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da Graça Saardinha1 

A LEITUR
RA E O LEITOR
L

Enntre os hom
mens, a circulação de sentido é  feita com eexpressões  sígnicas que se 
manifestam  atrravés  da  exxpressão  oral, 
o escritaa,  musical  e  até  corporal...ou  seeja  as 
relaçções  inten
ncionais  enntre  aquelles  e  o  mundo 
m são
o  mediadaas  pelas  várias 
v
lingu
uagens quee, por sua veez, interced
dem nas sittuações de comunicaçção. 

Coom o apareecimento dda escrita, aa estrutura da existên
ncia da hum manidade so ofreu 
gran
ndes  alterações,  dand
do  origem  a  mudançaas  bastantee  significattivas.  Um  outro 
o
acesso  ao  con nhecimento  começou  a  desenhar‐se:  acontecime
a entos  físiccos  e 
óricos  ligaados  a  grrandiosos  fenómeno
histó os  culturaais  vão,  ssucessivammente, 
consstruindo e rreconstruin
ndo a histórria. 

De sujeito ouvinte, enqquanto o oral impero umano passa a leitor, uma 
ou, o ser hu
vez  que  para  a 
a compreeensão  do  discurso 
d escrito  impõ
õe‐se,  como
o  complem
mento 
deste, o acto de ler. Assim
m, e sucesssivamente,  com o cammpo da leittura, uma  outra 
o
visão
o se alarga para horizontes até aaí desconheecidos. 

Em
m Silva (19
979) podem
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nciar as várias sensaçõ
ões que estta mudançaa veio 
prop
porcionar: 

 Depaartamento de L
1
Letras ‐ Univerrsidade da Beirra Interior. mg
ggds@ubi.pt 
SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
Falo, ouço, escrevo, volto­me ao mundo, busco a união através das coisas 
do mundo. Esta busca é mediada por um determinado tipo de linguagem 
– sem ela inexistiria a possibilidade de expandir as minhas experiências e 
de participar da transformação da cultura. 
   (Silva 1979: 65) 

O acto de ler interpretado numa verdadeira interacção entre o texto e o sujeito 
leitor, permite que todo o ser humano seja mais interventivo, reflexivo e crítico, se 
auto‐conheça, se realize e possa ampliar o seu projecto cultural de vida. 

Porém,  para  se  tornar  um  leitor  competente,  qualquer  sujeito  terá  de  saber 
interagir  com  o  texto,  extraindo  os  significados  deste,  construindo  assim,  o  seu 
próprio metatexto. 

Veja‐se  como  Manguel  (1998)  nos  transmite  esta  interacção  que,  na  nossa 
opinião será sempre imperfeita, entre o texto e o sujeito leitor: 

Seja qual for a forma como os leitores fazem seu livro, o resultado é que 
esse livro e o leitor se tornam um só. O mundo que o livro é devora o leitor 
que é uma letra no texto do mundo; assim se cria uma metáfora circular 
[…]. Nós somos aquilo que lemos. […] o texto e o leitor entrelaçam­se […] é 
por isso que […] nenhuma leitura pode ser definitiva. 
(Manguel, 1998: 182) 

Ao  leitor  cabe  abordar  o  texto  com  as  suas  próprias  estruturas  cognitivas  e 
afectivas. Ao receber o texto, pode construí‐lo de várias maneiras e fazer diversas 
interpretações,  refere  Giasson  (2000).  Todavia,  as  leituras,  para  além  de  sempre 
imperfeitas,  também  não  são  infinitas.  Há,  logicamente,  limites  impostos  pelo 
senso comum e, ainda, convenções gramaticais a respeitar. 

A  ênfase  atribuída  ao  leitor  é  hoje,  sem  dúvida,  reconhecida  como  essencial  à 
compreensão  de  um  texto.  Sem  este,  o  texto  permanecerá  para  sempre  um 
conjunto de marcas silenciosas (Manguel, 1998). 

