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56º

Curso Nestlé
de Atualização em Pediatria
Foz do Iguaçu
Paraná

Apoio Científico
Hospital das Clínicas
Universidade Federal do Paraná
Depto. de Pediatria
Pontifícia Universidade Católica
Depto. de Medicina
Disciplina de Pediatria
Faculdade Evangélica de
Medicina de Curitiba
Disciplina de Pediatria
Hospital Universitário Regional
do Norte do Paraná
Disciplina de Pediatria
Fundação Universidade Estadual
de Maringá
Depto. de Medicina
56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 1
2 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA
A presentamos, com grande satisfação, um resumo das aulas do 56o Curso
Nestlé de Atualização em Pediatria, realizado na cidade de Foz do Iguaçu – PR,
reafirmando seu compromisso fundamental que é, justamente, o de levar o
conhecimento dos especialistas a um grande número de pediatras de todo o país.
É patente que em nossos dias há uma demanda crescente por informação,
Editorial atualização e reciclagem do conhecimento. Novas técnicas e procedimentos surgem
a cada dia e os profissionais realmente preocupados em oferecer o melhor para
as crianças brasileiras sabem que, para exercer sua missão com plenitude, devem
estar em sintonia com essa nova realidade.
Também está claro a todos nós as dificuldades que enfrentamos para proporcionar
a nós mesmos a reciclagem que precisamos. Especialmente se considerarmos os
profissionais que desenvolvem suas atividades em cidades distantes dos grandes
centros. Se essa premissa acima é válida devido à intensidade das transformações
que testemunhamos hoje, o que dizer das dificuldades enfrentadas pelos médicos
pediatras em meados do século XX?
Nesse sentido, a parceria sabiamente iniciada no começo do século entre a
Sociedade Brasileira de Pediatria, suas Afiliadas e a Nestlé, e que há 43 anos
deu início ao Curso Nestlé de Atualização em Pediatria, tem gerado condições
favoráveis para que a oportunidade de reciclagem e atualização ocorra. A parceria
não deve ser brindada apenas pelas oportunidades que criou, mas principalmente
por seu ineditismo, arrojo e visão demonstrada por seus idealizadores.
As Entidades parceiras vêm dando à sociedade uma demonstração inequívoca
de que, baseada em princípios éticos sólidos, respeito mútuo e objetivos comuns,
podem construir juntas grandes benefícios para a coletividade.
O Curso Nestlé de Atualização em Pediatria volta ao Paraná após 11 anos,
e conta com o apoio da Sociedade Brasileira de Pediatria, através de seu presidente
Dr. Lincoln Marcelo Silveira Freire e de suas Afiliadas aqui representada pela
Sociedade Paranaense de Pediatria cujo presidente o Dr. João Gilberto Sprotte
Mira com seu entusiasmo e dedicação incontestes envidou todos os esforços para
a realização deste encontro.
A programação científica para este Curso foi cuidadosamente elaborada pela
Sociedade Brasileira de Pediatria e pela Sociedade Paranaense de Pediatria e
contou ainda com o apoio e a colaboração das Universidades Paranaenses.
O conteúdo programático transcrito nesta publicação é voltado para as
necessidades dos nossos dias e é resultado da contribuição inestimável dos
professores convidados, que se dispuseram a investir seu tempo para compartir
com os pediatras a preocupação de trazer benefícios para atualização pediátrica
no Brasil.
Desejamos aos participantes deste Curso um ótimo aproveitamento e que esta
publicação seja de grande valor para consulta e estudos.

Ricardo Gonçalves
Diretor Presidente
da Nestlé Brasil Ltda.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 3


4 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA
Caros Colegas,
M ais uma vez nos encontramos no Curso Nestlé de Atualização em
Pediatria, este ano em Foz do Iguaçu, aprazível cidade do Paraná e cartão postal
do nosso País.

O Curso Nestlé, já em sua 56ª edição, ocupa espaço importante no processo


Editorial de educação continuada do pediatra. Como nos anos anteriores, este encontro
oferece uma programação adequada às necessidades do profissional, de forma
bastante abrangente. Por isso, representa um das mais significativas oportunidades
de atualização dos pediatras brasileiros.

Por outro lado, não poderíamos deixar de destacar o apoio da Nestlé –


Nutrição Infantil para o engrandecimento da pediatria em nosso país e de nossa
Sociedade. Iniciativas como a realização deste curso, além da participação através
de patrocínio em outros eventos regionais e de especialidades, só corroboram esta
afirmação. Essa parceria, sempre ética e respeitosa, tem permitido implementar
ações em benefício do pediatra e das crianças e adolescentes brasileiros. Tudo
isso sem impor condições ou ferir nossa liberdade de atuação.

Nesta oportunidade, agradecemos aos demais membros da Diretoria da


Sociedade Brasileira de Pediatria, à Sociedade Paranaense de Pediatria e aos
departamentos de pediatria da Universidade Federal do Paraná, Pontifícia
Universidade Católica, Faculdade Evangélica de Medicina de Curitiba, Hospital
Universitário Regional do Norte do Paraná e Fundação Universidade Estadual de
Maringá que se empenharam na organização deste encontro, participando
ativamente na elaboração deste programa.

Especiais agradecimentos aos professores, que atenderam prontamente o convite


da Comissão Organizadora a participar, mesmo que com sacrifício pessoal. A
presença de vocês garante o sucesso deste encontro científico.

Um grande abraço a todos com os votos de um feliz Curso. Esperamos que


todos adquiram aqui os conhecimentos que vieram buscar, e aproveitem para se
confraternizar com os companheiros de profissão.

Dr. Lincoln Marcelo


Silveira Freire
Presidente da Sociedade
Brasileira de Pediatria

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 5


6 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA
ÍNDICE
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

DIRETORIA SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA


E SOCIEDADE PARANAENSE DE PEDIATRIA ................................................................................................... 9

PROGRAMA CIENTÍFICO ......................................................................................................................... 11

TITULAÇÃO DOS PROFESSORES ............................................................................................................. 17

RESUMOS ................................................................................................................................................ 21

SEGURANÇA INFANTIL
Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes e Violência
na Infância e Adolescência ......................................................................................... 23
Conduta nos Acidentes por Animais Peçonhentos ........................................................... 25
Enganos e Mitos no Atendimento Clínico de Vítimas de Acidentes e Violências ................. 32

OTORRINOLARINGOLOGIA PEDIÁTRICA
Deficiência Auditiva .................................................................................................... 39
Manejo do Respirador Bucal ....................................................................................... 40
Estomatites na Infância ................................................................................................ 43
Diagnóstico e Tratamento das Amigdalites Agudas ......................................................... 44
Índice
CUIDADOS PRIMÁRIOS
A Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância ............................................... 45
Situação da Saúde da Criança Brasileira ..................................................................... 49
Experiências dos Comitês Municipais de Combate à Mortalidade Infantil ......................... 55

NEFROLOGIA
Refluxo Vésico-ureteral: Atualização ............................................................................... 57
Glomerulopatias na Infância ........................................................................................ 60
Diagnóstico e Manejo das Hematúrias ......................................................................... 61

ADOLESCÊNCIA
Adolescência, Violência e Drogas ................................................................................ 67
Doenças Psicossomáticas ............................................................................................. 70
Prevenção da Gravidez na Adolescência - Uma Visão Interdisciplinar ............................... 73

TERAPIA INTENSIVA
Choque Séptico na Criança ........................................................................................ 79
Traumatismo Crânio-Encefálico ...................................................................................... 84
Insuficiência Respiratória Aguda ................................................................................... 89

ALERGIA
Asma no Lactente ....................................................................................................... 93
Prevenção das Doenças Alérgicas ................................................................................ 94
Rinite Alérgica ........................................................................................................... 95

ONCO HEMATOLOGIA
Emergências Oncológicas ........................................................................................... 97
Anemias .................................................................................................................. 101
A Criança com Púrpura ............................................................................................ 105

PRÁTICA PEDIÁTRICA - A visão do especialista


Noções de Oftalmologia para Pediatras ..................................................................... 109
Problemas Ortopédicos Comuns ................................................................................. 112
Síndrome da Respiração Oral .................................................................................... 113

CARDIOLOGIA E REUMATOLOGIA
Artrites Agudas ........................................................................................................ 121
Febre Reumática ....................................................................................................... 123
Avanços no Tratamento da Insuficiência Cardíaca Congestiva ....................................... 129

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 7


ÍNDICE
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

DEFESA PROFISSIONAL
O Pediatra e os Convênios ....................................................................................... 133
Cooperativas e Centrais de Convênios ....................................................................... 135
“Managed Care” ..................................................................................................... 138
A SBP e a Defesa Profissional ................................................................................... 139

EMERGÊNCIAS
Asma Aguda na Infância .......................................................................................... 143
Estado de Mal Epilético ............................................................................................ 148
Trauma Pediátrico ..................................................................................................... 152
Cetoacidose Diabética .............................................................................................. 163

PRÁTICA PEDIÁTRICA
Principais Dermatoses na Infância ............................................................................... 169
Abordagem da Cefaléia em Pediatria ........................................................................ 173
Dor Abdominal Recorrente ......................................................................................... 176
Problemas de Crescimento ......................................................................................... 180

ALEITAMENTO MATERNO
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e o Aleitamento Materno ............................... 185
O Aleitamento Materno e os Medicamentos ................................................................ 189
O Aleitamento Materno e a Prematuridade ................................................................. 192

NEUROLOGIA
Convulsões no Período Neonatal ............................................................................... 197
Distúrbios Paroxísticos de Origem não Epiléptica .......................................................... 199
Distúrbios do Déficit da Atenção - Hiperatividade: (DDAH) ............................................ 202

PNEUMOLOGIA
Tuberculose .............................................................................................................. 207
Pneumonias de Evolução Prolongada .......................................................................... 210
Bronquiolite Viral Aguda (BVA) ................................................................................... 213

GASTROENTEROLOGIA
Refluxo Gastroesofágico: Diagnóstico e Tratamento ....................................................... 217
Constipação na Criança ........................................................................................... 220
Avanços no Tratamento e Prevenção da Diarréia Aguda ............................................... 223

NUTRIÇÃO
Desnutrição .............................................................................................................. 227
Obesidade na Infância ............................................................................................. 232
Suplementação com Ferro e Vitamina A ...................................................................... 233
Anemia na Prematuridade ......................................................................................... 236

INFECTOLOGIA
Calendário Vacinal ................................................................................................... 241
Tratamento da Infecção pelo HIV em Crianças ............................................................ 243
Meningites Bacterianas ............................................................................................. 245

NEONATOLOGIA
Hiperbilirrubinemia do Recém-Nascido: Manejo ........................................................... 247
Anemias no Período Neonatal ................................................................................... 256
Dor no Recém Nascido ............................................................................................ 257
Diagnóstico Diferencial de Distress Respiratório no Recém-Nascido ................................. 259

8 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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Diretorias SOCIEDADE BRASILEIRA DE PEDIATRIA


(Triênio 1998 / 2000)

DR. LINCOLN MARCELO SILVEIRA FREIRE


Presidente
DR. PAULO ROBERTO ANTONACCI CARVALHO
Diretor do Curso de Reanimação Pediátrica

DR. CLÁUDIO LEONE DR. JOÃO DE MELO RÉGIS FILHO


1º Vice-Presidente Diretor de Programas Sociais

DRA. LUCIANA RODRIGUES SILVA DR. JEFFERSON PEDRO PIVA


2ª Vice-Presidente Editor do Jornal de Pediatria

DR. RICARDO DO RÊGO BARROS DRA. SARA LOPES VALENTIN


Secretário Geral Diretora de Benefícios

DRA. WÂNIA MARA DEL FÁVERO G. DA CRUZ DR. JOÃO CORIOLANO RÊGO BARROS
1ª Secretária Diretor do PRONAP

DR. EVANDRO ALVES DO PRADO DRA. ELIANE DE SOUZA


2º Secretário Diretora de Defesa Profissional

DR. FERNANDO ANTÔNIO S. WERNECK CORTES DR. MÁRIO SANTORO JÚNIOR


3º Secretário Diretor de Projetos Especiais

DRA. BLANCA ELENA RIOS GOMES BICA DR. HÉLCIO VILAÇA SIMÕES
1ª Tesoureira Diretor do CEXTEP

DRA. CONCEIÇÃO APARECIDA DE MATTOS SEGRE


DR. MILTON GENES
2º Tesoureiro
DR. NAVANTINO ALVES FILHO
Diretoria de Intercâmbio Internacional

DRA. ANA MARIA SEGURO MEYGE DR. JOSÉ HUGO LINS PESSOA
3ª Tesoureira
Diretor do GECHP

DR. EDUARDO DA SILVA VAZ DR. PEDRO CELINY RAMOS GARCIA


Diretor de Patrimônio Diretor de Relações Conesul

DR. DIRCEU SOLÉ DRA. MARIA YEDA SISO DE OLIVEIRA


Diretor de Cursos e Eventos DR. FERNANDO JOSÉ DE NÓBREGA
DR. REINALDO DE MENEZES MARTINS
DR. NELSON AUGUSTO ROSÁRIO FILHO Conselho Fiscal
Diretor Geral dos Departamentos Científicos
DRA. ELIANE BUARQUE DE FREITAS MACHADO
DR. RENATO SOIBELMANN PROCIANOY DR. PLÍNIO JOSÉ CAVALCANTE MONTEIRO
Diretor de Publicações DR. MAURÍCIO DIAS CARDOSO
DRA. NILZETE LIBERATO BRESOLIN
DRA. ALZIRA HELENA GOMES LOBO DR. ARMANDO JOSÉ FRANCO TEIXEIRA
Diretora do Curso de Reanimação Neonatal Comissão de Sindicância

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 9


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Diretorias
SOCIEDADE PARANAENSE DE PEDIATRIA
(Biênio 1998 / 1999)

DR. JOÃO GILBERTO SPROTTE MIRA


Presidente
DRA. REGINA BAGATIN
1ª Secretária

DR. DALTRO ZUNINO DR. CARLOS FERRI


1º Vice-Presidente 2º Secretário

DR. ALVARO LUIZ OLIVEIRA DR. DONIZETTI D. G. FILHO


2º Vice-Presidente 1º Tesoureiro

DR. GILBERTO SACILOTO DR. LUIZ ERNESTO PUJOL


3º Vice-Presidente 2º Tesoureiro

DR. LÚCIO ESTEVES DR. WILMAR MENDONÇA GUIMARÃES


4º Vice-Presidente Presidente de Honra

DRA. RAQUEL THOMAL


Secretária Geral

10 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


PROGRAMA CIENTÍFICO
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

11/10/99- 2ª feira 11/10/99- 2ª feira


MANHÃ
MANHÃ TARDE
TARDE
08h00 Mesa Redonda 14h00 Mesa Redonda
às 09h00 Segurança Infantil às 15h00 Cuidados Primários
• Coordenador: Wilson Maciel (SP) • Coordenador: Cláudio Leone (SP)
AIDIPI
Campanha Nacional de
Antônio Carvalho da Paixão (SE)
Prevenção de Acidentes
José Américo de Campos (MG) Programa de Redução
da Mortalidade Infantil
Conduta em Acidentes com Animais João Yunes (DF)
Peçonhentos
José Sabino de Oliveira (MG) Experiências dos Comitês
Municipais de Combate
Principais Enganos e Mitos à Mortalidade Infantil
no Atendimento Clínico de Vítimas Denise Siqueira de Carvalho (PR)
de Acidentes e Violência
Danilo Blank (RS)
09h00 Colóquio 15h00 Colóquio
às 10h00 Segurança Infantil às 16h00
Cuidados Primários
• Coordenador:Wilson Maciel (SP) • Coordenador: Cláudio Leone (SP)
Participantes: Participantes:
José Américo de Campos (MG) Antônio Carvalho da Paixão (SE)
José Sabino de Oliveira (MG) João Yunes (DF)
Danilo Blank (RS) Denise Siqueira de Carvalho (PR)
10h15 Mesa Redonda 16h15 Mesa Redonda
às 11h15 Otorrinolaringologia Pediátrica às 17h15 Nefrologia
• Coordenador: •Coordenador:
João de Melo Régis Filho (PE) José Maria Penido Silva (MG)
Deficiência Auditiva Avanços em Refluxo
Manoel de Nóbrega (SP) Vésico-ureteral
Manejo do Respirador Bucal Luiz Afonso Henrique Mariz (RJ)
Marcos Mocellin (PR) Glomerulopatias
Lesões da Cavidade Oral na Prática Diária
Luc Louis Maurice Weckx (SP) Júlio Toporovski (SP)
Diagnóstico e Conduta Diagnóstico e Manejo
nas Amigdalites Agudas das Hematúrias
João Gilberto Sprotte Mira (PR) Daltro Zunino (PR)

11h15 Colóquio 17h15 Colóquio


às 12h15 Otorrinolaringologia Pediátrica às 18h15 Nefrologia
• Coordenador: • Coordenador:
João de Melo Régis Filho (PE) José Maria Penido Silva (MG)
Participantes: Participantes:
Manoel de Nóbrega (SP) Luiz Afonso Henrique Mariz (RJ)
Marcos Mocellin (PR) Júlio Toporovski (SP)
Luc Louis Maurice Weckx (SP) Daltro Zunino (PR)
João Gilberto Sprotte Mira (PR)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 11


PROGRAMA CIENTÍFICO
•••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

12/10/99- 3ª feira 12/10/99- 3ª feira


MANHÃ
MANHÃ TARDE
TARDE
08h00 Mesa Redonda 14h00 Mesa Redonda
às 09h00 Adolescência às 15h00 Alergia
• Coordenador:
• Coordenador:
Mário Santoro Júnior (SP)
Darci Vieira da Silva Bonetto (PR)
Violência e Drogas Asma no lactente
Fernando Antônio Guimarães Ramos (MA) Maria Cecília Aguiar (RJ)

Doenças Psicossomáticas Prevenção das doenças alérgicas


Maria de Fátima Goulart Coutinho (RJ) Charles K. Naspitz (SP)

Prevenção da Gravidez Rinite alérgica: Manejo


Paulo César Pinho Ribeiro (MG) Francisco José Passos Soares (AL)

09h00 Colóquio 15h00 Colóquio


às 10h00 Adolescência às 16h00 Alergia
• Coordenador: • Coordenador:
Darci Vieira da Silva Bonetto (PR) Mário Santoro Júnior (SP)
Participantes: Participantes:
Fernando Antônio Guimarães Ramos (MA) Maria Cecília Aguiar (RJ)
Maria de Fátima Goulart Coutinho (RJ) Charles K. Naspitz (SP)
Paulo César Pinho Ribeiro (MG) Francisco José Passos Soares (AL)

10h15 Mesa Redonda 16h15 Mesa Redonda


às 11h15 Terapia Intensiva às 17h15 Onco Hematologia
• Coordenador: • Coordenador:
Izrail Cat (PR) Antônio Sérgio Petrilli (SP)

Choque séptico Emergências em Oncologia


Pedro Celiny Ramos Garcia (RS) Mara Albonei Dudeque Pianovski (PR)
A Criança com Anemia
Traumatismo Crânio-Encefálico
Francisco de Paula Ramos Pedrosa (PE)
Sérgio Augusto Cabral (RJ)
A Criança com Púrpura
Insuficiência Respiratória Aguda Sima Esther Ferman (RJ)
José Eduardo Carreiro (PR)

11h15 Colóquio 17h15 Colóquio


às 12h15 Terapia Intensiva às 18h15 Onco Hematologia
• Coordenador: Izrail Cat (PR) • Coordenador:
Antônio Sérgio Petrilli (SP)
Participantes:
Pedro Celiny Ramos Garcia (RS) Participantes:
Sérgio Augusto Cabral (RJ) Mara Albonei Dudeque Pianovski (PR)
José Eduardo Carreiro (PR) Francisco de Paula Ramos Pedrosa (PE)
Sima Esther Ferman (RJ)

12 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


PROGRAMA CIENTÍFICO
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

13/10/99- 4ª feira 13/10/99- 4ª feira


MANHÃ
MANHÃ TARDE
TARDE
08h00 Mesa Redonda 14h00 Mesa Redonda
às 09h00 Prática Pediátrica – A visão do especialista às 15h00 Defesa Profissional
• Coordenador: • Coordenador:
Antônio Márcio Junqueira Lisboa (DF) Lincoln Marcelo Silveira Freire (MG)
O Pediatra e os Convênios
Problemas Oftalmológicos mais Comuns
Milton Macedo de Jesus (PR)
Maurício Brik (PR)
Cooperativas e Centrais de Convênios
Problemas Ortopédicos mais Comuns Arnaldo Pineschi de Azeredo Coutinho (RJ)
Luiz Antônio M. Cunha (PR) “Managed Care” - Eduardo da Silva Vaz (RJ)
Síndrome de Respiração Oral A SBP e a Defesa Profissional
Floriano Peixoto Gomes de Sá (PR) Eliane de Souza (MG)

09h00 Colóquio 15h00 Colóquio


às 10h00 às 16h00 Defesa Profissional
Prática Pediátrica – A visão do especialista
• Coordenador: • Coordenador:
Antônio Márcio Junqueira Lisboa (DF) Lincoln Marcelo Silveira Freire (MG)
Participantes: Participantes:
Maurício Brik (PR) Milton Macedo de Jesus (PR)
Luiz Antônio M. Cunha (PR) Arnaldo Pineschi de Azeredo Coutinho (RJ)
Floriano Peixoto Gomes de Sá (PR) Eduardo da Silva Vaz (RJ)
Eliane de Souza (MG)

10h15 Mesa Redonda 16h15 Mesa Redonda


às 11h15 Cardiologia e Reumatologia às 17h15 Emergências
• Coordenador: • Coordenador:
Maurício Laerte Silva (SC) Aramis Antonio Lopes Neto (RJ)
Diagnóstico Diferencial das Artrites Estado de Mal asmático
Agudas Mário Roberto Hirschheimer (SP)
Maria Odete Esteves Hilário (SP) Estado de Mal convulsivo
Doença Reumática Sérgio Antonio Antoniuk (PR)
Margarida de Fátima Fernandes Acidentes Domésticos
Carvalho (PR) Zuleide Muniz Alves (BA)
Avanços no Tratamento da Insuficiência Cetoacidose Diabética
Cardíaca Congestiva Romolo Sandrini Neto (PR)
Antônio Carlos de Camargo Carvalho (SP)
11h15 Colóquio 17h15 Colóquio
às 12h15 Cardiologia e Reumatologia às 18h15 Emergências
• Coordenador: • Coordenador:
Maurício Laerte Silva (SC) Aramis Antonio Lopes Neto (RJ)
Participantes: Participantes:
Maria Odete Esteves Hilário (SP) Mário Roberto Hirschheimer (SP)
Margarida de Fátima Fernandes Sérgio Antonio Antoniuk (PR)
Carvalho (PR) Zuleide Muniz Alves (BA)
Antônio Carlos de Camargo Carvalho (SP) Romolo Sandrini Neto (PR)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 13


PROGRAMA CIENTÍFICO
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14/10/99- 5ª feira 14/10/99- 5ª feira


MANHÃ
MANHÃ TARDE
TARDE
08h00 Mesa Redonda 14h00 Mesa Redonda
às 09h00 Prática Pediátrica às 15h00 Neurologia
• Coordenador: • Coordenador:
Nelson de Carvalho Assis Barros (BA) Christovão de Castro Xavier (MG)
Principais Dermatoses na Infância Convulsões no Período Neonatal
Leide Parolin Marinoni (PR) Mitsuru Miyaki (PR)
Cefaléias Distúrbios Paroxísticos de Natureza
Alexandra Prufer de Queiróz C. Araújo (RJ) não Epiléptica - Fernando Kok (SP)
Dor Abdominal Recorrente Distúrbios do Déficit de Atenção
Dioclécio Campos Junior (DF) e Hiperatividade
Problemas do Crescimento José Luiz Dias Gherpelli (SP)
Marco Antonio Barbieri (SP)
09h00 Colóquio Colóquio
às 10h00 15h00
Prática Pediátrica às 16h00 Neurologia
• Coordenador: • Coordenador:
Nelson de Carvalho Assis Barros (BA) Christovão de Castro Xavier (MG)
Participantes: Participantes:
Leide Parolin Marinoni (PR) Mitsuru Miyaki (PR)
Alexandra Prufer de Queiróz C. Araújo (RJ) Fernando Kok (SP)
Dioclécio Campos Junior (DF) José Luiz Dias Gherpelli (SP)
Marco Antonio Barbieri (SP)

10h15 Mesa Redonda 16h15 Mesa Redonda


às 11h15 Aleitamento Materno às 17h15 Pneumologia
• Coordenador: • Coordenador:
Anamaria Cavalcante e Silva (CE) Norberto Ludwig (SC)
A SBP e o Aleitamento materno A Tuberculose na Atualidade
Sônia Maria Salviano Matos de Alencar (DF) Clemax Couto Sant’Anna (RJ)
O Aleitamento Materno e os Medicamentos Pneumonia de Evolução Prolongada
Antônio Carlos Bagatin (PR) Vitor Costa Palazzo (PR)
O Aleitamento Materno e a Prematuridade Bronquiolites
Ângela Sara Jamusse de Brito (PR) José Dirceu Ribeiro (SP)

11h15 Colóquio 17h15 Colóquio


às 12h15 Aleitamento Materno às 18h15 Pneumologia
• Coordenador: • Coordenador:
Anamaria Cavalcante e Silva (CE) Norberto Ludwig (SC)
Participantes:
Participantes:
Sônia Maria Salviano Matos de Alencar (DF)
Clemax Couto Sant’Anna (RJ)
Antônio Carlos Bagatin (PR)
Vitor Costa Palazzo (PR)
Ângela Sara Jamusse de Brito (PR)
José Dirceu Ribeiro (SP)

14 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


PROGRAMA CIENTÍFICO
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15/10/99- 6ª feira 15/10/99- 6ª feira


MANHÃ
MANHÃ TARDE
TARDE
08h00 Mesa Redonda 14h00 Mesa Redonda
às 09h00 Gastroenterologia às 15h00
Infectologia
• Coordenador:
• Coordenador:
Thêmis R. Silveira (RS)
Eduardo da Silva Carvalho (SP)
Refluxo Gastroesofágico:
Diagnóstico e Tratamento Calendário Vacinal Atual
Rosa Helena Porto Gusmão (PA) Reinaldo Menezes Martins (RJ)
Obstipação Intestinal Terapêutica Atual da AIDS
Mauro Batista de Morais (SP) Regina Célia Succi (SP)
Avanços no Tratamento da Diarréia Meningite Bacteriana
Aguda - Aristides Schier da Cruz (PR) Calil Kairalla Farhat (SP)

09h00 Colóquio 15h00 Colóquio


às 10h00 Gastroenterologia às 16h00 Infectologia
• Coordenador: • Coordenador:
Thêmis R. Silveira (RS) Eduardo da Silva Carvalho (SP)
Participantes: Participantes:
Rosa Helena Porto Gusmão (PA) Reinaldo de Menezes Martins (RJ)
Mauro Batista de Morais (SP) Regina Célia Succi (SP)
Aristides Schier da Cruz (PR) Calil Kairalla Farhat (SP)
Heliane Brant Machado Freire (MG)

10h15 Mesa Redonda 16h15 Mesa Redonda


às 11h15 Nutrição às 17h15 Neonatologia
• Coordenador: Ennio Leão (MG)
• Coordenador:
Desnutrição Benjamin Israel Kopelman (SP)
Fernando José de Nóbrega (SP) Icterícia: Manejo
Obesidade Navantino Alves Filho (MG)
Renato Junger de Oliveira (PB) Anemias no Período Neonatal
Flávio Adolfo Costa Vaz (SP)
Suplementação com Vitamina A
e Ferro Dor no Recém Nascido
Suzana de Souza Queiroz (SP) Renato Soibelmann Procianoy (RS)
Diagnóstico Diferencial do Desconforto
Anemia no Prematuro Respiratório
Luis Eduardo Vaz Miranda (RJ) Wilmar Mendonça Guimarães (PR)
11h15 Colóquio 17h15 Colóquio
às 12h15 às 18h15 Neonatologia
Nutrição
• Coordenador: Ennio Leão (MG) • Coordenador:
Benjamin Israel Kopelman (SP)
Participantes:
Fernando José de Nóbrega (SP) Participantes:
Renato Junger de Oliveira (PB) Navantino Alves Filho (MG)
Suzana de Souza Queiroz (SP) Flávio Adolfo Costa Vaz (SP)
Luis Eduardo Vaz Miranda (RJ) Renato Soibelmann Procianoy (RS)
Wilmar Mendonça Guimarães (PR)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 15


16 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA
Professores
PROFESSORES
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Alexandra Prufer de Queiroz C. Araújo Benjamin Israel Kopelman


Professora de Neuropediatria da UFRJ Professor Titular do Departamento de Pediatria da UNIFESP/EPM
Mestrado em Pediatria – UFRJ Coordenador da Pós-Graduação em Pediatria da UNIFESP/EPM
Doutorado em Neurologia – UFF
Membro do Departamento de Neuropediatria Calil Kairalla Farhat
da Sociedade Brasileira Professor Titular de Pediatria UNIFESP/EPM
de Pediatria Professor Titular da Faculdade de Medicina de Marília
Membro do Comitê de Neuropediatria da Sociedade
de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro Charles K. Naspitz
Professor Titular da Disciplina de Alergia, Imunologia Clínica
Anamaria Cavalcante e Silva e Reumatologia do Departamento de Pediatria da
Médica Pediatra UNIFESP/Escola Paulista de Medicina
Mestre em Saúde Pública pela UFC
Christovão de Castro Xavier
Diretora do Hospital Infantil Albert Sabin da Secretaria de Saúde
Neurologista Infantil do Hospital Felício Rocho, do Centro Geral
do Ceará Professora do Curso de Pós-Graduação em Saúde da Família
da Universidade de Fortaleza. de Pediatria e do IPSEMG
Presidente da ABENEP – Associação Brasileira de Neurologia
Angela Sara Jamusse de Brito e Psiquiatria Infantil – Capítulo MG
Professor Adjunto do Departamento Materno Infantil da Universidade Membro do Departamento de Neurologia da Sociedade Brasileira
Estadual de Londrina de Pediatria
Neonatologista
Cláudio Leone
Antonio Carlos Bagatin Professor Associado do Departamento de Pediatria da FMUSP
Professor Assistente do Departamento de Pediatria da UFPR 1º Vice-Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Chefe da Unidade de Neonatologia do Hospital de Clínicas da UFPR Membro do Departamento de Cuidados Primários
Mestre em Pediatria pela UFPR da Sociedade Brasileira de Pediatria
Antônio Carlos de Camargo Carvalho
Clemax do Couto Sant’anna
Professor Titular de Cardiologia e Chefe do Setor de Cardiologia Pediátrica
Professor Adjunto do Departamento de Pediatria da Faculdade
do Departamento de Pediatria da UNIFESP/EPM
de Medicina da UFRJ
Antônio Carvalho da Paixão Membro do Comitê de Doenças do Aparelho Respiratório da Sociedade
Mestrado e doutorado em Pediatria – USP / Ribeirão Preto de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro
Professor Adjunto – Doutor de Pediatria – Universidade Federal de Sergipe
Membro do Departamento Científico de Cuidados Primários da Sociedade Daltro Zunino
Brasileira de Pediatria Professor colaborador da Faculdade Evangélica de Medicina do Paraná
Médico do Serviço de Nefrologia e Pediatria do Hospital Universitário
Antônio Márcio Junqueira Lisboa Evangélico de Curitiba
Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Ex-Presidente da Sociedade de Pediatria de Brasília Danilo Blank
Professor Titular da Universidade de Brasília Professor Adjunto do Departamento de Pediatria da Faculdade de
Ex-Presidente da Academia de Medicina de Brasília Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Membro Honorário da Academia Nacional de Medicina Membro do Departamento Científico de Segurança da Criança
Membro do Conselho Acadêmico da Sociedade Brasileira de Pediatria e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Ex-Presidente da Sociedade Latino Americana de Perinatologia
Darci Vieira da Silva Bonetto
Antônio Sérgio Petrilli Professora de Pediatria da Faculdade de Medicina PUC/PR
Médico Oncologista Pediátrico Presidente do Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira
Professor Adjunto do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Pediatria.
de São Paulo – Escola Paulista de Medicina UNIFESP/EPM Especialista em Adolescência
Diretor Geral do Instituto de Oncologia Pediátrica do Grupo de Apoio Coordenadora do Curso de Pós Graduação - Adolescência - PUC/PR
ao Adolescente e à Criança com Câncer-UNIFESP/EPM
Denise Siqueira de Carvalho
Aramis Antônio Lopes Neto
Médica Epidemiologista da Secretaria Municipal de Saúde de Curitiba
Diretor de Defesa das Direitos da Criança e do Adolescente
Professora Assistente do Departamento de Saúde Comunitária da
da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro
Universidade Federal do Paraná
Membro do Departamento de Segurança Infantil da Sociedade
Membro do Comitê Pró Vida de Prevenção da Mortalidade
Brasileira de Pediatria
Diretor de Divisão Médica do Hospital Municipal N. Srª do Loreto-RJ Materno Infantil de Curitiba

Aristides Schier da Cruz Dioclécio Campos Júnior


Professor adjunto Doutor do Departamento de Pediatria da Faculdade Professor Titular de Pediatria da Universidade de Brasília
Evangélica de Medicina do Paraná - Chefe do Serviço de Pediatria do Hospital Universitário – UnB
Membro do Departamento de Gastroenterologia da SBP Presidente do Departamento Científico de Pediatria Ambulatorial
Presidente do Departamento de Gastroenterologia da SPP da Sociedade Brasileira de Pediatria

Eduardo da Silva Vaz


Arnaldo Pineschi de Azeredo Coutinho Diretor da Sociedade Brasileira de Pediatria
Presidente do Departamento de Defesa Profissional Vice-Presidente da AMB
da Sociedade Brasileira de Pediatria Membro do Departamento de Defesa Profissional
Conselheiro do Conselho Federal de Medicina da Sociedade Brasileira de Pediatria
Conselheiro do Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro Conselheiro do CRMRJ

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 17


PROFESSORES
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Eduardo da Silva Carvalho João de Melo Régis


Professor Adjunto Doutor da Disciplina de Infectologia Professor Adjunto lV e Regente da Disciplina de Doenças Infecciosas
Pediátrica da UNIFESP/EPM e Parasitárias da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade
Presidente do Departamento de Infectologia de Pernambuco – UPE;
da Sociedade Brasileira de Pediatria Membro do Departamento de Infectologia Pediátrica da Sociedade
Brasileira de Pediatria.
Eliane de Souza
Diretora de Defesa Profissional da Sociedade Brasileira de Pediatria João Gilberto Sprote Mira
Vice-Presidente da Federação Nacional dos Médicos Presidente da Sociedade Paranaense de Pediatria
de Minas Gerais/Espírito Santo Professor Adjunto Cadeira Pediatria Faculdade de Medicina da UFPR
Conselheira do Conselho Regional de Medicina/MG Professor Responsável pelo Setor de Otorrino Pediatria
Ex-Presidente do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais Professor Responsável pelo Departamento de Oftalmo Otorrino
da Faculdade de Medicina da UFPR
Ennio Leão
João Yunes
Membro do Conselho Acadêmico da Sociedade Brasileira de Pediatria
Secretário de Políticas de Saúde do Ministério da Saúde
Professor Emérito de Pediatria da UFMG
Professor da Faculdade de Saúde Pública de São Paulo
Fernando Antônio Guimarães Ramos
José Américo de Campos
Prof. Doutor em Pediatria pela UFRJ (Área da Adolescência)
Presidente do Departamento Científico de Segurança da Criança
Professor Adjunto do Departamento de Medicina III
e do Adolescente da Sociedade Brasileira de Pediatria
da UFMA (Área da Adolescência) Presidente do Departamento Científico de Segurança da Criança
Médico de Adolescência – Título de Habilitação conferido pela SBP/AMB e do Adolescente da Sociedade Mineira de Pediatria
Membro do Departamento Científico de Adolescência da Sociedade
Brasileira de Pediatria José Dirceu Ribeiro
Presidente da Sociedade de Puericultura e Pediatria do Maranhão Mestre Doutor em Pediatria.
Membro Titular do Conselho Estadual de Direitos da Criança Coordenador da Pós-Graduação em Pediatria – FCM – UNICAMP.
e do Adolescente
José Eduardo Carreiro
Chefe do Departamento de Pediatria da UFMA.
Mestre em Pediatria
Fernando José de Nóbrega Professor Assistente do Departamento de Pediatria da UFPR
Professor Titular do Departamento de Pediatria da Universidade Federal de Supervisor da UTI do Hospital de Clínicas da UFPR
São Paulo – Escola Paulista de Medicina – UNIFESP/EPM (aposentado) José Luiz Dias Gherpelli
Diretor Técnico do Departamento de Saúde do Núcleo de Nutrição do Livre Docente em Neurologia Infantil pela FMUSP
Centro de Referência da Saúde da Mulher e de Nutrição, Alimentação Presidente do Departamento de Neurologia da Sociedade Brasileira
e Desenvolvimento Infantil da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo de Pediatria
Presidente do Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira Médico do Serviço de Neurologia Infantil do Hospital das Clínicas FMUSP
de Pediatria.
Diretor Executivo da International Society of Pediatric Nutrition José Maria Penido Silva
Vice-Presidente da Sociedade Mineira de Pediatria
Fernando Kok Coordenador da Residência Médica de Nefrologia do Hospital
Médico Assistente do Serviço de Neurologia Infantil do HC – FMUSP. das Clínicas da UFMG
Doutor em Neurologia pela FMUSP. Presidente do Departamento Científico de Nefrologia Pediátrica
Pós Doutorado em Neurogenética pela Universidade de Johns Hopkins USA da Sociedade Brasileira de Pediatria
Flávio Adolfo Costa Vaz Professor Assistente de Pediatria da UFMG
Professor Titular de Pediatria da Faculdade de Medicina da Universidade Coordenador da Unidade de Nefrologia Pediátrica do Hospital
de São Paulo das Clínicas da UFMG
Chefe do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina José Sabino de Oliveira
da Universidade de São Paulo Professor Assistente do Departamento de Pediatria da UFMG
Floriano Peixoto Gomes de Sá Intensivista e Coordenador do Neocenter
Ex-professor de Fisiologia Oral da UFPR Intensivista do Hospital Governador Israel Pinheiro – IPSEMG
Especialista em Ortodontia e Ortopedia Facial Julio Toporovski
Fundador e Ex-presidente da Associação Paranaense de Ortopedia Maxilar Professor Titular de Pediatria da Faculdade de Ciências Médicas
Ex-presidente da Associação Brasileira de Odontologia – seção do PR da Santa Casa de São Paulo
Autor do Livro “As Bases Fisiológicas da Ortopedia Maxilar”
Coordenador da Unidade de Nefrologia Infantil da
(2ª Edição – Junho de 1999)
Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
Francisco de Paula Ramos Pedrosa Presidente do Departamento de Nefrologia da Sociedade
Chefe do Serviço de Oncohematologia Pediátrico do Instituto Materno de Pediatria de São Paulo
Infantil de Pernambuco – IMIP e do Centro de Hematologia e Oncologia Presidente do Departamento de Nefrologia Infantil
Pediátrica – CEHOPE da Sociedade Brasileira de Nefrologia

Francisco José Passos Soares Leide Parolin Marinoni


Doutor em Pediatria pela UNIFESP Professor Adjunto do Departamento de Pediatria – UFPR
Professor Adjunto do Departamento de Tocoginecologia e Pediatria Responsável pelo Serviço de Dermatologia Pediátrica do Departamento
da Universidade Federal de Alagoas - UFAL. de Pediatria no Hospital de Clínicas
Membro do Departamento de Alergia e Imunologia Membro do Departamento de Dermatologia da Sociedade Brasileira de
da Sociedade Brasileira de Pediatria. Pediatria e Presidente do Comitê da Sociedade Paranaense de Pediatria

Heliane Brant Machado Freire Lincoln Marcelo Silveira Freire


Professor Adjunto – Doutor do Departamento de Pediatria da UFMG Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Membro do Departamento de Infectologia da Sociedade Brasileira Vice-Presidente da Associação Médica Brasileira
de Pediatria
Luc Weckx
Izrail Cat Livre-Docente em Otorrinolaringologia
Responsável pela UTI Pediátrica do Departamento da UFPR Chefe da Disciplina em Pediatria UNIFESP – EPM
Prof. Titular do Departamento de Pediatria da UFPR Presidente da Sociedade Brasileira de Otorrinolaringologia (SBORL)

18 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


PROFESSORES
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Luis Eduardo Vaz Miranda Maurício Laerte Silva


Diretor Médico do Centro de Prematuros do Estado do Rio de Janeiro Cardiologista Pediátrico do Hospital Infantil Joana de Gusmão
Membro do Comitê de Perinatologia da Sociedade de Pediatria do Estado e do Hospital Universitário da UFSC – Florianópolis
do Rio de Janeiro Membro e Secretário do Departamento de Cardiologia da SBP
Mestrando em Ciências Médicas da UFSC – Florianópolis
Luiz Afonso Henrique Mariz Ex Fellow em Pesquisa Perinatal do NIH – Bethesda, Maryland - USA
Professor Assistente do Departamento de Pediatria da Faculdade
de Medicina da UFRJ Mauro Batista de Morais
Diretor do Instituto de Puericultura e Pediatria Martagão Gesteira Professor Adjunto Doutor e Chefe da Disciplina de Gastroenterologia
Membro do Departamento de Nefrologia da Sociedade Pediátrica da Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista
de Medicina
Brasileira de Pediatria
Membro do Comitê de Nefrologia da Sociedade de Pediatria Milton Macedo de Jesus
do Estado do Rio de Janeiro Membro do Departamento de Defesa Profissional
da Sociedade Brasileira de Pediatria
Luiz Antonio M. Cunha Vice-diretor do Departamento de Convênios da Associação
Chefe do Serviço de Ortopedia Pediátrica do Hospital Infantil e Hospital Médica de Londrina
de Clínicas da UFPR
Mestre em Cirurgia Pediátrica pela UFPR Mitsuru Miyaki
Doutor pela Escola Paulista de Medicina Professor Titular do Departamento de Pediatria da UFPR
Chefe da UTI Neonatal do Hospital de Clínicas da UFPR
Manoel de Nóbrega
Mestre em Otorrino – UNIFESP/EPM Navantino Alves Filho
Presidente do Departamento de Otorrinolaringologia da Sociedade Brasileira Professor Titular de Pediatria e Regente de Neonatologia da Faculdade
de Pediatria - Triênio 1998 - 2000 de Ciências Médicas de Minas Gerais

