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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LIME

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESEISTTAQÁO
DA EDigÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.

Eis o que neste site Pergunte e


Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questóes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortaleca
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabal no assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.

Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.

Pe. Estevao Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR

Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e


passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteúdo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.

A d. Estéváo Bettencourt agradecemos a confiaga


depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
J ■Á*"&> X. ~£

b;*,-,- .<*.-«... r ■u. t -

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27O
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"Nos, os Peixinhos..
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Armas Nucleares e Desarrt

Casamento e Famili;
no novo Oireito Canon

Anulacáo do Casamento da
va, - Carolina de Monaco

Absolvi^áo Coletiva de P<

É Licito o Uso das Imagens

"Os Poderes de Jesús <

A Trilogía Analíttc;

Setembro-Outubro —
''i'.' '. •
PERGUNTE E RESPONDEREMOS
SETEMBRO-OUTUBRO — 1983
Publfcacao bimestral
N< 270

SUMARIO Diretor-Responsável:

D. Estéváo' Bettencourt OSB


"NOS, OS PEIXINHOS. .'• 353 Autor e Redator de toda a materia
A espada de Dámocles sobre a huma- publicada neste periódico
nidade:
Diretor-Administrador
ARMAS NUCLEARES E DESARMA
MENTO 354 D. Hildebrando P. Martins OSB

Folheando um livro aínda pouco


conhecido:
CASAMENTO E FAMILIA NO NOVO
Admlnlstracao e dlstrlbuicáo:
DIREITO CANÓNICO . . 371
Será verdade? Edicdes Lumen Christi
ANULACÁO DO CASAMENTO DA Dom Gerardo, 40 - 5"? andar, S/501
PRINCESA CAROLINA DE MO Tel.: (021) 291-7122
NACO? . . 386
Caixa postal 2666
Ñas proximidades do Sínodo Mundial
20001 - Rio de Janeiro - RJ
dos Bispos:
ABSOLVICÁO COLETIVA DE PECA
DOS 395

Peranle a Leí de Deus: Pagamento etn cheque nominal visado ou


É LÍCITO O USO DAS IMAGENS Vale Postal (para Agencia Central/Rio),
SAGRADAS? 412
enderezado ás:

A solucáo moderna para todos os Edicdes Lumen Christi


problemas? Caixa Postal 2666
"OS POOERES DE JESÚS CRISTO"
20001 - Rio de Janeiro - RJ
por Lauro Trevisan . 423

Urna nova Escola


A TRILOGÍA ANALÍTICA 433
ASSINATURA EM 1983:
(De Janeiro a dezembro) Cr$ 2.500,00
Número avulso de 19S3 Cr$ 450,00
NO PRÓXIMO NÚMERO Assinatura de 1984 Cr$ 4.000,00
Número avulso de 1984 Cr$ 700,00
271 — Novembro-Dezembro — 1983 RENOVÉ SUA ASSINATURA
QUANTO ANTES
Que é "Ideología"? — "O Teológico das
LibertacSes". — "Historia do Cristianismo".
— "Onde as Flores NSo Murcham". — Vocé COMUNIQUE-NOS OUALQUER
sabe quando...? — O Casamento de Mar-
MUDANQA DE ENDERECO
tinho Lutero. — Que é a Excomunháo? —
"Técnica do Poder da Mente e Salvacao". —
"Conversando sobre sexo". — A Igreja
Composicáo e Impress&o:
Ortodoxa Russa.
"Marques Saraiva"
Com aprovagáo eclesiástica Santos Rodrigues, 240
Rio de Janeiro
"NOS, OS PEIXINHOS..."
Escritor cristáo do século m, Tertuliano, deixou-nos um
opúsculo sobre o Batismo. Fazendo a apologia deste, escreve
logo de inicio:
«Nos, os peixinhos segundo o nosso ichth)ys Jesús Cristo,
no qual nascemos, só somos salvos permanecendo na agua».
Este texto, com suas metáforas, merece ser aprofundado.
Em grego, Ichthys resulta da justaposigáo das iniciáis das
palavras Iesous Christós Theou Yiós Sotér (Jesús Cristo, Fi-
lho de Deus Salvador); donde ICHTHYS. O vocábulo assim
oriundo significa peixe em grego. Por isto Jesús Cristo é
figurado por um peixe na iconografía antiga, e os cristáos por
peixinhos, pois o cristáo é um outro Cristo. Alias, é o próprio
Senhor quem diz aos seus Apostólos que Ele os há de fazer
pescadores de homens (Mt 4,19), como também afirma que o
Reino dos céus é semelhante a urna rede langada ao mar para
recolher peixes de toda especie (cf. Mt 13,47).
Tertuliano, valendo-se ainda da simbologia do peixe, afirma
que os peixinhos, nascidos na agua do Batismo, só podem
sobreviver e salvar-se caso permanegam nagua.
Ora tal proposigáo, graciosa como é, nao deixa de ser
também muito seria. Lembra aos cristáos de hoje a inelutável
necessidade de permanecerem fiéis ao seu Batismo e a Santa
Máe que os batizou ou gerou para a vida nova: a Igreja. A
fidelidade á Igreja é inseparável da fidelidade ao Batismo e ao
Cristo Jesús; é impossível que conserve a vida do Batismo
aquele que sai dágua ou aquele que sai da plena comunháo
com a Santa Igreja. Embora seja forte, em muitos, a tenta-
cáo de dizer Sim a Cristo e Nao á Igreja, a fé ensina que «há
um só Corpo e um só Espirito, urna só esperanga,... um só
Senhor, urna só fé, um só batismo, um só Deus e Pai de
todos» (cf. Ef 4,4s).
Precisamente os meses de setembro e outubro se apresen-
tam como especial oportunidade de viver tal comunháo. Com
efeito; a Igreja realizará mais um Sínodo Mundial de seus Bis-
pos para abordar a momentosa questáo da Penitencia e da
Reconciliagáo em nossos dias (cf. pp. 395-411 deste fascículo)
— o que avivará a consciéncia de eclesialidade existente em
todo discípulo de Cristo. A este nao interessa ter seu Credo
próprio, como lhe pode interessar talvez ter suas concepgóes
políticas, sociológicas e económicas próprias. As proposigóes
da fé vém de Deus através de Jesús e da Igreja, de tal modo
que o grande anseio do cristáo é recebé-las com fidelidade.
Tendo nascido nagua, o pequeño peixe só pode sobreviver se
permanece dentro dágua!
E.B.
— 353 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XXIV — N? 270 — Setembro-Outubro de 1983

A espada de Dámocies sobre a humanhtade:

Armas Nucleares e Desarmamento


Em sintese: A guerra, em tese, é contraria á mensagem crista do
perdfio e do amor aos Inimigos. Todavía já S. Agostinho (t 430) percebfa
que poderla ser utilizada para a defesa dos inocentes; o mandamento do
amor ao próximo poderla traduzlr-se pela defesa deste. S. Tomás de
Aquino (t 1274) elaborou ulteriormente esta doutrlna, que toma sua forma
mals recente na Constitulcfio Gaudium et Spes do Concillo do Vaticano II,
n? 79. Por conseguinte, conforme a doutrina católica, a guerra pode ser
legítima quando empreendlda ou aceita estritamente em vista da defesa de
legítimos dlreltos de um povo Injustamente atacado; requer-se, porém, que,
1) antes de dar Inicio á guerra, se procurem outros melos de resolver
conflltos; requer-se outrosslm que 2) os males causados pela guerra nfio
sejam mals avultados do que os bens a ser defendidos, 3) naja probablli-
dade de éxito bélico, 4) nSo se utlllzem recursos Bélicos Indiscriminados,
mas somente aqueles que atlnjam objetivos militares, delxando incólumes
as populacOes civis.

Estes principios excluem a guerra nuclear, que ó apta a causar danos


Incontrolávels. Todavía bons moralistas católicos nfio condenam a posse,
por parte de superpoténclas, de armas nucleares apenas a titulo de Intlml-
dacfio do adversario, enquanto vfio sendo envidados esforcos em prol de
um desarmamento parcial ou mesmo total. Na verdade, reina entre os povos
um clima de desconfianza mutua, que dificulta enormemente as conversac&es
prc-desarmamento. Em conseqüéncia, a paz mundial val sendo mantlda
precariamente pelo fato de que as superpoténclas possuem armas nucleares
capazes de dissuadlr de agressfio bélica. Tal solucfio, porém, nfio pode
ser definitiva; seja tolerada enquanto os povos vfio tentando redescobrlr os
valores éticos da slncerldade, da benevolencia, da justlca e da llberdade,
sem os quais nfio pode haver auténtica paz.

Comentario: O mundo inteiro tem acompanhado as ten


tativas de conversagáo entre as grandes potencias bélicas no
sentido de reduzir ou quigá abolir a instalagáo de armas nuclea
res, que constituem ameaga de suicidio coletivo para o género
humano. Verifica-se, porém, que as negociagóes nao chegam
a acordó e que é crescente o perigo de catástrofe mundial.
A Igreja tem-se pronunciado em termos de moderagáo e equi
librio tanto pela voz dos Sumos Pontífices como pela de seus

— 354 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO

Bispos; salientam-se especialmente os pronunciamentos do


S. Padre Joáo Paulo n e urna recente Carta Pastoral do Epis
copado norte-americano, a qual tem dado lugar a certa con
troversia.

Eis o porgué de urna reflexáo serena sobre o problema


em foco.

1. O problema

Antes do mais, seja considerado o aspecto básico da


questao:

1.1. Guerra: sim ou nao?

O Evangelho prega a fraternidade e a benevolencia entre


os homens, incluindo o perdáo aos ofensores e o amor aos ini-
migos. É, portante, em tese, contrario á guerra.

Acontece, porém, que a historia da humanidade tem sido


constantemente marcada por conflitos armados entre os povos.
A violencia das paixóes, como cobica do poder, ambigáo, amor
próprio, procura de riquezas..., tem suscitado situagóes de
discordia, que terminam em guerra.

A Moral católica, diante dos fatos, elaborou a doutrina da


«guerra justa», ... guerra empreendida (ou aceita) táo
somente em legítima defesa de um povo injustamente agre
dido. Tal doutrina é válida até hoje, como se dirá mais explí
citamente a. p. 361, mas há de ser aplicada com reservas e cau
telas inéditas, visto que a guerra hoje, seja qual seja o seu
motivo, se torna especialmente virulenta em virtude da ameaga
das armas nucleares.

1.2. Armas nucleares

1. As armas se dividem em convencionais e nucleares ou


atómicas1. O ingresso da humanidade na era das armas ató
micas deu-se em 6/08/1945, quando foi langada a primeira

]As armas atómicas podem ser subdlvldldas em estratégicas, "de


teatro" e táticas: as primeiras sfio capazes de atingir um país intelro como
a URSS ou os EUA; as "de teatro" tem por objetivo um ponto definido ou
territorio; as táticas sSo bombas, mísseis, foguetes, minas, transportados
por artllharla, avises, submarinos... de alcance mais reduzido. — A dls-
tincSo, porém, entre estes tipos de armas nucleares se apaga cada vez mais,
dados os progressos da tecnología bélica.

— 355 —
4 «FERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

bomba atómica sobre Hiroxima (Japáo). Estes dados, relati


vamente recentes, nao devem levar a menosprezar o perigo
das armas convencionais, que hoje sao ditas «inteligentes»; o
fabrico e o comercio de armas convencionais, cada vez mais
requintadas, toma proporcóes sempre mais vultosas em nos-
sos tempos. fi o que observava o S. Padre Joáo Paulo n em
sua mensagem & ONU em 11/06/82:

"Na verdade, as armas nucleares nSo sfio os únicos meios de guerra


e de destrulcfio. A producfio e a venda de armas convencionais no mundo
constltuem fenómeno alarmante e, como parece, em plena expansfio. As
convereacfies sobre desarmamento nSo estariam completas se se ignorasse
que 80% das despesas armamentistas diz respelto ás armas convencionais.
De outro lado, parece que o tráfico das mesmas se desenvolve em ritmo
crescente e se orienta de preferencia para os países em vía de desenvolvi-
mento. Todo passo dado e toda iniciativa tomada para limitar tal produc&o
e tal tráfico e para submete-los a controle sempre mais eficaz vfim a ser
urna contrlbulcBo significativa para a causa da paz. Aconteclmentos re
centes conflrmam o poder destruidor das armas convencionais e as
deplorávels condlcCes a que se condenam os países tentados a recorrer
a elas para dirimir as suas controversias".

2. Nao há dúvida, porém, de que aínda mais grave é a


ameaga proveniente das armas nucleares.

Ninguém sabe exatamente quantas sao as ogivas1 nuclea


res hoje existentes no mundo, mas pode-se afirmar que ultra-
passam a cifra dos 40.000. O poder destruidor dos atuais
arsenais nucleares corresponde a um milháo de vezes a bomba
de Hiroxima, isto é, a cerca de treze bilhóes de toneladas
de TNT (trinitrotoluene) ou mais de tres toneladas de TNT para
cada habitante do planeta (cf. Livro Branco da ONU sobre as
Armas Nucleares, traducáo italiana, aos cuidados da ACLI,
Roma, 1982, p. 19).

As armas estratégicas de grande alcance (de 6.400 a


13.000 km) e de medio alcance (de 2.400 a 6.400 km), a
ser langadas da térra ou por submarinos ou por avióes che-
gavam em 1980 a 9.000/11.000 para os Estados Unidos, com
urna potencia de 3.000/4.000 megatons (Mt), e 6.000/7.500
para a Rússia, com urna potencia de 5.000/8.000 Mt. Julga-se,

* Ogiva, segundo Aurelio ("Novo Dlclonário"), é a figura formada pelo


cruzamento do dols arcos Iguais que se cortam superiormente, formando um
ángulo agudo, tfplco das abobadas góticas. Por trasladado, ogiva é a
parte frontal afilada de um projétll, foguete ou velculo espacial, que geral-
mente carrega a carga útil.

— 356 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 5

porém, que nos próximos anos se multiplicaráo em 40%, em


virtude especialmente da construgáo dos submarinos Trident
e da instalagáo dos misseis MX.

Todo submarino Trident transporta 24 misseis MIRV,


cada qual com dez ogivas, de tal modo que cada submarino
pode langar 240 ogivas nucleares sobre igual número de alvos,
a urna distancia de 7.000 km; a sua potencia explosiva é
superior á de todas as municóes da segunda guerra mundial.

Quanto ao míssil MX, com suas dez ogivas, atinge o alvo


com a possível oscilagáo de 100m apenas, após 13.000 km
de vóo.

Alias, a tecnología das armas nucleares tem-se aperfei-


goado constante e rápidamente. Por exemplo, tém-se redu-
zido o volume e o peso das ogivas, sem diminuir o seu- pode
río; em conseqüéncia, um só míssil estratégico pode carregar
diversas ogivas, o que aumenta enormemente a sua eficacia
sem aumentar igualmente o peso. Assim, ao peso da bomba
que caiu sobre Hiroxima (cinco toneladas), correspondem hoje
tres misseis Foseidon, com cinco ogivas cada um, sendo cada
ogiva tres vezes mais potente do que a bomba de Hiroxima;
desta forma, com o mesmo peso pode-se montar um engenho
de eficacia 150 vezes superior.

O aperfeigoamento da técnica tem em mira também a


precisáo da artilharia; esta, em alguns casos, pode oscilar
dentro de urna margem de 50 m apenas. O esmero dos enge-
nheiros tem-se voltado outrossim para a seguranga dos ati-
radores, a facilidade de manejo das armas, a possibilidade de
resistencia a ataque adversario, as plataformas de lance, os
sistemas de identificagáo dos misseis adversarios, de modo a
poder responder em tempo útil a um ataque. A propósito
note-se que os misseis balísticos intercontinentais levam 30
minutos para atingir seu objetivo, ao passo que aqueles de
curto raio levam táo somente 5 a 7 minutos.

3. O que mais preocupa, dentro de tal problemática, é


a espantosa capacidade destruidora das armas atómicas. Os
cientistas de diversas áreas tém-se pronunciado a respeito
com grande realismo.

— 357 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Assim a Pontificia Academia de Ciencias elaborou urna


explanacáo sobre «as dimensóes da catástrofe que se segui
ría ao uso das armas nucleares e os limites da assistencia mé
dica», explanacáo enviada pelo S. Padre Joáo Paulo II aos
Chefes de Estado dos EUA, da URSS, da Franca, da Grá-Bre-
tanha e ao presidente da ONU (cf. PR 263/ 1982, pp. 246-255).

Também um grupo de dentistas de diversas partes do


mundo, convidados pela Pontificia Academia de Ciencias, redi-
giu em 1982 um documento, do qual vai extraído o seguinte
trecho:

"A ciencia nio pode oferecer ao mundo nenhuma defesa contra as


conseqüénclas de uma guerra nuclear. NSo há possibilldade de produzir
melos de defesa suficientemente eflcazes para proteger as cidades, pois um
so engenho nuclear pode provocar ruinas macicas. NSo se ve como a massa
da populacSo poderla ser protegida contra um grande ataque nuclear, nem
como se poderla evitar a destruicáo dos fundamentos culturáis, económicos
e Industriáis. O desmoronamento da socledade e o número das vftlmas
seriam de tal grandeza que nenhuma estrutura de ordem médica poderla
socorrer mals do que a pequeña porcentagem dos casos necessltados"
(L'Osservatore Romano, 3/10/1982).

Por fim, vale a pena citar aínda o «Livro Branco» da


ONU (1982):

«Nao há nenhum alvo que possa resistir aos ataques


devastadores das armas nucleares nem defesa eficaz contra
um ataque inimigo inclemente», de tal modo que se pode dizer
que hoje «o homem dispóe de arma absoluta» (p. 47): Fa-
lando dos efeitos de uma guerra nuclear total, o texto dis
tingue entre «golpe contra forcas militares», que tem em
vista destruir o poder bélico do adversario e seus postos de
comando, e «golpe contra valores», dirigido contra os centros
industriáis e os aglomerados urbanos, com o objetivo de des
truir em grande vulto fábricas, habitacóes e cidades... Ora,
no caso de golpe marico «anti-forgas» contra os EUA, nave-
ría «14 milhóes de morios, mesmo que a populagáo tivesse
condigóes de se abrigar nos refugios antiatómicos hoje exis
tentes» (p. 62). No caso de um golpe «anti-valores», se fos-
sem langados 300/400 projéteis nudeares da potencia de 144/
/166 Mt, haveria 70/90 milhóes de vítimas e 60/65% da
industria estariam destruidos. Em outras palavras: apenas
com o emprego de pequeña porgáo do atual potencial nuclear,
haveria número de mortos enorme e destruigóes pavorosas,
quer a curto, quer a longo prazo. Por exemplo, calculou-se

_ 358 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 7

que os residuos radioativos que se espalhassem pelo mundo


em conseqüénda do uso de projéteis de 10.000 Mt de poten
cia complexiva, provocariam, num periodo de quarenta anos,
entre cinco e dez milhóes de óbitos por cáncer. A freqüéncia
das deformagóes congénitas seria aproximadamente a mesma
dos casos moríais de cáncer. A metade dessas deformagóes
congénitas se manifestaría ñas duas geracóes subseqüentes ao
conflito e a outra metade em geragóes posteriores» (p. 66).

Vé-se, pois, que urna guerra nuclear teria conseqüéncias


devastadoras para todo o planeta, a ponto de abalar o am
biente geográfico, a economia, o comercio e os valores cultu
ráis. Donde concluí o documento da ONU:

"É pouco provável que algum pafs possa permanecer política e social-
mente Intato no dia seguinte a um grande confuto nuclear. Sem dúvida,
numerosas nac6es desaparecerlam pura e simplesmente. Outras poderlam
tornar-se quase totalmente despovoadas pela fome e por maclca emlgracáo.
O sistema de seguranca Internacional estarla desmantelado assim como
grande parte das tradicionais estruturas dos países, das nacSes e sociedades
que consegulssem sobrevlver" (p. 70).

Examinemos agora

1.3. As dificuldades das conversa$6es pró-desarmamento

O perigo de urna guerra atómica tem levado as duas gran


des potencias militares que sao a Rússia e os Estados Unidos,
a procurar entendimento sobre urna possível diminuigáo ou
extingáo de armas nucleares. Todavía até hoje os resultados
foram muito exiguos.

Na base das dificuldades está urna atitude de descon-


fianga recíproca e medo. Cada qual dos interlocutores julga
que a outra parte nao é sincera em suas propostas ou nao
tenciona chegar a um acordó real, mas apenas quer fazer pro
paganda política e lancar areia nos olhos da opiniáo pública.
Cada qual eré que, quando o adversario estiver certo de pos-
suir superioridade militar, nao hesitará em desfechar um ata
que de surpresa. O desarmamento total, em tais condigóes, é
praticamente impossível; cada qual receia ficar a descoberto
do inimigo. Na melhor das hipóteses, pode-se pensar em che-

— 359 —
8 «PERPUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

gar a urna paridade de forcas, sem superioridade de alguma


das duas partes, á semelhanga do que aconteceu no encontró
de SALT 1 (Moscou 1972), no Interim agreement (Vladivos-
tock (1974) e no de SALT 2 (Viena 1979) K Mas atualmente
o conceito de paridade no setor militar é difícil de se definir,
dadas a rapidez e a complexidade dos progressos na tecnologia
militar. Por isto até hoje, desde que se iniciaram em 1982,
tém fraoassado as conversacóes de Genebra para a redugáo
das armas nucleares estratégicas (START, Strategic Arms
Reduction TaDts). O próprio Presidente Ronald Reagan decla-
rou que o clima de desconfianga nao convida as superpotén-
cias a procurar a paridade, mas, sim, a superioridade arma
mentista, porque julgam que só esta pode dissuadir o adver
sario de desferir o primeiro ataque. É, alias, o que notava o
S. Padre Joáo Paulo II em sua mensagem á ONU em 11/06/82,
mensagem que fazia eco a palavras de Paulo VI dirigidas á
ONU em 24/05/78:

"A luta em busca do equilibrio de Torgas leva cada urna das partes
a procurar conquistar certa margem de superlorldade, receando poder
encontrar-se alguma vez em sltuacfio de desvantagem. Asslm praticamente
ó fácil a tentacfio — e constante o perlgo — de ver a procura de equilibrio
transformar-se em procura de superlorldade que estimule de modo aínda
mals perlgoso a corrida aos armamentos" (II Regno/Documentl, rfi 13,
1/07/82, p. 389).

Examinemos agora os pronunciamentos da Igreja diante


da problemática que assim se coloca.

2. A Moral Católica «fiante cío problema

Distinguiremos 1) a clássica doutrina católica e 2) a posi-


gáo diante das armas nucleares.

iSALT é a sigla de Strategic Arms LJmltatlon Taita (Conversacdes


para a Limltacfio de Armas Estratégicas). Foram Iniciadas em dezembro
de 1969 em Helslnque (Finlandia); em novembro de 1972 termlnou a pri-
meira serle de conversacdes (SALT 1) com os seguintes tetos: 1.054
mfssels Intercontinental de base terrestre e 710 de base em submarino,
para os EUA; 1.618 e 950 respectivamente, para a URSS. Posteriormente,
em SALT 2, o teto pasaou a ser, para os dols países, de 2.400 vetores
estratégicos, dos quais 1.320 com ogivas múltiplas.

— 360 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO

2.1. A clássica doutrina da Moral

Visto que o problema da guerra em todos os sáculos se


colocou diante da consciéncia crista, esta formulou certos prin
cipios clássicos sobre o assunto, que conservam seu valor até
hoje, mas certamente em nossos dias merecem explicitacáo
muito precisa.

Eis breve noticia do histórico de tais principios:


S. Agostinho (t 430), impressionado pelas conseqüéncias
do pecado na historia, via na guerra um fruto do pecado, mas,
ao mesmo tempo, um trágico corretivo do mesmo na vida das
sociedades. Sim; a guerra procede originariamente de ambi-
cóes desordenadas, mas pode ser utilizada, ao menos em alguns
casos, para limitar o mal e proteger o inocente. O caso clás-
sico, para S. Agostinho, era o uso da forca, mesmo homicida,
no intuito de evitar ou repelir urna agressáo contra vítimas
inocentes. Diante do fato da agressáo a um inocente, o prin
cipio de que nao devemos fazer o mal, nem mesmo a um ini-
migo, se traduz pela obrigagáo de impedir que se cometa o
mal contra o inocente.
A argumentacáo em prol da guerra justa tomou formas
diversas na historia da teología católica. Ao passo que
S. Agostinho sustentava apenas o direito de defesa dos outros,
S. Tomás de Aquino (f 1272) estendeu-o á defesa do próprio
sujeito. No sáculo XX, os documentos da Igreja reconhecem
o direito de autodefesa aos Estados legítimos desde que no
contexto internacional nao haja urna instancia judiciária reco-
nhecida por todos os povos (cf. Constituiffáo Gaudium et Spes
n» 79, transcrito á p. 363 deste fascículo).
Os criterios vigentes na teología católica a propósito de
tal materia sao os seguintes:

1) A guerra de conquista ambiciosa e imperialista é sem-


pre ilegítima. Lesa direitos alheios em proveito de interesses
espurios do agressor.
2) É lícita a guerra imposta pela necessidade de defen
der justos direitos ou a guerra-resposta a um injusto agressor
ou a um ataque movido contra a justa e digna sobrevivencia
de determinado povo. Em tais casos, alias, a guerra nao é
apenas um direito legitimo, mas pode ser mesmo um dever
que incumbe ao Estado injustamente agredido; este deve zelar
pela incolumidade dos direitos fundamentáis da respectiva
populacáo.

— 361 —
10 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

O reconhecimento da guerra movida em legítima defesa


contra injusto agressor ainda sofre restrigóes nos seguintes
termos:

a) a guerra em tais casos seja o último e único recurso


viável para defender os legítimos direitos; nao é lícito apelar
para a tática bélica sem que estejam esgotadas anteriores
instancias menos violentas;

b) haja proporcionalidade entre os danos que a guerra


inflige, as despesas que ela impóe, e os bens que ela tenciona
salvaguardar ou defender. Isto quer dizer que devem estar
em perigo valores fundamentáis de determinada populacho, e
nao apenas «compleméntaseles» de tais valores;

c) haja probabilidade de éxito. Isto significa que, mesmo


quando a causa é justa, a guerra é ilícita se ela nao tem con-
digSes de defender os direitos violados ou caso se possa pre
ver de antemáo que será urna guerra perdida ou frustrada.
Isto ainda implica que é ilegítima a guerra declarada simples-
mente para «salvar a honra» de um Governo ou em atitude
de desespero, mesmo quando a causa seja justa. O Santo Pa
dre Pió XII em 1953 observava que nao basta o intuito de
se defender contra qualquer injustiga para recorrer ao método
violento da guerra. Quando os danos que esta implica nao
sao proporcionáis (ou sao de alcance muito mais ampio) á
injustica sofrida, pode haver a obrigagáo, para um povo, de
sofrer a injustica (cf. Pió XII, Disoorsi e Radiomessaggi,
Roma 1954, XV, 422).

d) Observe-se outrossim o principio do discernimento.


