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CINEMA

surrealista
“Cara imaginação, o que
eu amo, sobretudo em você,
é que você não perdoa”.
André Breton
CINEMA
surrealista

Abraão Coutinho
Bianca Trancoso
Fernando Barbosa
Luigi Pinheiro
Mariana Costa
Índice

Surrealismo 05

Cinema Surrealista 08

Cineasta Luis Buñuel 10

Filme Um Cão Andaluz 12

Roteiro do filme 13

Pôster 19

Referências bibliográficas 22
o Surrealismo

Paris, anos 20. Até então os movimentos de vanguarda


manifestaram a consciência desagregadora que agitava
a época da guerra. Os expressionistas haviam promovido
manifestações subjetivas e psicológicas da criação humana,
influenciando novos desdobramentos motivados pelo sentido
de construção e organização que subiam dos escombros da
grande guerra.

Baseados nessas idéias, André Breton, juntamente com Louis Aragon


e Philippe Soupault, escritores e poetas franceses, fundam a revista
Littérature, em 1919, publicando seus pensamentos e manifestos
claramente contrários à guerra. No ano de 1921, Breton passou a
rivalizar com Tristan Tzara, líder de um grupo de escritores e ar-
tistas alemães, pela direção do movimento dadaísta, iniciado em
Zurique, 1916, e alastrado em pouco tempo para outras cidades,
inclusive Paris. O ceticismo absoluto e improvisação, o ilógico e
absurdo eram características do movimento. É niilista (falta de
sentimentos baseada na análise racional), arte experimentalista,
espontânea, trabalha o acaso. Apesar da aparente falta de senti-
do, protestava contra a loucura da guerra. Assim, sua estratégia era
mesmo denunciar e escandalizar. Devido a divergências com Tzara,
Breton desliga-se do movimento, o que causou o enfraquecimento
do dadaísmo e fortalecimento de seu grupo. Esse grupo, que estu-
dava Freud e fazia experiências com o sonho e com o sono hipnóti-
co, procurou superar o sentido de grupo destinado apenas à divul-
gação de suas idéias para se transformar numa equipe de estudos
e experimentações psicanalíticas. Ao niilismo dadaísta opunham
agora o conhecimento total do homem, para o que tanto a poesia
quanto a pintura não passavam de meios de investigação que lhes

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permitiam, como cientistas, explorar o inconsciente, o sonho, o
maravilhoso. Assim, o grupo foi se organizando como frente úni-
ca de pesquisas, contando com poetas e pintores, dentre os quais
Aragon, Soupault, Artaud, Crevel, Desnos, Eluard, Prèvert e Vitrac,
chefiados por Breton, que em 1924 lançaria o primeiro manifes-
to definindo afinal as diretrizes desse grande movimento cultural,
chamado surrealismo.

Depois de 1924 segue uma fase de declarações e descobertas surre-


alistas. A partir do manifesto, os surrealistas buscavam a emanci-
pação total do homem, fora de valores burgueses como lógica e ra-
zão, inteligência crítica, família, pátria, moral e religião – o homem
livre de suas relações psicológicas e culturais. Idéias de bom gosto
e decoro deviam ser subvertidas. A tentativa era a de descobrir o
homem primitivo, ainda não maculado pela sociedade; daí a recor-
rência ao ocultismo, à magia, à alquimia medieval. O desenvolvi-
mento da psicologia e a descoberta do método psicanalítico da es-
crita automática e do pensamento falado, bem como a exploração
do inconsciente, as narrações dos sonhos, as experiências com o
sono hipnótico, a contra lógica e um pouco de humor são recursos
a serem utilizados para libertar o homem da existência utilitária.

Houve a fase de conscientização política, na qual as idéias de Marx


fizeram enfatizar a inclinação comunista do movimento. Agora, o
grupo desejava levar a poesia à ação: de método de investigação do
inconsciente a um instrumento de agitação social, refletindo ecos
da revolução comunista de 1917. Breton ligava o movimento das
artes à atividade revolucionária, coisa com a qual alguns indivíduos
do grupo não concordavam, motivando a partilha do surrealismo
entre comunistas e não-comunistas.