Mara Albonei Dudeque Pianovski Nelson de Carvalho Assis Barros


Mestre em Pediatria Professor Titular de Pediatria da Escola Baiana de Medicina
e Saúde Pública.
Professora Assistente Responsável pelo Serviço de Hematopediatria
Presidente do Conselho Acadêmico da Sociedade Brasileira de Pediatria.
do Hospital de Clínicas da UFPR
Norberto Ludwig
Marco Antonio Barbieri
Médico Pneumologista Infantil do Hospital Joana de Gusmão
Professor Titular do Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade Presidente do Comitê de Pneumologia da Sociedade Catarinense
de Medicina de Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo de Pediatria
Marcos Mocellin Coordenador do Programa de Fibrose Cística da Secretaria da Saúde
Professor Titular e Chefe do Serviço de Otorrinolaringologia da UFPR do Estado de Santa Catarina

Paulo César Pinho Ribeiro


Margarida de Fátima Fernandes Carvalho
Pediatra e Hebiatra
Doutora em Pediatria pela Faculdade de Medicina da USP
Secretário da Associação Brasileira de Adolescência (ASBRA)
Professora Adjunta de Pediatria da Universidade Estadual de Londrina
Preceptor do Curso de Especialização em Adolescência da Faculdade
Presidente do Comitê de Reumatologia da Sociedade Paranaense de Ciências Médicas de Minas Gerais
de Pediatria Membro da Sociedade Brasileira e Mineira de Pediatria
Membro do Departamento de Reumatologia da Sociedade Brasileira e da Society for Adolescent Medicine
de Pediatria. Membro do Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira
de Pediatria
Maria Cecília Aguiar
Chefe do Serviço de Alergia e Imunologia da Policlínica de Botafogo Pedro Celiny Ramos Garcia
Membro do Departamento de Alergia e Imunologia da Sociedade Doutor em Pediatria pela Faculdade de Medicina
Brasileira de Pediatria da Universidade de São Paulo – USP.
Membro do Comitê de Alergia e Imunologia da Sociedade de Pediatria Professor Adjunto da Faculdade de Medicina da Pontifícia Universidade
do Estado do Rio de Janeiro Católica do Rio Grande do Sul – PUCRS.
Mestre em Alergia pela Universidade de Minnesotta (USA) Chefe do Serviço de Pediatria Intensiva e Emergência
do Hospital São Lucas da PUCRS.
Maria de Fátima Goulart Coutinho
Mestre em Pediatria pela UFRJ Regina Célia Succi
Especialista em Pediatria com Habilitação em Adolescência Professor Adjunto de Pediatria da UNIFESP/EPM
pela Sociedade Brasileira de Pediatria Chefe do Setor de AIDS Pediátrica da UNIFESP/EPM
Coordenadora do Curso de Especialização em Adolescência da UFRJ

Maria Odete Esteves Hilário Reinaldo de Menezes Martins


Professora Adjunto e Chefe da Disciplina de Alergia, Imunologia Clínica Presidente do Comitê de Infectologia da Sociedade de Pediatria \do
e Reumatologia do Departamento de Pediatria – UNIFESP – EPM Estado do Rio de Janeiro
Presidente do XII Congresso Brasileiro de Infectologia Pediátrica
Mario Roberto Hirschheimer Membro da Comissão Assessora de Imunizações
Médico da Clínica Pediátrica do Hospital do Servidor Público Municipal do Ministério da Saúde
de São Paulo e da Unidade de Primeiro Atendimento do Hospital Israelita
Albert Einstein Renato Junger de Oliveira
Coordenador dos Departamentos Científicos da Sociedade de Pediatria de Especialista em Endocrinologia pela SBEN
São Paulo e Membro do Departamento de Terapia Intensiva da Sociedade Especialista em Pediatria pela Sociedade Brasileira de Pediatria
Brasileira de Pediatria. Doutor em Pediatria pela Escola Paulista de Medicina
Professor de Pediatria da Universidade Federal da Paraíba.
Mário Santoro Júnior Membro do Departamento de Endocrinologia da Sociedade Brasileira
Doutor em Medicina pela FMUSP de Pediatria.
Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Pediatria
Ex-Presidente da Sociedade de Pediatria de São Paulo Renato S. Procianoy
Diretor Clínico do Hospital Cândido Fontoura Professor Titular de Pediatria da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Maurício Brik Coordenador do Curso de Pós Graduação em Pediatria da UFRGS.
Médico pela FMUFPR Chefe da Unidade de Neonatologia do Hospital de Clínicas
Doutor em Medicina pela UNICAMP de Porto Alegre.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 19


PROFESSORES
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Romolo Sandrini Neto Suzana de Souza Queiroz


Professor Titular de Pediatria da UFPR Professor-Livre Docente Adjunto da Pós-Graduação do Departamento
Chefe do Serviço de Endocrinologia do Departamento de Pediatria de Pediatria e do Centro de Referência da Saúde da Mulher, Nutrição,
da UFPR Alimentação e Desenvolvimento Infantil da Secretaria da Saúde do Estado
Vice-reitor da UFPR de São Paulo
Rosa Helena Porto Gusmão Membro de Departamento de Nutrição da Sociedade Brasileira
Professor Adjunto de Pediatria da Universidade do Estado do Pará de Pediatria
Doutora em Pediatria pela EPM
Pesquisadora Associada ao Instituto Evandro Chagas Thêmis Reverbel da Silveira
Pós-Doutorado no Center For Pediatric Reseach Virgínia, USA Professor Adjunto de Pediatria da Universidade Federal
Sérgio Augusto Cabral do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Chefe de Clínica do Berçário de Alto Risco Coordenadora do Programa de Transplante Hepático Infantil do Hospital
do Hospital Servidores do Estado de Clínicas de Porto Alegre – HCPA.
Diretor Médico do CTI Pediátrico da Clínica AMIU Coordenadora de Pesquisa e Pós Graduação do HCPA
Membro do Departamento de Terapia Intensiva Pediátrica da Sociedade
Brasileira de Pediatria
Vitor Costa Palazzo
Sérgio Antonio Antoniuk Pediatra e Intensivista do Hospital Infantil Pequeno Príncipe de Curitiba
Professor Assistente da Disciplina de Neurologia do Departamento Neonatologista da Maternidade Nossa Senhora de Fátima de Curitiba
de Pediatria da UFPR
Chefe do Serviço de Neuropediatria do Hospital Nossa Senhora
Wilmar Mendonça Guimarães
das Graças de Curitiba
Chefe da UTI Neonatal do Hospital Infantil Pequeno Príncipe
Médico Neuropediatra co-coordenador do CENEP (Centro de
Neuropediatria do Hospital de Clínicas). Responsável pelo ambulatório
de Cefaléia, Neurocisticercose, Convulsão Febril e Dificuldade Wilson Maciel
de Aprendizagem. Professor Livre-Docente de Pediatria Social do Departamento de Pediatria
UNIFESP-EPM (aposentado)
Sima Esther Ferman
Professor Adjunto do Departamento de Pediatria da UNIFESP/EPM
Chefe do Serviço de Oncologia Pediátrica do Instituto Nacional do Câncer
Membro do Comitê de Oncohematologia da Sociedade de Pediatria (aposentado)
do Estado do Rio de Janeiro Ex-Estagiário do Centro Internacional da Criança – Paris/França
Presidente do Departamento de Segurança Infantil
Sônia Maria Salviano Matos de Alencar da Sociedade Brasileira de Pediatria
Presidente do Departamento Científico do Aleitamento Materno da SBP
Coordenadora do Centro de Referência do Banco de Leite Materno do DF
BLH/HRT Zuleide Muniz Alves
Membro da Comissão Nacional de Bancos de Leite Humano Pediatra da Emergência do Hospital Geral do Estado
do Ministério da Saúde Membro do Departamento Científico de Segurança na Infância
Consultora em Aleitamento Materno da Secretaria de Políticas de Saúde e Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria.
do Ministério da Saúde Médica do Hospital Ana Nery ( INAMPS)

20 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 21


22 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA
Segurança Infantil
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Campanha Nacional de Prevenção de Acidentes


e Violência na Infância e Adolescência
JOSÉ AMÉRICO DE CAMPOS

INTRODUÇÃO fundamentais na conduta médica do Pediatra. A


atual Presidência da SBP, preocupada com ações
Acidentes e violências configuram como “problema”
prioritárias que vão beneficiar a criança, resolveu
de educação preventiva e de saúde pública de
por ações educativas e preventivas gerar “SAÚDE
grande magnitude no Brasil. Ele existe em maior ou
E BEM ESTAR SOCIAL”, diminuindo os acidentes e
menor incidência em todos os países. É tão antigo
violências (causas externas) em diferentes faixas
quanto o aparecimento do homem na Terra. Consti-
etárias do nascimento à adolescência. Iniciou-se
tui a primeira causa de morte a partir do terceiro
com grande credibilidade e dinamismo da SBP em
ano de vida até o adulto jovem produzindo grande
todos os estados brasileiros, através das Filiadas a
ônus para a sociedade e causando forte impacto na
“CAMPANHA NACIONAL DE PREVENÇÃO DE
morbimortalidade da produção brasileira.
ACIDENTES E VIOLÊNCIA NA INFÂNCIA E ADO-
Apesar disso ainda necessita cada vez mais de ações LESCÊNCIA” com lançamento no dia 12 de outu-
preventivas por parte da comunidade e de uma bro de 1998.
Política nacional eficiente e efetiva para redução
Esta Campanha propõe através de estratégias, cola-
dessa morbimortalidade. A Sociedade Brasileira de
borar para articular a FORMULAÇÃO e AÇÃO de
Pediatria (SBP) vem ao longo dos anos, através de
política Nacional de redução da morbimortalidade
várias ações e de suas Filiadas, promovendo a pre-
por acidentes e violência. A abrangência das ações
venção de acidentes e violência na infância, adoles-
propostas é ampla e requer envolvimento de TODA
cência e juventude.
A SOCIEDADE, PODER PÚBLICO, PAIS, RESPON-
Alguns dos marcos na prevenção de acidentes e SÁVEIS, EDUCADORES, ORGANIZAÇÕES NACIO-
violência na infância e adolescência dentro da SBP: NAIS E INTERNACIONAIS e muito especialmente
OS PEDIATRAS.
• Criação dos Comitês, os atuais Departamentos
Científicos, todos com interfaces com a biosse- É importante salientar que este aspecto da preven-
gurança. O Departamento de Acidentes com iní- ção existem interfaces de possível atuação em todas
cio em 1969, atual Departamento Científico de as especialidades pediátricas.
Segurança da Criança e do Adolescente, teve Considerando-se que ACIDENTES e VIOLÊNCIA SÃO
seu primeiro Congresso Brasileiro de Acidentes e EVITÁVEIS (slogan da Campanha), o envolvimento
Intoxicações na Infância juntamente com o III Con- de todos os setores na assistência global da popu-
gresso Brasileiro de Toxicologia em Belo Horizon- lação alvo, numa abordagem bio-psico-social é fun-
te - agosto de 1983. Nele foram apresentados damental.
trabalhados dos pioneiros Centros de Controle de
Intoxicações de São Paulo e Minas Gerais além Desde seu lançamento em todos os Estados e vários
de aspectos educativos de prevenção de aciden- Municípios, sua consolidação, seus desdobramentos
tes nas escolas de Educação para o Trânsito e a com projetos piloto de execução testadas e avalia-
prevenção de acidentes na infância, dentre ou- das em suas faces evolutivas, além de formação de
tros. Os Congressos Brasileiros e Regionais têm núcleos de ações preventivas, a Campanha tem
sentido nos últimos anos a necessidade de con- crescido de modo a atingir gradativamente os objeti-
templar cada vez mais os aspectos preventivos e vos propostos.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 23


Segurança Infantil
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Trata-se de ações preventivas em todos os níveis, • Entrosamento entre os Departamentos Científicos


com prioridade de prevenção primária, não se es- envolvidos.
quecendo, quando necessário, da prevenção secun- • Responsabilidade e iniciativa das pessoas
dária e mesmo terciária. engajadas na organização.
• Apoio de empresas relacionadas à área de saúde,
educação e social.
FILOSOFIA DAS AÇÕES
• Apoio Ministerial na área da Educação, Saúde,
A filosofia da Campanha, imprimida pela SBP é Justiça quando solicitado.
dinâmica e abrangente com ações pautadas pela
• Receptividade por parte da sociedade como um
sociedade e ética. Sua abrangência é total, inde-
todo, comunidade em geral e pediátrica de modo
pendente de credo, raça, classe sócio econômica
específico.
cultural e regiões, valorizando a experiência e co-
nhecimento dos especialistas em cada área de atu- • Ações para manter a democracia e cidadania.
ação. Prioriza-se as ações que visam atingir crianças • Patrocínio de ações dos Departamentos Científicos,
e adolescentes das periferias das cidades, do meio comprometido com os aspectos preventivos de
rural, regiões indígenas e aquelas com alto índice biossegurança e defesa da criança e do adolescente.
de analfabetismo, aumentando significativamente o
público alvo.
FATORES QUE DIFICULTAM
AS AÇÕES
ESTRATÉGIAS
• Falta de diagnóstico mais preciso da situação atual
Dentre as estratégias, além de planejar, articular a a nível de Brasil em relação aos acidentes e violên-
formulação e ações, lembra-se a todos envolvidos a cias.
necessidade de se dar tom positivo nas ações pre-
• A grande extensão territorial a ser atingida pela
ventivas e ao projeto político com coerência interna
Campanha.
e externa. Pode citar que nas ações já executadas
observou-se: • Desigualdade sócio econômica, de educação (anal-
fabetismo) de saúde (patologias que facilitam os
a) Valorizar e articular com iniciativas e organiza- acidentes e violências).
ções já existentes e dispersas, após diagnosticá-las
• Desemprego e recessão, baixa renda gerando
e analisá-las em seus aspectos positivos.
situações de acidentes e aumentando grau de vio-
b) Manter cooperação técnica e científica com orga- lência.
nizações internacionais e nacionais e países que • Descontinuidade de ações, com retardo em cum-
têm políticas pertinentes aos objetivos de redução prir metas propostas.
da morbimortalidade por causas externas.
c) Sinalizar a limitação de nossa abrangência soli-
citando e/ou dando apoio a todas as iniciativas
CONSOLIDAÇÃO DA CAMPANHA
que beneficiam a criança e o adolescente. Planejamento, confecção e distribuição racionaliza-
da de material da Campanha: logotipo, slogan,
d) Diagnosticar “problemas” e fatores que favorecem
informação detalhada sobra a campanha através de
as ações preventivas ou fatores que as dificultam,
mensagem da Presidência da SBP com dados
priorizando os primeiros e eliminando os segundos. motivadores que facilitaram a motivação dos pedia-
tras, mídia e a sociedade em geral para participa-
ção ativa na Campanha.
FATORES QUE FAVORECEM AS
AÇÕES PROJETOS PILOTO
• Dinamismo, credibilidade, organização e determi- • Bebês de risco (Paraná) - Projeto em fase de exe-
nação por parte da SOCIEDADE BRASILEIRA DE cução.
PEDIATRIA e de suas Filiadas. Além da sua infra- • Comunidade Segura (Paraisópolis - SP) - Projeto
estrutura utilizada. em fase de execução.

24 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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• Segurança nos parques (MG) - Projeto em fase de • A prevenção de acidentes no ensino nas residên-
execução. cias de pediatras (RJ) - Projeto em execução.
• Biossegurança em hospitais infantis (MG / BA) - • Projeto de estruturação da biblioteca da SBP e
Projeto em fase de execução - 1ª fase concluída. Filiadas em relação à biossegurança e Bancos de
• Prevenção de acidentes e violência em cidades de Dados, fitas de vídeo, artigos, home page - projeto
grande porte (Belo Horizonte - MG) - Projeto em fase em planejamento.
de execução. • Biossegurança em creches de Belo Horizonte (mo-
• Prevenção de acidentes e violência no transporte - delo) (MG) - projeto em execução.
Transitolândia - Parceria SBP e Polícia Militar - 5º • Projeto criança e meio ambiente prevenção - estu-
Batalhão (Belo Horizonte - MG) - Projeto já existente do de riscos: surdez, cegueira, intoxicações e
- Atividades Diárias.
pneumopatias - Projeto em planejamento.
• Maternidade Segura - Odete Valadares (Belo Ho-
• Interfaces da biossegurança e especialidades mé-
rizonte - MG) - Projeto em planejamento.
dicas: Projeto para identificação de ações preventi-
• Escola Saudável IMACO (MG / RS) - Projeto em vas a nível de Brasil - projeto em planejamento
execução. (MG / PR).
• Biossegurança do Campus da Saúde - Hospital • Campanha na mídia: TV Escola - TV Futura - Pro-
Universitário (Belo Horizonte - MG) - Projeto em jeto em planejamento (SBP MG / SP / RJ/ RS).
execução.
• Inclusão de ações de prevenção de acidentes e Bibliografia
violência entre os pré-requisitos do projeto “Prefeitura
01 - Anais do III Congresso de Toxicologia e I Congresso Bra-
e ou Cidade Amiga da Criança”. Participação de sileiro de Acidentes na Infância.
universitários - Internato rural (Belo Horizonte - MG) 02 - Histórico e Memória do Comitê de Acidentes, atual Depar-
- Projeto em planejamento. tamento Científico de Segurança da Criança e do adoles-
cente.
• Inclusão de prevenção de acidentes e violência 03 - Campanha de Prevenção de Acidentes 1998 - Relatório
como ação básica de saúde proposta SBP ao Mi- da Assessoria de Comunicação da SBP.
04 - Mensagem do Presidente aos Pediatras sobre a Campa-
nistério da Saúde - Projeto em planejamento, já com nha de Prevenção de acidentes de 1998.
a sugestão feita oficialmente pela SBP. 05 - Relatórios e Atas de Reuniões sobre a campanha.

Conduta nos Acidentes por Animais Peçonhentos


JOSÉ SABINO DE OLIVEIRA

1. ACIDENTE BOTRÓPICO 1.1.2.2. Alívio da dor: usar analgésicos comuns,


como Dipirona 10 mg/kg, a cada seis horas, para
1.1. Tratamento crianças. Poderá ser usado morfina (Dimorf®) se a
1.1.1. Específico: soroterapia o mais rápido possí- dor for muito intensa, 0,2-0,5 mg/kg, cada quatro
vel (Quadro 1) com soro antibotrópico, preferenci- a seis horas, endovenoso.
almente antibotrópico crotálico ou antibotrópico 1.1.2.3. Manter uma boa hidratação com diurese
laquético. de 1 a 2 ml/kg/hora
1.1.2. Geral:
1.1.2.4. Antibioticoterapia: usar quando houver evi-
1.1.2.1. Manter o segmento corporal picado esten- dência de infecção. As bactérias mais freqüentemente
dido ou elevado para facilitar a drenagem postural isoladas nas lesões são: Morganella Morganii,

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 25


Segurança Infantil
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Escherichia Coli, Providência-sp e Streptococo do 1.1.2.7. Distúrbios respiratórios que demandam ven-
grupo D. Geralmente são sensíveis aos tilação mecânica são pouco freqüentes.
aminoglicosídeos nas doses habituais. Se houver
1.1.2.8. Tranqüilizar a criança e a família quanto à
suspeita de anaeróbios, usar clindamicina e/ou
gravidade do caso.
metronidazol.

1.1.2.5. Fasciotomia raramente está indicada. O 1.2. Prognóstico


mais freqüente é o tratamento local, debridamento e O prognóstico no acidente botrópico é bom, com
drenagem de abscessos. mortalidade abaixo de 1% dos casos tratados. Há
1.1.2.6. A correção da anemia, distúrbios eletro- possibilidade de seqüelas anatômicas locais e funcio-
líticos e ácido-básico, quando necessários, devem nais, como insuficiência renal, que na maioria dos
ser realizados. casos é reversível.

Quadro 1 - Acidente Botrópico: Soroterapia

Manifestações Classificação
Leve Moderada Grave
Dor – Edema Equimose ausentes ou discretos Evidentes intensos
Anúria
Choque ausentes ausentes presentes
Hemorragia grave
Tempo de Coagulacão normal ou alterado normal ou alterado normal ou alterado

Soroterapia 2 a 4 ampolas 4 a 8 ampolas 12 ampolas


(SAB/SABC/SABL)

Obs: o tempo de coagulação alterado por mais de 24 horas indica uma nova dose de 2 ampolas de soro.
Fonte: Ministério da Saúde, 1998.

2. ACIDENTE CROTÁLICO 2.1.2.2. Cuidados gerais: corrigir anemia, distúrbios


eletrolíticos, suporte ventilatório. Há raros casos descri-
2.1. Tratamento
tos de insuficiência respiratória por ação bloqueadora
2.1.1. Específico: soro anticrotálico ou antibotrópico- neuromuscular da toxina. Quando ocorre a insuficiên-
crotálico (Quadro 2) cia renal, deve ser iniciado a diálise peritonial.
2.1.2. Geral 2.1.2.3. Alívio da dor: geralmente não é intensa e
2.1.2.1. Manter hidratação adequada, diurese em de fácil controle.
1 a 2 ml/kg/hora. Pode ser usado manitol a 20% 2.1.2.4. Procurar orientar a criança e a família, tran-
5 ml/kg, se persistir oligúria usar furosemida 1 mg/ qüilizando-os.
kg/dose até de seis e seis horas. Procurar manter o
2.2. Prognóstico
pH urinário acima de 6.5 para evitar a precipitação
intratubular da mioglobina. Usar bicarbonato de sódio É bom nos casos leves e moderados e naqueles
e monitorizar o pH sangüíneo para não passar de atendidos nas primeiras horas da picada. Quando
7.50 há insuficiência renal o prognóstico é mais grave.

26 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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Quadro 2 - Acidente Crotálico: Soroterapia

Manifestações Classificação
Leve Moderada Grave
Facies Miastênica
ausente ou tardia Discreta ou evidente evidente
Visão Turva

Mialgia ausente ou discreta discreta intensa


Urina Vermelha
ausente pouco evidente ou ausente presente
ou Marrom

Tempo de Coagulação normal ou alterado normal ou alterado normal ou alterado

Soroterapia 5 ampolas 10 ampolas 20 ampolas

Fonte: Ministério da Saúde, 1998

3.1.1. Específico: soroterapia com soro antilaquético


3. ACIDENTE LAQUÉTICO ou botrópico laquético (Quadro 3)
3.1. Tratamento 3.1.2. Geral: Idêntico ao acidente botrópico

Quadro 3 - Acidente Laquético: Soroterapia

Manifestações Soroterapia

Bradicardia, hipotensão arterial, diarréia, 10 a 20 ampolas


cólicas, tonteiras, visão escura (SAL), SABL)

Fonte: Ministério da Saúde, 1998

4. ACIDENTE ELAPÍDICO 4.1.2.5. Uso de neostigmina: o uso de anti-


colinesterásicos (neostigmina) está indicado nos ca-
4.1. Tratamento
sos de veneno de ação pós-sináptica (M Frontalis,
4.1.1. Específico: soroterapia (Quadro 4) M Lemniscatus) e nos casos de envenenamentos
graves, pois promovem a rápida reversão da
4.1.2. Geral:
sintomatologia respiratória. Em seguida, transferir a
4.1.2.1. Hidratação: manter a criança hidratada com criança para o CTI.
diurese normal (1 a 2 ml/kg/hora).
Teste da neostigma: fazer 0,05 a 0,1 mg/kg em
4.1.2.2. Alívio da dor: a dor não é sintoma impor- crianças, EV. A melhora do quadro neurotóxico
tante neste acidente ofídico. ocorre em 10 minutos. No caso de melhora, man-
ter a dose de 0,05 a 0,1 mg/kg EV a cada
4.1.2.3. Apoio emocional: procurar tranqüilizar a
quatro horas. Deve ser administrado atropina para
família e a criança.
antagonizar os efeitos muscarínicos da acetil-
4.1.2.4. Assistência ventilatória: nos casos de aco- colinesterase, principalmente a bradicardia e secre-
metimento respiratório é vital manter o paciente ven- ções de vias aéreas. A dose de atropina é 0,05
tilado e oxigenado. Às vezes há necessidade de mg/kg EV. A criança deve ser mantida na UTI
intubação com ventilação manual ou através de pelo menos 48 horas após estar respirando normal-
ventiladores mecânicos. mente.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 27


Segurança Infantil
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4.2. Prognóstico que o atendimento quanto à soroterapia e assistên-


Mesmo nos casos graves o prognóstico é bom, desde cia ventilatória sejam adequados.

Quadro 4 - Acidente Elapídico: Soroterapia


Soro - 10 amplas

Todos os casos devem ser considerados graves

Fonte: Ministério da Saúde, 1998

5. ESCORPIONISMO são arterial com ou sem edema agudo de pulmão,


na dose de 0,5 mg/kg/peso sublingual.
5.1. Tratamento
5.1.2.5. Ventilação mecânica: considerar a intubação
5.1.1. Específico: Feito pela soroterapia com soro e a ventilação mecânica quando houver edema
anti-escorpiônico preferencialmente (Quadro 5) ou agudo de pulmão ou evidência de insuficência res-
antiaracnídeo. piratória aguda.
5.1.2. Geral 5.1.2.6. Uso de dopamina e/ou dobutamina. São
usadas quando há indicação nos casos de choque
5.1.2.1. Alívio da dor. Infiltração local de lidocaína
e insuficiência cardíaca nas doses habituais entre
2%. 1 a 2 ml para crianças e derivados pirazolônicos
2,5 e 2,0 mg/kg/peso/minuto.
10 mg/kg/peso a cada seis horas via oral ou
venosa. A dor melhora após a soroterapia. 5.1.2.7. Os casos moderados e graves devem ser
internados em UTI e terem as suas funções vitais
5.1.2.2. Distúrbios hidroeletrolíticos e ácido-básico monitoradas até a estabilização.
tratados de acordo com as necessidades. Evitar a
hiperhidratação. Manter a diurese em 1 a 2 ml/kg. 5.2. Prognóstico
O prognóstico quando o tratamento inicia nas pri-
5.1.2.3. Atropina: Indicada quando há bradicardia
meiras duas horas de vida e consegue internação
sinusal com baixo débito e bloqueio AV total na
em UTI é bom, com mortalidade de cerca de 0,5%.
dose de 0,01 a 0,02 mg/kg até de 4/4 horas.
O acidente no adulto e adolescente é sempre de
5.1.2.4. Nifedipina: Indicada quando há hiperten- bom prognóstico.

Quadro 5 - Acidente Escorpiônico: Soroterapia

Manifestações Classificação
Leve Moderada Grave
dor e parestesisas locais dor local intensa Idem forma moderada

}
náuseas Vômitos profusos e
vômitos incoercíveis
sudorese discretos Sudorese profusa
siolorréia Sialorréia intensa
agitação Prostração, convulsão,
taquipnéia coma
taquicardia Bradicardia, insuf.
Cardíaca, edema
pulmonar e choque
Soroterapia _ 2 a 3 ampolas 4 a 6 ampolas
endovenosa endovenosa*
Fonte: M. da Saúde, 1998
* A maioria dos casos se resolve com 40 ampolas, o que observamos desde 1972

28 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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6. ARANEISMO 6.1.1.2.1.1. Alívio da dor: infiltração local com


lidocaína 2% sem vaso-constritor, 1 a 2 ml, até a
6.1. Acidente por Phoneutria
cada 2 horas. Pode ser usado morfina (Dimorf®)
6.1.1 Tratamento intramuscular ou EV ou analgésico não opiáceo, como
6.1.1.1. Específico: soroterapia indicada em crian- dipirona 10 mg/kg cada 6 horas. Usa-se também
ças com manifestações sistêmicas e imersão em água morna ou compressa quente. Obs:
6.1.1.2. Geral evitar o uso de antihistamínicos.
6.1.1.2.1. Casos moderados e graves com manifes- 6.1.2. Prognóstico: os óbitos são raros e o prognós-
tações sistêmicas. tico é bom.

Quadro 6 - Foneutrismo: Soroterapia

Classificação Manifestações Clínicas Tratamento Geral Soroterapia


Leve Dor local
Observar por 6 horas _
Taquicardia e agitação eventuais
Moderado Dor local intensa
Sudorese e/ou vômitos
Hospitalização 2- 4 ampolas
ocasionais e/ou agitação
e/ou hipertensão arterial

Manifestações anteriores
Sudorese profunda
Siolorréia e vômitos
freqüentes Internação em CTI 5-10 ampolas
Hipertonia muscular
Priaprismo choque e/ou
edema pulmonar agudo

Fonte: Ministério da Saúde, 1998

6.2. Acidentes por Loxosceles 6.2.1.2.5. Tratamento cirúrgico: para correção das
6.2.1. Tratamento cicatrizes, enxertos, geralmente após 3 a 4 semanas
do acidente.
6.2.1.1. Específico: o uso de soro é controvertido,
pois após 36 horas do acidente a sua eficácia é 6.2.1.2.6. Corticosteróides: prednisona por via oral
reduzida (Quadro 7). equivalente 1 mg/kg/dia por no mínimo 5 dias.

6.2.1.2. Geral 6.2.1.2.7. Dapsone. Ainda em fase de testes, asso-


ciado à soroterapia pode modular a resposta infla-
6.2.1.2.1. Alívio da dor: usar analgésicos comuns.
matória: 0-100 mg/kg/dia via oral.
Dipirona 10 mg/kg/peso de 6 em 6 horas. Não
fazer infiltração local. Usar compressas frias no lo- 6.2.1.2.8. Manifestações sistêmicas: correção da
cal. anemia, tratamento da insuficiência renal aguda,
6.2.1.2.2. Cuidados locais: lavar a lesão 4 a 6 distúrbios de coagulação são tratados de maneira
vezes ao dia com sabão neutro e compressas de clássica.
permanganato de potássio 1:40.000 em compres- 6.2.2. Prognóstico
sas.
A insuficiência renal e a coagulação intravascular
6.2.1.2.3. Remoção da escara: deve ser feita apenas disseminada são os principais responsáveis pelo óbito.
após a delimitação definitiva da lesão (1 semana). As lesões cutâneas muitas vezes necessitam de en-
6.2.1.2.4. Antibioticoterapia: usar apenas quando xertos. Na boa parte dos casos o prognóstico é
houver sinais de infecção local. bom.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 29


Segurança Infantil
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Quadro 7 - Loxoscelismo: Soroterapia

Classificação Manifestações Clínicas Soroterapia


Leve Sem alterações clínicas
Sem alterações laboratoriais _
Lesão incaracterística
Moderado Lesão sugestiva
“Rash” cutâneo e plaquetas 5 ampolas
Ausência de hemólise
Grave Lesão característica
Anemia aguda
Icterícia 10 ampolas
Evolução rápida
Alterações laboratoriais de hemólise

Fonte: Ministério da Saúde, 1998

6.3. Acidente por Latrodectus edade. Diazepam 1 a 2 mg/kg/dose cada 4 horas


ou Midazolan 50 a 100 microgramas a cada 4 a
6.3.1. Tratamento
6 horas.
6.3.1.1. Específico: soroterapia com soro anti-
6.3.1.2.3. Tranqüilizar a família e a criança através
latradectus (Quadro 8) de conversa e orientação.
6.3.1.2. Geral; os pacientes devem ser hospitaliza- 6.3.1.2.4. Cuidados e monitorização dos dados
dos por pelo menos 24 horas. vitais.
6.3.1.2.1. Alívio da dor. Dipirona 10 mg/kg/peso 6.3.2. Prognóstico.
de 6/6 horas.
É bom desde que tratado precocemente e disponha
6.3.1.2.2. Benzodiazepínicos. Para alívio da ansi- dos meios de suporte das funções vitais.

Quadro 8 - Latrodectismo: Tratamento

Classificação Manifestações Clínicas Tratamento


Leve Dor local e membros inferiores
Edema local discreto Sintomáticos
Sudorese local Observação
Parestesia de membros
Tremores e contraturas
Moderado Os acima mais:
Dor abdominal
Sudorese generalizada Analgésicos + Sedativos
Ansiedade/agitação 1 ampola de soro
Mialgia antilatrodéctico IM
Cefaléia e tontura
Hipertermia
Grave Todas acima
Taqui/bradicardia
Hipertensão arterial Analgésicos + Sedativos
Taquipnéia/dispnéia 1 –2 ampolas de soro
Náuseas e vômitos antilatrodéctico IM
Priaprismo
Retenção urinária
Facies típica
Fonte: Ministério da Saúde, 1998

30 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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7. ACIDENTES POR HIMENOPTEROS 8. ACIDENTES POR FORMIGAS


7.1. Tratamento 8.1. Tratamento
7.1.1. Retirada dos ferrões através de raspagem. 8.1.1. Alívio da dor: Uso de compressas frias locais.
Não usar pinças. Pode ser usado dipirona 10 mg/kg via oral de 6/
6 horas.
7.1.2. Alívio da dor: usar dipirona 10 mg/kg de
peso de 6/6 horas. 8.1.2. Antihistamínicos: a dextroclorfeniramina 0,15
mg/kg por 24 horas divididos em 4 doses por via
7.1.3. Manter a hidratação, diurese entre 1 e 2 ml/
oral pode ser usada. Nos acidentes com reação
kg/hora. Corrigir os distúrbios ácido-básico e
anafilática, deve ser tratado como o das abelhas.
eletrolíticos.
7.1.4. Tratamento do choque anafilático
Adrenalina: solução 1:1000 subcutânea 0,01 ml/ Bibliografia
kg/dose repetida até 3 vezes com intervalos de 10
01 - Manual de Diagnóstico e Tratamento de Acidentes por
minutos. Animais Peçonhentos. Fundação Nacional de Saúde. Mi-
nistério da Saúde – Brasília 1998.
Corticosteróides: não controla reações graves, mas
02 - SCHVARTSMAN S. Plantas venenosas e animais pe-
são indicados rotineiramente a hidrocortisona 4 mg/ çonhentos. 2a edição. Ed Savier. São Paulo 1992.
kg/p EV cada 4 horas ou metilpredisolona 50 mg 03 - JORGE M.T., RIBEIRO L.A.R. Acidentes por Serpentes
EV cada 12 horas. Peçonhentas do Brasil. Rev. Assoc. Med. Bras. 36(2):6677,
1990
Antihistamínicos: Para aliviar reações cutâneas usar 04 - VITAL BRAZIL, O. Coral snake venons mode of action and
patohphysiology of experimental envenomation. Rev. Inst.
a dextroclorofeniramina 0,15 mg/kg via oral por Med. Trop. São Paulo. 29(3) :119-26, 1987
24 horas em 4 doses. 05 - AMARAL, C.F.S., RESENDE, N.A., FREIRE-MAIA, L. Acute
Pulmonary Edema after Tityus Serrulatus Scorpion Sting in
Broncodilatadores: Se houver broncoespasmo usar Children. Am. J. Cardiol. 71:242-5, 1993
fenoterol ou salbutamol em micronebulização. 06 - CAMPOS J.A., COSTA D.M., OLIVEIRA, J.S. Acidentes
por Animais Peçonhentos, In: TONELLI. 2a ed. Doenças
Ventilação mecânica: no caso de estridor com edema contagiosas e Parasitárias na Infância. Ed Medsi 1999,
no prelo
de glote, pode ser necessário a intubação e o uso
07 - FREIRE-MAIA L., CAMPOS, J.A., AMARAL, C.F.S.
de ventilação mecânica. approaches to the tretament of scorpion envenoming.
Toxicon 32:1009-14. 1994
Diálise peritoneal: quando há insuficiência renal no
08 - CARDOSO J.L.C., FRANÇA F., EICKSTEDT, V.R.D.
caso de síndrome de envenenamento, com oligúria Laxoscelismo: Estudo de 242 Casos (1980-1984). Rev
e anúria. Soc Bras Toxicol. 1(182)58-60. 1988
09 - LUCAS, M.S. Spiders in Brazil. Toxicon 26(9) 759-72.
7.2. Prognóstico 1988
10 - HADDAD J.V., CARDOSO S.L.C., FRANÇA F. Acidentes
O prognóstico é bom quando o número de picadas por Formigas: Um Problema Dermatológico. Anais Bras.
é pequeno e não há edema de glote. No caso de Dermatol. 71(6):527-30. 1996
11 - REID, H.A. and THEAKSTON D.G. The Management of
síndrome de envenenamento o prognóstico é reser- Snake Bite. Bulletin of the World Health Organization.
vado. 61(6):885-895. 1983

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 31


Segurança Infantil
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Enganos e Mitos no Atendimento Clínico


de Vítimas de Acidentes e Violências
DANILO BLANK

cia de eventos traumáticos e de suas conseqüências.


ENGANO NO 1: Menosprezar e/ou não aplicar a
Assim, as maiores autoridades no assunto, como a
orientação preventiva no âmbito do
Academia Americana de Pediatria e a SBP,
atendimento clínico primário.
recomendam que o aconselhamento sobre segurança
A educação para a segurança costuma receber específico para cada faixa etária seja incluído como
pouco crédito como estratégia no controle das injúrias parte integrante dos cuidados de rotina de crianças
físicas. Porém, uma análise mais criteriosa da literatura e adolescentes saudáveis. As principais
recente evidencia um número significativo de estudos recomendações quanto às áreas prioritárias para
controlados que demonstram que o aconselhamento aconselhamento, de acordo com os diferentes riscos,
no âmbito do chamado atendimento primário é pode ser obtidas nas referências 2 e 3. A seguir, um
factível e eficaz na melhora do conhecimento sobre conjunto de dez regras básicas para o controle global
segurança, na mudança do comportamento para um de injúrias físicas, em torno das quais todo pediatra
estilo mais seguro e na redução efetiva de ocorrên- precisa refletir reiteradamente:

Controle de Injúrias Físicas: Dez Regras Básicas

01. A atenção deve ser concentrada em eventos traumáticos mais freqüentes, mais graves e para os quais haja
intervenções efetivas.
02. Ao importar conhecimentos embasados cientificamente, países pobres precisam desenvolver intervenções que
sejam específicas no seu contexto político-sócio-econômico.
03. Há uma forte associação entre pobreza e mortalidade por injúrias físicas. Programas de promoção da segurança
e controle de injúrias físicas e violência devem considerar a privação social.
04. O empenho do pediatra no controle de injúrias físicas deve incluir o trabalho com indivíduos e com a comuni-
dade. É papel do médico estar a par dos programas de promoção da saúde da sua comunidade, envolver-se
e encorajar seus pacientes a fazer o mesmo e agir como consultor e incentivador.
05. Estratégias preventivas passivas (automáticas) são potencialmente mais efetivas do que as ativas e devem ser
usadas de preferência.
06. Campanhas de educação para a segurança têm um limitado sucesso em aumentar o conhecimento e alguma
mudança de comportamento, mas há poucas evidências de que reduzam as injúrias físicas.
07. Orientação preventiva específica é muito mais efetiva do que a vaga; atentar para prioridades em cada faixa
etária e contexto ambiental.
08. Ao aplicar medidas de prevenção primária a práticas pessoais em saúde, o paciente é o agente principal e deve
dividir com o médico a responsabilidade pelas tomadas de decisão.
09. O conceito de controle de injúrias físicas expande o foco de ação, incluindo também o cuidado pós-trauma
(prevenção secundária).
10. Injúrias intencionais, causadas por abuso, agressão, homicídio ou suicídio, merecem tanta consideração quanto
as não intencionais, que têm sido o principal foco de atenção até o presente.

Adaptado de: Rivara FP, Aitken M. Prevention of injuries to children and adolescents. Adv Pediatr 1998;45:37-72. US
Preventive Services Task Force. Guide to clinical preventive services, 2nd ed. Baltimore: Williams & Wilkins, 1996.
Dowswell T et al. Preventing childhood unintentional injuries - What works? Injury Prevention 1996;2:140-149.

32 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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informação toxicológica, vizinho. É aconselhável


ENGANO NO 2: Não preparar os pais e/ou respon-
adicionar à lista o endereço e o telefone da própria
sáveis para primeiros socorros e
casa, pois em situações de emergência a memória
suporte básico de vida.
pode falhar.
O treinamento de leigos em procedimentos de suporte
Um estojo de primeiros socorros completo deve ser
básico de vida devem integrar qualquer programa
mantido em casa, à mão e com produtos dentro
comunitário de controle de injúrias físicas. Todo pai
dos prazos de validade. Verificar sugestão na
ou responsável deveria estar apto a praticar manobras
referência 9.
essenciais de ressuscitação cardiopulmonar,
atendimento à criança asfixiada e manobra de
Heimlich. A SBP pode dar orientações sobre cursos ENGANO NO 3: Esquecer a ordem do “ABC do
nessa área para leigos. atendimento ao trauma”, em qualquer
tipo de injúria física.
É muito importante que os pais mantenham ao lado
de cada telefone da casa — e de preferência sob O chamado “ABC do atendimento ao trauma” deve
um ímã de geladeira — uma lista atualizada dos ser aplicado em sua ordem estrita, independente-
seguintes números de telefone: serviço de assistência mente da natureza da injúria sofrida, seja concussão,
médica de urgência, pediatra, dentista, centro de fratura, laceração, queimadura ou politraumatismo.

ABC do Atendimento ao Trauma

A. Via aérea Avaliar: Permeabilidade da via aérea, traumatismo maxilofacial, estridor


(Airway)

B. Respiração Esforço respiratório, freqüência respiratória, ritmo, cianose, nível de consciência


(Breathing)

C. Circulação Pulso periférico, perfusão da pele, taquicardia, nível de consciência


(Circulation)

D. Incapacitação Nível de consciência (Escala de coma de Glasgow)


(Disability)

E. Exposição Examinar a criança completamente despida, da cabeça aos artelhos,


(Exposure) medir temperatura

Adaptado de: Garcia PCR, Carvalho PRA, Bruno F. Trauma pediátrico. In: Piva JP, Carvalho PRA, Garcia PCR, eds.
Terapia intensiva em pediatria. 4a ed. Rio de Janeiro, RJ: MEDSI; 1997. p.306-20.