Mesmo em caso de defesa contra injusto agressor, sao veda
dos pela Moral Católica

— qualquer tipo de agressáo indiscriminada do adversa


rio (os ataques tenham em mira os objetivos que direta ou
indiretamente possuam urna fungáo militar, com preservagáo
da populagáo civil, dos hospitais, dos monumentos cultu
ráis, etc.);

— o uso de armas que indiscriminadamente destruam o


adversario. Fica, pois, condenada a chamada «guerra total»,
movida mediante armas convencionais ou com uso de gas e
de outros meios bacteriológicos e químicos ou ainda movida
mediante armas nucleares (pois estas, ainda que dirigidas ape-

_ 362 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 11

ñas contra objetivos militares, produzem efeitos destruidores


de alcance incontrolável) A reflexáo sobre tais armas será
retomada mais adiante.

O Concilio do Vaticano II expós com muita clareza os


principios da Moral católica frente ás guerras em sua Cons-
tituigáo Gaudium «t Spes (n.<* 79-82), donde extraímos os
seguintes tópicos:

Após haver condenado a guerra que viola os direitos de


populacóes, prossegue o texto conciliar:

"Na verdade, a guerra nao fol desarraigada da historia dos homens.


Por conseguirte, enquanto houver perlgo de guerra, sem que exista autori-
dade Internacional competente e dotada de torcas suficientes, e esgotados
todos os melos de negoclacSo pacífica, nSo se poderá negar aos Governos
o direito de legitima defesa. Os Chafes de Estado e todos aqueles que
participan) da responsabllldade do bem público, portante, tem o dever de
salvaguardar o bem dos povos que Ihes sSo confiados, diriglndo com
seriedade assuntos tfio serlos.

Todavía urna colsa é cuidar de assuntos militares com o íim de de


fender com justlca os povos, e outra colsa é querer subjugar outras
nacSes.

Nem o fato de possuir poderlo bélico torna legitimo todo e qualquer


uso desse poder, seja para fins militares, seja para flns políticos.

Nem se creía que, quando por infellcldade a guerra já fol desenca-


deada, se tornam legítimos todos os recursos militares entre as partes
beligerantes" (Ib. n<? 79).

2.2. A guerra atómica

Comecemos por considerar os dizeres do

2.2.1. Concilio do Vaticano II

Nestes termos pronunciou-se sobre o assunto o Concilio:


"Pelo progresso das armas científicas, o horror e a perversidade da
guerra cresceram sem medida. Com o emprego destas armas as operacSes
bélicas podem causar destruicSes enormes e indiscriminadas, que ultra-
passam multo os limites da legítima defesa. Ora, se estes recursos, que já
se encontram nos arsenals de armas das grandes nacdes, fossem real
mente aplicados, resultarla dlsso unta chacina quase total e recíproca entre
os adversarios, sem falar das multas devastacSes que se originarían) no
mundo, e das nefastas conseqüéncias do uso destas armas.

Isto nos obrlga a examinar a guerra com mentalldade Intelramente


nova. Os homens de rtosso tempo devem saber que prestarSo contas se
veras de suas operacoes bélicas. Pols o desenvolvimento dos tempos
vindouros em grande parte dependerá de seus planos de hoje.

— 363 —
12 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

A vista disto, este Sacrossanto Sínodo endossa as condenacfies da


guerra total Já enunciadas pelos últimos Sumos Pontífices e declara:

Qualquer agio bélica que visa á destrulcBo indiscriminada de cidades


intelras ou de vastas reglOes com seus habitantes, ó um crlme contra Deus
e o próprlo homem, a ser condenado com firmeza e sem hesItacOes"
(ConstltuicSo Gaudlum et Spes rfi 80).

Estas palavras, escritas há cerca de vinte anos, tém hoje


em dia significado muito mais pujante, visto que o fabrico de
armas, sejam convencionais, sejam atómicas, produz engenhos
muito mais numerosos e de efeitos muito mais daninhos do
que na época do Concilio (1962-1965). Além da URSS e dos
EUA, tornaram-se potencias nucleares a Franca, a Inglaterra,
a China; outras nacóes, como a India, Israel, o Brasil, se dis-
póem a entrar no «clube atómico». Os orcamentos militares
v&o atingindo tetos cada vez mais elevados e desenfreados;
só em 1982 gastaram-se 600 bilhóes de dólares na fabricagáo
de armas!... O comercio destas é altamente próspero e
rendoso.

2.2.2. Os Bispos norte-americanos

1. Baseados em tais principios e fatos, os Bispos norte-


-americanos publicaram urna Carta Pastoral intitulada «The
Challenge of Peaoe: God's Promise and our Besponse» (O De
safio da Paz: a Promessa de Deus e a nossa Resposta). Este
texto comeoou a ser elaborado em julho de 1981; passou por
duas redagóes, comentadas e emendadas por eclesiásticos e
leigos (entre os quais H. Brown, Secretario da Defesa durante
o Governo Cárter; G. Smith, Chefe da delegagáo dos EUA ao
encontró SALT 1; H. Sonnefeld, Conselheiro do Departamento
de Estado durante o Governo Nixon; C. Weinberger e E. Ros-
tow, oficiáis do Governo Reagan). A terceira redacáo do
documento, após quase dois anos de estudo e múltiplas corre-
CÓes, foi definitímamente promulgada em maio de 1983.

A Carta, antes do mais, reitera normas gerais, como se


depreende do texto abaixo:

"No mundo interdependente de ho|e, mesmo um confuto local pode


envolver pessoas de multas outras partes do mundo, especialmente se pro
cede de potencia? nucleares. Por Isto nenhuma nac.&o em nossos días pode
com justlga empreender urna guerra nuclear sem considerar os efeitos da
sua agSo sobre outros povos e sobre a comunldade Internacional. O
principio de proporclonalldade apllca-se em chelo seja a decisáo de Iniciar
um confllto armado, seja ao modo de conduzir a guerra. Durante a guerra

— 364 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 13

do VIetng, a Conferencia dos nossos Blspos chegou á conclusSo de que


o confuto atingirá um tal nivel de devastacfio do adversarlo e de danos
para a nossa socledade que nao se justtficava a continuagSo do mesmo".

2. Passando agora diretamente á consideragáo da guerra


nuclear, os Bispos norte-americanos proferem um N«w> deci
dido la mesma assim fundamentado:

Nao se vé como recorrer ao principio da legítima defesa


para justificar o uso de armas atómicas. Com efeito, as armas
nucleares sao essencialmente agressivas, e nao defensivas; o
seu uso nao visa a defender o próprio territorio, mas a dani-
ficar o inimigo. E isto, quer se trate do first strike (primeiro
golpe), que tem em mira destruir o poder militar adversario
e as respectivas armas nucleares quando ainda estáo em térra
(ou seja, quando o inimigo ainda nao tenha atacado), quer
se trate do second strike (segundo golpe), que é a represalia
contra o inimigo; esta nao tem em vista apenas a defesa con
tra um ataque já ocorrido, mas, sim, infligir ao adversario
danos iguais ou maiores dos que os que ele infligiu. A guerra
nuclear, quer seja ofensiva, quer defensiva, vem a ser sempre
guerra total ou guerra que fere e mata injustamente popula-
cóes inocentes.

Mesmo que um dos beligerantes, num ataque de surpresa,


desferisse o primeiro golpe destruindo todas as bases de mis-
seis terrestres da outra superpoténcia, a esta ficaria ainda a
possibilidade de represalia ou de segundo golpe, lancando seus
misseis a partir de submarinos ou de avioes bombardeiros
pesados ou de satélites ldltar. Ter-se-ia entáo a MAD (Mutual
Assured Destruction), a mutua destruigáo assegurada ou
garantida.

Verdade é que atualmente há quem admita a possibili


dade de vencer urna guerra nuclear, e por isto planeje um
first strike que desarme logo o adversario, ou concebem urna
guerra nuclear prolongada que redunde em Vitoria para quem
a tenha desencadeado. Todavía deve-se reconhecer que qual-
quer Vitoria obtida após um prolongado confuto nuclear (dado
que ela seja possivel) seria um trágico eufemismo; tal pers
pectiva envolve «conceitos perigosos e engañadores», como
observaran! 97 intelectuais «Premio Nobel», em recente Apelo.
Daí a observacáo dos Bispos norte-americanos:
"Seria preciso opor clara e pública resistencia á retórica que propSe
'guerras nucleares vencíveis1 ou Irrealistas expectativas de sobrevivencia
após cóndilos atómicos ou estrategias de guerra nuclear prolongada".

— 365 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

3. Mas nao haveria a possibilidade de limitar a guerra


nuclear?

Os Bispos dos EUA consideram a questáo nos seguintes


termos:

"Mesmo um ataque dirigido táo somente contra objetivos militares...


seria devastador para o país Intelro. Pois os objetivos militares estáo
espéreos, e nao concentrados em poucos pontos. Por isto serla necessárlo
fazer explodlr multas bombas nucleares. Além disto, a dlfusSo das irradla-
cfies por obra dos ventos matarla grande número de pessoas e contaminarla
ampias reglóes".

Vé-se que o principio que fundamenta a posigáo dos Bis


pos, é algo já formulado pelo Concilio e pela clássica teología
moral: nao é lícito provocar destruicóes em massa, atingindo
populagóes ou objetivos predominantemente civis. Por isto
também as represalias indiscriminadas sao condenáveis, por
que prejudicam mortalmente muitos inocentes.

4. Mais adiante, os Bispos norte-americanos reexami-


nam a pergunta sob especial aspecto: Nao seria admissível
urna guerra atómica, ao menos á guisa de resposta a um ata
que do inimigo desfechado com armas convencionais, superio
res, porém, áquelas que o segundo beligerante poderia por em
campo? — Responde o episcopado:

"As diflculdades de limitar o uso das armas nucleares sfio Imensas.


Numerosos peritos (convidados pela Conferencia Episcopal para dar o seu
parecer) advertem que os comandantes em atlvldade ñas frentes de guerra
provavelmente nfio terlam condlcCes de exercer estrlto controle; o número
de armas postas em uso crescerla rápidamente; entre os objetivos a visar,
estarlam Incluidos também os nSo militares e o Indica de morios civis
subirla enormemente. Nlnguém pode estar certo de que tal extrapolado
nfio ocorreria mesmo que se realizassem conversares diplomáticas para
manter limitado o uso reciproco de engenhos nucleares. Isto nos leva a
concluir que o perlgo de extrapolado é tfio grande que a iniciativa de urna
guerra nuclear, de qualquer tipo que fosse, constituirla um risco moral
inaceitavel e nfio poderla ser Justificado por objetivos políticos razoávels".
Por Isto, concluem os Bispos, "Julgamos que o recurso a armas nucleares
para revldar um ataque com armas convencionais é um risco moral
Injustiflcáver ".

Em sintese: os Bispos, apoiados no sólido parecer de peri


tos consultados, afirmam que limitar urna guerra nuclear é
de todo inviável, seja por causa dos efeltos imediatos das
armas atómicas, seja por causa das conseqüéncias remotas ou
a longo prazo das mesmas. Donde «faz-se mister declarar que
urna.resposta nuclear seja a um ataque convencional, seja a

— 366 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 15

um ataque nuclear pode causar destruigóes que ultrapassam


longe os limites da legitima defesa. Em tais circunstancias,
nao se justificaría o uso das armas atómicas».

Eis, porém, que novo e importante aspecto da questáo


ainda se impóe á consideragáo dos estudiosos:

3. Como julgar a tática da «intintrda^ao»?

A pergunta formula-se do seguinte modo: Nao seria


lícito a um país fabricar e possuir armas nucleares nao para as
usar (o que é ilícito, como dito), mas apenas a fim de inti
midar os adversarios? Sabemos, sim, que a paz mundial é
hoje mantida precisamente porque as superpoténcias tém
armas nucleares que atemorizam a qualquer nacáo desejosa
de comegar a guerra. Como se vé, a questáo é delicada: tra-
ta-se de possuir armas atómicas nao para utiliza-las, mas ape
nas para impor respeito.

A resposta nao é fácil. Proponhamo-la por partes:

1) urna intimidagáo mediante armas atómicas que seja


«para valer» ou que esteja disposta a «vias de fato», será sem-
pre ilícita;

2) urna intimidagáo atómica que seja mera tática, nao


associada á intengáo de desencadear guerra nuclear, é aceitá-
vel como meio provisorio de impedir a guerra, mas nao pode
ser solugáo definitiva. A propósito manifestou-se Joáo Paulo n
em sua mensagem á ONU:

"Ñas atuals circunstancias, urna IntimacSo fundada sobre o equilibrio,


nSo como fim, mas como etapa na via de um desarmamento progresslvo,
pode aínda ser tlda como moralmente aceltável. Todavía, para assegurar
a paz, ó Indispensável que os povos nao se déem por satisfeitos com esse
mínimo, que está sempre exposto ao perlgo do desencadeamento de urna
guerra".

Neste parecer sao considerados os dois aspectos do pro


blema:

— de um lado, a posse de armas nucleares é sempre um


perigo nao somente no plano físico, mas também no plano
moral, pois da posse ao uso a distancia é pequeña e pode esta
distancia ser vencida num ato desatinado ou num ato de der-
rogagáo ao projeto inicial;

— 367 —
16 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

— no atual clima de desconfianga mutua em que se


desenvolvem as relagóes entre as superpoténcias, a procura de
equilibrio de armas atómicas, impedindo superioridade da
potencia inimiga, ainda é um fator (precario) de paz, de jus-
tiga e de liberdade para os povos. Mas bem dizia Joáo Paulo II
em 23/08/82: «A lógica da intimidagáo nuclear nao pode ser
considerada como meta final ou como meio apropriado e
seguro para salvaguardar a paz internacional».

Com outras palavras: a tática da intimidagáo é moral-


mente aceitável, sun, na hipótese de que simultáneamente se
envidem sinceros esforgos no campo das negociagóes diplomá
ticas para se atingir o desarmamento — desarmamento este
que so poderá ocorrer se o clima de mutua desconfianga atual
se transformar em atmosfera de sinceridade e confianga entre
os povos.

A intimidagáo é, pois, aceitável sob condigáo, e nao em ter


mos definitivos. Com efeito; a intimidagáo, desvinculada de
qualquer esforgo em prol do desarmamento encobre urna
ascensáo constante na corrida aos armamentos, pois que, a
titulo de intimidar, nenhuma superpoténcia se contenta com o
equilibrio das forgas, mas procura sempre a superioridade em
relagáo ao adversario. Ora a corrida aos armamentos, como
tal, é moralmente condenável; ela custou e custa a morte e o
subdesenvolvimento de milhóes de adultos e criangas nos paí
ses do Terceiro Mundo.

Tais ponderagóes já foram formuladas em termos ainda


lioje significativos pelo Concilio do Vaticano II:
"É verdade que as armas científicas nao se acumulam apenas para
serem aplicadas no tempo de guerra. Sendo opIniSo corrente que a torga
defensiva de cada lado depende da capacldade fulminante em repelir o
adversarlo, esta acumulacáo de armas, cada ano mais volumosa, exerce
tima Influencia Incomum para atemorizar posslvels adversarlos. Multos
consideram Isto como o mals eficaz de todos os meios para garantir hoje
unía certa paz entre as nacóes.

Seja qual for o peso deste raciocinio, convencam-se os homens de


que a corrida armamentista, para a qual nao ipoucas nacSes apelam, nao
e camlnrto infalfvel para assegurar firmemente a paz; nem o assim chamado
equilibrio que resulta desta corrida, é a paz estável e verdadeira. Bem longo
de eliminar as causas de guerra que da( surgem, antes aos poucos as
agravam. Enquanto se gastam enormes somas na confecfáo de armas
sempre novas, nao se pode dar remódio suficiente a tantas miserias que
hoja grassam no mundo Inteiro. Em vez de sanar em verdade e pela base
os conflitos entre as nacñes, outras partes do mundo sao por eles conta
minadas, é preciso procurar novos caminhos que procedam de urna re
forma dos espiritas, a flm de que se remova este escándalo, e ao mundo,
libertado do pavor que o oprime, possa ser restituida a paz verdadeira.

— 368 —
ARMAS NUCLEARES E DESARMAMENTO 17

Por lato, mais urna vez deve ser declarado: a corrida armamentista é a
praga mals grave da human Idade, que lesa intoleravelmente os pobres. É
de se temer multísslmo que, se perdurar, ela produza um dia todas as
ruinas nefastas, cujos instrumentos já prepara" (Constitulcfio Gaudium et
Spea n? 81).

Muito mais recentemente (1982) escreviam os Bispos da


Alemanha:

"A IntlmldacSo nuclear nSo é recurso no qual se possa confiar a longo


prazo para evitar a guerra. Por isto é preciso desenvolver esforcos na pro
cura de alternativas. A ameaga e a IntlmldagSo geram medo recíproco. Ao
medo deve substltulr-se a aceltac&o comum da ordem moral...

Entrementes a Intlmfdagao nuclear pode ser tolerada do ponto de vista


ético táo somonte se ela realmente serve para evitar a guerra e se a pro
cura de estrategia e armamentos militares obedece aos tres seguintes crite
rios: é preciso que a guerra delxe de ser provável; os armamentos devem
ser reduzldos á sua cota mals balxa posslvel; a escolha das táticas militares
deve facilitar a llmitac&o e a reducto dos armamentos".

A tal sentenca faz eco a Carta dos Bispos norte-america


nos: a intimidagáo é aceita sob as condigóes atrás formuladas,
mas nao pode ser considerada como base suficiente para urna
paz duradoura (we cannot consider it adeguate as a long-term
baste for peace).

4. Goncluscto

A humanidade se encontra atualmente em urna fase


dramática da sua historia. É preciso tomar consciéncia de que
a corrida as armas nucleares leva á ruina de todos, tornando-se
o mais grave perigo para o género humano.

Nao basta, porém, dizer Nao <a guerra. É mister construir


a paz, que, como diz Joáo XXIII na encíclica Pacem in Terris
n» 34, se funda sobre quatro pilastras: a verdade, a justiga, o
amor, a liberdade. Isto significa que a problemática da guerra
nao se resolve apenas nos planos político, diplomático ou mili
tar, mediante acordos internacionais; ela só poderá ser resol-
vida se for colocada no plano mais profundo da consciéncia
moral ou se se reavivarem entre os homens, especialmente entre
os dirigentes dos povos, os valores éticos da justiga, do amor,
da verdade e da liberdade; estas virtudes incluem sinceridade
e confianca no trato mutuo entre os povos; haja diálogo bem
intencionado, que leve á progressiva redugáo dos armamentos
ou, como seria para desejar, ao desarmamento bilateral e con
trolado eficazmente.

— 369 —
18 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 270/1983

Tais sao as verdades que Joáo Paulo n tem recordado


freqüentemente:

"A Santa Sé nSo se cansará de Insistir na necessidade de frear a


corrida aos armamentos mediante progresslvas negoclacQes, Inspiradas no
principio da reclprocldade. Ela continuará a estimular todos os passos,
mesmo os menores, de um diálogo razoável nesse setor de capital
Importancia" (Mensagem para o Día Mundial da Paz, 1/01/83).

"A única solucfio realista dlante das ameacas de guerra fica sendo
a negoclacáo" (Mensagem á ONU em 11/06/82).

"A producfio e a posse de armas sSo a conseqQencia de urna crise


ética, que corroí a socledade em todas as suas dlmensSes. A paz é o
resultado do respeito aos principios éticos. O verdadeiro desarmamento,
aquele que garantirá a paz entre os povos, só será atingido se se resolver
a crlse ótica. Por consegulnte, se os esforcos em prol da reduc&o das
armas e, finalmente, do desarmamento total, nSo forem acompanhados de
um reavivamento ético, serSo fadados a fracasso" (Ib.).

A gravidade da situacáo pede de todos os membros do


género humano a colaboragáo pessoal de cada um: que a reno-
vagáo ética tome inicio no corac.áo e na conduta de cada cidadáo,
muito especialmente dos cristáos! E que todas as pessoas de
fé elevem suas preces a Deus em prol da remogáo da grande
ameaca de suicidio coletivo da humanidade!

Na elaboracfio destas páginas foi de grande utilldade o artigo "Guerra


Nucleare, Deterreza e Cosclenza Morale" de Gluseppe De Rosa S.J. em
"La Clvlltá Cattollca" 3190, 21/05/83, pp. 313-328.

Bibliografía:

CONCILIO DO VATICANO II, Constituido Gaudlum et Spes.

CONFERENCIA DOS BISPOS DOS ESTADOS UNIDOS, The Challenge


of Peace: God's Promlse and our Responso.

IL REGNO, n<? 477, 13/01/1983, pp. 16-22.

ÍDEM, n? 478, 1/02/1983, pp. 97-122.

JOHNSON, J. T., Ideology, Reason and the Llmttatlon of War.


Prlnceton 1975.

O' BRIEN, W., War and or Survlval, New York 1969.

ÍDEM, The Conduct of Jirat and Llmlted War. New York 1981.

POTTER, R., The Moral Loglc of War, In MacCornlek Quarterh/ 23 (1970)


pp. 203-233.

— 370 —
Folheando utn livro aínda poueo conhecido:

Casamento e Familia
no Novo Direito Canónico

Em 8inleao: O novo Código de Direito Canónico considera o ma


trimonio á luz da fe e também da realldade contemporánea, levando em
conta dados da psicología e das ciencias humanas em geral que contrlbuem
para melhor entender a pessoa a ser levada a salvacSo eterna. — O pre
sente artigo pOe em relevo os cañones de teor novo em relacáo ao Código
de 1917; asslm, por exemplo, é realcada a norma segundo a qual sao
Incapazes de se casar pessoas que nao tenham suficiente uso de razSo ou
n8o possam, por causas psíquicas, cumprir os deveres essenciais da vida
conjugal. Em caso de matrimonio entre parte católica e parte nSo católica
a Igreja leva em conta as dificuldades que podem surgir para se celebrar
o rito canónico católico. Recomenda-se instantemente a educacño católica
da prole e a conseqOente colaboragSo que deve haver entre país e mestres.
— Em suma, a nova leglslacáo canónica atinente ao matrimonio é fruto de
sabia reflexfio sobre t9o delicada questSo; é apta a exigir dos nubentes
magnanimidade e nobreza, ao mesmo tempo que revela compreensáo das
profundidades do ser humano.

Comentario: É notorio o fato de que a 25/01/83 o Santo


Padre Joáo Paulo II promulgou o novo Código de Direito
Canónico, que deverá comesar a sua vigencia aos 27/11/83,
primeiro domingo do Advento.

A nova legislacáo se baseia sobre sólida fundamentacáo


teológica e tem finalidade evidentemente pastoral. Isto quer
dizer: o Código supera qualquer forma de juridismo cegó, que
só considere os valores da lei, e tem em mira colaborar intensa
mente na obra de salvacáo da humanidade pela qual Cristo
morreu. Tais características se refletem claramente sobre os
cánones atinentes ao matrimonio e á familia, cuja importancia
justifica especial consideracáo ñas páginas subseqüentes: o
leitor perceberá que o novo Código levou em conta devida as
questóes de ordem antropológica, psicológica e cultural que a
vida moderna suscita em torno da familia.

— 371 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 270/1983

1. A nogño de casamento

1. O Código de 1983 inspirou-se ñas linhas teológicas


emanadas do Concilio do Vatciano n. Ora este apresentou
o matrimonio como o relacionamento inter-pessoal que tem no
amor reciproco dos cónjuges o seu fundamento primordial
(cf. Constituigáo Gaudium et Spes n" 48). Fazendo eco a tal
concepgáo, o Código define o matrimonio como «alianga pela
qual o homem e a mulher constituem entre si um consorcio para
toda a vida, consorcio que, por sua índole natural, tem em mira
o bem dos cónjuges e a geragáo e educagáo da prole»
(can. 1055, § 1').

Note-se que o novo Código nunca fala de contrato matri


monial, mas preferiu usar o termo «alianga», visto que este
melhor corresponde á linguagem bíblica (Antiga Alianga, Nova
Alianga).

Tal alianga tem origem no consenso manifestado por ambas


as partes jurídicamente habilitadas. A nogáo de consenso, no
novo Código, nao menciona explícitamente o ius in corpus ou o
recíproco direito sobre os corpos, mas define o consenso como
«o ato da vontade pelo qual o homem e a mulher, numa alianga
irrevogável, se dáo e se recebem mutuamente a fim de constituir
matrimonio» (can. 1057, §§ 1* e 2»).

Compare-se com o texto do Código de 1917, can. 1081, § 2':

"O consenso matrimonial é ato da vontade pelo qual cada urna das
partes entrega e recebe o direito perpetuo e exclusivo sobre o corpo, em
vista dos atos que levam por si & geracSo da prole".

Ve-se que, em vez de p5r em relevo o corpo, o Código


de 1983 prefere falar da entrega total e mutua de duas pessoas
em vista da alianga matrimonial. A nova perspectiva é mais
personalista.

2. Sao propriedades essenciais do matrimonio a unidade


e a indissolubilidade, ambas ditadas pelo Direito natural e
corroboradas pela dignidade do sacramento (cf. can. 1056).

3. O conceito de matrimonio consumado no antigo Có


digo punha em relevo preponderante o aspecto físico do ato
conjugal, como se depreende do canon 1015 do Código de 1917:

— 372 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 21

"O matrimonio contraído e consumado ocorre se entre os conjugas


houve o ato conjugal, ao qual é orientado por sua própria fndole o contrato
matrimonial e pelo qual os conjugas se tornam uma só carne".

Observe-se agora o teor do canon 1061 do novo Código:

"O matrimonio é contraído e consumado desde que os cónjuges


tenham realizado entre si humano modo o ato conjugal, que é por si apto
á geracSo da prole, para o qual está orientado por sua própria índole o
matrimonio e mediante o qual os cónjuges se tornam uma só carne".

O novo canon, como se vé, ultrapassa os limites da orde,m


física usando a expressáo humano modo (de modo humano),
expressáo que indui o fato conjugal que deve estar na base das
relagóes maritais.

4. O matrimonio assim entendido há de merecer, da parte


dos pastores de almas e da comunidade crista, especial assistén-
cia, a fim de que o estado conjugal conserve o seu espirito
cristáo e progrida na procura da perfeicáo. Tal assisténcia
indui preparacáo para o casamento, catequese, pregacáo,
acompanhamento dos cónjuges no desenrolar da sua vida
matrimonial. Cf. canon 1063.

2. Os impedimentos matrimoniáis

A nova íegislagáo, neste particular, é mais simples do que


a anterior.

