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Medicina, Ribeirão Preto, Simpósio: HEMOSTASIA E TROMBOSE

34: 282-291, jul./dez. 2001 Capítulo VII

COAGULAÇÃO INTRAVASCULAR DISSEMINADA

DISSEMINATED INTRAVASCULAR COAGULATION

Maria Carolina Tostes Pintão1 & Rendrik F. Franco2

1
Pós-Graduanda (Hematologia) do Departamento de Clínica Médica da FMRP-USP.
2
Professor Livre-Docente de Hematologia e Hemoterapia. Coordenador do Serviço de Investigação em Hemofilia e Trombofilia,
Fundação Hemocentro de Ribeirão Preto, Coordenador do Laboratório de Hemostasia, Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina
de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo.
CORRESPONDÊNCIA: Dra. Maria Carolina Tostes Pintão - Laboratório de Hemostasia - Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto - Universidade de São Paulo. Tel. 16 602 2223 - Fax: 16 633 1144 - E-mail: cpintao@hotmail.com

PINTÃO MCT & FRANCO RF. Coagulação intravascular disseminada. Medicina, Ribeirão Preto,
34: 282-291, jul./dez. 2001.

RESUMO: No presente artigo, revisamos diversos aspectos da etiologia, fisiopatologia, diag-


nóstico e tratamento da coagulação intravascular disseminada (CIVD).

UNITERMOS: Coagulação Intravascular Disseminada. Coagulação. Inflamação.

1. INTRODUÇÃO mento da condição predisponente são fundamentais


para a resolução da síndrome.
A coagulação intravascular disseminada (CIVD) Apesar de ter sido extensivamente estudada nas
é, atualmente, definida como uma síndrome adquirida, últimas décadas, muitos aspectos da CIVD, particu-
caracterizada pela ativação difusa da coagulação in- larmente aqueles relacionados à sua definição, diag-
travascular, levando à formação e deposição de fibrina nóstico e tratamento, são ainda motivo de extensos
na microvasculatura(1). O sistema fibrinolítico está, em debates. Este capítulo apresenta informações atuali-
geral, amplamente inativado durante a fase de maior zadas relativas à fisiopatologia, aspectos clínicos, diag-
ativação da coagulação, o que contribui para a deposi- nóstico e tratamento da CIVD.
ção de fibrina. Porém, em algumas situações (por exem-
plo, na leucemia promielocítica aguda) a fibrinólise pode 2. CONDIÇÕES CLÍNICAS ASSOCIADAS À
estar acelerada, contribuindo, assim, para quadros de CIVD
sangramento grave. A deposição de fibrina pode levar
à oclusão dos vasos e conseqüente comprometimento A CIVD pode ocorrer em associação a uma
da irrigação sangüínea de diversos órgãos, o que, em grande variedade de condições clínicas, as principais
conjunto com alterações metabólicas e hemodinâmi- listadas na Figura 1. A incidência da síndrome nas
cas, contribui para a falência de múltiplos órgãos. O diferentes situações citadas não pode ser estabelecida
consumo e conseqüente depleção dos fatores da coa- com precisão, em parte pela dificuldade em defini-la e
gulação e plaquetas, resultantes da contínua atividade também pela falta de critérios diagnósticos claros(1,2).
procoagulante, pode levar a sangramento difuso, o que As principais condições clínicas envolvidas na etiolo-
freqüentemente é a primeira manifestação notada. É gia da CIVD serão discutidas a seguir.
importante ressaltar que a CIVD é sempre secundá- As doenças infecciosas, em particular a septi-
ria a uma doença de base e a identificação e trata- cemia, são as mais comumente associadas à CIVD.

