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Stephen L. Macknik e Susana Martinez-Conde com Sandra Blakeslee Truques da mente O que a magica revela sobre © nosso cérebro Traducae: Locia Ribeiro da Silva & ZAHAR ‘Aos nossos filhos maravilhosos, Iago ¢ Bras. Agradecemos a vocts por toda a magia, wvscene of Mage Reveals About Our Evelay Deceptions) suiorizaa a pelea edigfo americans, publicada ow por Henry Holt Company uma divsio da Mace de Nova York, Estos U Mackaike Susana Marines Conde igi beasieira © aon e Zahar ter 1) ago | fn (a1 2520987 cedtoraggzaharcom br | yovsczahancom br | 2235104 Rio de Janie ns “Todos os dietos reservados A reproduc ‘uem pare, consti velco de dtits tora (Li 9610/98) is 1 Macinet-Conde, Susana, Sumario Introdugo 7 1. A mulher do vestido camaleGnico: ilusdes de dptica e magia 13, 2.0 segredo das colheres que entortam: por que os magicos tomam cuidado com os angulos 33, 3.0 padre que simulou uma cipula: lusts de éptica na arte e na ciéncia st 4, Bem-vindos a0 espetdculo, mas, por favor, mantenham 05 olhos vendados: ilusSes cogritivas 64 5.0 gorila entre nés: mais ilusées cognitives 85 6.0 segredo do ventrloquo:ilusbes multissensoriais 108 7.0 truque indiano da corda:iustes mnémicas 128 8. Exectativa e suposigéo: como os magicos nos fazem de bobos 151 Que a forga esteja com voce: a ilusio de escolha 178 10, Por que as varinhas magicas funcionam: corralagées ilusérias, superstigéo, hipnose e vigarice 209 11, 0.Castelo Magico 238 12, Amégica val acabar? 267 Epilogo 287 Notas 289 Agradacimentos 904 indice 308 Introdugao ‘Tenceins Le sada € indist ia suficientemente avan- Lat pr Niven: “Qualquer magica suficientemente avangada 6 indistin guivel da tecnologia.” Agariia Hereronrne ("Girt Genius"), Pararrase da Let op Nive: Q quer magica suficientemente analisada & indistinguivel da cigncial™ ‘Alguma vez vocé ja se perguntou como funcionam os efeitos migicos? Moedas se materializam do nada. Cartas se movemn em um baralho como se fossem puxadas por uma forca invisivel. Belas mulheres sio cortadas 20 meio, Colheres se vergam. Peixes, elefantes e até a Estitua da Liberdade desaparecem diante dos nossos olhos. De que forma um mentalista adivi nha os nossos pensamentos? Como é possivel nao ver um gorila na sala? ‘Como alguém consegue deter um projétil com os dentes? Como fazem isso? Nao se dé ao trabalho de perguntar a um ilusionista. Ao ingressar em, uma organizacdo de magicos profi nais, é possivel que o iniciado seja solicitado a prestar um juramento: “Como magico, prometo jamais revelar 0 segredo de qualquer ilusio a um nao magico, a menos que essa pessoa também jure respeitar o juramento dos magicos. Prometo nunca fazer nenhum truque para ndo magicos sem antes praticar o efeito até poder executé-lo bem o bastante para preservara ilusdo da magia.” Trata-se de ‘um cédigo, Uma confraria. O magico que desrespeita esse cédigo corre 0 risco de sofrer a reprovacao de seus colegas profissionais. Entio, 0 que nés, dois intrusos, estamos fazendo ao escrever um livro sobre magica? J4 nao se revelou quase tudo sobre o ilusionismo? Escreva “magica” na caixa de buseas do site Amazon Books e aparecerio 75 mil 8 Truques da mente resultados, Procure no YouTube e vocé poder ver praticamente todos os mnstrados com truques de ilusionismo jé inventados ~ muitas vezes den adoraiveis er nas de sete anos em seus quartos, enquanto a mie ou o pai seguram a cmera, Visite a Craigliste faca sua escolha em uma mirfade de encantadoras descrigdes de magicos amadores locais. O que mais resta dizer? Na verdade, muita coisa. Este ¢ 0 primeiro livro que ja se escteveu so bre a neurocincia da magica, ou, se voce prefer igia, termo que cunbamos ao iniciar nossas viagens pelo mundo do ilusionismo.* Muito {jise disse sobre a hist6ria da prestidigitacdo, os truques dos profissionais, os mais recentes acessorios de apoio € as reagies psicologicas aos efeitos d remos revelar 0 interior do cérebro no momento em que somos tapeados Jusionismo. Mas a ncurociéncia vai mais fundo na investigagio. Que por truques de prestidigitag2o, Queremos explicar, em um nivel funda- ‘mental, por que somos tao vulnerdveis aos ttuques da mente. Queremos que vor’ veja que a ilusto & parte integrante do carter human. Que cenganamos uns aos outros 0 tempo todo. E que sobrevivemos melhor € lusamos menos recursos cerebrais 20 fazé-lo, por causa da maneira pela qual nosso cérebro produza atencao. ‘Como muito do que acontece na ciéncia, chegamos ao ilusionismo por acaso, Somos neurocientistas do Instituto Barrow de Neurologia (BNI, na na cidade de Phoenix, Arizona. O BNI é 0 mais antigo Instituto auténomo de neurologia dos Estados Unidos ¢, no momento, sigla em ingles) tem o maior servico neurocirargico da América do Norte, fazendo mais de 6 mil craniotomias por ano, Cada um de nés dirige um laboratério de pesquisas no instituto ~ Stephen, 0 laboratério de neurofisiologia do com portamento, Susana, o laborat6rio de neurociéncia da visio. A propésito, somos casados. Temos o interesse primordial de descobrir como 0 cétebro, na condigao de dispositivo feito de células individuais chamadas neurdnios, 6 capaz de produzir a consciéncia, a sensagao de nossa experiéncia na De Powell, redator da revista New Je 2008, que intro ‘conta alternativa para "neuromagia” (estudo neuro screveu nossos primeizos estudos em seja tim pouica mais restrita do que “magicologi te intercambiiveis ese geral primeira pessoa.* De algum modo, quando os neurdnios se ligam uns aos outros em circuitos especificos, atinge-se a consciéncia, Essa é a suprema indagagio cientifiea, ¢ a neurociéncia esté prestes a respondé-la Nossa incursio pelas uses comecou hi uma década, quando, como Jovens cientistas que buscavam renome, tentamos instigar algum entu- siasmo popular por nossa especialidade, a neurociéncia da visio. Em 200s, depois de aceitarmos nomeacdes para o corpo docente do BNI, orga zamos a anual Conferéncia Europeia sobre Percepgo Visual, que se dew na cidade natal de Susana ~ La Coruifa, na Espanha. Queriamos expor a ciéncia da visio de uma maneira nova, que deixasse o pablico € a midia intrigados. Estavamos fascinados pela maneira como a ciéncia € capaz de cexplicar algo sobre as artes visuais ~ por exemplo, o trabalho de Margaret ngstone sobre por que o sorriso da Mona Lisa € to inefavelmente cenigmitico. Também sabiamos que as ilusdes de éptica séo de importincia fundamental para se compreender como o cérebro transforma informa. des visuais brutas em percepeto. A ideia que nos ocorreu foi simples: criariamos o concurso A Melhor Iusio do Ano. Pedimos a comunidades cientificas ¢ artisticas que con tribuissem com novas ilusdes de dptica e recebemos mais de setenta ins- crigdes. A plateia (uma mistura de cientistas, artistas e pablico em geral) viu as dez melhores ilusdes e escolheu as trés primeiras. O concurso, que hoje est em sua sétima edigao, foi um enorme sucesso. Nossa audiénci na internet dobra a cada ano, € nosso site (http://illusionoftheyear.com) recebe cerca de cinco milhdes de visitas anuai Por causa de nosso sucesso com o concurso de ilusdes de 6ptica, a Associacdo para 0 Estudo Cientifico da Conscigncia (ASSC, na sigla em glés) nos pediu que presidissemos sua conferéncia anual em 2007. A ASSC € uma associacao de neurocientistas, psicblogos e fildsofos unidos pelo objetivo de compreender de que modo a experiéneia consciente emerge das interagées de células nervosas desprovidas de pensamento ¢ indivi dualmente nao conscientes. 3, “apercep: 0 Trquesdan Propusemos realizar a conferéncia em Phoenix, nossa cidade natal, mas a diretoria da associacao rejeitou prontamente essa ideia porque faz um calor infernal na cidade no meio do ano. Em vez disso, ela sugeriu... Las Vegas. Hmmm. Em junho, Las Vegas é to escaldante quanto Phoenix, ¢,s¢ levarmos em conta al tem varios graus ad legas dos estudos sobre a consciéncia pareciam estar buscando um pouco ance, o jogo e as dancarinas, provavelmente nais de calor por causa do atrito, Assim, nossos co- de agitacdo de verdade, para apimentar seus exper yentos. Pois entdo, que fosse Las Vegas. Voamos para la em outubro de 2005, para fazer umas sondagens, No voo, perguntamos a nés mesmos: como poderiamos aumentar para o pablico a visibilidade das pesquisas sobre a consciéncia? Nao querfamos promover outro concurso. A resposta come cota germinar no momento em que nosso nclinou as asas para se aproximar do acroporto de Las Vegas. Pela janela, vimos ao mesmo tempo a Estitua da Liberdade, a Torre Biffel, um vuledo em erupcao, a Agulha Espacial, a Esfinge, 0 reino de Camelot e a Grande Piramide. Pouco de- pois, subiamos € desciamos a Strip, verificando o espaco para conferén cias nos hotéis. Passamos pelo castelo de Aladim, pelo Grande Canal de Veneza ¢ pela Ilha do Tesouro. Parecia estranho demais para ser real. E entéo, pimba, surgiu o tema da nossa conferéncia. Imagens de magicos enfeitavam cartazes, tixis e 6nibus: Penn & Teller, Criss Angel, Mac King, Lance Burton, David Copperfield. Eles nos fitavam com olhares matreiros c sortisos sedutores. E entio nos ocorreu que esses il as eram algo. como cientistas do mundo da bizarrice ~ e que haviam superado a nds, cientistas de verdade, em sua compreensio da atengio e da consciéncia, ¢ tinham aplicado de modo irreverente essa compreensio is artes do entre: tenimento, do furto praticado com destreza, do mentalismo e da tramoia G@ssim como a padroes singulares e inquietantes de pilosidade facial). ‘Como cientistas da visio, sabiamos que os artistas tinham feito desco- bertas importantes sobre o sistema visual durante centenas de anos e que @ neurociéncia da visio havia adquirido enormes conhecimentos sobre 0 cérebro ao estudar as té Pi claborar as regeas da perspectiva © da oclusio visuais, a fim de fazer com que pigmentos depositados em s ¢ idcias deles sobre a percepedo. Foram os no os cientistas, os primeiro: Inerodugao " ‘uma tela plana parecessem uma bela paisagem, rica em profundidade. Per- ‘cebemos entdo que os magicos eram apenas um tipo diferente de pintores: em vez da forma ¢ da cor, manipulavam a atencio e a cognigio, ‘Os migicos basicamente fazem experimentos de cién noite inteira para suas plateias, e € possivel até que sejam m: do que nds, cientistas, no laboratério. No entanto, antes que nossas cai- xas de entrada se encham de mensagens inflamadas de colegas furiosos, eficientes permitam-nos explicar. Os experimentos de neurociéncia cognitiva sto intensamente suscetiveis ao estado do observador. Quando o sujeito ex- perimental sabe ou consegue adivinhar a que se refere o experimento, é comum os dados serem corrompidos ou se tornarem impossiveis de ser analisados. Tais experimentos sio frageis e canhestros. E preciso instaurar mediclas minuciosas de controle para que os dados experimentais sejam ‘mantidos puros, Agora, comparemos isso com os espetécullos de ilusionismo. Os tru- ques de magica testam muitos dos mesmos processos cognitivos que estu amos, mas so de uma robustez incrivel. Nao tem a minima importéncia que a plateia inteira saiba que est sendo tapeada; ela cai em todos os es Sdo executados, um espetéculo apés outro, noite truques cada vez que apés noite, geracdo apds geracdo, Pensamos: “Ah, se pudéssemos ter essa habilidade ¢ essa esperteza no laboratério! Se tivéssemos apenas metade dessa mestria para manipular a atengo e a consciéncia, que avangos po deriamos obtet!” A ideia ganhou forma rapidamente: reuniriamos cientistas e ma para que os primeiros pudessem aprender as técnicas desses iiltimos € dominar seus poderes. Havia apenas um problema: nfo entendiamos nada de magica. Nao conheciamos um magico sequer, Nenhum de nés jamais tinha sequer assistido a um verdadeiro show de magica. Por sorte, nosso colega Da- niel Dennett nos arranjou uma grande oportunidade. Dennett é um. companheiro cientista e fildsofo que também vem a ser amigo de James, +lvel Randi, um famoso magico ¢ cérico que tem passado décadas \¢Bes de paranormalidade. Randi nos escreveu uma idea, Disse-nos que desmasearando al resposta em que endossou com entus smo an uns conbecia outros trés magicos que seriam perfeitos para nossa finalidade: Teller (da dupla de magicos Penn 8 Tel ‘Todos moravam em Las Vega: Mac King ¢ Johnny Thompson. interessavam pessoalmente pela ciéncia cognitiva. Apollo Robbins, 0 Ladrao Cortés, amigo de Teller, juntou-se 20 nosso grupo alguns meses depois. Grande parte deste livro se baseia em. nossas interagbes com esses magicos talentosos. Assim comegou nossa jornada de descobrimento sobre os esteios new: smo. Passamos os ittimos anos viajando pelo mundo, conhecendo magicos, aprendendo truques ¢ inventando a cineia da neuro- ‘magia. Desenvolvemos nosso proprio espeticulo de magica e resolvemos fazer uma audigao no mais pres oso clube de ilusionismo do mundo, 0 Castelo Magico, em Hollywood, na Califérnia, como auténticos magicos, (Para saber como nos saimos, veja 0 Ca Os truques de magica funcionam porque os seres humanos tém um processo estruturado de atencio e consciéncia que pode ser invadido e alrerado, Ao compreender como os migicos enganam nosso mais aptos a compreender como os mesmos truqh -s cognitivos funcionam nas estratégias de propaganda, nas negociagdes comerciais ¢ em toda sorte de relacdes interpessoais. Quando compreendermos como a magica funciona na mente do espectador, teremos desvendado as bases neurolégicas da prépria consciéncia.