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O tema como
operador de sentidos no
jornalismo de revista1
Reges Toni Schwaab e Frederico de Mello Brandão Tavares
Resumo: O presente texto reflete sobre o tema como um objeto de estudo no Jornalismo. Especi-
ficamente, partimos do universo do jornalismo de revista para pensá-lo não apenas como
referente, mas como operador de sentidos no âmbito das rotinas produtivas e dos produtos
aí envolvidos. Para isso, problematizamos e complexificamos a ideia de tema, tendo em
vista sua presença em revistas semanais e especializadas. A partir deste percurso, realizamos
o cruzamento e tensionamento de questões discursivas e conceituais, buscando contribuir
com os estudos de jornalismo e jornalismo de revista.
Palavras-chave: tema, jornalismo de revista, discurso.
Abstract: The theme as the operator of meaning in magazine journalism. This text reflects about the
theme as an object of study in journalism. Specifically, we focus on the universe of magazine
journalism to see it not only as a reference but also as an “operator of meaning” within the
ambit of the productive routines and products of journalism. To this end, we discuss and
complexify the notion of theme, in view of its presence in weekly and specialized magazines.
In this context, we examine discourse and conceptual questions, seeking to contribute to
studies on journalistic theory and magazine journalism.
Keywords: theme, magazine journalism, discourse.
1 Versão revista de texto apresentado no Grupo de Trabalho “Estudos em Jornalismo”, do XVIII Encontro da
Compós, na PUC-MG, Belo Horizonte, MG, em junho de 2009.
SCHWAAB, Reges Toni; TAVARES, Frederico de Mello Brandão. O tema como operador de sentidos no jornalismo de 181
revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
No entanto, se pensamos o jornalismo que foge do incomum e que alicerça sua produ-
ção em outras bases, aparece outro referente: o tema. Este figura em pautas jornalísticas
das mais diversas como, frequentemente, algo que pode preencher o espaço da notícia
que não houve, ou como componente de valor na trama da cobertura periódica dos
meios de comunicação.
Na verdade, o tema perpassa qualquer material jornalístico; toda notícia também
tem a sua temática, o que pode causar, em relação à distinção acima apontada, um es-
tranhamento. Mas, no jornalismo das hard news, o tema só emerge de forma explícita,
como uma pauta específica, encaixando-se nas lógicas da temporalidade jornalística e
dos valores-notícia, ou seja, “concorrendo” com o acontecimento. Neste contexto, o tema
não é o extraordinário. O que não significa que não possua sua novidade. No jornalismo
cotidiano, sua presença acaba restrita (em geral) a duas manifestações textuais correntes:
a reportagem e a chamada “matéria-fria” ou “de gaveta”. A primeira com certo status no
que tange a produção e a visibilidade, e a segunda com menor relevância na cobertura
diária, ambas, porém, atreladas a uma ideia: a do tema como um assunto a ser dito e que
deve adequar-se a uma rotina produtiva maior, que o envolve.
No entanto, o que acontece quando o tema se encontra em outros produtos (e
processos) jornalísticos que fogem à dinâmica evenemencial?(CHARAUDEAU, 2006)2
Mais que isso, ao fugir de tal lógica, permanece o tema como apenas um assunto a
ser inserido ou investigado? O que passa a existir? Que papel ele cumpre ao não falar do
extraordinário do mundo? Que operações sua presença, como pauta de destaque, assume
em determinados veículos? Concordando que não é possível generalizar tais mutações nas
variadas mídias e práticas do jornalismo, mas afirmando sua existência, buscamos, neste
artigo, refletir sobre a presença e o papel do tema no chamado jornalismo de revista. Este,
além de pouco estudado como objeto, apresenta-se no contexto do jornalismo impresso
como lugar privilegiado, a nosso ver, de manifestações temáticas no jornalismo. Seja em
coberturas voltadas para temas, seja na elaboração de projetos editoriais específicos.