Eco  (1993)  corrobora  esta  ideia  pois  também  ele  considera  indispensável  a 
presença  do  leitor,  factor  único  para  a  existência  do  texto,  quer  ao  nível  da 
mensagem recebida, quer ao nível da (re)construção do mesmo: 

[…]  um  texto  postula  o  seu  próprio  destinatário  como  condição 


indispensável  não  só  da  sua  própria  capacidade  comunicativa  concreta, 
como  também  da  própria  potencialidade  significativa.  Por  outras 
palavras,  um  texto  é  emitido  para  que  alguém  o  actualize  –  mesmo 
quando não se espera (ou não se deseja) que esse alguém exista concreta 
e empiricamente. 
(Eco, 1993: 56) 

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SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

O  autor  assinala  o  papel  das  estruturas  cognitivas  das  quais  fazem  parte  os 
conhecimentos sobre a língua tais como: 

Conhecimentos fonológicos – distinção dos fonemas de uma língua;  

Conhecimentos sintácticos – ordem das palavras na frase;  

Conhecimentos semânticos – sentido das palavras e sua relação;  

Conhecimentos pragmáticos – utilização da linguagem adequada à situação. 

Estes conhecimentos organizam‐se, por sua vez, em esquemas – conhecimentos 
sobre o mundo que todo o sujeito traz consigo e que permitem relacionar o texto 
com os conhecimentos anteriores. 

Também  nos  trabalhos  de  Adams  e  Pruce  (1982),  a  ênfase  atribuída  aos 
esquemas  mentais  do  leitor  assume  uma  importância  decisiva.  Os  autores 
consideram‐ 
‐nos fundamentais para que o texto tenha significação, referindo que sem estes não 
poderão observar‐se novas aquisições: 
 

A compreensão é a utilização de conhecimentos anteriores para criar um 
novo conhecimento. Sem conhecimentos anteriores, um objecto complexo, 
como um texto, não é apenas difícil de interpretar; para falar com rigor, 
ele não tem significação 
(Adams e Pruce, 1982: 23) 

Nesta  perspectiva  os  trabalhos  de  Rumelhart  (1975)  apontam  o  processo  de 
recuperação  e  modificação  destes,  durante  o  processo  de  leitura.  Quanto  mais 
vastos  forem  os  conhecimentos,  maior  será  a  possibilidade  de  sucesso  do  sujeito 
leitor. 

Quanto às estruturas afectivas estas são responsáveis pela atitude daquele face 
ao  texto.  Daí  dependem  o  interesse  e  o  grau  de  cumplicidade  nesta  interacção 
refere  Giasson  (2000).  A  autora  faz  referência  a  alguns  elementos  considerados 
mais interventivos ao nível das estruturas afectivas, como a capacidade de arriscar, 
ou até o medo de não conseguir atingir o sucesso desejado. 

A leitura, os contextos e a construção do conhecimento 

O contexto engloba todas as condições nas quais se encontra o leitor ao interagir 
com  o  texto.  Todavia,  para  Lopes  (1984),  do  contexto  fazem  parte  todas  as 
condições  externas  que  condicionam  a  produção  e  a  recepção  deste.  A  autora  ao 
enfatizar as condições pragmáticas que regulam a adequação do texto ao contexto, 
refere que este último engloba: 

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SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
 

Relações  hierárquicas  entre  os  participantes,  conhecimentos 


“enciclopédicos” implícitos e tacitamente pressupostos, sistema de crenças 
de cada um dos interlocutores, visões do mundo diferenciadas, intenções 
específicas do locutor, universo empírico e sociocultural circundante, etc… 
(Lopes, 1984: 98). 

Nesta perspectiva, salienta‐se a importância atribuída aos actos de comunicação 
como  forma  de  interacção  social,  cuja  situação  concreta  é  moldada  por  factores 
psicológicos e sociológicos. 

Três tipos de contextos são referidos por Giasson (2000): o psicológico, o social 
e  o  físico.  O  contexto  psicológico  remete  para  as  condições  contextuais  de  cada 
leitor, ou seja, o interesse pela leitura, a motivação e a intenção de leitura. Quanto 
ao  contexto  social  diz  respeito  às  manifestações  de  situações  de  leitura  num 
determinado  espaço.  No  respeitante ao  contexto  físico,  devem  ter‐se  em  conta  as 
condições  materiais  em  que  o  processo  de  leitura  se  desenvolve,  tais  como  a 
qualidade  de  reprodução  dos  textos  utilizados,  a  temperatura  do  ambiente  e  a 
intensidade do ruído.  

