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A DEMOCRACIA EA DINAMICA DA ESFERA PUBLICA SERGIO COSTA Na ordem democratica, entendida como forma de exercicio de uma dominagio politica consentida, as decisOes tém que ser permanente- mente “fundamentadas” e justificadas e dependem de anuéncia para que possam ser efetivadas (Sarcinelli, 1992). Neste processo, cabe & esfera piblica uma posi¢do central: ela se torna a arena onde se d4 tanto a amélgama da "vontade coletiva" quanto a justificagdo de decis6es politicas previamente acertadas. Serdo examinados, a seguir, dois modelos (um funcionalista outro “tedrico-discursivo") que descrevem a dindmica da esfera piblica nas democracias contemporaneas, conferindo-se destaque 4 forma como os "movimentos de protesto" ou os "atores da sociedade civil" sao referi- dos em cada um deles. No final procede-se a uma comparagdo entre os dois enfoques tedricos. O MODELO FUNCIONALISTA No modelo funcionalista aqui considerado a esfera publica é de- finida como um "sistema intermedidrio, cuja fungdo politica consiste na absorgio e no processamento de determinados temas e opinides, bem como na transmissdo das opinides ptiblicas que resultam deste processa- mento, tanto aos cidadfios quanto ao sistema politico" (Gehrards & Neidhardt, 1990:6). Desta definigdo resulta a imagem da esfera publica como um mercado de opinides no qual os diferentes atores sociais (parti- dos, grupos de interesse, movimentos sociais etc.) encontram-se em per- manente concorréncia por um recurso escasso, qual seja, a atencio 56 LUA NOVA N° 36 —95 publica. Tais atores procuram participar do processo de geragao da opiniao publica e influenciar, por esta via, as instancias de decisao!. De acordo com essa concepgao, a opiniao publica, constitufda pela acdo dos diferentes atores sociais, ndo assume imediatamente a forma de decisées politicas. Tal "conversao” ocorre conforme um modelo de dois niveis, que descreve 0 policy process. No primeiro est4gio verificam-se a formulagao piiblica e a apresentacdo de posicionamentos acerca de deter- minado problema. Trata-se portanto da formagdo da opiniao publica, So- mente quando a questo tematizada é assimilada pelo sistema politico — no segundo estégio — é que ela pode transformar-se numa decistio con- creta (Gerhards, 1993:26). Estes dois estdgios representam fases diferenciadas da “carreira" ou trajetéria que os temas percorrem, enquanto as atengdes ptiblicas en- contram-se voltadas para eles. Conforme essa concepgao as perspectivas de que certo problema se torne um tema piiblico dependem menos de seu contetido e relevancia do que de questées prético-estratégicas. Problemas que podem ser envolvidos num rétulo atrativo ou que sao trazidos a tona por atores sociais poderosos — em termos de acesso a recursos comunica- tivos — possuem melhores chances de ser tematizados publicamente e, portanto, de ser incorporados a agenda politica, que as questdes do inter- esse dos grupos que nao fazem parte do establishment (Pfetsch, 1994:14). O governo busca assumir o tratamento de problemas cujas solugées encontrem a "aceitagfo mais ampla possfvel", evitando questes polémicas. Neste contexto, afirma-se que 0 Executivo atua tanto como des- tinatério como quanto co-formador da esfera publica. Ele pode, mediante seu trabalho de relages pablicas, estimular a discuss daqueles problemas que revelem boas perspectivas de encontrar uma decisdo consensual, ou, a0 contrério, dificultar a "carreira” de temas que sejam potencialmente confli- tuosos ou cujo tratamento ameace os interesses estabelecidos. Nao obstante, no Ambito institucional da concorréncia partidéria © governo inevitavelmente vé-se forgado a levar em consideragdo 0 “esta- do dos animos' (a opiniao publica) reinante. 