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Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software Company, 2003 - 2009 For Evaluation Only. 1. 2. Sumario Sincronia e diacronia = O problema da palavra_ tt ialavra.e unidade accntual sees e 19) Palavra e homonimia u Palavra ¢ lexia__ 1 A segmentagao morfematica __13 As unidades minimas significativas____—— 13, A dupla articulacao da linguagem dS A importancia do sentido 16 Alomorfes e morfema zero ___ 18 Alofones ¢ alomorfes 18 A forma bésica Alomorfe ou morfema Morfema zero (9) e alomorfe zero (a) — 23 Classificagéo dos morfemas (1) __ 26 Radical Afixos: prefixos e sufixos Desinéncias —___ 8 Desinéncias de género as 25 Desinéncias de mimero —____________31 Desinéncias verbais —___________32 34 Vogais tematicas a Vogais teméticas nominais _____34 Vogais tematicas verbais — - 36 Vogais e consoantes de ligaséo 37 6. Classificagéo dos morfemas (2) _____ 40 Morfemas aditivos —_________— 40 Morfemas subtrativos —______42 Morfemas alternativos —___-___ 43 Morfemas reduplicat ee) Morfema de posigao —______ 46 Morfema zero (@) ————_______—_— 47 7. Conclusao _ —_— 48 8. Exercicios de aplicagao ________51 9. Vocabulario critico — 65 10. Bibliografia comentada ________69 1 Sincronia e diacronia Considerando-se que uma lingua é 0 resultado de evo- lugdes ocorridas ao longo dos séculos, podemos enfocé-la de dois pontos de vista diferentes: ou fixamo-nos no estado atual, com preocupagdes marcadamente descritivas (enfo- que sincr6nico), ou procuramos compreender-lhe 0 processo evolutivo, acompanhando-a desde as mais antigas fases até hoje, o que se torna tanto mais realizével quanto mais dis- pusermos de documentos escritos da lingua em questao (en- foque diacrénico). Nao julguemos, todavia, que a utilizacao de uma ou de outra postura seja uma mera questéo de escolha; sincronia diacronia podem contrapor-se quanto a métodos e resultados. Tomemos, a titulo de ilustragdo, verbo pdr. Nossas gramaticas consideram-no como uma anomalia da segunda conjugacdo. Realmente, a evoluedo histérica da lingua por- tuguesa confirma essa observacio. © verbo pontre, em latim, evolui normalmente para ‘por, em portugués, conforme se pode observar na cadeia evolutiva: pontre > ponére > poner > poder > poer > por Essas diferentes formas sdo decorrentes de transformagoes fonéticas bem caracterizadas através dos séculos e suficien- 8 temente explicitadas em nossas gramiiticas histéricas. Nao € nosso objetivo, aqui, especificar os detalhes esclarecedo- res das etapas apontadas; interessa-nos, sim, mostrar que poer, da segunda conjugacao, evolui para pdr, € que vesti- gios da antiga forma poer encontramos em adjetivos como poente e poedeira. Podemos, entretanto, chegar & mesma conclusio se dispensarmos a explicagao histérica ¢ fixarmo-nos no fun- cionamento do portugués atual, Observemos, p.ex., que algumas das formas conjuga- das do verbo pdr apresentam a vogal temética -e-, da segunda conjugagao: pusEmos, pusEra, pusEsse. ‘Acrescente-se, também, que as trés conjugagdes do portugués constituem paradigmas caracterizados pelo fato de serem representados por varios verbos: pertencem a pri- meita conjugagéo verbos como amar, cantar, falar etc.; beber, comer, correr etc. ilustram a segunda conjugagéo; fa terceira conjugaco é representada por verbos como exis- tir, partir, sumir etc Ora, verbo em -or s6 temos um: pér, que dé origem a derivados como contrapor, decompor, repor etc. Portanto, 0 verbo pdr nao constitui paradigma como os demais ver- bos dcima mencionados. Essas observagdes podem levar-nos a crer que, afinal, a escolha de uma posig¢ao sincrénica ou diacrOnica ¢ indife- rente, visto que ambas conduzem ao mesmo resultado. Notemos, contudo, que nem sempre o resultado é 0 mesmo. Sirva-nos de exemplo 0 verbo comer. Em latim, 0 verbo correspondente a comer & edBre, com radical ed-. No presente do indicativo, algumas for- mas desse verbo se confundiam com o verbo esse: ao lado de edo, edis, edit, havia as variantes edo, es, est. Com 0 objetivo de diferengar mais esses dois verbos, 6 latim vulgar da peninsula Ibérica antecedera o primeiro de um prefixo, cum- (que exprime companhia), e o resul tado, cum ed&re / cumedere, em virtude de uma série de transformacées fonéticas, produziré a forma comer, O cotejo de comer com comida, comilanea, comilao conduz- nos & conclusdo de que o radical comum a essa série ¢ com- (diferentemente do radical latino ed-).. Esse exemplo permite-nos constatar que nem sempre 9s enfoques sincrénico e diacrénico levam as mesmas con- clusées. De um ponto de vista metodolégico, ¢ aconselhavel, portanto, que se separem as duas posigGes. Adotaremos, ao longo de nossa exposi¢ao, uma postura sinerdnica com relagdo a alguns aspectos da morfologia portuguesa, por- que acreditamos que 0 conhecimento dos mecanismos de funcionamento de um idioma no seu “aqui € agora’” deve anteceder as explicagdes de cardter histérico, indiscutivel- mente necessirias e esclarecedoras, mas que devem ser invo: cadas num segundo momento. 2 O problema da palavra De acordo com a Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB), a morfologia deve ocupar-se das palavras quanto & sua estrutura e formagdo, bem como quanto as suas fle- xOes € classificacio Concentrando-se a morfologia na palavra, & neces rio, inicialmente, que levantemos ¢ discutamos algumas propostas de caracterizagao desse elemento. ‘Ainda segundo a NGB, a palavra, considerada, do ponto de vista fonético, como constituida de fonemas ¢ silabas e pro- vida ou ndo de tonicidade, recebe a designacdo de voedbulo; palavra & a denominagao mais adequada se enfocarmos 0 ponto de vista semantico. Nao levaremos em conta, aqui, essa ingdo, e os dois termos serao utilizados como sindnimos. ‘Apresentamos, em seguida, alguns critérios com vistas Accaracterizagao da palavra, assinalando as dificuldades cor- respondentes. Palavra e unidade acentual Tomemos, por exemplo, um critério fonético: a pala- vyra seria uma unidade acentual, um conjunto mareado por um s6 acento ténico. u Nao ha diivida de que mdrmore, xicara, café corres- pondem ao critério proposto; contudo, uma expresso como com o chinelo também satisfaz exigéncia acima — a preposicao com e 0 artigo definido 0 séo dtonos ¢ 0 substantivo chinelo € paroxitono; 0 grupo apresenta um 86 acento t6nico, mas nao constitui uma palavra do ponto de vista grafico. Em resumo, existem unidades acentuais que nao sfo palavras; esse critério fonético revela-se par- cial e, portanto, insu Palavra e homonimia Se procurarmos caracterizar a palavra sob 0 aspecto semAntico, os casos de homonsmia revelar-se-do problemati- cos. Consideram-se homénimas as formas lingiiisticas de mesma estrutura fonolégica, porém inteiramente distintas quanto ao ponto de vista significativo. Poderiamos afirmar que manga, nos seus diferentes sig- nificados, é uma sé palavra; ou haveria tantas palavras manga quanto os diversos significados correspondentes? A resposta, é menos simples do que parece; basta levar em conta as diver- géncias dos dicionérios, relativamente a solugdo do problema. Acrescente-se, ainda, que o fato de a palavra ter um sentido atualizado dentro de um contexto especifico (frasal/ textual), 0 que gera o fendmeno da polissemia (possibili- dade de variagdes de sentido em funcdo dos diferentes con- textos), impede o estabelecimento de limites claros entre esta tiltima e a homonimia. Palavra e lexia Vejamos se 0 conceito de lexia, proposto por Bernard Pottier, pode ser-nos de alguma utilidade para a caracteriza- ¢80 do voedbulo: 2 Segundo o autor, entende-se por lexia a unidade lexi cal memorizada. Dentre os diferentes tipos de lexia, desta- quemos, aqui, as lexias simples e as compostas B. Pottier propde alguns testes formais para a determi- nagdo das lexias, dos quais um dos mais operatérios é 0 da ndo-separabilidade dos elementos componentes. Apli- cando-o ao substantivo composto guarda-chuva, p.ex., notemos que qualquer modificador acrescentado a esse substantivo no pode romper o grupo em questao: guarda-chuva novo / novo euarda-chuva * guarda-novo-chuva (construgao inaceitavel) Nao é 0 que se observa com um vocabulo como obede- cerei. O acréscimo de um pronome pessoal obliquo a essa forma verbal acarreta a separacdo de seus elementos const tutivos: obedecer-te-ei. Assim sendo, obedecerei nao set uma lexia, embora possa ser reconhecido como uma palavra. Assinalemos, contudo, que, se nao podemos estabele- cer correspondéncia automatica entre palavra e lexia sim- ples (como o ilustrou o exemplo acima), 0 teste da ndo-sepa- rabilidade permite-nos levantar um grande ntimero de com- postos nao-dicionarizados. Sirva-nos de exemplo a expres- sao casa de detencdo. Qualquer adjetivo a ela acrescentado nao pode ocupar posicao interna relativamente ao grupo: casa dé detengtio abandonada “casa abandonada de detengao (construsao inaceitével) Ora, 0 comportamento de casa de detencéo é 0 mesmo do grupo guarda-chuva, acima apontado. Sao, portanto, dois exemplos de substantivos compostos Os critérios apresentados neste capitulo nao so os inicos possiveis, Revelam, todavia, a complexidade que caracteriza a palavra e, por conseguinte, as dificuldades da elaboragdo de uma morfologia baseada nesse elemento 3 A segmentacao morfematica As unidades minimas significativas Expusemos, no capitulo anterior, algumas dificuldades associadas & caracterizagdo do vociibulo. Partiremos, aqui, da hipétese de que a palavra é um elemento de constituicao complexa, cuja andlise poderé conduzir a uma base mais rigorosa para os estudos morfolégicos. Tomemos, a titulo de ilustrago, a forma verbal faldva- ‘mos. Como a conjugacao verbal portuguesa & caracterizada por uma riqueza de flexes, é possivel comparar a forma pro- posta com as demais que a ela se associam. Estabeleceremos, como principio, que as comparagdes devem ser feitas por pares; cada par deve apresentar uma s6 relagao de semelhanga € uma s6 relacdo de diferenca. Comparemos, inicialmente, fakivams falava O elemento comum (relagao de