O antigo Código distinguía impedimentos impedientes e


impedimentos dirimentes. Os primeiros tornavam o matrimonio
ilícito, nao, porém, inválido; os outros o tornavam ilícito e invá
lido; cf. canon 1036 do Código de 1917. Ora o novo Código só
conhece impedimentos dirimentes, isto é, que tornam o
matrimonio inválido; cf. canon 1073. Tais sao:

1) Falta do mínimo de idade para o casamento: 16 anos


completos para os homens, 14 anos completos para as mulheres.
É facultado a cada Conferencia Episcopal elevar este mínimo
dentro dos limites do territorio respectivo. Cf. canon 1083,
§§ 1» e 2>

2) É impedimento dirimente a impotencia de realizar o


coito conjugal, impotencia anterior ao casamento e perpetua,
tanto da parte do homem como da parte da mulher. — Por

— 373 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

«impotencia», no caso, entende-se a impossibilidade de realizar


o ato conjugal segundo as leis da natureza; nao se requer,
porém, que o homem possa emitir verdadeiro semen elaborado
pelos testículos.

A esterilidade, que difere da impotencia, nao torna nulo o


casamento a nao ser que o nubente estéril oculte á outra parte
a sua esterilidade a fim de obter o consentimento matrimonial.
O casamento contraído em má fé pelo cónjuge estéril é invá
lido; cf. canon 1084; 1098.

3) Se alguém está ligado pelo vínculo de anterior matri


monio sacramental válido, ainda que nao consumado, qual-
quer tentativa de novo matrimonio sacramental será sempre
inválida. Cf. canon 1085 § 1.

Note-se, porém, que está de pé o privilegio «petrino», a


saber: o Sumo Pontífice pode dissolver o matrimonio sacra
mental nao consumado desde que exista justa causa para
tanto e ao menos urna das duas partes o peca. Cf. canon 1142.

4) É inválido o matrimonio contraído entre duas pessoas


das quais urna foi batizada na Igreja Católica (ou recebida na
Igreja Católica depois de batizada fora) e nao apostatou for
malmente da mesma Igreja, e a outra nao é batizada (judeu,
maometano, fetichista ou indiferente).

A dispensa de tal impedimento pode ser concedida pelo


Ordinario do lugar1, desde que haja razoável e justa causa e
se preencham as seguintes condigóes:

a) a parte católica deve declarar estar disposta a fugir


dos perigos de apostatar da fé católica e há de prometer em-
penhar-se com todos os seus esforcos para que toda a prole
seja batizada e educada na Igreja Católica;

b) a parte nao católica seja, em tempo oportuno, noti


ficada de tal declaracáo e tal promessa;

c) as duas partes sejam elucidadas a respeito das fina


lidades e propriedades essenciais do matrimonio, que nao lhes
será lícito excluir. Cf. cánones 1086. 1125. 1126.

i Ordinario do lugar ó o Blspo diocesano ou aquele que Ihe faz as


vezes.

— 374 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 23

5) É também inválido o matrimonio dos clérigos que


tenham recebido as ordens sagradas de diácono, presbítero ou
de bispo; cf. can. 1087. Quanto aos diáconos permanentes, po-
dem casar-se antes da ordenacáo diaconal; se, porém, recebe-
rem a ordenacáo na condigáo de solteiros, devem emitir voto
público de celibato perpetuo. Cf. canon 1037.

A Igreja nunca concede a um Bispo licenea para casar-se,


mesmo que abandone o ministerio pastoral e se reduza ao
estado laical.

6) Também é inválido o matrimonio de quem tenha


proferido voto público e perpetuo de castidade em alguma
Ordem, Congregacáo Religiosa ou outra instituigáo religiosa.
Cf. canon 1088.

7) Quem seqüestra ou detém cativa uma mulher no intuito


de se casar com ela, nao pode contrair matrimonio válido com
a mesma a nao ser que tal mulher, emancipada do seu raptor
e posta em lugar tranquilo e livre, espontáneamente opte por
tal matrimonio. Cf. canon 1089.

8) Quem, no intuito de casar-se com determinada pes-


soa, mata o cónjuge desta ou o seu próprio cónjuge, invalida-
mente tentará tal casamento. Cf. canon 1090, § 1.

Também é inválido o casamento de pessoas que, para


se unir em matrimonio, provocam por meios físicos ou moráis
a morte do respectivo cónjuge; cf. canon 1090, § 2.

Tal é o «impedimento de crime» (impedimentum criminis),


que no Código de 1917 ocorria em termos mais complexos.

9) Segue-se o impedimento de consanguinidad», que


exige previa explanagáo.

Consangüinidadc é o vinculo que une pessoas procedentes


do mesmo tronco por via de geracáo ou, em outros termos, é
a relagáo biológica existente entre pessoas ás quais foi trans
mitido (total ou parcialmente) o mesmo patrimonio genético.

Para se avaliar a consangüinidade, é preciso distinguir


tronco, linha e graus.

Tronco é a pessoa da qual procedem todos os consan


guíneos.

— 375 —
24 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS* 270/1983

Linha é a serie de pessoas unidas por consangüinidade.


Pode ser reta ou vertical e oblíqua ou colateral. É reta, se as
pessoas da mesma serie descendem urna da outra por via de
geragáo. É oblíqua ou colateral, se as pessoas descendem do
mesmo tronco, nao, porém, urna da outra; a linha colateral é
dita igual, quando as pessoas de que se trata, distam igual
mente do tronco comum; é desigual, em caso contrario.

Grau é a distancia que medeia entre duas pessoas da


mesma linha ou o número de geragóes que se interpóem entre
elas.

Tratando-se de linha reta, contam-se as geragóes ou as


pessoas vinculadas entre si, excetuando apenas o tronco ou a
pessoa donde as demais procedem; assim pai e filho vém a ser
consanguíneos em primeiro grau; avó e neto, em segundo
grau; bisavó e bisneto, em terceiro grau.

Quanto ao parentesco em linha oblíqua, contam-se os


graus somando as distancias de cada um dos dois consanguí
neos em relagáo ao tronco comum. Em conseqüéncia, os irmáos
vém a ser consanguíneos em segundo grau, pois cada um deles
em relagáo a seu pai dista de um grau (1 + 1 = 2); tío e
sobrinho vém a ser consanguíneos em terceiro grau, pois o tío
dista de um grau, e o sobrinho dista de dois graus do tronco
comum, que é o pai do tio e o avó do sobrinho (1 + 2 = 3);
dois primos irmáos vém a ser parentes ou consanguíneos em
quarto grau, pois cada um deles, frente ao avó, dista de dois
graus (2 + 2 = 4).

Eis o que o novo Código propóe a respeito do impedi


mento de consangüinidade:

Na linha reta de consangüinidade, o matrimonio é invá


lido entre ascendentes e descendentes, sejam legítimos, sejam
naturais. Isto quer dizer que nunca se poderáo casar valida
mente: pai e filha, avó e neto, bisavó e bisneta... CL canon
1091, § 1. A Igreja nunca dará dispensa de tal impedimento
(cf. canon 1070, § 3), pois está fundado no próprio Direito
natural.

A consangüinidade em linha lateral ou oblíqua também é


impedimento até o quarto grau inclusive, isto é, até o paren
tesco entre primos irmáos. A Igreja nao admite o casamento

— 376 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 25

entre irmáo e irmá (mesmo que só tenham ura genitor comum),


pois se trata, em tal caso, de impedimento provavelmente deri
vado do Direito natural. Quanto á consangüinidade entre tios
e sobrinhos, requerem-se motivos muito imperiosos para que
seja dispensada. Quanto mais remoto é o grau de parentesco,
tanto menos difícilmente se obtém dispensa.

A consangüinidade ilegítima já basta para dar lugar ao


impedimento. Cf. canon 1091, §§ 1» e 2».

Note-se que o novo Código, para o cómputo dos graus de


consangüinidade em linha lateral, adotou o sistema do Direito
Romano, mais simples do que o do Direito Germánico, adotado
pelo Código de 1917: «Em linha oblíqua, tantos sao os graus
quantas sao as pessoas existentes em ambas as linhas, sem se
contar o tronco» (canon 108, § 3»).

10) Considere-se agora a afínidade.

A afínidade é o vinculo legal existente entre um dos cón-


Juges e os consanguíneos do outro. A afínidade é avaliada de
tal sorte que os consanguíneos do marido sao considerados, na
mesma linha e no mesmo grau, afins da esposa, e vice-versa.
A afinidade supóe matrimonio válido, mesmo que nao consu
mado. Cf. canon 109, §§ 1» e 2».

Ora é impedimento dirimente do matrimonio a afinidade


em linha reta, qualquer que seja o seu grau. Isto quer dizer
que o viúvo nao se pode casar com a máe de sua defunta esposa
(genro com sogra), nem a ñora viúva com o respectivo sogro,
nem o padrasto com a enteada. Cf. canon 1092. A Igreja
difícilmente concede dispensa em tais casos.

O novo Código aboliu o impedimento por afinidade em


linha colateral, impedimento que o Código de 1917 mantinha
até o segundo grau; cf. Código de 1917, canon 1077, § 1» Alias,
a dispensa do impedimento em linha colateral se obtinha sem
grande dificuldade.

11) O impedimento de honestidade pública é o que re


sulta de urna situagáo análoga á afinidade, situagáo, porém,
ocasionada nao por auténtico casamento, mas por matrimonio
inválido ou concubinato público. Este impedimento é menos
extenso do que os dois precedentes; só torna inválido o casa
mento entre o varáo e as consanguíneas em linha reta, até o

— 377 —
26 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

primeiro grau, daquela que foi sua companheira e vice-versa.


Por conseguinte, o concubino nao se poderá casar, sem dispensa,
com a filha de sua concubina e vice-versa. Cf. canon 1093.

Os óbices de consangüinidade, afinidade e pública honesti-


dade sao impostes pelo Direito Canónico para deter, de certo
modo, as desordena na sociedade; visam a proteger a decencia
natural que deve reinar entre pessoas da mesma familia. Dai
o seu notável alcance social.

12) O impedimento de parentesco legal é o que se deriva


da adocáo: é dirimente em linha reta e até o segundo grau da
linha colateral; cf. canon 1094. Donde se segué que pai e filha
por adogáo nao se podem casar entre si; nem tía com sobrinho
por adocáo, a menos que obtenham a devida dispensa.

O novo Código extinguiu o impedimento derivado de paren


tesco espiritual, existente no canon 1079 do Código de 1917.
Tal era o vinculo resultante do sacramento do Batismo; tornava
nido o matrimonio da pessoa batizada com aquela que a batizara
ou com um dos respectivos padrinhos (seja lícito recordar que
o Batismo pode ser administrado nao somente por um clérigo,
mas também, em caso de urgencia, por um leigo, homem ou
mulher).

Os impedimentos ácima, pelo fato de tornarem nulo o


casamento, sao comumente alegados nos processos matrimo
niáis. O papel dos juizes eclesiásticos consiste em apenas
averiguar, na base de depoimentos oráis e escritos, se, em tal
caso dado, houve ou nao algum dos óbices dirimentes, nao
previamente dispensado; caso se possa realmente provar a
existencia do impedimento, a Igreja declara nunca ter havido
casamento entre as duas pessoas interessadas, as quais por con
seguinte ficam habilitadas a receber validamente o sacramento
do matrimonio.

3 O consenso matrimonial

O novo Código dá grande importancia ás características


que deve ter o consenso matrimonial, mostrando-se mais exi
gente do que o anterior no tocante aos requisitos da vontade
necessários para se contrair matrimonio válido.

— 378 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 27

Conseqüentemente, o capitulo sobre o consenso matri


monial abre-se com normas totalmente novas que levam em
conta a incapacidade psíquica de assumir a vida matrimonial,
incapacidade esta que a ciencia psicológica tem posto em relevo
mediante apurado estudo das profundidades do ser humano.

"Canon 1095. Sao incapazes de contralr matrimonio:

1) aqueles que nSo possuem suficiente uso de razSo;

2) aqueles aos quais falte gravemente a capacldade de avallar os


direitos e deveres matrimoniáis essenclais, que devem ser mutuamente con
cedidos e recebldos;

3) aqueles que, por causas de natureza psíquica, nao podem


assumir as obrigacSes essenclais do matrimonio".

Como se vé, os dois primeiros números do canon versam


sobre o aspecto subjetivo do consenso, supondo-o afetado por
urna alteragáo profunda: o sujeito nao é apto a compreender
os direitos e deveres inerentes á vida conjugal. O terceiro
número já leva em conta a incapacidade objetiva de observar
tais direitos e deveres por causa de imaturidade psíquica ou de
algum estado patológico latente na esfera afetivo-volitiva.
Entre tais casos, enquadrar-se-áo muitas situagóes de homos-
sexualismo, que impede a realizagáo da vida conjugal.

Entre as nogóes básicas que os nubentes devem ter em


vista guando contraem matrimonio, está a de que o casamento
é permanente consorcio entre o homem e a mulher, destinado á
procriagáo mediante cooperagáo sexual. Cf. canon 1096.

A respeito do erro no consenso, o Código distingue sabia


mente entre a pessoa e determinada qualidade da pessoa. Con
seqüentemente, «o erro quanto á pessoa torna o casamento
inválido» (canon 1097, § 1»); o que quer dizer: se alguém ten-
ciona casar-se com a pessoa A e, na verdade, é a pessoa B que
contrai as nupcias, o matrimonio é inválido. Se, porém, alguém
deseja casar-se com A e julga que é pessoa paciente e branda,
mas depois verifica que A nao é tal, o erro nao invalida o casa
mento, a menos que a parte contraente tenha intencionado
casar-se com a pessoa A direta e principalmente por julgá-la
portadora de determinados predicados que ela de fato nao tem.
Cf. canon 1097, § 2'

— 379 —
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Segue-se um canon inédito no novo Código:

"CSnon 1098. Contra! matrimonio Inválidamente quem a Isto seja Indu-


zldo por engaño, ocasionado para obter o consenso, a respelto de alguma
qualldade da outra parte que, por sua próprla índole, possa perturbar
gravemente o consorcio da vida conjugal".

Este canon tem em vista os casos em que alguém, dese-


jando nao perder a oportunidade de se casar, oculta ao futuro
consorte um de seus tragos importantes para a vida matri
monial: doenga incurável ou contagiosa, esterilidade, graves
antecedentes policiais... — Está claro que o matrimonio assim
contraído é inválido.

A propósito do medo ou do constrangimento que possam


acompanhar o consenso, declara o canon 1103 que é inválido o
casamento contraído á forga ou por medo grave, incutido por
causa externa, medo do qual a pessoa só se possa livrar caso
aceite constrangidamente o casamento. Este novo canon
suprime a cláusula vigente no canon 1087 do Código de 1917:
«medo injustamente incutido». Basta, para invalidar, que um
grave medo tenha constrangido a pessoa a contrair matrimonio.

4. Forma cíe celebrajao

O novo Código diminuiu a carga de elementos extrínsecos


exigidos para a validade do consenso.

Para ser válido, o matrimonio há de ser contraído em pre-


senga do Ordinario do lugar ou diante do pároco ou ainda diante
de algum sacerdote ou diácono delegado por aquele ou por este,
assim como em presenga de duas testemunhas; admitem-se,
porém, excegóes, das quais tratam os cánones adequados.
Cf. canon 1108, § 1*.

Póe-se agora um elemento novo: ao Ordinario do lugar e ao


pároco é lícito conferir a sacerdotes e diáconos urna delegagáo
geral para que assistam a qualquer casamento dentro dos
territorios de sua jurisdigáo; cf. canon 1111. — Segundo o
Código de 1917, tal delegagáo devia ser concedida caso por caso.

Mais: onde faltem sacerdotes e diáconos, o Bispo diocesano,


tendo parecer favorável da sua Conferencia de Bispos e a
autorizagáo da Santa Sé, pode conferir a leigos a delegagáo
para assistirem a casamentes. — Cf. canon 1112.

— 380 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 29

Se, porém, os noivos nao podem, sem grave incómodo, obter


a presenca de um assistente da Igreja (Bispo, pároco ou
delegado de um ou outro), estáo habilitados a contrair matrimó.
nio licito e válido apenas diante de duas testemunhas: 1) em
perigo de morte; 2) fora do perigo de morte, desde que se
preveja que tal situacáo haja de perdurar por um mes ao
menos. Cf. canon 1116.

Tendo concedido táo ampias faculdades, os legisladores do


novo Código nao quiseram acolher a sugestáo de algumas
Conferencias Episcopais no sentido de reconhecer simplesmente
a celebracáo do casamento civil.

Um canon novo, de grande significado, é o den' 1117:


isenta da forma canónica de celebrar o matrimonio os católicos
que tenham apostatado da fé católica de maneira explícita ou
formal. Tal caso nao é raro hoje em dia; a Igreja nao quer
obrigar tais pessoas a receber um sacramento por elas expressa-
mente desvalorizado. Por conseguinte, se essas pessoas con-
traem matrimonio civil de maneira seria e consciente, nao sao
consideradas pela Igreja como concubinárias.

O lugar de celebraeáo das nupcias há de ser, a criterio dos


interessados, a paróquia onde .um dos noivos tem domicilio ou
quase domiciliol ou, ao menos, residencia por um mes. Isto,
porém, nao impede que, com a licenca do Ordinario ou do pároco
próprio, celebrem seu casamento em outro lugar.

5. Casamentas mistos

O novo Código abrandou, de certo modo, o rigor do anterior


referente á celebracáo dos casamentes mistos.

1. Assim, por exemplo, foi supresso o impedimento dito


«de mista religiáo» (canon 1060-1064) ou o impedimento de
matrimonio entre urna parte batizada católica e outra parte

1 No novo Dirello Canónico, domicilio é o lugar onde alguém mora


com a Intenc&o de permanecer al para sempre ou também o lugar onde
alguém habita há cinco anos, mesmo que nao tenha a intencáo de ficar lá.

Quase-domlcfllo é o lugar onde alguém mora com a intencSo de


permanecer al tres meses ou também o lugar em que habita há mais de
tres meses. Cf. canon 102.

— 381 —
30 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

balizada nao católica. Foi substituido pela proibigáo de se ce-


lebrarem tais casamentos sem a explícita permissáo da autori-
dade competente. — O motivo de tal abrandamento é o espirito
de aproximacüo vigente1 entre católicos e protestantes, em
virtude do qual o Código chama os cristáos nao católicos
«pessoas que nao tém plena comunháo com a Igreja Católica»
(canon 1124).

As condigóes para que a autoridade eclesiástica católica


conceda aos seus fiéis autorizagáo para tal tipo de casamento,
sao as seguintes:

a) a parte católica deve declarar estar disposta a fugir


do perigo de apostatar da fé católica e prometerá empenhar-se
com todos os seus esforgos para que toda a prole seja batizada
e educada na Igreja Católica;

b) a parte nao católica seja, em tempo oportuno, notifi


cada de tal declaragáo e tal promessa;

c) as duas partes sejam esclarecidas a respeito das finali


dades e propriedades essencíais do matrimonio, que nao lhes
será licito excluir. Cf. canon 1125, ns. 1, 2 e 3.

2. Nos casos de casamento entre urna parte católica e


outra nao católica de rito oriental, a forma canónica do
matrimonio é prescrita para a liceidade do mesmo; para a
validade, requér-se a intervengáo do ministro sagrado.
Cf. canon 1127, § 1*.

Se nos casamentos entre urna parte católica e outra parte


batizada nao católica surgirem graves dificuldades que impegam
a observancia da forma canónica, o Ordinario da parte católica
poderá dispei.sar da forma, após consultar o Ordinario do lugar
no qual o casamento deva ser celebrado, contanto que o casa
mento seja realizado de maneira pública; cf. canon 1127, § 2\
Tal canon representa notável novidade em relagáo ao Código
de 1917, que nao conhecia a possibilidade de tal dispensa. Justi-
fica-se a medida do novo Código pelo fato de que os ministros
do sacramento do matrimonio sao os próprios nubentes; exer-
ceráo, no caso, sua fungáo sem a presenga de ,um delegado da
Igreja Católica.

lAproximacSo ou ecumenlsmo nao significa relativismo ou Irenlsmo,


mas o desejo de superar dlssidéncias que o passado acarretou entre os
discípulos de Cristo.

— 382 —
CASAMENTÓ NO NOVO CÓDIGO Si

A Igreja Católica proibe que, antes ou depois da celebragáo


canónica de um casamento de parte católica com parte batizada
nao católica, se realize outro rito (protestante, geralmente) de
casamento. Também nao aceita que numa única celebragáo
religiosa o assistente católico e o ministro nao católico exercam
suas fungóes pedindo e abengoando o consenso dos nubentes;
cf. canon 1127, §3'. — A razáo destas proibigoes é o desejo de
evitar relativismo ou evitar a insinuagáo de que o sacramento
do matrimonio católico nao é suficiente ou nao é o casamento.

As disposicóes do canon 1127 sao válidas também para os


casamentes de parte católica com parte nao crista realizados
com a devida dispensa da autoridade eclesiástica; cf. canon 1129.

6. Os genitores e a educagao dos filhos

No tocante aos direitos e deveres dos genitores referentes


á educagáo dos filhos, o canon 1136 dispóe:

"Aos genitores compete o gravfsslmo dever e o direlto primarlo de


prover, segundo suas torgas, á educacáo dos filhos, seja física, seja social,
seja cultural, seja moral, seja religiosa".

A educagáo da prole é, antes do mais, um dever dos geni


tores, como lembra o Concilio do Vaticano II:
"Por ter dado a vida aos filhos, toca aos genitores o gravlsslmo dever
de educar os filhos; por Isto sao os primeiros e principáis educadores dos
mesmos. Essa tarefa educacional é de tanta importancia que, onde quer
que falhe, difícilmente poderá ser suprida" ("Gravisslmum Educatlonls"
n9 3).

Dar educagáo é também um direito dos genitores, anterior


ao direito paralelo da sociedade civil, pois a sociedade doméstica
é naturalmente anterior á sociedade civil. Diz o Papa Pió XI
na encíclica «Casti eonnubii»:
"é notorio que, por dlsposicao natural e divina, o dever e o direito á
educacSo da prole tocam, antes do mais, aqueles que pela gerac&o
Iniclaram a obra da natureza e aos quals é vedado expor á ruina a obra
iniciada, delxando-a Inacabada" ("Acta Apostolicae Sedis" 22, 1930, 545).

O novo Código explícita o direito, dos genitores, de escolher


livremente os meios de educar e de se beneficiarem, para tanto,
do auxilio da sociedade civil:
"Canon 793. Os genitores e aqueles que Ihes fazem as vezes, tém o
dever e o direito de educar a prole. Os genitores católicos tém o dever e o
direito de escolher os melos e as lnstituic.8es mediante os quals, segundo
as circunstancias locáis, mais convenientemente possam prover a educagSo
católica".

— 383 —
32 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

As escolas sao o principal apoio com gue os genitores


contam para realizar sua tarefa de educadores. A propósito, o
Código de 1983 encerra tres cañones de índole totalmente nova:

"Canon 796, § 2? é necessárlo que os genitores cooperem estrila-


mente com os mestres das escolas ás quals conflam a educacáo de seus
fllhos. Os mestres, no desempenho da sua missfio, colaborem Intimamente
com os genitores; oucam-nos de boa vontade; favorecam e tenham em
grande estima as assoclacOes e assemblélas de país de alunos.

Cdnon 797, é necessário que os genitores na escolha da escola


gozem de verdadelra liberdade. Por isto os fiéis sejam solícitos de que a
sociedade civil reconheca tal liberdade aos genitores e, salva a justlga
distributiva, ajudem-nos com subsidios.

Canon 798. Os genitores confiem os fllhos aquetas escolas que


ministren» a educacáo católica; se nSo o puderem fazer, tém a obrigacio
de providenciar a educacáo católica fora da escola".

Como se vé, o Código enaltece o papel das escolas católicas


e deseja fomenta-las ao máximo — o gue redunda em estimulo
para muitos educadores católicos gue julgam estar-se dedicando
a trabalho inútil ou pouco útil em educandários católicos.

No tocante a educagáo religiosa e á iniciagáo sacramenta


rla, reza o Código:

"Canon 774, § 29 Antes dos demais educadores, os pais tém a obriga-


cáo de formar os filhos, com palavras e exemplos, na fé e na prática da
vida crista; a mesma obrigacSo toca aos padrlnhos e aqueles que fazem
as vezes dos genitores".

Em consegüéncia, diz o Código gue os genitores devem


cuidar de gue seus filhos sejam batizados dentro das primeiras
semanas de vida (canon 867, § 1«). Aos párocos toca instruir
convenientemente os genitores sobre o significado do Batismo
e as obrigacóes gue deste decorrem (canon 851).

Aos pais e agüeles gue lhes fazem as vezes como também


aos párocos, compete cuidar de gue as criangas, tendo chegado
ao uso da razáo, sejam guante antes preparadas para a primeira
Eucaristía, Eucaristía gue elas receberáo depois de haver feito
a sua confissáo sacramental. Cf. canon 914, gue assim dissipa
as dúvidas sobre a conveniencia ou nao de levar as enancas a
confissáo sacramental antes da Primeira Comunháo.

— 384 —
CASAMENTO NO NOVO CÓDIGO 33

No tocante á Crisma, os pais tratarlo de que os filhos a


recebam depois de devidamente preparados e em momento
oportuno. Cf. canon 890.

Como se pode perceber, o novo Código, ao mesmo tempo


que mantém integralmente a doutrina da fé católica, utiliza
dados da filosofía e da psicología contemporáneas que contri-
buem para compreender melhor a pessoa humana e legislar de
maneira mais consentánea com a realidade da mesma. Era
precisamente em vista das novas circunstancias em que o
homem moderno vive e se manifesta que o Papa Joáo XXm
em 1959 apregoava a revisáo do Direito Canónico. A obra,
amadurecida no decorrer de vinte e quatro anos, corresponde
as intengóes de quem a idealizou e faz eco fiel á visáo profunda
e ampia que o Concilio do Vaticano n esbocou a respeito da
Igreja e do plano salvífico de Deus.

(Continua?§o da pág. 88)

urna seguranga, por vezes, simplória. Espontáneamente pro-


póe-se á mente do leitor de tais obras a impressáo de que a
megalomanía insconsciente movia os seus autores. Tenha-se
em vista, de modo particular, o opúsculo «A verdadeira espi
ritualidades de Norberto Keppe, onde a historia da Filosofía
é percorrida com as suas sucessivas escolas e um qualificativo
geralmente de censura para cada urna. — De resto, quem dis-
corda das teses da Trilogía, é tido, de público, como endemo
niado!. ..

3. Conclusao

1. Em poucas palavras, tem-se a impressáo de que, da


parte dos mentores da Trilogia Analítica, há certamente a boa
intengáo de rejeitar o materialismo e o pansexualismo da
escola freudiana. A Psicanálise Integral se devem reconhecer
dois grandes méritos:

— o de tentar a conciliacáo entre psicanálise e fé reli


giosa — coisa que Freud rejeitava de modo a caracterizar a
psicanálise ortodoxa;

(Continua na pág. 42)

— 385 —
Será verdade?

