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aqsontsiiitiee eet tees Os sujeitos autistas, seus objetos e seu corpo 85 cha rapidamente a porta, deposita a mamadeira sobre a mesa e vai para a caixa de areia; mostra-a com o dedo, mas nao toca em nada. Volta para acabar de criar um vazio em torno da mamadeira e, quando termina, me diz ‘Até logo’ e sai.”¥? As ferramentas" que J.-A. Miller extrai do ultimo ensino de Lacan sao muito uteis para pensar essa clinica da cadeia e da extracao. Alias, foi ao me perguntar como utilizé-las que me vi levado a repensar sob outro Angulo o que eu tinha comecado a formular trinta anos atras, num trabalho em cartel com os Lefort, Judith e Jacques-Alain Miller. Do objeto sem forma a em-férma do objeto a As escolhas eletivas e os usos autistas dos objetos podem ser muito curiosos. Esses objetos sao eminentemente diversifica- dos. Num certo ponto do espectro da experiéncia autista, sio uma em-forma; noutro ponto, um sem forma. Assim, T. Grandin'’ — que, lembremos, tornou-se uma es- pecialista mundialmente reconhecida em zootecnia — desen- volveu um interesse todo especial por diminuir 0 sofrimento dos animais. Propés modelos especificos de cattle chute (gaiola Para reses), ou squeeze chute (gaiola de contengao), gaiola ou dispositivo que permite “segurar um animal para marcé-lo, vacina-lo ou castré-lo”.16 Aperfeicoou circuitos especiais para €sses animais, currais curvos, menos brutais que os currais com angulo reto, de tal maneira que os animais entram neles da forma mais eficaz, evitando ao mesmo tempo que sofram. Acarne serA claramente mais saborosa se nao estiver invadida Por todos os horménios do estresse produzidos pelo animal antes de ser morto. Isso também permite manter 0 peso do animal no maximo: nao ha perda. T. Grandin é, portanto, bem. vista por todos aqueles cuja profissao é sacrificar esses animais com fins de lucro. Para ela, porém, trata-se de algo bem dife- rente. Ao desenvolver novos métodos para conduzir as vacas ao abatedouro, seu objetivo nao era que a carne fosse melhor, mas evitar sofrimento para os pobres animais. Estamos longe da pelcia ou da boneca transicional: esse ponto merece ser esclarecido com maior precisdo, mas o que é certo é que ha um objeto em jogo. Sua mie confirma que, desde bem pequena, Temple ja se refugiava em envoltérios para conter a si mesma. Esclarece, desse modo, que antes de ficar fascinada com os cattle chutes depois de uma estada no rancho de sua tia (a ponto de cons- truir uma squeeze chute pessoal, que também vai chamar de hug machine), os envoltorios eram o objeto transicional de Temple, seus comfies, seus “socorros”. Ela conta que a cattle chute era objeto de um “conflito interno” e suscitava nela uma estra- nha reacio de “rejeicio”..” Abriu-se a esse respeito com 2 mae, que, numa carta, lhe respondeu: “Nao se inquiete com 4 {cattle chute}. E um ‘paninho’ [comfy]. Vocé se lembra de que reieit?™ todos os ‘paninhos’ {comfies] quando era pequena? Vocé nao 05 suportava. Sua necessidade de se voltar para a [cattle chute] € agora natural.”* Portanto, aos dezoito anos, Temple monta uma maquin? que a abraca, the hug machine, a maquina de abraos. para ace va mar sua angustia. Mas, desde a infancia, ela se Prone rou} com a criac4o dessa maquina, assim como com suas “ “pa que tinham de ser folgadas. Sobre a maquina, ela diz: = horas, na escola, pensando nesse aparelho milagros° © ji 8; Os sujeitos autistas, seus objetos e seu corpo 7 de estudar. S6 comecei a estudar quando me dei conta de que \ os conhecimentos eram necessarios para construir © aparelho | que me forneceria os estimulos que me faltaram na infancia.”!* Por muito tempo ela fara uso diario dessa cattle chute pes- _ soal. Em 2010, menciona que a maquina quebrara em 2008 e / que ela nao a consertou: I’m into hugging people now?? (“Agora, | abraco pessoas”). ; Esse dispositivo nos diz, com efeito, algo sobre a maneira : |como 0 sujeito pode preservar uma relacao fixa com um ob- : jeto que entra em seu mundo, um objeto que adquire uma {forma e que também da uma forma ao sujeito. O matema lacaniano do objeto a é, sem diivida, bem mais adequado para ‘qualificar o meio pelo qual T. Grandin captura um corpo, um corpo animal ou entao o seu. Ela mesma afirmou que “se imagin[ava] no lugar de uma vaca”;?! “Eu me identificava ; com 0 animal”,”? escreve ela também. Essa identificacao nao tem nenhum mistério para ela, seu corpo esta, nao contido, { mas bordeado por essa forma, encerrado nela. Aqui, o que 0 objeto 4 poe em forma, encerra numa forma, a em-forma?? do f objeto a, nada mais é senao a cattle chute, que da uma forma ; ao objeto olhar enlouquecido — 0 olhar dela e o do animal “de olhos enlouquecidos, ... aterrorizados e nervosos”?4 — e se articula ao corpo. 