* Entdo pegue uma cadeira, porque Trugues da jor espetaculo de ilusi 10 da ‘Terra: 0 que esté acontecendo neste exato momento em seu cérebro, ais discutidas a0 A mulher do vestido camalednico: ilusdes de éptica e magia Johnny Thompson, o magico polonés conhecido como Mago de Vars6: via, que tem um niimero com incontaveis piacas infames - “Como sou parte polonés, parte irland@s e parte siciliano, eu poderia ser um zelador bébado que também faz. as vezes de pistoleio” -, irrompe palco adentro com seu smoking imaculado. Famoso como 0 Grande Tomsoni ~ "podem de um mestre do ile la MC. riz, proeminente, ness me chamar de O Grande” -, Johnny tem o ar al sionismo prestes a nos fazer subir (ou seria descet?) uma escada Escher, toda feita de trapagas, Ble tem 0 queixo largo, orelhas enormes ¢ um dos mais assombrosos penteados do show para disfarcar a calvici. Imagine por um Johnny aponta na direcdo de um refletor luminoso q jada com um miniisculo vestido branco, © Grande Tomsoni stante que voce est na plateia. As luzes esmaecem involve sua b ente, anuncia que transformard esse vestido branco em vermelho. AA luz do xplode em refletor diminui por um brevissimo instante e, em seguida tum ofuscante brilho de luz vermelha. A mulher é subitamente inundada de vermelho. Espere ail Trocar a cor de um refletor comum nfo é exatamente uma ilusio espantosa. Johnny para na lateral do paleo, parecendo satisfeito com sua piadinha. Sim, ele admite, foi um truque barato, do seu tipo favorito, explica. Mas hi que se concordar em que ele de fato fez 0 vestido da moca ficar vermelho junto com todo 0 resto. Por fav soja gentil com ele e bran volte sua atengio mais uma vez para a jovem assistente d enquanto ele volta a acender as luzes para o truque seguinte 1 Truques da mente Johnny bate palmas. As luzes tornam a esmaecer. Voce se pergunta por que comprot ingressos para um espetéculo tio bobo de magica e, de repente, 0 palco explode em uma supernova de brancura. E 0 que vocé vé? De mancira inexplicivel, desta vez vestido da mulher de fato ficou vermelho. Um vivo carmesim, Bla rodopia umas duas vezes para que vocé posse observar a transformacio magica, © Grande Tomsoni chegou Ié, mais uma vez. Jobnny acaba de priedades fundamen — que estudamos por profissio — constituem uma demonstracio particular ‘ar uma ilusio espetacular, baseada em algumas pro do sistema visual do cérebro. As ilusOes de Optica mente palpavel do giro sistemadtico de ilusdes que acontece o tempo todo no cérebro, em todos os niveis de percepedo, consciéncia e pensamento. Por definicio, as ilusbes de Optica sao percepedes visuais subjetivas que nao correspondem 4 tealidade do mundo que nos cerca. ‘Ao vivenciar uma ilusio de dptica, vocé pode ver algo que nio existe, deixar de ver algo que existe ou ver algo diferente do que existe. Suas per cepgdes contradizem as propriedades fisicas daquilo para que voce olha Podemos reconhecer cle imediato por que as ilusdes de dptica sto tteis para os ma s. E, para os cientistas, elas so instrumentos indispen: saveis para explicar os circuitos neurais e os Iculos mediante os quais © Acestranha verdade € que o cérebro constréi a realidade, tanto visual quanto de outra natureza, O que voce vé, ouve, sente e pensa se baseia no que espera ver, ouvir, sentir e pensar, Por sua vez, suas expectativas esto baseadas em todas as suas experiéncias ¢ lembrancas anteriores. O que vemos no aqui ¢ agora é aquilo que se revelow util para nds no passado. Sabemos que as sombras se inclinam de certa maneira, dependendo da hora, que os rostos em geral so vistos na posicao vertical e que a gravi- dade exence uma influéncia previsivel em tudo. Quando essas expectativas Sfo violadas, 0 cérebro pode levar mais tempo para elaborar os dados, ‘ou podemos concentrar a atencao na violacio. Mas, quando tudo corre ‘sranguilamente, sem surpresas, nosso sistema visual dei escapar grande do vestido camaledrica 8 parte do que acontece 4 nossa volta. E por isso que vocé pode voltar para casa dirigindo 0 carro sem se lembrar do que aconteceu entre 0 escritério eaentrada da garagem. Uma tese fundamental deste livro € que os mecanismos cerebrais, que evocam as ilusdes percebidas, as reagdes automaticas ¢ até a propria consciéncia definem, essencialmente, quem somos. Eles evoluiram em paralelo & nossa marcha bipede e a nosso fisico de macacos sem pelos. So produtos de uma trilha evolutiva que permitiu a nossos ancestrais| atravessar diversos gargalos da histéria humana, sobreyiver a era glacial ¢ inventar a agricultura, a linguagem, a escrita ¢ instrumentos cada vez mais sofisticados” Vocé 0 resultado dessa jornada épica, ¢ o mundo nunea viu nada que sse.a ela, Sem essas aptiddes sensoriais, motoras ¢ cognitivas {inatas, vooé no conseguiria baixar programas no seu smartphone, dirigit automéveis, lidar com as relagées interpessoais necessarias para se formar no ensino médio ou sequer para dar um chute em uma bola de futebol. A razio pela qual é capaz.de fazer essas coisas ¢ que, em esséncia, voce é uma maquina de fazer previsdes, ¢ prevé sem esforgo ¢ com preciséo quase todos os eventos que estao para acontecer em sua vida, Em um nivel intuitivo profundo, os magicos compreendem que © idade e, tal como Johnny, exploram o fato de nosso cérebro fazer uma quanticade estarrecedora de individuo cria sozinho a sua experiéncia de re francas fabulacdes para construir a simulago mental da realidade conhe- cida como “consciéncia’. Isso nao quer dizer que a realidade objetiva ndo “exista” em um sentido muito real. Mas tudo que experimentamos é uma simulagdo, O fato de a consciéncia dar a impressio de ser uma transcri- lida, robusta e factual da realidade é apenas uma das ilusdes que co * Embora seja seres humanos, temos apt especiais que faltam inteiramente a outras espécies, toda ver que os cient sses ateibutos ou capacidades nos distingue do resto do reino a sagem, o uso de ferns a cultura e até a danca nio sio exclusivas dos seres humanos, aind 4qve, em dado momento, todas tenham sido consideradas definidoras do reino humano e restritas tardam a desme pesquisadores ni 6 Truques da mente © cérebro cria para si mesmo, Pense bem: 0 mesmo equipamento neural que interpreta os dados sensoriais reais € também responsavel por nossos sonhos, lusdes ¢ lapsos de meméria. O real e 0 imaginario compartilham uma fonte fisica no eérebro. Nos proximos capitulos, afirmaremos ~ e esperamos convencé-lo disso — que uma proporcao surpreendente de nossas percepgoes é fundamental: has curvas, mas, quando as mede com ‘mente iuséria, Voce pensa ver uma fita métrica, verifica que sfo retas. Pensa estar prestando atengio, mas um larépio furta habilmente seu relogio, bem diante do seu nariz. Vocé acredita estar ciente daquilo que o cerca, mas, seja qual for o momento considerado, bloqueia 95% de tudo o que acontece. Os magicos usam esas vivias ciladas perceptuais e processos cerebrais contra nés, em uma forma de ji jitsu mental. Os samurais inventaram o jiusjitsu como uma ma- neira de continuarem a lutar caso suas espadas se quebrassem na batalha, Bater em um adversétio protegido por uma armadura seri o jiu-jitsu se bascia no principio de usar a energia do proprio agressor con- tra cle, em vez de fazer oposicgo a essa forga. Os magicos tém um modus operandi similar, Suas formas de arte se baseiam no principio de usar as propricdades intrinsecas da mente do espectador contra ele. Revelam 0 cérebro como 0 mentiroso que ele é. No truque do vestido vermelho, Johnny joga com o nosso sistema vi- sual, Composto de olhos e cérebro, esse sistema nfo deve ser comparado uma videocimera dispendiosa, que filme imagens do mundo com uma profusio de pixels. Ele é, antes, um emaranhado sumamente evoluido de circuitos, que se apoia em aproximagdes, palpites, previsdes ¢ outros atalhos para, literalmente, construit 0 que pode estar acontecendo no mundo em determinado momento, Eo que sabemos sobre esses circuitos? Exatamente que aspectos do cézebro dao otigem asilusdes de Optica? Como podemos sondar o aparelho visual para compreender a fonte tltima das ilusdes? Resposta completa: nna maioria das vezes, ndo podemos. Ao longo deste livro, estabelecere- ‘mos uma distinedo entre os principios psicolégicos e seus correlatos neu- rais. Consider (TEPT), O pris s, por exemplo, o transtorno de estresse pés-traumatico, io psicoligico que diz que o excesso de tensio pode evar Ammulher do vestida camalednico 7 a0 TEPT & bem documentado. Mas isso nao nos diz:nada sobre os meca- nismos cerebrais envolvidos, Para chegar aos correlatos neurais do TEPT, precisamos de um neurocientista que vasculhe 0 cérebro para desencavar cos detalhes do que acontece, em termos fisicos, no interior de seus circuitos. Quanto as ilusdes de éptica, hé um principio psicolégico que se re- fere a uma ilusio que ocorre quando a realidade fisica nao corresponde a petcepeao. Se os seus olhos veem profundidade quando vocé otha para uma pintura sobre uma tel contornos da imagem interagem na sua mente. No entanto, isso nao The deve ser gracas ao modo como as bordas ¢ os diz. nada a respeito de como o cérebro produz a ilusio. Outro principio psicologico trata o cérebro como uma caixa-preta. Essa é uma descricio “seca” das percepgdes e seus supostos esteios. O correlato neural é uma me- dida direta da atividade da anatomia cerebrais, e nos diz.quais partes do cérebro sio usadas para processar 0 percepto, quais circuitos dessas areas cerebrais déo origem a uma ilusdo ou até revela detalhes minuciosos sobre “molhada’”. Sabemos 0s neurotransmissores envolvidos. E uma biologia mais sobre prinefpios psicolégicos do que sobre correlatos neurais, mas essa defasagem esté comecando a diminuir. Pode-se dizer que os avangos mais empolgantes da ciéncia atual vém ocorrendo no campo das neurociéncias. Para compreender 0 que enfientam os neurocientistas ao explicarem as ilusdes de éptica, é preciso conhecer alguns fatos elementares sobre al. Nossos olhos nos dizem apenas parte aquilo que podemos “ver”. O resto é feito pelo cérebro, em um kbirinto como funciona o sistema vi de etapas. A primeira camada do aparelho visual consiste em fororveceptores ‘oculares que convertem a luz em ‘os, & também nessa camada que se origina um atributo cardeal do cérebro: a capacidade de detectar contrastes. Essa propriedade constitui a base de toda a cognicao, pensar e prestaratencao, Sem la, o mundo nao teria fronteiras eo cérebro nao poderia compreender a inclusive da capacidade de ver, ouvir, sen si mesmo nem compreender nada fora dele. Naturalmente, os migicos tropecaram