Amiláceo do Casamento
da Princesa Carolina de Monaco?

£m ahítese: O caso matrimonial da Princesa Carolina de Monaco tem


suscitado infundada perplexldade. Na verdade, a Igreja nSo dlssolve casa-
mentos válidos e consumados, mas apenas declara nulos os que tenham
sido nulos em suas orlgens. Quanto á Princesa Carolina, sabe-se que a
Prlncesa-mSe Grace Patricia, em comeco de 1982 entrou na Santa Sé com
um pedido de declaracfio de nulidade do matrimonio de aua lilha casada
com o empresario Phllippe Junot. Em conssqüéncla, como prescreve o
Dlrelto CanOnlco, foi constituida urna comlssáo especial para avallar as
razfies aduzldas (a Santa Sé reserva a si os casos de reís, principes e
seus fllhos, para assegurar toda objetivldade no Julgamento). Todavía a
Princesa Carolina, solicitada em malo de 1982, nfio constituiu advogado
para propor e defender a sua causa. Por isto o processo nem sequer
comecou e, como crdem os observadores, Jamáis comecará, pols realmente
nao há fundamento, no caso, para declarar nulo o matrimonio em foco.

Comentario: Em novembro de 1982 a imprensa noticiou


que a Santa Sé estava para anular o casamento da Princesa
Carolina de Monaco1. Esta perspectiva abalou nao poucos
leitores, aos quais afloraram interrogacóes sobre os porqués de
tal «anulagáo». Tratar-se-ia de favoritismo da Igreja em rela-
gáo aos ricos e poderosos? Estes estariam habilitados a tudo
obter, da parte da Santa Sé, em virtude da sua classe social
privilegiada?

Em vista da perplexidade assim gerada, a redagáo de


PR dirigiu-se ao Arcebispado de Monaco, pedindo-lhe informa-
góes sobre o caso. Sao estas informacóes, colhidas na fonte
mais auténtica, que PR tem agora o prazer de publicar, a fim
de esclarecer dúvidas e dissipar mal-entendidos sobre táo deli
cado assunto.

i Monaco é um territorio Independente encravado no SE da Franca


e constituido por um promontorio de 63 m de altura e pequeñas colinas.
Mede apenas 3 km de comprlmento por 500 m de largura. Tem a superficie
de 1,89 Km2. A capital ó a cldade de MOnaco, ao lado da qual se acha
a de Monte Cario. Em 1976 a populacBo era de 25.000 habitantes.
Desde 1949 o territorio (Principado) de MOnaco é governado pelo Principe
Ralnero III. Um tratado asslnado em 1918 com a Franca concedeu a este
país o dlrelto de aprovar a sucessSo do soberano monegasco.

— 386 —
CASAMENTO DE CAROLINA DE MONACO 35

Ñas páginas subseguientes, será preliminarmente exposta


a doutrina da Igreja sobre a indissolubilidade do matrimonio.
A seguir, seráo propostos os fatos referentes ao caso em foco.
Por último tres documentos recebidos do Arcebispado de
Monaco seráo divulgados em traducáo portuguesa.

1. Matrimonio: dissolúvel ou nao?

A Igreja afirma, em fidelidade a Cristo (cf. Me 10,lls;


Le 16,18; ICor 7,10s; Mt 5,31s; 19,9), a indissolubilidade do
matrimonio legalmente contraído e posteriormente consumado
pelo ato conjugal. É o que se lé no Código de Direito Canónico
de 1917, canon 1013, § 2», bem como no Código promulgado
em 1983, canon 1056.

Por conseguinte, á Igreja nao é licito anular um matri


monio válido e consumado; em instancia alguma ela o faz.
Precisamente por causa disto, a Igreja perdeu o reino da In
glaterra no sáculo XVI. Com efeito, o rei Henrique VIII em
1527 oomegou a pleitear a declaragáo de nulidade do seu ma
trimonio com Catarina de Aragáo, que na verdade fora válido;
o monarca se apaixonara pela dama da corte Ana de Bolena,
com a qual desejava casar-se. Após conversagóes, das quais
participaran! eclesiásticos e leigos na Inglaterra e que muito
contribuiram para elucidar a situacáo matrimonial de Henri
que, o Papa Clemente VIH em 1529 houve por bem reservar
o julgamento da causa aos tribunais da Santa Sé a fim de
evitar influencias da corte sobre os tribunais eclesiásticos da
Inglaterra. Finalmente, apesar de urna serie de ameagas de
cisma por parte do rei Henrique Vm, o Papa Clámente VIII
em margo de 1534 declarou válido e indissolúvel o matrimonio
com Catarina. O rei, que já se separara desta para unir-se a
Ana de Bolena, respondeu á Santa Sé com o Ato de Supre
macía, votado pelo Parlamento em 3 de novembro de 1534,
que declarava o rei supremo e único chefe da Igreja na Ingla
terra; a este eram atribuidos em toda a Inglaterra a autori-
dade e o poder espirituais que até entáo o Papa vinha exer-
cendo. Quem recusasse aceitar com juramento o Ato de Su
premacía e reconhecer o novo matrimonio do rei, era consi
derado réu de alta traicáo e punido com morte cruel.

Estes fatos sao eloqüente testemunho da fidelidade da


Igreja k doutrina de Cristo: nem as ameacas de um rei nem
a dolorosa perspectiva de perder a jurisdigáo sobre o territorio

— 387 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

da Inglaterra puderam levar o Papa a intimidar-se e a derro-


gar ao principio da indissolubilidade do sacramento do matri
monio.

Há casos, porém, em que o casamento, aparentemente vá


lido, é nulo desde as suas origens ou nunca existiu. Isto ocorre

1) quando, por ocasiáo do contrato matrimonial, existe


algum impedimento dirimente ou impedimento que o torna
nulo, sem que os noivos tenham obtido a dispensa de tal impe
dimento (veja-se a lista dos impedimentos matrimoniáis as
pp. 373-378 deste fascículo);

2) quando nao é observada a forma canónica ou o ritual


prescrito para a celebracáo válida do casamento (a menos que
a autoridade eclesiástica tenha dispensado os noivos da forma
canónica);

3) quando, da parte dos noivos (ou de um dos noivos),


falta o verdadeiro desejo de contrair matrimonio, tornando-se
entáo o cerimonial um rito simulado; tal simulacáo pode ser
provocada por coagáo física ou moral sobre os nubentes (ou
um dos nubentes);

4) quando os nubentes (ou um dos nubentes), ao ca-


sar-se, exclui urna das características essenciais do matrimo
nio sacramental, como sao a unidade, a indissolubilidade, a
prole;

5) quando o matrimonio foi validamente contraído, mas


nao consumado pela plena uniáo conjugal (sexual).

Por conseguinte, se, após o casamento, um dos cónjuges


julga ter sido nulo o seu casamento por um dos motivos atrás
alegados, toca-lhe o direito de pedir á Igreja a revisáo do
caso e a eventual dedaragao da nulidade existente. O processo
respectivo corre geralmente na diocese ou regiáo eclesiástica
onde o matrimonio foi contraído ou, ao menos, onde um dos
cónjuges tem domicilio; cf, canon 1673 do Código de 1983.
Todavía, quando se trata de matrimonio de Chefes de Estado
(reis, príncipes ou presidentes da República) e de seus ime-
diatos sucessores, a Santa Sé reserva diretamente a si, ou
seja, a Sagrada Rota Romana, segundo o Código de 1917,
canon 1557, § 2, o julgamento das respectivas causas a fim
de evitar interferencias indébitas sobre os tribunais eclesiás-

QQQ
CASAMENTO BE CAROLINA DE M6NACO 37

ticos regionais. Está claro que esta reserva nao significa apli-
cacáo de criterios diferentes Sos do Direito Comum nem con-
cessáo de privilegios, mas visa apenas a garantir a objetivi-
dade e retidáo do julgamento.

É sobre este paño de fundo que se sitúa o caso da Prin


cesa Carolina de Monaco, que pediu á Santa Sé a declaragáo
de nulidade (nao a anulagáo) do seu casamento com Philippe
Junot.

2. Os fatos em pauta

Em 1978 a Princesa Carolina, filha do Príncipe Rainero III


de Monaco e de sua esposa Grace, houve por bem casar-se com
o corretor de imóveis Philippe Junot. Assim procedendo, a
Princesa deixava de levar em conta advertencias dos país e
amigos, que tentaram dissuadi-la.

O casamento, celebrado com toda a pompa, durou dois


anos, um mes e doze dias, após o que foi dissolvido no foro
civil (dezembro de 1980). A jovem Princesa, com os seus
vinte e poucos anos de idade, casara^se com um homem qua-
dragenário, que nao pertencia 'á aristocracia. A uniáo, frágil
como era, foi abalada, entre outras coisas, pelo fato de que
Carolina, depois de casada, conheceu pretendentes que mais
a atraiam; assim o argentino campeáo de tenis Guillenno Vilas
e, principalmente, Robertino Rosselini, filho da artista Ingrid
Bergman e do regente Roberto Rosselini. Em 1981 propa-
gou-se com grande alarde na imprensa a noticia de que a
Princesa se casada com Robertino Rosselini depois de haver
obtido a declaragáo de nulidade do casamento anterior por
parte da Santa Sé; para tanto, Carolina alegava ter sido coa
gida á uniáo matrimonial com Philippe Junot. Dizia, com
efeito, que, sendo Princesa, nao podia viver maritalmente com
um homem que nao fosse seu esposo; por isto terá assinado
o compromisso matrimonial, sentindo-se, porém, obrigada a
tanto pelas circunstancias. Daí terá resultado, segundo Caro
lina, a nulidade do seu casamento. — É de notar, alias, que
a familia Grimaldi, á qual pertencem os Príncipes de Monaco,
é de longa tradicáo católica.

— 389 —
38 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

A Princesa-máe Grace Patricia era decididamente favo-


rável á declaracáo de nulidade por parte da Igreja. Em con-
seqüéncia, no comeco de 1982 enviou a Roma, por intermedio
do Arcebispo de Monaco, o pedido de que a Santa Sé cons-
tituisse urna comissáo especial para examinar o caso matri
monial de sua filha Carolina.

Aos 24 de abril de 1982, o Cardeal Agustino Casaroli,


Secretario de Estado, comunicou ao Tribunal da Sagrada Rota
Romana a aquiescencia do Sumo Pontífice ao pedido da Prin
cesa Grace: Joáo Paulo II concordava com a nomeacáo de
urna comissáo própria para avaliar o pedido de declaragáo de
nulidade (o que nao quer dizer que formulava a própria decla
racáo de nulidade).

Urna vez constituida a comissáo, aos 13 de maio de 1982


a Sagrada Rota solicitou á Princesa Carolina designasse um
advogado para propor e defender a sua causa.

Acontece, porém, que a interessada nao respondeu a essa


solicitagáo; em conseqüéncia, a comissáo nomeada nao pode
dar passo algum para iniciar o processo. Nem era de crer,
:omo dizem os observadores, que a Princesa Carolina preen-
chesse a condigáo de constituir um advogado junto á Sagrada
Rota, pois o seu caso carece de qualquer probabilidade de éxito.
Sim; o motivo alegado — coagáo — é, no contexto respectivo,
pouco convincente. Além do qué, deve-se observar: a comis
sáo nomeada é, sem mais, dissolvida se, dentro do prazo de
um ano após a nomeacáo, o processo nao pode ter inicio. Ora,
no caso da Princesa Carolina o termo em pauta ocorreu pre
cisamente durante a primavera (européia) de 1983. A quanto
parece em setembro de 1983, a Princesa, nao tendo consti
tuido advogado, a comissáo nao pode atuar e, por conseguinte,
foi dissolvida. O novo Código de Direito Canónico (a vigorar
a partir de 27/11/1983) só admite a constituigáo de comissáo
especial para julgar os matrimonios de Chefes de Estado, nao,
porém, para os de seus filhos ou familiares (cf. canon 1405,
§ 1», tí> 1); isto quer dizer que, se a Princesa Carolina quiser
voltar a pleitear a sua causa, recorrerá ao tribunal eclesiás
tico de Monaco, e nao á Santa Sé.

Sao estes fatos que os documentos abaixo supóem e men-


cionam, indicando a posicáo exata das autoridades eclesiásti
cas diante do caso matrimonial da Princesa Carolina.

— 390 —
CASAMENTO DE CAROLINA DE M6NACO 39

3. Tres documentos importantes

Seguindo a ordem cronológica, publicamos primeiramente

3.1. Um documento do episcopado francés

SECRETARIADO GERAL DO EPISCOPADO


SECRETARIADO NACIONAL DA
OPINIÁO PÚBLICA

Aos 30 de novembro de 1982

NOTA DE IMPRENSA

«A PROPÓSITO DO CASAMENTO DA PRINCESA CAROLINA DE


MONACO»

ALGUMAS OBSERVACOES SOBRE O RECONHECIMENTO DA


NULIDADE DE CASAMENTO

«Em conseqüéncia de um artigo, alias objetivo, de PARÍS MATCH


(19/11/82), aparecerán) na imprensa noticias mais ou menos fan-
tasistas a respeito de um pedido ao Papa que a Princesa Carolina de
Monaco teria formulado, no sentido de ser declarada a nulidade do
seu casamento. Para dissipar os eventuais equívocos da opiniáo
pública, faz-se mister aduzir as seguintes observacoes:

1) Todo fiel católico que, por motivo serio, ¡ulgue que o seu
casamento religioso nao é válido, tem o direito de se dirigir á Igreja,
que há de ¡ulgar a solidez dos motivos alegados.

2) Tal pedido é, via de regra, formulado ¡unto a um tribunal


da Igreja chamado 'ofidalidade'. Essa oficialidade pode ser ou dio
cesana ou interdiocesana (caso atenda a diversas dioceses). Muitas
pessoas julgam que os problemas de nulidade de casamento sao todos
tratados ñas cortes de Roma. Isto nao é exato. Todos os anos, no
mundo inteiro, as oficialidades locáis declaram nulos alguns milhares
de casamentos religiosos, contraídos por fiéis católicos.

3) Todavia o Direito da Igreja reserva a um tribunal instituido


pelo Papa o julgamento das causas matrimoniáis dos Chefes de Estado
e de seus filhos, para evitar que pressóes políticas ou outras influen
cien) os juízes locáis. Esta medida, pois, é ditada pela preocupacáo
de .garantir a independencia da ¡ustica.

— 391 —
40 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

4) Sao ignorados os motivos alegados para obter a declaracáo


de nulidade do casamento religioso da Princesa Carolina: como quer
que seta, esta solicitacao, formulada há dois anos, nada aprésenla
de extraordinario. £ conforme ao Direito da lgre¡a. O Direíto existe
em favor de todos e de cada um, sejam famosos, se¡am desconhecidos.

5) Nao basta pedir a declaracao de nulidade de um casamento


para oblé-la. £ preciso que o pedido se¡a fundamentado. As princi
páis causas de declaracao de nulidade sao: as doencas mentáis
graves \ a impotencia absoluta e definitiva, as intencoes contrarias á
índole do casamento, a falta de liberdade, etc... Atualmente
ninguém sabe qual será o resultado da sentenca a ser proferida a
longo prazo a propósito do casamento da Princesa Carolina de
Monaco. Qualquer, porém, que seja o nivel da causa em foco, os
¡ulzes da Igreja tém urna consciéncia, .que ninguém pode comprar».

A este texto faz eco

3.2. Um comunicado da Secretaría de Estado do Vaticano

N° 102.526 Gdade do Vaticano, 5 de Janeiro


de 1983

«Em resposta á carta de V. Ex? dirigida ao Santo Padre, a


Secretaría de Estado ¡ulga ser útil transmitir a V. Ex? os esclare-
cimentos seguintes:

1) Em caso de fracasso matrimonial, toca a todos os fiéis o


direito de recorrer a tribunais da Igreja. desde que tenham razoes
serias para julgar que o seu casamento possa ser nulo. Basta que
se dirijam as instancias da sua diocese, que Ihes indicarao como
proceder.

2) Quanto ao caso preciso que V. Ex? tem em mira2, somente


após minucioso processo — levado segundo as normas vigentes para
todos os fiéis — será eventualmente possível pronunciar-se sobre
a validade de tal casamento. Contrariamente ao que a imprensa
pode por vezes ter insinuado, nao está definido, por ora, que os
cónjuges possam vir a ser declarados, pela Igreja, livres do respectivo
compromisso matrimonial.

1 Acrescente-se, segundo a mente da legislacfio sempre vigente na


lgre|a: ... existentes antes do contrato matrimonial. (Nota do tradutor).

2 0 da Princesa Carolina e de Phlllppe Junot. (Ñola do tradutor).

— 392 —
CASAMENTO DE CAROLINA DE M6NAC0 41

3) O Sumo Pontífice inferveio, no caso, porque é norma do


Direito que os Chefes de Estado e seus filhos devem d¡rigir-se a Sua
Santidade em tais circunstancias — tao somente a fim de que o Papa
nomeie uma comissao integrada por ¡uízes da Santa Sé — para evitar
o risco de que se exercam pressoes sobre os ¡uízes locáis com pre¡uízo
da isencáo dos mesmos.

Mons. G. B. Re
Assessor»

Segue-se ainda

3.3. Um comentario do Arcebispado de Monaco

Em carta datada de 9/05/83, dirigida á redacáo de PR,


o Arcebispo de Monaco comentava:

«Desde a publicagSo destes dois documentos1, a situacáo nao


evoluiu sensivelmente; até hoje o processo ainda nao foi iniciado e
ninguém sabe nem quando nem como ele poderá ter o seu desfecho.

Os únicos pontos seguros sao os seguintes: á Princesa Carolina,


como a todo fiel batizado, toca o direito de pedir a averiguacáo da
validade do seu casamento, se ela julga ter razSes para fazé-lo; o
Santo Padre designou uma comissao especial constituida por juízes
da Sagrada Rota para um eventual exame da causa; o caso da
Princesa Carolina será tratado com a mesma retidao de consdencia,
o mesmo rigor e ñas mesmas condicoes que a causa de qualquer
outro peticionario. De resto,... as causas matrimoniáis das familias
dos reis e dos Chefes de Estado escapam, por completo, á competencia
do Ordinario do lugar. Isto se dá precisamente para reforear a garan
tía de objetividades.

Passemos agora a uma

4. Conckisdo

Nada mais valioso, em casos de incertezas e opinióes con-


traditórias, do que ir diretamente &s fontes de informagóes.
Ora, no caso da Princesa Carolina, o recurso a estas se reve-
lou altamente valioso; vé-se que nao somente o Santo Padre

i Os documentos atrás transcritos. (Nota do tradutor).

— 393 —
tí «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

nao declarou nulo o casamento da peticionaria, nem está pres


tes a fazé-lo (ao contrario do que informava a imprensa),
mas, antes, os passos judiciários encetados estáo em fase de
estagnacáo, que pode ser interpretada como desistencia da
Princesa interessada.

Percebe-se outrossim que há sinceridade e retidáo por


parte da Santa Sé, que nao atribuí a seu julgamento as cau
sas dos Chefes de Estado para privilegiá-los, usando «de dois
pesos e duas medidas», mas únicamente a fim de assegurar
a objetividade e isencáo de partido da sentenca da Igreja em
cada caso.

Observa-se aínda que o famoso «processo da Princesa


Carolina», que suscitou perplexidade e escándalo em muitos
meios, nem sequer comegou e talvez nunca venha a existir.
Se vier a comegar, nao implicará privilegio, mas apenas aten
derá ao direito que Carolina tem, como cada cristáo tem, de
ser examinada pela justiga da Igreja.

Tranqüilizem-se, pois, os ánimos perturbados! E conti-


nuem a procurar sempre as límpidas fontes de informagáo.

A propósito consultamos, para Ilustrar o histórico do caso, o artigo


de Eugen Georg Schwarz e Peter Kramer publicado com o titulo "Die
Prinzessln und der Vatikan" em Weltblld, 26 november 1982, pp. 8-10.

(ContlnuagSo da pág. 33)

— o de excitar o paciente á corregáo de suas fainas mo


ráis (embora nao denunciadas como defeitos moráis) ou o de
provocar a conversáo e o reescalonamento dos valores colo-
cando-se Deus e os bens espirituais no topo da escala), em
oposigáo á inversáo dos valores que desfigura o ser humano.
É realmente em muitos casos o próprio paciente quem, prati-
cando a ascese e a disciplina sobre si mesmo, pode-se livrar
de perturbagóes mentáis.

2. Dito isto, resta dizer que o papel atribuido ao demo


nio pela Trilogía Analítica é exagerado e falso. A fé crista
eré que o demonio existe e atua no mundo (cf. Ap 12, 13-17),
mas, sempre que algum fenómeno tem explicagáo psicológica,
a Igreja a aceita e se dispensa de o imputar diretamente ao
Maligno.
(Continua na pág. 80)

— 394 —
Ñas proximidades do Sínodo Mundial dos Bispos:

Absolvicao (oletiva de Pecados

Bn síntese: As páginas segulntes reproduzem um estudo do teólogo


espanhol Pe. Armando Bandera O. P., que versa sobre a necessidade do
sacramento da Penitencia para que baja auténtica conversáo; recomendé
a confissSo dita "de devocSo"; analisa e rejeita a apregoada distincáo entre
pecado grave e pecado mortal. Finalmente detém-se tongamente sobre a
validado das absolvieses coletivas ministradas fora das circunstancias
excepclonais previstas pela Santa Sé, e termina por afirmar que, a seu ver,
tais absolvieses nSo somente sao ilícitas, mas também multo provavelmente
inválidas.

Vai publicado nestas páginas um artigo do teólogo espa


nhol Pe. Armando Bandera O. P., de Salamanca. Corresponde
ao texto de urna conferencia apresentada ao V Simposio In
ternacional de Teologia realizado em Pamplona (Espanha)
nos dias 6-8/04/1983 em preparagáo do próximo Sínodo Mun
dial dos Bispos, que, em outubro de 1983, tratará de Recon-
ciliacáo e Penitencia. Visto ser longo tal texto, cancelamos
do mesmo citagóes que, por serem repetitivas, pareciam des-
necessárias á boa compreensáo da materia.

O Pe. Bandera, já conhecido através de PR 265/1982,


pp. 436-458, insiste sobre a temática da absolvicao coletiva,
mostrando-se fortemente inclinado a crer, na base de razóos
ponderáveis, que tal absolvicao, ministrada fora dos casos
excepcionais previstos pela Santa Sé, é nao somente ilícita,
mas também inválida.

Eis o respectivo texto:

JOÁO PAULO II £ O SACRAMENTO DA PENITENCIA

O sacramento da Penitencia ocupa lugar prioritario ñas pre


ocupares pastarais de Joño Paulo II. Já em sua primeira encíclica
o Papa vía a Igreja em estado de advento, isto é, de preparacao para
o terceiro milenio mediante urna idenrificacao cada vez mais profunda

— 395 —
44 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

com Cristo principalmente através dos sacramentos da Eucaristía e da


Penitencia. «A lgre¡a do novo advento, dizia, a Igreja que se pre
para continuamente para a nova vinda do Senhor, deve ser a Igreja
da Eucaristía e da Penitencia. Somente sob este aspecto... é a
Igreja da missao divina... tal como nó-la mostrou o Concilio do
Vaticano II» (ene. Redemptor Homínis n° 20).

O magisterio de Joao Paulo II sobre a Penitencia forma ¡á um


denso corpo de doutrina. Na minha exposicao darei preferencia ao
tema da absolvicao coletiva, porque creio que é exigencia da situacSo
pastoral em que vivemos.

T. Converscío e sacramento da Penitencia

Joao Paulo II comeca por apresentar o sacramento da Penitencia


como o grande meio de que a Igreja dispoe para respon
der ao chamado de viver em estado de conversao permanente
(cf. ene. Redemptor Hominis n° 20).

Esta idéia inicial adquire singular relevo em documentos poste


riores:

"é necessárlo dlriglrrho-nos continuamente a Cristo e convertermo-nos


a Ele Incessantemente. A vida crlstfi nao está completa sem essa conversSo
constante e a conversao nao é plenamente auténtica sem o sacramento da
Penitencia" (A jovens irlandeses em 28/08/1980).

As vezes hó quem recorra ao fácil expediente de criar e mu-dar


estruturas como se isto fosse remedio infalível para os problemas da
vida crista. Todavia, diz Joao Paulo II, «nao se podem criar estruturas
de apostolado no mundo sem... praticar a necessária conversao com
o objetivo de purificar as morivacoes... E, esta purificacao, todos
sabemos que ela se faz em profundidade e da maneira mais apro-
priada no sacramento da Penitencia» {Ao Pontificio Conselho para
os Leigos, em 12/10/1982).

«O chamado universal á conversao insere-se precisamente no


contexto do sacramento da Penitencia», porque, ainda que todos
tenham «necessidade dessa radical mudanca de espirito, de mente
e de vida que na Biblia se chama metanoia ou conversao», a dis-
posicáo interna nao basta, porque Cristo «estabeleceu que a salvacdo
de cada um se realize dentro da Igreja e mediante o ministerio da
própria lgre¡a»i ministerio que, a fim de assegurar a conversao e o
perdao, consiste principalmente na administracáo do sacramento da
Penitencia (cf. Bula Aper'rte Portas Redemptori, 6/01/83. ns. 4 e 5).

— 396 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 45

Aqui aparece urna contradicao com que nos temos debatido nos
últimos anos. Tem-se falado muito de conversao, mas tem-se guar
dado silencio sobre o sacramento. Assim a conversao é reduzida a
um tópico de linguagem. Ora a sinceridade da conversao se evidencia
no recurso ao sacramento. Os primeiros textos de Joño Paulo II que
transcrevemos, sao absolutamente claros. Nao obstante, o Papa con
sidera a questao também a partir do conteúdo intrínseco do misterio
da Redencao: «£ exigencia do misterio mesmo da Redencáo que o
ministerio da reconcíliacao, confiado por Deus aos pastores da Igreja,
encontré sua natural realizacao no sacramento da Penitencia. Disto
sao responsáveis os Bispos» (Bula Aperite n° 6).

2. Confissao freqüente

Se a conversao genuino e profundamente arraigada desemboca


no sacramento da Penitencia, a prática deste sacramento nao pode
ficar limitada aos casos de extrema necessidade, mas deve fazer parte
da vida crista normal. Em termos claros: a recepcáo do sacramento da
Penitencia ha de ser freqüente.

JoSo Paulo II o repele a miúdo:

"Demos seguranca ao nosso povo a respe i to dos grandes beneficios


da conflssfio freqüente. Estou firmemente persuadido da veracidade das
palavras do meu predecessor Pío XII: esta prática nao foi ¡ntroduzlda na
Igreja sem a insplracao do Espirito Santo" (AlocucSo aos Bispos cana-
denses, em 17/11/78).