No atual mercado editorial das revistas jornalísticas brasileiras, mesmo nas revistas
semanais, a presença temática é bastante relevante. Os mapeamentos realizados por
Augusti (2005) e Vaz e França (2009) servem de exemplo. O primeiro (2005) estuda o
período compreendido entre setembro de 2003 a setembro de 2004, constatando que, num
total de 52 semanas, a revista Veja trouxe 22 capas voltadas para a questão do compor-
tamento, sem considerar aí, outros universos como saúde, alimentação etc. Já o segundo
(2009) aponta que dentre as 51 edições de Veja no ano de 2001, apenas 10 trouxeram
2 Segundo Mar de Fontcuberta (1993), a reportagem, no contexto dos gêneros jornalísticos, poderia ser classificada,
juntamente com a notícia e a crônica, como um gênero textual informativo. Nesse sentido, no entanto, por
assumir (e possuir), pelo seu próprio caráter textual, um outro caráter informativo (em comparação aos outros
dois tipos textuais), vale relembrar as proposições de Charaudeau (2006). De um ponto de vista da análise do
discurso, diz o autor, “três aspectos devem ser tomados em consideração para determinar uma classe textual: o
de lugar de construção do sentido do texto, o de grau de generalidade das características que definem a classe,
o modo de organização discursiva dos textos” (CHARAUDEAU, 2006, p. 204 [grifo original]).
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revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
Em termos dicionarizados, a ideia de tema encontra-se assim definida: “1. assunto que
se quer desenvolver 2. objeto de discussão 3. radical ou elemento primitivo de uma palavra,
ao qual se acrescenta sufixo ou desinência” (HOUAISS, 2004, p. 426). Uma conceituação
que não foge àquela ideia primeira, que permeia seu uso geral: o tema diz respeito a um
assunto, um tópico sobre o qual se discorre, sobre o qual fala, se pensa etc4. Todavia, o que
significa tomar o tema não como objeto de referência, mas como um objeto de estudo?
Se verbalizada, a palavra “tema” torna-se “tematizar” e adquire nova substantivação:
tematização. Ambos os termos, tematizar e tematização, aparecem em teorias e, diferente
do tema por si mesmo, serviram, como conceito, para alguns percursos teóricos.
3 Pesquisas que darão origem às nossas respectivas teses de doutoramento, ambas focadas no jornalismo de
revista. Na primeira (TAVARES, 2008), uma reflexão acerca da cobertura especializada sobre a temática da
qualidade de vida numa revista específica, a Vida Simples da Editora Abril, observa-se como os relatos jorna-
lísticos (visuais e textuais) ali presentes, ao mesmo tempo em que configuram um sentido sobre o bem-estar na
sociedade, revestem o jornalismo de novos enquadramentos. Na segunda (SCHWAAB, 2009), uma reflexão
sobre jornalismo contemporâneo e temas complexos, analisa-se a prática discursiva e as processualidades de
dez diferentes revistas da Editora Abril e seu trabalho com temáticas ecológicas.
4 Em termos epistemológicos a palavra vem do grego Théma, significando assunto a ser tratado.
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5 Com atenção ao exterior lingüístico, procurando apreender como no lingüístico inscrevem-se as condições
sócio-histórias. A linguagem não é neutra e nem natural. É, em essência, lugar de manifestação da ideologia.
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revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
6 Em uma formação ideológica dada, a partir de uma posição dada, numa conjuntura dada, as Formações Dis-
cursivas determinam o que pode e deve ser dito (PÊCHEUX, 1995), conforme postulado de Foucault (2005).
7 O contrato permite um trabalho de homogeneização do sujeito num determinado tempo histórico (CHARAU-
DEAU, 2006).
8 As relações correspondem a posições ideológicas que mantêm entre si laços de aliança, antagonismo ou
dominação em dado momento histórico (BRANDÃO, 2004).
9 Ver os esquecimentos em Pêcheux (1995, p.173).
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revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
12 As três maiores tiragens do segmento revistas no Brasil são ocupadas por este tipo de publicação. Além disso,
conforme dados de 2008, as quatro revistas semanais de informação, Veja (Editora Abril), Época (Editora Glo-
bo), IstoÉ (Editora Três) e Carta Capital (Editora Confiança), mantém uma circulação média de 1,9 milhão de
exemplares, com uma estimativa de 7,5 milhões de leitores por semana. Segundo a Associação Nacional dos
Editores de Revistas, juntas, elas detêm 52% desse mercado. Disponível em: http://www.aner.org.br. Acesso
em 05 fev. 2009.