ENGANO NO 4: Em caso de asfixia, aplicar a mano- braço do socorrista. Firmando a cabeça da crian-
bra de atendimento inadequada para ça e virando-a para o lado, em um nível mais
a faixa etária ou a crianças que este- baixo que seu tórax, aplicar cinco golpes fortes e
jam tossindo, chorando ou fazendo secos entre as omoplatas, com a base da mão. Em
ruídos respiratórios. seguida, colocar a mão livre sobre as costas da
criança, firmando-lhe a cabeça, virar a criança para
Procedimentos de auxílio urgente para desobstrução a posição de supinação, enquanto se mantém a
das vias aéreas estão indicados sempre que uma cabeça segura entre as duas mãos. Virar a cabeça
criança que tenha aspirado um corpo estranho não para o lado e aplicar cinco compressões sobre o
possa emitir sons ou apresente sinais de obstrução tórax, na região inferior do esterno. Se não houver
completa (cianose e/ou ausência de movimentos respiração, abrir a mandíbula e tentar visualizar o
respiratórios). Não tentar manobras para asfixia se a corpo estranho, removendo-o. Ainda não havendo
criança estiver tossindo, chorando ou fazendo ruídos. respiração, aplicar ventilação boca-a-boca. Se o
O lactente com menos de um ano deve ser tórax não se mover, a obstrução persiste. Repetir
posicionado em pronação, apoiado sobre o ante- toda a seqüência.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 33


Segurança Infantil
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Criança maior de um ano consciente (em pé ou mãos sobre o abdômen, com um movimento rápido
sentada) deve receber a manobra de Heimlich: e seco dirigido para cima. Se necessário, repetir
posicionar-se por trás da criança, braços sob suas cinco golpes na mesma direção, cada um como um
axilas, envolvendo-lhe o tronco; colocar o punho movimento distinto. Tentar ventilação boca-a-boca.
com a região tenar contra o abdômen da criança, Se o tórax não se mover, a obstrução persiste. Repetir
na linha média, um pouco acima do umbigo, bem toda a seqüência.
abaixo do processo xifóide; agarrar o punho com a
outra mão e aplicar cinco compressões rápidas ENGANO NO 5: Em trauma craniano, indicar exames
dirigidas para cima. O punho não deve tocar o radiográficos ou hospitalização
processo xifóide ou a caixa torácica. Cada desnecessários para os casos leves
compressão deve ser um movimento distinto, com a e moderados, deixando de orientar
intenção de remover o corpo estranho. Tentar os responsáveis sobre a maneira
ventilação boca-a-boca. Se o tórax não se mover, a apropriada de observar a vítima.
obstrução persiste. Repetir toda a seqüência. Se a
Mais de 90% das crianças hospitalizadas para
criança perder a consciência, usar os procedimentos
avaliação de trauma craniano sofreram um injúria
para paciente inconsciente.
menor, com escore superior a 13 na escala de coma
Criança inconsciente (deitada) deve ser colocada de Glasgow (ver referências 4 e 5). Radiografias ou
em posição de supinação, com a cabeça voltada tomografias computadorizadas são desnecessárias
para o lado. Ajoelhar-se ao lado da criança ou quando não houver perda de consciência, amnésia,
acavalar-se sobre seus quadris; abrir a via aérea, déficits neurológicos focais ou afundamento do crânio
por meio da hiperextensão do pescoço; colocar a e o escore na escala de Glasgow for superior a 14.
base da palma de uma das mãos no abdômen da Nesses casos, a criança pode ser observada em
criança, na linha média, um pouco acima do umbigo, casa, desde que o transporte de volta ao serviço de
bem abaixo do processo xifóide (a outra mão deve urgência seja factível e os responsáveis recebam
ser colocada sobre o punho); pressionar ambas as orientação por escrito.

Instruções aos pais: O que observar no seu filho que sofreu uma batida na cabeça?

Observe atentamente o comportamento do seu filho nas próximas 24 horas. Fique de olho quando ele estiver acordado.
Quando dormir, acorde-o a cada 3 horas e verifique se ele é capaz de ficar acordado por alguns minutos, pode falar,
movimentar os braços e pernas normalmente e dizer o nome das pessoas conhecidas. Sintomas de uma batida na
cabeça podem surgir depois de dias ou até meses; mesmo que isso seja raro, se você notar qualquer problema procure
um médico.

Procure um médico imediatamente se a criança:


01. Não puder ser despertada ou se mostrar mais sonolenta do que de costume.
02. Vomitar mais de duas vezes.
03. Tiver dor de cabeça progressiva ou que dure mais de um dia.
04. Tiver convulsões.
05. Apresentar dor na nuca.
06. Sangrar pela orelha ou nariz.
07. Apresentar secreção clara pelo nariz.
08. Tiver qualquer problema de visão, audição ou fala.
09. Tiver problema para andar ou apresentar qualquer fraqueza nos braços ou pernas.
10. Apresentar qualquer comportamento estranho, choro excessivo, estado de confusão ou tontura.

Adaptado de: Goldstein B, Powers KS. Head trauma in children. Pediatrics in Review. 1994;15:213-9.

34 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Segurança Infantil
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Vítimas de trauma craniano com escore de Glasgow 1 a 2 µg/kg EV) e sedação (diazepam, 0,1 mg/kg
entre 12 e 14, perda de consciência transitória EV, ou midazolam, 0,05 mg/kg EV) devem ser usadas
(menos de 5 minutos), amnésia, atenção prejudicada, rotineiramente, com reforços nos procedimentos.
ou com afundamento do crânio devem ser submetidas
a avaliação radiológica, preferentemente por
ENGANO NO 7: Recomendar o uso de xarope de
tomografia computadorizada. Caso a tomografia seja
ipeca como primeira escolha em ca-
normal, podem ser observadas em casa.
so de ingestão de substância tóxica.
Crianças que tenham tido perda de consciência por
A administração de carvão ativado tem se firmado
mais de cinco minutos, convulsões, déficits
como a estratégia de escolha para descontaminação
neurológicos focais, qualquer anormalidade na
gástrica, com algumas exceções (metais pesados,
tomografia, ainda que com escore de Glasgow entre
ácidos e bases fortes, álcoois), em substituição à
12 e 14, devem ser hospitalizadas para observação.
ipeca e à lavagem gástrica. Pode ser usado na
Nesses casos, um escore de Glasgow inferior a 12
dose de 1g/kg/dose (até de 4/4h, em ingestão de
indica alto potencial de deterioração neurológica,
carbamazepina, fenobarbital, salicilatos, fenitoína e
sendo necessária hospitalização em unidade de
teofilina), em suspensão a 25%. Novos produtos
tratamento intensivo e avaliação neurocirúrgica.
contendo carvão ativado em suspensão com gosto
de cereja têm aumentado a aceitação por parte das
ENGANO NO 6: Aplicar pomadas (ou outras soluções crianças, o que poderá tornar seu emprego factível
caseiras, como manteiga, pastas ou em casa.
pós) sobre áreas queimadas, negli-
genciando a hidratação adequada
ENGANO NO 8: Retardar a redução de uma subluxa-
e a analgesia.
ção da cabeça do rádio (pronação
Toda a área queimada deve ser imediatamente dolorosa).
encharcada com água fria (não usar gelo); retirar A conhecida “pronação dolorosa”, típica de crianças
toda a roupa que não estiver grudada na pele (se abaixo da idade pré-escolar com história de terem
for esse o caso, cortar o máximo de tecido livre); recebido puxão vigoroso do braço para cima, causa
cobrir a área queimada com uma toalha ou lençol muito desconforto e é fácil e rapidamente redutível,
molhado; não romper bolhas. trazendo alívio imediato e usualmente dispensando
Não aplicar pomadas, manteiga, pastas ou pós imobilização. A redução pode ser obtida pela flexão
caseiros, que só pioram a evolução da queimadura do cotovelo a 90°, seguida pela pronação e
e aumentam o risco de infecção. Queimaduras de supinação completas, com o polegar do socorrista
segundo grau, depois de adequadamente limpas mantido sobre a cabeça do rádio, o que permite
em um serviço de emergência, podem ser cobertas sentir um sobressalto no momento em que o ligamento
com uma camada fina de gaze vaselinada ou anular escorrega sobre a cabeça do rádio de volta
tratadas com sulfadiazina de prata a 1%. para sua posição normal. Se estas manobras não
trazem alívio imediato da dor, deve-se obter radio-
A analgesia é importante, mesmo por via oral, usan-
grafia de todo o braço em busca de fraturas.
do-se acetaminofen (20 mg/kg/dose) associado à
codeína (1 mg/kg/dose) em intervalos de seis horas.
ENGANO NO 9: Usar gelo por tempo insuficiente em
Indica-se hospitalização de qualquer criança com
caso de entorses ou distensão de
queimadura na face, mãos, pés ou períneo;
tecidos moles.
queimadura de segundo ou terceiro grau em mais de
10% da superfície corporal, queimadura elétrica ou A maioria das entorses e distensões em crianças
por inalação, acompanhada de fraturas ou ainda se apresenta resolução rápida mediante imobilização
houver suspeita de maus tratos. Logo após os cuidados moderada. O acrônimo “RICE” ajuda a lembrar
com a via aérea e prevenção do choque, deve-se repouso, gelo (“ice”), compressão e elevação.
iniciar hidratação com solução isotônica (soro Contudo, é importante ressaltar que a aplicação de
fisiológico ou Ringer lactato) a 20 ml/kg/hora. gelo deve ser imediata e durar pelo menos vinte
Analgesia (morfina, 0,05 a 0,1 mg/kg EV, ou fentanil, minutos, sob compressão.

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Segurança Infantil
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ENGANO NO 10: Solicitar radiografias desnecessá- ENGANO NO 12: Avaliar de modo inadequado a
rias para injúrias de tornozelo. possibilidade de reimplantação de
dentes arrancados.
Os traumatismos de tornozelo são muito freqüentes
em jovens, exigindo procedimentos mais A avulsão de um dente permanente requer imediato
conservadores e menos dispendiosos. A aplicação encaminhamento para reimplante, preferentemente
da “regra de Ottawa” (Stiell et al. JAMA dentro de trinta minutos, com manipulação cuidadosa
1994;271:827-32) é capaz de reduzir em até 16% do dente em questão. Pegar o dente pela coroa
a necessidade de radiografias de tornozelo, com (jamais tocar nas raízes) e lavá-lo abundantemente
100% de sensibilidade para fraturas significativas. com soro fisiológico, removendo materiais estranhos.
Realizar radiografia do tornozelo apenas se houver Irrigar o local da gengiva de onde foi arrancado o
dor na região maleolar acompanhada de dente, removendo coágulos, e inseri-lo de volta com
hipersensibilidade na parte posterior ou ponta de firmeza. Procurar atendimento especializado imedia-
qualquer dos maléolos ou incapacidade persistente tamente, solicitando à criança que mantenha o den-
de apoiar o peso sobre o pé envolvido. Da mesma te no lugar, mordendo um pedaço de gaze. Se
forma, somente realizar radiografia do pé se houver essas manobras não forem factíveis, manter o dente
dor na região média do pé acompanhada de imerso em soro fisiológico.
hipersensibilidade na base do quinto metatarsiano
ou no navicular ou incapacidade persistente de apoiar ENGANO NO 13: Não administrar antibiótico em
o peso sobre o pé envolvido. casos de mordida de animal que
causem injúrias de alto risco de
ENGANO NO 11: Menosprezar a anestesia tópica e infecção.
novas abordagens ansiolíticas ao
Antibiótico profilático deve ser administrado nas
tratar lacerações.
seguintes situações: vítima imunodeficiente, mordida
Lacerações pequenas (<7 cm) em áreas bem de gato, ferimento profundo de mordida de cão,
vascularizadas, como o couro cabeludo e a face, mordidas de mais de 12 horas, qualquer ferimento
podem ser reparadas com o uso de anestésicos difícil de limpar, qualquer mordida na mão, punho
tópicos. Um mistura bem estudada contém lidocaína ou pé. Em vista da associação freqüente entre
(2-4%), adrenalina (1:1000) e tetracaína (0,5-2%) Pasteurella multocida e Staphilococcus aureus, as
em gel ou solução, que pode ser instilada nas drogas de preferência têm sido cefalexina e
margens da laceração, além de aplicada sobre o amoxicilina-clavulanato.
ferimento com um “swab” de algodão por cerca de
15 minutos. Em vista do efeito vasoconstritor, é contra-
ENGANO NO 14: Não suspeitar e/ou reconhecer ca-
indicado seu uso em áreas de circulação arteriolar
sos de abuso (injúrias intencionais).
terminal, como dedos, pênis, nariz e orelhas. EMLA,
uma mistura de lidocaína e prilocaína, é outra Todo pediatra que atende uma criança vítima de
alternativa, particularmente efetiva em ferimentos de injúria física deve estar atento para a possibilidade
extremidades, mas exige aplicação entre 60 e 120 de abuso. Lembrar que nem sempre os fatores
minutos antes do procedimento. clássicos de alto risco (criança menor de 4 anos,
hiperativa ou retardada, prematura; pais muito jovens,
A ansiedade da criança frente a procedimentos pode
deprimidos ou drogados; família com problemas de
ser aplacada com novas preparações de
relacionamento ou econômicos, desemprego) são
medicamentos por via oral. Midazolam, na dose de
evidentes.
0,3 a 0,5 mg/kg, tem sido administrado diluído em
suco de laranja, com boa aceitação, obtendo-se Suspeitar de abuso sempre que houver um tipo de
efeito em cerca de vinte minutos. Já se encontra injúria física inconsistente com a história, pais
referência a um “pirulito de fentanil”, com gosto de relutantes em dar informações ou confusos sobre como
framboesa, nas concentrações de 100 a 400 µg (a ocorreu o trauma, criança muito imatura para um
dose oral recomendada é 10 a 15 µg/kg), que tem determinado tipo de injúria supostamente auto-
sido muito bem tolerado, com baixa incidência de infligida, atraso em buscar auxílio médico. É
depressão respiratória. importante conhecer sinais indicativos de trauma

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Segurança Infantil
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intencional, tais como hemorragias retinianas, 02 - Blank D. Controle de acidentes e injúrias físicas na infân-
cia e na adolescência. In: Costa MCO, Souza RP, eds.
equimoses antigas ou com graus variados de Avaliação e cuidados primários da criança e do adoles-
evolução, queimaduras com bordos definidos e cente. Porto Alegre: ArtMed; 1998. p.235-42.
distribuição uniforme, marcas específicas (mordida, 03 - Committee on Injury and Poison Prevention. American
corda, cinto, cigarro), lesões traumáticas nas costas, Academy of Pediatrics.Injury prevention and control for
children and youth. 3rd ed. Elk Grove Village, IL: AAP;
queimaduras nas palmas e solas, equimoses bilaterais 1997.
com marcas de dedos, fraturas ósseas com idades 04 - Garcia PCR, Carvalho PRA, Bruno F. Trauma pediátrico.
diferentes, fraturas metafisárias. In: Piva JP, Carvalho PRA, Garcia PCR, eds. Terapia
intensiva em pediatria. 4a ed. Rio de Janeiro, RJ: MEDSI;
Trauma craniano não acidental costuma ter 1997. p.306-20.
prognóstico pior, até porque pode ser repetitivo em 05 - Goldstein B, Powers KS. Head trauma in children. Pediatrics
in Review. 1994;15:213-9.
até 20% dos casos. A presença de hematoma
subdural na região intra-hemisférica posterior sem 06 - Huurman WW, Ginsburg GM. Musculoskeletal injury in
children. Pediatrics in Review. 1997;18:429-40.
história de impacto traumático significativo é
07 - Knapp JF. What’s new in pediatric emergency medicine.
patognomônico de maus tratos graves. Pediatrics in Review. 1997;18:424-8.
08 - Mofenson HC, Greensher J. Pediatric basic and advanced
life support. In: Hoekelman RA, Friedman SB, Nelson NM,
Seidel HM, Witzman M, Wilson M, eds. Primary pediatric
Bibliografia selecionada: care. 3rd ed. St. Louis, MO: Mosby; 1997. p.1783-98.
09 - Schiff D, Shelov SP. Basics of first aid. In:Id, eds. American
01 - Barkin RM, Rosen P. Emergency pediatrics: A guide to Academy of Pediatrics guide to your child’s symptoms.
ambulatory care. 5th ed. St. Louis, MO: Mosby; 1999. New York, NY: Villard; 1997. p.199-219.

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Segurança Infantil
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Otorrinolaringologia Pediátrica
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Deficiência Auditiva
MANOEL DE NÓBREGA

A maturação das vias auditivas começa na vida consciência silábica e fonêmica, coesão auditiva
fetal e se completa no período de vida pós-natal por (interferências, abstrações, metáforas).
volta dos dois anos de idade. Corresponde ao
Os princípios da aprendizagem podem ser assim
período de maior plasticidade das vias auditivas.
definidos:
Quanto maior a riqueza de estímulos auditivos
recebidos, maior número de conexões entre as • Modalidade de Aprendizagem: três dos cinco
diferentes vias (auditivas e não auditivas) irá formar. sentidos - visão, audição e sentido táctil-cinestésico-
Pelo contrário, quanto maior for a privação auditiva, são primariamente utilizados no aprendizado,
menor número de conexões irá formar. Essa maturação colaborando com seus inputs, para o armazenamento,
irá desempenhar importante papel na aquisição e memorização e resgate dos dados;
desenvolvimento da fala e da linguagem. • Ambiente para o aprendizado: fatores interferentes
Os aspectos da estrutura da linguagem - fonologia, – ruído, iluminação, localização, hora do dia e
semântica e sintaxe - apresentam diferentes épocas movimento;
de maturação. Estas épocas correspondem ao
• Força de retenção: em geral, aprendemos 10% do
período de máxima plasticidade do sistema auditivo
que lemos, 20% do que escutamos, 30% do que
(“janelas”). A especialização mais precoce é a
vemos, 50% do que vemos e escutamos, 70% do
fonológica, quando ao final do primeiro ano de
que falamos enquanto trocamos idéias sobre o objeto
vida ocorre uma limitação no repertório de fonemas
de interesse e, 90% do que falamos enquanto
que podem ser discriminados. A especialização
fazemos uma coisa e falamos sobre ela (EKEVALL,
semântica ocorre até os 4 anos de idade e a sintática
E.E. & OSWALD, L.D., 1971 – Rx reading program
não será fixada antes dos 20 anos de idade. O
– teacher’s manual);
amadurecimento da semântica e da sintaxe é
dependente do input sensorial precoce. O input • Memória: curto termo, longo termo;
sensorial precoce, lingüisticamente organizado, irá • Aprendizagem preferencial: recrutando técnicas de
resultar no desenvolvimento de linguagem sofisticada, habilidades peculiares do hemisfério esquerdo e/ou
funcional. A privação precoce resultará em prejuízo direito.
deste desenvolvimento.
As perdas auditivas mínimas - limiar auditivo entre
A deficiência auditiva (DA), temporária ou definitiva, 16 a 25 decibéis (dB) high level (HL) - que ocorrem,
mesmo em graus de intensidade mínimos, já pode por exemplo, nas otites médias secretoras, já podem
prejudicar o desempenho da fala, da linguagem e interferir no desempenho escolar da criança. Crianças
do desenvolvimento intelectual e comportamental da com limiar auditivo de 15 dB HL podem perder até
criança. 10% do sinal auditivo quando o professor está a
A criança deve não apenas ouvir normalmente, mas mais de um metro de distância ou quando a sala de
processar corretamente a informação auditiva num aula é ruidosa. Isto é particularmente importante,
nível superior de consciência. Tais processamentos especialmente nos primeiros anos de vida em que a
auditivos centrais estão centrados nas capacidades instrução verbal predomina. Com limiares auditivos
de atenção auditiva, figura fundo-auditiva, fechamento de 30 dB HL, a criança já pode perder de 25 a
auditivo, discriminação auditiva, memória auditiva, 40% do sinal auditivo; limiares de 35 a 40 dB HL

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Otorrinolaringologia Pediátrica
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perdem até 50%; limiares de 50 dB HL perdem de então é testar a audição de todas as crianças, sadias
80 a 100% do sinal da fala. Por outro lado, quando ou não, com fatores de risco para surdez ou não,
a amplificação obtida através da utilização do objetivamente, de preferência antes da alta pós-parto.
aparelho de amplificação sonoro individual (a Tal iniciativa tem como objetivo a reabilitação precoce
“prótese auditiva”) está otimizada, a criança com a fim de minimizar o déficit na aquisição e
perda auditiva de até 90 dB HL pode identificar desenvolvimento da fala e da linguagem.
sons ambientais e detectar praticamente todos os Quando existir a suspeita de deficiência auditiva, o
sons da fala. Isto significa que a DA é grave mas pediatra deve sempre encaminhar a criança para
pode ser compensada. O fundamental é a detecção uma avaliação otorrinolaringológica e audiológica
precoce. Quanto mais tempo levarmos para detectar criteriosa. Toda e qualquer avaliação feita no próprio
uma DA, mais “janelas” do desenvolvimento da fala consultório pelo pediatra trará poucos benefícios
e linguagem já estarão “fechadas”. Isto resultará em práticos para a sua reabilitação. A avaliação auditiva
importante atraso da aquisição da fala e linguagem, pode ser feita basicamente através de dois tipos de
com grave impacto no desenvolvimento intelectual avaliação: subjetiva e a objetiva. Na avaliação
da criança e suas relações com o meio que a cerca. subjetiva, as respostas obtidas dependem da
Em 1972, as Academias Americanas de Pediatria, colaboração da criança examinada. Os métodos
Otorrinolaringologia, Audiologia dentre outras, de testagem são divididos de acordo com a idade.
formaram o “JOINT COMMITTEE ON INFANT Nos casos em que houver dúvida ou que não se
HEARING” para facilitar e normatizar a suspeita e o consiga obter um limiar auditivo confiável, deve-se
diagnóstico precoce da DA, criando os chamados utilizar os métodos objetivos, que independem das
Fatores de Risco para a DA. Os resultados respostas ou da colaboração da criança.
apresentados em 1990 após a aplicação dos Fatores A reabilitação da criança portadora de DA deve
de Risco para a DA revelavam detecção apenas de utilizar todos os canais de comunicação e
50% dos casos de surdez. A outra metade aprendizagem: visual, auditivo e táctil-cinestésico. A
praticamente não apresentava nenhum risco para a reabilitação auditiva deverá ser feita através da
DA mas apresentava surdez. Concluiu-se que a utilização do aparelho de amplificação sonoro
aplicação dos Fatores de Risco isoladamente não individual (um para cada orelha afetada), tentando
estava trazendo o benefício de detecção precoce compensar, se não totalmente, pelo menos parte da
esperado. Em 1994 surge a visão e a missão de audição, fundamental para o desenvolvimento da
detecção universal da DA. O objetivo a partir de criança.

Manejo do Respirador Bucal


MARCOS MOCELLIN

A cabeça do recém-nato corresponde a um quarto


INTRODUÇÃO:
do tamanho do corpo, chegando na puberdade a
É comum a suposição de que a função naso- um oitavo do corpo. Isto mostra que as partes do
respiratória está diretamente ligada ao nosso organismo crescem em diferentes velocidades
desenvolvimento dentofacial. Todo paciente com nas várias fases da vida. Como a face faz parte da
obstrução nasal crônica pode tornar-se um respirador cabeça e sua maior velocidade de crescimento ocorre
bucal ,o que normalmente leva à alteração na face, nos primeiros dez anos de vida, devemos propiciar
principalmente durante a fase de crescimento. as melhores condições para que este desenvolvimento

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Otorrinolaringologia Pediátrica
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se processe da maneira mais harmônica possível, • Hipertrofia amigdaliana: Quando os pólos


sendo que a obstrução nasal constitui uma das causas superiores das amígdalas palatinas estão aumentados
mais freqüentes na alteração do mesmo. a ponto de se encontrarem na linha média, elas
obstruem o fluxo nasal, podendo ainda levar à
As causa de obstrução nasal são muitas, mas a
dificuldade de ingestão de alimentos sólidos. O
hipertrofia das vegetações adenóides é sempre
tratamento é cirúrgico.
descrita como a grande causadora desta patologia,
formando o chamado “fáscies“ adenoideano que, • Rinite alérgica: Depois da hipertrofia adenoideana
na verdade, freqüentemente tem outras causas, como ,é a principal causa de obstrução nasal. Caracteriza-
a rinite alérgica , o desvio septal , a hipertrofia das se por obstrução nasal, rinorréia (coriza), crises
amígdalas palatinas e os pólipos nasais. Temos esternutatórias(espirros) e prurido nasal intenso. Exames
notado que muitas crianças são rotuladas como complementares confirmam o diagnóstico e o
adenoideanas, apresentando grandes deformidades tratamento é medicamentoso.
faciais e nada é feito para corrigi-las , algumas
• Desvio de septo nasal: luxação no parto, o
vezes por falta de conhecimento dos pais, ou por
aprendizado para andar, as brincadeiras e o esporte
culpa dos médicos ou odontologistas, que não alertam
são causas de traumatismo nasal, com conseqüente
para o problema.
desvio de septo. O diagnóstico é feito através da
história de obstrução nasal, sem antecedentes
alérgicos e sem hipertrofia das vegetações adenóides.
CAUSAS DE OBSTRUÇÃO NASAL O exame ORL , com rinoscopia anterior confirma o
Dividimos as principais causas de obstrução nasal diagnóstico. Quando a obstrução é total , a cirurgia
de acordo com a faixa etária: pode ser feita; se for parcial, deve-se aguardar a
idade adulta.
A) Recém-nato: O diagnóstico deve ser feito • Hematoma do septo nasal: Um trauma nasal pode
no berçário. provocar hematoma no septo nasal. O diagnóstico
• Atresia de coanas: É a principal causa , sendo o é feito com a história de obstrução progressiva ,
fechamento da parte posterior do nariz por uma horas após o trauma, e a rinoscopia anterior mostrará
membrana mucosa ou placa óssea . Este fechamento, o abaulamento do septo . O tratamento é a drenagem
quando bilateral, não permite a passagem de ar cirúrgica o mais breve possível. Se não for drenado,
para a rinofaringe , causando obstrução nasal total o hematoma poderá se transformar em abscesso ,
com risco de vida para a criança , que nos com destruição da cartilagem, septal, levando ao
primeiros dias de vida tem grande dificuldade para nariz em sela.
respirar pela boca. O diagnóstico é feito através do
• Fratura nasal: Assim como os desvios de septo , a
RX contrastado e o tratamento cirúrgico deve ser
fratura dos ossos próprios do nariz ocorre no dia-a-
realizado o mais breve possível.
dia da criança, porém esta fratura é bem menos
• Tumores nasais: São patologias que podem estar freqüente, pois necessita de um trauma mais forte. O
aparentes ou intra-nasais. Existem os tumores diagnóstico é feito através da criptação dos ossos
neurogênicos (meningoencefalocele, glioma nasal), e edema dos olhos e o tratamento é a redução nas
os tumores ectodérmicos (cisto dermóide, primeiras horas ou sete dias após o trauma, quando
epidermóide, sebáceo,ducto nasolacrimal, etmoidal o edema estiver desaparecendo.
e papiloma) e os mesodérmicos (hemangiomas).
• Corpos estranhos: Secreção nasal unilateral fétida,
B) Infância: na grande maioria das vezes, significa corpo estranho
na fossa nasal. A retirada deve ser feita com
• Hipertrofia adenoideana: É a grande causadora
instrumentos adequados para cada tipo de corpo
da obstrução nasal. Consiste no aumento de tecido
estranho.
linfóide existente na rinofaringe com diminuição do
espaço para a passagem de ar. A história clínica • Rinite vestibular: Infeção na região dos pêlos da
é de ronco e salivação noturna, o diagnóstico é fossa nasal é muito comum, pois as crianças tem o
feito com RX de cavum ou nasofibroscopia e o hábito de colocar o dedo no nariz, provocando
tratamento é cirúrgico. infeções. O diagnóstico é feito através de inspeção

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Otorrinolaringologia Pediátrica
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(edema) e palpação( dolorosa).O tratamento ém feito isso a resistência interna da face, com conseqüências
com antibioticoterapia e compressas quentes. como estreitamento do terço médio, alongamento da
face e retro-posicionamento da mandíbula, levando
C) Puberdade: ao conhecido “fáscies adenoideano”. A flacidez da
• Angiofobroma juvenil: É um tumor benigno com musculatura da boca leva à deformidade dos lábios.
características invasivas. É raro nas mulheres,
• Deformidade torácica e cor pulmonale:
aparecendo na grande maioria em meninos na
A hipertrofia exagerada de amígdalas e adenóides
puberdade. O diagnóstico é feito pela história de
leva a criança a um esforço muito grande para
obstrução nasal progressiva e sangramento de
respirar, exigindo movimentação intensa do tórax para
repetição. Na rinoscopia anterior observamos uma
vencer a resistência anatômica que bloqueia o fluxo
massa e, na tomografia computadorizada, avaliamos
de ar. Com o passar dos anos a deformidade torácica
sua extensão. O tratamento é sempre cirúrgico.
aparece e nos casos mais graves pode chegar a ter
• Pólipo nasal: É uma massa multilobulada que se uma área cardíaca aumentada (cor pulmonale).
forma na fossa nasal, com crescimento progressivo
da obstrução. Está relacionada a pacientes alérgicos. • Apnéia noturna:
O tratamento pode ser feito com corticóides, porém A hipertrofia amigdaliana é o grande causador desta
o resultado é temporário, sendo então indicada a doença, tão importante e tão estudada nos dias
remoção cirúrgica. atuais. As conseqüências são muito mais graves do
que se imaginava, como sonolência diurna,
• Rinite medicamentosa: É a complicação devido ao irritabilidade e enurese noturna.
uso de vasoconstritores nasais tópicos. Depois de
algum tempo, a hipertrofia dos cornetos é irreversível. Os estudos recentes mostram deficiência de
O tratamento é a tentativa de tirar-se o hábito do uso crescimento com diminuição de liberação deste
de gotas nasais, porém, nos casos rebeldes, a cirurgia hormônio, diminuição do QI. e outras alterações
estará indicada (turbinectomia parcial). ainda em estudos.

• Desvio de septo nasal: A incidência aumenta muito


nesta fase. O diagnóstico e tratamento já foram
citados anteriormente.
COMENTÁRIOS:
• Rinite alérgica: É pouco comum aparecerem os
sintomas apenas nesta fase. Normalmente, os As complicações da respiração bucal são uma
alérgicos são identificados logo nos primeiros anos, realidade. Como foi descrito não são poucas e não
quando os sintomas aparecem. são simples.

• Hipertrofia adenoideana: Nesta fase já estão em A alteração do fluxo aéreo do nariz para a boca
regressão, sendo muito raro um jovem apresentar merece uma importância maior do que é dada
obstrução nasal, porém, quando acontecer, o normalmente por alguns pediatras, ortodontistas,
tratamento é cirúrgico. fonoaudiólogos e otorrinolaringologistas. Observamos
com freqüência colegas deixarem uma criança
• Hipertrofia amigdaliana: Como as vegetações chegar à puberdade com respiração bucal, por
adenóides ,é raro um jovem apresentar obstrução desconhecimento das complicações ou por
nasal; porém, quando acontecer, o tratamento é radicalização na contra-indicação.
cirúrgico.
A nossa responsabilidade cresce quando lembramos
que as deformidades faciais alterações de linguagem,
CONSEQÜÊNCIAS DA alterações oclusivas, toráxicas , apnéia noturna são
freqüentes nestes pacientes. Pediatras, otorrinolarin-
RESPIRAÇÃO BUCAL:
gologistas, fonoaudiólogos e ortodontistas devem
• Deformidades faciais: A respiração bucal exige trabalhar em conjunto, procurando diagnosticar e
que a língua não encoste no palato, tirando com tratar adequadamente o adulto de amanhã.

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Otorrinolaringologia Pediátrica
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Estomatites na Infância
LUC WECKX

Estomatite é uma denominação genérica que Dentre as ESTOMATITES INFECCIOSAS as mais


corresponde a qualquer processo inflamatório da freqüentes são as VIRAIS, geralmente com início
mucosa bucal. Antes de receitar bochechos, agudo, febre e erosões pós vesiculosas na boca
gargarejos, antifúngicos e outros medicamentos, o e a CANDIDÍASE, na qual mais importante que
profissional de saúde deveria se preocupar em tentar tratar é tentar saber por qual motivo ela se instalou
estabelecer a etiologia da estomatite, para depois (uso de antibiótico ou corticóide, imunodefi-
recomendar o tratamento apropriado. ciências).
As causas mais freqüentes de estomatites encontram- Às vezes, a estomatite pode ser a primeira ou a
se no quadro a seguir. Dentre elas, a HIGIENE BUCAL única manifestação de uma DOENÇA SISTÊMICA,
DEFICIENTE por má escovação dentária é como por exemplo leucemia, anemia e
responsável pelo acúmulo e fermentação de restos imunodeficiências primárias ou adquiridas.
alimentares entre a gengiva e os dentes, ocasionando
Frente à uma estomatite de difícil diagnóstico
a doença periodontal.
etiológico, pensar na criança em FATORES
O ERITEMA MULTIFORME inicia com febre, cefaléia, IRRITANTES ou traumáticos, e às vezes até em auto-
artralgia, lesões bucais que predominam nos lábios, agressões. Por outro lado, as AFTAS continuam sendo
os quais ulceram-se e sangram com facilidade. Em de etiologia desconhecida, transformando-se às
50% dos pacientes encontra-se um fator predisponente, vezes em causa de sofrimento para crianças e
como uso de medicação ou infecções prévias. adolescentes.

Quadro - Estomatites na Infância


Etiologias mais Freqüentes

• HIGIENE BUCAL DEFICIENTE


• ERITEMA MULTIFORME
por drogas, por infecções
ou sem fator predisponente
• INFECÇÕES
– VIRAIS
– Herpes Simples
– Herpes Zoster
– Coxackie A
– Verrugas ou Papilomas
– CANDIDÍASE
– LUES
• DOENÇAS SISTÊMICAS COM REPERCUSSÕES BUCAIS
– LEUCEMIA
– CARENCIAL
– IMUNODEFICIÊNCIAS:
Congênita
Adquirida
Drogas Imunosupressoras
• FATORES IRRITANTES
• AFTA
• IDIOPÁTICA

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 43


Otorrinolaringologia Pediátrica
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Diagnóstico e Tratamento das Amigdalites Agudas


JOÃO GILBERTO SPROTTE MIRA

As amígdalas palatinas, linguais, faríngeas ou na vigência do uso de ampicilina aparece um rash


adenóides são pequenas porções de tecido linfóide cutâneo. Há impressão de que existe uma diminuição
localizadas na parede posterior da faringe, formando provisória da imunidade da criança pós
o anel linfático de Waldeyer. São elementos de mononucleose por um período de 3 a 6 meses,
defesa e produzem as imunoglobulinas IgA, IgG, onde ocorre maior número de infecções. O
IgM, IgE e IgD. diagnóstico clínico é confirmado pela linfocitose
atípica e IgG e IgM positivas. A reação de Paul
As amigdalites agudas são patologias muito frequentes
Bunnel Davidson apresenta alta porcentagem de
na clínica diária, podendo ser obstrutivas ou
negatividade em crianças.
infecciosas. O agente infeccioso pode ser um vírus
ou uma bactéria, mais raramente um fungo. • Sarampo - causado pelo paramixovírus, pode
causar uma amigdalite eritematosa, sendo que a
Os vírus representam 85% dos agentes infecciosos e
presença do sinal de Koplik faz o diagnóstico.
as bactérias em torno de 15%. O diagnóstico das
amigdalites é clínico, caracterizando-se por dor de • Angina diftérica - causada pelo Corynebacterium
garganta, febre alta, astenia, dores musculares, diphteriae, sendo rara atualmente devido à cobertura
cefaléia, artralgias, disfagia, dor abdominal e vacinal.
aumento dos linfonodos cervicais
• Herpangina - é provocada pelo vírus Coxsackie,
Gostaria de chamar atenção para algumas situações com quadro semelhante ao herpes simples, atingindo
clínicas atípicas, onde predominam a dor abdominal toda a cavidade oral. Quando o agente é o
por adenite mesentérica, semelhante a um abdomen Coxsackie A 16, caracteriza a doença “mão-pé-
agudo, ou dor em membros inferiores com artralgia boca”, com presença de lesões vesiculosas nestes
importante, semelhante a febre reumática. Apesar locais.
das provas inflamatórias estarem elevadas nesta
• Angina de Plaut-Vincent - é causada pela
situação, o fato de ocorrer artralgia na vigência da
associação de bacilos fuso-espirilar; é geralmente
infecção afasta a possibilidade de febre reumática
unilateral.
e caracteriza uma artrite reacional.
• Escarlatina - é causada pelo estreptococos beta
Nas amigdalites agudas, ocorre o uso extremamente
hemolítico do grupo A, sendo nefritogênico, podendo
alto de antibióticos em infecções virais, situações
complicar com glomerulonefrite difusa aguda.
estas nas quais eles poderiam ser dispensados, sem
Necessita tratamento com antibióticos.
comprometer a criança e a evolução da doença.
Este uso sem base científica e sem necessidade vem
aumentando a resistência dos patógenos das vias
COMPLICAÇÕES DAS AMIGDALITES
respiratórias.
As complicações podem ser do tipo infecciosas ou
Em relação ao diagnóstico diferencial entre as
inflamatórias.
amigdalites ou anginas, gostaria de comentar algo
sobre as denominadas amigdalites ou anginas Exames complementares - o importante é saber se a
específicas: etiologia é estreptocócica. Para tal, pedimos cultura
ou usamos um teste rápido para detectar o antígeno
• Mononucleose - causada pelo vírus Epstein Barr,
bacteriano, através da reação com anticorpo e
produz uma amigdalite que confunde com uma
verificação de aglutinação. Tem especificidade de
amigdalite bacteriana, pois as amígdalas apresentam
90%, porém o problema é o custo-benefício.
uma membrana pultácea, adenopatia cervical bilateral
e hepatoesplenomegalia. Muitas vezes ocorre Uma complicação que deve ser lembrada é a
obstrução importante das vias aéreas superiores e convulsão febril.

44 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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A Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância


ANTÔNIO PAIXÃO E SANDRA GRISI

INTRODUÇÃO no período perinatal - causa de mais difícil intervenção


- convivemos ainda com uma morbi-mortalidade
Com uma extensão territorial de 8,5 milhões de km2 elevada por doenças do subdesenvolvimento, como
e com uma população de cerca de l60 milhões de as pneumonias, diarréias, desnutrição e, na Região
habitantes, dos quais 16 milhões são crianças Norte, a malária.
menores de 5 anos, o Brasil caracteriza-se por
Das 559.003 internações do SUS, das crianças
grandes diferenças regionais, entre as suas
menores de 05 cinco anos, no período de janeiro
macrorregiões geográficas - Sul, Sudeste, Nordeste,
a abril de 1999, 349.067, foram por doenças
Norte e Centro-Oeste - tanto em relação à densidade
infecciosas/parasitárias (diarréia, desidratação, etc.),
demográfica, quanto às condições sociais econômicas
e do aparelho respiratório (pneumonia, broncopneu-
e de saúde de população.
monia, etc.) – SIH/SUS.
No Brasil, encontramos taxas de mortalidade infantil
Em resposta a este problema, a OPS/OMS e a
que variam de 22/l000nv na Região Sul até
agência dos Estados Unidos da América para o
60/1000nv na Região Nordeste. Nos municípios
Desenvolvimento Internacional (USAID), tem auxiliado
mais pobres do país, identificados como municípios
os países na adaptação das normas para o
de risco, para a saúde infantil, estas taxas podem
tratamento de casos por meio da estratégia da
ultrapassar 100/1000nv, refletindo as condições
Atenção Integrada às Doenças Prevalentes na Infância
extremamente adversas em que vivem uma parcela
(AIDPI), como um dos principais instrumentos
importante das crianças brasileiras.
disponíveis para o controle do problema.
Em relação aos países em desenvolvimento, estima-
Segundo o relatório sobre Desenvolvimento Mundial,
se que desde 1990 sessenta milhões de crianças
de 1993, a AIDPI é uma das intervenções sanitárias
morreram antes de completar cinco anos de idade.
de maior custo/eficiência tanto nos países de baixa
Destas, quarenta e dois milhões morreram de diarréia,
renda como de renda média.
pneumonia, sarampo e malária, o que corresponde
a 70% do total de óbitos. A desnutrição esteve 1 – A elaboração da estratégia parte da análise e
presente como causa associada em mais da metade identificação de:
das mortes, tanto nos casos acima referidos quanto
– Principais causas de mortalidade em menores de
naqueles ocorridos em 1995.
05 anos e daquelas que não representando um
Na região da Américas, estas cinco patologias número elevado de óbito, podem ser evitadas
representam metade das mortes em menores de cinco mediante o uso de condutas de controle disponíveis.
anos, e entre elas as Infecções Respiratórias e a – Principais causas de consulta e hospitalização em
Diarréia são responsáveis por mais de 40% dos menores de 05 cinco anos.
óbitos.
– Principais estratégias e intervenções disponíveis
No Brasil, apesar dos avanços conseguidos, o atual para a prevenção das doenças e a promoção de
perfil da Saúde Infantil representa ainda um grande hábitos saudáveis de vida para a família, contribuindo
desafio. Se por um lado observamos uma maior desta forma para uma melhor qualidade da saúde
proporção relativa de óbito por afecções originadas infantil.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 45


Cuidados Primários
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2 - A atenção que atualmente é prestada às crianças – Reduzir o número e a gravidade destas doenças.
na maioria dos serviços de saúde, tem as seguintes
– Melhorar a qualidade da atenção à criança nos
características:
Serviços de Saúde, diminuindo o uso de tecnologia
– Esta focalizada no motivo de consulta. diagnostica e tratamento inadequado.

– Não contempla a sistemática aplicação de medidas – Introduzir medidas de promoção e prevenção na


preventivas e de promoção: em geral por fatores rotina de atendimento das crianças.
diversos não se dedica tempo durante a consulta
– Expandir a atenção integrada ao nível comunitário.
para revisar a vacinação, o estado nutricional (cartão
da criança) e não se aproveita para oferecer aos
país ou acompanhantes informações sobre a
COMPONENTES PRINCIPAIS
prevenção das doenças e os cuidados adequados
com a criança em casa. DA AIDPI
– Não inclui o seguimento e controle posterior da – Aperfeiçoamento dos profissionais de Saúde no
evolução da doença: a verificação do resultado do atendimento dos casos, com a utilização de normas
tratamento não se realiza, os pais não recebem padronizadas no treinamento em serviço, assim como
estímulo posterior para completar o tratamento e para no acompanhamento, supervisão e avaliação;
aplicar as medidas de prevenção e promoção de – Desenvolvimento das práticas familiares e
saúde infantil. comunitárias, na certeza de que a participação da
família é imprescindível na implantação da AIDPI;
3 - Principais problemas observados na atenção
oferecida pelos serviços de saúde: – A melhoria do Sistema de Saúde, com a
disponibilidade de medicamentos, organização de
– Falta de Organização dos Serviços: que determina serviço e de políticas que permitam a implantação
uma sobrecarga, longas esperas (filas), falta de da proposta nos diversos níveis de atenção e na
prioridade segundo a gravidade de caso, e escasso implantação ou implementação do sistema de
e difícil acesso a referência. referência e contra referência.
– Falta de precocidade na consulta por parte dos
pais: que fazem com que as crianças apresentem
quadros graves, de vários dias de evolução. Isto
VANTAGENS DA AIDPI:
ocorre devido a falta de conhecimento dos sinais de – Avalia os principais problemas de saúde dos
alarme que devem ser utilizados para a procura menores de 5 anos.
urgente dos serviços de saúde.
– Incorpora de forma sistemática as medidas de
– Excessivo e inadequado uso de tecnologias para prevenção e promoção da saúde infantil.
o diagnóstico: o laboratório e a radiologia são
– Atende as demandas da população, ao contribuir
utilizados em excesso, e grande parte dos resultados
para recuperação da saúde da criança e a reduzir
não são utilizados para o diagnóstico e tratamento.
o número de episódios ou complicações das
– Excessivo e inadequado uso de medicamentos para enfermidades.
o tratamento: principalmente antibióticos, anti- – Garante um importante impacto nos indicadores
diarreicos e xaropes para tosse. de saúde (morbi-mortalidade, internações, etc.).
– Hospitalização desnecessária: para o tratamento – Adequada relação custo-beneficio, otimizando deste
de muitos casos de IRA e diarréia. modo o uso dos recursos, que podem destinar-se
para a melhora global das condições de vida.
– Melhora a equidade, colocando a disposição de
OBJETIVOS PRINCIPAIS DA AIDPI todas as crianças um conjunto de medidas básicas
–- Reduzir a mortalidade pelas doenças prevalentes que contribuem para reduzir a diferencia dos
em menores de 5 anos, especificamente devidas a Indicadores de Saúde, entre os países desenvolvidos
infeções respiratórias agudas, diarréias, e desnutrição. e os em desenvolvimento.