em métodos que tiram partido da deteccio de contraste teatro negro, que descreveremos mais adiante neste capitulo, nclusive em uma espantosa ilusio chamada 8 Truques da mente As informagoes provenientes da retina so canalizadas para um feixe de fibras chamado nerw dptico, que transporta padres eletroquimicos para o interior do cérebro, Tudo aquilo que percebernos penetra no cére: bro sob a forma de padroes. Na realidade, nao “vemos” nada; em vez disso, processamos padres relacionados com objetos, pessoas, cenas ¢ aconte cimentos, pata construir representagdes do mundo. Essas informagées fazem uma breve parada no centro do cérebro, o télamo, antes de subirem, para o cértex visual primério —a primeira area visual do prosencéfalo ¢ a primeira de cerca de trinta regiées corticais que, de maneira hierarquizada, extraem informagSes mais detalhadas acerca do mundo visual. B af que etectamos pela primeira vez.as diferentes orientagdes de linhas, bordas e quinas em uma cena visual Subindo na hierarquia, temos neurinias que disparam em resposta a contornos, curvas, movimentos, cores e até tracos especificas, como mios € rostos, Temos neurénios binoculares ~ que respondem i estimulagio proveniente dos dois olhos, em contraste com a que vem de um 6, Alguns disparam quando um alvo se move da esquerda para a direita, outros, s6 quando ele se move da direita para a esquerda, Outros reagem apenas a ‘movimentos de cima para baixo ou de baixo para cima. Alguns responclem melhor 4 movimentacio de bordas, ou a bordas que se movem em uma determinada orientagio. E assim que passamos da deteccao de pontos luminosos nos fororreceptores para a deteccio da presenca de contrastes, bordas e quinas até a construgao de objetos inteiros, inclusive com a per- cepcio de sua cor, tamanho, distancia e relagZo com outros objetos. Nesse processo, o aparelho visual faz inferéncias ¢ se vale de palpites desde o inicio. Percebemos um mundo tridimensional, embora uma sim. ples imagem bidimensional incida sobre cada retina, Nossos circuitos visu- aisampliam, jinam e fazem convergir e divergir as informagées visuais. Percebemos aquilo que vemos como algo diferente da realidade. Percep- cio significa resolucao de ambiguidades. Chegamos A interpretagdo mais plausivel das informag6es retinianas integrando indicios locais, Pensemos nna lua cheia elevando-se no horizonte. Ela parece enorme. Horas de entretanto, quando esti bem no alto e, na verdade, metade do diametro terrestre mais perto de nés, parece muito menor. O que poderia explicar 1 do vestido cami 12 agi ‘has s neurnios do sistema visual ps lateral (conto do cérebro| eno cértex visual pr ‘que conecta essa dreas do cérebra inc Sptiea@asradiagesdptcas. (Co os olhos, na ncleo gericulado io (parte do tris do oérebra. A rede rervo Otic, 0 quiasma 6p to do Barrow Neurological Institute) isso? O disco que incide em nossa retina nfo € menor com a lua no alto do que na lua nascente. EntZo, por que parece menor no alto? Uma das respostas € que inferimos o tamanho maior da lua nascente pelo fato de a vermos perto de arvores, morros ou outros objetos no horizonte. Nosso cérebro a amplia, literalmente, com base no contexto. f também por isso que um pedaco de papel cinza pode parecer escuro quando é cercado de branco, ou claro, quando a mesma folha é cercada de preto. E.uma pena, mas simplesmente nao se pode confiar nos proprios olhos. \s par. tes de cenas visuais que 0 cérebro nao consegue processar. Temos de faz Inventamos grande parte daquilo que vemos, “Completam Jo por causa da simples limitacéo do mimero de neurdnios ¢ conexées neuronais subjacentes aos processos sensoriais e mentais. Por exemplo, © nervo éptico contém todas as fibras que enviam informacbes visuais a0 cérebro, Cada nervo éptico ¢ composto por cerca de um milhio de fibras neurais, que ligam cada retina ao cérebro. Esses fios individuais sio chamados de axénios, e cada um representa um “pixel” da imagem visual, Portanto, cada otho & mais ou menos equivalente a uma camera de um megapixel. Parece muito, mas considere que, provavelmente, até a cdmera do seu telefone celular tem uma resolugio melhor que essa, 0 ‘Truques da mente Entlo, como € possivel termos uma percepeto to rica e detalhada do mundo, quando, na verdade, a resolucio do nosso aparetho visual equi vale a de uma camera digital barata? A resposta curta é que a riqueza da nossa experiéncia visual é uma ilusdo criada pelos processos cerebrais de preenchimento de lacunas. VISIBILIDADE E LUZ Talver voc# pense que a visibilidede requer apenas que alu incida sobre a sua retin. Porém, ela ¢ mais complicada do que isso. Nem tada lur usada por seu cérebro & vel para voe8. Por exemplo, como todos as seres hhumanas, voc® nao sabe cal- 0 de luz do meio a seu redor. Néo sabe, de maneira cular com exatidé o ni constiente, qual é 0 tamenno de sua pupila em um dado momento. Parte da razio disso € quea fs se adapta ao nivel tiferentementeiluminados sejam acessiveis ao processamento neural, Na lu fraca, 2 fis se abre para permitira entrada ce mais fotans, ena uz forte ela se fecha para impedir que a retina saja ofuscada palo bilo. € por isso que os especialistas em eis de luminosidade, como 0s fotdgrafos,precisam usar um dispositivo objetivo de medigao do nivel de luz, chamado fotémetro, ¢ no suas proprias estimativas 1 de luminosidade, a fim de paderem determinar @ melhor distancia focal a ser usada cam a lente de sua cémera. Contudo, isso quase chega 2 parecer um raciacino circular. Como & poss ‘com preciso a quantidade de luz que penetra em nossos olhos, por causa das al: ‘eragtes de nossa iis, mas o cérebro que contro a iis ter de ser responsavel por cotimiar @ densidad de fétons que atingem a retina? A resposta é que o controle is de fato calcula. com exatio as mudangas do nivel de lu, porém o faz 70 e ajuda a fazer com que ambientes subjetivas visuais do ni | ndo sermos capazes de quantificar te Por isso, vocé sé tem consciéncia de alguns aspectos da cena, coma a lumindncia relative das objets presentes, ao nasso que outa partes da informagio visual, como a medida quantificada do nivel global de luz, so manejadas de forma inconsciemte. dio vest letinica 2 Os magicos exploram tempo todo essas caracteristicas do nosso sis: tema visu -m seus truques, Usam ilusdes de profundidade nos truques com baralhos, Usam 0 contexto para enganar a percepgo. Contam com © fato de que voc’ preencherd as partes faltantes de uma cena, Recorrem a neurdnios detectores de bordas para nos convencer de que sio capazes de vergar colheres. E podem até recorrer a propriedades especificas do aparelho visual para nos deixar momentaneamente cegos - 0 que nos leva de volta ao Johnny. ‘ALERTAS DE SPOILER ‘Aguns mgios acham que os segtedos por és ds truquese iusGes nunca devem ser evelades, mas @ maioria concorda que & necesséia cert revelayo de magia para que a arte floresga — desde que os segredos soja revelados com cuidado, @ aponas para 2s pessoas que prcisam conhecé-os. Jack Devin, presidente do Ciculo Magic, uma destacada associago internacional de magia e iusionsmo, enunciaa ideia da segunte mancita: “A porta da magia fic fechada, mas no trancads” Ou seja, no existem segredos reais na mdgica: esto todos a para que qualquer um 0s descubra.Entretanto, 6 preciso querer muita buscé-los. €necesséi praticar feito um condenado para obter acesso ao clube, para ndo vir evelarsegredos avidentalmente, em fungéio de um desempenoprecério. seria inadmissival alguém topo poracaso com urn segredo ao lr uma revista auentreowwi uma converse ov 20 ler um liv. Visto que & necesséro evelar alguns sagredos para ciscutira neuroeina da igi, assinalamos todas as segGes do lvro em que os revelamas. Elas vm com a indicago “alert de spoiler”. Se vocé ndo quiserconhecer os segredos magicos nem saber como o seu cérebroé tapeatio por eles, pode pular esses techos. Ou nto pode se juntar ands na exparegio de camo e porque vac se deixa engenar com tanta facie. ves da mente 2 [ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREBRA! © truque do Grande ‘Tomsoni com o vestido vermelho revela uma pro- funda compreensio intuitiva de processos neurais que ocorrem no cérebro. Vejamos como ele o faz. Quando Johnny apresenta sua assistente, 0 vestido branco e justo que cla usa induz.o espectador a supor que nada - a0 menos néo outro vestido, com certeza — poderia se esconder sob o vestido branco. E claro que essa suposigio sensata est errada, © corpo provocante e sedutor da mulher também contribui para que a atengio seja concentrada exatamente onde Johnny a quer ~ na moga. lade de se notar os Quanto mais se fixa o olhar nela, menor é a probabil dispositivos escondicdos no piso, e mais os neurénios retinianos se adaptam, A luminosidade do refletor que Durante toda a conversa-fiada de Johnny, depois de sua “piadinha”, 08 olhos ¢ 0 cérebro do espectador passam por uma adaptacéo neural. Quando o refletor se apaga, os neurdnios visuais antes adaptados disparam_ uma resposta reativa conhecida como pés-descarga. Essa resposta faz. com. a sobre ela, que uma imagem-fantasma do objeto perdure por um momento. ‘Vemos esses tipos de pés-imagens ilusérias todos os dias, Pense no ‘lash das maquinas fotograficas. Ele dispara e a pessoa fica com um bri: Ihante ponto branco tempor: na escuridio. Por um instante fugaz, os fotorreceptores da parte da re- tina que registraram 0 flash “pensam” que, de repente, 0 mundo inteiro ficou brilhante branco, Adaptam-se instantaneamente a esse nivel de ‘no campo visual, que vai esmaecendo luminosidade. Quando o ft. segundos ou até minutos, as vezes, para se readaptar por completo aos niveis verdadeiros de iluminac3o. A adaptacio dos neurénios do movimento no cérebro também ex- brilhante o suficiente, a retina pode levar a ailusio da cachoeira. Se vocé passar um minuto ou mais olhando para uma cachocira e em seguida deslocar o olhar para as pedras ou a vegetacao proximas d la, os objetos estacionirios parecerdo estar Muindo para cima. A ilusdo ocorre porque os neurdnios cerebrais que Amulter do vestdo camaletnica a detectam o movimento descendente se adaptam ao estimulo continuo da Agua que cai, 0 que os torna relativamente menos ativos. Os neuré nios viainhos que detectam 0 movimento ascendente nfo se adaptam a0 movimento e, apesar de terem estado em repouso, sao relativamente mais ativos. Uma vez que 0 aparelho visual foi feito para discernir con- trastes ~ nesse caso, neurdnios adaptados ao movimento descendente verstts neurdnios nao adaptados ~, o cérebro chega & conclusio final de que ha alguma coisa se movendo para cima. Por isso, quando vocé olha para as pedras iméveis, elas parecem fluir magicamente para cima por alguns segundos, Entio, percebe agora por que o truque do Johnny funciona? Os neuré nios retinianos seletivos da cor vermelha adaptam-se ao vestido iluminado de vermelho, reduzindo sua atividade. Os fotorreceptores do vermelho so mais sensiveis a essa cor do que os fotorreceptores do azul ou do verde. Assim, os neurOnios sensi is ao vermelho no aparelho visual ficam mai adaptados ¢ tém uma pés-descarga maior. Na fragio de segundo depois que Johnny apaga as luzes, vocé percebe a explosio de vermelho como uma pés-imagem em forma de mulher. Ela persisve em seu cérebro por cerca de um décimo de segundo. Durante essa fragdo de segundo, abre-se rapidamente um algapao no palco e 0 vestido branco, apenas levemente preso com Velero e ligado a cabos invisiveis que descem até debaixo do paleo, € arrancado do corpo da assistente, Em seguida, as luzes retornam ¢ revelam um auténtico vestide vermelho, Outros dois fatores contribuem para que o truque funcione. Primeiro, ailuminagio € tio forte no instante que antecede a retirada do vestido que, quando ela se aterua, o espectador fica efetivamente cego. Nao consegue vet os movimentos ripidos dos cabos nem o vestido branco, quando eles desaparecem sob o palco. A mesma cegueira temporaria pode nos acome- ter quando saimos de uma rua ensolarada e entramos