Ha urna passagem singularmente significativa em que Joao


Paulo II nao só convida á confissao freqüente, mas também expoe
as razóes que a justifica m:

"Na medida em que comporta um salutar exerclclo de humlldade e de


sinceridade, pela profissfio de fé na mediacao da Igreja e pela prática da
esperance e de atento exame de consciéncla, o sacramento da Penitencia
nao só é Instrumento direto para destruir o pecado..., mas também
exerclclo precioso de virtudes, expiacSo, escola Insubstitulvel de espiritua-
lidade profunda, regeneracáo do homem perfelto configurado á plenltude
de Cristo (cf. Ef 4,13). Neste sentido, a confissao bem feita é por si
mesma urna altfsslma forma de dlrecSo espiritual. Precisamente por estas
razCes o recurso ao sacramento da Reconciliando nao pode reduzlr-se
apenas aos casos de pecado grave. Além das razfies de ordem dogmática
que se poderlam aduzir a propósito, recordamos que a confissao renovada
periódicamente, dita 'de. devocáo', sempre acompanhou na Igreja o ca-
minho da santldade" (Aos confessores de Roma, em 30/01/81).

— 397 —
46 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Neste ponto existe clara analogía entre o sacramento da


Penitencia e o da Eucaristía. Se a recepcao da Eucaristía ficasse re-
duzida aos casos de estrita necessidade, a vida crista sofreria empo-
bredmento irremediável. Com a Penitencia ocorre algo de semelhante,
porque os dois sacramentos estao associados entre si de maneira
¡nseparável. Como diz Joao Paulo II, «nao é somente a Penitencia
que leva á Eucaristía, mas também a Eucaristía leva á Penitencia.
Com efeíto, quando nos damos conta de quem é que recebemos na
Comunhao Eucarística, brota em nos qvase espontáneamente um
sentimento de indignidade, juntamente com a dor do nosso pecado
e com a necessidade interior de purificacdo» (Carta Domlnicae
Coenae n° 7).

E proposicao elementar da teología .que os sacramentos foram


instituidos como os meios principáis para gerar e desenvolver, a vida
crista. Limitá-los a casos de estrita necessidade equivale a introduzir
no designio divino de salvacao uns cortes arbitrarios, que nao podem
deixar de ser sumamente nocivos, porque afastam o cristáo das fontes
principáis das quais a graco. jorra e se comunica em plenitude.

No atual momento da lgre¡a urge o retorno a prática freqüente


do sacramento da Penitencia. Diz Joao Paulo II:

"Estou convencido de que um renasclmento da consciéncla moral e


da vida crista está estrila e indissoluvelmente assoclado a determinada
condlcio: a revltalizacao da confissSo pessoal. Fazel disto uma priorldade
da vossa tarefa pastoral!" (A Conferencia Episcopal da Alemanha, aos
18/11/1980).

"Juntamente comigo devoréis reconhecer com dolorida preocupacSo


que a recepc§o pessoal do sacramento da Penitencia diminuiu fortemente
em vossas comunidades nos últimos anos. De coracáo vos pego e exorto
a fazer o posslvel para que todos os balizados voltetn á prática freqüente
do sacramento da Penitencia através da conflssüo pessoal... Procura!
também vos receber regularmente o sacramento da Penitencia" (A sacer
dotes, em 18/11/1980).

O ministerio penitencial dos sacerdotes constituí hoje indiscutível


prioridade, porque permite captar intuitivamente uma importantissima
parte do misterio salvífíco, que atualmente sofre eclipse em muítas
consciéncias. Por isto escreve Joao Paulo II:

"Em particular, peco-vos, caros sacerdotes, que sejals conscientes da


colaborado que podéis prestar ao Salvador na obra divina da reconcillagSo.
Pode acontecer que, por falta de ternpo, devam ser abandonadas ou pos
tergadas algumas atividades importantes, nunca, porém, a confissSo. Dai
sempre prioridade a esta fungSo específicamente sacerdotal de representar

— 398 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 47

o Bom Pastor no sacramento da Penitencia. E, na medida em que fordes


testemunhando e louvando a maravilhosa agio do Espirito Santo nos cora-
caes, vos vos sentiréis chamados a mals Intensa conversSo e a um amor
mals profundo a Cristo e ao seu rebanho" (Em Liverpool, aos 30/05/82).

3. Obr¡ga;£o da confissao
Além de falar da confissao de devocao, Joao Paulo If trata
também claramente dos casos em .que a confissao dos pecados é
necessáría. Já nos inicios do seu pontificado referiu-se á solicitude
de Paulo VI para com o sacramento da Penitencia e sublinhou que
as Normas ditadas por tal Papa «fazem eco aos solenes ensinamentos
do Concilio de Trento referentes ao preceito divino da confissao
individual» (Aos Bispos canadenses, em 17/11/78). Esta primeira
afirmacao encontró ampio desdobramento em outra alocucao:

"Tende em conta que está em vigor, e estará sempre, o ensinamento


do Concilio de Trento relativo á necessldade da confissao completa dos
pecados mortals, como está em vigor, e estará sempre, na Igreja a norma
Inculcada por Sio Paulo e pelo próprio Concilio de Trento em virtude da
qual, para a digna recepcSo da Eucaristía, deve preceder a confissao dos
pecados, desde que alguém tenha conscióncia de pecado mortal" (Alocucfio
de 30/01/1981 aos Penitenciarlos).

Joao Paulo II mostra-se especialmente preocupado em convencer


os fiéis da necessidade da confissao sacramental a fim de assegurar
urna digna recepcao da Eucaristía, e quer que a catequese dé atencáo
a este ponto. Por isto diz:

"Aquele que, sem discernlmento, come e bebe o corpo e o sangue do


Senhor, come e bebe a sua própria condenacSo. Urna auténtica catequese
sacramental nao se pode descuidar de táo importante obrigacao. Como
bem sabéis, nSo é compatfvel com o magisterio da Igreja a teoría segundo
a qual a Eucaristía perdoa o pecado mortal sem que o pecador recorra ao
sacramento da Penitencia. £ verdade que o sacrificio da Missa... obtém
para o pecador o dom da conversSo, sem a qual nSo é posslvel o perdao;
todavía isto nao significa que aqueles que cometerán) pecado mortal se
podem aproximar da ComunhSo Eucarlstlca sem se ter primeiramente recon
ciliado com Deus mediante o ministerio sacerdotal. O sacramento da
Penitencia é a vía ordinaria e necessária para todos aqueles que, depols
do Batismo, calram em pecado grave" (iAos Bispos dos Abruzos e de
Molise, em 4/12/1981).

A Comunhao Eucarística é o grande encontró do homem com o


seu Salvador; mas, para que produza frutos, deve ser digna, isto é,
recebida com a consciéncia pura. Diz Joao Paulo II:

"Devemos vigiar sempre para que este grande encontró com Cristo
n§o se convelía, para nos, em ato rotineiro e a flm de que nSo recebamos
a Eucaristía Indignamente, Isto é, em estado de pecado mortal. A prátlca
da virtude e do sacramento da Penitencia sSo ¡ndispensáveis" (Carta
Dominicae Coenae n? 7).

— 399 —
48 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

"Nestes últimos anos tem acontecido, mesmo em casos multo nume


rosos, que todos os participantes da assembléla eucarfstica se aproxlmem
da ComunhSo, mas, ... como aflrmam experimentados pastores, sem que
tenha havldo a necessária preocupado de aproxlmar-se do sacramento da
Penitencia. Isto pode significar que aqueles que se aproxlmam da Mesa do
Senhor, nfio encontram em sua consciencla, e segundo a lei objetiva de
Deus, nada que Impaga aquele sublime e prazeroso ato de unISo sacra
mental com Cristo. Mas pode esconder-se af, ao menos em alguns casos,
outra convlccfio, a saber: consldera-se a mesa apenas como um banquete
no qual todos participam recebendo o corpo de Cristo, a flm de manifestar,
antes do mals, a comunhSo fraterna. A estes motivos pode-se acrescentar
fácilmente certo modo de ver meramente humano e um simples confor
mismo. Este fenómeno exige, da nossa parte, vigilante atengfio e anállse
teoióglco-pastoral, guiada pelo malor senso de responsabllidade. Nfio
podemos permitir que na vida de nossas comunidades se perca a sensiblli-
dada da conscléncla crlstñ, guiada pelo respelto a Cristo, que, recebido na
Eucaristía, deve encontrar no nosso coracfio urna digna morada. Este pro
blema está Intimamente relacionado nao so com o sacramento da Penitencia,
mas também com o sentido de responsabllidade dlante do depósito da
doutrlna moral e da dlstincfio entre o bem e o mal... Sfio conhecidas as
palavras de Sao Paulo: 'Examlne-se cada um a si mesmo' (1Cor 11,28);
esse exame é condlcSo Indlspensável para urna declsfio pessoal de aproxl
mar-se ou de abster-se da Eucaristía" (Carta Domlnlcae Coenae n? 11).

4. Pecado mortal e pecado grave


Os textos do Concilio de Trento relativos á necessidade da con-
fissao dizem que esta recaí sobre os pecados mortais cometidos após
o Batismo... Nos últimos anos tem-se feíto a distincao entre pecado
mortal e pecado grave, de tal modo que mortal sería apenas o pecado
cometido com malicia requintada, pouco menos que diabólica, desejosa
de romper diretamente com Deus. Ora tal é um pecado que, por sua
gravidade extrema, é cometido raras vezes. Todos os outros pecados
que se possam cometen diz-se hoje em día, mesmo que se¡am pecados
graves por sua materia, nao revogam a opcao fundamental por Deus,
nao implicam ruptura da alianca com Ele, isto é, nao sao mortais,
nem, por jsto mesmo, provocam no pecador a obrigacao de os con-
fessar (cf. J.-Y. Lacoste, Quatre theses théologiques sur la Confession,
em Revire Thomiste 82, 1982, pp. 392-414).

£ notorio que tal nocño de pecado mortal e de pecado grave


nao encontró respaldo nem no magisterio nem na tradicao teológica
da Igreja. Foi inventada nos últimos tempos com a clara Intencao de
abrir as portas a urna Moral permissiva ... e no intuito de solapar
a necessidade do sacramento da Penitencia na vida crista. Isto
ocasionou visível baixa na prática deste sacramento e certa leviandade
na recepcao da Eucaristía; é freqüente ver os fiéis procederem como
se nao houvesse motivo algum para ter que se abster da ComunhSo
Eucarfstica.

— 400 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 49

Joao Paulo II, por seu próprio modo de falar, excluí tais nocoes
de pecado mortal e pecado grave. Para ele, um e outro impedem o
acesso a Eucaristía e geram a obrigacao de confessar-se. Irtdicam-no
claramente os textos ¡á citados. .. Aqui transcreverei aínda urna das
suas mais expressivas assercoes: «A prática de recorrer ao sacramento
da reconcílíacao nao pode ser limitada apenas á hipótese de pecado
grave» (Aos Penitenciarios, em 30/01/1981). Tais dizeres supóem
que, na hipótese de pecado grave, o recurso ao sacramento da
Penitencia é necessárío.

Há, porém, aínda outra ponderacáo. Nos ensinamentos de Joao


Paulo II sobre este sacramento torna-se claro que a necessídade de
recebé-lo nao se aprésenla apenas de maneira excepcional e suma
mente rara, como acontecería se se aceitasse a nogao de pecado
mortal antes formulada; ao contrarío, o sacramento da Penitencia é
um fato que se dá habitualmente na vida crista e que deve ser ade-
quadamente considerado para que ninguém se exponha a comungar
indignamente. O pecado mortal de que fala a mencionada teoría,
tem malicia táo notoria e avultada que a pessoa nao pode conceber
a menor dúvída de o ter cometido e de se ter tornado indigna de
receber a Eucaristía. Joao Paulo II refere-se a casos de indignidade
obietiva que nao sao percebídos por causa do laxismo da consciéncia
ou por falta de reflexáo, isto é, por motivos que seríam impensáveis
na hipótese de que o mortal fosse equivalente ao diabólico.

Com vistas á necessidade de receber a Penitencia, nao se pode


distinguir entre pecado mortal e pecado grave. Um e outro devem
ser confessados. Isto nao implica que todos os pecados tenham o
mesmo grau de malicia; a teología de todos os tempos é absoluta
mente clara a tal respeito. Já a S. Escritura fala de um pecado contra
o Espirito Santo, que é de suma gravidade. Mas também menciona
outros muiros pecados que, por um lado, entram na vida de varias
pessoas e, por outro, excluem do Reino de Deus.

5. A íibsolvijao coietiva

A renovacáo litúrgica desejada e decretada pelo Concilio do


Vaticano II estende-se a todos os sacramentos. No tocante á Peniten
cia, a nova disciplina presta maior atencao do que -antes á prática
da absolvícao coietiva, porque ho¡e se apresentam situacóes novas
que a requerem.

— 401 —
50 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Todavía é fato que a nova disciplina deu lugar a abusos, porque


foi estendida a casos aos quais evidentemente nao era aplicável. Os
abusos comecaram cedo, de modo que ¡á Paulo VI se viu na obrigacáo
de chamar a atencao para eles (Alocucao de 20/0b/78 aos Bispos
do Distrito de Nova lorque). é o que também Joao Paulo II vem
fazendo desde o inicio do seu pontificado. A sua primeira intervencao
a propósito consistió em confirmar os ensinamentos do seu predecessor,
o qual «mais de urna vez afirmou o caráter totalmente excepcional
da absolvic5o coletiva» (A Conferencia Episcopal da Nigeria, em
15/02/82).

Diz ainda o S. Padre:

"A Igreja, por graves razSes pastarais e sob normas precisas e In-
dlspensávels para facilitar o supremo bem da graca a multas almas,
ampllou o uso da absolvlcáo coletiva. Todavía desojo recordar a escrupulosa
observancia das condigSes citadas, reafirmar que, em caso de pecado
mortal, também depols da absolvlcáo coletiva persiste a obrigacSo de urna
acusacSo especifica sacramental do pecado, e confirmar que, em qualquer
caso, os fiéis tém dlreito á confissSo pessoal" (Alocucao aos Penitenciarlos,
em 30/01/81).

Contudo há oufro documento, de singular importancia, ao .qual


me parece necessárío dedicar especial atencao. Refiro-me á alocucao
que Joao Paulo II dirigiu em 1/04/82 aos Bispos franceses da Provin
cia do Leste em visita ad linrina. Nesta peca aparecem os temas
centráis da Penitencia hoje: consciéncia do pecado e confissáo de
todas as faltas graves antes de receber a Comunhao Eucarística,
priorídade que os sacerdotes devem dar ao ministerio da Penitencia,
absolvicao coletiva e lugar que Ihe compete na pastoral.

"Para os crlstños — diz Jo3o Paulo II — um dos comprovantes do


senso moral é a conscifincia do pecado, o desejo do perdSo, o Itinerario
penitencial... Todavía é preciso reconhecer a existencia de urna crlse
real do sacramento da Penitencia. Muitos Já nfio véem como tenham peca
dos, menos aínda, se pecaram gravemente; nem véem por que haveriam
de pedir perdSo dlante de um representante da Igreja; outros alegam que
as conflssoes se perdem na ratina e no formalismo, etc. Por outro lado, há
serlas razfies para apreensao quando em certas regióos se vóem tantos
fiéis receber a Eucaristía e tfio poucos aproximar-se do sacramento da
ReconciliacSo. Urna boa catequese deve levar os fiéis a conservar a cons
ciéncia do seu estado de pecadores, a compreender a necessldade e o
sentido de um processo pessoal de recondliacáo antes de receber, junto
com a Eucaristía, todos os frutos de renovacao e unlSo com Cristo e com
a Igreja" (Ns. 6-7).

Isto implica que os sacerdotes devem assumir como auténtica


priorídade o ministerio de ouvir confissóes. Nao se pode objetar que,
estando «absorvidos por outras tarefas» e sendo «freqüentemente

— 402 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 51

pouco numerosos, uño estao disponíveis para tal ministerio. Lem-


brem-se do exemplo do Cura de Ars e de tantos pastores que, mesmo
em nossos días, gracas a Deus praticam o que se pode chamar 'a
ascese do confessionário'. Pois todos nos estamos a servico dos
membros do povo de Deus confiados ao nosso zelo» (¡b. n° 7).

Depois JoSo Paulo II íala do beneficio que traz á vida crista a


celebracao comunitaria da Penitencia, quando acompanhada de boa
catequese... Neste contexto se insere a mais forte chamada de
atencao do Papa para o tema da absolvicao coletiva:

"Estejamos atentos... O entusiasmo dos fiéis, especialmente dos


jovens, pelo aspecto comunitario da vida crista pode levar a descuidar o
processo individual que necessarlamente se impSe. É o caso das celebra-
cfies penitenciáis com absolvicao coletiva. Como sabéis, nao se pode
recorrer a esta senáo em circunstancias excepclonais, que se produzem
por impossibllldade física ou moral, em casos de grave necessidade. Nao
se pode, portante, recorrer a ela para renovar a pastoral ordinaria do sacra
mento da Penitencia. Além disto, a absolvicáo coletiva nao dispensa da
confissáo individual e completa das faltas. Esta deve ser felta todas as
vezes que tenham sido perdoados pecados graves por urna absotvicSo cole
tiva. O vinculo entre confissáo e perdió, Já inscrito na natureza das coisas,
pertence á esséncla do sacramento. Nunca se Insistirá bastante sobre a
necessidade dessa confissao pessoal das faltas graves seguida de absolvi-
cSo Individual; é primeramente urna exigencia de ordem dogmática, mas
é também um processo libertador e educador, visto que permite a cada
crlstáo orientar concretamente de novo a sua vida para Deus. Com efelto,
o cristfio nao é apenas membro de urna comunidade; é urna pessoa indi
vidual, com suas tendencias e seus problemas, seu ambiente e seu psi-
quismo próprlos, suas tentacdes e suas quedas, sua consciéncia e sua
responsabllldade diante de Deus e diante dos irmáos. O povo de Deus nSo
é rebanho uniforme: cada qual dos seus membros é um ser único dlante
de Deus; ó também tal diante do seu pastor, que é, para cada fiel, pai,
mestre e juiz da parte de Deus" (Aos Bispos franceses da Provincia de
Leste, n? 8).

Nada resta a acrescentar a este inciso. O tema é tratado de


maneira completa e luminosa, situado no terreno dogmático, que Ihe
é próprio. Nao se trata de questao meramente disciplinar, na qual
a lgre¡a possa introduzir mudangas. «O vínculo entre confissáo e
perdao... pertence á esséncia do sacramento» e, por isto mesmo,
nao há poder humano capaz de extingui-lo. Além desta razao funda
mental, há outra bem importante, a saber: a prática indiscriminada
da absolvicáo coletiva termina reduzindo os fiéis a um «rebanho uni
forme», a urna massa sem rosto. Joao Paulo II faz notar a evidente
contradigao de semelhante proposta práHca com a mentalidade
personalista da nossa época. «A este propósito, diz, quero lembrar
que a sociedade moderna, com razao, é ciosa dos direitos inalienáveis
da pessoa. Entao, como precisamente nesta táo misteriosa e sagrada

— 403 —
52 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

esfera da personalidade, onde se vive a relacáo com Deus, se haveria


de negar á .pessoa humana, á pessoa de cada um dos fiéis, o direito
de um coloquio pessoal, único, com Deus mediante o ministro
sagrado? Por que se haveria de privar da alegría íntima e pessoal
desta graca cada um dos fiéis, que vale como tal diante de Deus?»
(ib. n° 8> com referencia as Normas Pastorais Sacrantentum
Paenitentiae n° 3).

6. Fora de circunstancias excepcionais, é válida


a absolvigáo coletiva?

Quem volve o olhar para o que ho¡e ocorre na administracao


do sacramento da Penitencia, verifica que a questao proposta tem
importancia singular. Nenhum documento do magisterio a formula
explícitamente; isto implica que também nunca se Ihe deu urna res-
posta direta. Nao obstante, nos textos de Joao Paulo II atrás trans
critos há expressoes sumamente graves que obrígam a refletir... O
problema de fundo é reconhecer e acatar a intengao de Jesús Cristo
com referencia ao sacramento...

Joao Paulo II nao «presenta seus ensinamentos como origináis


e novos, mas recorre <ao magisterio anterior e se apoia nele. Cita
explícitamente Paulo VI e a Congregacao para a Doutrina da Fé.
Por sua vez, esta Congregacao dá Normas Pastorais sobre a absol-
vícao coletiva, levando em conta a Instrucao da Sagrada Penitenciaria
Apostólica de 25 de marco de 1944. £, pois, necessário comecar a
análise a partir desta Instrugao nao somente por ser a primeira de
urna serie de documentos, mas também porque contém aIgurnas ex
pressoes características e quase técnicas que se repetem depois.

6.1. A Sagrada Penitenciaria

A Instrucao da Sagrada Penitenciaria foi emitida durante a


segunda guerra mundial e tende, antes do mais, a resolver problemas
criados pela própria guerra. Os pontos fundamentas desta Instrucao
sao os seguintes:

a) Aínda que nao estejam aprovados para ouvir confissóes,


os sacerdotes podem dar absolvicáo coleKva aos soldados quando a
batalha está ¡mínente ou ¡á comecou e a falta de tempo impede de
ouvir cada um individualmente, pois semelhante sítuacáo equivale a
perígo de morte. Podem também dar absolvicáo coletiva tanto a
civis como a militares, quando há perigo de morte por causa de bom-
bardeíos inimigos.

— 404 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 53

b) Fora do perigo de morte, nao é lícito absolver coleriva-


mente <a muitos (non licet saeramenfalifer absolvere plures una simul),
nem individualmente a cada um que tenha feito apenas urna con-
fissao parcial (dlmidiafe tantum confessos) pela única razáo de grande
afluencia de penitentes, como pode acontecer no día de urna festa
importante.

c) Ao invés, é lícito (licet vero) absolver coletivamente se


ocorre alguma outra necessidade singularmente grave e urgente, pro
porcional ao preceito divino da integridade da confissao; tal é, por
exemplo, o caso dos penitentes que, sem culpa sua, se veriam privados
durante muito tempo (diu) da graca sacramental e da Comunháo
Eucarística.

d) Compete ao Ordinario do lugar definir se um grupo de


soldados, de prisioneiros ou de civis se acha em circunstancias tais
que permitam a absolviendo coletiva. Os sacerdotes estáo obriga-
dos a recorrer com antecedencia ao Ordinario 1 — sempre que pos-
síve I — a fim de poder absolver licitamente (uf licite huiusmodi
absolutionem impertiant).

e) As absolvicóes coletívas ministradas .pelos sacerdotes segundo


o seu arbitrio, fora dos casos mencionados ou sem ter previamente
obtido a licenca do Ordinario (Ordínaril Ifoentia), quando era pos-
sível recorrer ao mesmo, háo de ser tidas como abusos (utpote abusus
habendae sunt).

f) Aqueles que recebem a absolvicáo coletiva, contraem a


obrigacáo de confessar posteriormente todos os pecados graves (gravia
singula peceafa).

g) Os sacerdotes fagam saber aos fiéis que é gravemente proi-


bido (graviter prohiben) descuidar a confissao completa dos pecados
mortais (lethalia peccata) no intuito de incorporar-se a algum grupo
que receba a absolvicáo coletiva (Sagrada Penitenciaria Apostólica,
Instrucao de 25/03/1944).

Como se vé, na Instrucao aparece o conceito de liceidade, nunca,


porém, o de validade. E, quando o sacerdote nao se sujeita as con-
dicoes para absolver licitamente, diz-se apenas que comete um abuso,
nao um ato nulo.

i Ordinario é o Blspo do lugar ou aquele que I he faz as vezes. (Nota


do tradutor).

— 405 —
54 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

6.2. A Congregacóo para a Doutrina da Fé

£ evidente a influencia da Instrucao das Normas Pastorais para


a absolvicao coleliva emanadas da Congregacao para a Doutrina da
Fé \ Nesgas se encontró varias vezes o conceito de liceidade, embora
sob as formas verbais mais diversificadas. Assim, por exemplo, se le:
«Pode ocorrer que dar a absolvicao coletiva sem previa confissao
individual se¡a lícito ou mesmo conveniente» (ficeat vel etiam
oporteat).

A Congregacao para a Doutrina da Fé assume também outro


dado procedente da S. Penitenciaría, a saber: o abuso, ao qual acres-
centa urna qualrficacao significativa. Com efeito, diz que as absolvi-
Coes coletivas que nao se adaptam ás normas estabelecidas «hao de
ser consideradas como abusos graves» (tantquam abusus graves
habendae sunt) (Normas Pastorais n? 13). A razao desta gravidade
é que, como as Normas se fundam «na verdadeira natureza do sacra
mento da Penitencia» (ib. proemio), o que seja contrario a elas atenta
contra o próprio sacramento — o que nao pode deixar de ser grave.

Ora neste contexto das Normas abuso grave é o mesmo que


pecado grave, isto é, pecado que há obrigacáo de submeter á con
fissao sacramental, porque supoe a perda da amizade com Deus e
grave ofensa a Ele. As Normas usam a expressao «pecados moríais»
duas vezes, ambas em relacao com o Concilio de Trento... Nos
demais casos empregam invariavelmente a expressao «pecados
graves»2. Isto é prova evidente de que, segundo as Normas, pecado
grave é o mesmo que pecado mortal no tocante á obrigacáo de con-
fessá-los; esta obrigacao recaí sobre tais pecados considerados em
especie « número, de acordó com a formulagao tridentina; ela ocorre
nao somente quando os pecados chegam a produzir urna atitude
permanente, como por vezes se disse nos últimos anos 3.

1 Documento datado de 16/06/1972. (Nota do tradutor).

o A expressflo pecado mortal aparece nos números 1 e 8 e pecado


grave nos números 6, 7 (duas vezes) e 12. Quatro vezes grave e duas
vezes mortal.

a Isto é, quando chegam a derrogar á opcáo fundamental, tornando o


homem básicamente voltado contra Deus ou portador de urna opcfio funda
mental explícitamente contraria a Deus.

— 406 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 55

Temos assim urna conclusao certa. Fora de circunstancias excep-


cionais, a absolvicao coletiva é. objetivamente falando, um pecado
grave ou mortal, porque atenta contra «a verdadeira natureza do
sacramento da Penitencia». Mas pergunta-se: trata-se apenas de ili-
ceidade... ou está em ¡ogo também a validado do sacramento?
Atrás apresentamos unía serie de expressóes em que aparece o tema
da liceldade te, em contra-posicao, o da ilioeidade), nunca, porém,
se fala <fe validado e invalidade.

Nao obstante, ¡ulgo que o problema da validade nao pode ser


posto de lado. Note-se... que as frases centradas no termo liceidade
provém... da Instrucao da Sagrada Penitenciaria, que se pronunciou
numa época em que o problema nao assumira, nem de longe, as
características que ele hoje tem.