semelhanga) é falava; o ele- mento diferencial é -mos, que s6 ocorre na primeira forma. Consideraremos, também, que os elementos destaca dos devem ter um valor significative. No par acima, -mos indica que a aco expressa no passado € realizada por um grupo de pessoas, entre as quats se inclui o falante. oe ‘A forma comim — falava — é igualmente decomponi- yel, como 0 mostra a comparacdo seguinte: falava fala O segmento destacado — -va — indica que a aco expressa pelo verbo se desenrola num passado que se prolonga (pre- térito imperfeito do indicativo). Convém assinalar que nem sempre um tnico par nos permite depreender 0 segmento correto. Outros pares devem set estabelecidos para confirmar ou infirmar certos resulta~ dos. Se tivéssemos comparado falava com falara, teriamos isolado 0 -v-. O recurso a outras comparagdes — falava / fala; fatava / falasse — permite-nos corrigir esse resultado para -va. Podemos ainda prosseguit com um novo par, fala lo que nos fornece os segmentos -a e -0, Como a forma proposta é faldvamos, interessa-nos o -a. Baseados exclusivamente nesse par, deveriamos interpretar -a como indice de terceira pessoa do singular do presente do indicativo (em oposigiio ao -0, ‘mare de primeira pessoa do singular do mesmo tempo). Mais uma vez, a comparagdo com as outras formas do mesmo verbo vai conduzir-nos a interpretagdo correta; falAva, falAremos, falAriam, embora correspondam a ‘tempos ¢ pessoas diferentes, apresentam a mesma vogal -<- que é, na verdade, marca da primeira conjugacao. Finalmente, comparando fala chora destacamos os elementos fal- e chor-, que indicam agées iferentes. Portanto, a forma verbal apresentada ¢ constituida de quatro elementos: fal + d + va + mos. 18 Com relagéo a esses segmentos, convém ressaltar os seguintes aspectos: 1) so unidades portadoras de sentido; 2) sdo elementos recorrentes, de grande produtividade na lingua; fal- figura em toda a conjugacdo do verbo falar, bem como em derivados, como falador; -a- & marca de todos os verbos da primeira conjugacao (falar, cantar, cho- rary; -va- caracteriza o pretérito imperfeito do indicativo de qualquer verbo da mesma conjugacio (falava, cantava, chorava); -mos é indice de primeira pessoa do plural, inde- pendentemente de tempo, modo € conjugacdo (falamos, faldssemos, temtamos); 3) a ordem desses segmentos é rigida; qualquer alteraco resulta em formas inaceitaveis na lingua (p.ex.: * faldmosva). Como so elementos contiguos, podem ocorrer altera- ges fonoldgicas em alguns deles. Em portugués, sdo freqiten- tes os casos de crase e de elistio. Se compararmos gosto com gostoso, destacamos apenas -so, como elemento diferencial; contudo, os pares creme / cremoso, sabor / saboroso perm tem-nos depreender -oso. Trata-se do mesmo segmento, visto que 0 segundo membro de cada par apresenta um traco sig- nificativo comum. A vogal final de gosto ¢ a inicial de -oso, por serem idénticas, fundiram-se, de acordo com a regra fonoldgica da crase. Com relagdo ao par creme / cremoso, notamos que 0 -¢, dtono, de creme se elide diante do o- de -080; trata-se, agora, de um caso de elisdo. Essas unidades minimas significativas recebem 0 nome especifico de morfemas. A dupla articulagiio da linguagem Baseando-nos, agora, no par 16 destacamos f- e m=, que ja no sao elementos providos de sentido. A substituicao de f= por m- contribu, entretanto, para distinguir os vocabulos fala ¢ mala. Essas unidades distintivas, desprovidas de sentido, recebem a designagio de fonemas. Convenciona-se represen- tar os fonemas entre barras obliquas: /f/ ¢ /m/ Os pares caracterizados por apresentarem formas que se distinguem por um s6 trago diferencial sfio designados como pares minimos. Quando, na comparacio das formas, a substituigdo de um traco por outro acarreta uma mudanca de sentido, realizamos 0 que se denomina uma comutagao. Entre os morfemas ¢ os fonemas, hd uma diferenca qualitativa: enquanto aqueles so significativos, estes sio distintivos. Com base nessa oposi¢ao, André Martinet esta- belece a teoria da dupla articulagao da linguagem: a uma primeira articulac&o, representada por unidades significati- vas (que A. Martinet designa como monemas), acrescenta- se uma segunda articulacdo, de unidades distintivas (os fonemas). Convém esclarecer que, a0 contrério do que nossa exposi¢ao poderia levar a crer, as téenicas de analise fonolé- gica se desenvolveram primeiro; posteriormente, foram transpostas para o terreno da morfologia. Embora 0 termo monema, segundo A. Martinet, nao seja exatamente sindnimo de morfema, € esta tiltima desig- nacdo que se Vem generalizando cada vez mais e que mante- remos ao longo deste trabalho. ! A importancia do sentido valor significative dos morfemas tem algumas impli- cagdes, que passamos a expor a seguir. ' Remetemos o leitor interessado 20 vocabulirio ertico, para os devidos cselarecimentos de detalhes terminolégicos. ” Os pares canta / cantas ¢ mesa / mesas permitem-nos depreender -s. Ocorre que, no primeiro, 0 elemento desta- cado indica segunda pessoa do singular, ao passo que, no segundo, € marca de niimero plural. Como os valores signi- ficativos sao diferentes, devemos reconhecer, ai, dois mor- femas hom6nimos. ‘Além da diferenga de significado entre os dois, ha tam- bem diferencas de caréter formal. O -s de cantas opde-se as terminagdes de outras formas (canta, cartamos, cantais, cantam); com relagao a mesas, a ‘inica oposigo que pode- mos estabelecer é entre mesa © mesas. ‘Ao operarmos com determinados pares, devemos evi- tar as falsas comutacdes, que podem levar-nos a destacar elementos desprovidos de sentido. Assim, a comparacéo entre os membros do par lei / legal pode sugerit-nos que ie -gal sio morfemas, 0 que é falso, visto que n&o sao, em portugues, segmentos portadores de significado. Temos, aqui, um elemento indecomponivel — /ei — ¢ uma forma variante leg-. Cumpre, ainda, esclarecer que 0s segmentos comuns a0 par devem ter 0 mesmo valor seméntico. Para determi- nar os morfemas de capacidade, nao poderiamos compari- lo com capa ou com cidade, que, embora existentes em por- tugués, no tém nenhuma relagdo significativa com o voci- bulo proposto. A iinica comparagdo possivel, no caso, & com capaz; como resultado, obtemos a forma capac-, variante. 4 Alomorfes e morfema zero Jé assinalamos que as téenicas da anélise fonoldgica foram transpostas para a andlise morfolégica. Aqui, ressal- taremos alguns paralelismos resultantes dessa transposicéo. Alofones e alomorfes Alguns fonemas podem realizar-se através de variantes Assim, 0 fonema /1/ (depreendido de um par como fia / ria) apresenta, em portugués, as realizacSes [1] (J alveolar) ', quando antecede uma vogal: Jama; ¢ [w] (w semivocalico, como em mau), quando se pospde a uma vogal: alma [aw- ma], no portugués do Brasil. (Em Portugal, 0 / pés-voedllico realiza-se como um ff] (/-velar). Para a exposiedo que se segue, escolhemos a variante brasileira.) Essas variantes recebem a designacdo de alofones e, com freqiiéncia, encontram-se em contextos exclusivos, como 0 ilustra o quadro seguinte: 19 prévocalica revet | wl = + Fazendo a leitura do quadro com base nas colunas verticais, temos que [I] s6 aparece em posigao pré-vocdlica, diferente- mente de [vi], que s6 ocorre em posigéio pés-vocillica; onde utilizamos uma variante, néo podemos utilizar a outra, Neste caso, dizemos que as variantes séo combinatérias e esto em distribuigdo complementar, Existem alofones que nao ocorrem em distribuicdo com- plementar. Por exemplo, o fonema /7/, em posicdo inicial, pode realizar-se, em nossa lingua, como [F] (alveolar) ou como [¥] (velar), indiferentemente: rua [Fua / Kua]. Aq dizemos que as variantes sao livres. O mesmo pode observar-se com relacfio aos morfemas, que nem sempre séo caracterizados por uma tnica forma, como a maioria dos exemplos apresentados no capitulo ante- rior poderia levar a crer, No adjetivo infeliz, a comparagéo com feliz permite- nos depreender o morfema in-. Esse mesmo morfema realiza- se como #- antes de radicais iniciados por /-, m- € r-: ilegal, imoral, irreal. Essas diferentes realizagdes sio designadas como alomorfes, em paralelismo com alofones. De modo geral, os alomorfes apresentam-se em dist buicdo complementar, a exemplo do que ocorre com os alo- fones. Em portugués, 0 pronome pessoal obliquo mim rea- liza-se como /mim/ apés qualquer preposicio diferente de com (de mim, em mim, sem mim); seguindo-se & preposi¢aio com, temos a variante /migo/ (comigo), conforme o ilustra o quadro aba mim | 2P65 prep. | apés prep. # com com | | Tren + [| imigol [+ As colunas verticais do quadro mostram que /mim/ s6 cocorre em seguida as preposiedes diferentes de com, a0 passo que /migo/ s6 figura apés a preposi¢ao com. Dizemos, aqui também, que os alomorfes esto em distribuigao complemen- tar, visto que ocorrem em contextos exclusivos 7. E importante notar que nem sempre os alomorfes resul- tam de um contexto fonolégico, como pode sugerit 0 exem- plo do morfema in-, acima: a variante i- 6 € encontrada antes de determinadas consoantes. Com relacéo ao segundo exemplo, poderiamos pensar que a variante /migo/ ocorre apés nasal; as seqiiéncias em mim, sem mim, em que as preposigdes também terminam por nasal, negam a validade dessa afirmagio. O condiciona- mento, aqui, é, portanto, morfolégico, ¢ nao fonoldgico. Mesmo no exemplo anterior, 0 condicionamento fonolé- gico ndo representa uma restri¢ao absoluta na lingua. Obser- vemos que, se uma forma como irreal poderia induzit-nos a crer que a nasal no ocorre antes de /i/ (dada a inexisténcia de inreal na lingua culta), 0 verbo enrolar mostra que, em portugués, 0 fonema /F/ pode figurar apés -n-. Embora mais raros, também se encontram em portu- gués exemplos de variantes alomérficas livres: ao lado de ouco; temos a variante oico, € 0 falante € livre na escolha de uma ou de outra forma, diferentemente do que se obser- ‘you com relagdo as variantes /mim/ e /migo/, dependentes do contexto, A forma basica ‘A existéncia de diferentes alomorfes para um mesmo morfema remete-nos ao