6 que o partido governante faz parte, como os demais partidos, dos atores da agregagdo de interesses, 1 Embora este modelo de esfera piblica se baseie claramente na teoria sistémica, seus au- tores atribuem — diferentemente de Niklas Luhmann — um papel diferenciado ao siste- ‘ma politico, relativamente aos demais sistemas. Este teria “uma posigao de supremacia, tanto como destinatério de problemas, quanto como sistema de solugdo de problemas" (Gehards, 1993:23). Ou seja, os autores reconhecem que o sistema politico ainda preserva suas fungdes de diregio e coordenagio dos demais sistemas. A caracterizagio de tal modelo como funcionalista ndo é, por certo, livre de problemas. Trata-se, na verdade, de ‘um mateo conceitual misto, influenciado por correntes te6ricas variadas. DEMOCRACIA E DINAMICA DA ESFERA PUBLICA 37 aos quais cabe reunir as demandas sociais numa plataforma programética, com a qual estes se apresentam periodicamente ao piblico de eleitores (Gerhards, 1993:35). Por essa razdio a desconsideragao de determinados te- mas pelo governo pode custar para o partido governista, futuramente, a perda dos votos daquele grupo de eleitores que esteve interessado no trata- mento de tais problemas. Como contraponto conceitual aos atores partidérios, que concor- rem aos cargos executivos — e obviamente legislativos — aparecem os atores da articulagdo de interesses, que procuram, de forma indireta, exercer influéncia sobre o Executivo. Entre estes atores incluem-se tanto os sindica- tos eos grupos de interesse como os movimentos sociais e grupos de protesto —abrigados, neste modelo, coletivamente, sob a rubrica “atores de protesto". Admite-se, com efeito, que os “atores de protesto", comparativa- mente aos demais atores articuladores de interesses, apresentam um nfvel de organizagaio mais reduzido e dispdem de uma base de recursos mais limi- tada: enquanto os grupos de interesse contam com meios variados de in- fluenciar as instincias de decisfo (dinheiro, contatos pessoais, poder orga- nizacional etc), a mobilizaco, no nfvel da esfera publica, constitui para os atores de protesto a forma mais importante — freqiientemente o unico meio possfvel — de influir na formulagdo de decis6es politicas (Gerhards & Neidhardt, 1994:7). Do ponto de vista normativo, contudo, nao se atribui um cardter diferenciado aos "atores de protesto". Assim como os demais “atores da esfera publica", estes atuariam estrategicamente na defesa de seus préprios interesses, buscando, através da midia, atingir um "puiblico ca- rente de orientagao e entretenimento” (Neidhardt, 1994:7). Neste contexto, as formas t{picas de expressdio dos movimentos de protesto (manifestagées, passeatas etc.) siio equiparadas, analiticamente, aos instrumentos da chama- da politica simbélica. Esta busca produzir acontecimentos exclusivamente para a midia (inaugurag6es de obras, aparigdes puiblicas de figuras proemi- nentes etc). Tanto 0s atos piiblicos dos movimentos de protesto quanto os eventos vinculados a politica simb6lica sao qualificados, neste modelo, de "'pseudo-acontecimentos”, que se inserem em uma politica de gerenciamen- to de noticias (news manegement). Os atores da esfera publica buscariam, com tais eventos (gragas, entre outros fatores, ao apelo visual que eles en- cerram) produzir um fato de valor noticioso e, com isso, alcangar a midia. O MODELO TEORICO-DISCURSIVO Na concep¢io denominada tedrico-discursiva, desenvolvida por Jiirgen Habermas, essa idéia de uma esfera ptiblica inteiramente apoderada 58 LUA NOVA N° 36 —95 e manipulada pelos diversos grupos sociais é colocada em questio.? Con- forme autor, cruzam-se na esfera ptiblica politica pelo menos dois processos simulténeos: junto ao "uso manipulativo do poder da midia para obtencdo de lealdade das massas, geracdo de demanda e compliance frente a imperativos sistémicos [verifica-se] (...) a geragdo comunicativa de po- der legitimo". (Habermas, 1990:41). O autor vai além, portanto, da disputa pelas atencdes publicas — empiricamente evidente — que equivale, no modelo funcionalista, esfera publica mesma e investiga a origem dos in- puts que atingem essa esfera. Nesse esforgo heuristico o autor identifica, para além da disputa pela presenca na m{dia, um nfvel mais profundo, ao qual esté relacionada a "geracao de poder legitimo". ‘A concepgao habermasiana de esfera ptiblica (politica) oferece, implicitamente, elementos para se entender a forma original como o autor trata uma questdo classica da Sociologia, qual seja, como € possfvel a ma- nutengdo da ordem social num contexto secularizado, caracterizado pela auséncia de “transcendéncia e tradigdo". Em sua resposta, 0 autor reco- nhece a forga aglutinadora da coordenagao sistémica; concebe, entretanto, um