Em 1930 Breton publica o segundo manifesto do surrealismo, a


partir do qual se verifica a preocupação com o materialismo mar-
xista e a desagregação progressiva e cada vez mais grave do grupo
surrealista. Apesar de contar agora com a internacionalização do
movimento conquistando países da Europa e Américas, e com a
adesão de outros nomes como os pintores espanhóis Pablo Picas-
so, Juan Miró e Salvador Dali, ou ainda o cineasta Luis Buñuel,
Breton perdia a maior parte de seus antigos companheiros. Mais
tarde, após retornar da viagem dos Estados Unidos, em 1946, Bre-
ton buscou reeditar seus manifestos com o intuito de reafirmar o
seu protesto contra a exploração do homem pelo homem e pelas
religiões, pregando um novo mito social, falando de seres superio-
res, em telepatia, cosmos e certas formas de premonição. Assim
como depois da Primeira Guerra Mundial, Breton tentava depois
da Segunda abrir outros campos de especulações, mas o movimen-
to do surrealismo havia passado e as palavras de Breton se perdiam

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dentro da nova corrente filosófica emergente chamada existencia-
lismo.

O surrealismo foi descrito como “uma filosofia que exprime uma


nova concepção do mundo e busca a posse do segredo do univer-
so” (Michel Carrouges). Os adeptos do movimento estabeleceram o
contato entre poesia e ciência elevado à categoria mágica, em que a
poesia se transformava em instrumento da ciência e vice-versa, em
que a escrita automática, a telepatia, o esoterismo, os campos de
exploração mental se transformaram nos grandes motivos dos ar-
tistas surrealistas. Como movimento visual tinha encontrado um
método: expor a verdade psicológica ao despir objetos ordinários
de sua significância normal, a fim de criar uma imagem que ia além
da organização formal.

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o Cinema Surrealista

No início das décadas de 1920 e 1930 duas tendências se


confrontavam no cinema, sendo uma chamada de cinema
gráfico e a outra de cinema subjetivo.

A primeira possuía uma relação direta com a linguagem pictórica,


da busca pela construção de um texto visual. Esta tendência repu-
diava o modo que a fotografia facilmente representava as coisas
do mundo e, propendendo à recursos retóricos explícitos, utiliza-
va de efeitos especiais assim como propunha experiências sines-
tésicas que se utilizavam de cores, sons, etc. Já a outra vertente, a
chamada de cinema subjetivo, evitava a utilização de tais recursos
e não repudiava a fotografia. Procurava criar representações por
retóricas implícitas, a imagem fotográfica era usada para constru-
ção de metáforas, assim como a montagem era usada para produzir
no espectador uma visão não familiar do mundo. Sua intenção era
garantir deste modo a estruturação de mensagens com sentidos
polivalentes.

É neste contexto que o cinema surrealista define suas principais


características. Os surrealistas pouco se interessavam pelos filmes
gráficos ou abstratos, como também pouco se importavam com
a técnica, os jogos de luz e sombra, a montagem rítmica e outras
preocupações dos cinemas da época. Estruturavam seus filmes de
forma não-linear, mostravam uma realidade para incutir estranha-
mento, em uma outra perspectiva, algumas vezes cruel. O foco es-
tava na mensagem, não para que fosse captada diretamente, mas
que o leitor construísse leituras em seu subconsciente.
A estética estava na não-preocupação com estética e outras racio-
nalidades, que eram tidas como irrelevantes pelos surrealistas.

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Acreditavam que limitar a representação das coisas aos moldes da
consciência era restringir de maneira intolerável a liberdade. Em
seus filmes, emergiam imagens reprimidas e traumas de diversos
tipos, trabalhavam o inconsciente de forma automatista conscien-
te. Não procurando narrar especificamente um sonho, apesar de se
aproveitarem de um mecanismo análogo ao dos sonhos.