46 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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CAPACITAÇÃO DE RECURSOS alimentação e retorno ao serviço, e finalmente, a


reavaliação do caso e atenção apropriada a ser
HUMANOS dado na consulta de retorno.
– Os treinamentos conduzidos pelos Programas
Pode-se concluir que a capacitação de Recursos
Nacionais de vários países reservam material
Humanos (RH) engloba diversas abordagens e saber:
instrucional específico para cada doença. A
integração das normas clínicas já existentes Abordagem para Capacitação de RH
possibilitou que esta nova abordagem contemplasse
a criança como um todo, no contexto da família e
da comunidade.
MANEJO DA CRIANÇA DOENTE
O método usa um pequeno número de sinais clínicos
– A capacitação dos Recursos Humanos necessários
para avaliar, classificar e tratar a criança. A
para a implantação da AIDPI utiliza os princípios
identificação dos sinais clínicos é baseada em graus
dos programas desenvolvidos nos serviços de saúde,
de sensibilidade e especificidade.
incorporando a estes as práticas que compõem a
atenção integrada. Avaliar a criança
– Verificar sinais de perigo
Programas e Atividades que se beneficiam com o – Tosse /dificuldade para respirar
AIDPI – Diarréia
A capacitação dos recursos humanos para a – Febre
implantação da AIDPI é baseada em condutas que
– Problema de ouvido
incluem informações sobre: avaliação dos sinais e
– Anemia e desnutrição
sintomas das crianças, o seu estado nutricional e
calendário de vacinação; classificação da doença , – Estado de vacinação
identificando o tratamento e referência se necessário; Esta avaliação permite o manejo de caso dos 5
tratamento prévio ao encaminhamento de maior principais causas de doença na criança no mundo:
complexidade; aconselhamento à mãe ou Doença Respiratória, Diarréia, Sarampo, Malária,
acompanhante; administração de tratamentos Desnutrição e condições comummente associadas, e
específicos em casa com recomendações sobre ainda meningite e sepse.

Classificar a doença:

Forma Grave de Doença

Forma Moderada da Doença

Forma Leve da Doença

Identificar e Tratar a Criança

Referir ao Hospital após Tratamento Inicial

Tratamento Domiciliar

Orientação com ou sem Medicação

Aconselhar a mãe ou acompanhante Atualmente na estratégia da AIDPI, não esta incluído


– Alimentação da criança o atendimento de crianças menores de 7 dias, isto
– Administração de líquidos porque, durante a primeira semana de vida os recém-
– Cuidados gerais com a criança nascidos, com freqüência padecem de doenças
– Quando retornar imediatamente relacionadas com o trabalho de parto e com o parto.
– Quando retornar para seguimento Seus problemas necessitam de atenção especial e
– Cuidados sobre sua própria saúde. por este motivo não costumam ser referidas para as

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 47


Cuidados Primários
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unidades básicas de saúde, entretanto, devido ao e do município de São Paulo, sempre envolvendo
predomínio das causas perinatais na Mortalidade prioritariamente as equipes do PACS/PSF, sendo
Infantil, também nos países em desenvolvimento, a realizado neste ano a capacitação dos
Organização Mundial da Saúde, esta preparando coordenadores dos Polos de Capacitação do
material instrutivo especifico da primeira semana de Programa de Saúde da Família.
vida, para a sua incorporação na Atenção Integrada
Iniciou-se, também o trabalho de acompanhamento
às Doenças Prevalentes na Infância.
e avaliação pós capacitação na estratégia AIDPI,
que definiu critérios e ações necessárias ao processo
de seguimento da implementação da AIDPI no Brasil,
HISTÓRICO DA IMPLANTAÇÃO utilizando-se para isto indicadores de processo e de
NO BRASIL impacto na saúde infantil.
Em 1996, a viabilidade de implantação da AIDPI no
Classificação dos Estados, segundo a situação de
Brasil, foi discutida e aprovada por técnicos dos
implantação do AIDPI:
diferentes Programas do Ministério da Saúde, consultores
da Sociedade Brasileira de Pediatria, Universidades, 1 – Em face avançada: Ceará, Pará, Pernambuco e
técnicos das Secretarias Estaduais e Municipais de Sergipe.
Saúde e da OMS/OPS, UNICEF, BASIC/USAID. 2 - Em face intermediária, ou seja em processo de
implantação contando com facilitadores e tendo
Dando seguimento a essa reunião aconteceram 2
realizado pelo menos um curso: Bahia, Distrito
Oficinas de Trabalho, onde foi finalizada a
Federal, Paraíba, São Paulo, Rondônia e Tocantins.
adaptação do material da AIDPI á realidade
epidemiológica brasileira e às normas nacionais. 3 – Em face inicial, ou seja, contando com
facilitadores e com curso programado ou em
Após essa etapa em 1997, foram realizados 2 perspectivas de implantação: Alagoas, Amazonas,
Cursos Nacionais Sobre AIDPI, para a formação de Espirito Santo, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso,
53 multiplicadores, que participaram de diversos Paraná, Rio Grande do Norte e Roraima.
treinamentos e da implantação dessa estratégia no
país. Neste ano, foram realizados cursos locais nos No momento os maiores desafios para a estratégias
Estados que aderiram inicialmente a esta estratégia, da AIDPI, são:
Pernambuco, Sergipe, Pará e Ceará, totalizando 151 – Pressão para a sua expansão, mesmo nos Estados
profissionais de nível superior treinados. ou municípios que tem uma taxa de mortalidade
Devido às características desta estratégia, sua infantil superior a 40/l000nv, e para isto, existe a
implantação foi priorizada inicialmente para os necessidade de recursos financeiros suficientes para
municípios com mortalidade acima de 40/1000nv, capacitação de recursos humanos.
iniciando-se com os municípios do Projeto de Redução – Assegurou a qualidade de todos as atividades,
da Mortalidade na Infância e com os Programas dos procurando garantir primeiro as visitas de seguimento
Agentes Comunitários de Saúde e Programa Saúde para cada curso, para cada profissional capacitado.
da Família PACS/PSF.
– Enfatizar a necessidade da melhora dos serviços
Em outubro de 1997, a Sociedade Brasileira de de saúde. Assegurar que todos os medicamentos
Pediatria, ao organizar XXX Congresso Brasileiro no da AIDPI estejam na lista de medicamentos essenciais
Rio de Janeiro, incluiu a realização do Simpósio dos municípios. Garantir e facilitar o acesso aos
Internacional e, em conjunto com a Associação hospitais de emergência e aos ambulatórios de maior
Internacional de Pediatria (IPA) e a Associação Latino- complexidade.
americana de Pediatria (ALAPE) definiram como tema
central a Atenção Integrada às Doenças Prevalentes
na Infância, visando identificar a sua viabilidade, e REFERÊNCIAS BIOGRÁFICAS:
impacto social que a integralidade das ações
01 - Brasil, COMIN, Ministério da Saúde. Informe sobre grau
representa para a sobrevida e a saúde da criança. de cumprimento das metas da Reunião de Cúpula em
favor da Infância. Brasília, outubro 1996.
Em 1998, ampliou-se a cobertura para outros Estados 02 - Cunha, AL.A Integrated Management of Childhood Ilness-
do Nordeste e Região Norte, alem do Distrito Federal Basic Concepts. Mimeo. Rio de Janeiro, outubro 1997.

48 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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03 - Maranhão, AG.K. Política de atenção à saúde da criança 06 - OMS/OPS. La atención integrada a las enfermidades
no Brasil. Mimeo. Brasília, outubro 1997. prevalentes de la infancia em países de América Latina,
04 - OMS/OPS. Atenção Integrada às Doenças Prevalentes série HTC/AIEPI-12. Quito, janeiro 1998.
da Criança – o enfoque OMS/UNICEF. Washington, 07 - OPS/OMS/MS/SBP. Relatório do Simpósio Interna-
D.C., março 1996. cionalde Pediatria sobre AIDPI, Rio de Janeiro, outubro
05 - Tulloch, J. Visão da Atenção Integrada às Doenças 1997.
Prevalentes na Infância no mundo. Mimeo. Rio de Janeiro, 08 - FIOCRUZ, Assistencia Perinatal e Neonatal, Brasil. TEMA
outubro 1997. RADIS nº 17, janeiro 1995.

Situação da Saúde da Criança Brasileira


JOÃO YUNES

Nos últimos anos muitos foram os esforços Vale enfatizar os seguintes avanços relativos a saúde
desenvolvidos pelo Brasil na promoção da saúde e infantil:
nutrição da criança, resultando em quedas na taxa • redução da mortalidade infantil
de mortalidade infantil e diminuição da desnutrição
• declínio da mortalidade por diarréias, infecções
em todas as regiões brasileiras. A criação pelo
respiratórias e imunopreviníveis
Ministério da Saúde do Programa de Assistência
Integral à Saúde da Criança em 1984 em muito • erradicação da poliomielite
contribuiu para estes avanços encontrados. • declínio da desnutrição proteico-calórica na infância
Este programa com foco nos menores de 5 anos, Esta avaliação indicou ainda, áreas onde os
visava promover a integridade na assistência prestada progressos foram menores apontando para a
pelos serviços de saúde à criança deslocando o necessidade do estabelecimento de prioridade para
enfoque de uma assistência baseada em patologias, ação:
para uma modalidade de atenção que contemplasse • manutenção das altas taxas de mortalidade por
a criança no seu processo de crescimento e afecções perinatais
desenvolvimento.
• manutenção de prevalência de baixo peso ao
Esta posição em favor da infância foi reiterada no nascer
plano internacional com a criação do Estatuto da
• disparidades entre as situações de saúde e nutrição
Criança, do Pacto pela Infância e do compromisso
das zonas urbanas e rurais
governamental firmado em 1990 na sede das Nações
Unidas em NY, junto com mais de 150 países na • aumento da gravidez na adolescência
Reunião de Cúpula Mundial em Favor da Infância, As metas da infância serão agrupadas em 3 grandes
quando o Brasil foi signatário da Declaração Mundial temas e discutidas com mais detalhes:
sobre Sobrevivência, Proteção e Desenvolvimento da
Criança, assumindo 26 metas em favor deste grupo
etário, a serem atingidas até o ano 2000. Destas,
19 são referentes ao setor de Saúde. 1. SOBREVIVÊNCIA INFANTIL
Decorridos quase 8 anos deste compromisso As informações sobre mortalidade infantil são
governamental, os resultados de uma avaliação de provenientes de análises dos dados do Sistema de
médio prazo do grau de cumprimento destas metas, Informação do Ministério da Saúde e das estimativas
obtidas através de uma pesquisa de caráter nacional, de Mortalidade realizadas pelo IBGE além dos dados
mostram um substancial progresso na situação de da Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde
saúde da criança brasileira. realizada em 1996 (PNDS-96).

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 49


Cuidados Primários
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Em relação a MI, ela vem declinando em todas as • realização das campanhas de vacinação
regiões brasileiras, sendo no entanto diferente entre • implantação do Programa de Saúde Materno
elas, o ritmo de intensidade desta queda. Infantil (Terapia de reidratação oral, controle das
Dentre as ações que repercutiram na queda desta IRAs, CD e outras ações voltadas para o pré-natal
mortalidade destacam-se: e parto)
• ampliação da oferta dos serviços de saneamento • queda da fecundidade (4,1 filhos por mulher para
básico e da saúde 2,5 em 15 anos)

Ressalta-se que esta redução ocorreu mais acompanhamento tanto no pré-natal como no parto
marcadamente nas áreas urbanas. (207/1000 NV - 10 vezes maior que na área
Chama-se a atenção a mortalidade extremamente urbana), situação esta muito mais freqüente na zona
alta das crianças cujas mães não tiveram rural do país.

Mortalidade Infantil por Características Selecionadas Brasil 1996

Atendimento Médico Mortalidade Infantil por 1000 nascidos vivos

Nenhum no pré-natal e parto 207


No pré-natal ou no parto 63
No pré-natal e no parto 20

Fonte: PNDS-1996

50 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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Neste sentido o MS criou em 1996 o Projeto de Com relação as causas de morte em menores de 1
Redução da Mortalidade na Infância, priorizando ano, nota-se que a redução mais expressiva foi obtida
ações de saneamento, saúde e nutrição voltadas na mortalidade originada por causas infecciosas
para a mulher e a criança em 913 municípios com (diarréias e respiratórias agudas). Os óbitos por
as piores condições de vida no país, objetivando a causas perinatais passaram a assumir maior
melhoria da situação de saúde de crianças menores importância na estrutura da mortalidade no país,
de 5 anos. Nestes municípios foi priorizado também representando hoje cerca de 52% do total de óbitos
a implantação do Programa de Agentes Comunitários infantis.
de Saúde, que já conta com mais de 98 mil agentes A maioria destas mortes, refere-se ao período neonatal
espalhados em 3.800 municípios e o Programa de precoce, primeira semana de vida, especialmente os
Saúde da Família com mais de 4.000 equipes em óbitos ocorridos no primeiro dia de vida que
1.533 municípios. alcançam aproximadamente 36% destes óbitos.

Para reverter este quadro o Ministério da 2. CONDIÇÕES NUTRICIONAIS


Saúde está promovendo intervenções dirigidas à
INFANTIS
melhoria das condições de saúde das mulheres
visando a garantia do nascimento seguro e a Desnutrição protéico calórica
sobrevivência dos recém-nascidos, tais como: a A trajetória da desnutrição infantil tem apresentado
melhoria da qualidade da assistência pré-natal, a tendências expressivas de declínio nestas 2 últimas
humanização do parto e do nascimento, a redução décadas. Se considerarmos o indicador peso para
do número de cesarianas desnecessárias e a a idade observa-se uma redução de 20,8% para o
melhoria da qualidade da assistência prestada ao Brasil; como um todo no período de 1989 a 1996.
binômio mãe e filho, incluindo a promoção do Também para este indicador, a situação da zona
aleitamento materno nas primeiras horas após o rural é a menos alentadora, com uma redução de
parto. apenas 14% neste mesmo período.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 51


Cuidados Primários
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Na região Nordeste, onde a prevalência de Além disso o MS desenvolve ações de combate a


déficits de peso era elevada em 1989, observou- hipovitaminose A, deficiência de iodo e anemia
se redução de 35,1%. No Centro Sul estas carencial. Desde janeiro de 1999, mais de 300.000
prevalências pouco se modificaram (já eram muito crianças, residentes nos 512 municípios mais carentes
baixas tornando o indicador menos sensível). do Nordeste, estão recebendo sulfato ferroso 1 vez
O excesso de desnutridos na região Nordeste por semana, através do trabalho dos Agentes
em relação ao Centro Sul diminui (3,5 vezes para Comunitários de Saúde. Além disso, foi recentemente
2,5 vezes de 89 para 96). estabelecido um Compromisso Social para a redução
da Anemia por Carência de Ferro entre todos os
As tendências recentes de evolução dos índices
setores da sociedade brasileira - governo, setor
antropométricos das crianças brasileiras, indicam que
produtivo, consumidores, organizações da sociedade
a desnutrição infantil no país tende a se constituir um
civil e organismos internacionais. Através deste
problema eminentemente rural.
compromisso espera-se que mais de 70% das farinhas
O combate a desnutrição tem sido uma prioridade de trigo e milho produzidas no país sejam fortificadas
do MS. A partir de agosto de 1998, vem sendo com ferro para que toda a população tenha acesso
implementado o incentivo ao Combate às Carências a alimentos enriquecidos, e não apenas as camadas
Nutricionais com a distribuição de leite integral ou de maior poder aquisitivo, como acontece atualmente.
outro produto alimentar que tenha comprovadamente Com respeito a vitamina A estão sendo distribuídas
a mesma eficácia do leite na recuperação da através dos serviços de saúde e campanhas nacionais
desnutrição. Crianças menores de 6 meses não de imunização, doses maciças para toda criança de
entram no Programa porque devem estar recebendo 6 a 59 meses residente no Nordeste e Vale do
o leite materno. Jequitinhonha, áreas onde a carência de vitamina A
é endêmica.
Este Programa já está implantado em 4088
municípios beneficiando 7.877.959 pessoas. Para o controle dos distúrbios por deficiência de
Naqueles municípios onde o Programa já está iodo, o Ministério da Saúde tem promovido a
implantado a mais de 12 meses, a taxa de iodação do sal de consumo humano produzido no
recuperação média das crianças em risco nutricional país, segundo dados recentes, mais de 95% do sal
foi de 74%. dos domicílios é iodado.

Crianças Menores de Cinco Anos com Peso Baiso para a Idade


(< - 2Z Scores) Segundo Três Pesquisas Nacionais - Brasil 1975, 1989 e 1986

1975* 1989** 1996*** Variação

REGIÕES % % nº estimado de % nº estimado de 75/89 89/96


desnutridos desnutridos

NORTE 24,5 10,6 65.200 7,7 99.100 -56,7 -27,3%

NORDESTE 27,0 12,8 730.450 8,3 482.500 -52,6 -35,1%

CENTRO-SUL 13,0 3,7 371.200 3,9 424.800 -71,5 +5,4%

BRASIL 18,4 7,2 1.166.850 5,7 1.006.400 -61,4% -20,8%

* Estudo Nacional da Despesa Familiar - 1974/75/


** PNSN - Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição - 1989
*** PNDS - Pesquisa Nacional em Demografia e Saúde - 1996

52 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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Baixo Peso ao Nascer Além disso, o baixo peso ao nascer é um bom


indicador da qualidade da assistência à saúde
As prevalências de baixo peso ao nascer encontradas reprodutiva da mulher, haja vista que grande parte
no Brasil, apesar de atingirem a meta da Cúpula, dos seus fatores casuais (prematuridade, infecções
de alcançar taxas menores de 10% dos nascidos durante a gravidez, tabagismo, gravidez precoce e
vivos, ainda são insatisfatórias, principalmente se intervalo interpartal menor que 2 anos) são na sua
considerarmos que os países desenvolvidos tem taxas maioria, passíveis de controle com uma atenção
em torno de 5%. adequada à mulher em idade fértil.

Prevalência de Baixo Peso ao Nascer (2.500g).


Segundo Regiões e Situações Urbana e Rural Brasil, 1989 - 1996.

PNSN 1989* PNDS 1996** Variação


% % %

Brasil Total 10,1 9,2 - 8,9

Brasil urbano 9,6 8,6 - 10,4

Brasil rural 12,3 11,0 -10,6

Nordeste 12,0 9,4 - 21,7

Norte 12,2 8,7 - 28,7

Centro-Sul 9,5 9,1 4,3

* Refere-se às crianças menores de 5 anos, sobreviventes


** Refere-se a todas as crianças nascidas nos 5 anos anteriores à pesquisa.

Carências Nutricionais Específicas 3. PROMOÇÃO DA SAÚDE


Não há no Brasil informações precisas que permitam DA CRIANÇA
avaliar diretamente a situação das carências nutricionais
por Micronutrientes. Sabe-se que a região Nordeste é Aleitamento Materno
o local no país que tem as maiores incidências de O aleitamento materno se configura com uma
hipovitaminose A, segundo estudos realizados no início estratégia fundamental para a melhoria da saúde da
da década de 90. Neste segundo, o Ministério da criança e consequentemente para a redução da
Saúde vem promovendo nesta região a suplementação mortalidade infantil. Em relação a meta de garantir
deste micronutriente, através da distribuição de capsulas que todas as mulheres amamentem seus filhos até os
de vitamina A às crianças entre 6 meses e 5 anos de 6 meses, esta ainda não foi cumprida, mas os
idade, desde 1994. avanços nesta área são visíveis.
Em relação ao ferro, inúmeros estudos tem mostrado
Estudos realizados têm demonstrado que a duração
incidências de anemia ferropriva que variam de 40
média da amamentação elevou-se de 2,4 meses
a 50% nos estados de São Paulo, Pernambuco e DF.
para 5,5 meses entre os inquéritos de 1975 e 1996.
Neste ano será iniciado um projeto de controle da
anemia por deficiência de ferro, em 512 municípios Ainda com base nestes estudos verifica-se que a
da Região Nordeste (PRMI) que tem implantado o freqüência de crianças amamentadas nas idades de
PACS com a suplementação de sulfato ferroso para 4, 6, 12 e 24 meses elevou-se substancialmente.
crianças entre 6 meses e 24 meses. (ver gráfico)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 53


Cuidados Primários
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Estes dados comprovam o incremento da Os dados da PNDS-96 mostram que 73,4% das
amamentação no país, resultados dos esforços crianças menores de 5 anos, com diarréia fizeram
empreendidos por toda sociedade brasileira. Ressalta- uso de TRO, no Nordeste o incremento do uso da
se como exemplo as marcantes Campanhas de TRO foi de 35% se compararmos o estudo de 96
comunicação desenvolvidas desde o início dos anos com o estudo realizado por Victora e Barros no final
80, os avanços obtidos em relação à legislação no da década de 80.
que se refere à regulamentação dos substitutos do
A freqüência global da diarréia nos últimos anos,
leite materno e às licenças maternidades e
em crianças menores de 5 anos diminui de 16,8%
paternidades, a implantação da iniciativa Hospital
em 86 para 13,1% em 96 (realizada no mesmo
Amigo da Criança (116 no país) e a criação dos
período do ano, excluindo a sazonalidade).
Bancos de Leite Humano (103 no país).
Estes avanços devem ser creditados não só ao
Controle das Doenças Diarreicas trabalho do MS como também a atuação dos
A promoção das terapias de reidratação oral tem agentes comunitários da saúde, além da
sido uma das armas mais importantes no combate a participação de outros órgãos não governamental
desidratação principal causa de morte em crianças e a mídia, através das numerosas campanhas de
com diarréia. divulgação da TRO.

Acompanhamento do Crescimento a esta pesquisa, é muito pequeno (15%) requerendo


e Desenvolvimento a intensificação dos esforços de implementação do
acompanhamento e desenvolvimento, seja nos
Quanto ao CD, eixo da estruturação do atendimento
serviços de saúde, seja na comunidade mediante o
à saúde da criança, não existem dados suficientes
PACS E Pastoral da Criança.
para a evolução desta atividade no Brasil.
Informações provenientes da PNDS-96 indicam que
Imunização
80,3% das crianças menores de 24 meses possuem
o Cartão da criança. No entanto o percentual de Resultados bem melhores foram obtidos no controle
crianças que foram pesadas nos 2 meses anteriores das doenças imunopreveníveis. Em 1994, o Brasil

54 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cuidados Primários
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recebeu o Certificado de Erradicação da Poliomielite. resultou a atenuação da tradicional desvantagem das


Realiza anualmente 2 Campanhas Nacionais de primeiras. Embora os indicadores do Nordeste urbano
Vacinação, além da monitorização da ausência do estão ainda distantes daqueles observadores nas
polivirus selvagem no país. outras regiões. A mortalidade infantil é 2 vezes
superior e a prevalência das crianças desnutridas 3
Os casos de tétano neonatal sofreram substancial
vezes superior. Sendo urgente e necessário a
redução assim como os casos de sarampo. Aumentou-
priorização de ações voltadas para esta região, o
se a cobertura de todas as vacinas infantis e reduziu-
mesmo se aplicando, ainda com maior intensidade
se drasticamente as mortes por doenças
às populações rurais do país.
imunopreveníveis.
As causas da melhoria recente de indicadores de
Em suma a mortalidade infantil e a desnutrição tem
saúde relacionados à pobreza no Brasil, podem ser
evoluído favoravelmente nas últimas 2 décadas em
atribuídas, em maior grau, à do acesso da população
todo o país. O progresso dos referidos indicadores
a serviços e ao aumento da escolaridade das mães
nos anos 90 tem sido mais rápido do que o
e, em menor grau a ampliação da rede pública de
observado nas décadas anteriores.
abastecimento de água e a diminuição da proporção
Nos anos 90, pela primeira vez, os progressos de gestações de alto risco. A queda substancial das
registrados para as populações urbanas no Nordeste taxas de fecundidade nos anos 90 atuou como fator
do país ultrapassaram os progressos registrados para subjacente crucial para a melhoria dos indicadores
as populações urbanas no Centro - Sul, do que de saúde no país.

Experiências dos Comitês Municipais


de Combate à Mortalidade Infantil
DENISE S.CARVALHO

A existência de comitês de combate à mortalidade com modificações significativas. Nesta ocasião, o


registram de longa data em países desenvolvidos, processo de municipalização dos serviços de saúde
dentre os mais conhecidos o da Inglaterra e Canadá. e a descentralização dos sistemas de informação de
No Brasil, a implantação de comitês ligados à mortalidade e de nascidos vivos contribuíram para a
mortalidade materno-infantil são recentes. A partir de viabilização de um diagnóstico de saúde da
1987, surgiram os primeiros comitês de prevenção população mais preciso e atualizado. A identificação
de mortalidade voltados à redução da morte materna, de que os níveis de mortalidade infantil, embora em
apoiados pelo Ministério da Saúde, Organização declínio, apresentavam-se alarmantes e fortemente
Panamericana de Saúde e outros organismos ligados à problemática dos óbitos maternos,
internacionais. Apresentava como meta a redução demonstrados pelo aumento proporcional da
da mortalidade materna através da melhoria do mortalidade neonatal nas estatísticas de saúde, foi o
diagnóstico da situação da mortalidade, identificação motivo da criação do Comitê Pró-Vida de Prevenção
dos fatores envolvidos na sua determinação e propostas da Mortalidade Materno-Infantil do Município de
de ações que pudessem modificar o problema. Em Curitiba.
1989, foi criado no Paraná o Comitê Estadual de
Morte Materna. Sendo a sede do Comitê a capital A constituição do Comitê Municipal de Curitiba é
do Estado, Curitiba, o comitê municipal passou a ser interinstitucional e multidisciplinar. Conta com
estruturado, sendo formalmente instituído em 1993 representantes dos Conselhos Regionais de Medicina

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 55


Cuidados Primários
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e Enfermagem do Estado, da Sociedade de mortalidade neonatal, influenciadas por problemas


Obstetrícia e Ginecologia do Paraná e Sociedade originados durante a gestação e parto.
Paranaense de Pediatria, Universidades, Secretarias
Algumas dificuldades na implantação da vigilância
Estadual e Municipal de Saúde e outros organismos,
e investigação do óbito infantil retardaram o início
como a Associação de Proteção à Infância e
dos trabalhos do comitê na análise dos óbitos infantis
Maternidade Saza Lattes, Pastoral da Criança e Fórum
de forma individualizada. Este trabalho foi possível
Popular de Saúde. Suas atribuições são voltadas ao
através da priorização de casos, definidos como
aprimoramento das estatísticas de mortalidade do
aqueles que não apresentassem anomalias congênitas
município, buscando compreender as causas e fatores
como causa de óbito ou peso ao nascer superior a
contribuintes para a sua ocorrência, discutindo,
2500 gramas. Estes critérios foram adotados como
divulgando e propondo medidas que venham a
estratégia de implantação do sistema, devendo ser
contribuir na sua redução. Para o cumprimento de
progressivamente expandido a todos os óbitos infantis
suas tarefas, o Comitê foi subdividido em Câmaras
em uma fase posterior.
Técnicas, que desenvolvem o trabalho de análise
individual dos casos de óbitos maternos e infantis No período de 1998, ocorreram no município de
nas respectivas câmaras. Com a participação do Curitiba 464 óbitos infantis, dos quais 210 atenderam
Centro de Epidemiologia da Secretaria Municipal, ao critério de investigação, representando 45% do
estabeleceu-se um fluxo de investigação dos óbitos total. Após a fase de coleta de dados, os casos
infantis, implantado a partir de janeiro de 1998, passam à Câmara Técnica Infantil que discute e
com o intuito de abranger informações provenientes analisa cada caso, reconstituindo a causa básica do
dos prontuários ambulatoriais e hospitalares e dados óbito, avaliando a sua evitabilidade e sugerindo
coletados através de visitas domiciliares. medidas de prevenção.

A atividade inicial do comitê foi promover um Como ilustração, apresentaremos alguns casos de
conhecimento mais aprofundado sobre a situação óbitos investigados.
dos óbitos infantis no município de Curitiba, uma Na avaliação parcial dos resultados do Comitê,
vez que as estatísticas produzidas até então eram observa-se que grande parcela dos óbitos infantis
restritas e divulgadas com grande atraso. Neste decorre das precárias condições sócio-econômicas
diagnóstico, observou-se que a queda nas taxas da população. No entanto, identifica-se também que
de mortalidade infantil era decorrente da redução a forma de organização dos serviços, a melhoria da
dos óbitos no período pós-neonatal, reflexo da qualidade da assistência médica e das equipes de
política de saúde instituída através da imunização, saúde no âmbito ambulatorial e hospitalar, programas
uso intensivo da terapia de reidratação oral e de educação em saúde, de prevenção e detecção
incentivo ao aleitamento materno. Poucas precoce de problemas relacionados à saúde têm
modificações foram observadas entre as taxas de negligenciado o seu potencial e sua efetividade.

56 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nefrologia
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Refluxo Vésico-ureteral: Atualização


LUIZ AFONSO HENRIQUES MARIZ

Em condições normais, a junção uretero- vesical O diagnóstico do refluxo é realizado, na maioria


permite a passagem de urina do ureter para a bexiga, das vezes, durante a investigação de crianças com
fenômeno este denominado de efluxo, impedindo o infecção urinária, através uretrocistografia miccional
seu regurgitamento para o ureter e daí para o rim. ou utilizando-se radioisótopos (cistografia
O refluxo vésico-ureteral (RVU) é a passagem radioisotópica direta ou indireta). O primeiro método
retrógrada da urina vesical para o ureter, atingindo é o indicado preferencialmente para o diagnóstico,
ou não os rins, podendo ser primário ou secundário. devido à possibilidade de detalhamento anatômico
do trato urinário inferior, sendo a cistografia
No refluxo vésico-ureteral primário(RVUP) há um defeito radioisotópica mais utilizada para o acompanhamento
congênito na junção uretero-vesical, enquanto no da evolução do refluxo, devido à menor irradiação
secundário existe associação com anormalidades e por ser mais sensível que o método anterior.
estruturais ou funcionais: válvula de uretra posterior,
duplicidade pielo-ureteral, litíase vesical, disfunção O diagnóstico pode também ser feito nas seguintes
vesical, divertículos, ureterocele, cirurgia prévia, etc. situações:
– Investigação de irmãos assintomáticos de pacientes
A incidência do RVUP na população geral varia
com refluxo.
entre 0,21 a 0,55% (recem-nascidos) e de 0,4 a
1,8% (crianças maiores). – Avaliação das causas de hipertensão arterial e
insuficiência renal crônica.
Sabe-se, entretanto, que o RVUP é anormalidade
comum em pacientes pediátricos com infecção – Após detecção, pela ultra-sonografia fetal, de
urinária e, nestes casos, ocorre entre 42 a 57% dos dilatação de pelvis e/ou ureter.
recem-nascidos e em 30 a 50% das crianças maiores. O refluxo vésico-ureteral pode ser uni ou bilateral,
Tem sido verificado que a incidência é maior no existindo várias classificações quanto à sua intensidade
sexo feminino, devido a maior freqüência de infecção na uretrocistografia miccional. Segundo o Comitê
urinária, com conseqüente impacto no diagnóstico Internacional de Estudo do Refluxo dividi-se em:
de refluxo após a avaliação por imagem destas Grau I - atinge somente o ureter.
crianças. Grau II - chega até a pelve e cálices, sem dilatações.
Entretanto, no primeiro ano de vida e, principalmente, Grau III- mesmo do Grau II, porém com moderada
nos primeiros meses, a predominância no sexo dilatação dos ureteres e pelve, tortuosidade ureteral,
masculino é encontrada tanto nas séries onde o refluxo papilas normais ou com discreta eversão.
foi identificado após infecção urinária, quanto Grau IV - mesmo do Grau III, com dilatação e
naqueles em que o diagnóstico foi realizado após convexidade das papilas
constatação de dilatação de pelvis e/ou ureter ainda
Grau V - dilatação importante dos ureteres, pelve e
na vida intra-uterina. Cabe ressaltar que o refluxo
cálices, tortuosidade grosseira dos ureteres, com
vésico-ureteral Grau V, com importante dilatação do
ausência do formato das papilas.
trato urinário superior, é quase que exclusivamente
encontrado nos lactentes do sexo masculino e, em Aspectos Genéticos- apesar do conhecimento de fatores
um terço destes casos ocorre severo dano renal, sem genéticos envolvidos na origem do RVUP, o modo de
associação com infecção urinária. herança ainda não foi bem definido, acreditando-se

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 57


Nefrologia
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que seja autossômico dominante, com penetrância Por isso o manejo adequado desta síndrome deve
incompleta. Vários trabalhos têm demonstrado a sua fazer parte do tratamento de crianças com diagnóstico
presença em 8 a 45% de irmãos assintomáticos de de refluxo vésico-ureteral.
crianças com refluxo. Foi também detectado em 66%
de crianças, cujos pais apresentavam história de refluxo
vésico-ureteral, sendo também significativamente menos REFLUXO VÉSICO-URETERAL COM
comum na raça negra. URINA ESTÉRIL X LESÃO RENAL
Atualmente o refluxo estéril não é mais considerado
DISFUNÇÃO VESICAL / REFLUXO como causa de lesão renal. Entretanto, em presença
de obstrução, com micções de alta pressão (válvula
VÉSICO-URETERAL de uretra posterior, bexiga neurogênica, disfunção
Tem sido evidenciado que a disfunção do complexo miccional) podem ocorrer danos renais mesmo na
vésico-esfincteriano é um fator importante na ausência da infecção.
patogenia do refluxo vesico-ureteral, principalmente
observado em crianças normais, após a fase da
micção, sendo caracterizada através estudos urodinâ-
NEFROPATIA DO REFLUXO
micos por duas condições funcionais diferentes: Define-se como o conjunto de lesões renais
Hiperatividade do Detrusor (bexiga instável) - ocorre decorrentes do refluxo-vésico-ureteral.
constricção voluntária do esfíncter para manter a A prevalência vai variar de acordo com a idade da
continência, em conseqüência de contrações não- criança, severidade do refluxo e também com o
inibidas do detrusor, levando à obstrução do método utilizado para o diagnóstico (urografia
esvaziamento da bexiga; neste caso a capacidade excretora ou cintilografia renal com DMSA).
vesical é pequena ou normal e não há urina residual.
Os principais mecanismos envolvidos na formação
Hiperatividade do Esfíncter (bexiga descoordenada) das lesões (cicatrizes renais) são o refluxo intra-renal,
– caracteriza-se por obstrução durante a micção a infecção urinária e a pressão intra-vesical:
devido à constricção involuntária do esfíncter urinário
Refluxo intra-renal (RIR) - há regurgitação de urina
durante a contração miccional, com aumento da
para o parênquima renal, podendo ser diagnosticado
capacidade vesical, urina residual e graus variados
pela uretrocistografia miccional em 4 a 15% das
de trabeculação da bexiga e dilatação de ureter e
crianças com refluxo vésico-ureteral.
do trato urinário superior.
Foi demonstrada a existência de dois tipos de papilas
Estas alterações da micção caracterizam-se
renais: simples ou não refluentes, onde não há RIR,
clinicamente por incontinência urinária diurna e/ou
e compostas ou refluentes, que permitem a passagem
noturna, urge-freqüência e manobras realizadas pelas
de urina. As papilas compostas localizam-se
crianças para contenção da urina.
principalmente nos polos renais, onde são mais
frequentes as cicatrizes da nefropatia do refluxo. Nos
SÍNDROME DE DISFUNÇÃO seres humanos dois terços dos rins apresentam papilas
compostas.
DE ELIMINAÇÃO/ REFLUXO
Infecção Urinária - tem sido demonstrada a
VÉSICO-URETERAL. correlação entre RVU, infecção urinária e o
Esta síndrome caracteriza-se não apenas pela aparecimento da cicatriz renal.
presença dos distúrbios miccionais já relatados, mas
O papel de infecção reveste-se da maior importância,
também por associação com constipação intestinal,
já que o tratamento precoce e adequado reduz ou
sendo encontratada em 43% das crianças com refluxo
até mesmo previne o aparecimento das cicatrizes
vesico-ureteral. Por ser muitas vezes não
renais.
diagnosticada, relaciona-se com resolução tardia do
refluxo, número maior de episódios de infecção Pressão intra-vesical - em condições normais a pressão
urinária e até mesmo à indicação, muitas vezes vesical é baixa, sendo a urina conduzida pela
desnecessária, de tratamento cirúrgico do refluxo. peristalse ureteral. O aumento desta pressão facilita

58 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nefrologia
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o RIR e, na vigência de infecção urinária, poderá REFLUXO


levar à formação das cicatrizes renais.
VÉSICO-URETERAL X GRAVIDEZ
Cabe ressaltar que as cicatrizes renais ocorrem com
muita freqüência sem a existência do refluxo vesico- Durante a gravidez a prevalência de infecção urinária
ureteral; entretanto, quando este encontra-se presente na população geral encontra-se em torno de 2 a
e associado à infecção urinária, permanece como o 8%; entretanto, no grupo de gestantes com história
fator isolado mais importante no desenvolvimento das de infecção urinária durante a infância, a prevalência
cicatrizes renais. é de 15 a 57%.
A incidência de bacteriúria na gravidez foi mais alta
nas gestantes com cicatrizes renais (47%) do que
NEFROPATIA DO naquelas sem cicatrizes (27%), porém todas com
história anterior de infecção urinária. Por outro lado
REFLUXO X HIPERTENSÃO ARTERIAL
apenas 2% das grávidas sem história de infecção
Esta associação tem sido motivo de controvérsia nos urinária apresentavam bacteriúria.
últimos anos.
A infecção urinária parece ter poucos efeitos negativos
Há relato de alta incidência de hipertensão (5 a na grávida e no desenvolvimento fetal se a função
30%) nos pacientes com cicatrizes renais. No entanto, renal for normal, porém leva a um risco aumentado
mais recentemente, em importante trabalho com média para pré-eclâmpsia e hipertensão arterial nas
de 9 anos de seguimento não foi verificado nenhum gestantes com cicatrizes renais pré-existentes e deficit
caso de hipertensão arterial apesar da existência de da função renal, assim como incidência maior de
cicatrizes renais focais ou difusas em 34,3% dos prematuridade.
pacientes avaliados. Parece que o desenvolvimento
de hipertensão arterial está relacionado à existência
de significativa displasia renal. REFLUXO VÉSICO-URETERAL:
TRATAMENTO
NEFROPATIA DO O refluxo vésico-ureteral tende a desaparecer com o
REFLUXO X INSUFICIÊNCIA tempo e mesmo os de graus mais severos também
podem apresentar cura espontânea. Por este motivo
RENAL CRÔNICA o objetivo principal do tratamento é o de prevenir a
Na etiologia da insuficiência renal crônica a infecção urinária e o aparecimento de cicatrizes
nefropatia do refluxo tem sido encontrada em 9 a renais, através utilização de drogas como a
15% dos casos, ocorrendo também em 5 a 10% nitrofurantoína e a associação de sulfame-
dos pacientes submetidos ao transplante renal. toxazol-trimetoprim, em doses baixas (25% da
usual), até o desaparecimento do refluxo que ocorre,
A proteinúria é considerada como o fator mais
na maior parte dos pacientes, nos 5 primeiros anos
importante na evolução desfavorável dos pacientes
de vida.
com nefropatia do refluxo. O achado histológico
mais comumente encontrado corresponde à Já foi demonstrado que a profilaxia contínua mostrou-
glomeruloesclerose focal, responsável pela se bem mais eficaz na prevenção de novas cicatrizes
deterioração da função renal (glomerulopatia do renais, comparativamente com o tratamento apenas
refluxo), secundária principalmente ao processo de dos episódios de infecção urinária.
hiperfiltração decorrente da perda de parênquima
O reconhecimento dos padrões miccionais anormais
renal funcionante.
e da constipação revestem-se da maior importância
Atualmente, a participação da nefropatia do refluxo nestes pacientes, já que, muitas vezes, são
como causa de insuficiência renal crônica, vem responsáveis pela manutenção do refluxo.
diminuindo nos grandes centros, provavelmente devido Desta maneira, medidas efetivas de reeducação
ao diagnóstico e tratamento precoces da infecção miccional e do hábito intestinal, uso de
urinária, e à maior identificação e melhor manejo do anticolinérgicos e dieta laxativa também são
refluxo vésico-ureteral. fundamentais no tratamento.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 59


Nefrologia
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Por que não submeter todos os pacientes ao – nos pacientes tratados conservadoramente o refluxo
tratamento cirúrgico, já que os índices de sucesso persistiu em 74% dos ureteres em 2 anos e em 55%
são tão elevados - graus I e II: 90 a 100%; grau III: em 5 anos.
93 a 99%; graus IV e V: 50 a 60%? O grupo de
Os resultados do Estudo Internacional Colaborativo
estudo do refluxo de Birmingham comparou o
do Refluxo na Infância também não resultaram em
tratamento cirúrgico ao conservador e chegou às
diferença significativa nas duas modalidades de
seguintes conclusões:
tratamento, em 5 anos.
– não foram encontradas diferenças significativas entre
À luz dos conhecimentos atuais, o tratamento cirúrgico
os dois grupos no que se refere à recorrência de
se restringe aos graus mais severos (IV e V) de refluxo,
infecção urinária, filtração glomerular, comprimento
com ocorrência concomitante de episódios repetidos
renal, formação de novas cicatrizes ou progressão
de infecção urinária na vigência de quimioprofilaxia,
das já existentes, em 2 e 5 anos de acompanhamento.
sobretudo nos pacientes menores de 5 anos, e também
– a cirurgia resultou em cura em 97% dos casos de nos casos de falta de aderência ao tratamento
refluxo. conservador.