188 SCHWAAB, Reges Toni; TAVARES, Frederico de Mello Brandão. O tema como operador de sentidos no jornalismo de
revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
a uma leitura do todo do mundo, ou da totalidade de um público, mas que se volta para a
totalidade de sentidos de um só universo temático e que deve dizer da complexidade dos
universos (temporais e espaciais) que o envolvem.
A dinâmica que abrange tais publicações faz com que, na relação tema e jornalismo aí
construído, ocorra um processo co-incidente. De esferas temáticas formatadas no conjunto de
subtemas de temas principais (geradores), ocasiona-se: a criação de significados sobre um tema
específico (ecologia, qualidade de vida, etc.), a configuração de um público, e a formatação
de um produto jornalístico (a publicação em questão). Algo que, seja nestas publicações es-
pecializadas, seja nas semanais, coloca em evidência o tema para além do assunto e aponta
para os processos advindos do jogo de suas operações.
Operações e processos
Nas singularidades e regularidades presentes nas revistas, como apontado acima, a pre-
sença do tema coloca em evidência a existência de uma relação outra no jornalismo, que o
permite pensar não sob a ótica da instantaneidade, da velocidade e ou da novidade propriamente
dita, mas sob um ponto de vista que diz respeito a uma produção (apuração, redação, etc.) que
está condicionada a uma ação do tema sobre o jornalismo e a uma reação deste sobre aquele.
Sob o prisma da ação temática, o jornalismo de revista, em sua relação com o tema,
vê-se envolto a processos de configurações editoriais (o tema caracterizando perfis editoriais),
materiais e discursivas (o tema caracterizando formatos, visualidades e textos), e de segmentação
(o tema caracterizando públicos). Assim, o tema provoca ao (e no) jornalismo de revista ações
que o colocam, mais que um conteúdo a ser buscado, como algo que penetra e faz parte do
jornalismo que ali é feito. Cabe ao jornalismo de revista observar e mapear, na trivialidade
cotidiana, o que foge ao extraordinário e, inversamente à lógica canônica jornalística, falar
sobre temas espalhados na sociedade, buscando dar conta de suas tramas, estando, ao mesmo
tempo, relativamente sujeito à capacidade geradora que os envolve.
A resposta jornalística a essa provocação se dá pela configuração de características
específicas ao jornalismo de revista e, ao mesmo tempo, de enquadramentos jornalísticos
aos diversos temas abordados. Principalmente no que diz respeito a aspectos relacionados às
condições de produção do discurso das revistas, elementos temporais, sociais e tematizadores
recolocam-se frente ao jornalismo cotidiano. Alguns pontos dessa dinâmica podem ser assim
detalhados e/ou retomados:
As características acima elencadas, que dizem respeito à ação jornalística sobre o tema,
se tensionadas com aquilo que o tema provoca ao jornalismo de revista, oferecem um ponto
de reflexão instigante: ambos os processos, em nenhum momento, encontram-se descolados.
São eles co-incidentes, atuam um em função do outro, e geram, dele também fazendo parte,
um circuito informativo que diz ao mesmo tempo do jornalismo, da sociedade e da revista;
estando os temas no entremeio dessa relação. Neste locus, o tema constitui-se construto,
moldando a(s) revista(s) no mesmo passo em que a(s) revista(s) também molda(m) o tema.
15 Os campos semânticos construídos pela linguagem constituem esquemas de classificação que permitem a
acumulação da experiência. A transmissão de esquemas de classificação para diferenciar os objectos constitui
o acervo social de conhecimento (PONTE, 2005, p. 99).
16 Interpelado em sujeito, em sua forma individualizada concreta, aquela visível e a partir da qual é possível
adaptar o sujeito ao social do capitalismo (ORLANDI, 2002).
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revista. Revista Galáxia, São Paulo, n. 18, p.180-193, dez. 2009.
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