André Breton opunha-se a repressões e outras amarras da socieda-


de, indo contra, principalmente, o modo conservador de significa-
ção de signos impostos pela sociedade. Em seu primeiro manifes-
to surrealista critica os lugares-comuns, a mania reducionista de
tornar o desconhecido em conhecido, mostrando, pela psicanálise
Freudiana, que o sonho é uma parte psíquica considerável que não
poderia ser ignorada como estava sendo. A partir disto, gera quatro
parágrafos de reflexão acerca disto:

1º) O sonho é contínuo e possui traços de organização. Porém, a


memória faz cortes, não leva em conta as transições;
2º) O estado de vigília, que é uma interrupção do sono, causa uma
estranha tendência à desorientação;
3º) O espírito humano se satisfaz plenamente durante o sonho, é
inapreciável temos facilidade a tudo;
4º) Por fim, Breton acredita que a resolução destes dois estados, o
sonho e a realidade, possam ser resolvidos numa espécie de reali-
dade absoluta, que ele denomina como surrealidade.

Partindo de tais preceitos, analisamos que o filme surrealista de-


monstra claramente esta incerteza entre o sonho e a realidade.

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o Cineasta Luis Buñuel

Luis Buñuel nasceu na Espanha numa família abastada.


Estudou durante a infância e a pré-adolescência num colégio
de jesuítas, mas, com o passar do tempo, virou ateu e
expulsaram-no da escola.

Em 1917 foi estudar em Madri, na Residencia de Estudiantes, onde


entrou em contato com as vanguardas artísticas da época, como
cubismo, dadaísmo e surrealismo, além de conhecer Federico Gar-
cia Lorca e o próprio Salvador Dalí, com quem trabalharia anos
mais tarde no curta Un Chien Andalou. Tinha contato com o cinema
na Espanha quando fundou, em 1920, o primeiro cineclube espa-
nhol. Porém, foi em Paris quando estudou e trabalhou com o cine-
ma, em 1925.

Em 1929 escreve em parceria com Salvador Dalí o roteiro do filme


Un Chien Andalou, que é considerado um ataque a Federico Gar-
cía Lorca devido a sua homossexualidade da qual Buñuel possuía
aversão. É importante ressaltar que com essa obra tanto Buñuel
quando Dalí passaram a participar do grupo surrealista de André
Breton. Pouco tempo depois ele realiza o filme L’Âge d’Or, que conta
com a participação de Dalí no início do roteiro.

Buñuel volta para Espanha depois da proclamação da República e


filma o documentário Las Hurdes Tierra Sin Pan (Terra sem pão),
que trata sobre o dia-a-dia da aldeia Extremadura, localizada na
Espanha. O governo vigente da época proibiu a obra, alegando que
passava uma imagem negativa do país. Com o começo da Guerra
Civil Espanhola emigrou para os Estados Unidos, onde trabalhou
no Museu de Arte Moderna. Morou também no México por alguns

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anos onde realizou praticamente um filme por ano. Foram oito fil-
mes em oito anos.

Devido ao sucesso de seus filmes foi convidado pelo General Fran-


co, que comandava a Espanha, para retornar ao seus país de origem
e fazer um filme financiado pelo estado. Buñuel filma Viridiana,
um filme fortemente anti-católico que posteriormente a sua exibi-
ção foi proibido pelo governo espanhol e ganhou a Palma de Ouro
do Festival de Cannes.

Realizou seus últimos filmes na França, que mesmo chocando a so-


ciedade faziam sucessos de bilheteria como Belle de Jour, Le charme
discret de la bourgeoisie e Le fantôme de la liberté. Parou de filmar em
1976 devido a problemas de saúde e em 1983 publicou sua auto-
biografia Mon Dernier Soupir. Morreu no dia 29 de julho de 1983 na
Cidade do México aos 83 anos de idade.

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o Filme Um Cão Andaluz

O filme foi filmado em apenas 15 dias e teve sua estréia em seis


de junho, perante um público extremamente elitista francês.
A partir daquela sessão Un Chien Andalou foi considerado
um filme polêmico, com suas cenas de cunho violento e anti-
clerical.