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Coagulação intravascular disseminada

Apesar de virtualmente qualquer microorganismo que faz parte da síndrome HELLP (hemolysis,
(como vírus e parasitas) desencadear a síndrome, as elevated liver enzymes and low platelets) caracte-
infecções bacterianas são as mais freqüentemente riza-se melhor como secundária à anemia hemolítica
associadas à CIVD. Cerca de 30% a 50% dos pa- microangiopática, situação distinta da CIVD e discu-
cientes em septicemia cursam com CIVD em fase II tida abaixo(1,2). Outras causas obstétricas de CIVD
ou III e, virtualmente, todos apresentam CIVD em encontram-se listadas na Figura 1.
fase I (Figura 6). Diferente do que se acreditava, a Doenças vasculares, como hemangiomas gi-
ocorrência de CIVD em septicemia por germes do gantes (síndrome de Kasabach-Merritt) ou grandes
tipo gram-positivo é tão comum quanto na septicemia aneurismas de aorta, podem resultar em ativação lo-
por gram-negativo. Diversos fatores, como compo- cal da coagulação e ter como conseqüência a deple-
nentes de membrana dos microorganismos (lipopolis- ção sistêmica dos fatores da coagulação e plaquetas,
sacarídeos ou endotoxinas) e exotoxinas de bactérias consumidos localmente. Com menor freqüência, fa-
(por exemplo, α-toxina estafilocócica), estão envolvi- tores ativados podem atingir a circulação sistêmica,
dos e resultam em resposta inflamatória generalizada, desencadeando a CIVD. A incidência de CIVD cli-
com liberação sistêmica de citocinas que estão direta- nicamente detectável em pacientes com hemangioma
mente envolvidas no distúrbio hemostático que carac- gigante é de 25% e em aneurisma de aorta é de
teriza o quadro de CIVD(1, 2, 3). 0,5% a 1%(1, 2).
Trauma grave também é freqüentemente rela- Vale ainda mencionar um grupo de doenças
cionado à CIVD e uma combinação de mecanismos, caracterizado por anemia hemolítica microangiopáti-
que inclui liberação de gordura e fosfolipídios tissulares ca e que inclui púrpura trombocitopênica trombótica
na circulação, hemólise e lesão endotelial, contribui (PTT), síndrome hemolítico-urêmica (SHU), anemia
para a ativação sistêmica da coagulação em tal situa- hemolítica microangiopática induzida por quimiotera-
ção. O padrão de liberação de citocinas em pacientes pia, hipertensão maligna e síndrome HELLP. O evento
politraumatizados é semelhante àquele observado em comum nessas doenças é a lesão endotelial, que cau-
pacientes sépticos, reforçando as evidências do seu sa adesão e agregação plaquetária, formação de
papel fundamental no desenvolvimento da síndrome.
A incidência de CIVD em pacientes que sofreram
trauma grave com síndrome da resposta inflamatória
sistêmica é de 50% a 70%(1, 2). Medicina Interna
Tumores sólidos e neoplasias hematológicas Sepsis/infecções, leucemia, transplante, insuficiên-
podem cursar com CIVD. O mecanismo envolvido é cia hepática aguda, reações alérgicas, acidente
ainda pouco compreendido, mas parece estar relacio- ofídico, hipotermia, deficiência homozigotica de PC,
nado ao fator tissular (FT), expresso na superfície das tumores sólidos, cirrose, vasculite, Síndrome
células tumorais. Dez a 15% dos pacientes com tu- Kasabach-Merritt, SARA
mores metastáticos e 15% a 20% dos pacientes com Cirurgia
leucemia exibem evidências de ativação intravascular Trauma, grandes operações, lesão SNC, embolia
da coagulação. A leucemia promielocítica aguda cur- gordurosa, queimaduras, cirurgia cardíaca bypass,
sa com uma forma distinta de CIVD, caracterizada transplante de órgãos, aneurisma aorta, tumores
por hiperfibrinólise e, apesar de o sangramento ser a vasculares
manifestação clínica mais comum nesses pacientes, a
trombose disseminada também ocorre(1, 2). Obstetrícia
A CIVD é uma complicação clássica de condi- Embolia de líquido amniótico, DPP, aborto séptico,
ções obstétricas, como descolamento de placenta e rutura uterina, DHEG, sepsis, HELLP, feto morto
embolia de líquido amniótico. A liberação de material retido
tromboplástico é o que provavelmente desencadeia a
Medicina transfusional
síndrome, uma vez que o grau de descolamento pla-
Reação hemolítica transfusional aguda, transfusão
centário correlaciona-se com a gravidade do quadro e
maciça
o líquido amniótico é um potente ativador da coagula-
ção in vitro. A pré-eclâmpsia e eclâmpsia também Figura 1: Condições clínicas associadas à CIVD.
podem cursar com CIVD, no entanto, a coagulopatia