em uma loja pouco iluminada. Segundo, Johnny s6 faz 0 verdadeiro truque depois que voce pensa que a coisa jé terminou. Isso Ihe confere uma importante vantagem cognitiva: a surpresa, Vocé nao esta 4 procura de um truque no momento crucial, por isso relaxa ligeiramente seu exame. Pr Truques da mente As pos-imagens persistem em tod ccrianga, talvez, vocé tenha aprendido a criar uma p6s-imagem da meméria muscular, pressionando o dorso dos pulsos para fora contra as ombreiras, 05 sistemas sensoriais. Quando dle uma porta ¢ contando até trinta, depois do que seus bragos pareciam levitar, Na verdade, ha uma profusdo de pés-imagens sensoriais na vida cotidiana ¢, a medida que temos consciéncia delas, essas pos-imagens costumam ser apenas pequi impresses ou chatices fugazes, Para os ‘migicos, no entanto, valem ouro. FIM D0 ALERTA DE SPOILER ‘Como cientistas da visio, admiramo-nos constantemente com a arguicia ‘com que 0s migicos manipulam os cireuitos visuais do cérebro, Lembre-se do que dissemos sobre a nossa aptido para identificar contrastes: sem ‘© mundo nfo teria fronteiras ¢ o cérebro nao conseguiria se compreender nem compreender nada fora dele. Pois bem, os ‘igicos sabem tudo de identificacio de contrastes. Es. barraram nela ha mais de cem anos, com a invencio da arte negra, ot teatro gro. Nao sc trata do abracadabra dos antigos magos ¢ feiticeiras, mas de um método cénico para produzir assombrosas ilusdes visuais, descoberto por acaso em 1875 por um ator e diretor alemao, Max Auzinger. Segundo consta, Auzinger estava preparando uma cena de calabouco para uma peca €, no intuita de torné-la 0 mais assustadora possivel, fortou o comodo de veludo preto, Em um momento crucial, um mouro negro deveria aparecer em uma jancla do calabouco e recitarsua fala, No entanto, quando o ator que representava 0 mouro p6s a cabega na janela, ninguém conseguiu vé-lo, As tinicas coisas visiveis foram duas fileiras de dentes brancos fl twando no ar, abaixo de dois globos oculares brancos. Auzinger captou de imediato as imy is pretos contra um fundo preto, conseguiu fazer objetos e pessoas a¢des da iluso, Manipulando aparecetem e desaparecerem no paleo. E pde criar um niimero de magica e ninguém jamais tinha visto. Em pouco tempo, seu espeticulo “O armario negro”, estrelado por ele como Ben Ali Bey, sai em turné pelo nente, recebendo er do vestide camalesnico % Hoje em dia, um némero de teatro negro chamado Omar Pasha é igualmente popular , equipado com material ¢ modernos, sem duivida é mais espetacular do que as apresentagdes de cem anos atris. Produzido e apresentado por Michelle ¢ Ernest Ostrowsky, juntamente com seu filho Louis-O! personagem que aparece com aderecos fluorescentes em wm paleo negro ‘er, o programa € estrelade por um como azeviche, banhado por luz negra. A luz negea ~ aquilo que os cientis- tas chamam de Iuz ultravioleta — vibra em um comprimento de onda mais curto do que o da luz violeta visivel, e é chamada “negra” por ser invisivel. A fluorescéncia ocorre quando um comprimento de onda luminosa se converte em outro, Milhares de substincias brilham ou fluorescem sob a influéncia da luz negra, porque a luz invisivel se transforma em luz visivel ¢ faz as substincias fluorescentes se iluminarem com um brilho que no parece natural. A vaselina é de um azul elétrico, afluorita tem um intenso brilho roxo, amarelo, azul, rosa ou verde. Outros materiais reluzem em vermelho ow laranja, dependendo de suas substncias quimicas. No vero de 2009, virnos Omar Pasha em uma apresentacdo a0 vivo.” Ela é assim: ao subir a cortina, um homem de turbante branco decorado de brocado vermelho, tinica branca de brocado de seda, pantalonas de seda, faixa vermelha na cintura e capa vermelha, luvas brancas ¢ sapatos vermelhos com curvinhas na ponta dos pés que lembram os duendes do Papai Noel curva-se quase até 0 chao, Nao sorri ~ em momento algum. ‘Trata-se de Omar Pasha (Ernest Ostrowsky), que ¢ uma mistura do se- dutor presidente francés Nicolas Sarkozy com o gala de filmes de capa e espada Errol Flynn, Ao fundo pulsa o Bolero de Ravel. O piso do paleo, as. paredes laterais, as cortinas, tudo 0 que se pode ver é negro feito piche, com excecao de Omar Pasha, banhado em luz negra Como primeiro truque, Omar tira do turbante uma grande caneta de feltro e, com meia diizia de gestos largos, desenha o que parece ser uma es tante de miisica de 1.5m de altura, com uma barra dourada no alto. O objeto ideo, para que a cimera no pudesse captar os abjetos oew 26 Truques da mente parece surgir do nada. Em seguida, 0 migico desenha trés velas vermelhas, da barra da estante para cima, Tem-se entio um candelabro ~ s6 que nfo & um desenho, mas um objeto real de trés dimensées, Omar o levanta ¢ faz ‘uma ligeira mesura, em um convite aos aplausos. Em seguida, acende uma das velas ¢ a segura com o braco estendido & direita, Segura uma segunda vela com 0 outro brago estendido a esquerda, Olha para a chama, fazendo- the um sinal, A chama entio flutua sobre sua cabeca e desce sobre a outra acendendo-a. Com ar satisfeito, Omar faz sinal com a cabeca para a terceira vela, que continua na estante. A chama auténoma toma a partir, descreve um arco sobre a cabeca dele e pousa na terceira vela, Depois de uma mesura, Omar aperta as trés velas entre a palma das mios e elas desaparecem. O candelabro flutua pelo palco ¢ estaciona em uma mesa. No segundo truque, Omar pega um lencol de seda branca amarfa- mhado no chio € 0 sacode com um floreio, Surge do nada uma cadeira. Omar se coloca atrés dela e a cobre com o lengol, mostrando o perfil da cadeira vazia. Levanta o lencol ¢ o enfuna como se fosse uma vela balio, ce quando o pano cai vé-se que agora ha um rapaz de turbante sentado na cadeita. Omar péc-lhe uma venda nos olhos e apanha um sabre, Postando- se de frente para 0 rapaz, faz um movimiento de corte em seu pescogo. Quando chega para 0 lado, o homem esta sem cabeca. Omar segura a ca- beca cortada por alguns segundos € a coloca na mao estendida do homem acéfalo. A coisa de fato parece real, Em seguida, Omar se posta na frente do homem pela segunda vez e, quando chega para o lado, a cabeca voltou para o lugar, Ah, que bom, ninguém se machucou. Como tetceiro truque, o magico estende 0 brago no ar e surge em sua mio um cartaz enrolado, Ele 0 abre, revelando 0 desenho de uma bela jovem, ¢ torna a enroli-lo, Em seguida, pendura 0 cartaz no ar, desenrola- de novo e revela.a propria mulher, que sai da mokdura e pisa no paleo. Omar cobre a moga ¢ 0 rapaz com lengéis. Faz alguns gestos magicos cos lengéis crescem ¢ encolhem de maneira fantasmagérica. O lengol baixo, © lencol alto do que cobre a moga, cresce até 0 tamanho do homem, homem se encolhe até o tamanho da mulher. Voce ja sabe 0 que acontece em seguida: o efeito de transporte na versio mais limpa que jé vimos desse truque: Amulher do vestdo camalednico a ‘Vem entio o grande final, Omar torna a cobrir 0 rapaz com um Ien- gol de seda e 0 convida a dar alguns passos 4 frente. Postando-se atris dele, balanga as maos, pega o lencol e o arranca. O rapaz desaparece. Em seguida, ele poe um bambole no chao e pisa no interior do circulo, para mostrar que esti desobstruido. A moca se coloca no centro do aro. Omar levanta 0 bambole e vemos a jovem desaparecer no espaco, & medida que aro sobe ¢ oblitera seu corpo. Por fim, o magico pega um lencol no chao ese cobre, Enquanto 0 Bolero segue em um crescendo até seu auge, Omar desaparece sob o lengol, que obedece a dois estalos de uma mao invisivel. Esté terminado o espetaculo de seis minutos. Todos esses efeitos ad Wveis tém raizes na identificacio de contras- tes. Nossos olhos nao conseguem detectar nada sem que esteja presente algum tipo de mudanga, Uma das maneiras de explicar esse fato € por ‘uma expetiéncia conhecida ~ contemplaro eéu noturno repleto de estrelas. Imagine que vocé se deita de costas, em uma noite quente de verao, sob um céu sem hua, ‘Todos aqueles pontos de luz se encontram tio distantes que a area ativada na retina por cada estrela é menor que a area de um. linico fotorreceptor. Isso significa que, do ponto de vista do cérebro, a estrela é a menor coisa que se pode ver. Agora, imagine-se erguendo os olhos para o céu azul em um dia claro. ‘Todas aquelas estrelas continuam li, ando vivamente, mas vocé nao consegue vélas, Durante o dia, ficamos cegos para as estrelas. A razio tem a ver com as quantidades comparativas de luz que atingem os olhos de dia ¢ 8 noite. Durante a noite, uma estrela tipica produz. 10% de luz a mais que a luz dispersa circundante que vem da atmosfera, Trata-se de uma quantidade infima, porém é 0 bastante para perm hho que 0 apare- al distinga a estrela, Esse contraste entre figura e fundo é o sinal fundamental usado pelo cérebro para criar a imagem mental que temos da estrela. Sem esse contraste, os neurénios cerebrais nao teriam nada para falar uns com os outros, Durante o dia, 0 céu azul é 10 Ges de vezes mais luminoso do que o mais negro céu noturno, Uma estrela perfeitamente vis el A noite nao pode ser detectada pelo aparelho visual pois 0 céu circundante é tao claro que a diminuta contribuicio do brilho da estrela nao tem como ser detectada como um contraste. Nas palavras 2 Iruques da mente de Henry Wadsworth Longfellow, “o céu é repleto de estrelas que o dia torna invisivei [ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE ‘SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREBRAL (Omar Pasha cria suas deslumbrantes ilusdes cobrindo inteiramente 0 palco de veludo preto. Ao comecar o espeticulo, varios objetos em cena a estante de miisica, as velas, a cadeira — também esto envoltos em ve- udo preto, Sem nenhum contraste com que nosso aparelho visual possa funcionar, 0s objetos nos ficam invisiveis. Omar também usa a luz negra e tintas fluorescentes para reduzir ainda mais a visibilidade do fundo negro, Iminosos no paleo. incio, Se Omar falasse, seus dentes em contraste com 0s objetos O niimero todo transcorre em si brilhariam em um vampiresco tom roxo. Se ele ndo usasse luvas, suas 10 misterioso. A unhas ficariam fluorescentes. Seus olhos tém um bri medida que circula pelo palco, Omar vai retirando uma cobertura prea apés outra e tomando visiveis os objetos. Quando repoe as capas, eles se tornam invisiveis. Ajudantes envoltos em veludo negro entram e saem com facilidade do palco, sem que tenhamos um s6 vislumbre deles. Mos cobertas por Iuvas de veludo preto fazem chamas flutuarem pelo ar. A cabeca é decepada com a ajuda de um capuz de veludo preto. A mulher pretos. Nao & que o veludo preto seja invisivel. Se Omar pusesse sua mao desaparece dentro de um bambolé preso a leng; enluvada de branco atris do castical, antes de ele ser revelado, veriamos a silhueta escura do castical contra a huva. Nao, o truque esta no contraste on falta de contraste entre o tecido preto que cobre os varios objetos e 0 fundo preto do cena io € do paleo. (Os magicos no sio os tnicos a manipular contrastes para tornar as, coisas invisiveis. Os animais esto sempre fazendo isso. Chama-se camu- flagem ‘Todo animal que jé usou camuflagem em algum momento diminui seu contraste com 0 fundo, ganhando toda a invisibilidade possivel. No caso das estrelas no cu noturno eno espeticulo de Omar Pasha, reduzir ‘A multer do westida camalednico a © contraste significa diminuir a quantidade de luz contra um pano de fundio negro, Entretanto, outra maneira de diminuir o contraste é assumir ‘a mesma cor, textura ou brilho do pano de fundo ~ como 0 camaleio, 0 bicho-pau ou os soldados de uniforme camuflado. O contraste é a dife- rrenga entre um objeto € 0 meio que o cerca. Quando nao ha diferenca de cor, luminancia ou textura, ndo ha contraste visivel, por maior que seja aluz incidente. FIM 0 ALERTA DE SPOILER Jamy Tan Sw tris e um diamante si , com 0 cavanhaque bem-aparado, o cabelo penteado para na orelha esquerda, é 0 magico dos magicos © o rei dos truques de baralho feitos de perto. Adam Gopnik, redator da revista New Yorker, chama-o