segundo campo, o mundo da vida, caracterizado por agdes orientadas para o entendimento3. A imagem da esfera ptiblica que resulta de tal cons- tatago nao é mais, portanto, a de um simples palco para encenagiio de atores estrategicamente voltados para a manipulaco das opinides; a esfera ptiblica passa a ser concebida como resultado "das tentativas de coorde- nagdo sistémicas, de um lado, e do processo de formagao da vontade politica de pessoas fisicas emancipadas, por outro" (Rédel et al., 1989: 161). Em outras palavras, 0 que se afirma € que a esfera piiblica nao é constitufda apenas por discursos que simplesmente ocultam o anseio de 2 0 estudo classico de J. Habermas Mudanga estrutural da esfera publica, escrito ha mais de 30 anos e que descreve a decadéncia da esfera publica burguesa, nao é considera- do no presente trabalho. Baseia-se aqui nas contribuigtes mais recentes do autor, nas quais, dentro do marco tedtico da redescoberta da sociedade civil, vislumbra-se a existén- cia de uma “esfera piblica politicamente influente", Em trabalho anterior apresento uma introdugdo a esse debate, discorrendo sobre suas implicagdes para 0 contexto brasileiro (vide Costa, 1994). 3 Conforme Rédel et al. (1989:158 ¢ s.) Habermas, com o modelo dual sistema/mundo da vida, "desdiaboliza” a racionalidade formal. Sem que seja necessério recorrer a potenci dades contrafactuais — imaginariamente construfdas —, pode-se conceber uma safda para a alienagio que acompanha 0 avango da racionalidade formal: existiia uma instancia que ainda nfo foi "colonizada", a saber, 0 mundo da vida. Nos termos de uma "politica eman- ccipatéria" no se trataria mais, portanto, como na teoria critica cléssica, da subordinagio da racionalidade formal; bastaria construir, institucionalmente, um muro de seguranga en- tre 0 sistema e 0 mundo da vida, impedindo-se que o primeiro avance sobre 0 segundo. Os autores entendem que tal visio representa um recuo conservador vis a vis a erftica radical da primeira geragdo da Escola de Frankfurt. DEMOCRACIA E DINAMICA DA ESFERA PUBLICA 59 poder de grupos econémicos e politicos particulares. Para ela dirigem-se também fluxos comunicativos condensados na vida cotidiana, que encer- ram questées relevantes para o conjunto da sociedade. Cabe, portanto, a esfera publica, conforme o modelo teérico- discursivo, atuar como instAncia intermediadora entre os impulsos comu- nicativos gerados no mundo da vida ¢ os colegiados competentes que ar- ticulam institucionalmente 0 processo de formagao da vontade politica (parlamento, conselhos etc.). Quando os fluxos comunicativos gerados nos "microdominios da prdtica cotidiana" extrapolam as fronteitas das esferas ptiblicas aut6nomas‘, eles podem ter acesso as instancias delibe- rativas previstas na ordem democratica e, finalmente, influir nas decisdes af tomadas. O fluido poder comunicativo é exercido, portanto, conforme a légica do assédio: "ele atua sobre as premissas dos processos de julga- mento e decisdéo do sistema politico, sem a inteng%o de conquista” (Habermas, 1992a: 208). Os procedimentos democraticos institucionalizados devem as- segurar que os processos espontfineos de formago de opiniao sejam consi- derados nas instancias decisérias. Dessa forma procura-se assegurar, de for- ma procedimental, que a forca sécio-integrativa da solidariedade, imanente aos impulsos comunicativos do mundo da vida, contrabalance os outros dois recursos que suprem a "caréncia de integrago e diregdo" das socie- dades modernas, a saber, o dinheiro e o poder (Habermas, 1992b: 23). Mesmo que os instrumentos do Estado constitucional assegurem que a esfera publica atue como instincia transmissora, através da qual os fluxos comunicativos gerados no ambito de processos interativos voltados para o entendimento (e ndo para a manipulagdo) atinjam as instancias de- cis6rias, uma questo fundamental permanece ainda sem resposta. Trata-se de discutir a sustentago, no nivel da sociedade, para esta formago es- pontanea da opinido, ancorada no mundo da vida. Aqui insere-se como se poderia esperar, a idéia de sociedade civil. Neste contexto, a categoria abrange as diferentes associagdes voluntérias que "absorvem e condesam a ressonancia que as situages-problema emergentes na sociedade encontram nos dominios da vida privada, canalizando tal resposta de forma amplifica- da para a vida privada, canalizando tal resposta de forma amplificada para esfera publica politica" (Habermas, 1992c: 443, grifos meus - SC). Aos atores da sociedade civil € atribuido, portanto, neste cons- truto, um papel duplo, que reflete 0 cardter bidimensional destes sujeitos. ‘A condensagao de “situagées-problema” percebida na vida cotidiana cor- 4 Habermas (1985:422) chama de auténomas "as esferas piblicas que no sio criadas © mantidas pelo sistema politico com 0 objetivo de producto de legitimagio". 