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MCT Pintão & RF Franco

trombo e alteração da fibrinólise. A patogênese da consumo e conseqüente depleção dos fatores da coa-
PTT e da SHU envolve a deficiência de uma protease gulação e plaquetas, o que, freqüentemente, resulta
que cliva multímeros de fator de von Willebrand, le- em manifestações hemorrágicas. No conjunto, esses
vando ao seu acúmulo anormal e hiperagregação pla- mecanismos fisiopatológicos explicam a ocorrência si-
quetária. A coagulopatia presente em tais doenças multânea de trombose e sangramento na CIVD (Fi-
envolve, essencialmente, o consumo de plaquetas e gura 3). Nesse ponto, deve ser salientado que, não
não dos fatores da coagulação e é, portanto, distinta obstante as manifestações hemorrágicas sejam fre-
daquela relacionada CIVD(1, 2). qüentemente observadas ao exame clínico, é a trom-
bose microvascular que, provavelmente, mais contri-
3. FISIOPATOLOGIA bui para a disfunção de órgãos-alvo e mortalidade as-
sociadas à CIVD.
Nos últimos anos, estudos envolvendo pacien- Geração de trombina. Diversas evidências
tes sépticos e modelos animais e humanos de endo- apontam para o complexo FT/FVIIa como principal
toxemia e septicemia contribuíram em muito para a mediador da geração de trombina. O bloqueio da via
compreensão da fisiopatologia da CIVD. Em linhas do FT/FVIIa por anticorpos monoclonais anti-FT ou
gerais, pode-se dizer que a deposição sistêmica de anti-FVIIa resulta em completa inibição da geração
fibrina é resultado da geração de trombina, mediada de trombina e previne a ocorrência de CIVD e morte
pelo complexo fator tissular/fator VII ativado (FT/ em primatas submetidos a infusão de endotoxina(1,2,4).
FVIIa) e da inibição ou disfunção dos anticoagulantes Adicionalmente, em estudo recente, foi demonstrado
naturais (antitrombina [AT], proteína C [PC], proteína que a expressão de FT in vivo encontra-se aumenta-
S [PS] e inibidor da via do fator tissular [TFPI]). Em da em modelo de endotoxemia humana, e é direta-
adição, a inibição da atividade fibrinolítica pelo aumento mente associada à marcante ativação da coagulação(5).
dos níveis do inibidor do ativador do plasminogênio do Experimentos envolvendo o sistema de contato da
tipo 1 (PAI-1) resulta em remoção inadequada de coagulação (previamente designado “via intrínseca”)
fibrina, contribuindo, dessa forma, para a trombose da mostraram que tal via não contribui de modo impor-
microvasculatura. Citocinas, principalmente a interleu- tante para a geração de trombina, mas exerce fun-
cina-6, têm ação central nesse processo (Figura 2). A ções relacionadas a outros sintomas da resposta infla-
ativação sistêmica da coagulação promove não so- matória sistêmica como, por exemplo, a ocorrência de
mente deposição de fibrina e trombose, mas também, hipotensão(1, 2, 4).

Figura 2: Patogênese da CIVD

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Coagulação intravascular disseminada

Figura 3: Mecanismos fisiopatológicos na CIVD.