1 Isso contrasta muito com varios outros casos em que o ob- jeto pulsional rejeita qualquer captura no registro da forma ‘ do corpo. Quando o transtorno ou a perturbacio estado no auge, em particular quando as criangas sao abandonadas a si mesmas, sem que seus corpos encontrem limites que acolham seu sofrimento, entregues a um Outro feroz, elas as vezes ten- tam extrair as fezes de seu corpo, chegando até a introduzir 4 a mao no anus num horrivel fist-fucking. Percebe-se © quanto essa extracdo é 0 oposto da cattle chute. Trata-se, naquele caso, de um objeto de gozo sem forma que se impoc ao corpo. Esta incluido de maneira tao paradoxal no corpo que tem de ser ¢ ao prego da terrivel dor extraido custe o que custar, ainda qu mas do objeto que essa pratica pode provocar. Para além das for parcial, do objeto a, o objeto sem forma remete a um aconteci- mento do corpo traumitico fundamental no sujeito autista, € a isso retornaremos mais adiante. Por enquanto, basta constatar esses dois regimes do objeto. Num primeiro caso, temos 0 objeto que vem fazer supléncia aos limites do corpo, encerra-lo tranquilamente, protegé-lo da angustia de intrusio. Dizemos, com Lacan, que o objeto se apresenta como em-férma, tal como as formas de sapatos que constituem em-formas para conservar, de dentro, o vazio dos calcados e impedi-los de se deformar, de desabar. Num outro regime de funcionamento, 0 objeto é extraido do corpo, sentido como alteridade radical. O objeto enquanto vestigio do vivo deve ser abolido. De que maneira passar dessa extracdo bruta a um objeto cuja extracao do corpo seja me- nos cruel, como os “objetos de merda”, bonecas estropiadas e informes, as vezes fedorentas, por estarem realmente em continuidade com a extra¢ao corporal do objeto anal? De que maneira, em seguida, transformar esse objeto, com a ajuda de um dispositivo que o torne passivel de se afastar do corpo e de ser pego nele de outra forma? A medida que se afasta do corpo, o objeto pode, com efeito, entrar na troca, no laco social, a exemplo da cattle chute, capaz de ser incluida entre outros objetos da troca social. Apesar da complexidade de sua inser¢ao no abatedouro moderno, a cattle chute funciona ¢ é sae : Os sujeitos autistas, seus objetos e seu corpo 89 efetivamente utilizada. Ao contrario da inven¢ao de Joey -a crianga-maquina -?° que lhe servia, de maneira singular, para entrar em relagdo com os outros, a de T. Grandin nao é auto- centrada, Ela inventou uma maquina util que é aperfeicoada dia apés dia no departamento de zootecnia da Universidade do Colorado. Apesar dessa diferenga, sublinhemos, contudo, que a maquina de Joey Ihe permitiu desenvolver seu saber e encontrar uma profissao de técnico de nivel superior. Com esse resto que, em sua incomparavel diversidade, 0 objeto autistico constitui, outros sujeitos também demonstram tais efeitos de inclusao quando conseguem extrair esses ob- jetos tao préximos do corpo e, ao mesmo tempo, separar-se deles. Portanto, chamamos de “objeto” esse acomodamento dos restos, dos dejetos, deixados pelo encontro com o Outro da lingua que vem perturbar o corpo, seja qual for o substrato biolégico do funcionamento ou da disfungao de tal corpo. O objeto é essa cadeia heterogénea, feita de coisas descontinuas (letras, pedagos de corpo, objetos tirados do mundo...), orga- nizada como um circuito, munida de uma topologia de borda e articulada ao corpo. Topologia do espaco pulsional Diferentemente do objeto anal pego no circuito da demanda, quando se trata da extracao bruta de um objeto informe, as fezes nao se separam do corpo, elas sao extraidas como pura Fepeti¢ao de um objeto sem forma que nao pertence ao corpo. Anica articulagéo com o corpo é a de uma rejeicio radical. Oreal impde uma topologia que nao é a de um corpo circuns-

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