problema da escolha de um deles 2 Nao devemos falar em variante nos easos de erase ¢ elisd0. Por exemplo, fem gosioso houve crase de -o de gosto com o- de -080, mas o morfema é. indiscutivelmente, -os0 (cf., aqui, p. 18) a para representar 0 conjunto, © alomorfe selecionado recebe a designacdo de forma basica; nem sempre é facil estabele- cer essa forma, mas alguns critérios podem ser apontados. O primeiro deles, 0 critério estatistico, ¢ que especi- fica que, dentre as variantes existentes, é escolhida como forma basica a mais freqiiente. Com relacao ao exemplo acima, mim / migo, vimos que mim figura ap6s todas as preposigdes, com excecao da preposicdo com; por ser esta- tisticamente mais freqiiente, é selecionada como a forma bdsica. Convenciona-se representar a forma basica entre chave fonkC ‘A indicagdo acima deve ser lida da seguinte forma: 0 mor- fema {mim) realiza-se fonologicamente como /mim/ ¢ /mi- g0/, em contextos serem especificados. Quando os alomorfes apresentam a mesma freqiiéncia, escolhe-se a forma basica em funcao do critério da regulari- dade de formacao. Explicitemos, através de um exemplo, 0 que se deve entender pelo critério acima. O futuro do presente do indi- cativo, em portugues, € expresso pelos morfemas -rd- ¢ -re-, que ocorrem trés vezes cada um: -rd-, na segunda e terceira pessoas do singular e na terceira pessoa do plural (amards, amard, amaréo); -re-, na ptimeita pessoa do singular ¢ na primeira e segunda pessoas do plural (amarei, amaremos, amareis). Considerando que os morfemas indicativos de tempo e modo, em nossa lingua, apresentam todos formas basicas em -a e variantes em -e (de acordo com o critério estatistico), selecionamos, por paralelismo, -rd- como forma basica e -re- como variante (cf. quadro desses morfemas, as p. 32 € 33). ‘migo/ Nos casos em quie uma das variantes ocorre isolada- mente, enquanto a outra sé aparece atrelada a um novo morfema, ¢ a primeira que deve ser tomada como forma bésica. Em portugu@s, 0 substantive chapéu possui a variante chapel-, s6 utilizada quando seguida de um morfema ini- ciado por vogal: chapelaria, chapeleiro. Como sé a forma chapéu pode ser empregada isoladamente (Vi um homem de chapéu ), € ela a forma basica. Observemos, ainda, que & mais econémico partir de chapéw para prever chapel- basta estabelecer a regra segundo a qual o -w passa a -/- diante de morfema iniciado por vogal. Se partissemos de chapel-, como forma bsica, precisarfamos de duas regras para chegar outra variante: 0 -/ passa a -u: 1) diante de pausa; 2) antes de morfema iniciado por consoante (p.ex., chapeuzinho). Para certos morfemas, & conveniente postular uma forma basica teérica, ndo-documentada em sincronia. Em portugués, para explicarmos 0 plural do substantivo mar, poderfamos partir de uma forma teérica "mare (sineronica- mente, inexistente); 0 -e é eliminado no singular ¢ mantido no plural (mares). As-vantagens dessa descrig&io so especi- ficadas no capitulo 5 (cf. p. 31-2). Alomorfe ou morfema Nos exemplos acima apontados, encontramos alomor- fes que se assemelham do ponto de vista fonoldgico: in- / chapéu / chapel-. Observemos, contudo, que esse trago néo ¢ condi¢ao para postularmos a existéncia de variantes. No adjetivo amdyel, depreendemos 0 morfema -vel, que se realiza como -bil- quando antecede morfemas iniciados por vogal: ama- bil-idade, ama-bil-issimo. Os alomorfes -vel e -bil- esto fonologicamente muito mais distanciados do que as varian- tes dos outros exemplos apresentados 23 Essas consideragdes remetem-nos a um novo problema: diante de formas semanticamiente aparentadas, & preciso espe- cificar os critérios que nos permitam estabelecer se se trata de morfemas diferentes ou de variantes de um mesmo morfema. Para elucidar a questao, devemos basear-nos no aspecto semantico. Em amdvel / amabilidade, -vel e -bil- apresen- tam o mesmo sentido, 0 que nos leva a concluir que sio alomorfes. Comparando, agora, os membros do par: altura / alti- tude, depreendemos os segmentos -ura e -itude, ambos for- madores de substantivos abstratos a partir de radicais adje- tivos. Em altitude, ha alusio a elevagéo acima do nivel do mar, 0 que nao se verifica em altura; acrescentemos, ainda, que sé podemos falar na altura de um individuo, e nao em sua altitude, Por conseguinte, -ura € -itude so morfe- mas distintos, e ndo alomorfes. As observagdes aqui apresentadas confirmam um aspecto que ressaltamos no capitulo anterior: a depreensao dos morfemas no se reduz. a um mero exercicio formal; é fundamental que se leve em conta o elemento seméntico. Morfema zero (a) e alomorfe zero (0) ‘Ao tratarmos das técnicas de segmentagdo morfema- tica, utilizamos um par que retomaremos aqui: falivamos falava Comparando as duas formas, destacamos 0 morfema -mos, indicativo de primeira pessoa do plural Relativamente a falava, sabemos que representa a pri- meira ou a terceira pessoa do singular; no entanto, ndo se destacou nenhum segmento que exprima esas nog6es. E a auséneia de marca que, aqui, indica a pessoa e 0 mimero. Nesse caso, falamos em morfema zero (representado por 9). Pa S6 podemos postular um morfema @ se trés condigdes forem satisfeita: 1) € preciso que 0 morfema o corresponda a um espago vazio; 2) esse espago vazio deve opor-se a um ou mais seg- mentos (no par utilizado, 0 @ de falava contrapée-se 20 -mos de faldvamos); 3) a nogdo expressa pelo morfema o deve ser inerente classe gramatical do vocdbulo examinado. Em nosso exemplo, as nogdes de niimero e pessoa existem obrigato- riamente em qualquer forma verbal portuguesa No par: fiel fielmente que nos conduz a depreensao de -mente, nao é possivel pos- tular um morfema o para fiel, porque, em portugués, mor- femas como -mente (formador de advérbios de modo) nao so extensivos a todos os adjetivos; nao temos formas como triangularmente, vermelhamente etc. Assinalemos, também, que, mesmo em fielmente, 0 uso do segmento final sfa0 é obrigatério e automético para exprimir a idéia de modo; nada nos impediria de substitui-lo pela expressao de modo fiel. Nao é 0 que se observa no par casa em que destacamos -s, indicativo de nimero plural; 0 que nos permite afirmar que casa é singular é a auséncia de seg- mento destacavel. Temos, aqui, um exemplo de morfema © (de singular), porque a nogao de numero é inerente a qualquer substantivo de nossa lingua. Quando, numa série de alomorfes, houver a auséncia de um traco formal significativo num determinado ponto | | | 25 da série, podemos designar como alomorfe @ essa auséncia. E o que se pode verificar no substantivo pires, que apre- senta a mesma forma para o singular e para o plural; & impossivel depreender, neste caso, qualquer segmento indi- cativo dessas nogdes. A idéia de mimero aflora do contexto: © pires novo (sing.) 08 pies novos (pl.) > Como, em portugués, os alomorfes de plural sio -s, -es, -is, podemos dizer que pires é constituido do radical pires mais 0 alomorfe o de ntimero (singular/plural). Em resumo, 0 morfema @ ocorre numa série de mor- femas, ao passo que 0 alomorfe @ ocorre numa série de alomorfes. 3 0 que se da, também, com os demais substantivos; comparem-se: o livro novo (sing.) 95 livros novas (pl.) 5 Classificacéo dos morfemas (1) Apresentaremos, aqui, a classificagdo dos morfemas, de cuja depreensdo ja se tratou nos capitulos anteriores. De acordo com a doutrina de L. Bloomfield, as for- mas sio classificadas em livres (conforme possam funcio- nar como enunciagdes isoladas; p.ex.: mar, sol) e presas (quando sé aparecem atreladas, como o -s do plural em ‘mesas) A fim de evitar a estreiteza de um critério meramente formal, levaremos também em conta a funcdo dos elemen- tos apresentados, isto é, 0 papel que representam dentro do vocdbulo em que figuram. Feitos esses esclarecimentos, arrolamos, abaixo, os iferentes tipos de morfemas do portugués, também comuns Radical O radical corresponde ao elemento irredutivel e comum as palavras de uma mesma familia. Considerando-se a série: ferro / ferreiro / ferradura / ferramenta, é 0 segmento for 27 que, por satisfazer as exigéncias especificadas, representa 0 radical. Devemos evitar a designagao de raiz, vinculada a pers- pectiva diacrdnica. Como assinalamos no primeiro capitulo, nem sempre ha coincidéncia entre os enfoques sinerénico e diacrénico: em comer, o radical é com- (ep. comida, comi- Io), a0 passo que a raiz é ed-. Afixos: prefixos e sufixos Designam-se afixos os morfemas que se anexam ao radical para mudar-Ihe o sentido (p.ex.: fazer / des-fazer) ‘ow acrescentar-Ihe uma idéia secundaria (livro / livr-eco). Podem contribuir, ainda, para a mudanga da classe do vocébulo: leal, adjetivo, com o acréscimo do afixo -dade, passa a substantivo: lealdade. Os afixos antepostos ao radical denominam-se prefi- xos (des-leal, in-feliz, re-por); quando pospostos, recebem a designagao de sufixos (cruel-dade, firme-mente). Assinale-se, contudo, que a diferenca entre prefixos ¢ sufixos nao é meramente distribucional. O acréscimo de um prefixo no contribui para a mudanga de classe do radi- cal a que se atrela, diferentemente do que ocorre com os sufixos, conforme se pode observar nos exemplos acima apontados | Os prefixos agregam-se normalmente a verbos (re-fazer) a adjetivos (in-quieto). Lembremos alguns tragos de corres- pondéncia entre verbos ¢ adjetivos: 0 participio pasado fle- jona-se em género ¢ mimero (comprado(s), comprada(s)), A semelhanca dos adjetivos; certos verbos sao substituiveis or expresses constituidas de verbo de ligacdo seguido de um adjetivo (envelhecer / ficar velho; hesitar / estar hesitante). 0 sufixo pode, também, no alterar a classe gramatical do radical a que se junta; observe-se o exemplo ferreiro (subst.), derivado de ferro (subst.). Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software Company, 2003 - 2009 For Evaluation Only. 28 Sao raros os exemplos de prefixo preso a substantivo; geral- mente isso se verifica com deverbais (des-respeito, re-torno). Acrescente-se, ainda, que os verbos formados por pre- fixagdo podem vir seguidos de complemento encabecado por preposicdo correspondente ao prefixo: concorrer com suey depender de ..., embeber em Os sufixos, por sua vez, podem ser nominais, quando contribuem para a formacdo de nomes (substantivos e adjeti- vos), ¢ verbais. Como exemplos dos primeiros, temos -mento e -al (armamento e mortal); em portugués, ha um numero considerdvel de sufixos verbais: -ejar, -ear, -izar, -e(s)cer, -itar (purpurejar, galantear, civilizar, florescer, saltitar). Temos um s6 sufixo adverbial — -mente —, que se prende a forma feminina do adjetivo: lindamente, firmemente. Certas linguas apresentam, além dos prefixos ¢ sufixos, (08 infixos, que se inserem no radical. Nao existem infixos ‘em nossa lingua; 0 -z- de cafezal, classificado como infixo em gramaticas anteriores a NGB, é, na verdade, uma con- soante de ligacdo: nao esta inserido no radical, nem imprime a este um sentido especifico (a idéia de coletivo est em -al; cp. laranjal). Dedicamos, adiante, um pardgrafo ao estudo desses,fonemas de ligacdo em portugués Desinéncias Sio os morfemas terminais das palavras varidveis. Ser- vem para indicar as flexdes de género niimero (desinén- cias nominais), e de modo-tempo e ntimero-pessoa (desinén- cias verbais). Embora se coloquem a direita do radical, como os sufixos, apresentam duas diferencas importantes com re Gio a estes, As desinéncias, através da concordancia a elas associada, colocam a palavra na frase: em Os alunos estudiosos progridem » os e estudiosos, como elementos subordinados a alunos, concordam com esse substantive em género ¢ nimero; 0 sujeito alunos e 0 verbo progridem concordam em mimero pessoa. O sufixo, por sua vez, possibilita a criagéio de uma nova palavra, que se acrescenta ao léxico da lingua: anexando ao substantive ferro o sufixo -eiro, obtemos um novo substantivo, ferreiro. Outra diferenga importante a levar em conta é que as desinéncias s20 morfemas que ndo se podem dispensa p.ex., toda forma verbal portuguesa esta associada as noges de modo e tempo e de mimero e pessoa. Essas consideragdes permitem-nos rever 0 problema do grau, interpretado em nossas gramaticas como flexao. Observemos que a expresso do grau nao implica con- cordancia: um carrinho novo ?. Notemos, ainda, que, ¢m vez de carrinho, poderiamos dizer carro pequeno, ou seja, -inho nao € elemento de emprego obrigatério. Nao havendo concordancia nem obrigatoriedade de uso desse elemento, 0 grau nao constitui um caso de flexao; -inho é sufixo, e estamos diante de um exemplo de deriva- ao sufixal. © substantivo, em portugués, flexiona-se apenas em género ¢ niimero, ¢ & dos morfemas correspondentes a essas flexes que nos ocuparemos a seguir. Desinéncias de género O género, em portugués, pode exprimir-se através de flexAo (p.ex.: garoto / garota), de derivaco (quando uma das formas, masculina ou feminina, é formada pelo acrés- cimo de um sufixo ao radical: p.ex.: conde / condessa) ou 2 Embora seja possivel dizer um carrinko novinko, néo se trata de wna construgio obrigatdria. Edited by Foxit PDF Editor Copyright (c) by Foxit Software Company, 2003 - 2009 For Evaluation Only. 30 de heteronimia (caso de masculino e feminino representa- dos por dois vocabulos completamente diferentes: p.ex.: bode / cabra). Enfocaremos, aqui, apenas o primeiro recurso mencio- nado, ou seja, a flexao. ‘Ao contrario do que vinha afirmando a tradigao gra- matical portuguesa, segundo a qual a uma forma masculina em -0 se opde uma forma feminina em -a, Mattoso Camara propée uma descricdo original, de masculino em 9 oposto a.um feminino em -a. (© argumento do autor é que no podemos considerar -0 como marca de-masculino por opor-se a -a (como no par garoto / garota, acima), porque esse mesmo raciocinio nos obrigaria a considerar como masculino 0 -e de mestre (que também se opde a -a; cf. mestre / mestra). Se é facil associar -0 a masculino, o mesmo nao se da com -e, que pode estar ligado a um ou outro género (comparem-se, p.ex., ponte (fem.) e monte’ (masc.)). No caso, a solugaio mais plausivel é considerar 0 masculino como uma forma desprovida de flexao especifica, em oposi¢ao ao feminino, caracterizado pela flexdo em -a. A vogal final das formas masculinas seria, entdo, uma vogal tematica (de que falare- mos mais adiante). Entretanto, @ observacdo de alguns fatos leva-nos a rever essa posicdo. Note-se, p.ex., que, quando se acres- centa a uma palavra feminina uma terminacdo que conte- nha -o, essa palavra passa a masculina: mulher (fem.) / mulheraco (masc.) cabega (fem.) / cabecatho (masc.) Lembremos, ainda, que 0 povo, em sua linguagem espontanea, cria formas masculinas sempre em -0; p.ex., faz-se corresponder ao feminino coisa 0 masculino coiso, inexistente na lingua culta, Sao também dignas de nota for- mas como corujo, criango, madrasto. Essas observacées conduzem-nos a conclustio de que -o est intimamente associado & nogao de masculino: a fle- 31 xdo de género ndo se reduz a uma oposicao 6 / -a, e, sim, a uma oposicdo -0 / -a. A desinéncia -o apresenta as variantes 0 (peru / perua, autor / autora) e u semivocalico (europeu / européia; mau / md). Desinéncias de nmero Comparando os membros do par mesa / mesas verificamos que, enquanto o plural ¢ caracterizado pelo -s, © singular no apresenta nenhuma desinéncia especifica. ‘A auséncia de desinéncia para o singular permite-nos afirmar que, no que se refere ao mimero, 0 singular é carac- terizado pelo morfema @, a0 passo que o plural é marcado pela desinéncia -s. Com relac&o aos nomes paroxitonos terminados em -s, como /épis, simples, que permanecem invariéveis no singular eno plural, podemos considerar um alomorfe @. Nesses casos, a identificagao do nimero dé-se através da concordanci lapis preto / Idpis pretos Quanto aos nomes terminados em consoante, destaca- remos, a titulo de ilustrag&o, os que apresentam as termina- ges -r e -z. A formacao do plural de nomes como mar ¢ cruz pode ser explicada de duas maneiras. Podemos considerar que, em mares e cruzes, foi acres- centado 0 alomorfe -es (da desinéncia -s) aos radicais mar © cruz: mar-es; cruz-es. Outra possibilidade de explicagdo & partir das formas teéricas . ‘mare e “cruze 3. Poderiamos, entao, afirmar que, no singular, 0 -e desaparece ¢ se mantém apenas no plural 3A forma teérica (ef, aqui, p. 22) corresponde a uma realizagio embora ndo encontravel em sincronia, é postulada como ponto de partida para estabelecer relagdes entre formas aparentadas fonoldgica e morfoto- gicamente, Convenciona-se indicé-la antecedida de um asterisco. Copyright (c) by Foxit Software Company, 2003 - 2009 Edited by Foxit PDF Editor For Evaluation Only. 2 mar (sing.) “mare ‘mares (pl.) ‘eruz (sing.) “cruze /\. /\ ‘eruzes (pl.) A primeira solugéo conduz-nos a uma descriggo em que, ao lado da forma basica da desinéncia, devemos apre- sentar uma série de variantes, com a especificagdio dos res- pectivos contextos. Nao é 0 que ocorre com a segunda solu- a a apresentagao de um quadro m: econémico: a desinéncia do plural é sempre -s, sem que seja necessério falar em variantes; a vogal que, eventual- mente, antecede 0 -s é incorporada a forma tedrica Saliente-se, todavia, que a escolha de urha ou de outra possibilidade se pauta exclusivamente pela consideracao do aspecto econémico; nao se trata de contrapor uma des- crigdo correta a outra, incorreta, Desinéncias verbais Ha dois tipos de desinéncias verbais: as que exprimem modo ¢ tempo (modo-temporais) e as que indicam niimero € pessoa (miimero-pessoais). Nas formas verbais portugue- sas, & semelhanca do que ocorre com outros idiomas, as desinéncias modo-temporais precedem as mimero-pessoais. Apresentamos, abaixo, 0 quadro dessas desinéncias, acompanhadas das respectivas variantes. Desinéncias modo-temporais Indicativo presente: e 3 pret. impert. va: (14.¢on}) wars. vias (28 @ 3 conj,) (var. le) pret. pert, 2 (para as cinco primeiras pessoas) -ra: (para a 3% pess. do pl.) pret. mais-que-perf.: -ra- (atono) (vars -re) fut. do pres.: -r&-(tonico) (ar.:-re-, tonico) fut. do pret. je (ar.: rie) ‘Subjuntivo pres -@ (12 con},) a (22 @ 38 con),) impert: 386 fut: Ea War -re) Formas verbo-nominais int - (ars -re) ger. -ndo: part. pass.: do Desinéncias niimero-pessoais Singular 18 pess. ° (var:-0 (pres, indie.) {.#ipret. pert. fut. do pres.) 2! pess.: s -ste (pret. pert.) 3 pess, ° 4 (pret. pert) 1 pess.: 2! bess. (var.:-stes (pret. pert.) fas (fut. do subj. 6 inf. fle xionado) 3 pes. m 40 sinat sob 0 / ¢'0 w indica que se trata do i € do w semivocélicos (p. ex.,.em amel e amou). 4 Os quadros acima correspondem ao levantamento das desinéncias verbais, segundo M. Camara (ef. bibliografia) € merecem alguns comentarios. Observemos, inicialmente, que é 0 critério estatistico {que nos permite distinguir as formas basicas dos alomorfes: p.ex., no pretérito imperfeito-do indicativo (primeira conju- gacdo), a desinéncia é -va- (que ocorre na primeira, segunda e terceira pessoas do singular, bem como primeira e terceira pessoas do plural); -ve-, por figurar apenas na segunda pes- soa do plural (améveis), & 0 alomorfe. ‘As desinéncias acima ilustram, também, o fendmeno da cumulacao: exprimem tempo e modo, simultaneamente, bem como miimero e pessoa. Algumas acumulam outros valores gramaticais: € 0 caso da desinéncia mimero-pessoal -0, que, por figurar apenas no presente do indicativo, passa também a ser marca desse tempo’e modo. Vogais tematicas ‘As vogais temiticas acrescentam-se, normalmente, a0 radical para-constituit uma base, & qual sio anexadas as desi- néncifis. Sua posigo , pois, entre 0 radical e a desinéncia. Tém por fung&o marcar classes de nomes ¢ verbos. ‘Distinguiremos vogais tematicas nominais ¢ verbais, a exem- plo do que vimos com as desinéncias. Vogais tematicas nominais ‘AS vogais tematicas nominais, em portugues, séo -a, -e € -o, respectivamente Considerando-se que -a ¢ -o também podem ser desi- néncias de género, como vimos acima, surge a necessidade de explicitar o critério que nos permite classificar essas ter- minagdes como vogais tematicas. 