Supressão dos inibidores fisiológicos da Inflamação e coagulação. A relação existen-


coagulação. A atividade dos principais reguladores te entre inflamação e coagulação é inquestionável. A
da ativação da coagulação (AT, PC, PS e TFPI) está reação inflamatória ativa a coagulação sangüínea por
inibida nos pacientes com CIVD, contribuindo para a promover a expressão de fator tissular no espaço in-
formação e deposição de fibrina na microvasculatura. travascular, eliciar a expressão de moléculas de ade-
Os níveis plasmáticos de AT estão reduzidos, em con- são de leucócitos na parede vascular, diminuir a ativi-
seqüência do consumo secundário à geração contínua dade fibrinolítica e a função da via anticoagulante da
de trombina, aumento da degradação pela elastase li- PC(6). As citocinas são importantes mediadores des-
berada por neutrófilos ativados e diminuição da sua sas alterações e seu papel no desenvolvimento da CIVD
síntese. A atividade do sistema PC/PS também se vem se tornando cada vez mais claro. A síndrome da
encontra diminuída em decorrência de consumo e da resposta inflamatória sistêmica, secundária a infecções
diminuição da expressão de trombomodulina nas cé- e lesões teciduais extensas, é mediada por diversas
lulas endoteliais, além da diminuição da fração livre citocinas capazes de ativar a coagulação in vitro. Di-
da PS, importante cofator da atividade da PC. Os ní- ferentes investigações demonstraram que o fator de
veis plasmáticos de TFPI, em geral, não estão reduzi- necrose tumoral-α (TNF-α) é o primeiro a se elevar,
dos, porém há evidências de que sua atividade regula- seguido da elevação dos níveis plasmáticos de
dora não seja exercida adequadamente em pacientes interleucina 6 (IL-6) e interleucina 1 (IL-1). Estudos
com CIVD(1, 2, 4). envolvendo a administração dessas interleucinas em
Fibrinólise. Modelos experimentais demons- voluntários saudáveis ou em modelos animais bem
traram que a bacteremia e a endotoxemia resultam como o uso de anticorpos bloqueando sua ação, suge-
num rápido aumento da atividade fibrinolítica seguida riram que a IL-6 é a principal responsável pela gera-
de sua supressão, sustentada pelo aumento mantido ção de trombina, possivelmente por regular a expres-
nos níveis plasmáticos do PAI-1, o principal inibidor são de fator tissular. O papel do TNF-α na ativação
do sistema fibrinolítico. Com efeito, sua atividade re- da coagulação é relacionado à sua capacidade de in-
manescente não é capaz de compensar a deposição duzir o aumento da IL-6. Adicionalmente, o TNF-α
sistêmica maciça de fibrina (Figura 2). Exceção se parece ser o principal mediador da depressão da ativi-
faz à coagulopatia relacionada à leucemia promielocí- dade do sistema da PC, por induzir diminuição da ex-
tica aguda, em que evidências de fibrinólise intensa pressão de trombomodulina nas células endoteliais (Fi-
estão usualmente presentes(1, 2, 4). gura 4). A IL-1 é um potente agonista da expressão

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MCT Pintão & RF Franco

Figura 4: Papel das interleucinas na CIVD.