de Yo-Yo Ma do mentalismo, Penn e Teller 0 chamam de “James Bond com um baralho no lugar da pistola’. Jamy se refere a si mesmo como “um mentiroso sincero”, Ser magico, diz ele, é 0 meio de vida mais honesto que jé teve: ele promete nos tapear, ¢ tapeia. E como tapeia! Dispde quatro cartas viradas para baixo, arregaca as ‘mangas e move as mas elegantes sobre as cartas, como se agitasse corren- tes magicas. Estala os dedos ¢ uma delas se vira de maneira inexplicivel para cima—o as de espadas. Outro estalo. Uma segunda carta se abre mis. teriosamente — o as de copas. Estalo, Estalo, Mais dois ases ficam virados para cima, Nosso cérebo também dé um estalo. Como ele pode fazer isso? Jamy pega um baralho € mostra a carta de cima ~ digamos, o trés de ouros. “Vocé jé viv alguém balancara mao sobre um baralho e fazer uma carta se transformar em outra?”, pergunta, enquanto executa 0 movi ‘mento, O trés de ouros vita o valete de paus. “Basta vocé agitara mao”, diz, Fepetindo o gesto, “e ela muda’ — 0 valete de paus transforma-se no seis de copas -, “simples assim.” E continua: “As vezes, vocé dé s6 um tapinha ‘transformando uma apés outra em cartas diferentes. fazer nada remotamente suspeito — as cartas parecem flutuar pela matéria s6lida, sob o feitico de seus dedos ageis. Quisemos conhecer Jamy porque ele é um dos melhores prestidigita- dores que hé no ramo. Muitos truques de ilusionismo envolvem 0 uso de mater de apoio (@ classica fumaga ¢ 0s espelhos), além de outros detalhes complexos de producio, Mas, para dominar os truques feitos de perto, (© magico precisa confundir 0 aparelho visual humano. Perguntamos a “0 como Jamy teria pensado nisso, Estaria intuindo a ciéncia? Teria curiosidade sobre o que sabemos inés mesmos a que ponto um grande m: a respeito do funcionamento interno do cérebro? Muitos dos magicos com que falamos consideraram essas questOes, embora nao tivessem a mestria cientifica para isolar as respostas. B claro que isso nao os impediu de espee Nosso primeiro encontro com Jamy ocorreu no Three Flags Café, ho Marriott Hotel de Monterey, na California, a quatro quarteirdes do ¢ formar opinides pro Fisherman's Wharf e da Cannery Row. Era um final de manha e o lugar estava quase deserto, No ar pairava um aroma de café ¢ maré baixa, Pedimos para ver sua desaparic4o da moeda com retencao da visio um truque que envolve a manipulagio de uma tinica moeda. Ele foi po- pularizado hi mais de um século por Nelson Downs, um magico do final das eras vitoriana ¢ eduardiana conhecido como “Rei das Moedas”, Downs se dizia capaz de empalmar — isto é, de esconder em uma das mos — até sessenta moedas de uma vez. Nosso amigo Eric Mead, 0 fabuloso mentalista e magico, dissera- nos que Jamy fazia o melhor truque de desaparigio com retencio da visio que ele jé tinha visto. Jamy no nos decepcionou, Com um sorriso matreizo, abriu a mao esquerda com um floreio. A palma estava virada para cima, ligeiramente inclinada na nossa direcZo. Ele a apontou com 0 indicador di ‘0. Em seguida, mostrou na mio direita uma brilhante ‘moeda de cinquenta centavos, presa entre o polegar e os dois primeiros dedos. Seu olhar acompanhou a moeda quando ele a depositou na palma da mio esquerda, Sua mio esquerda foi se fechando em torno da moeda, um dedo de cada vez, a comecar pelo indicador esquerdo ¢ se movendo em sequén- cia até 0 dedo minimo, como uma onda na praia de Pipeline, no litoral norte de Oahu, no Havai. A medida que seus dedos se fecharam, a moeda desaparecer atriis da onda, Ao mesmo tempo, a mio diveita de Jamy se afastou ‘A mulher do vestido camalodnico 0 E entio, acabou-se. Obseryamos com atengio quando o magico rea- briu o punho, ea moeda~ que sem a menor diivida tinhamos sto ani- nhada na palma de sua mio ~ havia sumido, Incrivel! ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE ‘SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREGRAIS! Jamy nos contou que o efeito de retencao da visio funciona melhor com objetos brilhantes. A moeda é perfeita porque ele pode giré-la quando a deposita na mio esquerda. Isso garante que todos os espectadores vejam. um lampejo de luz, refletindo as luzes do salio, Esse lampejo cria uma breve pés:imagem, no muito diferente do que faz 0 flash de wma camera fotografica, porém menos intenso. Literalmente, vemos a imagem da moeda desaparecer, ou desfazer-se em nada, diante de nossos olhos. © truque de Jamy é semelhante ao de Johnny com o vestido verme- Iho, na medida em que os dois exploram pés-imagens. A diferenca é uma questdo de escala, tempo das populacdes especificas de neurénios que se adaptam. Johnny faz o aparelho visual se adaptar a um alvo seletivo, 0 vestido vermelho. Jamy usa um claro para fazer com que se adapte apenas a pequena porcio da retina que vé a moeda. Ele fecha a mao sobre esta, assim que a pés-imagem é criada. Isso Ihe dé algumas fragBes de segundo para retirar a moeda ¢ escondé-la na mio direita — enquanto a plateia pensa que ela esté na esquerda, obviamente, Isso se vé com uma clareza ctistalina, A pés-imagem comeca a desvanecer enquanto os dedos de Jamy se curvam, fechando punto. Mas ja fomos enganados. Jamy também nos disse que nao ¢ apenas 0 que ele faz com as mios que leva 0 truque a funcionar, Ele usa 0 corpo inteiro. Exagera, modi cando propositadamente a postura para indicar suas intengBes, Os mégicos uusam a tensio e 0 relaxamento para manipular nosso julgamento sobre ‘onde esti ou ndo esté 0 objeto oculto. (Percebemos que teriamos de aplicar esse principio em nossa audigao no Castelo Magico) Jamy demonstrou como fazer uma falsa teansferéncia. A ideia é fingit que uma moeda passa da mao direita para a esquerda, Ele faz 0 movi- mento de transferéncia ¢ acentua suas consequéncias. A mio esquerda, eva ruques oa mente que supostamente recebeu a moeda, sugere tensfo. A direita, que em tese a teria Jargado, fica relaxada, como se nao segurasse coi alguma Jamy usa 0 corpo todo nesse niimero, Enquanto faz.a falsa transferéncia, desloca o peso da direita para a esquerda, como se esse lado do corpo passasse a suportar o peso da moeda. Gira a cintura, torcendo e deixando ‘muito ligeiramente os ombros para a esquerda, como se transferisse © peso de uma das mios para a outra, Vira a cabega enquanto seus olhos acompanham a moeda de uma das méos para a outta. Nao importa que a moeda pese menos que um gole de café. Nao pre- cisamos deslocar o corpo a cada golinho tomado da xicara, Mas Jamy exa- gera ligeiramente cada aspecto da falsa transferéncia para nos convencer de outta coisa. Ao combinar seu ato gil com a pos-imagem da moeda e ao transferi ua atengao, ele introduz uma incrivel dose de poder de su _gestio nesse miniisculo evento falso, Cria um enorme sortimento de pistas cognitivas para que nossa atengdo as descubra. Sua técnica ¢ to primorosa que, apesar de ter repetido 0 truque varias vezes (0 que é uma pratica proibida para espectadores ¢ mégicos) a nosso pedido (isso por amor a cién: cia, explicow), nao conseguimos deixar de ser seguidamente enganados. Mesmo tendo resolvido nos concentrar nas partes relaxadas de seu corpo, niio pudemos deixar de atentar para as partes tensas. “E ai que esté a acio”, nosso cérebro ficou nos dizendo, embora soubéssemos que era 0 contr: FIM D0 ALERTA DESPOILER Jamy acrescentou uma ilusio cognitiva a uma ilusio visual, estratégia usada por muitos grandes magicos para nos convencer de que coisas im- possiveis podem acontecer. As ilusbes cognitivas, que examinaremos no préximo capitulo, envolvem fungées cerebrais de nivel sup jor, como al atengdo ¢ as expectativas. No entanto, antes de chegarmos a elas, discu- tiremos mais algumas ilusdes de éptica derivadas de niveis superiores da hierarquia da visio. O segredo das colheres que entortam: por que os magicos tomam cuidado com os angulos Seis semanas apés visitarmos Jamy, estavamos sentados no terrago do restatirante ¢ enoteca Cheuvront, na Central Avenue, em ix, Segu: rando tacas de haste longa. O trem ligeiro que corre pelo centro da ave- nida passou rangendo e tinindo, a caminho do norte, ¢ fez uma parada a algumas centenas de metros. Uma figura solitaria dese cai nna plataforma e hou em nossa ditecdo, carregando uma sacola preta que balangava ‘cada passo, Era Anthony Barnhart, ou Magic Tony, para seus fis, € vinha trazendo as ferramentas do oficio — baralhos, um saquinho de moed: uques. rofessor de magia, ¢ esse encontro iante de como “ensinar os cientistas a bolas de esponja vermethas e cordas preparadas para fazer Magi era para ny € 0 nosso mentor € rmos outra sesso praticar 0 lus mo, ou pelo menos a fazer alguns truques ‘magica sem que passem vergonha no teste no Castelo Magi um sujeito grandalhao, de cabelo preto a esco aear semana, faz, doutorado em ps logia na Universidade Estadual do Arizona, em Tempe. Nas noites de sexta-feir no entanto, poe sua gravata boba com a imagem de um peixe vermelho (S6 a uso por causa do halibute € seus sapatos de estampa de leopardo ("Foi preciso usar dois leopardos para fazer estes sapatos, mas nao faz mal, eram filhotes”), e sai fazendo truques de mesa em mesa no Dragonfly Café, em North Scottsdale, Os fregueses o adoram., Nés também. ‘Tony cresceu em Milledgeville, natacZo que ensinava magicas nas horas vagas. Junto com o nado crawl ois, onde teve um professor de 4 ‘ruques da mente craliano, Tony, entio com sete anos, teve aulas de ilusionismo como 0 de imports crucial: a magica € para divertir a platefa, Os jovens mAgicos nfo devem iniciante e se apaixonou. Também aprendeu uma priorizar a metodologia em detrimento da teatralidade. Uma loja de mégicas, a Magic Manor, ficava a uma hora de distancia, em um shopping na cidade vizinha de Rockford, Como muitos garot apaixonados pelo ilusionismo, Tony passava incontiveis tardes na loja, vasculhando as gondolas ¢ tendo aulas em grupos, nos quais era sempre 0 mais jovem (¢ 0 que aprendia mais depressa). Frequentou o Acampamento Magico de Tannen, em Long Island, durante dois anos seguidos Sua lem- branca favorita de ter se ferrado (isto é, de ter sido vergonhosamente ta- peado) ocorreu em seu dormitdrio no meio da madrugada. Ele dividia o quarto com dois colegas de acampamento. Por volta das duas horas da manha, seu mentor 0s acordow e disse a Tony: “Pense numa carta.” Ele o fez e, mais tarde, 0 mentor deu o nome da carta em que 0 menino sono- lento havia pensado (era o sete de paus). “Ainda nao sei direito como ele fez isso”, disse Tony. “Deve ter me preparado de algum modo, mas ndo tenho certeza. De certa forma, gosto de nfo saber.” Nesse dia, Tony ia nos ensinar dois métodos usados no truque da carta ambiciosa. Esse truque famoso pode ser feito de intimeras maneiras, mas as que iamos aprender s4o especialmente pertinentes ao modo como os magicos enganam nosso aparetho visual, © magico pede que escolhamos tama carta no baralho, qualquer uma. Nés o fazemos e colocamos a carta no meio do baralho, O magico estala os dedos sobre baralho e pronto: a carta aparece misteriosamente no topo. E uma carta ambiciosa ~ sempre passa por cima de todas as outras. Esse niimero é conhecido nos anais do ilusionismo como o truque que enganou Harry Houdini. Nas primeiras décadas do século XX, Houdini era 0 migico mais famoso do mundo. Embora tivesse conquistado uma confianca suprema em sua capacidade de lograr truques espetaculares de escapismo, talvez ele tenha confiado demais em suas habilidades na micromagia, Com uma empafia ofensiva, fez um desafio a todos os mé: gicos: mostrem-me qualquer truque trés vezes seguidas e cu Ihes direi como ele é feito, ‘u segreao vas co! res que entortam % Em 1922, no Great Northern Hotel, em Chicago, um magico talentoso, Dai Vernon, accitow o desafio e demonstrou sua versio do truque da carta nbiciosa. Conhecide como 0 Professor, Vernon era mais do que pareo para Houdini, Bra um dos melhores prestidigitadores de todos os tempos e, a0 lado de outro magico, Ed Marlo, talvez tenha sido 0 mais influente mago das cartas do século XX. Vernon foi um