60 LUA NOVA N°36—95 responde & dimensdo defensiva de tais atores, Trata-se aqui da preservagdo ¢ ampliago da “infra-estrutura comunicativa" do mundo da vida e da pro- dugdo de esferas publicas alternativas. Com a canalizagdo dos problemas tematizados na vida cotidi- ana A esfera piiblica ativa-se a dimensio ofensiva dos atores da socie- dade civil. Trata-se, nesse nivel, da tentativa de "apresentar novas contri- buigdes para a solugdo de problemas, de oferecer novas informagées de coroborar os bons motivos, denunciando os maus, de forma a intro- duzir um impulso nos animos capaz de alterar os parametros constitucio- nais da formagdo da vontade politica e de pressionar os parlamentos, os judiciérios e os governos em favor de determinadas politicas" (Habermas, 1992¢:448). Em consonancia com Cohen & Arato, Habermas assinala, em diferentes oportunidades, a necessidade de auto-limitagdo da influéncia dos atores da sociedade civil, tentando delimitar as contingéncias (cf. Cohen & Arato, 1988:55; vide também Cohen & Arato, 1989) que dificul- tam e condicionam o que chama de "préxis democrética radical". Tais problemas sao tratadas aqui em trés niveis tematicos, quais sejam: 1. a questéo da complexidade: para que possam funcionar como catalisadoras de processos espontineos de formacao da opinido, as organizagdes da sociedade civil no podem se transformar em estruturas formalizadas, dominadas pelos rituais burocréticos. De outra forma, o ganho de complexi- dade poderia significar a rendigdo aos imperativos organiza- cionais e 0 conseqiiente distanciamento da base (Habermas, 1985: 423). 2. a questio do poder: os atores da sociedade civil ndo possuem poder politico ou administrativo, dispdem apenas de uma for- ma mediatizada de geragio de poder. Isto 6, a influéncia destes sobre a politica consubstacializa-se nas mensagens que, percorrendo os mecanismos institucionalizados do Esta- 5 Muitos autores, dentro do marco analitico da sociedade civil, tém procurado ampliar 0 con- ceito de democracia préprio ao modelo teérico-discursivo, desenvolvido por Habermas. Con- forme tais autores, a préxis democrata radical nao pode se limitar aos canais previamente es- tabelecidos de amalgamagao da vontade politica. Schmalz-Bruns (1994) enfatiza 0 momento republicano da democracia, sugerindo a horizontalizago dos processos. decisorios. Epple-Glas (1993:120 seg.) considera que a agdo politica dos atores da sociedade civil €, atualmente, indcua e que estes tomaram-se ineptos considerados os termos da esferas piiblicas contemporaneas. Por isso, a reconstrugao de uma esfera piblica politicamente in- fluente requer a introdugo de "mecanismos de democracia de base” ¢ uma “alfabetizagio politica”, que possibilite, no nivel local, a vivéncia da nocao de poder. DEMOCRACIA E DINAMICA DA ESFERA PUBLICA 61 do constitucional, alcangam os micleos decisGrios. Desta for- ma, procura-se afastar a idéia de que a sociedade civil possa assumir as fungdes que cabem ao Estado. 3, aquestio dos requisitos sécio-estruturais: uma sociedade civil, & qual caiba o duplo papel referido anteriormente, s6 6 ima- ginavel num contexto social caracterizado pela existéncia de uma cultura politica fundada na liberdade e por um minimo de garantia de intocabilidade da esfera privada. Caso contrério, “surgem movimentos populistas que defendem cegamente os cristalizados acervos de tradig6es do mundo da vida ameagados pelamodernizacdo capitalista" (Habermas, 1992c: 449). ALCANCE E LIMITES Cotejando-se os dois modelos de esfera ptiblica brevemente apresentados e o lugar ocupado pela sociedade civil (ou atores de protesto) em cada um deles, algumas diferencas fundamentais