O número 1» das Normas, após recordar e reafirmar o ensina-


mento do Concilio de Trento sobre a obrigacáo de confessar integral
mente, em especie e número, todos os pecados mortais, assim concluí:

"A conflssSo Individual e completa e a absolvIgSo contlnuam sendo o


único modo ordinario para a reconclliacño dos fiéis com Deus e com a
Igreja a nfio ser que a Imposslbllidade física ou moral dispense desta
confiss&o".

A impossibilidade é explicada nos termos seguintes: além dos


casos de perigo de morte, pode ocorrer quando «Se aprésenla grave
necessidade, isto é, quando nao há confessores suficientes para ouvir
devidamente a confissño dos penitentes dentro de um tempo razoável,
de tal modo que os penitentes, sem culpa sua, se veriam forcados a
ficar por longo prazo privados da graca sacramental ou da Sagrada
Comunhao. Isto pode-se dar principalmente em térras de missáo, mas
também em outros lugares ou entre grupos de pessoas nos quais a
carencia de confessores seja constante. Nao é lícito, porém, dar a
absolvicao coletiva únicamente por causa da grande afluencia de
penitentes ocasionada por urna festa solene ou urna peregrinacáo...»
(Normas, n.08 1 e 3).

Estas idéias parecem-me de importancia decisiva. Nos casos ordi


narios, ou se¡a, sempre que nao ocorram as circunstancias excepcio-
nais asstnaladas, nao existe outro meio de reconciliar-se com Deus e
com a Igreja a nao ser a confissáo individual e completa de todos os
pecados mortais e graves. Creio que isto se pode «traduzir», dizendo
que, fora das circunstancias excepcionais, sem confissáo individual e
completa, nao existe sacramento da Penitencia e que, por conseguirle,
a absolvicao dada é nula.

— 407 —
56 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

O Ritual da Penitencia

Este documento, datado de 2/12/1973, insiste, mais do que qual-


quer outro, sobre as partes constitutivas do sacramento, que sao a
contricao, a confissáo, a satisfácelo e a absolvícao (n9 ó).

Creio que, diante deste modo de falar. é preciso considerar defi


nitivamente caduca a teoría que punha toda a «substancia» da Peni
tencia sacramental apenas na absolvicáo. Na verdade, a confissáo
que é parte constitutiva da Penitencia, é a confissáo individual e
completa no sentido do Concilio de Trento. Se falta essa confissáo,
falta urna parte essenclal e, por conseguinte, nao há sacramento. As
teorías da «confissáo pela metade» nao somente sao urna expressao
de laxismo moral, mas também implican), objetivamente falando, nuli-
dade do sacramento da Penitencia... Por conseguinte, julgo que,
fora das circunstancias excepcionais de que falamos, a absolvicáo
coletiva é nula. Pelo menosi existe serio perigo de nulidade; e ¡sto
explica que em circunstancias ordinarias nao possa ser ministrada sem
se cometer um pecado objetivamente grave.

Paulo VI

O magisterio pessoal dos Papas reforca a idéia de nulidade.


De Paulo VI conheco duas intervencoes...

A segunda é dirigida a Bispos... Como se trata de um texto-


-chave, embora extenso, ¡ulgo-me obrigado a reproduzi-lo na íntegra.

"Há seis anos, com Nossa especial aprovacio e por mandato Nosso,
a Sagrada CongregagSo para a Doutrlna da Fé promulgou Normas Pastorais
que regem a absolvicáo sacramental colativa. Este documento, Intitulado
Sacramentan) Paenltentlae relterou o solene enslnamento do Concillo de
Trento sobre o preceito divino da conflssSo Individual. O documento re-
conhecla também a dlflculdade experimentada pelos fiéis de alguns lugares
para conseguir a confissáo individual em virtude da escassez de sacerdotes.
Foram tomadas medidas para permitir a absolvicfio coletiva em casos de
grave necessldade, e as condtcdes em que se realiza esta grave necessldade
foram especificadas com toda a clareza. Flcou reservado ao Ordinario do
lugar Julgar, após consultar os outros membros da Conferencia Episcopal,
se de fato se cumprem as condlcfies estipuladas pela Sé Apostólica e
especificadas na Norma n<? 3. — Os Ordinarios, porém, nSo receberam
autorfzacfio para mudar as condlcQes exigidas nem para substituíalas por
outras nem para avallar a grave necessldade segundo criterios pessoals,
aínda que respeltávels. Com afeito; Sacranrantum Paenitentlae reconhecla
que as Normas pelas quals se rege o ministerio da reconcillacao sSo materia
de especial sollcltude para a Igrefa universal e caem sob a Jurlsdlc&o da
autoridade suprema da Igreja. O mals Importante na apllcacáo das Normas

— 408 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 57

é assegurar a eficacia do ministerio que a Igreja exerce, de acordó com a


Intencfio de Cristo Salvador. Na vida da Igreja a absolvicáo coletlva nao
pode ser praticada como recurso pastoral ordinario ou como meló de fazer
frente a urna sltuacSo pastoral difícil. É permitida únicamente em vista de
circunstancias extraordinarias de grave necessidade, como Indica a Norma
r& 3. Precisamente no ano passado chamamos a atencao publicamente para
o caráter totalmente excepcional da absolvigáo coletlva... Pedimo-vos fiel
observancia das Normas, como a exige a fldelidade á comunháo da Igreja
universal; tal fldelidade será a garantia da eficacia sobrenatural da vossa
mlssSo ecleslal de reconciliacño" (Alocucáo aos Bispos do Distrito de Nova
lorque, em 20/04/78).

Creio que urna reflexáo sobre este discurso leva á conclusáo de


que, fora dos casos excepcionais, a absolvicáo coletiva é nula. A meu
ver, a nulidade se funda sobre dois motivos:

O primeiro é a falta de urna das partes constitutivas do sacra


mento: Paulo VI diz claramente que o direito divino e a intencao de
Cristo... requerem a confissáo individual e completa, a nao ser que
urna situacáo excepcional a dispense. Ora bem; é evidente que contra
o direito divino e a intencáo de Cristo nao pode existir sacramento,
e tudo que entao se faca por parte dos homens é sacramento total
mente nulo, porque nao ha poder humano capaz de prevalecer sobre
o direito divino ou a intencáo de Cristo.

O segundo motivo de nulidade é a falta do que comumente se


chama poder de ¡urisdicáo para absolver. Paulo VI declara com toda
a firmeza que a regulamentacáo da absolvicáo coleKva compete
exclusivamente á suprema autoridade da tgreja e que esta só permite
tal absolvicao em casos «totalmente excepcionais». Portanto nao
parece que, fora de tais casos, haja alguém na Igreja jurisdicionado
para ministrar absolvicáo coletiva, nem mesmo o próprio Papa, pois
evidentemente o Papa está rambém sujeito ao Direito e á intencáo de
Cristo concernente ao sacramento da Penitencia.

Joáo Paulo II

A sua afirmacao mais taxativa é a seguinte: «O vínculo entre


entre confissao e perdao, ¡á inscrito na natureza das coisas, pertence
á esséncia do sacramento»; por isto «a confissao pessoal é exigencia
de ordem dogmática» (Alocucáo aos Bispos da Suica em 9/07/82).
Ora a confissao pessoal de que aquí se fala, é a confissao de todos
os pecados graves ou mortais em especie e em número, de acordó
com os ensinamentos do Concilio de Trento, ao qual JoSo Paulo faz
referencia.

Portanto, se nao ocorrem circunstancias excepcionais, que dis-


pensem da confissao integral, falta urna parte essencial do sacra-

— 409 —
58 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 270/1983

mentó. Este, em consequénda, é nulo, e nao há poder humano que


possa evitar essa nulidade, como também nao há instancia humana
que possa mudar a essénda do sacramento da Penitencia.

Nem Paulo VI nem JoSo Paulo II usam expressoes de licekfade


ou validado. Todavia fazem enunciados dogmáticos de tal natureza
que só^ podem ser entendidos corretamente se os situamos no plano
da validade. Sob formas literariamente diferentes, mas conceptual-
mente concordantes, afirmam que, para manter a esséncia do sacra
mento da Penitencia e, por conseguinte, a validade <do mesmo, é
necessário limitar a absolvicao a casos excepdonais, oriundos da tm-
possibilidade física ou moral de se fazer urna confissao individual
completa.

7. Um último principio de esctarecimento

Todos os documentos anteriormente aduzidos formulam um prin


cipio importante, ao qual é preciso dedicar especial atencao. Tal é
o seguínte: quem recebe, mediante absolvicao coletiva, o perdao de
pecados graves, está obrigado a confessá-los todos pessoalmente em
ocasiáo posterior.

Ora qual pode ser a razao de .que esses pecados, perdoados


em absolvicao coleHva, devam ser obligatoriamente submetidos a
posterior confissao individual? Creio que a única razao possível é a
que foi indicada por Joao Paulo II e acaba de ser recordada, ou
seja, «o vínculo entre confissao e perdao, ¡á inscrito na natureza das
coisas, pertence á essénda do sacramento». Isto supSe duas ver
dades:

A prímeira é que Jesús Cristo «eclesializou» o perdao dos peca


dos graves cometidos depois do Batismo, de modo que, sem referen
cia ao ministerio da lgre¡a, nao pode haver perdao dos mesmos.
A segunda é que, sendo da essénda do sacramento a confissao pes-
soal e completa, se nao existem circunstancias excepción ais que déla
dispensem, também nao existe sacramento e, portanto, a absolvicao
é nula, como foi dito repetidas vezes.

A confissao genérica anterior á absolvicao coletiva válida salva


o valor do sacramento a título de excecao, cu¡a eficáda nos é conde
cida somente «través da prática da Igreja; Esta reitera e firmemente
nos assegura que está em seu poder ministrar tais absolvicoes cole-
tivas. Contudo essa confissao é intrínsecamente incompleta; seu valor

— 410 —
ABSOLVICAO COLETIVA DE PECADOS 59

sacramental depende de urna referencia, ao menos implícita, á con-


fissao individual e completa a ser realizada em tempo oportuno.
De outro modo, creio que é absolutamente inexplicável que ha ¡a
obrígacao grave, como repetem invaríavelmente todos os documentos,
de confessar os pecados ¡á perdoados.

Assim os abusos da confíssáo coletiva contribuirán! para elucidar


mais a fundo a doutrina do sacramento da Penitencia e, particular
mente, o valor da confíssáo como ato do penitente... Fica também
claro que os confessores muito «despachados» que «cortam a pala-
vra» ao .penitente e nao Ihe permiten! confessar os pecados todos
segundo especie e número, atentam contra algo essencial ao sacra
mento; expoem-no ao perigo de nulidade e violam o dever de minis
tros da recontiliacao, que há de ser dispensada segundo a intencáo
de Cristo, como diz Paulo VI... Isto nao quer dizer que atormen
temos o penitente com indagacoes desnecessárias. Creio que a pru
dencia crista, há séculos, vem ensinando com suficiente clareza quol
deva ser o comporlamento de um bom ministro da Penitencia.

Gondusao

Qualquer que seja a solucao dada ao problema da validade


ou nulidade das absolvicoes coletivas ministradas fora de circuns
tancias excepcionais, urna coisa fica absolutamente clara, a saber:
tais absolvicoes. sao, por porte de quem as ministra, pecados obje
tivamente graves ou mortais. O criterio que rege toda esta questáo,
nao é o de ampliar a concessao de absolvicoes coletivas, mas o de
salvaguardar o principio dogmático da confíssáo pessoal e completa
no sentido proposto pelo Concilio de Trento, ao qual fazem referencia
todos os documentos que tratam da absolvicao coletiva. Esta será
sempre urna excecao e, portanto, nao pode ser estabelecida como
norma.

O artigo, assaz explícito como é, dispensa ulteriores comen


tarios. Merece, sim, ser estudado e ponderado, visto que
levanta serio problema, no qual verdades de fé ou dogmáticas
estáo implicadas, no qual também a pedagogía ou a formagáo
da consciéncia do povo de Deus está interessada.

— 411 —
Perante a Leí de Deus:

É Lícito o Uso das Imagens Sagradas?

£m slntese: A proiblcSo de confeccionar Imagens contlda no Antlgo


Testamento era devlda a circunstancias contingentes da historia do povo de
Deus; cercado de nacSes Idólatras, Israel tendía ao culto pagáo das imagens
e a concepcdes de índole mágica que as imagens poderlam fomentar. De
resto, ]á mesmo no Antlgo Testamento o próprio Deus prescreveu a con-
feccBo de Imagens como querublns, serpente de bronze, leóes do palacio
de Salomao, etc.

O misterio da Encarnacáo do Filho de Deus mostrou aos homens urna


face vislvel de Deus, que, além do mals, se quls servir de numerosos
elementos senslvels (Imagens, palavras, cenas históricas...) para comu
nicar a Boa-Nova. Os crlstSos foram entSo compreendendo que, segundo
a pedagogía divina, deverlam passar da contemplacSo do vislvel ao invisfvel.
As Imagens, principalmente as que reproduzlam personagens e cenas da
historia sagrada, tornaram-se a Biblia dos iletrados ou analfabetos.

A controversia Iconoclasta, Inspirada por correntes judaizantes e


heréticas nos séculos VIII e IX, termlnou com a reaflrmacáo do culto das
imagens no Concilio de Nlcéia II (767). Tal culto é dito "de veneracfio"
e é válido na medida em que as imagens representam os santos; nao se
confunde com adoracfio.

Os Reformadores protestantes rejeitaram as imagens por causa dos


abusos do fim da Idade Media; Lulero, porém, se mostrou assaz liberal a
tal propósito. Últimamente entre os luteranos a atitude inococlasta tem sido
submetida a revlsfio.

As autoridades eclesiásticas católicas tém promulgado normas para


se evltarem abusos e erros teológicos na confeccSo e no culto das imagens.

Comentario: Nao raro levantam-se objegoes contra o


uso católico de confeccionar imagens sagradas, visto que estas
parecem proibidas pela Lei de Deus. Com efeito, diz o livro do
Éxodo:

"NSo farás para ti imagens esculpidas, nem qualquer Imagem do que


existe no alto dos cóus, ou do que existe embalxo, na térra, ou do que
existe ñas aguas, por debalxo da térra. Nao te prostrarás diante délas e nSo
Ihes prestarás culto' (20,4).

— 412 —
E AS IMAGENS SAGRADAS? 61

Os fiéis católicos sentem-se as vezes em apuros para, diante


de tal texto, justificar a praxe católica de venerar imagens. Eis
por que, a seguir, abordaremos o assunto: 1) percorrendo mais
a fundo a Sagrada Escritura, 2) estudando um pouco a historia
do Cristianismo e 3) elucidando o sentido que as imagens tém
para o povo católico.

1. A doutrina bíblica

Distinguiremos duas etapas, ou seja, a mensagem do


Antigo e a do Novo Testamento.

1.1. No Antigo Testamento

1. O Senhor vedou aos israelitas a confecgáo de imagens,


estatuas, etc., visto que na antigüidade pré-cristá fácilmente se
atribuía a esses artefatos um caráter religioso; eram considera
dos pelos pagaos como símbolos em que a Divindade estava
presente, ou como a Divindade mesma. Dada essa mentalidade
dos povos vizinhos de Israel, o uso de imagens acarretava perigo
para a fé monoteísta dos hebreus, que as poderíam ter na mesma
conta em que as tinham os idólatras (coisa que de fato se dava
quando os israelitas transgrediam o preceito do Éxodo;
cf. 2Rs 18,4; Ez 8,3-18). Justamente para evitar a confecgáo de
imagens, o Senhor nao tomava forma nem figura quando falava
a Israel; apenas fazia notar a sua presenga por meio de raios,
trovóes, etc. Desta maneira subtraia ao seu povo qualquer
ponto de apoio para fabricar alguma representacáo de Deus; o
próprio Javé se dignou revelar o motivo da proibigáo no texto
de Dt 4,15, paralelo a Ex 20,4s:

"Estal atentos; já que nao vistes forma nenhuma no dia em que Javé
no Horebe vos falou em meló ao fogo, nSo prevariquéis e nSo fagáis
imagem esculpida a representar o que quer que seja".

Os Profetas foram assaz veementes na rejeigáo das


imagens visto que, de fato, Israel tendía a idolatría; tenham-se
em vista os textos de Is 40,18; 44,9-20; Jr 10,2-5...

As razSes remotas que levavam os antigos a adorar


imagens, eram muitas vezes de ordem mágica. Com efeito,
julgavam os povos primitivos que a imagem participava da
esséncia do individuo representado; a imagem era consubstan-

— 413 —
62 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

cial com o individuo, ou mesmo a imagem era o próprio indivi


duo. Em conseqüéncia, quem conseguisse fazer a imagem de
um deus, capturava esse deus ou exercia poder e dominio sobre
ele; encerrava a torga da divindade dentro do respectivo arte-
fato; poderia entáo idpsor da agáo poderosa da divindade.

Este fundo de cena, incompatível com a nogáo elevada e


pura de Deus na revelagáo bíblica, explica adeguadamente a
proibicáo do uso de imagens no Antigo Testamento.

Como se vé, a proibicáo de imagens no Antigo Testamento


nao implicava oposigáo entre o visivel e o Invisível, entre o
material e o espiritual, nem pretendía incutir um culto espiri
tualizado dirigido diretamente ao Invisível. Muito diverso era
o sentido dessa proibicáo: ela se prendía ao conceito mesmo de
Javé e devia incutir que o Senhor era diferente dos deuses dos
outros povos; estes podiam ser representados e fixados em de
terminado lugar, porque eram ficgóes dos homens; ao contrario,
Javé se manifestava livre e soberanamente onde e quando
quería, infinitamente ácima das torgas e dos seres sensíveis,
pois Ele é o Criador de todos.

2. Nao obstante, em certos casos, tomadas as cautelas


contra o perigo de idolatría; o Senhor nao somente permitiu,
mas até mandou que se confeccionassem imagens sagradas, a
fim de elevar a piedade de Israel.

a) Foi, por exemplo, o que se deu na fabricagáo da Arca


da Alianga: por ordem explícita de Javé, Moisés colocou dois
querubins de ouro sobre o Propiciatorio da Arca, tendo as asas
voltadas para o alto e as faces dirigidas para a placa sagrada
de metal; era pelo Propiciatorio assim configurado que Javé
falava ao seu povo; cf. Ex 25,17-22. Em vista disto, a Biblia
costuma dizer que «Javé está assentado sobre querubins»;
cf. ISm 4,4; 2Sm 6,2; 2Rs 19,15; SI 79,2; 98,1.

b) No Templo construido por Salomáo, diz o texto


sagrado que foram confeccionados querubins de madeira pre
ciosa para ficar junto & Arca da Alianga (cf. IRs 6,23-28);
e mais: as paredes do Templo foram todas revestidas de imagens
de querubins (cf. IRs 6,29s). Tais obras se fizeram, sem dúvida,
com a ordem ou a aprovagáo do próprio Deus (cf. lCr 22,8-13),
que, já no deserto, «comunicara a Beseleel o seu espirito —
espirito de sabedoria, inteligencia e ciencia — para realizar

— 414 —
E AS IMAGENS SAGRADAS? 63

toda especie de obras, para conceber e executar projetos de


obras em ouro, prata e bronze... assim como para talhar a
madeira» (cf. Ex 31,1-5). Vé-se assim com que aprego Deus
considerava as esculturas de seu Templo, já mesmo no regime
do Antigo Testamento.

c) Durante a travessia do deserto, o povo de Israel foi


acometido por serpentes cuja mordedura fez perecer muita
gente. Foi entáo que o Senhor Deus ordenou a Moisés que
fizesse urna serpente de bronze e a colocasse sobre urna haste;
todo aquele que, mordido, a contemplasse, seria salvo.
Cf. Nm 21,4-9.

d) O mar de bronze ou reservatório de agua lustral colo


cado á entrada do palacio de Salomáo era sustentado por doze
bois de metal, dos quais tres olhavam para o Norte, tres para
o Oeste, tres para o Sul e tres para o Leste; cf. IRs 7,23-26.

e) Havia também entre os ornamentos do palacio regio


de Salomáo figuras de leóes, touros e querubins; cf. IRs 7,28s.

Estes textos dáo a ver que a proibigáo de confeccionar


imagens nao era absoluta no Antigo Testamento, mas condicio
nada por circunstancias em que vivia o povo de Israel. A
própria Tradigáo de Israel foi aos poucos interpretando com
certa flexibilidade a proibigáo do Decálogo. Tenham-se em
vista, por exemplo, certas sinagogas da Palestina do sáculo III
d.C, onde se encontraram aíreseos e figuras humanas. Seja
citada também a sinagoga de Dura-Europos (á margem do rio
Eufrates), na qual estavam representados Moisés diante da
sarga ardente, o sacrificio de Aaráo, a saida do Egito, a visáo
de Ezequiel.

1.2. No Novo Testamento

Passaram-se os séculos... O mesmo Senhor que se man-


tivera invisível, quis tomar corpo humano e viver na térra; quis
assim dirigir-se aos homens mediante urna figura (a do Cristo
Jesús), que, sem dúvida, devia ser ímpressionante. Em sua
pregagáo, Jesús houve por bem ilustrar as realidades transcen-
dentais (o Reino de Deus, a Misericordia do Pai, o dinamismo
da graca...) mediante imagens inspiradas pelas realidades
visíveis; tal foi o significado das parábolas e alegorías utilizadas
pelo Divino Mestre, que aludiu aos lirios do campo, á figueira,

— 415 —
64 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

aos pássaros do céu, ao bom pastor, á videira e a seus ramos,


as criangas que brincam na praga pública, á mulher que perdeu
sua moeda, ao administrador infiel, aos operarios chamados á
vinha...

Ademáis a evolugáo das culturas fez que o ambiente greco-


-romano fosse menos dado á magia e mais penetrado pela filo
sofía do que o dos povos primitivos. Isto veio permitir melhor
compreensáo do alcance da Encarnagáo do Senhor e das
imagens sagradas.

2. Um pouco de historia

Nos primeiros sáculos do Cristianismo, aínda se Iéem


testemunhos de escritores cristáos, que apontam mal-entendi
dos ou abusos por parte dos fiéis no uso das imagens. Outros
mostram-se hesitantes quanto á validade do uso das imagens.
Tal é, por exemplo, o testemunho de Minúcio Félix no século III:
"Que Imagem poderla eu confeccionar para representar Deus, dado
que o homem mesmo é a imagem de Deus?" (Octavlus 32, Patr. latina,
ed. Mlgne, 3,339a).

"O próprlo homem é a imagem viva de Deus", els o argumento que


Clemente de Alexandria (t antes de 215) repete, acrescentando ainda um
adagio freqüente na Igreja antlga: "Viste teu rmfio, viste teu Deus"
(Stromatels I 19 e II 15, PG 8,812 e 1009).

Todavía os cristáos foram percebendo que a proibigáo de


fazer imagens no Antigo Testamento tinha o mesmo papel de
pedagogo (condutor de criangas destinado a cumprir as suas
fungóes e retirar-se) que a Lei de Moisés em geral tinha junto
ao povo de Israel. Por isto o uso das imagens foi-se implan
tando. As geragóes cristas compreenderam que, segundo o
método da pedagogía divina, atualizada na Encarnagáo, de-
veriam procurar subir ao Invisivel passando pelo visível que
Cristo apresentou aos homens; a meditagáo das fases da vida
de Jesús e a representagáo artística das mesmas se tornaram
recursos com que o povo fiel procurou aproximar-se do Filho
de Deus.

Considerem-se os antigos cemitérios cristáos (catacumbas),


onde se encontram diversos afrescos geralmente inspirados pelo
texto bíblico: Noé salvo das aguas do diluvio, os tres jovens
cantando na fornalha, Daniel na cova dos leóes, os páes e os
peixes restantes da multiplicagáo efetuada por Jesús, o Peixe
(Ichthys), que simbolizava o Cristo...

— 416 —
E AS IMAGENS SAGRADAS? 65

Ñas igrejas as imagens tornaram-se a Biblia dos iletra


dos, dos simples e das criangas, exercendo fungáo pedagógica
de grande alcance. É o que notam alguns escritores cristáos
antigos:

"O desenlio mudo sabe falar sobre as paredes das igrejas e ajuda
grandemente" (S. Gregorio de Nissa, Panegírico de S. Teodoro, PG 46, 737d).

"O que a Biblia é para os que sabem ler, a Imagem o é para os


iletrados" (Sao Joüo Damasceno, De imaginlbus I 17 PG 94, 1248c).

O Papa Sao Gregorio Magno (f 604) escrevia a Sereno,


bispo de Marselha:

"Tu nao devias quebrar o que fol colocado ñas igrejas nSo para ser
adorado, mas slmplesmente para ser venerado. Urna colsa é adorar urna
Imagem, outra colsa é aprender, mediante essa Imagem, a quem se dirigem
as tuas preces. O que a Escritura é para aqueles que sabem ler, a imagem
o é para os Ignorantes; mediante essas imagens aprendem o caminho
a seguir. A imagem é o livro daqueles que nSo sabem ler"
(eplst. XI 13 PL 77, 1128c).

Nos sáculos VTII e IX verificou-se na Igreja a disputa em


torno do uso das imagens ou a luta iconoclasta. Por influencia
do judaismo, do islamismo, de seitas e de antigás heresias cristo-
lógicas, muitos cristáos do Oriente puseram-se a negar a
legitimidade do culto das imagens. Os imperadores bizantinos
tomaram parte na querela, por motivos políticos mais do que
por razóes religiosas.

Desencadeada sob o Imperador Leáo Isáurico (717-741),


a controversia foi levada ao Concilio de Nicéia II (787), que,
na base dos raciocinios de grandes teólogos como Sao Joáo
Damasceno, reafirmou a validade do culto de veneragáo (nao
adoragáo) tributado as imagens. Com efeito; o Concilio dis-
tinguiu entre latréia (adoragáo), devida somente a Deus, e
proskynesis (veneragáo), tributável aos santos e também ás
imagens sagradas na medida em que estas representam os
santos ou o próprio Senhor; o culto as imagens é, portante,
relativo, só se explica na medida em que é tributado indireta-
mente aqueles que as imagens representam. Assim se pronun-
ciaram os padres conciliares:

"Definimos... que, como as representacSes da Cruz..., assim


também as veneráveis e santas imagens, em pintura, em mosaico ou de
qualquer outra materia adequada, devem ser expostas ñas santas igrejas de
Deus (sobre os santos utensilios e os paramentos, sobre as paredes e os
quadros), ñas casas e ñas estradas. O mesmo se faga com a imagem de

— 417 —
66 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Deus Nosso Senhor e Salvador Jesús Cristo, com as da... santa Máe de
Deus, com as dos sanios Anjos e as de todos os santos e Justos. Quanto
mals os fiéis contemplaren! essas representacóes, mais serfio levados a
recordar-se dos modelos origináis, a se voltar para eles, a Ihes teste-
munhar... urna veneracáo respeitosa, sem que Isto seja adoracfio, pols
esta so convém, segundo a nossa fé, a Deus" (sessSo 7, 13 de outubro
de 787; Denzinger-SchSnmetzer, £nchiridion Symbolonim n? 600s).