Representou uma violenta reação contra o cinema de vanguarda


que, preocupado com a montagem rítmica e a pesquisa técnica, por
vezes exibia um estado de espírito perfeitamente convencional e
barato. No filme a posição tomada pelo produtor-diretor foi pu-
ramente moral-poética, assumindo um comportamento antiplás-
tico e antiartístico, tendo como objetivo despertar no espectador
reações de atração e repulsa. A concepção surrealista da trama é
evidenciada pela motivação psíquica consciente dos personagens e
o uso de imagem poética como arma para derrubar a representação
convencional da natureza das relações humanas, da mesma forma
que o filme instiga e ataca o espectador fazendo-o enxergar os de-
sejos relegados ao estado fantástico dos sonhos. Permeados ao dis-
curso não linear, está incutido um descrédito, assumido pelo autor,
às instituições burguesas e religiosas categoricamente cercadas de
ações misteriosas e inexplicáveis.

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o Roteiro do Filme

Era uma vez...


Um balcão de noite. Um homem afia sua navalha junto do
balcão. O homem olha o céu através dos vidros e vê...
Uma nuvem clara avançando para a lua cheia.
Depois, uma cabeça de moça, de olhos arregalados. A lâmina
da navalha dirige-se para um dos olhos dela.
Agora a nuvem passa pela lua.
A lâmina da navalha atravessa o olho da moça, seccionando-o.

Oito anos depois.

Uma rua deserta. Chove.


Uma personagem, vestida com uma roupa cinza escura, aparece de
bicicleta.
Tem a cabeça, as costas e a cintura envoltas em panos brancos.
Em seu peito está presa, por correias, uma caixa retangular, listra-
da em diagonal de preto e branco. A personagem pedala maquinal-
mente, o guidão livre, as mãos pousadas nos joelhos.
A personagem vista de costas até as ancas em P.A., superimpressão
no sentido longitudinal da rua na qual ele circula de costas para a
câmara.
A personagem avança até à câmara até que a caixa listrada esteja
em primeiro plano.
Um quarto qualquer num terceiro andar dessa rua. No meio está
sentada uma moça vestida com uma roupa de cores vivas, que lê
atentamente um livro. De repente estremece, escuta com curiosi-
dade e afasta o livro atirando-o sobre um divã próximo. O livro cai
aberto. Numa das páginas, vê-se uma reprodução de A Rendeira, de
Vermeer. A moça está agora convencida de que alguma coisa está
acontecendo: levanta-se, dá meia-volta e vai à janela com passo rá-
pido.