38 Enquanto -0 ¢ -« desinenciais comutam com -a e -0, respectivamente, para exprimir mudanga de género — com- parem-se: menin | 0 _ garot.y a menin | a”, garot | 0 —, 0 mesmo nfo ocorre com as vogais tematicas: ndo existe uma forma livra feminino de livro, como nao ha uma forma carto como masculino de carta. Acrescente-se, ainda, que -0 € -a tematicos nao se associam necessariamente as nogdes de masculino e feminino, como os exemplos livro e carta poderiam levar-nos a crer; lembrem-se os vocdbulos libido (fem.) e mapa (masc.). A vogal temética -o apresenta, em alguns vocabulos, a variante -u; p.ex., no adjetivo /utuoso, o -u- esta. no lugar do -o temético (ef. ufo). Isso ocorre com relativa freqiién- cia, quando ao -o tematico se anexa uma desinéncia ou um sufixo iniciado por vogal (comparem-se: conceito / con- eeitual / conceituar / conceituoso. Observe-se, contudo, que a passagem de -o a -u-nio é automatica, no contexto especificado. Se’a conceito correspondem conceituar / con- ceituoso, a respeito correspondem respeitar / respeitoso (com elisdo e crase, respectivamente, do -0)). Existem, também, nomes atematicos, desprovidos da referida’vogal. E 0 caso dos substantivos terminados em vogal tOnica: cipd, café. O acréscimo de sufixo a esses vocdbulos nao implica a queda da vogal t6nica final — cipoal, cafezinko —, 0 que mostra que essa vogal ndo € destacdvel e faz parte integrante do radical, Com relago aos substantivos terminados em consoante, podemos considerd-los como atemdticos ou nao. Num qua- dro descritivo em que mar é apresentado como um substan- tivo cujo plural se obtém através do alomorfe -es — mar-es —, podemos afirmar que os nomes terminados em conso- ante so atematicos; se, para explicar o plural do substantivo fem questo, postularmos a forma tebrica “mare, somos obri- 36 gados-a reconhecer no -e a vogal tematica. Em. resumo, para (0s nomes terminados em consoante, a vogal tematica seré ou ndo postulada, conforme o quadro descritivo escolhido. Vogais tematicas verbais Em nossa lingua, so trés as vogais tematicas verbais: -a- (primeira conj.), -¢- (segunda conj.) ¢ -i- (terceira conj.). E praxe identificd-las pelo infinitivo; séio as vogais que ante- cedem 0 -r desinencial: am-a-r, vend-e-r, part-i-r. Das trés vogais temiticas verbais, a mais produtiva é a que caracteriza a primeira conjugagao, visto que todos 05 verbos novos sdo a ela incorporados: discar, tricotar. ‘A vogal temdtica da primeira conjugacdo apresenta as variantes -e- e -o-, respectivamente (na primeira e na terceira pessoas do singular do pretérito perfeito do indicativo: amei, amou); a inica variante da vogal temética da segunda conju- gacdo é -i-, que ocorre no pretérito imperfeito do indicativo, na primeira pessoa do singular do pretérito perfeito do indi- cativo e no participio passado (vendia, vendi, vendido). # falso interpretar a auséncia de vogal temética numa forma verbal como um caso de alomorfe @. Em formas ‘como amo e ame, p.ex., nao figura’a yogal temitica em virtude da regra fonolégica da eliséo: ¢ uma vogal étona que cai em contato com a vogal da desinéncia: ama'+ 0= amo;ama + @ = ame No caso de vendia,'deu-se a crase do alomorfe -i- (da vogal temética) com a vogal inicial-da desinéncia -ia: vend + i+ ia = vendia Como é possivel recuperar a vogal tematica, devemos sempre. postuld-la; sua auséncia fica facilmente explicada pela aplicagdo de regras fonoldgicas gerais em portugués. Lembremos, ainda, que 0 morfema (¢ 0 alomorfe) no pode(m): ser. recuperado(s): quando afirmamos que a Ev desinéncia do singular é 9, em oposi¢ao ao -s do plural, no hé nenhum elemento que possamos pér no lugar de 2. ‘A vogal tematica verbal aparece, também, em adjeti- vos formados a partir de um tema verbal: am-A-vel. Esse fato reforca a afirmago que fizemos acima (no pardgrafo relativo aos afixos), com relagdo ao parentesco entre ver- bos e adjetivos. Em alguns substantivos deverbais, é freqiiente a ocor- réncia de duas vogais tematicas, uma verbal ¢ outra nomi- nal, como se pode observar em um exemplo como arma- ‘mento, em que 0 segundo -a- & a vogal tematica da primeira conijugagdo, e 0-0 é vogal temética nominal. Vogais e consoantes de ligagdo JA fizemos referéncia aos fonemas de ligagéio em por- tugués quando tratamos dos afixos, Vamos enfocé-los, agora, mais detidamente. Os fonemas-de ligagao so os que ocorrem no interior do vocdbulo, normalmente entre 0 radical ¢ 0 sufixo (ou entre dois radicais, no caso de alguns compostos). Sua utili- zaco est, geralmente, ligada a eufonia, o que nao impede que possam surgir por razdes analégicas, como veremos mais adiante. Quanto as vogais de ligagdo, em portugués, a rigor existem apenas duas: /i/ ¢ /o/.A vogal /i/ figura na com- posig&o de elementos latinos; /o/, na composigao- de ele- mentos gregos. O /i/ de ligagao ocorre em varios contextos, mas vamos fixar-nos nos exemplos em que essa vogal antecede o sufixo -dade: dignidade, facilidade. A existéncia do adjetivo digno e do sufixo -dade nao antecedido de /i/ (como em lealdade, ruindade) mostra-nos que esse /i/ deve ser interpretado como’ uma vogal de liga- 40. Poderiamos, também, imaginar. que se trata de uma” variante da desinéncia -o do adjetivo digno, em contato 38 com 0 sufixo; todavia, essa interpretago é inaceitavel, se Ievarmos em conta o outro exemplo proposto — facilidade —, para 0 qual o /i/ nao pode ser analisado como variante de desinéncia. Com relagao aos pares sério / seriedade Isdbrio / sobriedade) [proprio / propriedade] observamos que, com os adjetivos terminados em -io, 0 -0 passa a -é- quando se Ihe anexa o sufixo. Nesses casos, podemos afirmar que o /e/ é uma variante (fonologica- mente condicionada) da vogal /i/. Quanto A vogal /o/, s6 é'conveniente considerd-la vogal de ligac4o em vocabulos em que ela também pode ser isolada, numa perspectiva sincrOnica. E 0 caso de gas6- metro: a ocorréncia de gds e metro, independentemente, mostra que 0 /o/ é um elemento de ligacdo, semelhanga do que observamos relativamente ao /i/, Em palavras como geografia ¢ biblidfilo, nio & boa técnica descritiva analisar 0 -o- como vogal de ligaco. A existéncia dos vocabulos geologia ¢ caligrafia, p.ex., leva- nos a ver, em geografia, um composto de radicais gregos (bastante produtivos na linguagem técnico-cientifica): geo + grafia. ‘As consoantes de ligagfio mais produtivas, em portu- gués, so /z/ e'/1/, conforme se pode observar nos ‘exem- plos: cafezal, capinzal; paulada, chaleira. Sao raras as ocorréncias de outras consoantes, como /t/, em cafeteira (vocébulo criado provavelmente por analo- gia com-leiteira). Nota-se a-tendéncia a economizar os fonemas de liga- do na andlise morfoldgica, pela integragdo desses elemen- tos aos sufixos, que passam,,assim, a apresentar variantes. Um dos exemplos acima apresentados — cafezal — pode ser segmentado de duas maneiras: café + /2/ ¥ al cafe + zal (var. de -al) 39 A integracdo da consoante ao sufixo, e no ao radical, resulta da observagao de certos paralelismos: -zinho (var. de -inho) (cf. cafezinho, menininho); por conseguinte, -zal (var. de -al), jd que se trata da mesma consoante de ligacdo. ‘A segunda segmentagdo parece mais econdmica ¢ coe rente: divide © vocébulo em apenas dois elementos ¢ eli- mina 0 fonema de ligacao, que nao tem cardter morfematico. Ressaltemos, entretanto, que a escolha da. solugdo mais simples é ditada exclusivamente pela preocupacdo com a economia descritiva. Se reconhecermos a produtividade dos fonemas de ligacdo em portugués, nada nos impede de dar a eles o devido destaque. 6 Classificacaéo dos morfemas (2) Apresentamos, no capitulo precedente, uma classifica- 40 dos'morfemas do ponto de vista funcional. Levando em conta a face significante (0 material f6ni- co) desses segmentos, podemos propor outro tipo de classi ficadéo, que privilegie 0 aspecto formal, Esse enfoque nao se contrapde a0 que j apresentamos; pelo contrério, per- mite destacar novos aspectos dos morfemas examinados. Basear-nos-emos no que diz J. Mattoso Cémara Jr., em seu Diciondrio de lingiiistica e gramdtica (verbete mor- ‘fema). Segundo 0 autor, os morfemas, do ponto de vista do significante, podem ser: aditivos, subtrativos, alternati- vos, reduplicativos, de posicao e zero. Passamos a especificar, abaixo, os tracos caracteristi- cos de cada um desses diferentes tipos. Morfemas aditivos Como © nome o indica, os morfemas aditivos sao seg- mentos que se anexam a um nticleo (geralmente, o radical). Apontamos como exemplos os afixos (prefixos ¢ sufixos), as vogais teméticas (nominais ¢ verbais) e as desinéncias (nominais e verbais). Sdo os que predominam em portu- gués, bern como em outros idiomas. Quando dois ou mais morfemas se agregam a um niicleo, sua combinatéria é rigida e a ordem dos segmentos é determinada de forma bem especifica. A titulo de ilustra- G80, examinemos a seqiiéncia dos elementos constitutivos da forma verbal portuguesa; em marchdvamos, apés as comutagdes necessarias, destacamos os morfemas (Rd) + -4- (VT) + -va- (DMT) + -mos (DNP) (em que Rd = radical; VT = vogal tematica; DMT = desi- néncia modo-temporal; DNP = desinéncia mimero-pessoal). Como 0 radical e a vogal tematica constituem uma base — o tema —, ¢ os elementos seguintes so desinenciais, podemos dividir a forma apresentada em dois blocos: T (Rd + VT) + D (DMT + DNP) (em que T = tema), salientando, contudo, que essa ordem nao pode ser alterada. Em vocébulos em que figuram mais de um prefixo ou sufixo, a seqiiéncia também é rigida: recompor (*conre- por), amavelmente. Com relagio a recompor, o prefixo re-, que exprime repetigdo, esta semanticamente menos integrado a p6r do que o prefixo com-; dai, a sua posi¢ao mais perifé- rica. O mesmo pode notar-se nas construgdes sintaticas: quando dois adjetivos modificam um mesmo substantivo, 0 adjetivo semanticamente menos coeso é 0 que mais se dis- tancia com relacdo ao niicleo substantival: céu azul maravi- thoso ‘A seqiiéncia exemplificada em amavelmente & expli- cada por fatores de ordem estrutural: 0 sufixo -vel ¢ forma- marci 1 Note-se, também, que &0 tinico que pode permutar com