de fator tissular in vitro, no entanto, seu papel in vivo tura para a falência de múltiplos órgãos e morte é ain-
ainda é pouco claro e o fato de sua elevação só ocor- da desconhecida. De qualquer forma, diversas evi-
rer depois das principais alterações procoagulantes que dências apontam para a contribuição da CIVD em tal
seguem a administração de endotoxinas, torna a pos- processo e uma hipótese atraente é a de que as inte-
sibilidade de um papel direto no desenvolvimento da rações entre coagulação e inflamação, como expos-
CIVD pouco provável(2, 7, 8). tas acima, estejam diretamente envolvidas(10, 11).
Por outro lado, a ativação descontrolada do sis-
tema de coagulação não resulta apenas em trombose, 4. DIAGNÓSTICO
mas também em inflamação e proliferação celular, me-
diadas principalmente pela ação da trombina. Assim, Não existe exame laboratorial que isoladamen-
estabelece-se uma alça de retroalimentação positiva te estabeleça ou afaste o diagnóstico de CIVD, po-
que, se não controlada, pode progredir, promovendo le- rém a combinação de alterações clínicas e laborato-
são vascular, falência de múltiplos órgãos e morte. Os riais compatíveis e, principalmente, a presença de do-
mecanismos controladores desse processo ainda não fo- ença sabidamente relacionada à síndrome permitem
ram completamente elucidados, porém a PC parece ser diagnóstico confiável na maioria dos casos (1, 2).
um importante mediador do controle, o que pode, ao Clinicamente, pode-se observar os sinais de res-
menos em parte, explicar os resultados promissores posta inflamatória sistêmica, como febre, hipotensão,
obtidos com o uso desse inibidor fisiológico da coagu- acidose, manifestações de sangramento difuso
lação no tratamento de pacientes sépticos graves(6, 9). (petéquias, equimoses, sangramento em locais de pun-
O significado clínico da presença da CIVD não ção venosa e cicatriz cirúrgica ou traumática) e sinais
é completamente claro. É indiscutível a importância de trombose(12). As principais manifestações clínicas
da plaquetopenia e depleção de fatores da coagula- são apresentadas na Figura 5. A CIVD é um proces-
ção em pacientes com sangramento ou submetidos a so de gravidade progressiva, o que permite caracteri-
procedimentos invasivos. Entretanto, a magnitude da zar sua evolução em fases, conforme mostrado na
contribuição da deposição de fibrina na microvascula- Figura 6(13).

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Coagulação intravascular disseminada

TROMBOSE HEMORRAGIA

SN: ↓ consc., delírio, coma SN: sangramento i.c.


Pele: isquemia focal, gangrena Pele: petéquias, equimoses, sítios
Rins: oligúria, azotemia de venopunção
AR: SARA Mucosas: epistaxis, gengivorragia
GI: ulceração aguda Rins: hematúria
Anemia hemolítica GI: sangramento

Figura 5: CIVD: quadro clínico

Os exames laboratoriais necessários para a


confirmação diagnóstica de CIVD são discutidos a
Fase 1 (ativação compensada) seguir.
• Poucos sintomas Tempo de protrombina (TP), tempo de
• TTPA, TP, TT, fibrinogênio: N tromboplastina parcial ativada (TTPa) e tempo de
• Plaquetas: N / limite trombina (TT). O prolongamento do TP e do TTPa
• AT: ↓ discreta reflete o consumo dos fatores da coagulação e, por-
tanto, uma fase de ativação franca da coagulação. O
• DD, PDF, TAT, F1+2: ↑ resultado normal desses exames não exclui a presen-
ça de CIVD, uma vez que, nas fases iniciais da sín-
drome, não há consumo suficiente de fatores da coa-
Fase 2 (ativação descompensada) gulação para prolongar o TP e o TTPa. Eles são exa-
• Sangramentos + disfunção de órgãos mes amplamente disponíveis e sua realização seriada,
• TTPA, TP, TT: ↑ diante da suspeita de CIVD, permite avaliar a evolu-
• Plaquetas, fibrinogênio: ↓ ção do quadro assim como a resposta terapêutica. O
• AT, fatores da coagulação: ↓ TT, por sua vez, reflete a hipofibrinogenemia relacio-
• DD, PDF, TAT, F1+2 : ↑↑ nada ao consumo de fibrinogênio, além de alterar-se
mediante ação dos produtos de degradação da fibrina/
Fase 3 (CIVD plenamente manifesta) fibrinogênio (PDFs) sobre o fibrinogênio.
Contagem de plaquetas. A contagem de pla-
• Sangramentos + disfunção de múltiplos ór- quetas inicialmente baixa e, particularmente, a sua que-
gãos da progressiva são um achado sensível, ainda que pouco
• TTPA, TP, TT: ↑ ↑ / ↑ ↑ ↑ específico, para avaliar a evolução da síndrome, uma
• Plaquetas, AT, fibrinogênio, fatores: ↓↓ vez que a agregação plaquetária é conseqüência da
• DD, PDF, TAT, F1+2 : ↑ ↑ ↑ geração de trombina. A estabilização da contagem de
plaquetas sugere que a formação de trombina tenha
Figura 6: Fases da CIVD: manifestações clínicas e
cessado.
laboratoriais Fibrinogênio e produtos da degradação da
fibrina (PDFs). A dosagem de fibrinogênio plasmático