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A personagem de há pouco acaba de parar, em baixo, na rua. Sem
opor a menor resistência, por inércia, cai na sarjeta com a bicicleta,
no meio de um monte de lama.
Gesto de cólera, de rancor, da moça que se precipita para as escadas
para ir à rua.
Primeiro plano da personagem caída no chão, sem nenhuma ex-
pressão, na posição idêntica à do momento da queda.
A moça sai de casa, correndo para o ciclista e o beija freneticamente
na boca, nos olhos, no nariz.
A chuva aumenta a ponto de fazer desaparecer a cena precedente.
Fusão com caixa, cujas listras oblíquas superpõem-se às da chuva.
Mãos contendo uma pequena chave abrem a caixa, da qual retiram
uma gravata embrulhada em papel de seda. É preciso considerar
que a chuva, a caixa, o papel de seda e a gravata devem ter listras
oblíquas, apenas variando o tamanho delas.
O mesmo quarto.
Em pé junto à cama está a moça que contempla os acessórios usa-
dos pela personagem - panos, caixa e colarinho duro com gravata
fosca e lisa -, tudo disposto com se esses objetos estivessem sendo
usados por uma pessoa deitada na cama. A moça finalmente deci-
de-se a pegar o colarinho, do qual retira a gravata lisa para substi-
tuí-la pela listrada, que ela tirou da caixa. Coloca-a no mesmo lugar
e depois senta-se junto à cama, na atitude de uma pessoa que vela
um morto. (Nota: a cama, isto é, a colcha e o travesseiro, estão le-
vemente amarrotados e afundados como se realmente um corpo
humano ali estivesse.)
A mulher tem a sensação de que alguém está por trás dela e volta-
se para ver quem é. Sem o menor espanto, vê a personagem, desta
vez sem nenhum acessório, que olha com grande atenção qualquer
coisa em sua mão direita. Há muita angústia nessa grande atenção.
A mulher aproxima-se e olha por sua vez o que ele tem na mão.
Grande Plano da mão, no centro da qual agitam-se formigas que
saem de um buraco escuro. Nenhuma delas cai.
Fusão com pêlos axilares de uma moça deitada na areia ensolarada
de uma praia. Fusão com um ouriço do mar, cujos espinhos mó-
veis oscilam levemente. Fusão com a cabeça de uma outra moça,
tomada em plongé muito violento e cercado pela íris. A íris abre-se
e mostra que essa moça está no meio de um grupo de pessoas que
procura forçar o círculo feito por policiais.
No centro do círculo, a moça tenta apanhar, com uma bengala, uma
mão cortada, de unhas pintadas, que está no chão. Um dos polícias
aproxima-se dela e a repreende severamente, abaixa-se e apanha
a mão, que embrulha cuidadosamente e põe na caixa do ciclista.
Entrega tudo à moça, cumprimentando-a militarmente enquanto
ela agradece.
É preciso notar que, no momento em que o polícia lhe dá a cai-
xa, ela está invadida por uma emoção extraordinária, que a isola

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completamente de tudo. Ela está como que subjugada pelos ecos de
uma longínqua música religiosa: talvez uma música ouvida em sua
mais tenra infância.
O público, satisfeita a curiosidade, começa a se dispersar em todas
direções.
Essa cena é vista pelas personagens que deixamos no quarto do
terceiro andar. Vêmo-las através dos vidros do balcão, de onde se
pode ver o fim da cena acima descrita. Quando o agente entrega
a caixa à moça, as duas personagens do balcão parecem, também
elas, invadidas pela mesma emoção, emoção que chega até às lágri-
mas. Suas cabeças balançam como se seguissem o ritmo daquela
música impalpável.
A personagem olha a moça e faz-lhe um gesto que parece significar:
“Viste? Não te disse?”.
Ela olha novamente na rua a moça que agora está só, como que pre-
gada no chão, em estado de inibição absoluta. Passam autos em ve-
locidades vertiginosas. De repente, um deles passa por cima dela,
mutilando-a terrivelmente.
Então, com a decisão de um homem em plena posse de suas facul-
dades, a personagem aproxima-se da moça e, depois de tê-la olhado
lascivamente dentro dos olhos, apalpa-lhe os seios através da rou-
pa. Grande Plano das mãos lascivas sobre os seios. Estes emergem
da roupa. Vê-se então uma terrível expressão de angústia, quase
mortal, refletir-se nas feições da personagem. Uma baba sanguino-
lenta escorre-lhe da boca sobre o peito nu da moça.
Os seios desaparecem para se transformar em nádegas que conti-
nuam a ser apalpadas pela personagem. A expressão deste muda.
Seus olhos brilham de maldade e de luxúria. Sua boca, escancarada,
fecha-se, minúscula, em forma de esfíncter.
A moça recua para dentro do quarto, seguida pela personagem
sempre na mesma atitude.
Subitamente, ela faz um gesto enérgico para separar os braços dele,
libertando-se assim do contato audacioso.
A boca da personagem contrai-se de ódio.
Ela compreende que uma cena desagradável ou violenta vai acon-
tecer. Ela recua, passo a passo, até um canto onde entrincheira-se
por trás de uma mesinha.
Gesto de vilão de melodrama da personagem. Olha para todos os
lados, procurando alguma coisa. A seus pés, ela vê a ponta de uma
corda e a apanha com a mão direita. Tateia com a mão esquerda e
apanha uma corda idêntica.
A moça, colada à parede, olha, apavorada, a manobra de seu agres-
sor.
Este avança para ela, arrastando com grande esforço o que está
amarrado nas cordas.
Vê-se passar, primeiro, uma cortiça, depois uma cabaça, dois ir-
mãos de colégios cristãos e finalmente, dois magníficos pianos de

