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Cicero Silva*
Por terem tido cada vez mais importância nas questões associadas à cultura
e ao comportamento em geral, e por conseqüência terem cada vez mais
atraído um número maior de pessoas interessadas, os jogos começaram a
ser motivo de questionamento sobre sua importância nas relações com
áreas do conhecimento estabelecidas, tais como a literatura, as artes
plásticas, o cinema e até a filosofia. Para se ter uma idéia de como essa
indústria produz “novidades” (aquilo que Adorno criticava vorazmente na
indústria do consumo), em 2005 a toda poderosa empresa de Bill Gates
lançou outra versão de seu Xbox (vídeo-game que processa milhões de
cálculos por segundo e que não reconhece as versões anteriores).
Com o surgimento dos jogos de computadores que operam com o uso das
redes e da Internet, começaram a pipocar inúmeros debates, publicações e
projetos acadêmicos sobre o tema. Na área de produção cultural o
Ministério da Cultura brasileiro resolveu investir na área e lhe dedicar uma
linha de incentivo para projetos que desenvolvam narrativas e jogos
eletrônicos. A idéia que ronda os desenvolvedores, acadêmicos e o público
em geral é a de que os jogos serão parte inevitável de nossa futura cultura
e, portanto, evitá-los é o mesmo que ter evitado, no passado, o surgimento
do rádio, da televisão e, na década passada, da Internet. Assim como há
uma espécie de consenso entre alguns acadêmicos de que os jogos
surgiram, novamente, para marcar alguns campos que antes eram restritos
ao seu suporte, como, por exemplo, a literatura e a televisão, existe
também uma série de críticos que vêem esse movimento de tentar associar
os jogos de computadores com a academia e com áreas tradicionais da
pesquisa científica como um jogo momentâneo para angariar uma certa
credibilidade, abrir um certo espaço sem os incômodos tradicionais, e
garantir uma certa autonomia passageira para suas atuações dentro de seus
respectivos campos de trabalho.
Seguindo a linha de pensamento que acredita que os jogos dessa vez vieram
para ficar, Noah Wardrip-Fruin, artista, professor, pesquisador visitante na
Brown University e professor no departamento de Artes Visuais da
University of California em San Diego (UCSD) resolveu organizar, em
parceria com Pat Harrigan, um livro em torno do assunto com acadêmicos
reconhecidos em suas áreas. Noah e Pat reuniram mais de 20 textos sobre
jogos, narrativas e interatividade num só volume e realizaram uma tarefa
curiosa: os textos foram comentados durante algum tempo em um fórum
virtual, e o resultado dessa discussão, restrita somente aos autores do livro,
foi também editada e publicada no livro First Person: New Media as Story,
Performance and Game, pela MIT Press. No livro Noah e Pat apresentam sua
proposta e fazem algumas apostas sobre o futuro das narrativas e sobre a
relação entre a literatura, a escrita e aquilo que hoje é conhecido como
interatividade, a partir do surgimento de jogos cada vez mais complexos em
sua programação e linguagem.
NWF: Eu diria que por duas razões. A primeira é que eu acredito que
fundamentalmente jogar jogos, representar, contar estórias e declamar
poemas são atividades profundamente humanas e todas essas atividades
aparecem, de uma forma ou de outra, na mídia digital. Portanto, eu queria
criar um livro no qual as pessoas que estão pensando sobre isso estivessem
em um mesmo contexto, reagindo umas às outras, de modo que pudessem,
através desse diálogo, refletir sobre o campo de forma mais ampla. Isso foi
parte da motivação. A outra parte foi que, apesar de eu acreditar que isso
já esteja mudando, ainda existe uma idéia de que jogos sejam como que
uma parte separada da mídia digital. Assim, apesar de seu enorme sucesso
comercial, os jogos se mantiveram muito desinteressantes de um ponto de
vista artístico, de um ponto de vista acadêmico. E eu também quis desafiar
um pouco esse ponto dizendo: “Sim, os jogos constituem uma de nossas
formas de mídia digital mais populares, mas também existem trabalhos de
interesse artístico, uma forma de escritura interessante. E isso está
acontecendo e se relaciona com os jogos”.
E eu acho que acadêmicos e artistas devem contribuir para nossa discussão
sobre o assunto.
NWF: Sim, é isso... com isso você produz regras, o que eu acredito que, na
verdade, funcione muito bem com o uso do reconhecimento estatístico de
linguagem que opera com grandes dicionários de linguagem. Usamos o
padrão que observamos nestes grandes sistemas de linguagem para
tentarmos interpretar e gerar linguagem, e isso produz melhores resultados.