É interessante ainda salientar como argumentava o maior


defensor das imagens, que foi Sao Joáo Damasceno (t 749):

"Como fazer a lmagem do Invlslvel?... Na medida em que Deus é


Invlslvel, nao o represento por imagens; mas, desde que viste o Incorpóreo
felto homem, fazes a lmagem da forma humana; já que o Invlslvel se tornou
vlsivel na carne, pinta a semelhanca do Invlstvel" (Tratado sobre as
Imagens I 8 PG 94, 1237-1240).

"Outrora Deus, o Incorpóreo e Invlsfvel, nunca era representado. Mas


agora que Deus se manifestou na carne e habitou entre os homens, eu
represento o 'vlsivel' de Deus. Nfio adoro a materia, mas o Criador da
materia" (Ibd. I 16 PQ 94, 1245a).

A Tradicáo crista reconheceu constantemente o valor


pedagógico e psicológico das imagens como suportes para a vida
de oragáo. Assim, por exemplo, escrevia Jean Gerson
(1363-1429), mestre de espiritualidade:

"Doravante ninguém há tfio simples e Iletrado que possa desculpar-se


de nao saber como viver retamente para ganhar o paraíso, quando ele tem
dlante de si e para si, na representac&o da cruz e do Crucificado, um llvro
ilustrado, escrito, ornamentado multo clara e legivelmente, em que todas
as virtudes sao aprovadas e todos os vicios reprovados" (Moralltó de la
Passlon, em Oeuvres completes, ed. Glorieux, t. 7, París 1966, p. 143).

Santa Teresa de Ávila (t 1582), ao ensinar as vias da


oragáo ás suas Religiosas, dizia:

"Els um meló que vos podará ajudar... Cuida! de ter urna lmagem
ou urna pintura de Nosso Senhor que esteja de acordó com o vosso gosto.
NBo vos contentéis com traze-la sobre o vosso coracfio sem Jamáis a olhar,
mas servi-vos da mesma para vos entreterdes multas vezes com Ele"
(Camino de la Perfección, cap. 43,1).

Foi na base dos argumentos atrás aduzidos que se firmou


na Igreja Católica a veneragáo das imagens, a qual nada tem
que ver com adoracáo de alguma criatura ou com idolatría.

Examinemos agora

— 418 —
E AS IMAGENS SAGRADAS? 67

3. A pos¡;5o protestante

Os Reformadores do sáculo XVI reagiram contra os


excessos do culto das imagens existente na Idade Media deca
dente; as suas invectivas provocaram a destruicáo de muitas
imagens. Todavía o próprio Lutero nao foi intolerante, mas,
de certo modo, liberal no caso, como se depreende do texto
abaixo, datado de 1528:

"Tenho como algo deixado á livre escolha as Imagens, os sinos, as


vestes litúrgicas... e coisas semelhantes. Quem nao os quer, deixe-os de
lado, embora as imagens inspiradas pela Escritura e por historias edificantes
me paregam multo útels... Nada tenho em comum com os Iconoclastas'
(Da Cela de Cristo).

Calvino, porém, foi mais radical neste particular, como


atestam os dizeres seguintes:

"Nfio julgo licito representar Deus sob forma vislvel, porque Ele
prolbiu que o flzessem e também porque a sua gloria é assim desfigurada
e sua verdade falsificada. Se nSo é licito representar Deus sob forma
corpórea, tanto menos será permitido adorar imagem em lugar de Deus
ou adorar Deus numa imagem. Por consegulnte, que ninguém pinte ou talhe
senSo as coisas vlslveis ao olho" (Instituíion de la Religión Chrestienne
I, c. 11, n? 12).

A propósito seja lícito observar que nao se trata, para os


católicos, de adorar imagens, mas apenas de adorar a Deus me
diante o estímulo que os sinais visíveis possam oferecer á mente
do cristáo. Este, sendo psicossomático, é sempre sustentado por
elementos sensíveis, mesmo quando exerce os atos da mais
elevada espiritualidade.

A tradigáo protestante permaneceu avessa 6s imagens até


os últimos tempos. Recentemente, porém, novas vozes ai se
fizeram ouvir, como se pode depreender das Atas do VUI Con-
gresso Evangélico de Arte Sacra realizado em Karlsruhe
(Alemanha) no ano de 1956. Duas teses bem distintas se de-
frontaram nos debates:

a) os Reformados (calvinistas) defendiam a opiniáo,


tradicional entre os protestantes, de que as imagens sao contra
rias & Escritura Sagrada e acarretam o perigo de idolatría;

b) Os luteranos, porém, replicaram que o preceito de


Cristo mandando aos discípulos pregar o Evangelho em todas
as línguas, incluí também o uso da linguagem figurada do

— 419 —
68 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

artista (pintor ou escultor). Lembravam que a Biblia se serviu


de imagens, palavras de sentido metafórico, para exprimir ver
dades divinas; Cristo mesmo falou em metáforas variadas, de
sorte que o pintor protestante Rembrandt nao hesitou em pintar
cenas dos Santos Evangelhos. Acrescentavam os luteranos que
quem, com Lutero, reconhece na música o veículo apto da fé
e do amor dos cristáos, nao pode deixar de reconhecer também
ñas representacóes óticas aptíssimo instrumento para exprimir
a verdade revelada. Por que admitir, de um lado, as impressóes
auditivas na catequese e no culto e, de outro lado, rejeitar as
impressóes visuais? Estas parecem ainda mais eficientes do que
aquelas (documentagáo colhida no semanario «Der christliche
Sonntag», Herder, 14 Oktober 1956, 327).

Assim é que a antiga cláusula de Ex 20,4, dada ao povo


de Deus ainda muito rude, vai sendo, entre os próprios pro
testantes, mais e mais interpretada á luz do conjunto da Reve-
lacáo, que é toda irradiada pela Encarnacáo do Filho de Deus.

Resta dizer breve palavra sobre

4. A vigilancia da Igreja

As imagens, licitas como sao, podem sempre acarretar o


perigo de exageros e abusos na piedade católica. Conseqüen-
temente, as autoridades eclesiásticas, ao mesmo tempo que
aproveitam a veneragáo relativa das mesmas, tém exercido
controle sobre os tipos de imagens utilizadas no culto cristáo;
nunca poderáo ser inspiradas únicamente pelo esteticismo ou
pela devogáo popular exuberante, fantasista.

Assim é que o Papa Urbano VIII em 1629 condenou a


representacáo da Santissima Trindade sob a forma de .um
tronco humano com tres cabegas (monstruosidade!). Em 1745
Bento XIV rejeitou a cena de tres pessoas humanas sentadas
urna ao lado da outra para significar a Trindade Divina. Urna
das principáis razóes dessas reprovacóes é que o Espirito Santo
nunca apareceu sob forma humana; a Igreja quer que a arte
crista, para representar as Pessoas Divinas, só reproduza ele
mentos mediante os quais estas aparecem na historia sagrada
ou na Biblia: assim ao Filho será de todo oportuno atribuir
figura humana; ao Espirito Santo só convém os símbolos da
pomba (tenha-se em vista o batismo de Jesús, em Mt 3,16)

— 420 —
E AS IMAGENS SAGRADAS? 69

ou das linguas de fogo (cf. a narrativa de Pentecostés, em


At 2,3); quanto ao Pai Eterno, é representado por ura Dedo
ou urna Máo, sinais de agáo e poder (note-se a expressáo de
Jesús em Le 11,20: «Se é pelo Dedo de Deus que expulso os
demonios...») ou pelo tipo de um Andáo, consoante a pro
fecía de Dn 7,9, que vé o Filho do homem adiantando-se em
direcáo de venerável e antigo Varáo de cabeleira branca, sen
tado sobre um trono.

De modo especial, com vistas a catequese, os Bispos fran


ceses promulgaran! certas diretrizes que devem orientar a con-
fecgáo de imagens para criangas:

1) Sao desejáveis

a) as imagens que eduquem a fé, isto é, que facam pen


sar ñas realidades sobrenaturais e despertem auténticos sen-
timentos de fé e de piedade;

b) as imagens que levem em conta as reagóes da crianga,


e nao as dos adultos;

c) as imagens que sejam concebidas dentro de certa


preocupagáo com a estética e nao sejam feudo de alguma
escola particular;

d) as imagens que nao apresentem pormenores inúteis


aptos a desviar do essencial a atengáo das criangas;

e) as imagens que utilizem cor e movimentagáo, a fim


de melhor prender a atengáo e o interesse das criangas; toda
vía, sem exageros.

2) Sao desaconselhadas

a) as imagens que tratem o invisível com os mesmos


tragos concretos das realidades visíveis; assim os anjos confi
gurados, sem mais, a seres humanos;

b) as imagens que sejam capazes de impressionar e agra


dar, mas nao suscitem sentimentos de fé e de piedade; por
exemplo, aquelas que apresentam os personagens sagrados
com semblante de boneca ou com expresionismo humano car-
regado demais, como sao as imagens da Virgem SS. em geral
e as de S. Joáo Evangelista na última ceia produzidas por
certos artistas do Renascimento (sáculo XVI);

— 421 —
70 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

c) as imagens que as mangas nao possam fácilmente


compreender, por serem demasiado abstratas.

3) Sao condenadas

a) as imagens que transmitam falsa nogáo da realidade,


como, por exemplo, a do Menino Jesús pregado a Cruz ou
detido no tabernáculo do altar ou imagens muito sentimentais;

b) as imagens que contribuam, na mente das pessoas


simples, para ridicularizar algum personagem sagrado, algum
misterio da fé ou os ritos da Liturgia. Cf. La Documentation
Catholiqu© 15/09/1957.

Estas normas, sabias e prudentes como sao, merecem


plena atengáo, visto que as imagens sao veículo de instrucáo
do povo de Deus. Sejam, pois, plenamente conformes á men-
sagem que elas devem transmitir.

Etn conclusao: verifica-se que o culto de veneragáo rela


tiva atribuido ás imagens foi sendo paulatinamente integrado
no patrimonio da vida da Igreja; tem o seu fundamento no
misterio da Encarnagáo do Filho de Deus, que evidenciou o
caráter provisorio da proibigáo do Éxodo e a utilidade de
representagóes sensíveis para o bom desempenho da catequese
e o estímulo da oragáo. Nao seria cristáo recusar a arte na
medida em que ela pode ser via de acesso a Deus. Por con-
seguinte, a Igreja proclama: nem o iconoclasmo nem o culto
supersticioso e mágico das imagens. A cada cristáo toca pes-
soalmente fazer o uso das imagens que melhor corresponda
as suas disposigóes e necessidades pessoais: enquanto uns sao
altamente beneficiados por representagóes sensíveis, outros as
dispensam quase por completo. Na verdade, as imagens sao
um meio, nao um fim. Todavía que ninguém negué a legiti-
midade do uso moderado e teológicamente fundamentado das
mesmas!

A propósito:

Plerre Michel, Images (cuite des), em DIctlonnaire de Splrituallté,


vol. Vil, París 1970, cois. 1503-1519.

D. Stlemon, Images (cuite des salmea), em Cathollelsme Hler,


Aujourd'hul, Demaln, t. V. cois. 1244-1250.

— 422 —
A solucáo moderna para todos os problemas?

"Os Poderes de Jesús Cristo"


por Lauro Trevisan

Em ahítese: O novo Hvro de Lauro Trevisan sobre "Os Poderes de


Jesús Cristo" é mais urna expressáo da filosofía pantetsta ou nSo crista do
autor. Embora guarde vocábulos e nomes da terminología católica, Lauro
Trevisan se distancia do conteúdo católico de tais palavras. Em conseqüen-
cla, Jesús Cristo aparece na obra como um grande Avatar ou manlfestacSo
da Dlvlndade (no sentido budista); o homem Jesús é gerado como Fllho
de Deus pelo Espirito Santo por ocasláo do Batismo; por conseguinte, nfio
é Deus e Homem desde o inicio da sua encarnagio no selo da Virgem.
O Pal e o Espirito Santo s9o tidos como forcas ou poderes mentáis, de
modo que se dlssolve o misterio da SS. Trlndade. A fé significa crer no
poder do pensamento e da palavra; orar é proferir a palavra correspondente
ao desejo que o sujelto concebe; quem désela algo ardentemente e eré
que o alcancará, conseguirá realmente tal objeto (saúde, riqueza, carro,
geladelra..,), desde que saiba aclonar as forcas da mente. A oraefio, por-
tanto, tem significado mecanielsta; é comparada ao ato de "ligar urna
tomada para obter corrente elétrica". Lamentavelmente o novo llvro de
Trevisan deturpa, por completo, os conceitos crlstáos a que alude, iludlndo
grande número de leltores, que, em última Instancia, desejam paz e feli-
cldade, mas se tornam vltlmas de graves males físicos e psíquicos provo
cados pelos cursos de controle da mente.

* * *

Comentario: Lauro Trevisan já é conhecido aos leitores


de PR pela recensáo do seu livro «O Poder Infinito de sua
Mente» publicado em PR 263/1982, pp. 299-309. L. Trevisan
editou, seguindo a orientacáo de tal obra, um novo livro inti
tulado «Os Poderes de Jesús Cristo» 1. Neste livro o autor
considera de mais perto Jesús Cristo e os seus feitos maravi-
lhosos. Visto que a mensagem de Trevisan está sempre em
foco no grande público, parece oportuno comentar nestas pági
nas também a maneira como o autor considera a figura de
Jesús Cristo.

1. O conteúdo do livro

A análise de «O Poder Infinito de sua Mente» levou-nos


a conclusáo de que Lauro Trevisan compartilha a filosofía
panteísta, segundo a qual Deus, o homem e o mundo consti-
tuem urna única realidade em evolucáo. Esta tese se torna
ainda mais evidente na obra sobre Jesús Cristo.
* Editora e Distribuidora da Mente, Santa María (RS), 13B x 210 mm,
266 pp.

_ 423 —
72 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

1.1. Jesús e a SS. Trindade

1. Jesús Cristo é tído como «o maior fenómeno da nossa


historia» (p. 19), Agüele que veio ensinar aos homens as leis
da mente e do universo, leis que só agora no século XX váo
sendo devidamente entendidas.

Jesús existia como o filho do homem ou como simples


homem até o dia do seu Batismo. Nesta data foi gerado o
Cristo, o Filho de Deus; tornou-se «o Cristo, o Iluminado, o
Messias, o Salvador, o grande Avatar» (p. 59). «O Espirito
Santo gerou o Cristo no Batismo» (p. 37).

As concepcoes trinitarias de Lauro Trevisan sao alta


mente confusas, pois os nomes «Pai, Filho e Espirito Santo»
sao mantidos, mas recebem significado diverso do clássico, de
acordó com os principios panteistas do autor. Eis, por exem-
plo, urna das passagens em que L. Trevisan explana o mis
terio de Deus:

"O Pal é o Poder Divino Imánente no subconsciente de Jesús. O Pal


é o realizador, o executante, o operador..."

"Jesús é o Eu consciente, o que pensa, a personalidade exlstenclal


no tempo. Jesús é o ser vlslvel, que fala, vé, ouve, toca, decide, determina,
resolve, escolhe".

"O Espirito Santo, Espirito Paráclito, é a Sabedorla Infinita, que tudo


sabe e que procede do Pai que habita no subconsciente de Jesús" (p. 27).

A confusao persiste, por exemplo, nos dizeres abaixo:

«Jesús fazla da sua pregacSo o Camlnho novo para urna nova existen
cia; o Pal, que se manlfestava nele, era o Poder criador da vida em todas
as dlmensSes, e o Espirito Santo, que asslstla Jesús, através do Pal,
assegurava a Verdade dos seus ensinamentos. Desta trindade nascla o
Poder de Jesús" (p. 28).

Estes dizeres, como se vé, guardam a clássica termino-


logia, mas nao ressalvam o significado atribuido á SS. Trin
dade, que preexiste á encarnagáo do Verbo ou do Filho de
Deus; as tres Pessoas Divinas existem desde todo o sempre;
na plenitude dos tempos, Deus Filho assumiu a natureza hu
mana, foi Deus e homem desde o primeiro instante de eua
encamacáo; o Batismo nada acrescentou á sua realidade onto-
lógica, mas contribuiu para revelar Jesús ao mundo pela voz
do Pai e o testemunho do Espirito Santo.

— 424 —
OS PODERES DE JESÚS CRISTO 73

2. A expressáo Avatar que L. Trevisan aplica a Jesús


repetidamente (cf. pp. 25. 57), é de origem budista-panteísta.
Avatar vem a ser, segundo esta corrente de pensamento, urna
manifestagáo excelente da Divindade, tal como se deu em
Buda, em Krishnamurti! A designacáo de Jesús como Avatar,
por conseguinte, leva o leitor ao mundo do panteísmo.

3. L. Trevisan admite tenha Jesús realizado viagens de


aprofundamento fora da Palestina, seguindo neste ponto a
tese de autores esotéricos, que nao yéem em Jesús senáo um
grande homem iniciado ñas ciencias ocultas e dotado de
extraordinarios poderes mentáis:

"Pouco ou nada se sabe dos estudos de Jesús, da sua Iniclafáo e até


mesmo de posslvels viagens de aprofundamento, pois com toda a certeza
o Fllho do Homem deve ter cultivado o mals elevado grau de conheclmentos
humanos, esplrltuals e sobrenaturals.

Há escritores que falam em viagens pelo Egito, pela China, pela


Grecia, pela Caldéia, pela Pérsla, pela Alexandrla, por Heliópolis e outros
lugares..." (p. 57).

A propósito é de se ponderar: quem admite que Jesús


tenha viajado para se instruir, reduz a figura de Jesús á de
homem,... mero homem que nao veio trazer ao mundo a
Revelagáo consumada do Pai, mas apenas os conhecimentos
«místicos» de outros homens.

4. Outro tópico tirado do panteísmo-ocultismo é a tese


do «terceiro-olho»... Com efeito; em Me 11,35, Jesús disse:
«Teu olho é a lámpada do teu corpo. Se teu olho for sim
ples, estará em luz todo o teu corpo». — Ora, segundo Tre
visan, «parece claro que Jesús se refere ao terceiro olho, tam-
bem chamado terceira visáo, olho de Ciclope, olho de Shiva,
olho Crístico.

Segundo entendidos, este olho se sitúa no centro da testa,


á altura do final do nariz. Talvez vocé até já tenha visto em
gravuras a ilustracáo desse olho entre os dois olhos físicos.

Trata-se de um olho mental ou espiritual. Mas verda-


deiro.

Hoje parece um olho desativado. Mas Jesús, que conhe-


cia profundamente todos os caminhos das ciencias ocultas e
mentáis, sabia que esse olho, que seria a fonte do poder, pode
ser conduzido para o bem ou para o mal» (p. 228).

— 425 —
74 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Será que Lauro Trevisan quis colocar Jesús na linha de


autores como Lobsang Rampa, que escreveu um livro inteiro
sobre «A Terceira Visáo», cedendo a exuberante fantasía?
O fato é que, em apoio de sua tese do «terceiro olho», L. Tre
visan cita também Huberto Rhoden, que é um autor imbuido
de panteísmo oriental (cf. p. 229). O mesmo Trevisan recorre
a afirmacóes de Emmet Fox e Spencer Levis, cujos escritos
sao de inspiracáo panteista (cf. pp. 237s).

Passemos agora a outro trago importante do livro.

1.2. Müagres de Jesús. Fé e Orajcío

1. Jesús, na sua vida pública, realizou muitos prodigios,


devidos ao poder de sua mente e ao conhecimento que tinha
das leis e dos principios universais: «Quem conhece a causa
e o principio da energía, saberá produzir e usar a energía»
(p. 47). Lauro Trevisan percorre os milagres realizados por
Jesús, conforme os Evangelhos, e tenta mostrar que cada qual
foi praticado mediante aplicacáo de forcas mentáis. Em última
análise, segundo Trevisan, o desencadeamento das forgas men
táis pode ser chamado Fé:

"A Leí da Sugestfio, a Leí do Hipnotismo, as Lels da Cura através da


mente, a Leí do Mllagre e tantas outras tém como explosivo energético a
forca a que Jesús deu o nome de Fé" (p. 49).

A fé, portante, é urna energía poderosa que todas as pes-


soas tém em si, «apta a remover montanhas e curar toda
especie de doengas... é o mais fantástico explosivo interior»
(P-49).

«Quando urna pessoa acredita que a sua palavra produz


a realidade do seu conteúdo, está usando a leí da fé, que neste
caso coincide com a lei natural da sugestáo» (p. 50).

A fé é todo-poderosa: é capaz de alcancar «casa, em-


prego, viagem, amor, casamento,... riqueza, dinheiro, carro,
geladeira, cura do cáncer, cura da paralisia..., dominio da
natureza, poder sobre os animáis, sobre a materia, sobre as
plantas,... regeneragáo de células, redencáo espiritual, e mais
e mais e mais e mais» (p. 52).

— 426 —
OS PODERES DE JESÚS CRISTO 75

2. Para ativar a fé, basta orar. E orar é acreditar que


quem deseja com grande confianga, alcanga o que déseja; orar
nao é propriamente um diálogo filial do homem com Deus,
mas é ativagáo da energía mental que cada um traz dentro
de si:

"O seu pensamento acreditado já é seu pedido. É por isso que


dlzem os mestres da mente que todo pensamento acreditado e persistente
sempre acontece. A maneira pela qual vocé se comunica com o Poder
Divino é através do seu pensamento. Este é o vefculo que aclona o expío*
slvo da fé; este é o caminho que leva ao Pai, ao Poder Divino. Orar é
pensar. Orar é falar o seu pensamento. Orar é expressar o que val no seu
interior; orar é dlzer o que vocé quer que acontece na sua vida Interior
e exterior" (p. 53).

Daí concluí L. Trevisan:

"EntSo crie, pela palavra, a sua casa, o seu salarlo, o seu emprego,
a sua comida, a sua vestimenta, o seu bem-estar, e o Pal tudo providenciará"
(pp. 235s).

"Quanlo ás riquezas, é so pedir e pronto. Porque a palavra, o pen


samento acreditado, produz a realldade física do seu conteúdo" (p. 235).

É á luz destas afirmacóes que L. Trevisan interpreta as


palavras de Jesús: «Quem tem fé em mim, fará as obras que
fago, e fará obras maiores do que estas» (Jo 14,12). Cf. p. 181.

A oragáo assim entendida tem aspecto mecanicista e


mágico. É atividade que infalivelmente produz o seu efeito
— mesmo os mais ousados efeitos — desde que o «orante»
siga fielmente as regras do jogo:

"O pensamento cria, o desejo atrai, a fé realiza.

Tudo o que vocé pede e acredita que, pelo fato de pedir, recebe
Infalivelmente, receberá.

Esta é urna lei que nfio falha. Se vocé colocar as premissas córrela-
mente, o resultado nunca pode falhar.

Acredito que esta foi a grande lei enslnada por Jesús. Esta lei tem
a forca de curar as doencas, gerar abundancia, mudar o temperamento,
produzir bem-estar, criar paz, alegría e calma, realizar os desejos de amor
de qualquer pessoa. Grande Leí. Grande Leí.

Quando vocé pede algo e nSo alcanca, nao desconfie da veracldade


desta lei, porque a leí nlo pode falhar. Veja onde vocé falhou. Procure
a causa em vocé e nSo na lei.

— 427 —
J6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Se vocé coloca urna tomada na sua casa e ela nSo liga, vocé val
tratar de rever a llgacfio da tomada, nfio é mesmo? Porque eletrlcldade
vocé sabe que tem na sua casa. Tanto é verdade que outras lampadas
e tomadas estfio ligadas e funclonam. Assim é com a leí do PEDÍ E
RECEBEREIS" (p. 2303).

3. A filosofía panteista que está na base do conceito de


oracáo de Lauro Trevisan, aparece nítidamente no trecho
abaixo:

"Quanto mais vocé estlver em comunhfio com a Fonte do Poder, mals


voce verá manar de si a córrante e o fluxo poderosos que realizam milagro.
Estado de oracfio é o mesmo que nivel Alfa, para usar terminología mals
atual.

Vocé alcance o estado de oracfio ou nivel Alfa, atravós da meditacfio,


da calma, do relax...

Quando voce se concentra, Já está em estado de oragáo. Neste caso,


o cerebro pulsa numa media de 14 ciclos por segundo.

Quando voce está em estado de oracfio... vocé está em estado


elevado. A mente, espiritualizada, está em comunhfio com todo o universo
e em harmonía com a materia, com as plantas, com os animáis e com todos
os seres humanos. lAbrem-se as comportas dos nlvels interiores de tele
patía, clarividencia, poder curador. Neste estado vocé entra em contato
com o Pal...

Fago o seu pedido, visualiza o que deseja ardentemente, grave fundo


no subconsciente. O Pal, que está no secreto, de onde nasce a sua oracfio,
atenderá" (pp. 55s).

Vé-se que o texto é obscuro: «o Pai está no subcons


ciente», diz Trevisan. Perguntamos: está como forca neutra
a ser ativada pelo consciente do individuo? Alias, diz Tre
visan, corroborando a nossa impressáo de que Deus e urna
energia neutra a ser hábilmente (e mágicamente) acionada:

"Nfio pertence ao Pai examinar e julgar, mas executar, realizar. Deus,


que habita o ámago do seu ser, sempre atando ao seu pensamento... Nao
analisa. Nfio julga" (p. 221).

Pergunta-se aínda: que quer dizer a frase «Deus é em


vocé a resposta literal dos seus pensamentos e agóes» (p. 208) ?

4. A oragáo em muitos casos nao parece ser mais do


que o encontró do consciente do individuo com o seu subcons
ciente, no qual habita Deus (= Poder Infinito). Repetida
mente léem-se no livro de L. Trevisan afirmagóes como esta:

— 428 —
OS PODERES DE JESÚS CRISTO 77

"Há, na verdade, em vocé o poder criador da palavra.

O Poder Infinito, existente em cada criatura humana, no amago do


seu ser, no subconsciente, sempre atende ao pensamento, á palavra
acreditada...

Sonriente quando urna pessoa se eleva Interiormente é que consegue


chegar ao Pal, ao Poder Divino, que habita o ámago de cada ser humano.

Através do pensamento, da palavra, da Idéla, da fmagem, enflm da


crlacSo mental, a pessoa atinge o poder do subconsciente. Mas, para
atingir o Pal, o Poder Divino, precisa alcancar um outro estágio mental...
precisa harmonizar positivamente a mente consciente com a mente
subconsciente.