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cauda. Os pianos estão cobertos por carcaças de burros cujas pa-
tas, caudas, ancas e excrementos transbordam da caixa harmônica.
Quando um dos pianos passa diante da objetiva, vê-se um enorme
cabeça de burro apoiada no teclado.
A personagem, puxando com grande esforço essa carga, está de-
sesperadamente inclinada para a moça. Ela derruba cadeiras, me-
sas, uma lâmpada de pé etc. As ancas dos burros embaraçam-se
em tudo. A lâmpada do teto, sacudida de passagem por um osso
descarnado, ficará balançando até o fim da cena.
Quando a personagem está a ponto de atingir a moça, esta esquiva-
se com um pulo e foge. Seu agressor, largando as cordas, sai em
sua perseguição. A moça abre a porta de comunicação, por onde
desaparece no quarto contíguo, mas não suficientemente rápida
para fechar completamente a porta. A mão da personagem, tendo
conseguido interpor-se, fica presa pelo punho.
No interior do quarto, fechando cada vez mais a porta, a moça olha
a mão que se contrai dolorosa e lentamente, e as formigas, que rea-
parecem, espalham-se pela porta. Imediatamente, ela vira a cabeça
para dentro do novo quarto, que é idêntico ao precedente, mas ao
qual a iluminação dará um aspecto diferente : a moça vê...
A mesma cama, na qual está estendida a personagem, cuja mão
continua presa na porta, vestida com os panos e a caixa sobre o
peito, sem fazer o menor gesto, os olhos arregalados e com uma
expressão supersticiosa que parece significar: “Neste momento vai
acontecer uma coisa extraordinária!”.

Pelas três horas da manhã

No patamar da porta de entrada do apartamento, uma nova per-


sonagem, vista de costas, acaba de parar. Aperta a campainha da
porta do apartamento onde essas coisas estão acontecendo. Não
se vê nem a campânula nem o martelo elétrico da campainha mas,
em seu lugar, por dois buracos praticados na folha da porta, vê-se
passar duas mãos que sacodem um shaker de prata. Sua ação é ins-
tantânea, como nos filmes comuns, quando se aperta a campainha.
A personagem deitada estremece.
A moça vai abrir a porta.
O recém-chegado vai diretamente até a cama e ordena imperati-
vamente à personagem que se levante. Ela obedece de tal manei-
ra recalcitrante que o outro vê-se obrigado a pegá-la pelos panos,
forçando-a a levantar-se.
Após ter-lhe tirado os panos um a um, joga-os pela janela. A caixa
segue o mesmo caminho, bem como as correias que o outro procu-
ra, em vão, salvar da catástrofe. E este gesto leva o recém-chegado a
punir a personagem, obrigando-a a ficar de castigo contra a parede.
O recém-chegado faz todos esses movimentos de costas.
Então volta-se pela primeira vez para apanhar alguma coisa do ou-