inventor brilhante de eft t08 de micromagia com cartas, moedas, bolas e outros objetos pequenos. Ele peditr que Houdini escolhesse uma carta e nela assinasse suas ini- ciais, do baralho. Vernon estalou os dedos. tinta, A carta foi para ome A carta de Houdini apareceu no topo. Houdini ficou perplexo: ~ Voc® deve ter uma carta duplicada, ~ Com as suas iniciais, Harry? — perguntou Vernon, Ele repetiui o truque trés vezes, usando um método diferente a cada ‘uma, Houdini ficou enfurecido. Nao conseguiu descobrir como tinha sido feito. Vernon 0 executou mais quatro vezes, B ainda assim Houdini foi enganadlo ~ embora » \ca 0 tenha admitido em piblico. A prest itaco, quando bem feita, é milagrosa de se ver. (A palavra “sleight”* vem do nérdico antigo e significa inteligencia, perspicécia, ast: cia.) Em geral, é executada a curta distincia, a poucos passos do especta: dor, Existem centenas de truques diferentes. Alguns envolvem o desvio da atencio (chegaremos a eles no Capitulo 4). Outros exploram falhas do aparelho visual. Alias, o papel da percepedo visual na prestidigitacao é fandamental para a magi ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREBRAIS! Nilo € 4 toa que os magicos usam baralhos para fazer truques, As cartas so notaveis, por serem duras mas muito finas. Cabem na palma da mao € podem ser escondidas com facilidade. Podem ser embaralhadas, aber- ras em leque, viradas, empalmadas, cortadas, seguradas e embolsadas. Nossa primeira ligdo de hoje & a dupla levantada,” provavelmente o passe I do repertério dos magicos ~ e um a: ecto-chave mais basico e centi dos truques d ita ambiciosa, O segredo é virar duas cartas do topo do baralho, dando a impressio de que se vira apenas um No da atencio, simples assim, ntanto, se usado na hora certa e combinado a outros tipas de desvio \.os0, Dai Vernon era mestre um passe absolutamente esp: rna dupla levantada. Digamos que a sua carta seja o ds de paus. O magico - iga q abre o baralho em leque e vocé introduz o as, Ao fechar o leque, ele poe tuma carta em cima do 4s ¢ marca sub-repticiamente esse local, chamado ervalo, com o dedo mindinho, Faz um corte rapido, de modo qu a segunda carta a contar do topo. Vem e dupla. Ele levanta duas cartas e 0 4s aparece virado para cima, no topo. jo a levantada fs passe a se a carta ambiciosa, (© magico sorrie dizs "Sim, é carta ambiciosa.” Torna a levantar duas cartas viradas para baixo e pega a carta superior (que voce pensa ser 0 as, mas obviamente ndo é) ¢ 2 coloca no meio do baralho, Estala os dedos is! Com certeza, trata-se de uma carta e viraa carta do topo, que é... 0 ambic voce fica perplexo. Os magicos treinam por milhares de horas para levantar duas cartas sem revelar que as esto “manipulando”. & necessirio treinar os dedos para levantar duas cartas com destreza, convencendo o espectador de que esta levantando apenas uma, Isso envolve diversas manobras, como fazer uma pequena ondulacao nas duas eartas para que, quando viradas para baixo, 0 magico possa senti-las como uma sé. Uma vez viradas as carts a ondulacio se de: as cartas ficam planas, Para dor truque, os migicos devem ter a capacidade de executar os movimentos 10 de 1961, S tos magicos estragam sem prestar ateng30 ao que esto fazendo, Em u of Magic, Vernon alertou para o fato de que m 2 dupla levantada por terem medo de que as duas cartas se separem. “A ido, € nao deve ser carta’, disse cle, “é um objeto leve e del ada como um bloco de cimento.” tbém & conhecido por “das come wna", (NT) UU segreuo vas comeres: Entéo, como € que a dupla levantada engana sistematicamente o es- pectador? Por que 0 aparelho visual nfo consegue acompanhar como deveria? Isso tem a ver com o centro da visio, Para identificar duas cartas cartas juntadas com firmeza e se movendo como uma seria preciso por os olhos a centi las mils do magico ¢ fitar as cartas como que sob uma lente de aumento, Ainda assim, o truque poderia passar despercebido. A razao € que o aparetho visual tem uma resolugo muito preciria, tas si0 to finas que a visio no Jas, sobretudo nas maos de um habil especialista em giao abarrotada de fororreceptores. Junta com ddcula a proxima ao centro da retin: a fovea (© proprio centro da micula e a parte com ta, Jo mais, ela é responsivel pela visio de alta acuidade, Trata-se de uma parte tio especializada da anatomia que tem seu préprio conjunto de doenca clusive a degeneragio macular ligada a v €. A degeneragio macular €a mais comum dentre as formas de cegueira nos idosos, pois a mécula vai mortendo lentamente ao longo dos anos. Sem a mécut gue enxergar com a visio peri ‘ca, que tem uma resolugio 0 individuo circula vendo o mundo de acordo com o que aparece nas laterais da cabeca FIM DO ALERTA DE SPOILER ‘Tony mostrou-nos outra maneira de fazer o truque da carta ambiciosa, chamada ilusio de profundidade de Vernon (também conhecida como inclinagio de Marlo, porque os dois magicos a desenvolveram de modo independente), Muito depois da morte de Houdini, Vernon continuow a aperfeicoar o truque, com um discernimento diabélico do processamento visual. Nesse truque da mente ~ captado em uma filmagem rara da década de 1950 -, Vernon pede ao espectador que escolha uma carta e a assine.* we ruques 0 rm Pega a carta ea insere claramente no meio do baratho, de maneira lent: ¢ deliberada, para nao haver diivida de que se trata da carta escolhida, Em segutida, vira a carta do topo do baralho e pronto! —éa sua carta assinada. ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE ‘SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREBRAL ‘Teata-se de um acontecimento incrivel, espantoso, irritante. Vejamos como ‘em para fora, no ponto para o qual o espectador esta olhando ~ na frente do baralho, mais ou menos na metade da altura, de cima para baixo, Essas cartas empurradas reforcam a ideia de que Vernon de fato pretende inserir sua carta no centro do monte. Mas é um artificio, Enquanto rear- ruma o baralho (reintroduzindo as cartas), como que pata cortigir seu erro, Vernon inclina um pouquinho para cima as costas da carta do topo. © espectador nfo consegue vera inelinasio, embora lo de quase um centimetro entre a carta do topo e De sua perspectis haja agora um inter a seguinte, vistas por tris do baralho. Em seguida, Vernon pega a carta assinada e a insere no monte, na base do intervalo ni como se percebido. Do ponto de vista do espectador, ela entrasse no meio do baralho, mas, na verdade, agora ela € a segunda carta de cima para baixo, O observador nao nota a discrepincia por duas raz6es. Primeiro, do seu angu de visio, ele nfo consegue ver a inclina ‘io da carta superior, Nao Ihe ocorre que 0 magico possa estar inserindo sua carta na posigio da segunda, imediatamente abaixo da carta do topo. Em segundo lugar, seu aparelho visual o convence de que a sua carta esta muito abaixo da posieao da segunda m Ja parece estar no meio do baralho, mais ou menos cide posi¢Zo de quando Vernon empurrou mente” algumas cartas com a carta torcida. O espectador vi ‘outras cartas serem empurradas para serida”. Mas seri que de fato a viu entrar? fom 2 fa para omeia do bar Ia logo abaixo nada acima, 8 dreta). De um modo ov de outro, acarta areca estar nano meio da monte, vista plo Angulo da espectador.(Desenha de Jorge Otar0-M ébvio que nao, mas seu aparelho visual também Ihe diz. que agora suta carta foi oclufda pela parte superior do baralho. Seu Angulo de visio Ihe diz que sua carta esté sendo inserida, E sua visio tridimensional Ihe diz que sua carta deve estar no meio do baralho — umas vinte e cinco cartas abaixo da que esta no topo. claro que toda essa lbgica é burlada quando o verso da carta superior é inclinado, durante a segunda tentativa de inserc4o. Depois, um gesto muito inocente de Vernon permite que a carta inclinada caia, ¢ 0 intervalo se fecha. Agora, a carta assinada se encontra em uma posicao perfeita para ser tevelada por uma levantada dupla. Vernon diz ao espectador que sua carta ambiciosa subiu para o topo, e li esta ela. Em seguida, acentua a sensagiio de perplexidade, dizendo: “Deixe:me mostra ‘0 de novo.” Torna a virar para baixo as duas cartas superiores, com uma dupla levan. tada, e retira a de cima (que nao &a carta assina | embora o espectador aw traques da mente acredite que sim), inserindo-a de fato no meio do baralho. E 0 resto voce Jd sabe, A carta as Dois aspectos normais da percepcao de profundidade ~ a oclusio e a nada aparece no topo. para enganar o espectador. Esses processos si0 automiticos ¢ ocorrem sem que tenhamos consciéneia deles, razo pela qual o truque funciona, Lembra-se que dissemos que 0 cérebro constréi a realidade? Pois bem, nesse caso, o aparclho visual diz ao sujeito 0 qu “real”, mas € uma pobre vitima nas maos de um magico habilidoso. A oclusio se refere ao fato de que, quando uma pessoa fica parcial mente escondida atrés de outra, € natural presumirmos que a pessoa no ochuida esta mais perto de nds. O mesmo se da com as cartas de baralho. ‘Trata-se de uma deducio logica produzida pelo cérebro, feita de maneira automitica e quase instantinea, sem reflexto consciente, ‘Vernon engana mais uma vez 0 aparelho visual. Ja que o espectador io do baralho, as outras devem estar por ser inserida non \. Esto ocluindo sua carta, que deve estar bem mais abaixo no monte Ninguém sabe em que lugar do cérebro a oclusio é calculada, mas su: poese qu isso aconteca em um ponto do aparelho visual suficientemente alto para que os neurdnios pert individuas. Os neurdnios que entram em atividade logo no inicio do trajeto visual ntes codifiquem forma detectam apenas pequenas caracteristicas do mundo ~ bordas, quinas, curvas, Para montar uma forma completa e ver um objeto de interesse (uma pessoa, uma carta), precisamos de neurdnios selecionadores de for- ‘mas, que combinam os resultados dos detectores iniciais de caracteristicas, ‘Seguindo essa légica, precisamos de um nivel ainda posterior de calculo, capaz de deter de um neurénio esti sendo inar que a forma fav ‘ocluida, Portanto, 0 aparelho visual constréi a percepefo de profundidade ‘como uma linha de montagem automobilistica, uma peca de cada ver, até chegatmos a um percepto rico em profundidade Além disso, Vernon manipula nosso impulso cerebral de compreender a. A perspectiva linear se apoia no faro de que as nimos os termos “percepeio” ¢ "percept" ( seatedo das colheres que entortam linhas paralelas, como os trilhos de um trem, parecem convergir a distin- cia (0 truque da torre inclinada do Capitulo 3 se baseia nesse fendmeno). (O aparetho visual interpreta a convergéncia como profundidade, por pre- sumir que as linhas paralelas se mantém paralelas. No truque de cartas de Vernon, entra em jogo a perspectiva do tama- ho. Quando dois objetos similares parecem ter tamanhos diferentes, 0 aparelho visual presume que o menor esteja mais distante, Aqui, a carta assinada se afigura ligeiramente menor na retina, 0 que significa que deve mnge. Deve estar entrando no meio do baralho, com base em estar ma todos os outros indicios que o espectador ve FIM D0 ALERTA DE SPOILER No comeco da década de 1970, um novo superastro da magica surgiu no al. Sew nome era Uri Gel to e desengon- cenario mun cado, com uma cabeleira negra 4 moda dos Beatles, sobrancelhas escuras ec olhar penetrante. Presenca carismitica no palco, Geller colheres, fazer relogios pararem ou andarem mais depressa, patia desenhos ocultos ¢ estarrecer as pessoas de varias outras maneitas com seus “poderes sobrenaturais ‘Tratava-se de uma era de completa credulidade ‘Talvez fossem as drogas. Quando o sujeito po ¢gelatina de LSD e vé o mundo se transformar em uma tel feita de cores radiantes, formas geométricas que cintilam ¢ uma fantasma- goria mutante, enquanto seu senso de individualidade se desfaz, bem, por que nao seria possivel que alguém vergasse uma colher com o pensamento? ‘Talvez fosse a paranoia da Guerra Fria. A CIA acreditava que a KGB tinha aprendido a explorara percepcao extrassensorial ou a visio remota, Espides inimigos