E como sabemos que os resultados são melhores? Nas décadas de 70 e 80,
nós usávamos técnicas baseadas em procedimentos computacionais e
obtivemos algum resultado, mas com limitações. Enquanto isso, o que
aconteceu foi que os gráficos computacionais apresentaram melhoras
incríveis, sendo usados para aplicações militares e por Hollywood, e com
isso jogos de computador foram se tornando cada vez melhores. Assim,
talvez por essas razões, talvez por outras, os jogos de computador se
focaram mais no componente gráfico, e muito pode ser dito a esse respeito
em termos de literatura. Hoje em dia acredito que isso esteja mudando.
Empresas de jogos de computador estão contratando escritores em
período integral, profissionais com experiência e que pensam e escrevem
através de e para os procedimentos. Ao mesmo tempo, nossa capacidade
de lidar computacionalmente, algoritmicamente, com a linguagem está
aumentado. O segundo ponto importante sobre o qual eu quero refletir é
como isso tudo pode, talvez, estar produzindo um novo tipo de literatura,
que seja conectada ao setor de jogos de computador. Hoje, a maior parte
dos jogos de computador ainda são mais bem escritos, ou talvez mais mal
escritos do que os filmes de Hollywood. Mas eu acredito que exista um
movimento alternativo crescendo na área de jogos. E acredito que esse
movimento alternativo de jogos produzirá jogos que serão tão bem escritos
quanto os bons jogos, quanto os bons filmes, ao invés de ser comparável
aos filmes ruins. O terceiro ponto é que eu acredito que existam aquelas
estruturas sobre as quais precisamos refletir nos jogos de computador, de
modo que pensamos sobre eles como uma estrutura de busca. Espen
Aarseth escreveu a esse respeito. Janet Murray escreveu a esse respeito.
Talvez não queiramos pensar sobre jogos de computador como literatura,
mas podemos compreender melhor algumas das suas estruturas através da
utilização de modelos literários.
NWF: Bem, nos EUA nós tivemos nosso primeiro grande boom dos jogos
no início da década de 1980, e empresas como a Warner se envolveram,
comprando empresas de jogos, por exemplo. Foi um momento bastante
interessante, pois as pessoas estavam jogando tantos tipos de jogos. E
então a indústria de jogos de computador entrou em um tipo de colapso.
Algumas pessoas interpretaram esse colapso como sendo parcialmente
causado pela entrada das grandes empresas da mídia. Daí a teoria de que as
grandes empresas de mídia não entendem jogos etc. Eu não sei se eu
acredito nisso. Acho difícil acreditar que as grandes empresas de mídia não
compreendam os jogos. Mas é verdade que hoje em dia as grandes
empresas de jogos incluem gente como a Electronic Arts, e gente como a
Microsoft, mas também gente como a Sony. E a Sony tem, de fato, uma
presença significativa em outros tipos de mídias. Portanto, acho
interessante ver como essas grandes empresas se saem. Dito isso, acredito
que hoje em dia a maior parte dos jogos de computador seja produzida no
modelo de grandes corporações da mídia, em um grande estúdio, com
grandes investimentos e grandes riscos na tentativa de se criar grandes
sucessos de vendas. E tudo aquilo que não vira um grande sucesso de
vendas é considerado como um tipo de fracasso… e isso precisa ser
mudado. Eu acredito que jogos de computador somente poderão crescer
como uma forma de arte quando houver muito mais diversidade do que a
que temos tido hoje, em termos de seus modelos de produção. E seus
modelos não são aquele das grandes corporações da mídia.