relagdo ao subs: ‘maravithoso céu azul am dor de adjetivos, e -mente forma advérbios de modo, atre- lando-se a direita da forma feminina do adjetivo. Portanto, € preciso que, inicialmente, se agregue -vel para obter 0 adjetivo; em seguida, anexa-se o sufixo adverbial. Essas consideragdes mostram que 0s morfemas apre- sentam diferentes graus de coesao relativamente ao micleo, © que explica a existéncia de determinadas combinatérias. Observemos, ainda, que determinados morfemas aditi- vos sio bloqueadores, isto ¢, uma vez acrescentados a0 miicleo, impedem a anexagdo de qualquer outro morfema: € 0 caso do -s de ntimero plural. Em um vocdbulo como armamento, nao podemos afirmar que 0 sufixo € bloquea- dor, porque podemos ainda acrescentar-Ihe outro sufixo, -ista: armamentista; contudo, o acréscimo de -s bloqueia a forma: armamentos, em que nao é possivel anexar nenhum outro elemento. Diferentemente do -s do plural, as vogais, tematicas e os sufixos no sao morfemas bloqueadores (comparem-se: amA / amArd, amAssemos; respeitOSa / respeitOSamente). Morfemas subtrativos ‘Quando se da a supressdo de um fonema do- radical para exprimir alguma diferenga de sentido, tem-se o mor- fema subtrativo, Embora bem mais raro que os morfemas aditivos, hé um exemplo interessante em portugués. Examinando 0s pares ando / and irméo / irma Grftio / bf podemos afirmar que o feminino é obtido através da elimi- nagao do -o do masculino. Na descrigao da flex&o desses pares, é mais econdmico partir da coluna correspondente a0 feminino, 0 que nos permite formular a regra segundo a qual o masculino é formado pelo acréscimo de -o & forma do feminino. Se partissemos dos masculinos, nao poderia- 8 mos afirmar que o feminino resulta da queda do -o, por- que 0s substantivos em -o apresentam varios tipos de femi- ninos: ando / and ; ledo / leoa ; sultdo / sultana. Em outras palavras, quando o feminino ¢ em -d, 0 masculino é auto- maticamente em -o; se o masculino termina em -do, ha possibilidades variadas de feminino, o que nos obrigaria a estabelecer listagens. Nao cabe, aqui, a interpretagdo das formas femininas. and, irma e 6rf como casos de morfema @. J4 vimos que a desinéncia de género feminino em portugués é -a; a vogal -d do radical funde-se com o -a desinencial, segundo a regra fonoldgica da crase. Assim, temos: irmda > irmd. Como € possivel recuperar a desinéncia, ndo podemos postular um morfema @, de acordo com o que observamos as paginas 36 ¢ 37. Morfemas alterativos Consistem na substituigdo de fonemas do radical, que passa a apresentar duas ou mais formas alternantes; dessa alternancia resulta 0 morfema. Examinaremos, aqui, os casos de alternancia vocdlica, muito fregiientes em portugués. Podemos distinguir trés tipos de alternancia de timbre da vogal t6nica: 1) /€/-/6/ 5 16/-/6/ Essas alternancias aparecem em alguns nomes e pro- nomes, na oposigdo entre singular e plural, ou entre mascu- lino e feminino: olho / olhos; esse / essa. ‘Também ocorrem em alguns verbos da segunda conju- zagHo, opondo, no presente do indicativo, a’ primeira pes- soa do singular as demais pessoas que apresentam acento ténico no radical: bebo / bebes ; corro / corres. 2) M8-Lil 3 16/-Lu/. Estabelecem distingdo, nos pronomes, entre o animado 0 neutro: aquele / aquilo ; todo / tudo. Designamos como verbos fortes um pequeno grupo de verbos irregulares em que a primeira ¢ a terceira pessoas \gular do pretérito perfeito do indicativo tm acento ténico no radical, sem desinéncia especifica. Alguns deles apresentam a alternancia especificada neste item: fez / fiz ; pos / pus. 3) i/-16L 5 Val-106/ Ocorre em alguns verbos da terceira conjugagao, onde diferencia, no presente do indicativo, a primeira pessoa das demais, que também apresentam acento ténico no radical: Jiro / feres ; acudo / acodes. 0s trés tipos acima propostos exigem alguns comenté- ios. Notemos, inicialmente, que sio extensivos as flexdes nominal e verbal, com excegaio do terceiro, que é caracteris- tico apenas dos verbos. Percebemos, assim, um paralelismo entre nomes e verbos no que se refere a alguns tragos de flexdo, o que simplifica ¢ facilita o estudo desse aspecto. Observemos, ainda, que a alternancia vocélica se consti- tui num traco redundante. Nos exemplos apresentados, as fle- xdes de género, niimero e pessoa sao expressas por desinén- cias, ou seja, por morfemas aditivos. E excepcional, em nossa ingua, que a simples alternancia sirva para distinguir forma: nos nomes, s6 ha um exemplo de oposigéio masculino/femi nino baseada exclusivamente na alterndincia: av6/avd. Também nos verbos fortes, acima mencionados, a alternancia é basicamente distintiva. Afora esses casos, sempre um trao paralelo as desinéncias flexionais, e, por tanto, redundante. Salientamos, ao tratar dos morfemas subtrativos, que era mais econdmico descrever os pares apresentados partindo das formas femininas. Com relacdo as formas que apresen- tam alternneia vocalica, é conveniente, por razdes de eco- nomia descritiva, estabelecer como formas basicas as de vogal mais aberta. Utilizaremos, a titulo de exemplifica- do, apenas dois exemplos extraidos do primeiro tipo. 45 No caso do plural dos nomes, basta formular uma regra segundo a qual a vogal t6nica se fecha no singular: olhos ~ olho. O fechamento da vogal no singular é automé- ico. Se partissemos do singular para explicar o plural teriamos que proceder a listagem de excegdes, pois ha exem- plos de pares em que a vogal t6nica é igualmente fechada no singular e no plural: bolso / bolsos. ‘Com os verbos da segunda conjugacao, a forma basica 6 a segunda pessoa do singular, cuja vogal t6nica se fecha automaticamente na primeira pessoa: bebes + bebo. Nem sempre a vogal tdnica da primeira pessoa se abre nas demais: comparem-se temo / temes, 0 que, mais uma vez, nos obrigaria a elaborar listas Apontemos, finalmente, 0 caso da alterndncia prosé- dica, que corresponde as diferencas de posigao do acento para marca o contraste entre nomes € verbos: diivida / duvida fébrica / fabrica Nesses pares, os proparoxitonos so substantivos, ao passo que os paroxitonos so verbos. Morfemas reduplicativos Em alguns idiomas, a repeticio da parte inicial do radical (especificamente, a primeira consoante seguida da primeira vogal que, em alguns casos, toma o timbre e) tem valor morfolégico. E 0 que se verifica em latim, em que certos verbos apresentam, no pretérito perfeito do indica- tivo, uma forma caracterizada pela reduplicacdo ou redo- bro: cano, ‘‘canto’’ / cectni ; do, “dou” / dedi. Ao lado desse tipo de reduplicago, havia, também, em latim, 0 chamado redobro expressivo ou intensivo, com repe- tigdo da consoante inicial do radical acompanhada de uma vogal acrescida da vibrante /t/: murmur, “‘murmiirio”” ; tur- tur, “rola (ave)”. Diferentemente da reduplicacdo anterior, Ges seessseesscooess eee sere eeeRE CSRS SSRN ff cccs. © redobro expressive tinha por fungéo dar mais realce a0 vocdbulo; seu emprego, portanto, era mais estilistico. Observe- se 0 caréter onomatopéico dos exemplos apresentado: Esses morfemas também sao, de certa forma, aditivos; diferenciam-se, contudo, destes tiltimos pelo fato de que no ¢ 0 elemento acrescido que tem valor morfolégico, ¢ sim sua repeticao. A lingua portuguesa nao apresenta morfemas redupli- cativos. Em nossa lingua, 0 fenémeno da reduplicagao é comum na linguagem infantil ¢ nos hipocoristicos: papai, miamde, vov6, Zezé, Fifi; ocorre, também, em alguns com- postos: pingue-pongue, reco-reco, tique-taque. Saliente-se, porém, que esses exemplos nao se revestem de valor morfo- Idgicor ilustram, na verdade, o chamado redobro expressivo, de que falamos acima. Morfema de posi¢ao ‘A disposigao dos morfemas na frase pode ter valor gramatical. Comparem-se: Jodo vé José (Jodo: sujeito; José: objeto) e José vé Jodo (José: sujeito; Jodo: objeto). © morfema de posicao distingue-se dos outros tipos aqui apresentados por nao se constituir nem em acréscimo, nem em subtrag&o de segmentos. Convém ressaltar que, a0 lado das combinagdes que’ implicam mudanga-de fungéo, como ilustrou o exemplo acima, temos seqiiéncias de ordem livre, como, p.ex., em: Hoje, vou sair / Vou, hoje, sair / Vou sair, hoje, em que a posi¢éo varidvel do advérbio nao lhe altera a fungao. Acrescente-se, ainda, que hd combinatérias que néo podem ocorrer: "homem o (diferentemente do que se passa em romeno, em que © artigo & posposto: omul). “ Como, para os lingtlistas de orientacdo distribuciona- lista, as combinagdes de segmentos internos ao vocdbulo sdo estudadas na morfologia, cabendo A sintaxe o estudo ee das combinagées ao nivel da frase, 0 morfema de posi¢ao ocuparia, a rigor, um capitulo importante da sintaxe. No entanto, a impossibilidade de formar seqiiéncias como “homem o nao é, fundamentalmente, diferente da impossibilidade de formar ‘faldmosva (por faldvamos). Isso nos leva a ver, no morfema de posicao, um tipo limitrofe entre a morfologia e a sintaxe, 0 que dificulta o estabele: mento de uma rigida linha diviséria entre os dois campos. Morfema zero (a) Jé fizemos, ao longo deste livro, algumas referén ao morfema e ao alomorfe 9. So comuns, em portugués, os exemplos de morfema @ na flexo verbal: com freqiiéncia, as desinéncias modo- temporais e mimero-pessoais so representadas por esse tipo de morfema. Lembremos, cointudo, que nao se deve postular um morfema @ quando estamos diante de um ele- mento recuperdvel: em ame, ndo se deve falar em vogal tematica @, visto que, no tema amA-, a vogal tematica se elide antes da desinéncia modo-temporal -e: am(a)e. Essa observaciio deve, portanto, prevenir-nos contra um uso indiscriminado do morfema @, que s6 deve ser pos- tulado em casos de real necessidade. Os diferentes tipos de morfema apresentados neste capitulo agrupam-se em trés blocos, caracterizados, respec- tivamente, pelo acréscimo, pela subtracao e pela alterndn- cia de segmentos. 0 Em portugues, predominam, como ja se observou, os morfemas aditivos; so freqtientes, também, os alternativos (normalmente, redundantes com relagdo aos morfemas seg- mentais), no terreno das flexdes nominal e verbal. Raros sfio os casos de morfemas subtrativos em nossa lingua. 