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MCT Pintão & RF Franco

deve ser feita, porém em fases iniciais da CIVD, seus Observação do esfregaço de sangue perifé-
níveis podem permanecer normais ou mesmo eleva- rico. Tem importância nos casos de suspeita de CIVD,
dos apesar da ativação da coagulação, uma vez que à medida que a presença de hemácias fragmentadas
se trata de proteína de fase aguda. A hipofibrinogene- (esquisócitos) é indicativa da presença de trombose
mia aparece em casos graves de CIVD. O aumento microvascular.
dos PDFs são, em geral, observados desde o início do Em suma, diante da suspeita de CIVD, os se-
quadro de CIVD. Nos últimos anos mostrou-se que guintes exames devem ser realizados: contagem de
testes de quantificação de dímeros-D (um dos produ- plaquetas e visualização do esfregaço de sangue peri-
tos da degradação da fibrina no plasma) são mais sen- férico, TP, TTPa, TT, dosagem de fibrinogênio, PDFs
síveis que os ensaios de PDFs e que níveis normais de e dímeros-D. É importante enfatizar que a repetição
dímeros-D têm um alto valor preditivo negativo para a seriada desses exames tem maior valor que seus re-
presença de degradação intravascular da fibrina. Uma sultados isoladamente e permite melhor avaliação da
vez que o fibrinogênio é também degradado em regi- evolução da síndrome. Em casos selecionados, a de-
ões extravasculares, a elevação dos PDFs e dos dí- pender de análise individual e disponibilidade do méto-
meros-D não implica necessariamente a presença de do diagnóstico, dosagens de AT, PC ou fatores da coa-
fibrinólise intravascular. Deve-se ainda considerar que gulação podem também ser efetuadas.
PDFs são metabolizados pelo fígado e excretados pe- Scores. Nas últimas décadas, numerosos siste-
los rins e, portanto, os níveis plasmáticos desses produtos mas de score foram propostos com a intenção de per-
são influenciados pela função dos órgãos citados. mitir diagnóstico e acompanhamento mais precisos da
Dosagem de fatores da coagulação e anti- CIVD, porém, até o momento, nenhum deles foi am-
coagulantes naturais (proteína C, antitrombina). plamente aceito. Recentemente, o Subcomitê Cientí-
A diminuição dos níveis plasmáticos de fatores da fico de CIVD da Sociedade Internacional de Trombo-
coagulação é refletida, como já foi dito, no prolonga- se e Hemostasia (ISTH) propôs um sistema que con-
mento dos tempos de coagulação e é resultado do seu sidera duas situações diferentes: CIVD fases I/II e
consumo. A dosagem de fatores específicos (por CIVD plenamente manifesta(14). O diagnóstico de
exemplo, fatores V e VIII) pode ser útil em algumas CIVD plenamente manifesta é baseado na aplicação
situações, como, para auxiliar na diferenciação entre de algoritmo de cinco passos, com atribuição de pon-
coagulopatia associada à insuficiência hepática e tos cuja soma maior ou igual a cinco é compatível com
CIVD. A dosagem plasmática de AT e PC pode tam- o diagnóstico de CIVD plenamente manifesta, levan-
bém ter valor diagnóstico complementar em casos em do-se em conta que uma pontuação menor não exclui
que a hipótese de CIVD não pôde ser estabelecida o diagnóstico (Figura 7). A presença de uma doença
mesmo após a realização dos exames mencionados de base sabidamente associada à síndrome, é o pri-
anteriormente. meiro passo do algoritmo e condição sine qua non
Marcadores de ativação da coagulação: para sua execução. O subcomitê recomenda que o
fibrinopeptídeo A (FPA), fragmento1+2 da protrom- score seja calculado diariamente a fim de que se ca-
bina (F1+2), fibrina solúvel e complexo trombina- racterize a gravidade e a evolução do quadro(14).
antitrombina (TAT). Considerando-se a definição de
CIVD (que leva em conta a formação intravascular 5. TRATAMENTO
de fibrina), a medida direta dos níveis de fibrina solú-
vel no plasma poderia contribuir para o diagnóstico Evidências seguras que possam fundamentar o
definitivo da síndrome. No entanto, testes dessa natu- tratamento da CIVD ainda são escassas, e a maioria
reza não se encontram disponíveis ou validados para dos tópicos envolvidos em tal tratamento é motivo de
utilização na rotina de investigação diagnóstica da controvérsia. No entanto, é de geral aceitação que a
CIVD. Os marcadores FPA, F1+2 e TAT são indica- pedra angular do manejo da CIVD é o tratamento da
dores sensíveis da geração de trombina, com sensibi- doença de base. Enquanto isto se faz, estratégias de
lidade e especificidade que variam de 80 a 90%, po- “suporte” (administração de fluidos, antibioticotera-
rém são exames caros e, em geral, não disponíveis pia, correção de distúrbios hidroeletrolíticos e do equi-
para uso rotineiro. Apesar de úteis em situações clíni- líbrio ácidobásico, suporte ventilatório e cardiocircu-
cas de maior complexidade, não são essenciais na prá- latório) podem ser necessárias. Adicionalmente, me-
tica clínica diária. didas baseadas principalmente nos conhecimentos que