NWF: Certo, e o que eu estou pensando é que minha mãe tem um laptop
que ela carrega com ela não somente quando ela viaja, mas pela casa…
NWF: Certo, e quando ela está refletindo sobre alguma coisa e ela quer
maiores informações sobre o assunto, ela abre o laptop e faz uma busca na
Web, e normalmente a informação que ela quer está ali. Eu acho que nós
não ponderamos sobre o que isso significa para nossa cultura. E sobre o
que acontece agora e presumivelmente vai acontecer cada vez mais. Acho
que existe um grande grupo de pessoas que assume que o mundo on-line
vai ser como uma biblioteca, com muitas informações disponíveis
gratuitamente. E isso tem uma força enorme, já que a maior força vem
daquilo que as pessoas assumem como certo em seu entendimento e como
seu direito. E o que se assumiu é que a Internet é uma biblioteca, e se você
tentar mudar a rede e impedir que continue sendo uma biblioteca, eles
dirão: “Como assim?”. Hoje sabemos que a Internet é uma biblioteca, mas
podemos ver, em retrospecto, que na década de 1990 as pessoas se
perguntavam: “O que a Internet vai se tornar? Vai ser como uma TV a
cabo?”. E hoje sabemos que a Internet é como uma biblioteca. Ainda não
sabemos o que vai acontecer com os jogos de computador. Não sabemos
se serão como os modelos dominantes, ou como eles vão modificar nossas
expectativas, ou ainda o que faremos a respeito com as informações
arquivadas nos bancos de dados. Mas, com certeza, se tomarmos aqueles
que estão na faixa dos 30 anos ou menos, temos um grupo de indivíduos
que têm uma expectativa quanto à presença dos jogos em sua vida diária,
não como uma parte separada de suas vidas em casas de fliperama, mas
com jogos jogados em um console ligado a uma TV, ou em um computador
– onde eles também podem fazer sua lição de casa quando crescerem, ou
em um aparelho que pode ser carregado dentro do bolso, como um Game
Boy. Então eu acho que se assume que os jogos não sejam mais uma coisa
isolada, e essa talvez seja uma mudança que vamos começar a observar.
NWF: Bem, eu acho que um ponto sobre o qual temos que refletir é de
onde vem a tecnologia gráfica para os jogos. Grande parte do financiamento
é de fontes militares, cujo intuito é criar simuladores de vôo e de batalhas.
A razão pela qual os militares investem tanto dinheiro no desenvolvimento
de programas como simuladores de vôo não é por pensarem que os livros
são ruins, mas sim porque talvez existam coisas que possam ser aprendidas
a partir da simulação, mas que não possam ser aprendidas a partir de um
livro, ou que sejam muito difíceis de se aprender através de um livro. Assim,
para eles, esses simuladores de vôo não constituem uma alternativa a dar
um livro sobre vôo para alguém, mas sim uma alternativa a colocar alguém
na cabine de um avião – uma alternativa a uma ação no mundo real.
Acredito que, de certa forma, o que nós precisamos é pensar sobre o
objetivo dos jogos na educação. E o objetivo dos jogos na educação
provavelmente não deverá ser tentar ensinar coisas que possam ser
aprendidas através de livros, mas sim ensinar coisas que não possam ser
ensinadas através de livros. E para ensinar coisas deste tipo, talvez
possamos simular atividades que podemos realizar no mundo real, ou que
não podemos fazer de forma nenhuma. As pessoas tentam fazer isso. Por
exemplo, usando jogos como SimCity para ensinar às crianças sobre as
cidades. Mas aí nos deparamos com um outro problema: Sim City não vem
do nada, ele é baseado em uma pesquisa de um cara do MIT chamado Jay
Forester, que deu duro para tentar entender o planejamento urbano
através da simulação. Mas suas cidades são distorcidas. Por exemplo, suas
cidades não têm subúrbios, de forma que temos crianças...
NWF: (risos...) sim, eu jogo jogos, e acho que jogar é como ler. Toma
muito tempo, quer dizer, se você nunca diminui o tempo de jogo, você
sempre precisa fazer mais do que já fez. Eu acho que essa é uma das
vantagens que os acadêmicos da área de cinema têm sobre nós: eles levam
duas horas para assistir um filme, e você leva várias horas para terminar um
jogo, e para interagir em um romance complexo. Você pode medir a obra
de um diretor em uma semana, e o mesmo não é verdade se você quiser
conhecer uma série de trabalhos de uma empresa de jogos. Se você quiser
medir todo o seu trabalho, provavelmente vai levar semanas. Minhas
primeiras experiências com jogos foram com coisas como Infocom Games,
e Zork, e talvez coisas anteriores como Hunt the Wumpus. Depois,
quando eu estava no colegial, eu joguei muito Tetris, nós tínhamos um
Nintendo. Agora, eu diria que cheguei em um ponto onde meus jogos
favoritos são experimentais. Eu realmente aprecio jogos interativos como
Façade, e também gosto de jogar grandes sucessos como Fable. Mas em
algum nível, não é a mesma coisa. As pessoas que produzem Fable têm uma
obrigação para com seus financiadores de criar algo com apelo para uma
audiência realmente grande. E alguma coisa que tem esse apelo, ao
contrário dos para audiências mais restritas, eu não tenho apreciado muito.