Glomerulopatias na Infância
JÚLIO TOPOROVSKI

Abordaremos, em nossa apresentação, uma atualiza- vez de maneira bastante elegante, que o fator que
ção das duas glomerulopatias mais comuns em nosso determina a nefritogenicidade da bactéria está
meio: glomérulo nefrite difusa aguda (GNDA) pós inserido no segmento C. Assim sendo, nos doentes
estreptocóccica e a síndrome nefrótica idiopática (SN). com GNDA nota-se ascensão dos anticorpos contra
o segmento C. Os segmentos A e B possuem várias
Iremos focalizar os mais recentes avanços na área
sequências de aminoácidos que apresentam reação
destas duas nefropatias.
cruzada com vários tecidos do organismo (coração,
GNDA – seqüela não-supurativa de estreptococcia de articulações e sistema nervoso), que seriam
vias áreas superiores (IVAS) ou de pele, condicionada responsáveis pela reumatogenicidade da bactéria.
pelo estreptococo ß hemolítico do grupo A raças
3º – No que se refere à GNDA, conseguiu-se detectar
nefritogênicas - constatamos que a prevalência das
prováveis antígenos responsáveis pela agressão
raças nefritogênicas em uma determinada população
imunológica que ocorre nesta nefropatia.
é cíclica, pois com o passar do tempo a população
vai tornar-se imune ao sorotipo vigente. a – Para um grupo, trata-se de uma substância
secretada pelo estreptococo, Exotoxina B ou
Os principais aspectos que gostaríamos de mencionar “Streptococal Proteinase”, cujo teor de anticorpo
são os seguintes: apresenta-se elevado em todos os pacientes com
1º – A gravidade do quadro clínico também está GNDA e é normal nos doentes com Febre Reumática
associada aos sorotipos determinantes desta (FR) e faringite estreptocóccica.
patologia, que apresentam também variação cíclica. b – Outros pesquisadores realçam a importância da
2º – A proteína M que determina a virulência e a estreptoquinase secretada pelas raças nefritogênicas
imunidade tipo-específica apresenta três conjuntos da bactéria, como fator desencadeante da reação
protéicos: A,B,C, sendo que, recentemente, Mori e em cascata do complemento que determina o dano
colaboradores, conseguiram demonstrar, pela primeira renal da GNDA.

60 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nefrologia
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4º – Outro aspecto relevante desta patologia foi o Salientando-se que os pacientes com GESF constituem
estudo realizado por autores escandinavos, que a glomerulopatia que mais habitualmente leva à
recentemente conseguiram reproduzir a nefropatia Insuficiência Renal Crônica (IRC).
em animais de laboratório (ratos). A ministração de Do ponto de vista de apresentação clínica, é difícil
penicilina a um grupo de ratos conseguiu abortar o diferenciar os dois subtipos, pois o quadro clínico,
surgimento desta nefropatia, fato este ainda não o nível de proteínas plasmáticas, o teor de colesterol,
totalmente comprovado em humanos. a função renal e o sedimento urinário, são
5º – Importante contribuição na área da GNDA e FR praticamente iguais.
é a possibilidade de ministração de vacinas que Salienta-se, no entanto, que nos pacientes portadores
objetivam a proteção contra estreptococos de LM, a resposta terapêutica ao tratamento com
nefritogênicos, reumatogênicos e determinantes de Prednisona (2mg/kg/peso/28dias) é satisfatória, são
doença invasiva estreptocóccica. denominados córtico-sensíveis, enquanto os portadores
Os estudos em andamento são fundamentados no de GESF geralmente são córtico-resistentes.
seqüenciamento dos aminoácidos que constituem a Admite-se, modernamente, que a progressão nesta
proteína M. Esta proteína possui uma extremidade nefropatia é determinada fundamentalmente por
carboxi-terminal ancorada no citoplasma da bactéria alterações que ocorrem na matriz mesangial do
e outra extremidade livre amino-terminal. Conseguiu- glomérulo. Verifica-se acúmulo da matriz extracelular
se fracionar esta proteína em dois segmentos: um decorrente da alteração da síntese desta proteína e
responsável pela sua imunidade e virulência e outro sua degradação que se processa pela ação de
que apresenta reação cruzada com diversos tecidos proteinases.
e nefritogenicidade.
Os pacientes portadores de GESF diferem daqueles
Desta maneira, com esse fracionamento da proteína com LM na resposta terapêutica habitual: corticóides
M, conseguiu-se produzir duas vacinas: Tetravacina e imunosupressores. Este achado corresponde à nossa
com os sorotipos 24-5-6-19 e, mais recentemente, experiência.
Octavacina 24-5-6-19-1-3-18-2, usada na forma de
Recentemente abriu-se perspectiva mais animadora
spray, com grande atividade protetora.
na terapêutica da GESF e da SN córtico-resistente,
SN: carateriza-se fundamentalmente pela presença com o emprego da Metilprednisolona na forma de
de proteinúria maciça (>50 mg/kg/peso) e por pulsos (Esquema de Mendoza) e da Ciclosporina.
hipoalbuminemia (< 2,5 g%). Este esquema mostrou-se eficiente, determinando
Na grande maioria dos casos 80-90% vamos remissão na maioria de nossos pacientes. Outros se
encontrar dois padrões histológicos: Lesão Mínima beneficiaram, melhorando sua função renal e
(LM) e Glomérulo Esclerose Segmantar e Focal (GESF). diminuindo os níveis de proteinúria.

Diagnóstico e Manejo das Hematúrias


DALTRO ZUNINO

A hematúria, quando detectada, constitui-se em microscópica. A história clínica e o exame físico são
grande preocupação não só para os familiares, mas fundamentais na avaliação inicial, já que existindo
também para o médico, dado o grande número de dados que surgiram de um diagnóstico ou etiologia
patologias que causam este achado, seja ela os exames corretos serão solicitados com mais
sintomática, assintomática, macroscópica ou critérios.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 61


Nefrologia
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A hematúria que não é explicada por uma condição da definição de hematúria e da composição da
óbvia, como por exemplo uma cistite ou glomerulone- população estudada, sendo que a prevalência
frite aguda pós-estreptocócica é relativamente comum. da hematúria macroscópica não é conhecida. Na
A avaliação inicial das hematúrias usualmente não tabela 1 estão assinaladas algumas definições de
requer a participação de um subespecialista (nefrolo- hematúria.
gista ou urologista), mas freqüentemente será solicitada A hematúria pode ser grosseiramente visível,
sua presença nas fases posteriores da investigação. variando do vermelho ao marrom escuro, reque-
Deve ser lembrado que algumas patologias podem rendo investigação imediata ou microscópica,
se beneficiar eventualmente de terapêutica precoce usualmente detectada ao acaso, quando sangue
(glomerulonefrite membranoproliferativa, uropatias (hemácias ou hemoglobina) é encontrado na urina.
obstrutivas, urolitíase) ou aconselhamento genético A hematúria microscópica na criança é transitória
(glomerulopatias hereditárias, doença renal policística em até 20% e se persiste por um período de 2 a
dominante). 3 meses, então a avaliação laboratorial deverá ser
iniciada.
As tiras reativas são pelo menos tão sensíveis quanto
INCIDÊNCIA o sedimento urinário e devido a sua alta sensibilidade
A prevalência da hematúria microscópica persistente e especificidade excluem, com segurança, a presença
na criança varia de 0,3 a 4,1% , na dependência de hematúria.

Tabela 1. Definições de hematúria

1. Amostras consecutivas de urina com teste positivo na tira


2. > 5 hemácias/campo 400 x
3. > 8.000 hemácias/ml
4. > 3.500 hemácias/min
5. > 500.000 hemácias/12h
6. > 10/mm3

AVALIAÇÃO E MANEJO glomerulonefrite aguda pós-estreptocócica, freqüente


na idade escolar e rara antes dos 2 anos.
Urina vermelha ou escura nem sempre indica a
presença de sangue, já que corantes, drogas, Toda investigação de hematúria deve iniciar-se pelo
pigmentos e alguns estados patológicos podem tornar estudo morfológico das hemácias, dado necessário
a urina vermelha, marrom ou negra ( tabela 2). e insubstituível, já que esta caracterização dirigirá a
investigação para causas glomerulares ou não
Na avaliação correta do paciente com hematúria,
glomerulares. Como é evidente, esta conduta
muitas vezes dados coletados na anamnese bem
diminuirá em muito os custos da investigação,
feita, podem indicar o melhor caminho para aquele
totalmente diversa para uma ou outra condição.
caso particular. Na figura 1 podemos observar alguns
dados da história clínica que auxiliam no diagnóstico Além do que, o paciente será submetido a um número
da hematúria, sugerindo um determinado diagnóstico significativamente menor de exames complementares,
ou etiologia que será definido com a investigação alguns deles invasivos e traumáticos, como a urografia
posterior. excretora, a cistouretrografia miccional ou a
cistoscopia.
Também é importante considerar na elaboração diag-
nóstica da hematúria a idade da criança (tabela 3), Não achamos necessária a utilização da microscopia
já que algumas causas são mais comuns em de fase na caracterização da hematúria, como é
determinado período etário, como por exemplo a correntemente citado na literatura. A presença de 80%

62 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nefrologia
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Tabela 2. Alterações na coloração da urina

Rosada, vermelha, cor de chá


* Estados patológicos
– Hemoglobinúria – Mioglobinúria
– Porfirinúria –- S. marscecens
– Pig. Biliares – Uratos
* Ingestão
– Aminopirina – Antrocianos
– Corantes Aso – Beterraba
– Benzeno – Amora preta
– Cloroquina – Desferrioxamina
– Difenilhidantoína – Ibuprofen
– Chumbo – Metildopa
– Nitrofurantoína – Fenazopiridina
– Fenolftaleína – Rifampicina
– Rodamina – Sulfazalazina

Cinza escura, negra


* Estados patológicos
– Alcaptonúria – Ác. homogentísico
– Melanina – Metahemoglobinúria
– Tirosinose
* Ingestão
– Alanina – Cáscara sagrada
– Resorcinol – Timol

Figura 1. Historia clínica e hematúria

Disúria, polaciúria, fetidez, turvação

IVAS: GNAPI
D. da membrana fina
D. de Berger
História familial: GNs hereditárias
Doença policística
Hipercalciúria
HEMATÚRIA Dor em cólica: Litíase
Coágulo
S. hematúria dor lombar
Trauma
Exercício extenuante
Anticoagulante
Medicações
Raça negra

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 63


Nefrologia
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Tabela 3. Hematúria e idade

– RN/Lactente – Malformação renal


– Isquemia renal
– Coagulopatias
– Tumor
– Infecção
– Trauma

– Pré-escolar – Glomerulonefrites
– Corpo estranho
– Hipercalciúria
– Litíase
– Hemoglobinopatias

– Escolar/adolescente – Menstruação

ou mais de uma determinada forma de hemácia define, Não existindo proteinúria significativa, com função
com segurança, se a hematúria é glomerular renal e níveis tensionais normais, o seguimento
(dismórfica) ou não glomerular (isomórfica). A presença cuidadoso é a melhor opção, já que esta
de acantócitos parece ser o dado mais específico de anormalidade é freqüente na triagem de crianças
dismorfismo, já que sua presença, a partir de 4 a 5% em idade escolar e a segunda causa de referência
define a presença de glomerulopatia. para clínicas nefrológicas nos EUA.
A caracterização da origem da hematúria por outros Na Tabela 5 estão listadas as causas mais freqüentes
métodos que não o visual, retirando o aspecto de hematúria glomerular, quase todas assintomáticas,
subjetivo do exame, como a utilização do Coulter pelo menos na sua fase inicial.
counter é eficaz, mas não disponível na prática diária
e mais ainda no consultório do subespecialista. A Na investigação laboratorial (Tabela 6), é necessário
presença de cilindros hemáticos classicamente localiza ressaltar que em nosso país a forma mais comum de
a origem glomerular da hematúria, mas pensamos glomerulopatia é a glomerulonefrite aguda pós-
que a presença do dimorfismo eritrocitário basta para estreptocócica, cuja forma assintomática pode ser
definir, com segurança, a presença das várias formas até quatro vezes mais freqüente que a sintomática.
de glomerulopatias. O principal fator envolvido na Daí que devem ser rotineiramente solicitados exames
transformação da hemácia é a sua passagem através que corroborem esta possibilidade, com a
da membrana basal glomerular lesada, embora outros determinação do título de ASO e de C3 e C4.
mecanismos possam contribuir para esta alteração. Nos países mais desenvolvidos, notadamente no
Definida a origem da hematúria, a investigação será Japão, a doença de Berger é a forma de
dirigida para as causas mais comuns deste achado. glomerulonefrite mais comum, seja sintomática ou
Na tabela 4 estão listadas as principais causas de assintomática, sendo o diagnóstico de certeza
hematúria e, à exceção da primeira, todas as demais estabelecido pela presença de IgA nos glomérulos
se caracterizam pela presença de isomorfismo destes pacientes, que podem apresentar por vezes
eritrocitário. níveis séricos de IgA elevados.

Muitas crianças com hematúria glomerular A urinálise de pais e irmãos pode detectar hematúria
assintomática persistente não terão uma causa glomerular, devendo então ser considerada a
identificável, já que não apresentam doença possibilidade de glomerulonefrite hereditária, seja a
subjacente significativa. Com dados de história clínica glomerulonefrite familiar benigna, a doença da mem-
ausentes e exame físico normal, a avaliação se torna brana fina ou eventualmente a Síndrome de Alport,
mais problemática. existindo história familiar de surdez e de nefropatia

64 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nefrologia
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Tabela 4. Causas principais de hematúria

– Origem parenquimatosa
– Doenças vasculares renais
– Doenças do trato urinário excretor
– Alterações sistêmicas da coagulação

Tabela 5. Causas de hematúria glomerular

– GNAPI – Exercício extenuante


– S. de Alport – Estado infeccioso agudo
– Hem. Fam. Benigna – Anemia de cél. falciformes
– D. de Berger – S. hematúria dor lombar
– Outras GNs

Tabela 6. Hematúria glomerular: investigação

– Creatinina – Proteinúria de 24h


– ASO – Hemograma e VHS
– C3, C4 – IgA sérica
– Biópsia renal??

crônica evoluindo para a insuficiência renal crônica. Exercício extenuante como causa de hematúria ainda
Graças às modernas técnicas genéticas, estas glome- não foi descrito na criança, ao contrário do que
rulopatias parecem compartilhar várias semelhanças, pode acontecer no adulto.
existindo a possibilidade de serem variantes de uma
Na hematúria glomerular isolada, a preocupação
mesma doença, com penetrâncias diferentes.
inicial e evolutiva é a detecção de proteinúria que,
Estados infecciosos agudos, tanto virais como se presente e significativa, indica a possibilidade de
bacterianos podem cursar com hematúria glomerular evolução para a cronicidade.
e proteinúria discretas, com normalização em dias
A biópsia renal não é usualmente realizada nos
ou poucas semanas.
casos assintomáticos, já que não existe terapêutica
Uma causa comum de hematúria glomerular isolada específica para qualquer uma das condições
é a glomerulonefrite membranoproliferativa na sua fase referidas. No entanto, deve ser considerada,
inicial, com diminuição de C3 persistente ou intermiten- existindo evidências de doença progressiva,
temente, mas que na evolução quase sempre se mani- como elevação da creatinina, da excreção de
festa como uma síndrome nefrótica, causa importante proteína e de níveis tensionais. Embora a biópsia
de evolução para a insuficiência renal crônica. seja diagnóstica, ela dificilmente alterará o manejo
de pacientes com hematúria glomerular assintomática.
Raramente a Síndrome de Hematúria Dor Lombar
O acompanhamento a longo prazo confirmará o
é considerada no diagnóstico, dada a sua raridade.
prognóstico favorável na maioria dos pacientes,
Pela prevalência da raça negra em nossa população, assegurando o tratamento da hipertensão, se
a possibilidade de anemia de células falciformes manifesta e aumenta o entendimento da história
deve ser considerada. natural destas patologias.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 65


Nefrologia
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Já com relação às hematúrias não glomerulares, Neste tipo de hematúria, estudos de imagem são
assinaladas na Tabela 7, também muitas delas podem freqüentemente solicitados, podendo elucidar
ser totalmente assintomáticas, dependendo da diagnósticos como doença renal policística, processos
experiência do médico a correta investigação, que obstrutivos, litíase ou eventualmente tumores, estes
deve ser desenvolvida passo a passo, iniciando com bastante raros na criança. A avaliação dos vasos
os exames mais simples e daí para os mais complexos renais com Ecodoppler, pode mostrar compressão
e conseqüentemente mais onerosos e, por vezes, da veia renal esquerda pela aorta e mesentérica
mais invasivos. superior, levando à congestão renal, que explicaria
a hematúria, por vezes acompanhada de dor lombar
Na Tabela 8 estão assinalados os exames que podem
na síndrome de “nutcracker”, patologia bastante rara,
ser solicitados de início na investigação destes
mas que deve ser lembrada na investigação.
pacientes. Assim, a relação cálcio/creatinina em
amostra de urina em jejum pode estabelecer a Já a presença de varizes e fístulas ou malformações
suspeita de hipercalciúria idiopática, corroborada arteriovenosas são uma raridade, mas devem ser
na urina de 24 horas, que também faz o diagnóstico lembradas quando todas as causas precedentes foram
de hiperuricosúria, outra causa freqüente de hematúria afastadas.
na criança, estando estas patologias por vezes Na dependência dos resultados iniciais, exames de
associadas. imagem de maior resolução serão solicitados, como
Evidentemente, causas óbvias como menstruação em a tomografia computadorizada, a ressonância
adolescentes (possibilidade nem sempre lembrada!!), magnética ou mesmo a angioressonância magnética.
a cistite hemorrágica a vírus na seqüência de estados Finalizando, é importante ressaltar novamente que a
gripais ou a administração de drogas que podem investigação de toda hematúria, seja ela sintomática
cursar com nefrite intersticial e insuficiência renal ou assintomática, macroscópica ou microscópica,
aguda, são patologias suspeitadas com os dados deve iniciar-se, obrigatoriamente, pelo estudo
obtidos na anamnese. morfológico das hemácias.

Tabela 7. Causas de hematúria não glomerular

– Hipercalciúria – Cistos
– Hiperuricosúria – Obstrução
– Trauma – Cistite
– Drogas – Menstruação
– Malformação AV – Fístula
– S. do “nutcracker” – Varizes
– INEXPLICADA ??

Tabela 8. Hematúria não glomerular: investigação

– Relação Ca/Cr em amostra de urina


– Ca e ác. úrico em urina de 24h
– Creatinina, Ca e ác. úrico plasmáticos
– Estudos de imagem: US, Uexcr., TAC, RM
– Cistoscopia

66 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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Adolescência, Violência e Droga


FERNANDO ANTÔNIO GUIMARÃES RAMOS

Optamos por iniciar esta nossa conversa deslocando simples indivíduos massificados, modelados,
para o centro de nossas atenções o cidadão serializados são seres humanos singulares assumindo
adolescente. e vivendo a subjetividade. A singularidade é um
Segundo F. Peres (1995), ao lidarmos com a faixa conceito existencial e dentro dele cada ser humano
da adolescência não devemos perder de vista que é ele próprio e, por conseguinte, diferente, enquanto
estamos diante de “seres concretos, que vivem seus que a subjetividade é modelada no registro social e
cotidianos em suas diversas e desiguais condições desta forma assumida por indivíduos em suas
de existência” e que são exatamente estas “desiguais existências particulares. Segundo Guattari (1993):
possibilidades de existir em diversas situações “o modo pelo qual os indivíduos vivem esta
culturais, agravadas pelas diferenças sociais que subjetividade oscila entre dois extremos: uma relação
determinam e reforçam as diferentes maneiras de de alienação e opressão ou uma relação de
encarar a vida”. expressão, de criação, na qual o indivíduo se
reapropria dos componentes da subjetividade,
Precisamos destacar também que o conceito de produzindo um processo que se chamaria de
vida não pode e não deve ficar limitado à singularização”. No que complementa Elias (1994),
concepção paradigmática biológica, mas que está “cada pessoa parte de uma posição única em sua
concebido como diferentes processos e cursos rede de relações, atravessa uma história singular de
construídos sócio-cultural e historicamente vida ... e esse eu, essa essência pessoal forma-se
(Featherstone, 1991). E nesta concepção, Ortega num entrelaçamento contínuo de necessidades, num
Y Gasset (1989) já destacou a importância de desejo e realização constantes, numa alternância de
valorizamos o que chamou de “circunstância” dar e receber”.
(circum-stantia = presença em torno), no existir de
cada ser vivente, razão porque afirmou: “O indivíduo Ratificamos portanto o nosso pedido de permissão
vive envolvido pelo ambiente geográfico-histórico- para, em um evento fundamentalmente médico,
social-cultural” e que esse contorno pode se discutirmos as questões relacionadas à violência e
apresentar mais ou menos hostil, mais ou menos droga na adolescência a partir de paradigmas sócio-
favorável para cada um. Queiramos ou não, temos filosóficos.
que contar com ele, completando que “a vida é Segundo Carvalho (1991), não podemos mais
essencialmente um diálogo com o contorno tanto encarar o problema da drogadição como algo
em suas funções fisiológicas mais simples como em relacionado somente ao indivíduo envolvido, mas a
suas funções mais sublimes. Viver é conviver e o aspectos bem mais amplos, baseados em questões
outro que conosco convive é o mundo que nos sociais, culturais, econômicas e políticas, pois
rodeia”. drogadição hoje não se restringe apenas a uma
Não devemos esquecer, ao lidarmos com camada social, afetando todas as camadas da
adolescentes, que estamos diante de indivíduos com população e, dependendo das circunstâncias
suas singularidades, em diálogo com seu contorno. existenciais, em maior ou menor proporção. Afeta
As circunstâncias onde cada um está inserido não só o adolescente em péssimas condições
determinam fundamentalmente suas formas de financeiras, entregue à própria sorte, experimentando
caminhar na vida. Diferentes sim, pois mais do que sentimentos de incerteza, desproteção e menos-valia,

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 67


Adolescência
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mas também o adolescente de classe privilegiada toda ação ou omissão pessoal ou coletiva na relação
experimentando às vezes carências de outros níveis, do poder, ferindo os direitos de pleno desenvolvimento
vivenciando também o mesmo sentimento de e do bem estar das pessoas, sendo o seu caráter
insegurança e menos-valia. Ambos encontram na histórico-social mutável, na função da dinâmica desse
droga seu refúgio. Portanto, não concebemos hoje poder e distribuição diferencial de regras e recursos.
em dia que se permaneça tratando a droga pela Ela não é única, mas múltipla, razão porque podemos
droga, esquecendo o indivíduo. E se é o indivíduo estabelecer distintos e vários tipos de violência,
que conta, por que na prática o olhar e o agir se segundo os interesses em jogo, os agentes e as
colocam tão ambíguos? Por que para alguns o uso vítimas, os cenários centrais, os valores, os
da droga requer necessidade de apoio, visando o instrumentos utilizados e os efeitos produzidos. Desse
resgate de valores, e para outros a abordagem modo, podemos ter a violência política, sexual,
continua a ser repressiva, policial? Não podemos ter estrutural, social, física, psicológica, urbana, rural,
visões simplistas com a droga que a coloquem ora etc. A agressão física, o terrorismo psicológico, a
como crime (um problema legal), ora como doença discriminação, a repressão pessoal, o engodo
(um problema psiquiátrico) e portanto, sob estes político, a coerção educativa e a destruição de
olhares, necessitando de condutas “extremamente” sonhos e planos são formas concretas de violência.
especializadas e discriminatórias.
Analisemos um pouco a situação brasileira. Sabemos
O problema das drogas é considerado hoje pela que a violência que aflige crianças e adolescentes
OMS como problema de saúde pública. E saúde na realidade brasileira atual é de tamanha gravidade
implica em qualidade de vida; a droga está inserida que tem incomodado todos os setores da sociedade,
e decorre deste contexto. A tentativa de se sendo, inclusive, reconhecida como relevante
compreender a pessoa que recorre a tais substâncias problema de saúde pública, principalmente a partir
deverá ser precedida de uma compreensão do final da década de 80, segundo documentos
adequada pela sociedade a que ela pertence e produzidos no próprio Ministério da Saúde (1993).
como este cidadão nela se insere. Como já Este e outros documentos têm afirmado que o mais
afirmamos, a literatura tem feito muitas referências freqüente tipo de violência a que estão sujeitas as
às razões que determinam a busca das drogas como crianças e os adolescentes no Brasil é a denominada
alívio de tensões internas, tais como angústias, estrutural.
sensações de vazio e/ou depressão de origem e
Segundo Minayo (1993), a gravidade dos casos
intensidade das mais variadas, além do próprio
nesta questão revela a face adulta da sociedade
modismo ( Ministério da Saúde, 1991 ). Entretanto,
brasileira, marcada por profundas desigualdades
somam-se às tensões internas intensidades variáveis
sociais, má distribuição de renda, discriminações de
de tensões externas, representadas pelas mais
raça, cor e sexo, expropriação econômica e cultural,
contraditórias formas de violência.
exclusão da cidadania e privilégios de grupos. Hoje,
Minayo (1990) em seu estudo classificou a violência essa face monstruosa e adulta do país constitui a
brasileira em três categorias: a violência estrutural, violência fundamental, no seio da qual são gerados
quando programada pelo próprio sistema social, com e reproduzidos bio-psíquico-social-culturalmente nossos
suas conseqüências tais como a fome, o desemprego jovens e nossas crianças.
e tantos outros problemas que afligem grande parte
E neste contexto da violência estrutural, pelas razões
da população do país; a violência revolucionária ou
supracitadas, um fato novo nos tem paralisado, a
da resistência, expressa por manifestações de classes
partir do final da década de 80, quando constatamos
e grupos discriminados pela sociedade e a violência
um novo perfil epidemiológico no país, passando as
de delinqüência, que se constitui na forma de
chamadas “causas externas” (homicídios, suicídios e
violência melhor entendida pelo senso comum. A
acidentes) para terceiro lugar no quadro geral de
referida autora ainda afirmou que qualquer forma de
mortalidade (12% dos óbitos) e já se constituindo,
violência deve ser vista em rede e não de forma
nesta década que atravessamos, a primeira causa
estanque e isolada.
de morte entre adolescentes. Perguntamos então:
Vários outros autores já definiram também a violência. Quem está morrendo realmente? Quem está
Entre eles há o consenso em resumi-la como sendo matando? Quem é violento de fato?

68 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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Segundo o Movimento Nacional dos Meninos e pela equipe da Fundação Carlos Chagas, registrou
Meninas de Rua e o Instituto Brasileiro de Análises discriminações do pobre e principalmente do negro
Sociais e Econômica (1991), a grande maioria que na escolaridade. A própria distribuição do aluno em
sofreu homicídio é do sexo masculino, com idade de área geográfica onde já no recrutamento das escolas
15 a 18 anos, negro e mulato. Foram assassinados públicas a absorção estabelece crivos diferenciados
em brigas de gangues, roubos, uso de tóxicos, e uma vez constituída a clientela socialmente
“queima de arquivo” ou simples suspeita. Enfim, “homogênea”, os próprios professores passam a atuar
situações que representam “o propósito de exterminar no sentido de reforçar estas diferenças, “na crença
hoje o possível delinqüente de amanhã ”. Neste de que os alunos pobres e negros não são
mesmo trabalho do MNMMR, os exterminadores educáveis”. Ramos Dias (1979) em sua pesquisa
foram detectados como justiceiros, participantes de sobre as desigualdades sociais e oportunidades
gangues de extermínio, esquadrão da morte a serviço educacionais – a produção do fracasso, comentou
de negociantes que se sentem ameaçados, mandantes que os professores de escolas públicas estão pouco
de tráfico de drogas ou simplesmente participantes aparelhados para lidar com a heterogeneidade do
da polícia ou egressos dela. alunado (de classes, étnicas ou raciais), legitimando
com isso as desigualdades sociais, gerando o
E o que é mais grave, o Relatório da Comissão
“otimismo educacional” nas escolas para classe média
Internacional dos Direitos Humanos (ONU, 1992)
(onde todos se orientam para a produção do sucesso
observou que não há mobilização da opinião
escolar) ou a “ideologia da impotência”, nas escolas
pública, na sua maioria, com relação ao extermínio
de clientela pobre onde partem do pressuposto de
de crianças e adolescentes. Os inquéritos policiais,
que filhos de famílias “incompletas”, de pais
quando abertos, são inconclusivos.
desempregados e aculturados não estão fadados ao
Como tem se comportado a sociedade adulta em sucesso escolar.
outros segmentos sociais? Procuremos fazer uma
breve análise sobre dois desses segmentos: a família É dentro deste contexto, como negros e descen-
e a escola. dentes desta etnia e como pobres, miseráveis, que
inúmeras crianças e adolescentes iniciam sua es-
Precisamos rediscutir os conceitos básicos da família, cola, no pressuposto dos que os recebem de que
diante da questão Droga e Violência. Precisamos são “diferentes”, inferiores, para quem não vale a
urgentemente resgatar valores (confiança, respeito, pena qualquer esforço. Considerando a educação
amor) que nos parecem ter sido sufocados no corre- como um “estar com”, perguntamos: como educa-
corre diário. Ainda acreditamos ser a família esse dores, quantas vezes paramos para refletir sobre
espaço privilegiado de socialização, de exercício o porquê de muitos que iniciaram conosco já
de tolerância e função de responsabilidade, ideal, constituírem “ausências” ? Neste “caminhar com”,
enfim, para a prática plena da cidadania. Sabemos a escola tem deixado de exercer sua função de
também, como esta vem sendo exigida nas buscas
ajudar cada criança e adolescente, que necessita
coletivas diárias de estratégias de sobrevivência.
mais de apoio para vencer seus obstáculos natu-
Discutir droga, violência e família requer antes de
rais e menos de quem os imponha dificuldades
tudo a superação de condutas alicerçadas na
ainda maiores. Tem faltado à escola olhar cada
concepção de que a família é incapaz, incompetente,
aluno como cidadão do ensino e não como con-
desestruturada. Precisamente este último preconceito
sumidor deste. O modelo hegemônico da educa-
precisa ser revisto, discutindo desestruturação não
ção, onde a preferência ainda está voltada para
somente sob o pressuposto do modelo nuclear, mas
aqueles intelectualmente melhores, que dão sem-
dentro dos conceitos modernos e atuais de família
pre respostas que a escola quer ouvir e que po-
saudável, cuja prática se fundamenta em outros
tencialmente representam sucesso, contribui para a
valores.
marginalidade, a exclusão de tantos que já ven-
Precisamos também discutir a escola, teoricamente cendo obstáculos para galgar um lugar na sala
protetora, desde que não passe a assumir junto aos de aula vêem seus potenciais podados e seus
jovens atitudes discriminatórias e marginalizadoras sonhos frustrados, só porque muitas vezes não
tantas vezes presentes, conforme exemplos que representam o “modelo” que a escola estabelece
seguem. Hasenbalg (1987), em pesquisa concluída como “normal”.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 69


Adolescência
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Por fim, recorremos ainda como exemplo desta mesma Referência Bibliográfica
violência e impunidade a veiculação indiscriminada
01 - CARVALHO, Fernando V., Realidade atual sobre o consumo
do álcool entre adolescentes, onde fabricantes e de drogas. IN: Anais do II Congresso Brasileiro de
vendedores visam sempre esta população como Adolescência. Pernambuco, 1991.
grande promotora de amplas oportunidades de lucro, 02 - GUATTARI, F. et al. Micropolítica - Cartografias do Desejo.
Ed. Vozes, Rio de Janeiro, 1993.
protegido sob os pseudo-rótulos de liberdade. E o 03 - ELIAS, Norbert. A Sociedade dos Indivíduos. Jorge Zahar
direito do jovem de ser protegido, como fica? Editor, Rio de Janeiro, 1994.
Quando entretanto, sob o comando do mesmo álcool, 04 - GASSET, Ortega Y. Em Torno a Galileu. Esquema das
Crises. Editora Vozes, Rio de Janeiro, 1989.
uma cena mais violenta ocorre, mutilando ou ceifando
05 - PERES, F. Adolescência em busca dos sujeitos sociais.
vidas adolescentes (acidentes, homicídios, suicídios, Tese de Doutoramento apresentada à Faculdade de Saúde
etc.) “arvoradores da verdade” logo se levantam e Pública da USP – São Paulo, 1995.
06 - MNMMR – Movimento Nacional de Meninos e Meninas
“vozes justiceiras” se pronunciam em julgamentos
de Rua e Instituto Brasileiro de Análises Sociais e
implacáveis, onde o adolescente comumente é o réu Econômicas (IBASE). Aspectos da Violência contra crianças
e culpado. e adolescentes. Rio de Janeiro, 1991.
07 - MINAYO, M. C. S. A violência na adolescência – um
Podemos afirmar, no convívio próximo com tantos problema de Saúde Pública. Cad. De Saúde Pública VG
Nº 3, 1990.
jovens há anos, que reabastecemos continuamente
08 - MINAYO, M. C. S. O Limite da Exclusão Social – Meninos
nossa confiança em dias melhores através deles, e Meninas de Rua no Brasil. Hucitec – Abrasco, São
desde que venham ter melhores referenciais adultos. Paulo / Rio de Janeiro, 1993.
09 - ONU – Organização das Nações Unidas. Relatório da
Para enfrentar a questão, temos que preparar nossos Comissão Internacional dos Direitos Humanos, 1992.
adolescentes. Na prevenção do problema, 10 - HASENBALG, Carlos A. Desigualdades Sociais e
Oportunidade Educacional – A Produção do Fracasso.
concordamos com Tufik (1988) e não acreditamos Caderno Pesq. (63), Rio de Janeiro, 1987.
na eficácia de atitudes meramente repressivas. Os 11 - RAMOS, Dias, M. Teresa. Tese de Mestrado. IN:
dados não justificam atitudes discriminatórias. A HASENBALG, Carlos. Desigualdades Sociais e
Oportunidade Educacional - Produção do Fracasso –
atenção ao usuário deve ser pautada na promoção INPERJ. Cad. Pesq. (63), Rio de Janeiro, 1987.
de saúde e de melhor qualidade de vida, seja ele 12 - TUFIK, Sérgio. Abuso de Drogas. IN: Adolescência e
Saúde – Comissão de Saúde do Adolescente. Secretaria
residente em suntuoso prédio ou sobrevivente das
de Estado da Saúde de São Paulo. Paris Editorial, São
ruas de qualquer cidade. Paulo, 1988.

Doenças Psicossomáticas
MARIA DE FÁTIMA GOULART COUTINHO

Para termos uma compreensão mais ampla dos relação de amor – a relação mãe e filho. Nessa
processos do adoecer, é fundamental considerar-se fase, pela exigüidade de possibilidades de expressão,
a totalidade do ser humano e das circunstâncias que o corpo passa a ser o veículo de contato com o
o rodeiam. O indivíduo, no decorrer do seu mundo. Na relação sintônica, a criança vai
desenvolvimento, constrói e estrutura formas de ser e encontrando novos meios de comunicação e de
de reagir aos diferentes estímulos aos quais pode ser defesa diante das situações de conflito e na obtenção
submetido no sentido de manter sua homeostase. da satisfação de suas necessidades.
A cada etapa do desenvolvimento, a identidade Assim, a somatização é um mecanismo de defesa
constitui características próprias de cada indivíduo. fixado nas fases iniciais do desenvolvimento afetivo,
Esse processo evolutivo tem início no nascimento, pois a perda da sintonia na relação mãe-filho faz
através dos primeiros contatos na mais profunda com que o bebê reaja fisicamente, uma vez que a

70 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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via de comunicação da criança está, a princípio, Segundo Guir, o fenômeno psicossomático possui
quase que exclusivamente constituída por suas funções três etapas: a) separação brutal de um ente querido
vegetativas, pelos seus órgãos (infans = que não (morte, separação, desmame); b) a separação se
pode falar ainda). Essa comunicação pré-verbal repete na realidade ou um conjunto de significantes
constitui-se numa das chaves para o entendimento particulares que relembram ao sujeito; c) antes de
dos processos psicofisiológicos. um ano após a lesão aparece.
Os transtornos psicossomáticos são desordens em O estresse significa um esforço para adaptação,
que os fatores psicológicos contribuem significa- geralmente em resposta a mudanças na vida. O ser
tivamente para o desenvolvimento, exacerbação ou humano é capaz de adaptar-se ao meio ambiente
manutenção da doença. Podem acometer vários desfavorável, mas esta adaptação não ocorre
órgãos e, embora fatores emocionais exerçam impunemente. As doenças de adaptação são
importante papel, não são necessariamente exclusivos. conseqüências de excesso de hostilidade ou de
excesso de reações de submissão. Quando as
Em muitas situações, o termo psicossomático vem sendo
mudanças excedem a capacidade e os recursos
substituído por psicofisiológico – termo que evidencia
adaptativos, os efeitos negativos, tais como sintomas
maior consciência de que os fatores psicossociais e
psicossomáticos, podem emergir.
os biológicos são aspectos inseparáveis e
interdependentes em todas as doenças. Na maioria Na adolescência, encontramos fatores estressores
dos artigos atuais, o termo psicossomático é usado do desenvolvimento, gerado pelas incontroláveis
para sintomas nos quais os achados orgânicos estão mudanças corporais e pela definição do papel
ausentes ou de muito pouca expressão. sexual, além de estressores gerados por eventos
inesperados (rompimento de relacionamentos, confli-
Os pacientes portadores de doenças psicossomáticas tos familiares e escolares, etc.), fazendo com que o
têm uma atividade fantasmática reduzida. Sonham adolescente se refugie no seu mundo interior para
pouco e seus sonhos são “realistas”: eles repetem o que possa fazer uma ligação com o seu passado.
que fazem durante o dia e o que se passa na Sendo assim, há uma somatização normal nessa
realidade. Há muito pouca elaboração psíquica, faixa etária, produto das mudanças biológicas, que
como se o pré-consciente funcionasse de modo são vivenciadas com angústia. Aqui, é importante
insuficiente. Não há afeto, nem via imaginária. Se assinalar que a somatização, assim como os sintomas
lhes sobrevem um acidente da existência, uma perda, psicossomáticos, são diferentes da simulação, já que
um luto, reagem com uma doença somática. A o paciente está sinceramente relatando suas sensações
eclosão psicossomática está correlacionada a corporais e não usa conscientemente esses sintomas
acontecimentos reais, por exemplo, a uma perda. para manipular ou controlar pessoas ou situações,
Existem características que são comuns aos pacientes mesmo que inconscientemente haja ganhos. Além
psicossomáticos: disso, é importante ressaltar que a presença de
uma desordem orgânica identificável não exclui a
– Alexitimia: Impossibilidade de nomeação dos
possibilidade do adolescente poder vivenciar níveis
próprios sentimentos, como uma falha no reco-
elevados de estresse podendo influenciar o curso da
nhecimento de seus estados afetivos;
doença.
– Pensamento operatório: Esses pacientes possuem
Alguns estudos têm procurado identificar componentes
um mundo interno pobre; investem intensamente na
do estresse que possuem maior relação com as
realidade externa, da qual passam a ser dependentes
desordens psicossomáticas. Esses estudos mostram
ou “hiperadaptados”. De ordem pragmática, quando
que os sintomas psicossomáticos são mais freqüentes
sofrem problemas existenciais, intensificam o
em adolescentes submetidos a estilos de vida mais
investimento no trabalho para que este ocupe o lugar
estressantes, nos que apresentam níveis maiores de
interno segurador (mãe). As representações ou
ansiedade e depressão, nos que têm menores recursos
percepções carregadas de afetos são afastadas da
sociais, nos que contam com menor suporte de
mente e as tensões físicas não encontram caminho
parceiros, nas famílias que respondem com atenção
para o psíquico, permanecendo no campo físico.
e privilégios especiais e em que haja altos níveis de
– Anhedonia: Dificuldade de viver emoções somatização, nos que conseguem perceber suas
prazerosas. limitações adaptativas.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 71


Adolescência
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Entre os transtornos psicossomáticos, os mais freqüen- responde bem a terapias que combinem terapia fí-
tes na adolescência são: sica e ocupacional, enquanto se trabalham as situ-
– Dor abdominal recorrente: É a mais comum, inclu- ações psicológicas subjacentes.
indo sintomas de motilidade intestinal e dispepsias. – Fadiga crônica
Dados recentes sugerem que crianças e adolescentes – Hiperidrose, acne, alopecia, dermatite seborréica,
com dor abdominal recorrente têm maiores possibili- eczema atópico, urticária, edema angioneurótico;
dades de diagnóstico de síndrome do cólon irritável. – Asma, rinite, sinusite crônica, soluços;
– Cefaléias: Isolada ou em associação com dor
– Colite ulcerativa, cardioespasmo, enterite, mega-
abdominal. A forma mais comum é a cefaléia
colon, cólica persistente, vômitos recorrentes, altera-
tensional episódica ou crônica. Muitas vezes, a
ção da salivação;
cefaléia tensional coexiste com a enxaqueca.
– Taquicardia paroxística, espasmos vasculares peri-
– Dor torácica: Freqüentemente associam à
féricos, enxaqueca, certas epistaxes, hipertensão
possibilidade de doença cardíaca, o que muito
essencial, algumas hipotensões;
raramente pode ser verdadeiro. A ansiedade e a
– Lombalgias, artralgias, mialgias, certas cãibras,
hiper ventilação podem estar associadas e,
bruxismo;
freqüentemente, pode-se relacionar a situações de
maior estresse. – Amenorréia, dismenorréia, TPM, poliúria, disúria,
– Dor músculo-esquelética: Ocorre em mais de 20% perturbações da função sexual;
de crianças e adolescentes e os principais estressores – Vertigens, perturbações do sono;
estão relacionados à família ou à escola. A maioria – Zumbidos, hiperacusia.