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tro lado do quarto.
Nesse instante, a fotografia torna-se esfumada. O recém chegado
move-se em câmara lenta e vê-se suas feições, idênticas às do ou-
tro; não são mais que um; só que este tem um ar mais moço e mais
patético, como o outro deveria ter sido há alguns anos.
O recém-chegado vai até o fundo do quarto, precedido pela câmara,
que o acompanha em Plano Aproximado.
Uma carteira escolar, para a qual se dirige nosso indíviduo, entra
em campo. Dois livros, na carteira, bem como vários outros objetos
escolares: suas posições e sentido moral se determinarão cuidado-
samente.
Ele apanha os dois livros e volta-se para juntar-se à personagem.
Nesse instante, tudo volta ao estado normal, cessando o esfumado
e a câmara lenta.
Chegando perto dele, ordena-lhe que abra os braços em cruz e põe-
lhe um livro em cada mão, mandando-o ficar assim de castigo.
O castigado tem um ar finório e cheio de traição. Volta-se para o
recém-chegado. Os livros, que continuam em suas mãos, transfor-
mam-se em revólveres.
O recém-chegado olha-o com ternura, sentimento que aumentará.
A personagem dos panos, ameaçando o outro com as armas, força-
o ao “mãos ao alto!” e, apesar de ter sido obedecido, descarrega so-
bre ele os dois revólveres.
Em Plano Aproximado, o recém-chegado cai mortalmente ferido,
as feições se contraindo dolorosamente (o esfumado volta e a que-
da para a frente é numa lentidão mais pronunciada que a anterior).
De longe, vê-se o ferido cair, não mais no quarto mas num parque.
A seu lado está sentada, imóvel e vista de costas, uma mulher de
espáduas nuas, ligeiramenre inclinada para a frente.
Caindo, o ferido tenta agarrá-la e acariciar suas costas; uma de suas
mãos, trêmula, vira-se para ele próprio; a outra, roça a pele das es-
páduas nuas. Finalmente cai no chão.
Tomada de longe. Alguns transeuntes e guardas correm para socor-
rer o recém-chegado. Levantam-no nos braços e o carregam através
do bosque.
Fazer intervir o capenga apaixonado.
Volta-se ao mesmo quarto. Uma porta, aquela em que a mão este-
ve presa, abre-se lentamente. Aparece a moça que já conhecemos.
Fecha a porta atrás dela e olha atentamente a parede contra a qual
esteve o assassino.
O homem não está mais lá. A parede está lisa, sem nenhum móvel
ou enfeite.
A moça faz um gesto de impaciência e de despeito.
Vê-se outra vez a parede, no meio da qual há uma pequena mancha
preta.
Essa manchinha, vista mais de perto, é uma mariposa. A mariposa
em Grande Plano.

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A caveira das asas da mariposa cobre toda a tela.
Em Plano Aproximado, aparece bruscamente o homem dos panos,
que leva a mão rapidamente à boca, como alguém que perde os
dentes. A moça olha-o desdenhosamente.
Quando a personagem retira a mão, vê-se que a boca desapareceu.
A moça parece dizer: “Bom. E agora?” e acentua a pintura dos lá-
bios.
Vê-se o rosto da personagem. No lugar da boca, começam a nascer
pêlos.
A moça, reparando naquilo, abafa um grito e olha vivamente sua
axila, que está completamente depilada. Desdenhosa, mostra-lhe a
língua, põe um xale nos ombros e, abrindo a porta de comunicação
a seu lado, passa para o quarto contíguo, que é uma grande praia.
Junto da água, uma terceira personagem espera. Cumprimentam-
se amavelmente e passeiam acompanhando a curva das ondas.
Plano das pernas e das ondas que morrem a seus pés.
A câmara acompanha-os de carrinho. As ondas atiram suavemente
a seus pés primeiro as correias, depois a caixa listrada, os panos
e finalmente a bicicleta. Esta tomada continua ainda um instante
sem que o mar atire mais nada.
Continuam o passeio na praia, desaparecendo pouco a pouco en-
quanto no céu aparecem estas palavras:

Na Primavera

Tudo está mudado. Agora, vê-se um deserto sem fim. Plantados no


centro, enterrados na areia até o peito, vê-se a personagem princi-
pal e a moça, cegos, as roupas esfarrapadas, devorados pelos raios
de sol e por uma nuvem de insetos.

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o Pôster

O pôster enquanto design gráfico e, portanto, aplicado


também ao cinema, enquadra-se na categoria da apresentação
e da promoção, na qual imagem e palavra precisam ser
econômicas e estar vinculadas a um significado único e fácil
de ser lembrado.