tornam-se evidentes. Para o modelo funcionalista, que projeta a imagem de uma esfe- ra publica inteiramente “apoderada" pelos diversos grupos de interesses, a questao relativa a atribuigdo de um status politica e analiticamente diferen- ciado para os atores da sociedade civil certamente nao se coloca. Trata-se de uma definigdo puramente empirica de esfera publica, que considera uni- camente a aparente feico mercadolégica desta esfera em detrimento da in- vestigagdo da origem dos varios inputs que a alcangam. Se se pretende afirmar, nos termos de tal modelo, que a esfera puiblica ainda preserva al- guma fung&o enquanto base de legitimagao da ordem politica, hé que se entender legitimagao, neste contexto, como simples resultado de um tra- balho eficiente de relagdes publicas. Ou seja, aqueles que dispuserem de maiores recursos materiais passiveis de conversdo em instrumentos comu- nicativos eficazes terfio assegurado a "legitimagao” de seus interesses, in- dependentemente da natureza destes. Conforme assinalado, os “atores de protesto", dentro do marco conceitual funcionalista, servem-se da esfera ptiblica da mesma forma que os demais atores sociais, qual seja, como palco de encenago na luta pela conquista de influéncia politico-publicitaria. Dessa forma, iguala-se (como faz Pfetsch, 1994:19), conceitualmente, por exemplo, a visita de Bill Clinton ao Portal de Brandeburgo em Berlim as passeatas de repidio ao ra- cismo e & xenofobia. Ambas manifestagGes sao analisadas-exclusivamente. sob a 6tica da produgio de fatos noticidveis. Recusa-se, explicitamente, a reconhecer que os "atores de protesto" (como os manifestantes contra 0 ra- 62 LUA NOVA N° 36 —95 cismo), com suas agdes, nfo buscam apenas a cobertura pela midia (objet vo nico de Clinton com a referida visita).Procuram também o convenci- mento ¢ a aprovacao piiblica de suas propostas, interferindo, desta forma, nos prdprios consensos éticos que orientam a convivencia social. No modelo teérico-discursivo, em contrapartida, atribui-se aos atores da sociedade civil um cardter diferenciado. Talvez se possa for- mular, de forma esquemética, que os sujeitos da sociedade civil, con- forme 0 modelo discursivo, distinguem-se dos demais atores da esfera piiblica nos seguintes aspectos: 1. quanto ao contetido: enquanto os sindicatos, grupos de inte- resse, etc representam, no ambito da esfera publica, as reivin- dicagdes de grupos politicos e econdmicos especfficos, os atores da sociedade civil tematizam situagdes-problemas emergentes na vida cotidiana — portanto, questdes de re- levancia para toda a sociedade. 2. quanto as formas de comunicagdo: enquanto os demais atores procuram, exclusivamente, ocupar espacos ptblicos, os atores da sociedade civil buscam transformar a esfera publica numa arena da argumentagao discursiva e de conven- cimento do conjunto da sociedade sobre a justeza de seus propésitos®, O poder resultante de tais esforgos comunicati- vos baseia-se, pois, na concordancia, encontrada no nfvel da sociedade, relativamente as mensagens transmitidas. Ou, conforme Rédel (1994:35): "Argumentos e opinides com- partilhadas no espaco piiblico, com base no convencimento, constituem o poder do qual os atores da sociedade civil que- i iveis de co- municagdo dentro da esfera publica que parece bastante oportuna para evidenciar algumas diferenciagdes entre os dois modelos apresentados. Sao consideradas nesta distingo tés for- mas de comunicagio piblica, a saber: = Tipo informativa: no 4, nesse caso, propriamente, uma interago comunicativa. Aquele que fala refere-se recorrentemente As suas préprias categorias ¢ linhas argumentativas, Mesmo eventuais questdes sdo respondidas conforme esse modelo monolégico. ~ Tipo agitagdo: tenta-se desqualificar os argumentos do interlocutor sem levar em conta, efetivamente, seus méritos. ~ Tipo discursiva: os interlocutores esforgam-se, nesse.caso, por empreender uma comunicagio voltada para oentendimento que pode levar arevisbes nas posigBes opiniGes originais. No modelo funcionalista a comunicagéo na esfera publica restringe-se, efetivamente, aos dois primeiros tipos referidos, enquanto que no modelo tedrico-discursivo a comunicagio piiblica pode desenvolver-se nos termos do terceiro tipo. Esta representaria exatamente a for- DEMOCRACIA E DINAMICA DA ESFERA PUBLICA 63 rem e podem dispor.” 