A melhor manelra de atingir esse estágio interior ó, segundo Jesús,


pela oracfio. Por oracSo entende-se a palavra harmoniosa, elevada, positiva,
atlvada pela fé.

Quando vocé está em estado totalmente positivo, vocé está ligado ao


Pai. O Pal é o Poder do Bem" (pp. 184s).

Estas linhas doutrinárias, que perpassam o livro inteiro,


sao suficientes para dar nogáo do conteúdo filosófico-teológico
da nova obra de L. Trevisan.

Procuremos agora formular

2. Urna avdragáo

Eis o que nos ocorre observar a respeito dos pontos atrás


expostos.

2.1. A figura de Jesús Cristo

L. Trevisan guarda a terminología católica referente a


Jesús Cristo: filho do Homem, Messias, Salvador, Filho de
Deus..., podendo dar a impressáo de estar professando a
clássica doutrina ortodoxa a respeito de Cristo,... doutrina
ortodoxa enriquecida, talvez, por proposigóes da psicología
moderna.

— 429 —
78 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

Ora tal nao é o caso. Examinando bem a figura de Jesús


apresentada pelo autor do livro, verifica-se que é a de um
personagem humano extraordinario, dotado de poderes parap-
sicológicos e de raro conhecimento das leis da natureza (enten
dida em sentido panteísta). Os diversos seres, humanos e nao
humanos, neste mundo estariam ligados entre si por urna rede
de energías: a maioria dos homens, nao conhecendo tal rede,
nao a utiliza; Jesús a terá conhecido e utilizado; mas os seus
segredos nao foram reconhecidos pelos seus discípulos até os
nossos dias, guando «grandes psicólogos» (como Lauro Tre-
visan) descobrem tais segredos e os aplicam para curar doen-
cas e fazer prodigios maiores do que os de Jesús!

Assim o Evangelho, após quase 2000 anos, se torna ple


namente revelado aos cristáos e ao mundo!

Como se vé, tal concepcáo concernente a Jesús nao é crista.


É a das escolas ocultistas e panteistas. Nao se salvam ai a
Divindade de Jesús Cristo nem as verdades do Credo: encar-
nagáo do Filho de Deus, Páscoa salvífica do Senhor, Igreja
como Corpo Místico de Cristo...

Está claro que também o misterio da SS. Trindade é


totalmente esvaziado por tal teoría. Embora o autor fale do
Pai, do Filho e do Espirito Santo, guardando algo da termi
nología do Evangelho, nao entende tais termos como a fé cató
lica os entende; mas torna-os sinónimos de forcas mentáis
entendidas panteísticamente. Tenham-se em vista principal
mente as explanagóes das pp. 27s. 221. — £ de notar, alias,
que muitos títulos e subtítulos dos capítulos do livro sao sim-
plesmente frases do Evangelho, de modo que o leitor pode
julgar estar diante de um comentario do texto bíblico, quando
na verdade este serve apenas de ocasiáo para L. Trevisan
expor as suas idéias, diametralmente opostas ta doutrína do
Evangelho; cf., por exemplo, cap. 14 (pp. 217-236), cap. 15
(pp. 237-245).

2.2. Fé « era(5o

Nao resta dúvida de que as nocóes de fé e oracáo apre-


goadas por L. Trevisan nada tém que ver com os conceitos
cristáos homónimos.

— 430 —
OS PODERES DE JESÚS CRISTO

A doutrina católica ensina que a £é é a adesáo do homem


a Deus que fala e se revela á criatura (cf. Constituigáo Dfii
Verbum n» 2). Essa revelagáo divina comunica ao homem
verdades a respeito da vida divina intratrinitária e no tocante
ao plano de salvagáo que foi levado á sua plenitude pela encar-
nagáo do Verbo. Ter fé, para o cristáo, é aceitar as verdades
reveladas como sao professadas pela Igreja desde os tempos
dos Apostólos. Está claro que a fé implica outrossim con-
fianga na Providencia Divina. Essa confianza, porém, nao dis-
póe de forgas mágicas para obter ou para produzir infalivel-
mente tudó que ocorra á mente do cristáo. Este é filho de
Deus e dirige-se ao Pai por Cristo no Espirito Santo (cf. Ef
2,18), sugerindo com humildade a Deus as dádivas que ele
julgue necessárias para chegar á vida eterna através das estra
das deste mundo. O Pai do céu pode nao conceder ao orante
o que este sugere, mas sempre lhe atenderá, dando-lhe outras
gracas que concorram para o verdadeiro bera do orante. Diz
o Senhor através do Profeta Isaías: «Os meus planos nao sao
os vossos planos; os meus caminhos nao sao os vossos cami-
nhos... Quanto os céus estáo elevados ácima da térra, tanto
se acham elevados os meus caminhos ácima dos vossos pla
nos» (Zs 55,8s).

Nao há energías emitidas pelo cristáo e todo-poderosas.


Nem a oragáo se pode confundir com tal nogáo fantasista.

2.3. Reflexóo final

Os livros e cursos de Lauro Trevisan fascinam muitas


pessoas, inclusive católicas, pois parecem atender ao anseio
de solugáo de problemas que movem a sociedade de nossos días,
táo atribulada a diversos títulos.

Nao poucos católicos, mal formados na doutrina da fé,


deixam-se seduzir pelas promessas de «redengáo» trazidas por
Lauro Trevisan, pois tais promessas estáo «envernizadas» por
frases do Evangelho.

— 431 —
80 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

tos de fé e saibam descobrir no Evangelho auténticamente


entendido e vivido respostas muito mais sólidas do que agüe
las que o autor do livro apresenta.
O poder da sugestáo — que Trevisan identifica com fé e
oracáo — pode produzir efeitos positivos, mas sao efeitos mo
mentáneos e provisorios, que geralmente nao tocam no ámago
dos problemas que o homem traz em si. Ao contrario, con
firma os pacientes numa visáo antropocéntrica (fazendo do
homem o centro do mundo, em lugar de Deus); ora tal visáo
é insuficiente para satisfazer as grandes aspiragóes do ser hu
mano; este foi feito por Deus e para Deus, e somente em Deus
repousa. Enquanto os terapeutas quiserem dizer a seus clien
tes que a felicidade está simplesmente em conseguirem realizar
todos os seus sonhos temporais (riqueza, saúde plena, casa
própria, carro, geladeira...), estaráo iludindo o homem e
sujeitando-o a decepcóes no plano espiritual e graves males no
plano físico.
Com efeito. As repercussóes daninhas para a saúde física
e psíquica decorrentes dos cursos de treinamento mental tém
sido estudadas por médicos, que vém alertando a populacáo a
respeito dos abusos cometidos pelos instrutores de tais cursos.
Tenha-se em vista, entre outros, o livro da equipe de médicos
de Sao José dos Campos que é apreciado em FR 268/1983,
p. 261.
Prepondere a sá razáo sobre a emotividade cega, e mui-
tos erros, muitos males seráo evitados.

(Continuagáo da pág. 42)

O ponto nevrálgico e deficiente de toda a síntese trilógica


é precisamente a negacáo do inconsciente e da influencia dos
fatores inconscientes sobre o comportamento do homem. Nor-
berto Keppe, de certo modo, substituí o inconsciente pelo demo
nio em nome do esplritualismo ou do antimaterialismo — o
que nao é teológico nem científico.
Pergunta-se, para terminar: visto que o autor tem evo-
luido em seu pensamento, será que ainda chegará a rever as
suas posicóes exageradas referentes á atuagáo do demonio no
mundo? E será que compreenderá melhor o papel da Igreja
através dos séculos e em nossos días?
Fazemos votos para que sim, a fim de que se possa salvar
o que de bom e válido traz ao' público a Trilogía Analítica.
Estevao Bettencourt O.S.B.

— 432 —
Urna nova Escola:

A Trilogia Analítica

Em sfntese: A Trilogía Analítica se devem reconhocer dols grandes


méritos:

— o de tentar a conclllacSo entre pslcanállse e fé religiosa — colsa


que Freud rejeltou, de modo a caracterizar a pslcanállse ortodoxa;

— o de excitar o paciente á corregáo de suas falhas moráis (inveja,


megalomanía...) ou o de provocar a conversfio pessoal e o reescalona-
mento dos valores (colocando-se Deus e os bens esplrituals em primeiro
lugar).

Todavía o papel atribuido pela Trilogía Analítica ao demonio é


exagerado. A fé crista admite a existencia do demonio e a sua atuacfio
no mundo (cf. Ap 12,13-17), mas, sempre que algum fenómeno lem expli-
cacio psicológica ou parapsicología, a lgre]a a aceita e se dispensa de
o imputar dlretamente ao Maligno.

O ponto nevrálglco e deficiente de toda a sintese trltóglca é precisa


mente a negacáo do Inconsciente e da influencia dos fatores inconscientes
sobre o comportamiento do homem. Norberto Keppe, o fundador da
Trilogia, de certo modo substituiu o inconsciente pelo demonio — o que
nao é teológico nem científico. O poder do inconsciente é fato ampia-
mente comprovado por pesquisas e pela experiencia de todo ser humano.

Comentario: Tem-se imposto ao público estudioso, no


Brasil e no estrangeiro, urna nova Escola de Psicanálise, que
realizou aos 13 e 14 de agosto pp. na cidade de Sao Paulo
o seu I Simposio Internacional de Demonologia, com a parti-
cipagáo de mais de trezentas pessoas, do Brasil e de fora. A
nova Escola deve-se ao Dr. Norberto Keppe, profissional de
formagáo católica em sua juventude, que desenvolveu sua for-
macáo científica em 1958-1960 em Viena (Austria); como
psicanalista freudiano, trabalhou doze anos, inclusive no Hos
pital das Clínicas de Sao Paulo (SP). Ao verificar que a cor-
rente freudiana, materialista como era, nao satisfazia las exi
gencias do ser humano e de válida psicoterapia, voltou-se para
as proposicóes de Melanie Klein e, a seguir, para as de Vürtor
Frankl (donde o livro From Sigmund Freud to Viktor E.
Frankl. Integral Psychoanatysis1). Aos poucos, a experiencia

i Protón Editora, SSo Paulo (SP).

— 433 —
j!2 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

e as reflexóes daí decorrentes fizeram que Norberto Keppe


constituisse sua escola própria, dita «Psicanálise Integral ou
Trilogía Analítica». O nome «Tirlogia» lhe vem do fato de
que tenciona conjugar entre si as proposic.5es da ciencia, da
filosofía e da Religiáo ou do pensamento, do sentimento e da
agáo.

Ñas páginas subseqüentes, examinaremos as grandes


linhas doutrinárias da Trilogia Analítica e lhes acrescentare-
mos alguns comentarios, valendo-nos nao somente dos escritos
dessa corrente, mas também da experiencia colhida em parti-
cípagáo no I Simposio de Demonologia realizado em Sao Paulo
aos 13-14/08/83.

1. Que é a Trilogía Analítica?

Norberto Keppe admite seja o homem composto de corpo


e alma. Distancia-se, porém, de Sigmund Freu na medida em
que nega a existencia de fatores inconscientes ou do Id. Se
gundo o pai da psicanálise, os comportamentos desatinados do
ser humano tém sua raíz em impressóes guardadas no incons
ciente do sujeito; a psicanálise teria a fungáo de detectar tais
fatores inconscientes a fim de facilitar ao individuo a supe-
ragáo dos mesmos.

Ora N. Keppe julga que a tese de Freud é positivista e


materialista. Afirma que a conduta desregrada do ser hu
mano se deve próximamente a tres grandes fatores do próprio
psiquismo humano:

— a inversáo: o individuo coloca os valores importantes


em segundo lugar e se entrega aos devaneios da sua imagi-
nagáo, cujos ingredientes sao dinheiro, sexo, tóxicos...;

— a inveja (de in-videre ou nao ver, segundo N. Keppe):


o individuo nao quer ver a realidade que o cerca (bondade,
afetos, beleza...) e se entrega á destruicjio, á alienacáo, á
inconscientizagáo...;

— a teomania ou megalomania: o ser humano quer ser


Deus e por isto se prejudica e desfigura.

Em última análise, porém, há seres espirituais existentes


fora e independentemente do homem, que instigam os compor
tamentos invertidos, invejosos e megalomaníacos do ser hu-

— 434 —
TRILOGÍA ANALÍTICA 83

mano. Tais sao os demonios, cuja influencia sobre os homens,


em linguagem trilógica, é explicada por telepatía (!) ou por
comunicagáo de maus pensamentos e maus desejos telepáticos.
— Os demonios, em conseqüéncia da sua queda original, nao
tém mais luz nem consciéncia nem amor; por isto eles preci-
sam dos homens para absorver e sugar toda a luz que possam
sugar. Visto que os demonios nao tém consciéncia, julgam que
ainda venceráo o Senhor Deus e seráo superiores a Deus.

Norberto Keppe e sua escola, tendo investigado manico


mios, prisóes, centros kardecistas e umbandistas..., julgam
evidente a atuacáo do demonio ñas pessoas que apresentam
aberracóes moráis, psíquicas e físicas... A humanidade fez
um pacto com o demonio desde Adáo e Eva, e deve em nossos
dias romper finalmente tal pacto.

A cura que a Triologia Analítica propóe aos seus pacien


tes, é obtida pela oonsciéncia. Esta nao tem que ver com norma
da moralidade propriamente dita, mas é «o olhar da eterni-
dade derramado em nosso interior» (N. Keppe, Glorificagáo,
p. 13); é a intuigáo de que a inversáo, a inveja e a teomania
destroem a personalidade. A escola trilógica é geralmente con
traria ao consumo de medicamentos; assim como julga que as
doencas físicas e psíquicas provém de urna desordena de atitu-
des interiores, assim eré que a cura de tais molestias se faz
mediante a corregao de tais atitudes1. Visto, porém, que os
desmandos interiores e exteriores se prendem a agáo do demo
nio, a Trilogía apregoa a expulsáo do Maligno, nao por exor
cismo, mas por tratamento de psicanálise integral (infelizmente
os mestres da Trilogía nao entendem o que seja o exorcismo e,
por isto, o confunden! com a magia).

Embora a Trilogía professe a existencia de Deus, a de


Jesús Cristo como Deus e Homem (ao menos, segundo a maio-
ria dos seus adeptos), a dos anjos e dos demonios, ela se opóe
ao que chama «as Instituigóes Religiosas», e, em especial, a
Igreja Católica; os Religiosos sao, para tal escola, «os funcio
narios da Religiáo». A razáo de tal aversáo é a valorizagáo
da cruz ou «o escándalo da cruz» (ICor 1,23) apregoada pelo
Apostólo Sao Paulo; a ascese e a procura da perfeigáo evan
gélica, caras aos cristáos, sao tidas como expressóes de teo-

iA Trilogía n§o costuma falar de pecado nem de regeneracáo ética,


mas, na verdade, ela aponta com outros nomes para tais realidades.

— 435 —
84 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

mania dos Religiosos. A Trilogía se compraz em analisar a


historia do Cristianismo e denunciar falhas dos cristáos na
maneira de considerar o demonio, as bruxas, a magia...

Üma vez exposta sintéticamente a doutrina trilógica, im


porta tecer-lhe alguns comentarios.

2. Refletindo...

Antes do mais, convém perguntar:

2.1. Por que tanto sueesso?

Julgamos que tres sao os principáis fatores do éxito da


Trilogía Analítica:

1) Urna psicanálise aberta ao Transcendental. A escola


de Sigmund Freud, de ampia irradiacao, associou a técnica
analítica com materialismo, pansexualismo e menosprezo da
Religiáo. Ora tais notas langaram, na mente de muitos clien
tes e estudiosos (especialmente de cristáos), o descrédito sobre
a psicanálise ortodoxa. Ora, com Norberto Keppe, aparece
urna escola analítica que nao somente nao nega Deus e os valo
res religiosos, mas até mesmo os proclama e os incute (talvez
se possa dizer que a Trilogía fala mais do demonio do que de
Deus). Este aspecto cristao (embora deficientemente cristáo)
aparece como urna novidade positiva e valiosa para as pessoas
formadas na escola do Cristianismo.

2) Becomendafiáo da regeneragáo ética. Embora a Tri


logía nao use as palavras «ética» e «moral», é certo que ela
toca no auténtico principio de recuperacáo de muitas persona
lidades doentias ou desfiguradas, a saber: a superacáo das
desordens fantasistas e volitivas do ser humano; a Trilogía
apregoa a conversáo em lugar da inversáo. A denuncia explí
cita de desordens moráis existentes nos pacientes é fator que,
sem dúvida, acelera a restauracáo do equilibrio da personali-
dade. — Está claro, porém, que o recurso generalizado as
influencias demoniacas (por via telepática e outras) para expli
car as desordens afetivas e volitivas do ser humano é ponto
faino, que a teología católica e a sá filosofía contestam com
bons argumentos.

— 436 —
TRILOGÍA ANALÍTICA 85

3) A aceitacao do demonio e de sua atuagao no mundo,


embora seja exagerada e erróneamente professada pela Trilo
gía, é aínda um ponto que atrai o interesse de muitas pessoas
religiosas, cristas ou ecléticas. Especialmente um Simposio
sobre Demonologia, instituido sob os auspicios de dentistas e
psicólogos, como foi o de 13-14/08 pp., nao podía deixar de
suscitar curiosidade pela sua índole inédita; quem visse a pro
paganda preparatoria do Simposio, poderia crer que a exis
tencia atuante e influente do demonio no mundo é urna con-
clusáo de pesquisas científicas.

2.2. Aspectos negativos..

Sejam realzados tres tópicos com seus sub-itens.

1) Negacáo do inconsciente. Esta é urna das caracterís


ticas de mais avultadas conseqüéncias na Trilogia. Tal recusa
leva esta corrente a atribuir ao demonio o comportamento
invertido, a megalomanía e a inveja.

Ora a existencia do inconsciente e do seu enorme poten


cial é corroborada pela prática de médicos e psicólogos de
renome, além de ser um fato de experiencia comum; quem,
por exemplo, esquece freqüentemente o seu guarda-chuva,
esquece-o provavelmente porque em seu íntimo acha molesto
andar de guarda-chuva.

A Trilogia alega que de um elemento negativo — o incons


ciente — nada pode sair de concreto e positivo (um ato hu
mano, no caso); «o nao e o sim nao sao a mesma coisa», diz
Norberto Keppe. Ora nisto há um equívoco. O inconsciente
da psicanálise de Freud, Jung e outros nao é o vazio ou o
nada, mas consta de afetos reais e atuantes que nao afloram
á mente ou 'á consciéncia do sujeito; embora nao aflorem, eles
podem ter, e tém de fato, grande influencia sobre o comporta
mento do individuo.

Note-se ainda: um dentista, pelo fato de explicar a con-


duta humana por atuagáo de fatores inconscientes, nao é ma
terialista nem positivista (no sentido de Comte). Doutro lado,
pelo fato de admitir a existencia do mundo espiritual e trans
cendental, o dentista nao está obrigado a negar o inconsciente
e a atribuir ao demonio todas as manifestagóes deficientes da
conduta humana. Pode um estudioso aceitar a realidade do
inconsciente e do subconsciente sem adotar a filosofía mate
rialista e pansexualista de Sigmund Freud.

_ 437 _
J6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

2) O conceito de demonio na Trilogia é assaz confuso e


nao resiste ao crivo da filosofía. Com efeito; haveria a) os
demonios principáis (Lucifer e seus sequazes), b) as almas
endemoniadas das pessoas más que morreram e atualmente
perseguem os vivos, e c) os demonios humanos ou encarnados
neste mundo. — Ora o demonio é um anjo decaído que nao
tem corpo, ao passo que a alma humana é naturalmente criada
para animar um corpo; nenhuma alma humana se torna demo
nio, embora possa conceber malicia e perversáo em alto grau.

A Trilogia admite que criangas no Brasil, nos Estados


Unidos, na Dinamarca e em toda parte vejam pequeños seres
escuros e monstruosos, que seriam os próprios demonios;
admite que se possam ouvir urros do demonio — o que supóe
falsamente tenha o demonio um corpo.

Os síntomas de possessáo diabólica, segundo a Trilogia,


seriam: emissáo de sons inarticulados, forga descomunal, varia-
gáo de vozes, gritos, levitagáo, palavróes, doengas mentáis,
mau cheiro, incontinencia... Ora tais fenómenos hoje em dia
sao explicáveis pela parapsieologia; se, pois, tém elucidagáo
natural, nao devem ser imputados á possessáo diabólica. A
Igreja admite, sem dúvida, a possessáo diabólica (se nao exis-
tisse, Jesús teria fingido nos Evangelhos), mas nao a admite
com a freqüéncia quea Trilogia supóe.

Observa-se, alias, que os mestres e monitores da Trilogia


entram fácilmente em assuntos especificamente bíblicos e teo
lógicos, dando orientagóes para a vida religiosa e espiritual
— o que já nao compete a psicólogos e psioanalistas. As ques-
tóes bíblicas e teológicas devem ser reservadas aos especialis
tas na materia, em vez de ser «definidas» por estudiosos de
outras áreas. Assim evitar-se-áo o ecleticismo e a confusáo
de nogóes em que incidem nao raro os arautos da Trilogia.
Percebe-se que estes trazem certa formagáo básica crista, mas-
a mesclaram com nogóes heterogéneas, distanciando-se de
auténtica teología.

3) De modo geral, as concepgóes que tal corrente apre-


senta com referencia á Religiáo e á Igreja Católica sao erró
neas. Assim

a) a Igreja Católica nao se terá orientado por Jesús


Cristo, mas por Sao Paulo, que apregoava a mortificagáo do
corpo (cf. ICor 9,24-27; Gl 5,16-24; 6,14); em conseqüéncia,
«logo após a morte de Cristo, o demonio já conseguiu desviar

— 438 —
TRILOGÍA ANALÍTICA 87

a orientagáo de Deus. Este fenómeno continuou por toda a


Idade Media e Moderna, atingindo a própria ciencia: a psicaná-
lise, toda a psicología moderna, artes e vida social» (N. Keppe,
A verdadeira espiritualidade, p. 10).

Nisto ha certamente enorme equívoco. A exortagáo á


mortificag»o nao é peculiar do Apostólo Sao Paulo, mas pro-
cede do próprio Jesús:

«Disse Jesús aos seus discípulos: 'Se alguém quer vir após
mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me. Pois
aquele que quiser salver a sua vida, perdé-la-á, mas o que
perder a sua vida por causa de mim, a encontrará. De fato,
que aproveitará ao homem, se ganhar o mundo inteiro, mas
arruinar a sua vida? Ou que poderá dar o homem em troca
de sua vida?'» (Mt 16,24-26).

Quando, pois, a Igreja prega a renuncia as paixóes da


carne, nao taz senáo reproduzir a mensagem de Cristo. Tal
pregagao, porém, nada tem de dualismo ou maniqueismo; o
corpo como tal nao é considerado mau, pois é criatura de Deus;
evidentemente, porém, é a sede de instintos que nem sempre
condizem com as diretrizes da razáo e da fé. De resto, o amor
á Cruz no Cristianismo nao se deriva de masoquismo ou
sadismo, mas únicamente do fato de que a cruz liberta o ho
mem dos seus instintos desregrados e o habilita a ressuscitar
com Cristo; a perspectiva da ressurreigáo é inseparável da
imagem da cruz.

b) A procura de perfeigáo espiritual ou de santidade


por parte dos cristáos nao deve ser confundida com teomania
ou megalomanía. É simplesmente a resposta a ,um convite do
próprio Cristo, que dizia: «Sede perfeitos como vosso Pai Ce
leste é perfeito» (Mt 5,48). A perfeigáo espiritual incluí pro
funda humildade; significa «deixar que a graga de Deus íru-
tifique na vida do cristáo».

c) A Trilogía ensína que quem trabalha ganha seu pao


e nao precisa de esmola. Só necessita de auxilio alheio ou de
esmola quem nao trabalha; e quem nao trabalha, é preguigoso.
Por conseguinte, quando a Igreja exorta os fiéis a se interes-
sarem pelos pobres a fim de os socorrer e promover, está
fazendo obra errada, pois está favorecendo a preguiga. — Ora
nao há quem nao perceba a simploriedade deste sofisma; em
nossos tempos, táo marcados por recessáo e desemprego, há
milhares de pessoas honestas que procuram trabalho sem o

— 439 —
88 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 270/1983

encontrar e, por isto, passam fome, merecendo a solidtude da


Igreja e dos cristáos em geral; o menosprezo por tais pessoas
seria falta de senso humanitario e hipocrisia. Ademáis a
Igreja apregoa a pobreza, nao, porém, a miseria, pois esta
equivale a um estado de vida sub-humano.

d) A tese trilógioa de que as doengas sao conseqüéncias


do pecado, exige reparos. O livro do Génesis (3,16-19) e Sao
Paulo (Rm 5,12) ensinam que, pelo pecado dos primeiros pais,
a morte e seus precursores entraram no mundo. Isto, porém,
nao quer dizer que toda doenga resulte de pecados pessoais do
paciente; muito menos significa que, quanto mais alguém sofre,
mais é pecador. O livro de Jó atesta que Deus pode submeter
o homem reto á proya para acrisolá-lo na virtude ou para aju-
dá-lo a se libertar dé suas paixóes. Note-se ainda que a Igreja
está longe de alimentar nos seus fiéis urna mentalidade tris-
tonha ou conformista, própria de «vítimas do destino»; a men-
sagem evangélica, apregoada pela Igreja, libertou o homem das
cadeias da supersticáo e de forgas cegas irracionais para des
pertar nele a conviccáo de que é colaborador de Deus na obra
da criagao. Como imagem e semelhanga de Deus, o homem
está subordinado táo somente a Deus e as autoridades que
legítimamente recebam de Deus o seu poder (cf. Rm 13,1-7).

e) Os arautos da Trilogia apontam freqüentemente a


Idade Media como período de obscurantismo e Inquisigáo.
— Há nisso um preconceito contra a Idade Media, que estu-
dos modernos tém contribuido para dissipar. Cf. PR 240/1979,
pp. 520-534.

Além disto, a Inquisigáo há de ser entendida dentro dos


parámetros da sua época e nao á luz da mentalidade moderna:
os medievais julgavam de boa fé que o demonio estava pre
sente nos fenómenos estranhos daqueles tempos e procediam.
de acordó com os ditames da sua consciéncia; nenhum dos
grandes santos medievais, nem mesmo S. Francisco de Assis,
que até hoje é estimado, teve palavras de protesto frente h
Inquisigáo. Donde se vé que nao seria justo acusar os medie
vais como se fossem criminosos ou homens destituidos de
valores. ^
f) Quem le as obras da Trilogia Analítica, verifica que
tém pretensóes «grandiosas»: na base de interpretagóes sim
plificadas, criticam as mais diversas escolas filosóficas com'
■•;oa
(Continua na pág. 33) • \m %

— 440 — " ' ■' I


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