288
Coagulação intravascular disseminada

Figura 7: Algoritmo para diagnóstico de CIVD plenamente manifesta

se tem sobre a fisiopatologia da CIVD podem ser


implementadas. De forma geral, as intervenções se • Tratamento da doença de base
baseiam no uso de anticoagulantes, reposição de plas- • Medidas de “suporte”
ma e plaquetas e administração de inibidores fisiológi- • Anticoagulantes
cos da coagulação, consoante detalhado a seguir (Fi- Heparina, LMWH: dose
gura 8)(1, 2).
Inibidores de trombina
Anticoagulantes. Estudos experimentais mos-
Anti-TF (rNAPc2)
traram que a heparina pode, pelo menos em parte,
inibir a ativação da coagulação relacionada à septice- • Transfusão de plaquetas
mia e outras causas. Estudos não controlados, envol- • Transfusão de plasma e crioprecipitado
vendo pacientes com diagnóstico de CIVD sugeriram • Concentrados de inibidores (AT, PC, TFPI)
benefício do uso de heparina, porém tal benefício não • Antifibrinolíticos: contra-indicados
foi, até o momento, inequivocamente demonstrado em Figura 8: CIVD: tratamento
estudos controlados e incluindo grande número de

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MCT Pintão & RF Franco

pacientes. Além disto, a segurança do tratamento com desses processos em pacientes sépticos. Bernard et
heparina em pacientes com risco de sangramento tam- al. demonstraram recentemente num estudo clínico
bém é motivo de debate. Por outro lado, a profilaxia multicêntrico, duplo cego e randomizado (PROWESS),
com heparina pode prevenir tromboembolismo nos que, em pacientes com septicemia grave e evidências
pacientes com CIVD. A administração de doses pro- de disfunção de múltiplos órgãos (choque circulatório,
filáticas de heparina por via subcutânea ou endoveno- acidose, oligúria e hipoxemia), o uso da PC recombi-
sa ainda é recomendada em pacientes com CIVD em nante foi eficiente em diminuir a mortalidade, indepen-
numerosos centros. Doses maiores devem ser reser- dente da idade, gravidade da doença, número de ór-
vadas para pacientes com tromboembolismo ou situa- gãos comprometidos, sítio da infecção ou tipo de orga-
ções de deposição extensa de fibrina como purpura nismo envolvido. O aumento de risco hemorrágico não
fulminatus e isquemia acral. Quando se toma a deci- atingiu significância estatística, porém deve-se ressal-
são de se utilizar a heparina, tanto a heparina não tar que o delineamento desse estudo excluiu pacientes
fracionada como a heparina de baixo peso molecular com alto risco de sangramento (hepatopatia crônica,
podem ser administradas. nefropatia crônica diálise-dependente, intervenção ci-
O uso de inibidores da trombina não dependen- rúrgica recente ou transplante, trombocitopenia [con-
tes da AT, como a hirudina, pode ser benéfico em pa- tagem de plaquetas < 30.000/mm3] e uso de ácido acetil