Manguel (1998) assinala a importância dos contextos físicos e psicológicos, e na 
sua opinião estes influenciam‐se mutuamente: 

Sabia  que  nem  todos  os  livros  eram  próprios  para  ler  na  cama.  As 
histórias policiais e os contos fantásticos eram os mais conducentes a um 
sono repousado. 
(Manguel, 1998: 61) 

O  autor  transmite‐nos  todo  o  prazer  que  a  leitura  proporciona,  referindo‐se  à 


importância da postura do corpo, do aconchego, e até do conforto físico do leitor: 

[…] certos livros não requerem apenas um contraste entre o seu conteúdo 
e  o  ambiente  que  o  rodeia;  parecem  também  exigir  posições  específicas 
para serem lidos, postura do corpo do leitor que por seu turno requerem 
lugares de leitura apropriados a essas posturas […]. Há livros que leio em 
sofás  e  outros  que  leio  à  secretária;  há  livros  que  leio  no  metro,  em 
eléctricos  e  outros  carros  […].  Os  livros  lidos  numa  biblioteca  pública 
nunca têm o mesmo travo dos livros lidos nos sofás ou na cozinha. 
(Manguel, 1998: 161). 

Ler muito, saber criar contextos de leitura e ou saber usufruir daquilo que estes 
nos podem oferecer/enriquecer é uma forma de desenvolvimento de nós mesmos, 
da  nossa  identidade,  sempre  inacabada,  logo  em  permanente  construção  e 
concomitantemente  do  desenvolvimento  da  própria  inteligência  de  todo  o  ser 
humano. 

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SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

Sternberg (1985), autor da teoria triárquica, refere‐se à forma como se organiza 
a  inteligência,  à  comunhão  do  indivíduo  com  o  meio,  enfatizando  o  papel  das 
experiências: 

A  teoria  triárquica  é  uma  teoria  do  indivíduo  e  das  relações  com  o  seu 
mundo  interior  e  o  seu  mundo  exterior.  Considero  as  experiências  como 
mediadoras desses dois mundos. 
(Sternberg, 1985: 317) 

A  teoria  triárquica  é,  segundo  o  autor  supracitado,  composta  por  três 


subteorias:  a  contextual,  a  componencial  e  a  experiencial.  A  primeira  relaciona  a 
inteligência  com  o  ambiente  exterior  ao  indivíduo.  A  segunda  refere‐se  ao  seu 
ambiente  interior.  A  terceira  ocupa‐se  da  interacção  entre  os  dois  ambientes 
referidos onde, por sua vez, a inteligência vai operando. 

Por meio da teoria (triárquica), o autor assume que a formação da inteligência 
tem  lugar  entre  os  dois  mundos,  interior  e  exterior,  o  que  remete  para  a 
capacidade  de  um  sujeito  como  ser  único  e  individual.  O  privilégio  atribuído  aos 
contextos  nesta  adaptação  ao  meio  assume  uma  importância  considerável  na 
óptica do autor mencionado: 

Vejo a inteligência como a actividade mental do indivíduo, dirigida para 
uma  dada  finalidade  e  procurando  a  adaptação,  a  selecção  ou  a 
transformação do meio (mundo real) importante para a sua própria vida. 
(Sternberg, 1985: 45) 

O indivíduo vai criando adaptações sucessivas ao ambiente que o rodeia e, em 
simultâneo,  vai  desenvolvendo  a  sua  actividade  mental,  sempre  de  acordo  com  o 
contexto em que vive, segundo os seus próprios objectivos. 

Nesta perspectiva, a subteoria experencial é a responsável pelo modo como se 
realizam as tarefas ao nível do processamento da informação.  

No  referente  à  leitura,  onde  aquelas  tendem  a  assumir  um  carácter  de 
automatização,  podemos  afirmar  que  existe  uma  relação  de  causa/efeito  entre  o 
desenvolvimento da compreensão do mundo que nos rodeia, a capacidade leitora e 
a construção do conhecimento. 