3. quanto ao tratamento da esfera piiblica: como os sujeitos da sociedade civil ndo dispdem de outros meios de exercer sua influéncia sobre o processo politico (como, a propésito, de- preende-se também do modelo funcionalista) que nao seja a atuagdo na esfera publica, eles mostram-se particularmente sensiveis as ameagas de obliteragdo das possibilidades piiblicas de comunicagio. Por isso, tais atores procuram, a0 contrério dos demais, empenhar-se na reprodugdo e revitali- zagdo da esfera piblica, buscando explorar intensivamente as possibilidades comunicativas existentes e ampliar as fron- teiras dessa esfera, mediante a incorporagdo de novas mi- norias ¢ grupos marginais e da invengao de novos meios co- municativos. 4, quanto aos tragos identificadores: enquanto os demais atores da esfera publica podem ser classificados, previamente, a partir de sua origem vinculada a determinados campos fun- cionais como partidos politicos, grupos de interesse, repre- sentagdes funcionais etc”(Habermas, 1992c: 453), a identi- dade dos atores da sociedade civil é constituida ad hoc, no Ambito da ago coletiva. Se € verdadeiro que as naturezas distintas e os diferenciados graus de enraizamento social dos diversos "atores da esfera piblica” nao so adequadamente contemplados pelo modelo funcionalista, ha também que se admitir que 0 modelo teérico-discursivo apresenta problemas para ser utilizado como instrumental para se entender a dinamica da esfera piblica da maior parte das democracias contemporaneas. Se se leva, por exemplo, as tiltimas conseqiiéncias 0 pressuposto de que a relevancia pliblica dos atores da sociedade civil € devida exclusivamente ao contetido e ao apelo argumentativo de suas intervenc&es, muito poucos seriam os su- jeitos coletivos, empiricamente observaveis, a merecer o enquadramento na categoria de representante da sociedade civil. Além do esforgo de con- vencimento argumentativo, tais atores realizam um trabalho de relagdes pliblicas com o objetivo exclusivo de obter espago na mfdia. Procuram, dessa forma, adaptar-se aos requisitos estruturais dos veiculos, "oferecen- do informagées de valor noticioso, orientadas, no nivel de contetido e quanto aos prazos, pelas formas de produgao jornalisticas e pelas carac- terfsticas institucionais dos meios de comunicagao de massa." (Rossman, 1993:85). Esta concessdo & Realpolitik nao impe, certamente, a capitu- lago daqueles que conferem aos atores da sociedade civil a fungdo de ca- 64 LUA NOVA N°36— 95 nalizar os problemas emergentes nos dominios da vida cotidiana para a es- fera piblica, participando, dessa maneira do processo de constituigdo da base de legitimagio de um poder fundado comunicativamente. A facul- dade de cumprir tal papel parece depender mais propriamente da organi- zagao interna dos atores coletivos. Isto 6, caso o ator permanega permedvel aos impulsos provindos da base e aos processos espontaneos de formagdo da opinido, ele certamente se manterd, estruturalmente, em condigdes de condensar as situag6es-problema emergentes no mundo da vida e de trans- porté-las para a esfera publica. SERGIO COSTA é mestre em Sociologia pela UFMG, doutorando da Univer- sidade Livre de Berlim (bolsista do CNPq) docente no Instituto de Estudos Latino-americanos da Universidade Livre de Ber BIBLIOGRAFIA’ Arato, A. & J.Cohen, 1988. "Civil society and social theory". Thesis Eleven, 21. Arato, A. & Cohen, Jean,1989. "Politics and the reconstrution of the concept of civil socie~ ty". In Honneth, Axel et al, Zwischenbetrachtungen. Im Prozess der Aufkldrung. Frankfurt, Suhrkamp. Benhabib, S. (1992) “Models of public space: Hannah Arendt, the liberal tradition, and Jurgen Habermas”. In Calhoun, C. (org) Habermas and the Public Sphere. MIT Press. 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DEMOCRACY AND THE DYNAMICS OF THE PUBLIC SPHERE SERGIO COSTA Two models of the dynamics of the public sphere are compared: the functionalist and the discourse-theoretical. Special attention is given RESUMOS/ABSTRACTS 199 to the way the protest movements and the actors in the civil society appear in each model.

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