DOR RECORRENTE: Localização e diagnóstico diferencial

Sintoma Enf. funcional Enf. Orgânica


Cefaléia - Contração muscular - Massa expansiva, hematoma subdural
- Enxaqueca - Malformações vasculares: aneurismas, angiomas
- Depressão - Inflamação: meningite crônica ou residual, vasculite
- Fobia escolar - Dor referida: dental, seios paranasais, disfunção temporomandibular, erros de refração
Dor torácica - Ansiedade - Costocondrites
- Hiperventilação - Síndrome da parede torácica
- Reação de conversão - Cardíacos: prolapso de válvula mitral, estenose congênita de válvula aórtica,
- Depressão isquemia, hipercolesterolemia.
- Fobia escolar - Gastrointestinal: hérnia hiatal, esofagite.
Dor - Psicogênica - Úlcera péptica, colelitíase, refluxo gastroesofágico, pancreatite.
abdominal - Colon irritável - Doença de Crohn, colite ulcerativa.
- Dor abdominal - Doença celíaca
recorrente - Abuso de laxativos
- Intolerância à lactose - Síndrome de Fitz-Hugh Curtis ( Gonococos, Clamídia)
- Fobia escolar - Metabólicas: acidose, porfinúria
- Origem - Intoxicação por chumbo
desconhecida - Parasitose intestinal
Dor pélvica - Psicogênica - Doença pélvica inflamatória crônica
- Depressão - Endometriose/Dismenorréia
- Abuso sexual - Aderências cirúrgicas/Abscesso tubo-ovário
- Milttelschmerz - Malformações/Cisto folicular de ovário/Cisto lúteo
(ovulação) - Causas não ginecológicas: constipação crônica, abuso de laxantes, cólica ureteral
Dor dorso- - Somatização - Postural / Traumático: fratura
lombar - Ansiedade - Infeccioso/inflamatório: discite, osteomielite crônica, abscesso epidural
- Hipocondríase - Reumáticas: espondilite anquilosante, artrite, artrite reumatóide, Doença de Reiter,
Espondilite/espondilolistese.
- Hérnia, falcemia, neoplasias vertebrais intraespinhais.
- Dor referida.
Dor no - Osgood-Schlatter, Síndrome dolorosa patelo-femural (condromalácia de patela).
joelho - Suluxação ou deslocamento de rótula.
- Osteocondrite dissecante. Tendinite patelar. Artrite. Sinovite. Dor referida.
Deslizamento de cabeça femural.

72 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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Prevenção da Gravidez na Adolescência -


Uma Visão Interdisciplinar
PAULO CÉSAR PINHO RIBEIRO

INTRODUÇÃO brasileira. Esse grupo populacional se encontra


vulnerável à gravidez, à violência sexual e às doenças
Quase 20% da população mundial é constituída de sexualmente transmissíveis, incluindo a Aids, sendo
pessoas na faixa etária entre 10 e 19 anos, que as adolescentes menores de 18 anos apresentam
totalizando um bilhão de adolescentes. No Brasil, maior índice de complicações e mortalidade materna.
as cifras ultrapassam os 20%, com cerca de 32
milhões de jovens de ambos os sexos nessa faixa Alguns dados sobre a saúde sexual e reprodutiva
etária, o que significa 21,84% da população dos adolescentes, no Brasil e no mundo:

– A cada ano, mais de 14 milhões de adolescentes dão à luz no mundo.


Fonte: Alan Guttmacher Institute, 1998.

– A cada dia, são realizados 55 mil abortos inseguros no mundo.


Fonte: Organização Mundial de Saúde, 1997.

No Brasil, o parto representa a primeira causa de internação de meninas no Sistema Público


de Saúde (adolescentes de 10 a 14 anos na adolescência inicial).
Fonte: Ministério da Saúde - SIH/SUS; Ecos - Sylvia Cavasin.

No Brasil, apenas 14% das jovens de 15 a 19 anos usam algum tipo de método
anticonceptivo. A pílula é utilizada por 7,9% das jovens nessa faixa etária.
Fonte: Dados de Demography Health Survey - DHS/96; FNUAP - Brasil.

No Brasil, 14% das mulheres abaixo de 15 anos já tinham ao menos um filho.


Fonte: Pesquisa Nacional sobre Demografia e Saúde, 1997.

18% das adolescentes brasileiras já tiveram pelo menos um filho ou estão grávidas. Metade
das jovens de 14 a 19 anos sem nenhum ano de escolaridade já havia
sido mãe.
Fonte: PNDS, 1996; CNPD, 1997.

Em 1997, no Brasil, houve 2.178.265 partos, sendo que 32% foram cesarianas.
Fonte: Ecos - Sylvia Cavasin.

Estima-se que ocorram no país de 1 a 1,2 milhão de abortos ao ano.


Fonte: Programa Saúde da Mulher/Ministério da Saúde, 8/3/99.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 73


Adolescência
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Uma em dez mulheres de 15 a 19 anos já tem dois filhos, 49,1% desses filhos foram
indesejados, 20% das adolescentes residentes na zona rural têm pelo menos um filho, 13%
das adolescentes residentes na área urbana têm pelo menos um filho, 54% das adolescentes
sem escolaridade já ficaram grávidas, 6,4% de meninas com mais de 9 anos de escolaridade
já são mães ou estão grávidas do primeiro filho, 20% das adolescentes da região nordeste
têm pelo menos um filho e 9% das adolescentes da região centro-oeste têm pelo menos um
filho.
Fonte: PMDS (Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde).

O que mais preocupa os jovens atualmente? Medo do futuro incerto - 33%, falta de
emprego - 27%, Aids - 14%, violência - 9%, drogas - 4%, gravidez - 3%, todos os ítens
citados - 10% e outros - 1%.
Fonte: Mapa Marketing

Pesquisa sobre a sexualidade dos estudantes entre 13 e 19 anos em Belo Horizonte -


39,6% já tiveram uma experiência sexual, 12,7% já pagaram para ter sexo, 5% já se
prostituíram, 1,6% confessaram ter sido vítimas de abuso sexual e 8,2% já fizeram sexo
em grupo.
Fonte: Grupo de Estudo Multiprofissional sobre Adolescência/U.F.M.G.

A análise e o estudo dos dados e estatísticas relatados jovens, mas proibindo a gravidez precoce. As práticas
têm nos mostrado que, apesar de todos os esforços sexuais pelos rapazes são consideradas manifestações
envidados no sentido de prevenção da gravidez na de virilidade e força. As moças recebem, como os
adolescência, os resultados têm sido precários. rapazes, informações sobre sexualidade, só que há
Falta o quê? Falhamos onde? Como repensar as uma desvinculação com as suas experiências, já que
estratégias? Quais foram as dificuldades no para elas os desejos devem ser reprimidos, ligados
estabelecimento de vínculo com essa clientela? ao casamento, à heterossexualidade e à função
Falhamos na abordagem ou a questão primordial reprodutora. Suas emoções, sensações e seus
não é descobrir o que aconteceu, mas sim o que sentimentos não são considerados. Fica extremamente
faremos a partir de hoje? difícil trabalhar a prevenção da gravidez na
adolescência quando deparamos com uma moral que
No nosso curso “Especialização em Adolescência”
reprova o uso de anticoncepcionais entre as não
da Faculdade de Ciências Médicas, temos trabalhado
casadas, especialmente pelas adolescentes. Além
a atenção integral ao adolescente, numa visão
disso, há um pequeno número de serviços contra-
biopsicosocial, envolvendo profissionais da saúde e
ceptivos para a clientela masculina, a divulgação de
educação. Talvez, pensando numa abordagem
métodos que não atendem às necessidades das ado-
interdisciplinar, possamos ter no futuro resultados mais
lescentes e que sejam para elas adequados, as difi-
satisfatórios ao abordamos questão tão delicada:
culdades no fornecimento de anticonceptivos, princi-
Por que os nossos adolescentes têm engravidado?
palmente para as adolescentes pobres e a ausência
de ações que atentem para as necessidades reais
CONSIDERAÇÕES dos jovens e sua sexualidade.
A sociedade não reconhece e tende a ignorar o
exercício da sexualidade pelos jovens. Muitas vezes,
no processo educativo, qualquer manifestação de
A ESCOLA
sexualidade é negada, reprimida ou vista com uma A orientação afetivo-sexual, programa que vem
certa intolerância, ou a sociedade mostra-se pseudo- sendo implantado e implementado pelas escolas,
permissiva, permitindo o exercício da sexualidade pelos desempenha papel importante na informação e

74 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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formação dos jovens. O programa é dado numa A FAMÍLIA


transversalidade na sua abordagem, após estabe-
A família tem que criar um vínculo de confiança com
lecida a necessidade através de um levantamento e
os filhos -tarefa que não é fácil- para que possa
diagnóstico dos questionamentos e aspirações dos
repassar informações para a formação sexual dos
alunos. O trabalho em questão seria um dos fatores
adolescentes. É imprescindível que os pais revejam
que poderiam estar influenciando, no futuro, a dimi-
conceitos sócio-culturais, livrem-se de tabus, mitos e
nuição das estatísticas com relação à gravidez e à
preconceitos e tenham, também, uma orientação
redução das doenças sexualmente transmissíveis e
afetivo-sexual, estabelecendo dessa forma um modelo
da Aids na adolescência. É importante não priorizar
sexual a ser seguido.
os aspectos negativos da sexualidade e sim enrique-
cer os currículos com orientações verdadeiras, sem Valores familiares se confrontam com informações
ideias tendenciosas ou preconceituosas, desmis- duvidosas, distorcidas e contraditórias dos meios de
tificando tabus, com adequação de recursos huma- comunicação, dando aberturas para atitudes de
nos suficientemente sensíveis para discutir, além dos desafio e auto-afirmação dos jovens, algumas vezes
problemas que possam ser gerados pelo exercício resultando em gravidez indesejada.
da sexualidade, o amor, a intimidade e a responsa- É importante a disponibilidade dos pais, a abertura
bilidade interpessoal. Trabalhar o exercício da e o diálogo com os filhos, para que os assuntos
sexualidade, deixando claro que ele se faz por sobre sexualidade possam ser tratados não de uma
opção, com maturidade e responsabilidade, com forma pré-estabelecida, mas sim no momento em
conhecimento do próprio corpo e o do parceiro, que surgem. Às vezes a oportunidade é rara e deve
com informações sobre o seu funcionamento, com ser aproveitada imediatamente.
conhecimento dos métodos anti-conceptivos, com
respeito ao próximo e com afetividade. À escola,
além de informar, cabe trabalhar sempre a afeti- A MÍDIA
vidade. Vivemos numa sociedade altamente erotizada e a
O sistema educacional brasileiro deve estar alerta mídia contribui com grande intensidade com a
aos altos índices de adolescentes fora da escola que exibição de filmes, novelas, shows, programas e
engravidam. É importante corrigir esta falha, já que comerciais onde o erótico, muitas vezes o porno-
a escola pode ser fator de resiliência (fator protetor) gráfico está presente, transformando fatos que gera-
no que tange ao assunto em discussão. Muitas vezes, riam problemas na vida real em situações que se
ao engravidar, as adolescentes são “convidadas” a resolvem da melhor maneira possível na tela.
sair da escola, já que seriam um péssimo exemplo Com frequência, assistimos a profissionais não
para as colegas. Com essa evasão, a escola deixa capacitados a analisar questões da sexualidade
de funcionar como fator protetor numa segunda transmitindo como verdades sua visão distorcida do
gravidez, que muitas vezes acontece dois a três tema. Outras vezes questões individuais não bem
anos após a primeira. Sem perspectivas otimistas de explicitadas são colocadas como o correto a ser
vida, mais fragilizadas ainda, muitas dessas jovens seguido, influenciando de maneira desastrosa um
tendem a repetir várias gestações seguidamente e se público que inicia a sua formação e na maioria a
acomodam no papel de mães. sua orientação afetivo-sexual.
A escola é apontada por todos os especialistas como Aproveito a oportunidade para citar o que considero
um dos canais na prevenção da gravidez indesejada uma das melhores definições para a educação sexual,
na adolescência. a de Cecília Cardinal de Martin:

“A educação sexual deve ser:


– uma educação mais para o ser do que para o ter e o fazer,
– uma educação para a formação de auto-consciência e dos próprios valores,
-– uma educação para a troca,
– uma educação para a liberdade (com responsabilidade!)
– uma educação para o amor,
– uma educação para a vida passada, presente e futura.”

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 75


Adolescência
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A ADOLESCÊNCIA doenças sexualmente transmissíveis do que com a


gravidez.
O pensamento mágico (onipotência pubertária e não
se achar vulnerável) do/a adolescente os induz a Não podemos deixar de envolver o adolescente
achar que a gravidez nunca vai acontecer com ele/ masculino em todas as nossas propostas de prevenir
ela. Muitas vezes conhecem até o método anti- uma gravidez indesejada. Cabe aqui a clássica
conceptivo, mas pelo pensamento mágico não fa- pergunta ao rapaz: “Qual seria a sua responsabili-
zem uso dele. dade numa relação sexual se soubesse que poderia
ficar grávido?” Cabe também alertá-lo para as con-
Não se nota, quando a adolescente engravida,
seqüências legais, sociais e econômicas da ques-
intenção consciente de fazê-lo. Nas várias situações
tão.
observadas existem fatores que fazem com que
aconteça a gravidez: busca de uma novo momento Pesquisas feitas entre adolescentes mostram o papel
por desajustes na família, falta de perspectivas no importante na prevenção da gravidez desempenhado
futuro, o exercício da sexualidade sem prevenção e pelos pediatras ao iniciarem esse trabalho em idade
no envolvimento da paixão, a ignorância quanto à pré-púbere, na qual as crianças escutam mais os
anticoncepção, a conduta dos pais achando que adultos, podendo as informações recebidas mudar o
conhecer métodos anticonceptivos possa levar seus rumo de suas vidas. Os pais sempre recorrem aos
filhos ao sexo desenfreado e o fato de a adolescente pediatras, não só em questões envolvendo as práticas
querer testar a fertilidade e ser mãe. curativas e preventivas da especialidade, mas também
solicitando ajuda no que diz respeito a atitudes,
educação e formação de seus filhos. Durante as
A SAÚDE consultas pediátricas, os pais se mostram mais
Existem falhas no fornecimento de informações à receptivos e daí o papel importante do pediatra nas
mulher sobre o funcionamento do seu corpo, das práticas educativas e preventivas.
questões envolvendo o exercício da sexualidade,
sobre a reprodução e anticoncepção e mesmo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
onde buscá-las. O que verificamos, na nossa rea-
lidade, são jovens atingindo o período fértil sem E AÇÕES
conhecimentos básicos sobre o corpo e seu fun- 1. Educação para a sexualidade adequada,
cionamento, ficando difícil controlar adequadamen- privilegiando as relações humanas, os sentimentos,
te a sua fertilidade. A pobreza agrava a questão as responsabilidades sexuais e as expectativas
pela dificuldade das adolescentes na aquisição individuais, saindo do lugar-comum das informações
dos contraceptivos. Campanhas veiculadas por apenas biológicas.
todos os setores da saúde esclarecem sobre a
importância da prevenção no que se refere à 2. Valorizar a educação geral como um todo,
gravidez e doenças sexualmente transmissíveis, trabalhando não só as questões que envolvam
mas na maior parte das vezes os métodos não se sexualidade, mas a importância da saúde física,
encontram disponíveis para dispensação, mesmo mental, sexual e reprodutiva.
os dois importantes para os adolescentes: a pílula 3. Motivar, capacitar, informar, treinar e qualificar os
e a camisinha. educadores e os profissionais da saúde para trabalhar
Os profissionais da saúde não podem ignorar que a sexualidade dos jovens com conhecimento, sem
os adolescentes têm iniciado atividade sexual idéias tendenciosas ou preconceituosas, livres de mitos
precoce, que usam incorretamente os métodos e tabus, sem barreiras religiosas, que gostem dessa
anticonceptivos e que o método contraceptivo de tarefa e nela sintam-se à vontade. Entretanto, é
escolha na adolescência é o anticoncepcional oral importante o respeito ao indivíduo, sua privacidade,
(disponível nos serviços de saúde, mais seguro, tem seu livre-arbítrio e sua crença religiosa.
poucos efeitos colaterais e dispensa colaboração 4. Estimular a formação de multiplicadores adoles-
do parceiro). centes.
O grupo de parceiros masculinos tem preocupa- 5. Envolver os adolescentes no trabalho preventivo,
ção maior na prevenção no que diz respeito às principalmente o adolescente masculino.

76 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Adolescência
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6. Implantação de serviços que promovam a aten- Referências bibliográficas:


ção integral ao adolescente, implementação de ser-
01 - CANELLA, P. Problemas da Sexualidade na Adolescência,
viços já existentes para aconselhamento/prevenção Ginecologia e Obstetrícia Atual, março, Ano VII, nº 3,
e provisão de serviços de contracepção adequados 1998.
a essa faixa etária. 02 - DADOORIAN, D. Adolescentes, por que elas engravidam?,
Femina, janeiro-fevereiro/96, vol. 24, nº 1.
7. Trabalhar, sempre, com os jovens o resgate da 03 - MELO, J. et al. Adolescentes “Saúde Sexual e Reprodutiva”-
Dossiê, Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos
prudência e o não envolvimento em situações de Reprodutivos, Brasil, 1999.
risco. 04 - POLI, M.E.H. Sexo seguro, atualização, Femina, novembro
-dezembro/96, vol. 24, nº 10.
Finalizando, o problema atual da gravidez na 05 - SAITO, M.I. Sex Education in school: preventing unwanted
adolescência, um problema social, não constitui pregnancy in adolescents, International Journal
of Gynecology and Obstetrics 63, suppl. 1, 1998,
apenas uma preocupação do governo, mas de todos S157-S160.
os profissionais envolvidos na tarefa de atenção à 06 - SERAPIÃO, J.J. A escola e a Educação Sexual dos
clientela adolescente. Adolescentes, Ginecologia e Obstetrícia Atual, agosto,
ano VII, nº 8, 1998.
Muitas das estratégias ou ações são criadas a partir 07 - SILVA, E.S.R.; BRUNO, Z.V.; BEZERRA, M.F. e OLIVEIRA,
do exercício do atendimento que gera uma constante F.C. Anticoncepção na Adolescência - importância da
escolha, Ginecologia e Obstetrícia Atual, junho, ano V,
descoberta de técnicas apropriadas para melhor nº 6, 1996.
atendimento a essa clientela. Uma vez estabelecido 08 - SILVA, J.L.P. Gravidez na Adolescência: desejada x não
um bom vínculo de confiança entre as partes, desejada, Femina, novembro, 98, vol. 26, no. 10.
09 - VIEIRA, E. M.; FERNANDES, M.E.L.; BARLEY, P. e MCKAY,
certamente obteremos êxito na nossa tarefa, que não A. Seminário “Gravidez na Adolescência”, Rio de Janeiro,
é só minha, mas também sua e de todos nós. 30 e 31 de julho, 1998

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 77


Adolescência
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78 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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Choque Séptico na Criança


PEDRO CELINY RAMOS GARCIA

INTRODUÇÃO básica3 . Espera-se em breve novas terapias adjuvantes


que contribuirão para a redução na morbidade e
O choque séptico é uma das manifestações mais
mortalidade associada o choque séptico4 .
complexas e menos entendidas da infecção1 . Final
comum de muitas doenças infecciosas, esta
manifestação, antes vista como uma complicação da FISIOPATOLOGIA EVOLUTIVA
sepse, é hoje classificada como parte integrante deste
processo mórbido que continua sendo um problema DA SEPSIS
tanto para os pediatras, como para os clínicos e os Pode-se descrever a seqüência que leva ao choque
investigadores2 . Nesta última década se conseguiu séptico da seguinte forma: estes agentes agressores
alguns avanços no entendimento da fisiopatologia desta interagem com o sistema imune do organismo. Uma
doença que se refletiu em um tratamento intervencionista vez a cascata de eventos se inicie a progressão
e agressivo mas ainda não foram insuficientes para clínica da doença pode eventualmente se
modular de forma eficaz sua resposta fisiopatológica autoperpetuar5 (figura 1).

Figura 1: Representação Esquemática dos Principais Eventos no Choque Séptico

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 79


Terapia Intensiva
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FISIOLOGIA DO CHOQUE SÉPTICO resultar de má distribuição do volume intravascular


(perda do tônus vascular), deficiência do volume
Os componentes hemodinâmicos que contribuem para
intravascular (componente hipovolêmico), disfunção
a instalação e a manutenção da choque séptico podem
miocárdica (choque cardiogênico) (ver figura 2).

Figura 2: Etiologia do Choque

Além de uma diminuição no aporte de oxigênio em


nível tecidual, decorrente de redução no débito
TRATAMENTO
cardíaco e de má distribuição sangüínea em nível Ressuscitação Volumétrica
capilar, existe uma diminuição na captação de
Pacientes em choque necessitam de pelo menos um
oxigênio em nível celular secundária à disfunção
acesso vascular que permita infusões de grandes
mitocondrial. No ambiente celular, estabelece-se uma
volumes de soluções colóides ou cristalóides. Nesta
insuficiência energética em função da diminuição da
situação, preterimos a canulação percutânea da veia
oferta de oxigênio (DO2) e do consumo de oxigênio
subclávia ou da jugular interna. Se a cateterização
(VO 2), apesar de uma necessidade energética
de veia de grosso calibre não for possível ou tornar-
aumentada6 . De relevância clínica, vemos que, em
se demorada, resta-nos a opção da punção intra-
termos práticos, não se dispõe de meios para
óssea9 ,
aumentar a captação de O2 em nível celular (VO2),
mas sim para aumentar o transporte de O2 (DO2)7 . Propomos, para a primeira infusões de pelo menos
Em razão dessas alterações, há também um 60 ml/kg de Soro Fisiológico (Solução salina normal
comprometimento do sistema cardiovascular como 0,9%) ou SF, divididas em 20-30 ml a cada
um todo8 . 20-30 minutos. Caso não ocorra reversão do
choque com tal expansão, inciamos a monitorização
Uma nova moldura para um velho quadro – o
da PVC. Um valor abaixo de 5 mmHg (6,5 cm de
C.H.A.O.S
água) é sinal de persistência da situação de
O quadro clínico do choque séptico pode ser descrito hipovolemia. indicativo da necessidade de
à luz dos mecanismos descritos por Bone (Figura 3). novas infusões. A figura 4 exemplifica bem a

80 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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Figura 3: Evolução da Sepse, SIRS, CARS e MARS

Figura 4: Ressuscitação volumétrica no Choque Séptico

seqüência por nós usada na fase de ressuscitação SUPORTE ANTI-INFECCIOSO


volumétrica do paciente em choque.
Nos casos em que ainda persiste o quadro de Uma vez considerada a possibilidade de choque
hipovolemia após a ressuscitação volumétrica com séptico, deveremos: (a) coletar as culturas pertinentes
pelo menos 60 ml/kg de SF na primeira hora ou a cada caso e iniciar com antibióticos (quadro 1);
sinais de hipervolemia extravascular (edema por (b) iniciar um esquema seqüencial de drogas
exemplo) podemos considerar o uso de albumina cardiotônicas-vasoativas para suporte farmacológico
(0,5-1g/kg) ou plasma fresco (10 ml/kg por vez). da circulaçãoErro! Indicador não definido..

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 81


Terapia Intensiva
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Quadro 1 - Esquema Empíricos Iniciais de Antimicrobianos na Sepse

INFECÇÃO COMUNITÁRIA INFECÇÃO HOSPITALAR1

Faixa etária do Foco Respiratório Foco Digestivo2 Foco Respiratório Foco Digestivo2
hospedeiro ou indeterminado ou Urinário ou Cateter3,4
ou Urinário

Recém- Ampicilina + Ampicilina + Vancomicina5 + Cefotaxima +


nascido gentamicina ou gentamicina ou cefotaxima ou amicacina
cefotaxima cefotaxima ceftazidima

1 a 3 meses Ampicilina+ Ampicilina + Vancomicina + Cefalosporina 3ª+


Cefalosporina 3 ª
Cefalosporina 3 ª
Cefalosporina 3 ª
amicacina
(ou ceftazidima)

3 meses a 7 anos Cefalosporina 3ª2 Cefalosporina 3ª Vancomicina + Cefalosporina 3ª +


Cefalosporina 3 ª
amicacina
(ou ceftazidima)

Após 7 anos Pen. G cristalalina Cefalosporina 3ª Vancomicina + Cefalosporina 3ª +


ou cefuroxima Cefalosporina 3 ª
amicacina
(ou ceftazidima)

Observações:
1.Considerar imunocompetêncla do pacientce procedimentos invasivos, como também a prevalência de
germes e o padrão de sensibilidade do local (CCIH).
2.Com suspeita de foco abdominal, adicionar metronidazol; p. ex.. em apêndice roto, preferir anipicilina
+ gentamicina + metronidazol.
3.Considerar o uso de TMP+SMX e eritromicina na presença de pneumonia intersticial.
4.Uso de anfotencina B nos casos de sepse prolongada (> lO dias), especialmente na presença de
fatores agravantes cara s Candida ap. )ver texto).
5.Conforme a sensibilidade dos Stafilococcus no hospital considerado (CCIH).

Segundo Carvalho PRA ,Garcia PC, Cunha J., 1996

Dobutamina
SUPORTE CARDIOVASCULAR
Temos usado a dobutamina sempre que a resposta
Dopamina inotrópica à dopamina falha ou, primariamente. em
A dopamina. quando usada em dose baixa pacientes com conhecida falência da bomba
(2.5-5 µg/kg/min), tem ação predominantemente cardíaca. Iniciamos 5 µg/kg/min e aumentamos
delta. com aumento das perfusões esplâncnica e gradativamente a dose até I5 µg/kg/min. Geral-
renal e com discreta ação cardíaca. Dopamina em mente utilizamos a dobutamina associada a uma
dose média (5-15 µg/kg/min) tem ação predomi- infusão em dose baixa de dopamina (2,5-5 µg/kg/
nantemente beta. Possui moderado efeito inotrópico min) para tirar vantagem de sua ação delta. Doses
positivo, com pequeno risco para taquicardias e menores ou maiores de dobutamina poderão ser
arritmias, promove moderada vasodilatação periféri- usadas conforme variação individual.
ca (efeito beta-2 e delta) e um aumento do DC e
da PAM, tanto pelo aumento da FC, contratilidade, Adrenalina
como pela redução moderada na pós-carga. A adrenalina é uma potente catecolamina endógena.
Dopamina em dose alta (acima de 15 µg/kg/min) com ação simpaticomimética alfa e beta-agonista.
copia alguns efeitos das altas doses de adrenalina Sua ação hemodinâmica é dose dependente.
indesejável no tratamento do choque. assim, nas doses de 0,05-0.2 µg/kg/min. tem um

82 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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predomínio dos efeitos beta com moderado efeito Derivados Biperidínicos


alfa. enquanto nas doses de 0,2-0,5 µg/kg/min A milrinona é utilizadas preferencialmente no choque
predominam os efeitos alfa. com moderado cardiogênico por sua capacidade de reduzir a RVS
efeito beta. Geralmente, doses acima de 0.5 até e a RVP, ao mesmo tempo em que melhoram a
1,0 µg/kg/min resultam em constrição periférica. contratilidade cardíaca. sem induzir aumentos
Iniciamos a infusão com 0.05 µg/kg/min e aumen- significativos no consumo miocárdico de 02. A dose
tamos progressivamente a dose até o máximo de 1 de milrinona preconizada é uma infusão de 50 mg/
µg/kg/min. kg em 3-5 minutos. seguida de uma infusão contínua
<0,75 mg/kg/min)10 .
Noradrenalina
Comparada à adrenalina a noradrenalina tem a Escolha da Melhor Droga e da Associação Ideal
vantagem de causar bem menos arritmias e Nossas considerações anteriores mostram que pode
taquicardia. A associação da noradrenalina com haver variações consideráveis na resposta a uma
baixas doses de dopamina consegue melhorar a mesma droga inotrópica. Se uma resposta clínica
função renal, melhorando a distribuição regional de não é obtida com doses adequadas de uma amina
sangue para esta região. Iniciamos a infusão com simpaticomimética, uma outra droga ou combinações
doses baixas cerca de 0,025 µg/kg/min aumen- de agentes inotrópicos e vasoativos podem ser usadas
tando-as até 0,5 µg/kg/min. como no esquema abaixo (figura 5).

Figura 5: Suporte Farmacológico no Choque Séptico

BIBLIOGRAFIA 05 - Doughty LA, Kaplan SS, Carcillo JA. Inflammation and


multiple organ failure-induced mortality in pediatric sepsis.
Crit Care Med 1997;25: A125.
01 - Shenep JL. Septic Shock.In: Aronoff SC, Hughes WT, Kohl
S, Wald ER. Advances in Pediatric Infecsious Disease, 06 - Wong HR. Potential Protective Role of the Heat Shock
Vol 12, 1997, Mosby-Year Book p209-241. Response in Sepsis. New Horiz 6:194-200, 1998
02 - Nalhens AB, Marshall JC. Sepsis, SIRS, and SDMO; What’s 07 - Toweill DL, Goldstein B. Linear and Nonlinear Dynamics
in a nome? World J Surg 1996; 20:386-91. and the Pathophysiology of Shock. New Horiz 6:155
-168, 1998
03 - Leclerc F, Martinot A, Fourier C, Definitions, risk factors, and
outcome of sepsis in children. In: Tibboel D, van der Voort 08 - Murphy K, Haudek SB, Thompson M, Giroir BP. Molecular
E (eds.) Update in Intensive (‘are and Emergency Medicine Biology of Septic Shock. New Horiz 6:181-168, 1998
25. Intensive Care in Childrood. A Challenge to the Future. 09 - Guy J, Haley K, Zuspan SJ: Use of intraosseous infusion
Springer-Verlag. Berlin, Heidelberg, 1996: 227-38. in the pediatric trauma patient. J Pediatr Surg 1993;
04 - Singh-Naz N, Sprague BM. Patel KM. Pollack MM. 28:158-16 1
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A prospective cohort study. Crit Care Med 1996; 24: milrinone lactate in pediatrics patients with septic shock.
875-8. Crit Care Med 1996:24:1.302-12.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 83


Terapia Intensiva
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Traumatismo Cranio-Encefálico
SÉRGIO AUGUSTO CABRAL

INTRODUÇÃO Fatores determinantes da pressão


de perfusão cerebral
O traumatismo cranio-encefálico é um dos achados
mais freqüentes entre os traumas agudos em crianças A pressão de perfusão cerebral é a resultante da
e na adolescência. O manejo do trauma agudo de pressão arterial média menos a pressão intracraniana.
crânio requer uma avaliação clinica da causa (PPC = PAM – PIC)
primária da lesão e uma estimativa da existência de O aumento da pressão intracraniana é a maior causa
lesões intracranianas. Nosso enfoque principal será de redução na pressão de perfusão cerebral no
o primeiro atendimento de emergência visando reduzir trauma agudo de crânio. A pressão intracraniana é
a morbidade e mortalidade secundários ao TCE. mantida relativamente constante (< 15 mmHg) através
de mecanismos de compensação. Quando o limite
de complacência do sistema é esgotado, pequenos
EPIDEMIOLOGIA
acréscimos de volume geram um grande aumento na
Estima-se que 250.000 crianças e adolescentes sejam pressão intracraniana. (Figura 1)
admitidos nos serviços de emergência a cada ano,
vítimas de trauma agudo de crânio. Isto eqüivale a Mecanismos de compensação
2% de todas as admissões em serviços de emergência para o aumento da PIC
pediátrica. Estes acidentes resultam em 7.000 óbitos
e 29.000 casos de seqüela neurológica, em graus Liquor –Com o aumento da PIC ocorre deslocamento
variáveis. do liquor para o espaço subaracnóide. (Figura 2)
Volume sangüíneo cerebral –O fluxo sangüíneo
cerebral pode aumentar de forma importante no
FISIOPATOLOGIA DO trauma de crânio. Este aumento (hiperemia cerebral)
TRAUMA DE CRÂNIO ocorre logo após ao trauma sendo pouco conhecidos
As crianças são mais predispostas ao trauma agudo os mecanismos de sua geração. Sua redução pode
de crânio pelo maior tamanho proporcional da ser regulada por alterações da PaO2 e da PaCO2.
cabeça em relação ao resto do corpo. Os ossos (Figura 3 e 4)
do crânio são mais finos e eu cérebro é menos mie-
linizado e, consequentemente, mais sujeito a lesões.
Pode haver ainda uma maior perda de sangue em PRIORIDADES NA AVALIAÇÃO
grandes lesões do couro cabeludo, gerando choque
hemorrágico. As lesões do sistema nervoso central E CONDUTA NA EMERGÊNCIA
podem ocorrer no momento do impacto e são, 1. Avaliação funcional da via aérea, respiração e
geralmente, resultantes do trauma direto aos ossos circulação (ABC)
do crânio e às estruturas intracranianas. A via final
A abordagem inicial do trauma agudo de crânio
levando à lesão cerebral secundária é o aumento
segue o roteiro do suporte básico de vida como em
da pressão intracraniana e a diminuição da pressão
qualquer outra situação de grande risco para o
de perfusão cerebral. O edema cerebral é o achado
paciente.
mais frequente e importante, secundário ao aumento
do fluxo sangüíneo cerebral conseqüentes a distúrbios A instabilidade cardiocirculatória pode ser conse-
na autoregulação. A ruptura das membranas celulares qüência de lesão intracraniana grave, hipertensão
libera no espaço extracelular produtos do metabolismo intracraniana ou lesão de outras áreas como o tórax
celular como glutamato, ácidos graxos livres e e abdome. Seja qual for a causa, há necessidade
compostos vasoativos levando a uma maior deficiên- de um suporte ventilatório precoce e agressivo e
cia do sistema autoregulador. tratamento do choque quando presente.

84 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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Figura 1

100 Pressão
Intracraniana
(mmHg) 4

50
3
2
1

0
Volume Intracraniano

Figura 2

SNC Crânio
Transdutor

Plexo
Coróide

Arterial Venoso 10-15


Torr
Supine
Cérebro
Vilosidades
aracnóides
Espaço
Subaracnóide Foramen
Magnum

Representação do conteúdo intracraniano

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 85


Terapia Intensiva
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Figura 3

SNC Crânio
Transdutor
Plexo
Coróide

Arterial Ven. 25+


Torr

Cérebro
Vilosidades
aracnóides
Espaço
Subaracnóide Foramen
Magnum

Conteúdo intracraniano durante aumento


da pressão intracraniana

Figura 4

100 Fluxo Sangüíneo


Cerebral
(ml/100g/min)

50

0 3 6 9 12
Pa CO2 (kPa)

86 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

2. Trauma cervical associado aumentatendo em vista a cabeça proporcionalmente


maior da criança projetando-se à frente do corpo
O trauma cervical associado a choques leves é menos nestes acidentes.
comum que nos adultos devido à maior elasticidade
da medula e vértebras. Entretanto, nos grandes Desta forma o manejo inicial do paciente com trauma
traumas como colisões de carro ou quedas de grave deve observar a imobilização da coluna
grandes alturas, em que ocorrem lesões por cervical durante o atendimento e transporte do
aceleração/desaceleração, o risco de lesão medular paciente. (figura 5)

Figura 5

Fluxo Sangüíneo Cerebral


100 (ml/100mg/min)

50

0 6 12 18 24
Pa O2 (kPa)

3. Controle da pressão intracraniana na emergência 4. Exame clínico


Todo o paciente com lesão neurológica grave deve
Os pontos principais a serem avaliados no exame
ser submetido a um protocolo de tratamento de
clinico do paciente com trauma agudo de crânio são:
emergência para trauma de crânio que inclua:
• Elevação da cabeceira a 45º (afastada lesão da • Sinais vitais
coluna vertebral) • Sinais de fratura de base crânio (hemotimpano,
• Manutenção da cabeça e pescoço centralizados equimose periorbital ou retroauricular)
• Estimulação reduzida (movimentação, aspiração)
• Otorréia ou rinorréia
• Restrição da cota hídrica (exceto em situações de
choque) • Fratura com depressão óssea ou ferida penetrante
• Uso de diuréticos (manitol e furosemide) • Exame neurológico sumário - Escala de coma de
• Hiperventilação controlada (mantendo PaCO2 entre Glasgow (quadro 1), reflexos pupilares, movimentos
25 e 30 mmHg) de extremidades)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 87


Terapia Intensiva
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Quadro 1 - Escala de coma de Glagow

Resposta de abertura dos olhos


Espontânea 4
Responde a estimulo verbal 3
Responde a estimulo doloroso 2
Não reage 1
Resposta verbal
Orientada 5
Conversa de forma confusa 4
Palavras desconexas 3
Sons incompreensíveis 2
Não reage 1
Melhor resposta motora de membros
Obedece a comandos 6
Localiza a dor 5
Reflexo de retirada 4
Flexão anormal 3
Extensão anormal 2
Não reage 1
Para crianças abaixo de 2 anos, confere-se pontuação máxima no item
de resposta verbal se o paciente chora quando estimulado..

5. Classificação da gravidade do paciente. Para tanto, podemos utilizar uma


da lesão e conduta escala como a recomendada pela Sociedade
Para uma conduta terapêutica correta é funda- Canadense de Pediatria, seguindo um protocolo
mental a determinação do grau de gravidade de conduta de acordo com a classificação

TRAUMA LEVE CONDUTA


• Paciente assintomático Observação em casa. Oferecer instruções escritas aos pais
• Cefaléia leve ou responsáveis. A criança deverá ser trazida de volta
• Três ou menos episódios de vômitos à emergência se qualquer um dos sinais ou sintomas abaixo
• Glasgow de 15 surgirem nas primeiras 72 horas após a alta:
• Perda de consciência inferior a 5 minutos • Qualquer comportamento que pareça anormal
• Desorientação quanto ao nome ou local
• Impossibilidade de acordar a criança
• Cefaléia progressiva
• Convulsões
• Impossibilidade de manter-se em pé
• Sonolência fora de hora ou enjôo
• Acima de 3 episódios de vômito
TRAUMA MODERADO CONDUTA
• Perda da consciência por 5 minutos ou mais • Observação por 6 horas após a lesão.
• Letargia progressiva Se sua condição clinica melhorar progressivamente, alta
• Cefaléia progressiva para casa com as mesmas instruções do trauma leve.
• Vômitos (mais de 3 episódios ou • Não ocorrendo melhora, estender observação por
associados a outros sintomas) 24 horas. Solicitar tomografia e consultoria neurológica.
• Amnésia pós-traumática Transferência para a UTI.
• Convulsões pós-traumáticas
• Trauma múltiplo
• Lesão facial grave
• Sinais de fratura de base
• Possível ferida penetrante ou com depressão
• Suspeita de espancamento
• Glasgow entre 11 e 14
TRAUMA GRAVE CONDUTA
• Glasgow inferior a 10 ou redução de 2 pontos • Pacientes com trauma grave devem receber os
ou mais não conseqüentes a convulsões, drogas, procedimentos básicos de suporte a vida, sendo
redução da perfusão ou fatores metabólicos hospitalizados em um centro terciário com cuidados
• Sinais neurológicos focais intensivos e consultoria neurocirúrgica
• Ferida penetrante no crânio
• Fratura com depressão craniana
• Fratura craniana múltipla

88 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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DÚVIDAS FREQUENTES NO 4 horas pos-trauma A maioria dos trabalhos sugerem


que os pacientes vítimas de trauma grave de crânio
PRIMEIRO ATENDIMENTO apresentarão sinais clínicos nas primeiras 6 horas a
AOS PACIENTES COM TRAUMA partir do acidente. Devemos ainda considerar o
AGUDO DE CRÂNIO benefício da intervenção neurocirúrgica precoce.

1. É possível avaliar pelo exame clínico quais 3. Existe indicação para radiografia de crânio?
crianças apresentam lesão intracraniana?
As radiografias não apresentam grande utilidade na
Está bem demonstrado na literatura que crianças com avaliação do trauma agudo de crânio. São
TCE podem apresentar, após um período de lucidez, indicações as feridas penetrantes e fraturas com
deterioração clinica importante com sinais de her- afundamento. Não há consenso sobre o manejo da
niação uncal e morte. Este intervalo livre ou período fratura de crânio linear, não complicada. Sugere-se
lúcido é descrito por alguns autores como a Síndrome observação no hospital por 24 horas.
do “ falar e deteriorar”. A sensibilidade do exame
clinico em determinar a presença de lesões
4. As pequenas quedas sofridas por lactentes podem
intracranianas é muito variável, oscilando entre 62
causar lesões graves?
e 100%.
Alguns trabalhos demonstram que os lactentes
apresentam fraturas de crânio após quedas de
2. Quando indicar a tomografia computadorizada?
pequenas alturas (60 a 90 cm). O percentual de
A maioria dos autores recomenda a indicação da fraturas oscila em torno de 5%. Traumas secundários
TC nos pacientes com exame neurológico anormal e a quedas de pequenas alturas (menos de 1,3 metros)
nos que apresentem algum sintoma nas primeiras não ocasionam, de forma geral, lesões fatais.