Nas ruas das crescentes cidades do final do século XIX, os pôsteres


eram uma expressão da vida econômica, social e cultural, compe-
tindo entre si para atrair compradores para os produtos e público
para os entretenimentos. As ilustrações refletiam o estilo artístico
da época e introduziram uma nova estética de imagens econômicas
e simplificadas. O texto lhes atribuía precisão e contexto para as-
sim completar a significação do todo.

O pôster é caracterizado por abrigar um significado que pouco


tem a ver com o indivíduo que o criou: não expressa as idéias de
seu designer. A mensagem do designer atende às necessidades de
quem está pagando por ela. Mesmo abrigando a subjetividade de
quem o criou, é produzido segundo critérios para se colocar na lin-
guagem do público ao qual é direcionado. O design ainda não era
reconhecido nos primórdios da popularização do pôster, muitos
dos pioneiros a ingressar no ramo eram artistas plásticos. Os que
se dedicavam exclusivamente ao ofício eram chamados de artistas
comerciais, ou “visualizadores” (artistas de layout), o que mais tar-
de, por convenção, mudou para engenheiros visuais, ou designers.
Assim, o pôster nunca foi uma obra de arte, mas um trabalho de
design, porque além de ser produzido unicamente para vender um
produto ou uma idéia, é projetado para a reprodução mecânica em
escala industrial.

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O século XX foi marcado pela guerra, houve a necessidade de infor-
mar e instruir a população para recrutar os indivíduos. Os pôsteres
foram utilizados pelos governos para fazer propaganda e anúncios
públicos e exortar e os cidadãos no esforço de guerra. Muitos ele-
mentos característicos do design gráfico surgiram não apenas nos
pôsteres, mas também na própria guerra. Os militares precisavam
de um sistema de signos para organizar suas equipes, manuais de
instrução, insígnias de posto, símbolos para identificar unidades e
regimentos. O design havia tornado-se um veículo de comunica-
ção de massa, principalmente no período de pós Revolução Russa
de 1917, quando o sistema socialista foi implantado e o pôster de
propaganda em massa começou a ser utilizado em larga escala pela
agência de propaganda e difusão ideológica da União Soviética. O
cartaz russo se caracterizou pelo envolvimento com as vanguardas
construtivistas e a propaganda do governo.

Na Europa, os designers comerciais foram seguidos por artistas de


vanguarda, que viram no design gráfico uma maneira de estender
a arte para a vida moderna. Eles usaram a tipografia tradicional, a
fotografia a subversão de imagens e a montagem como um novo e
expressivo recurso de comunicação.

Ao final da guerra os movimentos artísticos predominantes eram


o expressionismo e o dadaísmo. O estilo Art Déco, ramificação do
cubismo, teve uma extensa presença nos pôsteres do século XX.
Todos esses movimentos foram precursores do surrealismo. Este,
porém, não participou ativamente na produção de pôsteres de sua
época, sua participação ficou no campo das artes: pintura, escul-
tura, fotografia e cinema. Entretanto nos dias de hoje encontra-se
cartazes de filmes com elementos surrealistas, como o do filme O
Silêncio dos Inocentes (1988), e mais recentemente (2005) o do fil-
me Abismo do Medo, ambos com releituras da obra In Volupta Mors
(1951), de Dali.

Para o nosso projeto gráfico fizemos um cartaz animado para vei-


culação na web. Escolhemos duas cenas do curta Un Chien Andalou:
a do barbeiro que corta o olho da mulher, logo no começo do curta,
e a da mão com formigas brotando. São duas cenas marcantes, sen-
do que a segunda representa um ditado popular da França fourmis
dans les paumes (formigas nas mãos), que significa a vontade assas-
sina do homem. Usamos como trilha sonora o tango presente na
versão sonorizada de 1960.

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In Volupta Mors, Salvador Dali

Cartaz de “O Silêncio dos Inocentes”

Detalhe da obra de Dalí na borboleta

Cartaz do filme “O Abismo do Medo”

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Referências Bibliográficas

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Martins Fontes, 2005

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