poderiam desvendar nossos segredos a meio mundo de distancia, usando seus poderes telepaticos. Poderiam sustar de longe os batimentos cardiacos (para uma visio divertida dessa epoca, ver 0 filme Ivez tenha sido um daqueles momentos bizarros da iaem que um mimero incomumente grande de pessoas, afora isso racionais, 6 u Traquas da mente seduzido pelo pensamento magico. Os modismos da Nova Era exaltavam, as maravilhas das cartas de tard, o | Ching, a fotografia kirliana, o poder dos cristais, a rabdomancia, a astrologia e as novas abordagens do desen volvimento pessoal em harmonia com a evolucao planetatia. Geller, na vanguarda dessa febre, era mais famoso por sua capacidade de vergar colheres. “Nao ¢ inerivel?”, deslumbrava-se, segurando uma colher pela parte mais estreita esfregando-a com o indicador, em gestos delicados porém ripidos, Aos poucos, como um acrobata curvando lan- guidamente 0 corpo para tras, a colher ia se dobrando, até se vergar em um Angulo acentuado, Magia das colheres. Milhdes de pessoas foram iludidas pelo ntimero de Geller, até que um. famoso “desmascaradot” de alegagées de paranormalidade, James Randi, conhecido como o Incrivel Randi, resolveu jogar um balde de gua fria no agito de Geller" Certa vez, Geller disse realizar suas proezas por meio de poderes sobrenaturais que Ihe tinham sido conferidos por extraterrestres. Ran entrou em cena e disse que as proezas de Geller eram truques de sali. Repet adi e tudo 0 mai -08 todos, explicando como era feito cada um ~ entortar colheres, ar pensamentos, fazer relégios pararem, praticar a rabdomancia ‘© pensamento magico é uma ladeira escorregadia”, disse Randi durante suas demonstracées. “As vezes € inofensivo, em outros momentos, muito perigoso, Sou contra o embuste, Desmascaro as pessoas suas ilusGes, mostrando.as como de fato sio.” Por exemplo, Randi explicou que fazia anos que os mentalistas repro- duziam desenhos ocultos. Uma pessoa desenhava algo em um pedaco de Papel e 0 escondia, ¢ ent&o 0 magico revelava o que fora desenhado. As vezes, 0 magico virava de costas e tapava os olhos enquanto o desenho era feito. Randi se perguntou: “Por que tapar os olhos, se ele est de costas?” E palma da mao que cobria 6s olhos mostrava exatamente o que a pessoa estava desenhando, fez a demonstracdo: um espelhinho escondido: Entretanto, apesar de seus esforcos para desmascarar Geller como ilusionista, as pessoas continuaram a acreditar. Até alguns cientistas se media/Randicy 0 searedo das colhores que e deixaram iludir. Em 1975, dois pesquisadores de psicologia paranormal ange Harold Puthoff, subme- do Instituto Stanford de Pesquisas, Russel teram Geller a testes e concluiram que ele se saira bem o bastante para justificar estudos mais aprofundados. Deram a isso o nome de “efeito Geller”. As ondas cetebrais, afirmaram, podiam afetar os metais diicteis. Danny dor, tem uma explicagio para a razdo de os cientistas serem particular um renomado cientista da computacio e magico ama- mente crédulos em relacio aos Gi ‘mais ficil ludibri sabem a que ponto os magicos sio capazes de descer € nao sio treinados lers da vida, “Quanto melhor o cientista, lo", diz ele. “Os cientistas sio pessoas honestas. Nio para enganar de maneira proposital Por exemplo, certa vez Hillis mostrou um truque de magica a Ri chard Feynman, um fisico da Caltech tido como uma das pessoas mais brithantes que jé existiram. “Eu fazia o truque e 0 desafiava a descobri Jo, Ble safa por um ou dois dias, pensava no assunto ¢ voltava com a resposta correta”, disse Hillis. “Ento eu repetia o truque, usando um. método inteiramente diferente. E isso 0 deixava louco. Ele nunca apreendeu. © metaprincipio de que cu mudava de método. Talvez isso se deva a0 modo pelo qual os cientistas sao treinados para usar 0 método cientific. (O sujeito vai fazendo experimentos até encontrar a resposta. A natureza € confidvel. A ideia de que alguém pudesse trocar de método simples mente 0 atordoay: ALERTA DE SPOILER! A SEGAO SEGUINTE DESCREVE ‘SEGREDOS DA MAGICA E SEUS MECANISMOS CEREBRAL Vergar colheres é algo que pode ser feito de muitas maneiras. Vejamos o que Tony nos ensinow.* Ble comega com trés cotheres e faz alguém escolher ¢ examinar uma delas, Pede a essa pessoa que encoste a colher na testa (Tony fez a demons- tragio pondo uma colher em sua prépria testa) e Ihe solicita que informe quando a colher comegar a se aquecer. “ Truques dam Ao abaixar a colher de pequena demonstra¢o ~ enquanto todos tém a atencSo voltada para o pobre bobo que segura uma colher na testa, Tony dobra simultaneamente suas duas cotheres no ponto mais estreito. Essa 6a ess ia da arqueacio de colheres. Flas slo vergadas antes que ro da catraca”, Tony mio dircita com o polegar, segurando 0 cabo se erie ail Jo. Os magicos dio a isso 6 nome de dobra a primeira colhes no punho fechado. Ao mesmo tempo, verga a segunda pressionando a erna do pulso direito, uma manobra muito ape na mao direita. E, de qualquer modo, todos estio prestando a testa, Enquanto isso, ‘Tony ta concavidade contra a parte simples ¢ natural. A ideia é dar a impressio de que est juntand as colher atencio ao sujeito que segura uma colh transfere rapidamente a colher jé dobrada da mao esquerda para a di Segura as duas entre o polegar e 0 indicador direitos, de tal modo que as dobras das duas colheres se toquem. A impressio é que ele est segurando duas colheres no vergaclas, cruzadas na parte mais estreita do cabo. jeres e as “deixa murcharem’. E como assem moles € os gargalos dobrassem lentamente, Na verdade, cle deixa as colheres entortadas girarem devagar entre os dedos, para que as dobras fiquem na mesma direcZo a parte cOncava das colheres acabe pendendo. Enquanto as colheres se vergam, Tony urna pausa rapida ¢ recupera a tetceira colher do espectador, usando a mao livre. Redireciona a atengao de todos para as colheres que se dobram, dizendo-se concen trado nelas. Sua mente as esti yergando, Enquanto isso, ele entorta sub de uma forma repticiamente a terveira colher 1a @ perna e a segui que deixa apenas 0 cabo visivel. Quando as duas cotheres que “nu gadas, Tony as devolve ao espectador que 0 auxilia e diz: “Agora, vamos mi’ ficam completamente ver tentar de novo.” Segura a terceira colher com as duas mios, para que © cabo aponte para cima, por tris das maos entrelacadas. Nem a parte mncava da colher nem a dobra de noventa graus agora existente em seu reta, jd que 0 cabo sio visiveis, A plateia presume que a colher ainda est espectador acabou de examiné-la. “Tony comeca ase concentrar na terceira colher e, aos poucos, de forma exerea qualquer pressio perceptivel, 0 cabo da Osea contruidade corti ‘quando o magico as soa de fatovergadas (8 jams as colhores cruradas |. aposar de elas extaram fe Jorge Oero-Millan) colher se verga, até 0 gargalo ficar dobrado na diregio dele em um Angulo de noventa graus. Tony entrega a colher entortada ao espectador, o piiblico aplaude ¢ o niimero acaba, Alguns conceitos psicologicos cruciais nos fazem pensar, de maneita equivocada, que as colheres devem estar retas, quando, na verdade, el { foram entortadas, O primeiro € 0 que os ciemtistas chamam de comple ta ‘amodal —o processo pelo qual um objeto ocluido por um segundo objeto nos inteito, apesar de estar ocluid, magine-se sentado aqui em Phoenix, em uma das nossas aulas de magica com Magic Tony. Voc® esti no Cheuvront, saboreando um prato nna taca de Rioja na mao ¢ contemplando a vastidio do deserto de Sonora entre um truque de queios espanhis manchegos e de queso de Pa com © outro, Vocé nota uma lebre. Bla dé trés saltos e para parcialmente atris de um enorme cacto de quatro braco: ‘0 para fora, apenas com o tras balancando a cauda branca e felpudda, Ser que a lebre ainda tem cabeca? & claro que tem, Como é que seu cérebro Ihe da informacées sobre a forma da parte oculta da lebre atris do cacto? E se nao estivéssemos falando de uma lebre, mas de ws a superficie retangular vazia, projetando-se de um dos lados do cacto? Nesse caso, vocé néo teria como saber por experiencia das lebres, podem ter qualquer tamanho. Agora, porém, imagine que o retangulo se projeta de ambos os laos do cacto, de tal modo que vocé possa ver ‘otamanho da parte o ida, porque os 46 ‘Truques da mente todos os seus quatro cantos, mas o meio continue ocluido. Or: da oclusio da maior parte da superficie, vocé teria uma impres forte do tamanho do objeto ¢ da forma assumida por ele ~ mesmo nfo apesar muito podendo saber, de verdade, 0 que se passa com a parte da superficie que esta atrés do cacto. No caso da lebre, o cérebro jé mapeou um modelo biologico tridimen- sional dela e dé palpites perceptuais sobre a aparéncia que deve tera parte ocluida do animal. [sso € muito titil, sobretudo quando se esti cagando coelhos. No caso do retingulo, o cérebro pode fazer algumas conjecturas perceptuais, mas no outras, dependendo da quantidade de informacoes que tenha, ‘Tony tirou partido do completamento amodal ao prender as duas co- heres vergadas entre o polegar eo indicador. Visto que 0 cabo da colher niimero um estava alinhado com a concavidade da colher niimero dois, ¢ ambas pareceram retas; 0 completamento amodal completou de maneita impropria 0s dois objetos atras dos dedos de Tony. O magico expli- da “boa continuidade’, originalmente cou que esse processo obedece a codificada pelos psicdlogos alemaes da Gestalt na virada do século XX. POR QUE A BOA CONTINUIDADE E GENIAL ‘boa continuidade é 0 processo pelo qual, com base em informagdes dispersas, 0 cerebro faz as coisas paracerem inteiras.O completamento amadal é um exemplo de ‘boa continuidade, mas existem muitos outros. Jé mencionamos o preenchimento de lacunas. 0 mundo 6 grande e complexo demais para que enxerquemas tados os seus detalhes. Quando olhamos para uma praia salpicada de seixos, ou para um tapete persa tecito de modo intricado, nosso cérebro nao visualiza cada seixo nem cada ponto da trama, Nao temos células suficientes na retina para isso. Vemos uma Ppequena parte da preia ou do tapete e completamos oresto. A boa cantinuidade é Parte to integrante de uma mutiplicidade de mecanismos cerebrais que Tony acha ‘que 8550 60 principio mais explorado de toda a prestdigitagéo, Para ver como nosso cérebro ¢inteligente no preenchimento de lacunas, basta exporimentar a técnica do Ganzfeld(termo que significa “campo total” em alemao). O segreda das colheres que entortam Primero, corte uma bola de pingue-pongue a0 meio. Depois, sintonize o radio em ‘um ponto que s6 tena estatica. Deite-se, pranda meia bola sabre cada olho com {ita adesiva e espere. Dentro de alguns minutos voo8 vivenciaré uma enxurrada de senssagSes bizarras. Haveré ursos-polares salttando com elefantes. Terd uma visio de um tio morto ha muito tempo. Ou qualquer autra coisa. Seu eérebro nao sebe lidar com a inexisténcia completa de estimulos sensoriais, por isso inventa sua propria ealidade, O importante aqui é que o cétebra cria constantemente sua prépriarealidade, raceba ou nao estimulos provenientes da realidade por mela dos sentidos. As ma- «quinagées cerebrais de criegéo do mundo continuam funcionando mesma na fate de estimulos sensorias. E por isso que o confinament solitrio é considerado um castigo em nosso sistema prisionl. Talver voe8 pense que esse confinamento seria um: io dos perigos e incémodos da vida em um presiio. Mas ele é praticamente a Pir coisa que se pode fazer com os presiirios, que dessa forma perdem 0 contato ‘om a realidade. Muitos consideram essa pratica uma forma de tortura, e livros inteiros sobre os efeitos psicaldgicas negatives da confinamento sol i foram escrito. Os prisionsias relatam alucinagies e outras formas de reegbes pscbtcas u seja, comegam a acregitar nos inado usando bolas de pinque-pongue e um rio. reproduzdo com permisséo da Globe Newspeper Company, nc com base em uma edigdo de 2010 do jornal Boston Giae © copyright 2010) ” 1” jer ao meio? Voeé ja se perguntou como um magico serra uma m © truque se baseia em duas coisas: uma caixa