7 Conclusao © exame da complexidade do vocdbulo conduziu-nos A andlise de seus elementos constitutivos. Partindo de pares minimos, cujos membros devem apresentar uma relacéo de semelhanga ¢ uma relagdo de diferenca, depreendemos através das técnicas explicitadas, os morfemas, unidades minimas portadoras de sentido. C interesse da depreensao dos morfemas resulta de seu caréter produtivo: sao elementos recorrentes, reutilizados em centenas de vocdbulos, e, portanto, vivos na lingua. Bis por que as técnicas propostas adquirem particular importan- cia, Por razées metodoldgicas, privilegiamos 0 ponto de vista sinerénico, 0 que nao significa que subestimemos 0 enfoque diacr6nico. O prévio conhecimento sincrdnico ajuda a entender determinados fatos de evolugdo: a maior resistén- cia de morfemas mais produtivos e mais freqiientes; relati- vamente aos morfemas semanticamente aparentados, a ten- déncia ao maior emprego de um deles em detrimento dos) ‘outro(s) ou o desenvolvimento de uma nova diferenga entre eles. Em portugués, com relagdo aos sufixos verbais -ejar e -ear, de valor freqiientativo, nota-se a tendéncia a0 uso 9 mais constante da primeira forma; observem-se os verbos: branquejar (a0 lado de branquear), purpurejar (ao lado de purpurea). Os sufixos formadores de substantivos dever- bais, -mento e -¢do, quando se anexam ao mesmo tema formam um par cujos membros se diferenciam semantica- mente: armamento / armacao ; coroamento / coroacao. Devem ser ressaltados, também, certos paralelismos que caracterizam a morfologia portuguesa. No paragrafo relativo 0s morfemas alternativos, mostramos como os mesmos tipos de alternancia ocorrem nas flexdes nominal e verbal, Outro fato importante a destacar é a integracdo que se estabelece entre algumas nogdes: mostramos, no capitulo 5, que os nomes terminados em consoante sdo tematicos ou no, em fungdo do quadro descritivo escolhido para explicar o plural. Se optarmos por uma descrigao que privi- legie as variantes, diremos que o plural de mar (mares) é formado pelo acréscimo do alomorfe -es ao radical; se pre- ferirmos economizar as variantes, partiremos da forma ted- rica “mare, cuja vogal tematica desaparece no singular e se mantém no plural. Vemos, assim, que a flexéo de nimero e as vogais tematicas nominais séo tépicos que nao se disso- ciam, Também esto associadas as vogais temdticas ¢ as desinéncias de género as vogais de ligacéo: num primeiro momento, é preciso esclarecer que, em dignidade, 0 -i- des- tacado no é variante da desinéneia de género masculino -o, levando-se em conta uma forma como facilidade, para a qual nao seria cabivel essa interpretagdo. Convém, ainda, salientar que 0 estudo dos processos de formacao de palavras pressupde o conhecimento das téc- nicas de segmentacdo morfematica e da classificagao dos morfemas (tanto do ponto de vista funcional, quanto do ponto de vista significante). O préprio conceito de deriva- gio vocabular — o acréscimo de afixos a um radical = implica o conhecimento dos elementos mencionados. (Os estudos de J. Mattoso Camara Ir., relativos as fle- xdes nominal (de género e ntimero) e verbal, representam 0 um avango. com relagao as descrigdes propostas em nossas graméticas tradicionais e também pressupSem 0 conheci- mento de algumas informagGes teéricas e 0 dominio de técni- cas implicitas na obra do autor, mas cuja explicitacdo deta- Ihada se faz necesséria para muitos leitores que terdio um pri- meito contato com os textos mattosianos. Esperamos que as téenicas de segmentagao e a classificagdo dos morfemas depreendidos, que desenvolvemos ao longo deste livro, pos- sam contribuir para o preenchimento dessas lacunas. 8 Exercicios de aplicagado Levando em conta as dificuldades de segmentacdo morfemitica de certos vocibulos mais complexos, apresen- tamos, neste capitulo, alguns exercicios comentados. Pro- pomos, também, algumas questdes, para cuja solucdo 0 estudante pode basear-se no(s) exercicio(s)-modelo. Embora fosse mais interessante utilizar a transcricdo fonolégica, preferimos, a titulo de simplificagao, exemplifi- car com a forma escrita dos vocdbulos. O objetivo desses exercicios ¢, também, acrescentar algumas observag6es relativas aos morfemas do portugues. 1) Depreender, pela técnica da comutacdo, os morfemas constitutivos do vocdbulo deslealdade. Como observamos no capitulo 3, levaremos em conta que 0 vocdbulo proposto se relaciona com outros, com os quais apresenta relagdes de semelhanca e de diferenca. Esse traco permite-nos estabelecer pares, que podem ser comparados. Inicialmente, comparemos deslealdade com desle de desleal lade ‘0 que nos leva a depreender -dade, sufixo, 2 Prosseguindo, cotejemos desleal com leal. E praxe (embora nao seja obrigatéric) estabelecer o novo par a par- tir do segundo elemento do par inicialmente apresentado desteal Teal (© que nos conduz a depreensio de des-, prefixo © adjetivo lea! € indecomponivel e representa o radi- cal do vocabulo em questao. 0 vocdbulo proposto apresenta, portanto, os seguintes morfemas: des-: prefixo eal: radical -dade : sufixo 2) Destacar os morfemas constitutivos do vocibulo desres- peitosamente. Estabelecamos, inicialmente, o par desrespeitosamente destespeitosa que nos permite destacar -mente, sufixo Considerando o novo par, - desrespeitosa respeitosa depreendemos des-, prefixo. Prosseguindo, temos respeitosa respeito 6 que nos leva a depreensao de -sa. Aqui, 0 verdadeiro seg- mento a ser destacado s6 pode ser corretamente estabele- ido se levarmos em conta outros pares, freqilentes na lin- gua portuguesa: . creme / cremosa fervor / fervorosa ete. que nos mostram que o morfema destacavel é -osa, sufixo. 53 Como o substantivo respeito termina em -o € 0 sufixo -osa inicia-se pela mesma vogal, deu-se o fenémeno da crase (cf., acima, p. 15): respeito + osa respeitosa Encontramos aqui a interferéncia de uma regra fonoldgica, diferentemente do exercicio anterior, que nos conduziu a0 destaque de morfemas nitidamente diferenciados no corpo do préprio vocabulo. Comparando respeitosa com respeitoso respeitosa respeitoso depreendemos -a (¢ -0). Como 0 vocdbulo proposto é des- respeitosamente, € 0 -a, desinéncia de género feminino, que deve reter nossa atenciio. Por outro lado, vemos que -osa é, na verdade, constituido de dois elementos: -os-, 0 sufixo propriamente dito, ¢ -a, desinéncia Sincronicamente, ndo é possivel decompor respeit-, radical Em resumo, 0s morfemas destacados si des. : prefixo respeit- : radical sos: sutfixo ‘a: desinéncia de género feminino -mente : sufixo 3) Segmentar os morfemas constitutivos do vocdbulo insen- ~ sales.” Comparando as formas insensatez insensato destacamos -e2, sufixo. O -0 de insensato, em contato com a vogal inicial do sufixo -ez, sofre elisio (cf., acima, p.15 insensat(o) + ez = insénsatez 84 A partir de insensato, estabelecemos um novo par, insensato _sensato que nos permite depreender in-, prefixo. O cotejo de sensato com senso sensato senso possibilita-nos o destaque de -ato, sufixo (cf. cordato). ‘Os morfemas depreendidos sao: ine: prefixo ssens- + radical -at(o) : sufixo -ez sufixo 4) Depreender os morfemas constitutives do vocbulo con- fiabilidade. ‘A segmentac&o deste vocdbulo apresenta problemas especificos, que discutiremos a seguir. Relativamente ao par inicial amavel durdvel ete, Nesses pares, observamos que os elementos da segunda coluna s40 0s substantivos abstratos correspondentes aos adjetivos da primeira coluna. Assinale-se, também, que a terminacao -vel dos adjetivos passa regularmente a -bil- nos substantivos derivados da segunda coluna. Essas obser- ‘vages permitem-nos concluir que -bi/- é uma forma variante de -vel, 0 que nos possibilita voltar ao par confiabilidade confivel, 55 considerando, agora, que confidvel e confiabil- so formas correspondentes !. Sendo assim, 0 segmento diferencial, destacivel, & -idade, sufixo. A ocorréncia de -dade (sem -i-), em vocdbulos como bondade, lealdade, ruindade, leva- nos a interpretar o -i- como vogal de ligacao; se optarmos por uma andlise mais econdmica, podemos considerar -idade como alomorfe de -dade. Qualquer uma das duas solugdes € igualmente aceitével. Procedendo & comparagio de confidvel fiavel” ~ depreendemos con-, prefixo. Prosseguindo, estabelecamos um novo par, fidvel fia que nos leva a destacar -vel, sufixo. (Esse sufixo apresenta- se, em confiabilidade, sob a forma do alomorfe -bil-.) Comparando, agora, fia com outra forma, fia fio segmentamos -a (e, também, -0, que nao nos interessa no caso). O par fia / fio leva-nos a interpretar -a como indice de terceira pessoa do singular do presente do indicative. Contudo, podemos corrigir essa classificagio, levantando formas como fiava / fidramos / fiassem em que a ocorréncia de -a- é constante, independentemente de modo/tempo e nimero/pessoa; trata-se, na verdade, da vogal temética da primeira conjugacdo. Retomando os morfemas destacados, temos: con- : prefixo fi- : radical A variante -bif- ocorre também no superlativo: aceitabilissimo, amabilis- simo, confiabilissimo, durabilissimo, : vogal tematica (I? conjug.) alomorfe do sufixo -vel alomorfe do sufixo «dade vogal de ligacdo; -dade: sufixo) Observemos, também, que os adjetivos terminados em -z, quando seguidos dos sufixos -dade ou -issimo, alte- ram 0 -z em -c-, conforme o ilustram os exempios: capaz, / capacidade / capacissimo feliz / lade / felicissimo veloz / velocidade / velocissimo 5) Destacar os morfemas constitutivos do vocdbulo despre- zivel. Partamos da comparacéio desprezivel desprezo que nos conduz a depreensio de -/vel, sufixo. A existéncia da forma desprezdvel permite-nos esta- belecer outro par: desprezivel desprezavel do qual destacamos o elemento -i- (¢ -d-). Deveriamos classificar esse elemento como variante da vogal temiitica. Contudo, entre os adjetivos desprezivel e desprezdvel ha uma ligeita diferenca de sentido (& seme- Ihanca do que ocorre com os adjetivos vendivel venddvel). Como 0 