Perkins (1986) defende que toda a aprendizagem se faz num continuum. O autor 
diz‐nos  que  a  inteligência  dos  sujeitos  (alunos)  só  pode  ser  melhorada,  se  forem 
privilegiadas  as  estruturas  do  pensamento.  Neste  sentido  alerta  para  uma 
pedagogia centrada numa perspectiva construtivista: 
 

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SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 
 
Podemos  levar  o  aluno  a  pensar  estrategicamente  sobre  o  seu  próprio 
comportamento para que ele tente inventar as estruturas de pensamento 
necessárias. 
(Perkins, 1986: 8) 

A teoria de Gardner (1987) remete o conceito de inteligência para competências 
individuais  autónomas  –  múltiplas  inteligências.  O  autor  distingue  sete 
competências  na  inteligência:  motora,  musical,  lógico‐matemática,  linguística, 
espacial, interpessoal e intrapessoal. 

Falar  da  construção  do  conhecimento  através  da  leitura  implica,  ainda,  uma 
alusão,  embora  breve,  tanto  à  metacognição  como  à  memória,  pois  ambas 
apresentam uma relação de causa efeito neste percurso. 

Bjorklund  et  al.  (1990)  dizem‐nos  que  as  mudanças  que  se  vão  operando  ao 
nível  do  conteúdo  do  conhecimento  estão  directamente  relacionados  com  a 
utilização de estratégias de memória. Esta perspectiva é analisada nos trabalhos de 
Erickson  e  Simon  (1984)  que  remetem  para  o  conceito  de  memória  activa.  Para 
que  esta  se  desenvolva  ao  nível  da  metacognição,  deve  privilegiar‐se  o 
questionamento  sistemático  dentro  da  sala  de  aula.  Tal  procedimento  que, 
segundo  os  autores,  deverá  sempre  ter  em  conta  os  textos,  visa  dirigir  a  atenção 
dos sujeitos para os aspectos relevantes da semântica do processo cognitivo. 

As  questões  orientadas  pelo  professor  promovem  a  cultura  do  auto‐


questionamento  que  interiorizada,  promove  a  auto‐regulação  das  competências 
cognitivas  que,  por  sua  vez,  conduzem  aos  aspectos  ligados  à  metacognição  e, 
sucessivamente,  à  construção  e  desenvolvimento  dos  esquemas  mentais  de 
qualquer sujeito. 

ALGUMAS NOTAS CONCLUSIVAS:


Como  resposta  às  questões  propostas  neste  Congresso  (questões  de  partida) 
afirmamos,  com  convicção,  que  a  leitura,  nos  mais  variados  suportes,  é  sempre 
fonte de conhecimento. 

Através  da  leitura  vamos  construindo  a  nossa  identidade  (sempre  imperfeita), 


sabendo quem somos, o que somos, o que e quem queremos ser. 

Só  sendo  leitores  competentes  poderemos  ser  livres  nas  nossas  escolhas  e, 
consequentemente, exercer democraticamente a nossa cidadania. 

Continuando a dar resposta às questões de partida, acreditamos que não tendo 
a leitura como projecto de vida, não pode haver conhecimento; que a maior parte 
do  conhecimento  tem  raíz  na  leitura;  que  os  vários  tipos  de  conhecimento  que  a 
leitura  proporciona  se  relacionam  entre  si;  que  a  leitura  transporta  consigo  uma 

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SARDINHA, M. (2007) Literacia em Leitura e Construção do Conhecimento. In, V. Trindade, N. 
Trindade & A.A. Candeias (Orgs.). A Unicidade do Conhecimento. Évora: Universidade 
de Évora. 

carga emocional tão forte, que sem ela a vida não pode ser sentida e compreendida, 
visto ler implicar sempre compreensão. 

Para  Heidegger(1962  )  o  homem  ascende  ao  ser  ou  seja  vive  em  plenitude 
quando compreende:  

Compreensão  é  o  Ser  existencial  da  potencialidade  para  ser  da  própria 


existência  humana;  e  é  assim  de  tal  modo  que  este  ser  descobre  em  si  o 
que de seu ser é capaz. 
Heidegger (1962: 182) 

Saber  buscar  um  sentido  mais  profundo  para  e  na  leitura,  é,  sem  sombra  de 
dúvida, procurar potencialidades de existência para o ser humano. 

Compreender  o  texto  através  da  leitura  é  poder  enriquecer  com  novas 


proposições do mundo, é, em suma, viver. 

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