oca e 0 desejo do eérebro a, voce ve por uma boa continuidade. Quando a mulher se deita na c: a cabeca em uma extremidade e os pés na outra, Seu cérebro the diz. que 1a. Na verdade, ela nfio esti deitada. A caixa ela esta em supinagio e i de tal modo que a cabeca que se projeta em uma ponta e os jem da outra pertencam a duas mulheres diferentes. A construi pés que comumente acentuada por um des da caixa. Com que facilidade vocé é enganado! Alguns mecanismos por tris da boa continuidade comecam a serbem compreendidos. Por exemplo, no aparelho visual, ela depende da orien- tagio e da posigio espacial das linhas para as quais voeé olha. Quando a posi¢o € orientacio relativas de dois ou mais segmentos de linha esto alinhadas, vocé pode discernir um contorno. Quando duas ou mais lic has de orientacao semethante sdo posicionadas em estreita proximidade, com as extremidades alinhadas, vocé talvez note que alguns segmentos isolados ficam n pano de fundo, No entanto, quando a separacao entre os segmentos ou is saliemtes em termos visuais: destacam-se contra 0 as diferencas na orientagao deles sdo grandes demais, a boa continuidade falha e 6 mais di Charles Gilbert ¢ alguns colegas de seu laboratério, na Universidade Rockefeller, descobriram uma base fisiea da boa continuidade no apa- il discernir os segmentos (a figura) do fundo. relho visual. Lembre-se de que os neurdnios do cértex visual primario sintonizamt-se com orientacdes espectficas ~ preferem, digamos, segmen tos de reta horizontais ou verticais. Esses neurdnios especializados sio encontrados em diferentes partes do cértex visual primario, para que o cérebro possa integrar informacSes que vao muito além das fronteiras de 3s com atributos similares so neurdnios isolados, Ocorre que os newrd ligados por fibras horizontais que percorrem longas distancias no eértex visual pr niitio. Os olhos da mente conseguem "ver" a lebre atras do eacto por causa das conexdes de longo alcance entre tipos semelhantes de neurénios no cortex. Os mesmos processos desempenhariam alguma Fangio em outros tipos cognitivos de percepeio visual, que discutiremos com mais detalhes em capitulos posteriores. tado, Quando as colheres si moles, Essa ilusio ocorre porque o aparetho visual tem dois meca smos diferentes para enxcrgar linhas. Para detectar a borda de uma reta, de- pendemos de neurdnios do cértex visual primario, Para localizar as extre tern midades de uma reta, porém, recorremos a tagao de linha stopped) ntonizadas para reagir aos términos de contornos longos. Alguns neurdnios de orientacio e de terminagio de linha reagem como 0 cabo de uma col rentes. O eérebro percebe patticularmente bem a estimulos move sacudida, Mas seus tempos de reacio sao d ntagio das cabo de uma colher, quando ela é sacudida, parece se mexer antes de as nhas mais depressa do que o término delas. Por isso, extremidades se mexerem — 0 que da origem a ilusio de que a colher est se vergando. FIM DO ALERTA DE SPOILER Por mais romantico que seja concluir que o pensamento é capaz de en. tortar colheres ou fazer mesas levitarem, ou que os poderes meditinicos, rea da mente sobre a mat sio fendimenos reais, as consequéncias dessas crencas podem ser dolorosas, ou no minimo cons- trangedoras. Q dle que poderia ser capaz de atravessar barreiras pelo simples esforco men indo Susana tinha cer de oito anos, encasquetou a ideia tal, Os pesados porties de ferro do prédio de seus avés em Santander, na Espanha, pareceram id is para esse expetimento. Quando os adultos se de fininho e desceu correndo os 1 ida do edificio, Estava deci toda a velocidad ¢ de cabeca. Para sua surpresa, o ferro batido nem se deitaram para a sesta clas nies de escada que levavam ae fae correua mexeu, como prova a pequena cicatriz que ela tem até hoje na témpora esquerda. Ela levou mais de uma década para confessar i familia que nio tinha tropecado por acidente nesse d Existe uma profusio de charlat es € trapaceiros tirando vantagem de clientes ingénuos ou desesperados, que acreditam sinceramente em habi- idades meditinicas. Esses clientes sio ine 50 vezes, so convencidos ar jor de varios tipos de interven- em termos a rej tratamentos médicos comprovades, nicas, Quando um vidente, um curandeiro, um médium ou nceitos ou coisa pior: bes medi leis da natureza, ha to parecem desafiar cenvolvida, Nossa tarefa é descobrir como esses truques funcionam. E isso mpre uma & parte do que motiva este livro. 3. O padre que simulou uma cuipula: jlusGes de Optica na arte e na ciéncia Oscientistas da vi ‘enxergamos, pelos pontos de vista psicoligico e biolégico, ¢ nossa. tem uma longa tradigao de estudar artistas phisticos, como pintores ¢ escul de 6ptica ~os pintores o fizeram. As artes plisticas nfo raro precederam os cientistas da io, como € o nosso caso, procuram compreender como tores. Os visio na descoberta de principios fundamentais desta, por meio da aplicacao de téenicas de pesquisa mi Do mesmo modo, os migicos, icas — ainda que, talvez, mais intuitivas, fas mundiais da atenco ¢ da consciéncia, fizeram suas proprias descobertas. Foi isso que ‘nos atraiu para sta ribalta, suas mesas de carteado e suas apresemtacbes de rua, Queremos quie os mégicos nos ajuclem a compreender as Isdes cog al como os artistas nos revelaram descobertas sobre a de optica. E, na verdade, as ilusdes de opti a truques de magica feitos no papel, Neste capitu turné por nossas ilusdes cognitivas favoritas. nitivas, assemelham um pouco faremos uma breve Osarcistas usam ilusdes de optica desde o século XV, quando os pinto- tes renascentistas inventaram técnicas para enganar 0 cérebro, fazendo-o Pensar que uma tela plana era rensional, ou que uma série de pince- natur jorta era uma travessa de frutas apetitosas, Eles descobriram a perspectiva linear—a ideia de que as linhas paralelas podem, usio de profundidade jos rumando para o ser representadas como convergentes para dar € distancia. (Pense mais uma vez em trilhos ferro horizonte) Perceberam que po zendo tons ¢ cores esmaecetem ao se afastarem do campo visual. Us ipular os efeitos atmosféricos, 3 Truques dan Nas prmeras dévadas do s6culo XVI, os pitors holandesescriaram natuezas-mortas em pintures de cavalate com um realism de trampoci(Os atuas do intr de CComelus N. Gysbreths, Réunion des Musées Naionaux/Art Resource, NY) a linha do horizomte ou do olhar como ponto de referéncia para julgar 0 tamanho e a distancia dos objetos em relagdo ao observador, Empregaram osombreamento, a oclusdo ¢ 0s pontos de fuuga para tornar seus quadros hiper-realistas. Trompe resceu na Holanda do século XVIL. As pi é um termo francés que significa da molduras As vezes o trompe l'oeil é usado em larga escala para sugerir partes inteiras de construcdes que, na verdade, nao existem. Orazio Grassi, 0 ‘A “copula” da igre de Santo Indio parece real, vista por este anguio, Fico) arquiteto da igreja de Santo Inacio, em Roma, tinha planejado construir ‘uma cipula, mas morreu antes de terminara igreja, ¢ 0 dinheiro destinado a0 domo foi usaco em outra coisa. Trinta anos depois, em 1685, pediram a0 pintor je Andrea Pozzo gue pintasse uma cipula falsa no teto, acima do altar. Pozzo ja era considerado um mestre na arte da perspectiva, mas fic acreditar no que conseguiu fazer. Até hoje, muitos visitantes da igreja de Santo Indcio ficam admirados ao descobrir que a cdpula espeta cular nao é real, ¢ sim uma ilusio. Os arquitetos logo perceberam que também poderiam manipular a realidade, distorcendo as indicacbes de perspectiva ¢ profundidade Para criar estruturas ilusérias que desafiassem a percepeao. Alguém Precisava de um cémodo grande, porém dispondo apenas de um quarto do espago? Nao havia problema algum. Foi exatamente 0 que fez Fran- cesco Borromini no Palazzo Spada, que visitamos ha alguns anos em Roma. Borromini criou a ilusdo de uma galeria de patio de 37 metros de comprimento em um espaco de oito metros. Ha até uma escultura em tamanho natural no fim da arcada, Bem, nao exatamente. A escultura 3 Truques da mente parece ser do tamanho de uma pessoa, mas, na realidade, tem apenas sessenta centimetros de altura Mais perto de nds e do ilusionismo, temos 0 saguiio do Grande Canal no Venetian Hotel and Casino, em Las Vegas. Na primeira vez que se ppisa no saguio, tem-se a sensacio de um sibito inicio de creptisculo. Foi exatamente o que sentitia mae da Susana, Laura, quando a levamos a Las Vegas pela primeira vez, enquanto planejvamos nossa conferéncia, Des- cemos de nossa suite depois do almoco fornecido pelo servico de quarto. Ao sairmos dos elevadores e entrarmos no sagudo, Laura disse: ~ Ab, escureceu tanto aqui fora! Susana perguntou o que ela queria dizer, — 0 céu — respondew Laura. ~ Pscureceu muito cedo. = Mas, mame - explicon Susana ~, ainda estamos do lado de dentro. Esti vendo aqueles pontos pretos no céu? Sao as pontas dos sprinklers. rio, com seus Boquiaberta, Laura examinou o incri cinco matizes de azul do rococé — azul-pavio, azul-claro, azul-celeste, turquesa e gua-marinha ~ ¢ os filamentos de cirros, cirros-estratos € 55 cirros-ctimulos. Laura pensou no assunto por um minuto, virou-se para Susana e disse: ~ Bem, por que vocé me contou tdo depressa? Eu gostaria de té-lo apreciado um pouco mais. Outro grande ilusionista foi o litégrafo e xilogravurista holandés Mau rits Cornelis (mais conhecico como M,C.) Escher, No inicio da carreira, Es- cher entalhou cenas realistas, baseadas em suas observagdes e suas viagens. Mais tarde, voltou-se para sua imaginacao e produziu algumas das mais, brilhantes ilusdes de Optica da historia da arte. Quando Steve frequen- tava © curso médio, um de seus cartazes favoritos era uma reprodugio da escada interminavel de Escher (Subindo e descendo, 1960), na qual um ‘grupo de monges trajando habitos subia ou descia perpetuamente uma escadaria impossivel, situada no alto de um templo. Ela era impossivel -ulo em torne de si mesma ¢ nfo acabava nunca. porque descrevia um Ora, como podia ter sido desenhada se era isicamente impossivel? Escher devia ter trapaceado em algum ponto da gravura e deixado de retratar a estrutura adequada de uma escada de verdade. Mas Steve nao conseguiu descobrir onde, por mais que olhasse com atencao. Percebeu que deveria examinar a estrutura como um todo para ver se havia alguma pequena distoredo sistematica em toda ela que per E foi entio que constatou que nao podia olhar de maneira global para a estrutura, S6 conseguia realmente ver uma area da escada de cada vez. Sua visio conseguia processar os detalhes da escada quando ele centrava © olhar em uma parte especifica. No entanto, no momento em que o fa- 71a, todas as outras areas da escada, em sua periferia visual, viravam um borrao, Ble se dew conta, entdo, de que foi assim que Escher deve té-la desenhaclo: como s6 se pode ver uma fea local de eada vez, os pequenos erros graduais da estrutura inteira nao podem ser vistos a olho nu Esse efeito desafia nossa percepeao, conquistada com dificuldade, de que 0 mundo nossa volta segue certas normas invioliveis, Revela tam- a sensacao de percepcao global costurando -multiplos perceptos locas, Desde que a relacio local entre as superticies € os objetos siga as regras da natureza, nosso cérebro nao parece se importar como fato de a percepeao global ser impossivel bem que nosso cérebro cons 56 Truques da mente A apresentacio formal de Susana a ‘quando cla chegou a Universidade Harvard para estudar com David Hu bel e Margaret Livingstone. Na época, Harvard era a meca do estudo das yestone lideravam, 1sdes de Gptica veio em 1997, \sbes, ¢ foi la que ela conheceu Steve, Hubel ¢ Lit ‘o campo de estudos das ilusdes cerebrais, mas varios psicélogos de Har indo um leque de fendmenos completa: vard também vinham descol mente novos. ‘Como parte de sua formacao no pés-doutorado, Susana resol Iher uma ilusio de Optica e investigar seus efeitos. Folheando ur arte, descobriu o patio de recreacio perfeito para sua curiosidade: a arte

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