Insuficiência Respiratória Aguda


JOSÉ EDUARDO CARREIRO

A Insuficiência Respiratória Aguda continua sendo Ner voso Periférico, Músculos Respiratórios,
uma das causas mais comuns de internação por Pulmões (Vias Aéreas e Alvéolos) e a Vasculatura
risco de vida em unidades de terapia intensiva, a Pulmonar.
despeito dos recentes avanços no conhecimento sobre
A função primária do Sistema Respiratório é a de
fisiopatologia e tratamento pulmonar.
ofertar oxigênio (O2) e remover o dióxido de carbono
Insuficiência Respiratória Aguda é definida como (CO2) do leito do capilar pulmonar. Uma falha deste
troca gasosa ineficaz através dos pulmões pelo sistema resultará em níveis de oxigênio arterial
sistema respiratório. O sistema respiratório inclui: anormalmente baixos, com ou sem níveis arteriais
Sistema Nervoso Central (Tronco Cerebral), Sistema anormalmente elevados de dióxido de carbono.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 89


Terapia Intensiva
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CLASSIFICAÇÃO: outras podem levar a um ou outro tipo de


Insuficiência Respiratória. Em adição, como a
Baseado na definição acima podemos classificar a relação ventilação-perfusão pode se alterar durante
Insuficiência Respiratória Aguda em dois tipos: a evolução da doença, o Tipo de Insuficiência
a) Tipo I (Hipoxêmica ou Hipo / Normocapnica): Respiratória também pode se alterar.
PaO2 diminuído com PaCO2 normal ou diminuído,

b) Tipo II (Ventilatória ou Hipercapnica): PaO2


AVALIAÇÃO CLÍNICA:
diminuído com PaCO2 elevado.
Algumas questões devem ser respondidas para
determinar a velocidade e a intensidade das
ETIOLOGIA: intervenções que deverão ser tomadas: A via aérea
está pérvia? Há respiração espontânea e esta parece
a) Insuficiência Respiratória Hipoxêmica (Tipo I):-
ser adequada para as trocas gasosas? Se a resposta
geralmente relacionada com Doença Pulmonar
for não; devemos intervir com urgência.
envolvendo Distúrbios da Ventilação-Perfusão (V/Q)
ou “shunt” pulmonar:- Pneumonia, Atelectesia, ARDS,etc. Na feitura da História Clínica devemos perguntar
Pode também estar associada a problemas primários sobre: Possível aspiração de corpo estranho; história
cardíacos (I.C.C.) ou a doenças hematológicas (Meta- de febre consistente com infecção determinando a
hemoglobinemia, Anemia intensa). Insuficiência Respiratória (Pneumonia, Epiglotite,
Bronquiolite); causas de hipoventilação (Trauma,
b) Insuficiência Respiratória Hipercapnica (Tipo II):- Meningite, Drogas).
Pode estar relacionada com Disfunção do Sistema
Nervoso Central (Drogas, Infecção, Trauma, Tumor, No exame físico devemos detectar dados para três
Hipoventilação Alveolar Central - S. de Ondine); aspectos importantes: Etiologia, Gravidade e
Doenças Neuromusculares (S. de Guillian-Barré, determinar se a Insuficiência Respiratória é aguda ou
Miastenia Gravis, Poliomielite, Trauma espinal, crônica.
Botulismo, Miosite); Doenças da Pleura e Caixa
Torácica (Cifoescoliose, Efusão Pleural Maciça,
Pneumotoráx, Trauma); Obstrução Vias Aéreas AVALIAÇÃO DA GRAVIDADE:
Superiores (Estenose subglótica, Tumor, Laringite,
Corpo Estranho, Hipertrofia Adenoidiana) e Obstrução Frequência Respiratória: Taquipnéia ou Bradipnéia
Vias Aéreas Inferiores/Alvéolo (Asma, Corpo Estranho, (esta geralmente significa necessidade de intervenção
Bronquiolite, DPOC). imediata),

A Insuficiência Respiratória do Tipo I geralmente é Cianose


decorrente de doenças próprias do pulmão, Retrações (Subcostal, Intercostal)
enquanto a Insuficiência respiratória do Tipo II
Gemência
geralmente resulta da diminuição na Ventilação
Minuto ou num aumento do Espaço Morto. Movimento de aletas nasais
Informações clínicas limitadas são fornecidas quando
Uso de Musculatura Acessória
classificamos a Insuficiência Respiratória Aguda
nestes dois tipos. Pouco é revelado sobre a doença, Hipopnéia (Esforço respiratório mínimo): Estafa
sua gravidade ou seu prognóstico. Movimentos Paradoxais do Tórax e Abdômen:
Isto requer dados obtidos na história do paciente, Exaustão muscular (diafragma),
exame físico, exames de imagens do toráx (Raio-X, Ausculta: Murmúrio Vesicular diminuído, Estertores,
Tomografia) e análise dos gases sangüíneos arteriais. Sibilos,
Entretanto, esta classificação oferece alguns dados
Pulso Paradoxal (PAS < 10mmHg na inspiração):
sobre processo fisiopatológico básico envolvido e
Doença Obstrutiva grave,
sugere qual modalidade terapêutica pode ser mais
apropriada. Certas doenças determinam somente “Status” Neurológico: Agitação (Hipoxemia) ou
Insuficiência Respiratória Aguda do Tipo II, enquanto Sonolência (Hipercapnia).

90 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Terapia Intensiva
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Após a avaliação clínica devemos proceder a precoce, pode prevenir este evento catastrófico. O
avaliação laboratorial para diagnosticarmos a tratamento inicial da hipoxemia é sempre
Etiologia (Raio-X de Tórax, Hemograma, Culturas e oxigenioterapia, dado inicialmente em altas
outros que se fizerem necessários) e a gravidade da concentrações e, após estabilização do paciente e
Insuficiência Respiratória (Gasometria Arterial), para tendo dados adicionais disponíveis (Gasometria
podermos instituir a terapêutica adequada. Arterial, Oximetria), posterior diminuição progressiva
da sua concentração a níveis adequados para o
paciente. Se a hipoxemia é grave ou se há retenção
importante de dióxido de carbono, a ventilação
TRATAMENTO:
mecânica é indicada. Novas modalidades terapêuticas
O aspecto mais importante no manejo da Insuficiência têm sido utilizadas no tratamento da Insuficiência
Respiratória Aguda é a sua detecção precoce. Muitas Respiratória Aguda: Oxigenador de Membrana Extra-
das causas de Parada Cardiorespiratória em pediatria Corpórea (ECMO), Terapia com Óxido Nítrico,
são de origem respiratória e, somente uma intervenção Reposição de Surfactante e Ventilação Líquida.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 91


Terapia Intensiva
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92 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Alergia
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Asma no Lactente
MARIA CECÍLIA AGUIAR

A asma brônquica é a doença crônica mais comum fácil de entender, pois a anatomia e fisiologia das
na infância, mas seu diagnóstico no lactente continua vias aéreas nesta idade fazem com que patologias
sendo um grande desafio para os médicos que lidam das vias aéreas inferiores evoluam facilmente para
com esta faixa etária. Não havendo nenhum marcador insuficiência respiratória.
fisiológico, biológico ou imunológico específico para
Não existe um único fator desencadeante de asma,
o diagnóstico de asma, este é baseado numa série
mas fatores de risco para o seu desenvolvimento
de dados, como história pessoal e familiar de atopia,
em indivíduos geneticamente predispostos. Os fato-
tipo de sintomas, fatores de risco, testes diagnósticos
res de risco considerados importantes para o de-
e resposta a medidas terapêuticas.
senvolvimento de asma são: mãe asmática, mãe
Os testes para auxiliar no diagnóstico de asma no fumante, dermatite atópica ou alergia alimentar;
lactente são difíceis de executar. Assim, contamos exposição aumentada a alérgenos respiratórios
com a clínica e a resposta medicamentosa. Além precocemente.
disso, inúmeras patologias podem desencadear Os vírus são os microorganismos mais associados à
sibilância, devendo ser afastadas. Devemos sibilância em qualquer idade, mas no lactente o tipo
considerar doenças de vias aéreas superiores (rinite de vírus e o momento da exposição podem ser
alérgica, rinite infecciosa, sinusite, corpo estranho), cruciais para a indução de atopia e asma. É normal
doenças do trato respiratório médio (membrana lactentes terem 6 a 8 infecções respiratórias por
laríngea, laringomalácia, traqueomalácia, fístula TE, ano; 30% apresentarão sibilância e 2/3 serão
anel vascular, hipertrofia ganglionar, tumores, corpo sibiladores transitórios (em geral apresentam redução
estranho, coqueluche, epiglotite, laringotraqueo- da funcão pulmonar prévia). Segundo alguns traba-
bronquite, disfunção das cordas vocais) e doenças lhos, infecção grave pelo vírus sincicial respiratório
do trato respiratório inferior (asma, bronqueolite, (RSV) aumenta o risco de alergia e o aparecimento
mucovicidose, displasia pulmonar, corpo estranho, de asma. Por outro lado, infecção pelo vírus do
refluxo gastroesofágico, aspiração crônica, bron- sarampo em crianças africanas levou a uma menor
quiectasia, hemosiderose, bronquiolite obliterante, prevalência de asma, uma tendência similar a apre-
tumor). Além da anamnese e do exame físico, existem sentada por japoneses após contrairem tuberculose.
exames importantes para chegarmos a um diagnós- A explicação seria que o vírus do sarampo e o
tico: Hemograma, dosagem das Igs, radiografia de bacilo da tuberculose induziriam a uma resposta Th1
tórax AP e P, seriografia esofagoestomagoduodenal, importante, diminuindo a formação de linfócitos Th2
cinedeglutograma, PPD, exame de fezes, teste de e suas citocinas, responsáveis por manifestações
puntura com alguns inalantes e antígenos alimenta- alérgicas.
res Phmetria, cintilografia pulmonar, US com color
O tratamento da asma no lactente, como na criança
doppler, teste do suor, tomografia computadorizada
maior, compreende o período de crise no qual
de alta resolução pulmonar, estudos citogenéticos,
broncodilatadores (B2 agonistas e brometo de
ECG, PFP, broncoscopia, biópsia pulmonar.
ipratrópio) e corticosteróides devem ser usados no
A morbidade da asma brônquica é muito alta e a tratamento ambulatorial e o período intercrise. A
mortalidade tem aumentado em alguns países, em conduta nesta segunda fase vai depender da
crianças abaixo de quatro anos de idade, o que é gravidade do quadro. Além de um bom controle

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 93


Alergia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

ambiental, evitando alérgenos e irritantes, medica- Flunisolida. A dose vai depender do modo de
mentos anti-inflamatórios poderão ser usados por administração e da gravidade do quadro. Os efeitos
inaladores pressurizados (MDI) com espaçador ou colaterais locais com doses altas mais freqüentes
nebulização. As dificuldades para a avaliação dos são irritação facial, moniliase oral e rouquidão.
estudos farmacológicos em crianças com menos de Efeitos colaterais sistêmicos, como supressão de
2 anos de idade são muitas: a população estudada supra-renal e diminuição do crescimento vão
em geral é heterogênea, a amostragem é pequena, depender principalmente da biodisponibilidade
o modo de administração da droga varia, a gravi- sitêmica da droga, que é maior com a
dade da doença difere, a aderência ao tratamento Beclometasona do que com a Budesonida e menor
não é boa, os parâmetros para avaliação são em com a Fluticasona.
geral clínicos e os estudos nem sempre randomizados,
Existem vários questionamentos com relação aos
duplo-cegos e com placebo.
corticóides inaláveis ainda sem respostas, especial-
Há os que preconizem o uso de cromoglicato mente com relação aos riscos versus benefícios.
dissódico ou nedocromil por terem menos efeitos Enquanto aguardamos novas pesquisas, parâmetros
colaterais, mas os anti-inflamatórios mais eficazes para introdução dos CI seriam sintomas duas vezes
são os corticóides inaláveis (CI). Existem diferentes por semana, crises de uma a duas vezes por mês,
drogas, mas a experiência internacional nesta idade ocorrência de crise com risco de vida e interferência
é com a Beclometasona, a Budesonida e a na qualidade de vida.

Prevenção das Doenças Alérgicas


CHARLES K. NASPITZ

O fenótipo alérgico parece ser determinado por O delicado equilíbrio imunológico entre mãe e feto
componentes genéticos herdados e modificados por durante a gravidez, através da placenta, leva à
interações com fatores ambientais. Vamos focalizar as prevenção da rejeição fetal. Em condições de
estratégias de potenciais intervenções para a normalidade, o perfil das citocinas Th2 na placenta
prevenção das doenças alérgicas, em especial as do murina está associado a uma gravidez bem sucedida,
trato respiratório, e em particular, da asma. Os genes com adequado crescimento fetal. Apesar de o
responsáveis pela susceptibilidade à asma ainda não desenvolvimento fetal ocorrer em um ambiente tipo
foram identificados. Os efeitos modulatórios dos Th2, a maioria das crianças não apresenta posterior
múltiplos fatores ambientais ainda precisam ser mais doença atópica. Isto provavelmente significa que logo
bem definidos e também precisam ser mais investigadas após o nascimento este grupo muda o padrão Th2
a relação temporal entre doença alérgica e exposição para um Th1. As crianças que irão desenvolver
a fatores ambientais, especialmente durante a vida doenças alérgicas, já apresentam ao nascer uma
intra-uterina e no período pós-natal precoce. produção deficiente de interferon gama por células
mononucleares do sangue de cordão, mostrando um
Nos últimos quarenta anos, houve um dramático
predomínio do sistema Th2.
aumento na prevalência das doenças alérgicas.
Embora não haja uma explicação clara para este Para a prevenção primária de doenças atópicas é
aumento, as alterações ambientais que vêm ocorrendo necessário identificar crianças de alto risco. A
desde os anos 60 podem ter um papel, considerando maioria dos pesquisadores usa a presença de
que o potencial genético para o desenvolvimento de doença atópica na mãe e/ou pai como um critério
doenças alérgicas não se modificou. simples e barato; entretanto, este critério não é

94 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Alergia
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aceito por todos. Marcadores biológicos no recém- o número de infecções nos primeiros meses e anos
nascido poderiam ajudar na identificação das de vida.
crianças de alto risco: de todos até agora
O estabelecimento de tolerância oral a alérgenos
investigados, o único de consenso é o da deficiente
inalantes e alimentares é uma abordagem interessante
produção de interferon gama. A identificação dos
para a prevenção primária da asma. Entretanto,
grupos de alto risco não é fácil. Vários estudos
intervenções imunes (desvio imune ou tolerância) ainda
prospectivos de longa duração, evitando alérgenos
estão em fase experimental e até sua eventual
alimentares e inalantes, não mostraram uma
aplicação ainda há um longo caminho.
diminuição significante na prevalência da asma. A
identificação correta dos grupos de alto risco é A prevenção secundária da asma em crianças com
importante para evitar a implementação de medidas dermatite atópica é possível em alguns subgrupos
preventivas desnecessárias. Na situação atual, pode- desta população, pela administração de um anti-
se recomendar aos filhos de pais atópicos: histamínico (cetirizina) por via oral, por tempo pro-
aleitamento materno prolongado, introdução tardia longado, sem quaisquer efeitos colaterais. Este exem-
de alimentos sólidos, ventilação adequada das plo de uma intervenção farmacológica preventiva
moradias, evitar animais domésticos e a exposição abre a possibilidade de verificar se outras drogas,
passiva à fumaça de cigarro. isoladas ou associadas, teriam também um potencial
de prevenir o aparecimento de asma.
Nos últimos anos, a diminuição de infecções
associadas à produção de interferon gama em Em conclusão, os mecanismos de “priming” e possível
crianças tem sido apontada como uma causa do sensibilização durante os períodos fetal e neonatal
aumento da prevalência das doenças alérgicas. ainda precisam ser mais bem definidos. Além disso,
Apesar das grandes controvérsias em relação ao deve-se definir critérios de identificação de recém-
eventual efeito protetor das infecções precoces, este nascidos de alto risco para o desenvolvimento de
conceito não se aplica a países em desenvolvimento. doenças atópicas. A prevenção primária das doenças
Assim, no Brasil, as famílias são numerosas e é grande alérgicas deve ser nossa prioridade nos próximos anos.

Rinite Alérgica
FRANCISCO JOSÉ PASSOS SOARES

A rinite é uma das patologias mais comuns na infância. A evolução crônica e episódios agudos recorrentes
É de origem alérgica e atinge até 20% das crianças provocam distúrbios no sono e no desenvolvimento
e adolescentes. Embora não apresente predominância psicossocial, comprometendo a produtividade escolar
por gênero ou raça, a prevalência da rinite alérgica e a socialização de crianças e adolescentes, além
parece aumentar em populações de maior poder de interferir na estética, em função de problemas
aquisitivo, com estilo de vida ocidental moderno e ortodônticos. A criança e a família desgastam-se em
que vivem em ambientes urbanos. visitas repetidas a serviços de emergência e
A rinite é definida como uma inflamação da mucosa consultórios devido a epistaxes, otites e sinusites
nasal e caracteriza-se pela presença de um ou mais secundárias à inflamação. Além disso, as crianças
dos sintomas: congestão nasal, rinorréia aquosa, sofrem variados tipos de proibições alimentares e
espirros e prurido. Este aspecto clínico varia entre repressões comportamentais que poderão repercutir
indivíduos na freqüência e gravidade. na vida psicossocial adulta.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 95


Alergia
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A associação muito freqüente com a asma brônquica Tratamento: Medidas de higiene ambiental devem
poderá agravar ainda mais a qualidade de vida de priorizar os dormitórios, sendo consideradas como
uma criança portadora de rinite. O tratamento isolado medidas essenciais o controle dos ácaros, encapar
da asma ou da rinite poderá resultar em insucesso e colchões e travesseiros com capas impermeáveis e
frustração para a criança e os pais, perpetuando a laváveis.Deverá ser evitado também exposição a
falsa crença da incurabilidade das doenças alérgicas. fumaças, principalmente de cigarros, e odores fortes
de produtos utilizados na higiene doméstica.
A família de uma criança com rinite alérgica tem um
custo social aumentado, em função de faltas ao Anti-histamínicos (anti-H1) – são mais eficazes em
trabalho para cuidar do menor e de gastos com filtros, relação ao prurido, aos espirros e à coriza e têm pou-
mudança de móveis, residência e medicamentos. cos efeitos na obstrução nasal. Uma nova geração de
AH elimina a sonolência induzida pelos AH clássicos,
A avaliação clínica deve ser criteriosa: época do
embora tenham originado uma preocupação com respei-
início dos sintomas e eventos relacionados, sintomas
to ao uso de doses elevadas ou habituais de terfenadina
associados no início(sibilo, urticária, febre), sintomas
e astemizol combinados à eritromicina e cetoconazol,
atuais(secreção aquosa ou purulenta, cefaléia, prurido
podendo provocar arritmias cardíacas graves.
e espirros), duração dos sintomas, dispnéia associada
a esforços; fatores desencadeantes; sintomas atuais Drogas mais utilizadas: Cetirizina, loratadina, epinas-
associados (fungados, roncos noturnos, anosmia, tina, azelastina, fexofenadina, ebastina, cetotifeno.
epífora, prurido conjuntival, fadiga, apnéia durante Devem ser utilizados de forma descontínua e de
o sono, halitose), tratamentos prévios, história familiar acordo com a intensidade dos sintomas. Algumas
de alergia, história ambiental (tabagistas, preparações são combinadas com alfa-adrenérgicos,
escolarização precoce, animais, etc.). descongestionantes. Já existem no mercado duas
O exame físico deve ser completo, com observação preparações para uso tópico(azelastina, levoca-
cuidadosa dos ouvidos, narinas, conjuntivas, bastina) de anti-H1, com eficácia aproximada aos
orofaringe e pulmões. de uso sistêmico.

São sinais externos comuns: olheiras, dupla prega Cromoglicato dissódico – de uso tópico, tem ação
infra-palpebral, sulco nasal transverso, fácies razoável na rinite de sintomas leves ou moderados.
adenoidiano. O terço anterior da cavidade nasal Por ser de natureza profilática, deverá ser usado por
pode ser examinado até com o otoscópio, revelando períodos prolongados 4 a 6 vezes ao dia, induzindo
cornetos hiperplásticos, hiperemiados ou pálidos e raros efeitos colaterais locais.
violáceos, secreção hialina ou purulenta (se unilateral, Glicocorticóides: De potente ação anti-inflamatória,
suspeitar de corpo estranho) e pólipos. Na cavidade devem ser administrados por via tópica nasal,
oral observaremos palato ogival e má-oclusão evitando-se os efeitos sistêmicos indesejáveis. Hoje
dentária. existem disponíveis no mercado sprays de
Diagnóstico laboratorial: A detecção da Imuno- beclometasona, budesonida, triancinolona e
globulina E especifica a antígenos, por meio de fluticasona, semelhantes em eficácia e na forma
testes in vivo (teste cutâneos e intradérmicos e testes aquosa. Os efeitos colaterais mais comuns, locais,
de provocação nasal) ou in vitro (RAST) indica ape- são a epistaxe, ressecamento da mucosa e raramente
nas sensibilização, sendo comum às diversas pato- ocorrerá infecção por cândida.
logias alérgicas. Os testes cutâneos devem ser pre- Estudos enfatizam o uso de doses acima de 800mcg/
ferencialmente o método de escolha em função da dia, por período prolongado para que haja
simplicidade técnica e de interpretação dos resulta- interferência no metabolismo do cálcio. A rinite pode
dos, rapidez, baixo custo e maior sensibilidade que ser controlada com doses médias inferiores a
os testes in vitro. 200mcg/dia na maioria dos pacientes.
Alguns indivíduos com ausência de resposta à tera- Imunoterapia por via subcutânea deverá ser utilizada
pêutica com corticosteróides tópicos combinados a quando um paciente apresentar sintomas persistentes
anti-histamínicos deverão ser investigados para fatores apesar do tratamento farmacológico. Não é isenta
associados ou complicações por meio de métodos de riscos, devendo ser realizada por médico
radiológicos (Rx e tomografia) e nasofibroendoscopia. experiente em centro com recursos para reanimação.

96 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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Emergências Oncológicas
MARA ALBONEI DUDEQUE PIANOVSKI

Com os avanços no tratamento das neoplasias A VCS é um vaso de paredes finas, com baixa
malignas da infância, atualmente cerca de 70% das pressão intra-luminal. Ao seu redor, estão linfonodos
crianças com câncer são curadas. Emergências que drenam o lado direito, a porção inferior do
oncológicas podem ocorrer tanto no diagnóstico lado esquerdo do tórax e o timo, localizado no
quanto durante o tratamento de manutenção. Muitas mediastino anterior e superior. Tumor ou infecção
vezes, o pediatra é o primeiro médico a quem os nestas estruturas podem comprimir a veia cava e, na
pais recorrem, por ser este o profissional que se criança, a traquéia e os brônquios. Mais comu-
encontra mais próximo e os centros de especialidades mentemente, os tumores malignos são a causa, entre
existem em menor número. Assim, é importante que eles, do linfoma não-Hodgkin, tipo T, da doença de
o pediatra esteja familiarizado com as possíveis Hodgkin, da leucemia linfóide aguda T e dos tumo-
emergências com as quais possa se defrontar. res de células germinativas.
Os seguintes sinais e sintomas podem ser observados:
Patogenia
tosse, dispnéia, ortopnéia, e dor torácica. Menos
Quanto à patogenia, as emergências podem ser freqüentemente, porém mais graves, são ansiedade,
classificadas em três grandes grupos: confusão mental, letargia, cefaléia, visão turva e
1. Causadas por lesões que ocupam espaço e síncope. Os sintomas podem ser agravados se o
comprimem estruturas; paciente for flexionado para punção lombar. Também
2. Secundárias a distúrbios metabólicos; podem ser observados edema, pletora e cianose de
3. Causadas por anormalidades hematológicas. face, região cervical e extremidades superiores,
sudorese abundante, sufusão e edema da conjuntiva.
Nos adultos, o início da SVCS causada por tumor
1. EMERGÊNCIAS CAUSADAS POR maligno é usualmente insidioso; na criança e no
LESÕES QUE OCUPAM ESPAÇO: adolescente os sintomas freqüentemente progridem
rapidamente, em dias.
A. Síndrome da veia cava superior ou mediastinal
superior; O exame físico pode também mostrar linfono-
B. Tamponamento pericárdico; domegalias supra-claviculares ou cervicais.
C. Compressão da medula espinhal; O raio X do tórax mostra massa no mediastino anterior
D. Aumento da pressão intra-craniana; e superior. Efusão pleural e pericárdica podem ser
E. Hepatomegalia volumosa encontradas.
A. Síndrome da veia cava superior (SVCS) refere-se O hemograma é fundamental no diagnóstico,
aos sinais e sintomas de compressão ou obstrução podendo sugerir leucemia ou linfoma envolvendo
deste vaso. O termo síndrome mediastinal superior medula óssea. O perfil bioquímico pode demonstrar
(SMS) é usado quando também ocorre compressão alterações de uréia e ácido úrico, elevação de
traqueal. Nos adultos, predominam os sinais de desidrogenase lática, sugerindo doença linfo-
SVCS, enquanto que na criança é freqüente observar proliferativa. Determinações de alfa-feto-proteína ou
sinais de desconforto respiratório secundário à gonadotrofina coriônica podem ser úteis para o
compressão traqueal. diagnóstico, se bem que os resultados de alfa-feto-

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 97


Onco Hematologia
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proteína geralmente não são disponíveis em casos do mediastino. Ocorre quando o espaço existente
de urgência. entre o pericárdio e o epicárdio se torna preenchido
por fluído, aumentando a pressão no saco pericárdico
Muitas vezes, é necessário se obter tecido para análise
e podendo interferir com o retorno venoso ao lado
microscópica. É importante lembrar que a criança
direito do coração.
pode não tolerar procedimento anestésico. Durante a
anestesia geral, o tônus dos músculos abdominais Os achados clínicos usuais são: edema facial, dor
aumenta e o dos músculos respiratórios diminui, o pré-cordial, dispnéia, hipotensão, pulso filiforme,
movimento caudal do diafragma desaparece, os bulhas cardíacas hipofonéticas, aumento da silhueta
músculos lisos dos brônquios relaxam e o volume cardio-mediastinal e pulso paradoxal. O tratamento
pulmonar diminui. Estas alterações podem agravar os de emergência consiste de aspiração por agulha do
efeitos de compressão extrínseca da veia cava. A fluido pericárdico e já que efusões malignas tendem
entubação traqueal pode ser impossível e a extubação a recurrer rapidamente, medidas imediatamente
difícil. Os pacientes podem requerer ventilação posteriores devem ser tomadas, com quimio ou
mecânica até que a massa tumoral seja reduzida. radioterapia. A janela pericárdica pode ser uma
opção.
Tratamento:
Se a obstrução é secundária a cateter venoso cen-
tral, infusão de uroquinase 200 U/kg/hora pode C. Compressão de medula espinhal:
lisar o trombo. Há poucas evidências de que A compressão aguda da medula espinhal ocorre em
anticoagulação com heparina seja benéfica. 2,7 a 5% das crianças com câncer.
SMS causada por massa tumoral é uma verdadeira A maioria dos casos resulta de compressão epidural,
emergência; muitas vezes, não se consegue o decorrente da extensão do tumor paravertebral através
diagnóstico anátomo-patológico. Para o bem do do forame intervertebral ou, menos comumente, de
paciente, pode ser necessário tratá-lo antes de se extensão do tumor na coluna vertebral. Os tumores
realizar biópsia. Tratamento tradicional tem sido mais freqüentes são neuroblastoma, sarcoma de
radioterapia: doses tão baixas quanto 200 cGy Ewing, linfoma não-Hodgkin ou doença de Hodgkin.
podem ser suficientes, em se tratando de linfomas. Eventualmente, leucemias agudas podem causar
Deterioração respiratória pode ocorrer após a compressão medular.
radioterapia, por edema traqueal secundário.
Linfonodos incluídos no campo de irradiação podem Cerca de 80% das crianças com compressão medular
se tornar impalpáveis dentro de 24 horas. se apresentam com dor nas costas, localizada ou
irradiada.
Corticoterapia ou quimioterapia incluindo ciclo-
fosfamida são alternativas razoáveis para irradiação. O raio X da coluna pode evidenciar lesão lítica. O
As características histológicas podem se tornar sem melhor exame atualmente é a ressonência magnética
condições de interpretação em 48 horas. A avalia- nuclear.
ção do paciente deve ser dinâmica e a biópsia
O paciente com história de disfunção medular
obtida tão logo haja melhora das condições respi-
rapidamente progressiva necessita de imediata
ratórias.
atenção. Deve-se administrar dexametasona
Devido ao risco de trombose, flebite e inadequada intravenosa, na dose de 1 mg/kg. O paciente sem
distribuição das drogas, injeções intravenosas nos anormalidades neurológicas pode receber dose
membros superiores são contra-indicadas: assim, toda menor, 0,25 a 0,5 mg/kg, por via oral, a cada 6
infusão intravenosa deveria ser administrada nas veias horas, seguidas por exame de RM nas próximas 24
dos membros inferiores. horas. Se o aspirado de medula óssea não confirmar
Resposta rápida ao tratamento pode resultar na diagnóstico de leucemia, a abordagem cirúrgica para
síndrome de lise tumoral aguda (ver adiante). biópsia e descompressão devem ser agilizadas. A
laminectomia geralmente é suficiente para descom-
B. Tamponamento pericárdico: primir a medula.
É uma complicação rara que pode ser vista em O diagnóstico e tratamento precoces são essenciais
associação com linfomas ou outros tumores primários para recuperação das funções neurológicas.

98 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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D. Aumento da pressão intra-craniana. Embora este tumor possa apresentar regressão espon-
Os tumores cerebrais são os tumores sólidos mais tânea, seu tratamento deve ser cogitado frente às
freqüentes na infância, com uma incidência anual complicações acima assinaladas. A instituição do tra-
de 4 em 100.000 crianças. A maioria dos tumores tamento deve ser considerada mais cedo nos lactentes
cerebrais pediátricos manifesta-se por sinais e sintomas com menos de 4 semanas de idade. Regimes
de aumento de pressão intra-craniana. quimioterápicos podem incluir doses baixas de
ciclofosfamida. Radioterapia, na dose de 150 cGy
As manifestações clínicas variam de acordo com a por dia, durante 3 dias, também pode ser eficaz.
idade. Os sinais e sintomas no lactente incluem
alterações da personalidade, vômitos, letargia,
desaparecimento das habilidades motoras previamente 2. EMERGÊNCIAS CAUSADAS
adquiridas, convulsões e sintomas de hidrocefalia
obstrutiva e aumento do perímetro cefálico. POR DISTÚRBIOS METABÓLICOS:
A avaliação de um paciente com suspeita de hipertensão A. SÍNDROME DE LISE TUMORAL:
intra-craniana deve ser ágil. A tríade de Cushing pode As alterações metabólicas mais importantes, vistas
estar presente: bradicardia, hipertensão e apnéia. na síndrome de lise tumoral são: hiperuricemia,
Qualquer um destes sinais, assim como alterações outras hipercalemia, hiperfosfatemia com hipocalcemia, que
do padrão respiratório, tamanho e reatividade pupilar, podem ocorrer individualmente ou como parte da
alterações da função motora ou sensorial, indicam síndrome completa.
necessidade de descompressão urgente.
Síndrome de lise tumoral aguda é uma conseqüência
O diagnóstico deve ser confirmado por TAC ou RM. da liberação rápida de metabólitos intra-celulares
A punção lombar geralmente está contra-indicada (ácido úrico, potássio, fosfato), na corrente sangüínea,
na avaliação inicial. em quantidades que excedem a capacidade excre-
tora dos rins. Ocorre mais freqüentemente nos pa-
O tratamento inclui dexametasona IV, na dose de
cientes com grandes massas tumorais, tais como
0,5 a 1,0 mg/kg, seguida de 1 a 2 mg/kg
linfoma de Burkitt, ou síndromes leucemia-linfoma T.
diariamente. Também pode ser administrado manitol
a 20%, na dose de 1 a 2 g/kg. O manejo destas alterações é complicado pela pro-
pensão do ácido úrico e fosfato de precipitarem nos
E. Hepatomegalia volumosa túbulos renais e causar insuficiência renal. Orienta-
ções de tratamento podem ser vistas nos quadros I
Torna-se uma complicação emergencial nos lactentes
e II.
com neuroblastoma, estádio IV s. A hepatomegalia
decorrente da infiltração tumoral pode causar A função renal e as alterações metabólicas devem
comprometimento mecânico dos sistemas respiratório, ser monitorizadas várias vezes ao dia, especialmente
cardiovascular, gastro-intestinal e renal, além de quando se observar diminuição do tamanho do tumor,
coagulação vascular disseminada. o que pode acontecer em horas pós tratamento.

Quadro 1 - Tratamento da Síndrome de Lise Tumoral

Hidratação: D5 + NS + 50-100 NaHCO3 mEq/L, sem potássio, 3-6 L/m2/d


Manter a densidade da urina < 1010
Alcalinização: Manter pH urinário em torno de 7.0-7.5
Reduzir o NaHCO3 se o bicarbonato sérico estiver acima de 30 mEq/L, ou pH urinário >7,5
Acetazolamida, 5 mg/kg/dia, por via oral
Redução do Alopurinol, 100 mg/m2 , a cada 8 horas, por via oral
ácido úrico: Oxidase do urato, 100 U/kg, IV, diariamente.
Diuréticos: Evitar, se hipovolêmico
Furosemida, 1 mg/kg, IV a cada 6 horas.
Manitol, 0,5 g/kg, IV, a cada 6 horas.
Redução do fosfato: Hidróxido de alumínio, 50 mg/kg, via oral, a cada 8 h.

D5 + NS = 5% de dextrose com soro fisiológico a 0,25%; NaHCO3 = bicarbonato de sódio.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 99


Onco Hematologia
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Quadro II - Indicações para Diálise, em


Pacientes Pediátricos com Síndrome de Lise Tumoral

Potássio > 6 mEq/L


Ácido úrico > 10 mg/dL
Creatinina > 10 vezes o normal
Uremia
Fosfato > 10 mg/dL
Hipocalcemia sintomática
Hipervolemia
Hipertensão não controlada

B. HIPONATREMIA – calcitonina, 4 U/kg, SC a cada 12 horas


Complicação comum nas leucemias não linfóides – mitramicina, 25 ug/kg, em dextrose 5% 50 mL,
agudas. num período de 3 horas.
Entre os mecanismos: depleção salina, secundária a
vômitos ou diarréia, secreção inapropriada do E. ACIDOSE LÁTICA:
hormônio anti-diurético (associada ao quimioterápico Várias doenças neoplásicas, especialmente as
vincristina), insuficiência adrenal, inabilidade do rim linfoproliferativas , como leucemias e linfomas,
em reabsorver a grande carga osmótica resultante especialmente quando envolvendo o fígado, podem
da lise das células tumorais. causar acidose lática.
Os mecanismos incluem produção excessiva de ácido
C. HIPOCALEMIA
lático pelas células neoplásicas, via mecanismos
Comumentemente associada às leucemias não- glicolíticos, hipóxia de estase e metabolismo
linfóides agudas. Fatores etiológicos incluem ingestão inadequado do lactato pelo fígado.
inadequada, perda gastro-intestinal, e perda renal
devida a lisosimas. Perda renal tem sido associada O diagnóstico deve ser pensado no paciente com
a carbenicilina e aminoglicosídeos. Outro mecanismo inexplicável acidose metabólica, com ânion “gap”
fisiopatológico pode ser a captação celular de aumentado, na ausência de níveis elevados de
potássio para rápida geração de novas células, cada cetonas ou insuficiência renal.
uma das quais contém 30 a 40 vezes a concentração O manejo inclui tratamento da doença básica. Deve-
extra-celular de potássio. se tomar cuidado com a administração de bicarbo-
nato de sódio, que pode ser uma faca de dois
D. HIPERCALCEMIA gumes, já que seu uso pode levar a hiperos-
Pode ser vista em 0,4 a 0,7 % das crianças com molaridade e, em algumas situações, aumentar a
câncer. Vista em crianças com leucemia linfóide aguda produção de lactato.
ou rabdomiossarcoma alveolar, embora outras neo-
plasias possam cursar com elevação do cálcio sérico.
3. EMERGÊNCIAS CAUSADAS
Os sintomas incluem astenia importante,anorexia,
náuseas, vômitos, obstipação intestinal, dor abdominal
POR ANORMALIDADES
ou na região lombar, poliúria e sonolência. HEMATOLÓGICAS
A. HIPERLEUCOCITOSE
Tratamento:
– hiperhidratação com soro fisiológico (2 a 3 x o B. ANEMIA
normal) C. PLAQUETOPENIA
– furosemide IV, 2 a 3 mg/kg a cada 2 horas. D. COAGULOPATIA
– prednisona, 1,5 a 2,0 mg/kg/dia E. LEUCOPENIA

100 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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Selecionamos apenas a hiperleucocitose, em função anemia, na presença de hiperleucocitose, pois have-


do espaço reservado para este assunto. rá um aumento geométrico da viscosidade sangüínea,
desencadeando a síndrome de hiperviscosidade.
A presença de grande número de blastos na corren-
Nestes casos, pode ser necessário lançar mão de
te sangüínea está associada a morbi-mortalidade
exo-sangüíneotransfusão ou, em crianças maiores, de
precoce, decorrente de alterações metabólicas ou
leucoferese automatizada.
leucostase na microcirculação.
Hidratação, alcalinização e alopurinol devem ser
Definida como um número de leucócitos acima de
iniciados imediatamente. Transfusões de plaquetas
100.000/mm3, é observada em 5 a 20% das
para manter seu nível acima de 20.000/mm3 devem
crianças diagnosticadas com leucemia, e é mais
ser feitas devido ao risco de hemorragia intra-
freqüentemente encontrada nos pacientes com
craniana.
leucemia linfóide aguda.
O tratamento anti-leucêmico deve ser iniciado logo
Hiperleucocitose clinicamente significativa ocorre com
que o paciente esteja estabilizado.
um número de leucócitos acima de 200.000/mm3,
na leucemia mielóide aguda, acima de 300.000/
mm 3 na leucemia linfóide aguda e acima de
600.000/mm3 na leucemia mielóide crônica.
Pode levar a um impedimento de circulação no
Referências bibliográficas:
cérebro, pulmões e outros órgãos, levando a lesão 01 - Kelly, K.M. e Lange, B., Emergências Oncológicas. Clínicas
Pediátricas da América do Norte, 4:813, 1997.
na parede dos vasos e conseqüente sangramento. A
02 - Altman & Schwartz, Oncologic Emergencies, in Malignant
morbidade está diretamente associada à viscosidade Diseases of Infancy, Childhood and Adolescence,
do sangue. pág. 136, 1983.
03 - Lange,B.; O’Neill,Jr.; Goldwein, J.W. et al. Oncologic
Deve-se ter o especial cuidado de não realizar Emergencies in Pizzo & Poplack , Principles and Practice
transfusão simples de papa de hemácias, para corrigir of Pediatric Oncology, pág. 1025, 1997.

Anemias
FRANCISCO DE PAULA RAMOS PEDROSA

Anemia é geralmente definida como a diminuição A principal função da hemoglobina é transportar e


do nível de hemoglobina circulante, provocada por liberar oxigênio para os tecidos em quantidade
causas as mais variadas. O limite para diferenciar adequada às suas necessidades metabólicas. Assim,
um estado normal de uma anemia é o achado de fisiologicamente, podemos definir anemia como
dois desvios padrões para baixo em relação aos a diminuição da oferta de oxigênio para os
valores médios encontrados para a idade e o sexo. tecidos, na presença de uma função cardiovascular
(Tabela 1). normal.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 101


Onco Hematologia
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Tabela 1 - Níveis Normais de Hemoglobina (g/100ml) de acordo com a idade e sexo

Idade: (anos) Valor médio Valor mínimo


0.5-1.9 12.5 11.0
2-4 12.5 11.0
5-7 13.0 11.5
8-11 13.5 12.0
12-14
Feminino 13.5 12.0
Masculino 14.0 12.5
15-17
Feminino 14.0 12.0
Masculino 15.0 13.0

Fonte: Organização Mundial de Saúde - OMS

A definição fisiológica de anemia complementa a de instalação da anemia. Assim os pacientes que


definição laboratorial e deverá ser considerada no têm anemia de instalação rápida, como nos casos
momento de avaliar a necessidade de reposição de perda aguda de sangue, terão muito mais
com transfusão de sangue. sintomatologia com níveis mais altos de hemoglobina
do que os pacientes cuja anemia é crônica e que
A sintomatologia é dependente da adaptação se instalou lentamente como é, por exemplo, o caso
fisiológica do sistema cardiovascular e da velocidade da anemia ferropriva. (Figura 1).

Figura 1

Representação esquemática dos sintomas da anemia. Relação entre os níveis de hemoglobina e sintomas,
que dependem da velocidade de instalação da anemia e da capacidade de adaptação de cada paciente.

102 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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CLASSIFICAÇÃO c. Infiltração da medula óssea:

Existem várias classificações para as anemias, a mais ➣ Doenças malignas.


racional e mais prática é a que combina fisiologia e ➣ Mielofibrose.
morfologia. A combinação de ambas classificações é ➣ Osteopetrose.
rotineiramente utilizada na avaliação inicial do paciente.
O melhor roteiro para se identificar as múltiplas causas 2 – Diminuição da Produção da Eritropoietina:
da anemia é procurar identificá-las em um dos três a. Desnutrição.
grandes grupos fisiológicos:
b. Doença renal crônica.
I - Diminuição da produção dos eritrócitos. c. Doença inflamatória crônica.
II - Distúrbio da maturação dos eritrócitos e d. Hipotireoidismo.
eritropoiese ineficiente.
e. Hipopituitarismo.
III - Aumento da destruição ou perda aumentada g. Hemoglobinopatia com diminuição da afini-
dos eritrócitos. dade pelo oxigênio.
No primeiro grupo, estão as anemias que têm como
causa a diminuição efetiva da produção eritrocitária,
que pode ocorrer por: falência da medula óssea, II - Distúrbio da maturação dos eritrócitos
quer seja por aplasia quando existe uma eritroblas- e eritropoiese ineficiente:
topenia verdadeira, quer seja por infiltração da medula
1 - Maturação citoplasmática deficiente:
óssea por elementos estranhos, como acontece nas
leucemias, metastases tumorais, mielofibrose etc. a. Deficiência de ferro.
b. Talassemia.
No segundo, temos as anemias por deficiência de
síntese da hemoglobina, devido a distúrbio de c. Anemia sideroblástica.
maturação dos eritroblastos, representadas pelas d. Intoxicação pelo chumbo.
anemias ferroprivas e pelas talassemias.
No terceiro grupo, temos as anemias hemolíticas, que 2 - Maturação nuclear deficiente:
se caracterizam por uma destruição acelerada dos a. Anemia megaloblástica: deficiência de vita-
eritrócitos, nas quais encontramos um tempo encurtado mina B12 e de folatos.
de sobrevida média das hemácias e as anemias b. Anemia megaloblástica responsiva à vitamina B1.
provocadas por hemorragias, quer sejam por perda
c. Diseritropoieses primárias.
aguda de sangue, quando há lesão vascular, ou por
perda crônica, como acontece nas parasitoses d. Protoporfiria.
intestinais, perdas menstruais excessivas etc.
No esquema abaixo, procuramos identificar as III - Aumento da destruição ou perda aumentada
principais anemias da criança de acordo com a dos eritrócitos:
classificação fisiológica e morfológica.
1- Destruição aumentada: anemias hemolíticas:
ANEMIA - CLASSIFICAÇÃO FISIOLÓGICA a. Congênitas:
I - Diminuição da Produção dos Eritrócitos: ➣ Hemoglobinopatias.
➣ Defeito da membrana.
1 - Falência Medular:
➣ Deficiências enzimáticas.
a. Anemia aplástica:
b. Adquiridas:
➣ Congênita.
➣ Imunológicas
➣ Adquirida.
➣ Destruição mecânica do eritrócito.
b. Aplasia pura da linhagem vermelha:
➣ Destruição induzida por substâncias
➣ Congênita: Doença de Diamond-Blackfan. oxidantes.
➣ Adquirida: Eritroblastopenia transitória. ➣ Destruição induzida por agentes infecciosos.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 103


Onco Hematologia
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2 - Perdas aumentadas: CLÍNICA


a. Hemorragias por acidentes, perda aguda de
A avaliação inicial para o diagnóstico de uma anemia
sangue.
inclui história clínica, exame físico e exames de
b. Hemorragias gastrointestinais por lesão vas- laboratório.
cular, hemorragia menstrual.
Alguns dados da história têm grande significado no
c. Hemorragias por distúrbio da hemostasia.
sentido de nos conduzir ao diagnóstico etiológico
da anemia. Em relação à idade, as anemias que se
ANEMIA - CLASSIFICAÇÃO MORFOLÓGICA instalam no período neonatal são geralmente
decorrentes de perdas agudas de sangue ou devido
I - Microcítica:
à hemólise, quer seja por isoimunização, quer seja
1. Anemia ferropriva.
por manifestação inicial de uma anemia hemolítica
2. Talassemia. congênita, sendo que esta última se manifesta mais
3. Intoxicação pelo chumbo. freqüentemente na idade de três a seis meses. Anemia
4. Anemia sideroblástica. ferropriva em criança nascida a termo nunca se
manifesta antes dos seis meses de idade. Informações
II - Normocítica: a respeito da dieta têm importância no sentido de
identificar aquelas crianças que se alimentam com
1. Anemia hemolítica.
uma dieta muito pobre em ferro e aquelas que se
2. Anemia aplástica. nutrem essencialmente de leite.
3. Anemia por perda aguda de sangue.
As hemoglobinopatias S e C são mais comuns em
4. Anemia das doenças crônicas. crianças da raça negra, enquanto as talassemias
5. Anemia das infecções agudas. são mais freqüentes nas crianças brancas.
A presença de hepatoesplenomegalia, adeno-
III - Macrocítica:
megalia, manchas hemorrágicas sugere diagnóstico
1. Anemia megaloblástica por deficiência de de uma doença maligna, principalmente leucemia
vitamina B12 e de folatos. como a causa da anemia. A presença de icterícia
2. Anemia megaloblástica responsiva à vitamina nos leva a pensar na possibilidade uma anemia
B1. hemolítica.
3. Anemia das hepatopatias. A solicitação dos exames de laboratório deve ser
4. Anemia devido à infiltração da medula óssea. feita de acordo com as informações obtidas na

Tabela 2 - Diagnóstico Diferencial das Microcitoses

Índices Def. de Ferro Talassemias Intoxicação pelo chumbo

Hemoglobina Diminuída Diminuída Normal ou Diminuída

VCM Diminuído Diminuído Normal ou Diminuído

RDW Aumentado Normal Normal

FEP Aumentado Normal Aumentado

Ferro sérico Diminuída Normal ou Aumentado Normal

TIBC Aumentado Normal Normal

Ferritina Diminuída Normal ou Aumentado Normal

VCM = Volume Corpuscular Médio. RDW= Distribuição da Largura dos Eritrócitos.