tinico traco diferenciador entre esses adjetivos é a oposigao -i- / -a-, somos obrigados a associar a ele a dife- renga de sentido, Considerando que as vogais tematicas so meramente classificatérias (cf., acima, p. 34), ndo pode- mos atribuir a elas um valor significative. Essas observa- ges levam-nos a nao separar a vogal do sufixo propria- mente dito, analisando -ivel como um todo. Notemos que € essa a posicdio da maioria de nossos dicionérios, quando 7 indicam 0 sufixo -vel sempre antecedido de uma vogal: -dvel, -fvel, -tivel ? Prosseguindo com as comutagdes, temos desprezo prezo © que nos permite destacar des-, prefixo. Portanto, os morfemas depreendidos sao: des. + prefixo, prez: : radical tel: sufixo Exercicio: Depreenda ¢ classifique os morfemas constitutivos dos vocdbulos: inegavelmente — impetuosamente — desgracioso — legalidade — aceitabilidade. Passemos, agora, a alguns exercicios de segmentagao de formas verbais, destacando as dificuldades especificas. © Segmentar os morfemas componentes da forma verbal descongelavam. Estabelecamos, inicialmente, 0 par descongelavam congelavam que nos fornece o morfema des-, prefixo Prosseguindo, temos congelavam gelavam que nos possibilita a depreensao de con-, prefixo Isolados os prefixos, podemos ainda continuar: gelavam, gelava com destaque de -m, desinénci mimero-pessoal 2 No exercicio anterior, poderiamos, portanto, ter ligado a vogal tematica «a-a alomorfe -bil. epresentando a vatiante por -abil- 58 Partindo, agora, de gelava, temos gelava gela © que nos leva a destacar -va, desinéncia modo-temporal (pretérito imperfeito do indicativo da primeira conjugacdo). Podemos, ainda, levantar um novo par, ecla elo com destaque de -a. Como ja foi observado acima, o par leva-nos a classificar esse como desinéncia de terceira pessoa do singular (em oposigio ao -0); é 0 confronto com outras formas: gelava / gelaremos / gelando em que 0 -a- & constante, que nos permite como vogal tematica da primeira conjugacdo. Finalmente, a comparagiio gela canta fornece-nos 0 radical, gel-. Em resumo: des- : prefixo con- : prefixo gel- + radical -a-: vogal temética (1? conjug. -va- : desinéncia modo-temporal -m —: desinéncia niimero-pessoal 7) Destacar os morfemas componentes da forma verbal bus- cdveis. Nao podemos, aqui, estabelecer o par: buscdveis / bus- cava, sem antes mostrar que -ve- é variante de -va-. Comparando as formas buscava e buscasse, depreen- demos -va, desinéncia modo-temporal (j4 especificada no 59 exercicio anterior). Levantemos todas as formas correspon- dentes a esse tempo: busca va busca vas busca va bused va mos busca ve is busca va m © quadro mostra-nos que -ve- figura uma s6 vez na coluna em que ocorre cinco vezes a forma -va-; trata-se, portanto, de uma variante da referida forma. Feita essa observacdo, podemos, agora, retomar o par mente apresentado: buscéveis buscava que nos permite destacar -is, desinéncia mimero-pessoal. (Se nao tivéssemos levado em conta o quadro acima, serfa- mos obrigados a depreender -eis.) Finalmente, cotejando: busca fala depreendemos busc-, radical. Os morfemas segmentados sao: use: a (1? conju.) alomorfe da desinéncia modo-temporal -va- : desinéncia mimero-pessoal 8) Depreender os morfemas componentes da forma verbal existia. Se estabelecéssemos, inicialmente, 0 par existia existisse destacariamos -a como desinéncia modo-temporal. Contudo, a uti ago de um novo par existia exista possibilita-nos corrigir o resultado acima. As duas formas (existia / exista) passam a distinguir-se pela presenca do em existia. Considerando que -i- € a vogal tematica dos ver- bos da terceira conjugacdo e que a funcéio dessa vogal é apenas classificatéria, nao pode ser associada a ela a dife- renga de modo/tempo entre as duas formas verbais. Essas observagdes levam-nos a destacar -ia como desinéncia modo-temporal (pretérito imperfeito do indicativo da segunda ¢ terceira conjugacdes). ~~Ja vinios, & pdgina 36, que a vogal temdtica deve ser sempre postulada. Quando ela nao ocorre, é em virtude de regras fonoldgicas, como crase ¢ elisdo. No exemplo em ques to, houve a crase da vogal temética -i- com o i+ de -ia: exist + i + ia = existi E possivel, ainda, prosseguir com as comutagdes existia existiamos © que-nos indica que a noc&o de primeira (ow terceira) pes- soa do singular, em existia, esta representada pelo morfema o (em contraposigao a existiamos, em que -mos representa a primeira pessoa do plural). Finalmente, se compararmos existia dormia depreendemos exist como radical. Convém observar, aqui, que a utilizacao de um par como existia partia conduziré a erros de segmentagao. De fato, o elemento comum, nesse par, é -tia; os elementos diferenciais so exis- a € par-, ou seja, todos elementos desprovidos de significagao €, portanto, sem valor morfematico (cf., acima, observagao ap. 17). A forma verbal existia ¢ composta dos morfemas exist : radical Gi): vogal tematica (3% conjug.) iq: desinéncia modo-temporal ©: desinéncia nimero-pessoal. Exercicio: Depreenda e classifique 0s morfemas constituti- vos das formas verbais: bailemos — bebtamos — marcharam (pret. mais-que-perfeito) Os exercicios acima tm por objetivo ilustrar as técni- cas de segmentagao. Apresentamos, em seguida, alguns tipos de exercicio mais variados. 9) Separar ¢ classificar as desinéncias dos vocdbulos: senko- res — moca — limpamos — chamdveis senhores A comparagdo de senhores ¢ senior conduz: a0 desta- que de -es, desinéncia de mimero plural. Podemos interpre- tar -es como alomorfe da desinéncia -s; outra solugao con- siste em postular a forma tedrica “senhore, & qual se acres- centa 0 -s desinencial (¢f., acima, p. 31-2). moca A oposigio moga / mogo permite-nos depreender -a, desinéncia de género feminino. O par moga / mocas leva a depreensio do morfema @ de singular. Temos, assit smog +a +o limpamos © cotejo com limpavamos possibilita 0 destaque do morfema @ modo-temporal (presente do indicativo ou preté- a rito perfeito do indicativo, visto que a forma verbal esté fora de contexto). Opondo limpamos a limpa, destaca-se -mos, desinén- cia mimero-pessoal. chamdveis A comparagao com chamava leva a depreensio de -is, desinéneia mimero-pessoal (relativamente variante -ve-, de -va-, cf. observacao referente ao exercicio 7, acima). O par chamava / chamasse permite a segmentagao de -va-, desinéncia modo-temporal. Temos, portanto: chama (tema) + ve (alom.) + is Exercicio: Destaque ¢ classifique as desinéncias de: luzes — damos — garota — temiam 10) Destaque © sufixo dos vocébulos normal ¢ taquaral e mostre’se se trata do mesmo morfema nos dois casos. Nao poderfamos comparar, inicialmente, normal com norma e taquaral com taquara, porque esses pares nos leva- riam ao destaque de -/, que ndo tem valor de morfema. Levando em conta os pares espectro / espectral— _ paralelos a norma / normal morte / mortal bambu / bambual—_ paralelos'a taquara / taguaral tomate / tomatal—~ depreendemos 0 sufixo -a! . Podemos, assim, afirmar que em normal e taquaral houve o fenémeno da crase: norma + al = normal taquara + al = taquaral Em normal, o sufixo tem valor adjetival de relacdo, pertinéncia; em faquaral, indica quantidade, conjunto. 6 Em virtude da diferenca de sentido, podemos afirmar que se trata de sufixos homénimos. Como reforco a essa observacdo, note-se que 0 mor- fema -al nfo aceita as mesmas combinatorias nos dois vocd-t bulos: de normal temos normalizar, normalmente e norma- lidade; em taquaral, essas seqiiéncias nao so possiveis: *ta- quaralizar, “taquaralmente, *taquaralidade sao formas ina- ceitaveis em nossa lingua. E, portanto, conveniente, de um ponto de vista sincré- nico, distinguir dois sufixos -al, em portugues. 11) Com base nas construgées: sem nds — conosco — de nds — com nds rnesmos, indique em um quadro a dis- tribuigdo do pronome nds. Podemos ilustrar essa distribuigdo no quadro abaixo: inds}_| prep. com + {nés) prep. com + (nds) + #3 | [inasr + : [Teseor © quadro mostra que 0s alomorfes nds e nosco esto em distribuigdo complementar. Exereicio: Indique a distribuigio dos pronomes pessoais tOnicos mim, ti e si ¢ estabeleca uma compara- do com relacao ao quadro acima. Os exercicios acima apresentados e discutidos nio tive- ram por objetivo apenas a aplicacdo das técnicas explicita- das ao longo deste livro. Alguns aspectos da morfologia portuguesa foram também acrescentados. Lembremos, por 3 Este sinal indica pausa 64 vogal tematica permitiu corrigir algumas segmentagées (cf. exercicios 5 e 8); 0 exercicio 11 mostra a complexidade do subsistema dos pronomes obliquos ténicos em nossa lingua. Ao Pe Assinalemos, ainda, que foi nossa preocupacdo cha- Vocabulario critico mar a atengao do leitor para a ordem das comutagoes, a n de evitar que alguns pares sejam estabelecidos antes da realizacao de certas comutagées prévias, 0 que pode con- duzir a segmentagdes ou a classificagdes falsas (cf., p.ex., exercicio 7). Alofones: & como se denominam as diferentes realizacdes de um fonema. Em portugués, 0 fonema /I/ apresenta 08 alofones [I], alveolar, e (t], velar (substituido, no por- tugués do Brasil, por {w]). Convenciona-se representar os fonemas entre barras obliquas, ¢ os alofones, entre colchetes. A designacao de alomorfes é paralela & de alo- fones (v. alomorfes). - Alomorfes: para os lingitistas americanos, de orientagao i distribucionalista, € a designagao que se da as diferentes, realizagdes de um mesmo morfema. Assim, em portu- gués, 0 morfema (mim) apresenta, como alomorfes, /mim/ e /migo/, respectivamente (v. distribuigdo com- plementar). Hé alguns critérios para estabelecer qual dos alomorfes de um determinado morfema representa a forma basica. Por convengao, representa-se a forma basica entre chaves, e os alomorfes, entre barras obli- quas (v. alofones). * Comutagdo: teste que consiste em substituir um fonema de «um signo lingiistico por outro, a fim de verificar sea subs- tituig&o acarreta uma diferenca de sentido. Em caso afir- mativo, tem-se um novo fonema; por exemplo, em /pa-

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