cientes com CIVD, porém não existem ainda estudos salicílico [dose maior que 650mg/dia] até três dias an-
clínicos envolvendo pacientes com CIVD que autori- tes do início do estudo). Outros estudos são, portanto,
zem seu uso e o alto risco de sangramento pode ser necessários para avaliar a eficácia do tratamento em
um fator limitante importante para sua aplicação em pacientes com septicemia moderada e leve, sem dis-
tais pacientes. função de órgãos, e em pacientes sob maior risco
Transfusão de plasma e plaquetas. Baixos hemorrágico. De qualquer forma, o PROWESS for-
níveis de fatores da coagulação e plaquetas podem neceu evidências clínicas claras de que novas terapias
aumentar o risco de sangramento na CIVD. No en- utilizando agentes com propriedades antiinflamatórias
tanto, a transfusão desses produtos não deve ser feita e anticoagulantes, são eficazes em diminuir a mortali-
apenas com base em exames laboratoriais, mas tam- dade em pacientes sépticos graves(9, 15).
bém, no quadro clínico do paciente. Não existem es- A antitrombina também é um importante inibi-
tudos bem controlados que provem a eficácia da trans- dor fisiológico da coagulação. Estudos em modelos
fusão “profilática” de plasma e plaquetas, mas ela pa- animais e em humanos (envolvendo pequeno número
rece ser uma opção racional para pacientes com san- de pacientes), mostram resultados promissores com o
gramento e para aqueles que vão ser submetidos a uso de concentrados de antitrombina, porém ainda não
procedimento invasivo. Reposição de concentrados de foram publicados estudos clínicos adequadamente
fatores da coagulação não está indicada. delineados, que provem sua eficácia a ponto de auto-
Concentrado de inibidores da coagulação. rizar seu uso na rotina terapêutica de pacientes com
A restauração das vias naturais de anticoagulação pa- CIVD. Outras modalidades terapêuticas, como anti-
rece ser um objetivo terapêutico adequado. A PC é um corpos anti-FT (rNAPc2), TFPI, trombomodulina
anticoagulante natural que promove fibrinólise, inibe recombinante e intervenções em nível de citocinas,
trombose e inflamação e é um importante modulador encontram-se atualmente sob avaliação(2).

PINTÃO MCT & FRANCO RF. Disseminated intravascular coagulation. Medicina, Ribeirão Preto, 34: 282-
291, july/dec. 2001.

ABSTRACT: In the present article we review several aspects related to the etiology,
pathophysiology, diagnosis and treatment of disseminated intravascular coagulation (DIC).

UNITERMS: Disseminated Intravascular Coagulation. Coagulation. Inflammation.

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Coagulação intravascular disseminada

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 9 - BERNARD GR; VINCENT JL; LATERRE PF; LAROSA SP;
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