FEP = Protoporfirina Eritrocitária Livre. TIBC= Capacidade Total de Combinação do Ferro.

104 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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história e no exame físico. Inicialmente, devemos ou a presença de formas especiais como hemácias
solicitar um hemograma, que nos fornece níveis de em foice ou em alvo orienta no sentido do
hemoglobina, índices hematimétricos, contagem de diagnóstico. Os índices hematimétricos nos informam
leucócitos e morfologia das hemácias. Além do se estamos diante uma anemia microcítica,
hemograma, deverá constar da solicitação inicial normocrômica ou macrocítica e, conseqüentemente,
uma contagem de reticulócitos e plaquetas. orientam no sentido da etiologia. (Tabela 2).
O exame do esfregaço do sangue periférico é o Com as informações obtidas com estes exames,
procedimento mais simples na avaliação laboratorial associadas às fornecidas pela história e pelo exame
do paciente com anemia, porém fornece informações físico, necessitaremos ou não solicitar outros exames,
muito importantes para a condução do diagnóstico tais como: ferro sérico, capacidade de combinação
etiológico da anemia. A presença de microcitose, do ferro, ferritina, protoporfirina eritrocitária livre,
macrocitose, policromasia, esquizócitos, esferócitos Coombs, eletroforese de hemoglobina, mielograma.

A Criança com Púrpura


SIMA ESTHER FERMAN

A criança com púrpura apresenta a doença devido 1. PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA


ao acometimento de vasos sangüíneos ou plaquetas.
As alterações na pele são causadas por NEONATAL
extravazamento de sangue dos vasos e pode variar
Dados da história e exame físico que devem ser
de pequenas petéquias a grandes equimoses.
sempre considerados:
A avaliação da criança com púrpura inicia-se com
– No recém-nascido: a presença ou ausência de
uma história clínica e exame físico bem detalhados,
sinais de doença sistêmica, principalmente sepsis,
que permitem diferenciar os defeitos da hemostasia
hepatoesplenomegalia e anomalias congênitas.
primária e da coagulação.
As manifestações clínicas do sangramento decorren- – Na mãe: a contagem de plaquetas e o esfregaço
te de alteração plaquetária, tipicamente envolvem do sangue periférico, história passada ou atual de
pele e membranas mucosas, incluindo petéquias, doença infecciosa e hematológica e uso de medica-
equimoses, epistaxe, hematúria e sangramento ções.
gastrointestinal. Sangramento intracraniano pode Em recém-nascidos doentes, pensar em trom-
ocorrer, embora não seja freqüente. Hematomas de bocitopenia por consumo ou devido à coagulação
músculos profundos e hemartroses são vistos em intravascular disseminada, em geral associada à
pacientes com defeitos da coagulação. doença de base. A causa mais comum de
Serão descritos, prioritariamente, a púrpura trombo- púrpura em recém-nascidos que estão clinica-
citopênica neonatal, púrpura trombocitopênica idio- mente bem é a trombocitopenia mediada
pática, trombocitopenia associada à doença de por anticorpos. Pode ser púrpura tromboci-
medula óssea, trombocitopenia causada por drogas topênica aloimune ou causada por auto-anticorpos
e púrpura vascular. maternos.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 105


Onco Hematologia
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A.1. Púrpura Trombocitopênica Aloimune A.2. Trombocitopenia causada por autoanticorpos


maternos.
É causada por aloanticorpos maternos da variedade
IgG contra antígenos antiplaquetários fetais ausentes Doença materna associada com autoanticorpos IgG
nas plaquetas maternas. Freqüentemente é associada circulante é uma causa mais comum de púrpura
ao antígeno plaquetário (PLA1 ou ZwA). Os anticorpos neonatal. A doença mais importante é a púrpura
atravessam a placenta e se ligam aos antígenos trombocitopênica idiopática (PTI) materna, que é
plaquetários do feto, resultando em destruição das responsável por cerca de 80% de todos os casos de
plaquetas pelo sistema reticuloendotelial. púrpuras imunológicas neonatais. Em contraste com
a púrpura aloimune, a contagem de plaquetas
A púrpura aloimune é análoga à anemia hemolítica materna é baixa e deve haver história de PTI ou
aloimune neonatal, causada por incompatibilidade outra doença associada com trombocitopenia
feto-materna dos antígenos eritrocitários. imunológica, como o lupus eritematoso sistêmico. Em
O recém-nascido com púrpura aloimune em geral é geral, a criança afetada deve nascer por parto
saudável e não tem outra anormalidade no exame cesariana. Contagem de plaquetas deve ser efetuada
físico, exceto as petéquias. Dependendo da nos 3-4 dias após o nascimento e ultrassonografia
circunstância do nascimento, pode haver púrpura cerebral deve ser realizada se contagem de plaquetas
exagerada nas áreas de trauma, incluindo o <50000/mm 3. Tratamento com gamaglobulina
desenvolvimento de cefalohematoma, petéquias em intravenosa é recomendado se contagem de
pescoço e face e grandes equimoses. Os exames plaquetas <20.000/mm3, se há evidência de
laboratoriais do lactente são normais, exceto a hemorragia intracraniana, associar também o
diminuição de plaquetas. A contagem de plaquetas corticóide. Pacientes com trombocitopenia acentuada
materna é normal. Dentro de 48 horas de vida pode ou hemorragia significativa podem ser tratados com
ocorrer icterícia relacionada ao depósito de sangue transfusão de plaquetas de doador não relacionado.
intersticial. Os primeiros filhos são afetados em cerca Recém-nascidos com contagem de plaquetas
de metade dos casos, sugerindo que a exposição >50000/mm3 não devem ser tratados. Mães com
ao antígeno pode ocorrer durante o curso precoce PTI não devem ser desencorajadas a amamentar.
da gravidez, em contraste com a imunização devido
ao sistema Rh. B. Síndrome de Kasabach-Merritt
A associação de trombocitopenia em lactentes com
Tratamento: A púrpura aloimune é uma doença
hemangioma gigante é conhecida como síndrome
benigna e resolve-se espontaneamente nos 3 primeiros
de Kasabach-Merritt. A trombocitopenia é devida à
meses de idade. Entretanto, hemorragia intracraniana
diminuição da sobrevida de plaquetas, sendo que
constitui a complicação mais temida associada a
em alguns casos tem também uma coagulopatia de
uma mortalidade de cerca de 12-20%. Um número
consumo com baixo nível de fibrinogênio e nível
de diferentes modalidades terapêuticas tem sido
elevado de produtos degradação de fibrina.
utilizadas para tratar os récem-nascidos. Tratamento
com corticóide é freqüentemente incluído, mas não Tratamento: Várias formas de tratamento têm sido
está documentado se é eficaz. Transfusão com utilizadas com resultados questionáveis. Recentemente,
plaquetas antígeno negativas se tornou o tratamento Interferon ++tem sido eficaz em corrigir a contagem
mais comum para resolução pronta da trombo- de plaquetas e reduzir o tamanho do hemangioma.
citopenia. Como somente 2% da população tem PLA1 Corticóide pode ser útil em alguns casos.
negativo, o melhor doador disponível é geralmente
a mãe do lactente. O plasma materno contém
2. PÚRPURA TROMBOCITOPÊNICA
anticorpo anti- PLA1, logo as plaquetas devem ser
preparadas para transfusão por remoção cuidadosa IDIOPÁTICA - PTI
do plasma materno e lavadas do concentrado. As Púrpura trombocitopênica idiopática (PTI) é a causa
plaquetas maternas devem também ser irradiadas mais comum de sangramento na criança. Devido à
para eliminar o risco de doença enxerto contra sua freqüência, às manifestações clínicas iniciais e
hospedeiro. Acompanhamento pré-natal e parto ao diagnóstico diferencial com doenças neoplásicas,
cesáreo estão indicados em futuras gestações, devido o pediatra necessita conhecer a história natural e o
ao alto risco de recorrências. tratamento dessa entidade clínica.

106 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Onco Hematologia
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É freqüente a história de infecção aguda, geralmente efetuado, para excluir outras causas de tromboci-
viral, 2 a 3 semanas antes do início dos sintomas. topenia. Tem sido questionada a necessidade de rea-
Mais comumente são infecções de vias aéreas lização de mielograma para diagnóstico, baseado no
superiores, outras vezes são viroses da infância como fato de que seria muito improvável que uma criança
rubéola, sarampo e varicela. Vacinação com vírus com aplasia ou leucemia tenha contagem de plaquetas
vivo atenuado, como vacina Sabin ou MMR, pode inferior à 10.000/mm3 e ao mesmo tempo taxa de
também anteceder o episódio. hemoglobina, contagem e diferencial de leucócitos
normais. Nossa conduta é realizar o mielograma nos
O paciente típico é uma criança jovem, de 2 a 7
casos de trombocitopenia crônica e também antes do
anos, saudável, que recentemente adquiriu uma
uso de corticóide, pois esta droga poderia mascarar a
infecção viral não específica. Subitamente desenvolve
evolução natural da leucemia aguda.
petéquias, equimoses, epistaxe e/ou gengivorragia.
Mais raramente hematúria ou hemorragia digestiva Tratamento: Um aspecto questionado é quanto à
acompanham o quadro. O exame físico é completa- necessidade de hospitalização. A maioria das crian-
mente normal, exceto pelas manifestações de ças pode ser tratada ambulatorialmente, com avalia-
sangramento. O baço não é normalmente palpado. ção clínica e hemograma 1 a 2 vezes por semana.
O quadro clínico de apresentação pode ser abrupto, Nossa conduta é limitar os casos de hospitalização
com manifestações agudas e graves de sangramento, às crianças com hemorragias externas intensas e com
ou leve, com aparecimento de petéquias e equimoses, risco de vida e quando não se pode dar crédito aos
que são inicialmente atribuídas ao trauma. Das ma- cuidados a serem dados em casa.
nifestações de sangramento, a hemorragia intra-
Se a criança apresentar um quadro leve de púrpura,
craniana é a que determina a maior morbimortali-
pode-se manter conduta expectante com medidas
dade na PTI e ocorre em aproximadamente 1% dos
básicas de suporte: repouso relativo à intensidade
casos.
da trombocitopenia, proibição da ingestão de
O risco é maior no primeiro mês após o diagnósti- aspirina, anti-histamínicos e injeções intramusculares
co. Entretanto, pode ocorrer em qualquer tempo em e imunização com qualquer tipo de vacina.
que houver trombocitopenia persistente, com conta-
A indicação do corticosteróide e/ou gamaglobulina
gem de plaquetas inferior a 20.000/mm3. Fatores
intravenosa na PTI é controversa. Apesar de não
de risco consistem de petéquias em palato, hemor-
modificar a história natural da doença, foi demonstra-
ragia retiniana e manifestações de sangramento ati-
do um aumento mais rápido das contagens de
vo em qualquer superfície mucosa. Os sinais e sin-
plaquetas. É indicado em casos selecionados em que
tomas de sangramento intracraniano incluem cefaléia
é antecipado um risco maior de hemorragia severa,
importante, irritabilidade seguida de confusão mental
como crianças com plaquetas <20000/mm3 e
e, finalmente, convulsão. Alguns estudos sugerem que
sangramento intenso de membranas mucosas ou
a cefaléia é o primeiro sinal clínico a aparecer, às
<10000/mm3 com púrpura leve. Gamaglobulina
vezes 12 horas antes do comprometimento mais
intravenosa tem sido indicada quando há necessida-
generalizado. Pacientes com trombocitopenia e
de de aumento rápido de plaquetas, como, por exem-
cefaléia devem ser considerados de alto risco para
plo, antes da cirurgia ou em pacientes com hemorra-
sangramento em sistema nervoso central e ade-
gia extensa e com risco de vida. É uma medicação
quadamente manejados.
extremamente cara.
Exames complementares na PTI: Hemograma com
A administração de concentrado de plaquetas está
contagem de plaquetas, avaliação do esfregaço
contra-indicada como medida de rotina nos pacientes
sanguíneo e tempo de sangramento. Provas de
com PTI. Como o anticorpo antiplaquetário é dirigido
atividade inflamatória , pesquisa de células LE e FAN,
contra plaquetas autólogas e homólogas, estas serão
devem ser realizados em pacientes com PTI crônica.
rapidamente destruídas na circulação do receptor.
A alteração no hemograma é a diminuição do número Entretanto, nas hemorragias com risco de vida, como
de plaquetas, sendo que na medula óssea o número hemorragia intracraniana e gastrintestinal maciça, há
dos megacariócitos é normal ou aumentado. Todas as necessidade de manejo agressivo que inclui corticos-
crianças devem ser examinadas pelo hematologista e teróide em altas doses, gamaglobulina endovenosa,
um estudo cuidadoso do sangue periférico deve ser além de doses altas de concentrado de plaquetas.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 107


Onco Hematologia
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De Oitenta a noventa por cento dos casos de PTI 5. PÚRPURA DE


são curados em 6 meses, sendo que 60% curam em
4 semanas, 10-20% dos casos evoluem para formas HENOCH-SCHONLEIN
crônicas. Mesmo nestes casos, observa-se elevação É uma púrpura vascular não trombocitopênica. A erup-
da contagem de plaquetas tardiamente. Dessa forma, ção purpúrica difere daquela devido à tromboci-
a esplenectomia está sendo cada vez menos topenia, pois as lesões são maculopapulares,
indicada, dando lugar às formas de tratamento com semelhantes à urticária. O rash aparece nas nádegas
menor potencial de morbidade. e nas superfícies extensoras dos braços e pernas.
Sintomas articulares e gastrointestinais acompanham o
rash em muitos pacientes. O estudo da hemostasia é
normal. O tratamento é sintomático. Quando há dor
3. TROMBOCITOPENIA abdominal severa, tratamento com corticóide é benéfico.
ASSOCIADA A DOENÇA
DA MEDULA ÓSSEA
6. SÍNDROME HEMOLÍTICO
Infiltração da medula óssea ocorrendo por leucemia
ou por metástase de tumores sólidos pode levar a
URÊMICA (SHU)
trombocitopenia severa devido à diminuição de A síndrome hemolítico urêmica afeta crianças
megacariócitos. A criança com leucemia apresenta saudáveis entre 6 meses e 5 anos de idade. Tipica-
história de febre, palidez, inapetência, dor óssea, mente a diarréia precede a anemia hemolítica e
hepatoesplenomegalia, além das manifestações trombocitopenia por 5 a 7 dias. As anormalidades
purpúricas. No caso dos tumores sólidos infiltrando laboratoriais incluem anemia, fragmentação das he-
a medula óssea se observa no exame físico e/ou no mácias, trombocitopenia, aumento da desidrogenase
estudo de imagens a presença do tumor primário, láctica, reticulócitos e bilirrubina não conjugada,
como por exemplo, tumoração em membro inferior associado à graus variáveis de elevação das escó-
por rabdomiossarcoma ou massa de suprarenal em rias renais. A maioria dos casos de SHU com diarreia
neuroblastoma. A infiltração de medula óssea pode deve-se à exposição à E.coli 0157:H7. Injúria à
também resultar de invasão por doenças não célula endotelial renal leva à anemia hemolítica
neoplásicas, como por exemplo, as doenças de microangiopática e à lesão glomerular. O tratamento
depósito. Outras causas de trombocitopenia amega- se baseia em medidas de suporte e manejo da
cariocítica são as anemias aplásticas idiopática e insuficiência renal e da hipertensão. São utilizadas
secundária a drogas ou irradiação. Constituem infusões de plasma ou plasmaferese, porém é
trombocitopenias constitucionais a Síndrome de TAR controverso. Agentes antiplaquetários também são
e a Anemia de Fanconi. O estudo da medula óssea usados, como dipiridamol e aspirina, porém com
é imprescindível nessas condições. eficácia não comprovada. Transfusões de plaquetas
podem potencialmente piorar o processo trombótico.

4. TROMBOCITOPENIA CAUSADA
LEITURAS RECOMENDADAS:
POR DROGAS: 01 - George JN, Woolf SH: Idiopathic Thrombocytopenic
Purpura: A practice Guideline Developed by Explicit
A. Trombocitopenia Imune: Methods for the American Society of Hematology. Blood 1:
3-40, 1996 Bearsdley DS, Nathan DDG: Platelet
Heparina, quinidina, penicilina, sulfonamida e abnormmalities in Infancy and Childhood, on Nathan and
derivados, rifampicina, digoxina, anticonvulsivantes Oskis´s: Hematology of Infancy and Childhood. W.B.
Sauders Company, 5th edition, 1585 – 1630, 1998.
e clorotiazida.
02 - Medeiros D, Buchanan GR: Current controversies in the
management of idiopathic thrombocytopenic purpura during
B. Disfunção plaquetária: childhood. Pediatric Clinics of North America 43(3): 757-
Aspirina, antiinflamatório: fenilbutazona, indometacina, 772, 1996.
furosemide, nitrofuradantina, antihistamínicos, tranqui- 03 - Bearsdley DS, Nathan DDG: Platelet abnormmalities in
Infancy and Childhood, on Nathan and Oskis´s:
lizantes, antidepressivos, dipiridamol, penicilina, cefa- Hematology of Infancy and Childhood. W.B. Sauders
losporina e lidocaína. Company, 5th edition, 1585 – 1630, 1998.

108 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica -
A visão do especialista
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Noções de Oftalmologia para Pediatras


MAURÍCIO BRIK

A finalidade desta é apresentar aos Pediatras em Outras vezes a inspeção pode mostrar um quadro
geral alguns quadros de clínica oftalmológica que aparentemente importante como por exemplo uma
podem ser detectados no berçário ou no consultório hemorragia sub-conjuntival mas clinicamente banal
pediátrico e estabelecer as principais características e que se resolve sem qualquer intervenção. O olho
diagnosticas e terapêuticas. Não pretendemos que vermelho entretanto costuma aparecer em quase todos
os pediatras devam estabelecer o diagnóstico os quadros patológicos e para que esta apresentação
preciso ou o tratamento, bastando que a suspeita não seja excessivamente longa ou complexa mas
seja levantada. Trata-se portanto de determinar os não deixe de mencionar os aspectos mais importantes
casos positivos e encaminhá-los ao exame da clínica oftalmológica escolhemos 10 tópicos que
especializado. expomos a seguir:

Alguns quadros oftalmológicos são tão evidentes que 1) Conjuntivite neo natorum. Até há alguns anos a
é impossível um Pediatra não valorizar o achado. principal etiologia da conjuntivite neo natorum era a
Assim a anoftalmia é um quadro tão chamativo que infecção provocada por Neisseria gonorraehe. A
o recém nato portador desta anomalia oculo cerebral contaminação do feto durante o parto era o fator
é imediatamente rotulado como positivo e infeccioso principal. Atualmente os quadros
encaminhado ao exame com o Oftalmologista e com provocados por Neisseria são muito mais raros e a
o Neurologista. conjuntivite provocada por Chlamidia trachomatis
Outros quadros, não menos graves, podem passar ocupa o primeiro lugar nas etiologias. O quadro
desapercebidos pela inspeção feita pelo Pediatra. clínico é de uma conjuntivite catarral aguda com
Um retinoblastoma, por exemplo se reveste da maior grande edema de pálpebras superior e inferior,
gravidade em função da morbidade e mortalidade hiperemia e quemose, com abundante descarga
quando não tratado à tempo e aparece como um purulenta. O tratamento pode ser feito com colírio
reflexo amarelado através da pupila. Este reflexo se de Gentamicina 1 gt. nos dois olhos cada 2 horas
deve à massa tumoral ocupando a cavidade vítrea, nas primeiras 24 horas e 4 vezes ao dia a partir do
atrás de um cristalino transparente. O efeito é segundo dia até 6 dias tomando o cuidado de
chamado de “olho de gato amaurótico” e deve ser limpar a secreção e crostas com água fervida ou
encaminhado com urgência para a enucleação. soro fisiológico.

Nem sempre os problemas são exclusivos da baixa 2) Conjuntivite Alérgica. Extremamente freqüente na
idade. O Pediatra também deve estar atento a primeira infância isolada ou associada a outras formas
quadros que são raros em crianças apesar de seu de alergia das vias aéreas superiores, pode ser
diagnóstico fácil através da simples inspeção. O sazonal quando provocada por pólen ou crônica
herpes zoster, por exemplo embora seja uma quando assume as vezes a forma de uma conjuntivite
patologia comum de pacientes com idade avançada, severa com papilas gigantes e lesões corneanas. O
pode parecer em crianças. aspecto clínico é de um olho lacrimejante, com

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 109


Prática Pediátrica - A visão do especialista
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discreta hiperemia, prurido e ardor. O prurido é um remoção da catarata cirurgicamente, na colocação


sintoma freqüente e insistimos sempre em que se de um implante intra ocular, na oclusão do olho
evite o ato de esfregar e coçar. Ao esfregar o paciente são e em seguimento cuidadoso muito freqüente.
macera mastócitos e libera os grânulos tóxicos o que
4) O Glaucoma Congênito é um quadro grave cuja
piora o quadro. Também acredita-se que existe uma
etiologia é uma malformação no ângulo camerular,
conexão entre o ato de coçar e o aparecimento de
o ângulo formado pela córnea e pela iris ao longo
ceratocone, uma distrofia corneana grave. A
do qual se processa o escoamento do humor aquoso.
conjuntiva palpebral apresenta sempre papilas que
Com o fechamento dos canais de saída do líquido
são produto do edema conjuntival. Nas formas
se acumula no interior do globo ocular, aumentando
moderadas insistimos para que o paciente não coce
sua pressão e destruindo o nervo óptico. Nos infantis,
e recomendamos compressas geladas que reduzem
por causa da elasticidade da tunica excleral e
o edema e consequentemente a coceira. Quando o
corneana, o olho com pressão aumentada se distende
quadro é mais grave há necessidade de medicação.
e aumenta de volume, criando o aspecto característico
Cromoglicato de Sódio a 4% q.i.d. por 15 dias era
de buftalmia, ou olho de boi. O sintoma mais
usado até recentemente. Atualmente dá-se preferência
importante além do aumento do diâmetro corneano
a Levocabastina b.i.d. por 30 dias. Nos quadros
é a fotofobia. A fotofobia precede o alargamento
com papilas gigantes e risco de opacificação
da córnea em muitos casos e as vezes é o único
corneana recomendamos a cortisona. Usualmente
sinal.
Minidex t.i.d. 6 dias ou às vezes Maxidex q.i.d.
quando as respostas são lentas ou ausentes. Em O tratamento se faz através de cirurgia especializada
alguns casos, mais graves, há necessidade de que consiste na abertura das lâminas anômalas que
injeções de corticoesteroide sub conjuntival e cirurgia obliteram o ângulo camerular. Mesmo depois de
para a remoção das papilas. neutralizada a pressão estes olhos ficam muito
3) Na Catarata congênita encontramos uma grandes e via de regra com altíssimas miopias.
patologia incapacitante que se reveste de extrema 5) A obstrução lacrimal seria o tópico seguinte e é
importância. Todas as causas que afetam o um achado freqüente. Na maioria dos bebês o
crescimento do feto nos três primeiros meses de saco lacrimal não está patente ao nível do meato
gestação podem se traduzir por cataratas congênitas médio. Nestes primeiros meses de vida a secreção
mas a causa mais comum são as viroses porque lacrimal também está diminuída e a falta de abertura
durante a fase de viremia as partículas virais se inferior não causa nenhum transtorno. Em alguns
alojam no cristalino e destas a rubeola a mais casos a secreção lacrimal já é normal e abundante
freqüente causa de catarata. O diagnóstico é feito ao nascer e isso causa como primeiro sintoma a
por inspeção da área pupilar. As pupilas de um epifora. Como em todos os casos em que existe
paciente com catarata são esbranquiçadas. Nos coleção de líquido cavitário a contaminação é regra.
casos unilaterais a gravidade é maior porque o O tratamento é expectante. Na maioria dos casos
desenvolvimento da visão é um processo lento e o crescimento do nariz abre espontaneamente o
progressivo que se inicia no nascimento e só se meato médio e as lágrimas começam a drenar para
completa aos 8 anos. Se um bebê apresenta o nariz. Enquanto esperamos recomendamos o uso
catarata congênita unilateral seu olho não se de colírios antibióticos como a Getamicina e
desenvolverá normalmente e a falta do estímulo massagens com compressão do canto interno para
luminoso do olho doente provocará uma parada expelir a secreção e promover a desinfecção da
do seu desenvolvimento com danos orgânicos às cavidade.
células do cérebro que estão na trajetória do
estímulo, desde sua formação na retina, até as 6) Ambliopia Obscuracional. A ambliopia é uma
células da fissura calcarina nas áreas 17 e 18 da afecção importante que compromete 3% da
córtex, passando pelo núcleo geniculado lateral. população. A ambliopia, ou “olho preguiçoso” como
Este fenômeno, chamado ambliopia será objeto de é chamada se reveste de grande importância porque
tópico isolado que analisaremos posteriormente. O é uma forma evitável de perda visual. Se detectada
tratamento de uma catarata congênita consiste na nos primeiros 18 meses de vida a oclusão do olho

110 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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são e a remoção dos agentes causadores de escuro quanto mais forte for o defeito. O tratamento
ambliopia podem evitar sua instatação. A forma consiste em receitar os óculos corretivos e oclusão
descrita anteriormente e provocada por catarata do olho são.
congênita é a mesma que é causada por qualquer
8) Ambliopia estrábica. Nos estrabismos o desvio
outro obstáculo à passagem normal da luz.
dos eixos oculares produz como primeiro efeito visão
Chamamos de ambliopia obscuracional a esta forma
dupla, ou diplopia. Para se defender deste incômodo
que aparece na catarata, na ptose, nas opacidades
sintoma o cérebro rapidamente põe em ação um
da córnea como leucomas e nas opacidades do
mecanismo para eliminar a diplopia, apagando uma
vítreo, como persistência do vítreo primário, restos
das imagens. Este fenômeno chamado supressão é
da artéria hialóide e retinopatia da prematuridade.
transitório no início mas com o tempo passa a
O diagnóstico pode ser feito pela simples inspeção
permanente. Como o passar dos meses o olho com
quando se perceberá que não há passagem
a imagem suprimida não consegue funcionar
adequada de luz na presença de uma mancha da
normalmente por estar suprimido. Com o tempo
córnea, de uma catarata ou de uma ptose. Nestes
apareceram defeitos nas células do corpo geniculado
casos também podemos utilizar um exame muito fácil
lateral e na córtex cerebral. As três formas de
e simples. Trata-se do reflexo vermelho do fundo que
ambliopia são portanto relativamente similares nos
é realizado com um oftalmoscópico de pilha.
fenômenos que ocorrem no SNC. No início, até os
Iluminando-se as duas pupilas ao mesmo tempo de
3 anos de idade, os mecanismos de supressão são
uma distância de 2 metros comparamos a cor dos
reversíveis com a oclusão. Após os 3 anos de idade,
reflexos do fundo do olho. Em geral se um olho
passado o período crítico, a oclusão já não funciona
apresenta um obstáculo à passagem da luz aparecerá
porque aparecem alterações estruturais no trajeto das
um reflexo vermelho mais escuro, ou mesmo ausente
fibras ópticas dentro do encéfalo. Devemos lembrar
enquanto que o olho são apresenta um reflexo
que os estrabismos podem ser confundidos com falso
vermelho alaranjado forte e claro. O tratamento
estrabismo e podem vir acompanhados de desvios
consiste na remoção das causas e oclusão do olho
verticais.
são.
9) Traumas. Um penúltimo capítulo que interessa aos
7) Ambliopia por anisometropia. Esta forma, uma
Pediatras diz respeito aos traumas oculares.
das mais difíceis de tratar e de descobrir
precocemente ocorre quando uma pessoa apresenta No ambiente doméstico, na escola, nos transportes
um grau óptico diferente nos dois olhos, os traumas oculares são freqüentes e sua prevenção
particularmente quando um olho é normal ou quase deve ser a regra primordial porque o tratamento
normal e o outro é hipernatrópico, astigmático ou cirúrgico sempre se acompanha de alterações e
uma combinação de ambos. Nestes casos a causa complicações que podem resultar em perda visual.
da ambliopia não é a falta de passagem de luz, 10) Toxoplasmose congenita. Para finalizar queremos
mas a imagem deformada e de má qualidade que mencionar o problema da toxoplasmose congênita,
se forma na retina do olho com o defeito óptico. O que pode comprometer ambos os olhos e quando as
cérebro escolhe a imagem melhor e “apaga” a lesões são centrais e comprometem de forma
imagem borrada. O reconhecimento desta forma de permanente a acuidade visual. A toxoplasmose
ambliopia, chamada anisometrópica se faz com o materna adquirida durante os 3 primeiros meses de
teste do reflexo vermelho que pode ser feito até no gestação tem uma probabilidade muito grande de
berçário. O reflexo se apresentará diferente nos dois se traduzir por lesões corio retinianas e este achado
olhos, mais claro no olho normal ou quase normal e deve sempre alertar o Pediatra a solicitar o exame
mais escuro no olho com o defeito óptico, tanto mais oftalmológico do recém nato.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 111


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Problemas Ortopédicos Comuns


LUIZ ANTÔNIO M. CUNHA

As patologias do sistema músculo esquelético são metatarsos comum em crianças no início da mar-
comuns no consultório dos pediatras e o termo cha, a torção interna de tíbia, comum entre 2 e 5
“ORTOPEDIA” sintetiza bem a relação da anos e a anteversão do colo do fêmur, a mais co-
especialidade com as doenças na infância. mum delas e freqüentemente preocupando os pais e
os pacientes após os 5 anos de idade. Todas três
Algumas doenças congênitas freqüentes devem ser
possibilidades têm evolução favorável e raramente
enfatizadas pelas peculiaridades no seu diagnóstico
requerem qualquer tipo de tratamento.
e tratamento.
As deformidades angulares, principalmente dos
O pediatra clínico deve estar atento ao diagnóstico
joelhos, são também muito comuns. O joelho varo
diferencial do torcicolo, principalmente em relação
geralmente não é patológico em crianças de baixa
aos problemas oftalmológicos, como o estrabismo
idade quando está relacionado a fatores raciais,
vertical; problemas neurológicos, como as lesões da
torção interna de tíbia muito acentuada e quando
base do crânio; defeitos vertebrais, como o síndrome
apresenta radiografia onde a média do ângulo
de Klippel-Feil e também à possibilidade da
metáfiso – diafisário é menor que 11 graus. O
associação do torcicolo congênito com a luxação
diagnóstico diferencial deve ser feito com os diferentes
congênita do quadril.
tipos de doença de BLOUNT.
As escolioses congênitas devem ser avaliadas com
A deformidade em valgo dos joelhos é freqüentemente
relação ao risco de associação a má-formações
fisiológica entre os 2 e 5 anos de idade e está
cardíacas e renais.
mais relacionada a crianças com maior peso
A luxação congênita do quadril é hoje conhecida corporal.
como displasia do desenvolvimento e os esforços
O pé plano valgo, que pode ser rígido ou flexível,
dos pediatras devem estar voltados para o diagnóstico
é na maior parte das vezes fisiológico e não necessita
precoce. A manobra de ORTOLANI deve ser
tratamento ortopédico.
complementada com a de BARLOW e também o
uso da Ultrassonografia favorece a avaliação precoce Outro problema pediátrico comum é a dor nos
dos quadris suspeitos de displasia do desenvolvimen- membros inferiores em crianças. Segundo o “National
to. Outro fator importante é o esclarecimento dos Center of Health Science”, 7% das consultas
pediatras da necessidade do exame periódico dos pediátricas estão relacionas a dores nos membros
quadris durante o primeiro ano de vida, visto a inferiores.
possibilidade da displasia acetabular desenvolver-se As doenças infecciosas do sistema músculo esquelético
neste período. estão entre as principais causas de dor e claudicação.
Outra doença congênita comum é o pé torto Vale a pena ressaltar a importância do diagnóstico
congênito. Com relação a esta deformidade deve precoce principalmente da artrite séptica, da
ser enfatizada a necessidade do encaminhamento freqüência da osteomielite sub aguda e também a
para centros especializados, uma vez que as importância da cintilografia para o diagnóstico
correções secundárias estão muito sujeitas a maus precoce das infecções axiais.
resultados . As diferentes síndromes dolorosas da articulação do
quadril em crianças são também comuns e devem
As deformidades torcionais e angulares são muito
ser abordadas para discussão.
comuns no dia -a- dia do pediatra. Uma das principais
queixas no consultório dos ortopedistas é a marcha A sinovite transitória do quadril, com suas
com a ponta dos pés voltadas para dentro. Três características principais, constitue-se em uma doença
possibilidades, que são idades dependentes, podem com história e evolução natural conhecidas, tendo
ser comumente levantadas: a deformidade dos uma relação causal com a Doença de Legg-Perthes.

112 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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A doença de Legg- Perthes é ocasionada por múlti- A epifisiolise femural superior do adolescente tem seu
plos infartos ao nível da articulação do quadril e tem tratamento regrado através de um parafuso canulado
seu prognóstico relacionado ao grau de necrose e e os métodos modernos permitem uma melhor
idade do paciente no início da doença. exposição e adaptação destes instrumentais nacionais.

Síndrome da Respiração Oral


FLORIANO PEIXOTO GOMES DE SÁ

A respiração oral constitui um problema de interesse Lateralmente brotados da cavidade nasal estão os
médico-odontológico, tanto nos seus aspectos vários seios: os maxilares, o etmóide e o frontal,
etiológicos, sintomáticos como nos terapêuticos. sendo espaços preenchidos por ar, cuja função não
é bem definida.
Durante o repouso, um indivíduo respira de 12 a 15
vezes por minuto, 500 ml de ar penetram em cada O tabique nasal, por sua vez, é formado pela lâmina
respiração, ou seja, 6 a 8 litros por minuto são perpendicular do etmóide, o vômer e a cartilagem
inspirados e expirados, o que representa de 10.000 quadrangular, que rege o formato do nariz e onde
a 12.000 nas 24 horas. se realizam operações que visam a retificação dos
desvios septais e restauração da respiração
insuficiente.
TRAJETO DA CORRENTE AÉREA
ATÉ CHEGAR AOS ALVÉOLOS As paredes laterais são compostas pelas apófises
pterigóideas, maxilares superiores e massas laterais
PULMONARES
do etmóide, apresentando saliências horizontais
Este trajeto inicia-se no nariz, que constitui dirigidas de frente para trás, os cornetos, formados
característica da espécie humana e ocupa um bloco por uma lâmina óssea coberta por mucosa.
retangular com os seios da face, ficando entre a
Debaixo de cada corneto existe um espaço em forma
abóbada palatina e a base do crânio.
de canal ântero-posterior, chamado meato.
Na parte anterior, a cavidade nasal tem uma
O piso inferior (cornetos e meatos inferiores e
polegada de largura e uma polegada e meia na
medianos) está destinado à passagem do ar da
parte posterior, onde ocupa maior espaço, devido à
respiração, enquanto o piso superior serve para o
diminuição do tamanho das órbitas.
olfato.
Apresenta-se dividida em duas câmaras pelo septo
A mucosa do piso inferior é grossa e sua
nasal, que, teoricamente, deveria seu uma linha reta. vascularização abundante dá cerca de 500cc de
o que de fato raramente ocorre.
água por dia ao ar inspirado, também dando
As paredes laterais do nariz, por outro lado, passagem a um número incalculável de leucócitos,
apresentam-se consideravelmente maiores pela que englobam e destróem as bactérias do ar
presença de cornetos e dos seios nasais. Os cornetos, inspirado, que a capa de muco detém na superfície
especialmente o inferior, estão cobertos por uma da mucosa, protegendo o organismo contra
mucosa muito vascularizada, similar ao tecido erétil numerosas infecções. A este fato damos o nome de
do pênis, em sua estrutura. fagocitose nasal.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 113


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O epitélio nasal é estratificado e ciliado, sendo que Além desta filtração, temos outra muito mais importante
estas características variam de local para local. que é por precipitação turbulenta. Quando o ar
penetra no nariz, encontra muitos locais que
As funções do nariz sobre o ar que por ele transita
funcionam como “aspas obstrutivas”, tais como,
são as seguintes:
cornetos, tabique médio, parede faríngea, e ao entrar
• Aquecimento em contato com estas obstruções, o ar deve mudar
• Umidificação seu curso, e as partículas suspensas nele, por terem
• Filtração massa maior que o próprio ar, não podem mudar
seu curso rapidamente, seguindo mais adiante e se
O aquecimento é executado, particularmente, pelos chocando com as superfícies obstrutivas (anteparos).
cornetos, em virtude de sua rica vascularização, o
que lhes permite funcionar como verdadeiros Partículas de fumo, que têm aproximadamente 0,3µ
radiadores. de diâmetro passam pelos alvéolos pulmonares quase
sem perda de partículas e a maior parte volta aos
A umidificação é, como dissemos, função da porção pulmões com o ar expirado.
inferior das fossas nasais que, para tal, secreta cerca
de 500 ml de água por dia, que se mistura com o Ultrapassando as fossas nasais, a corrente aérea
ar inspirado. atinge a faringe, entrocamento para passagem de
ar e alimentos e pertencente aos aparelhos digestivos
A filtração, quando se trata de partículas volumosas, e respiratórios. É construída pela metade superior de
é feita através dos pêlos. um tubo, formando uma goteira de concavidade
Segundo Comroe (1967), partículas de 2 a 10µ voltada para frente. Muito importante é a presença
podem aderir-se à parede da traquéia, aos brônquios no fórnix da faringe, ou seja, sua parte superior, das
e bronquíolos. vegetações adenóides (tonsilas) e também das
“tonsilas tubárias”, que devido as suas íntimas relações
Partículas de 0,3 a 0,2 µ de diâmetro e os gases com os ;óstios das tubas auditivas ou trompas de
e vapores estranhos chegam aos condutos alveolares Eustáquio, podem muitas vezes, obstruí-los. As tonsilas
e alvéolos. Partículas como o silício, pó inerte, são estão situadas atrás da saída da trompa de Eustáquio.
captados; bactérias e vírus são depositados ou
Em seguida à faringe temos a laringe, em cujo interior
removidos, e vapores irritantes e tóxicos são
encontramos as cordas vocais. Pela deglutição, a
absorvidos como partículas grandes. Salvo em casos
laringe move-se no sentido de obstruir sua entrada e
de excesso de função, os mecanismos de filtração
impossibilitar a penetração de substâncias alimentares
conservam os alvéolos praticamente estéreis. Esta
em direção aos pulmões.
filtração é executada pelos cílios e seus movimentos.
Entre a laringe e os brônquios temos a traquéia, cujo
Os cílios são estruturas primitivas que se encontram
arcabouço é constituído por cerca de 20 anéis
em toda extensão do aparelho respiratório,
cartilaginosos incompletos para trás, que são as
excetuando-se partes da faringe, terço anterior das
cartilagens traqueais e têm forma de um “C”.
fossas nasais e unidades respiratórias terminais.
Inferiormente, elas se bifurcam em dois brônquios
Sua velocidade de impulsão é de mais ou menos principais, dividem em brônquios de 2ª e 3ª ordens,
16mm por minuto, e o dessecamento os lesiona de os quais se ramificam em bronquíolos, que penetram
forma irreversível. Seus movimentos só se processam nos lóbulos pulmonares.
no muco, e não no ar, e a ação da onda é
Os pulmões, finalmente, são órgãos extraordi-
impulsionar a capa de muco (e as substâncias nela
nariamente elásticos e estão recobertos pela pleura.
contidas) até a zona alta do aparelho respiratório.
A superfície externa dos pulmões (pleura visceral) é
Sua forma é invariável de dois filamentos centrais constituída por uma membrana fina, úmida e brilhante
rodeados por uma auréola de nove. que envolve os pulmões e recobre a caixa torácica
interiormente (pleura parietal). Os capilares
O muco, por sua vez, é composto, principalmente
pulmonares somam uma superfície de 100 m2.
por mucopolissacarídeos (complexo com ácido
siálico), ao qual está unido intimamente e, talvez, Após compreender este roteiro da corrente aérea, é
possa separar-se fisicamente das mucoproteínas. necessário sabermos como ocorrem a inspiração e

114 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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expiração, que resultam de complexos movimentos primeiros dias de vida como resposta após o
musculares acompanhados de deslocamentos das nascimento, à flora normal, estafilococos da pele e
costelas e cuja finalidade é aumentar e diminuir a Escherichia coli, no trato intestinal. A Ig A aparece
área torácica interna. após o 30º dia de vida e aumenta vagarosamente
até a puberdade. A Ig gama G é a fração mais
Os músculos responsáveis são divididos em:
importante das gama-globulinas e consiste em vários
Inspiradores milhares de anticorpos específicos contra infecção.
• Diafragma
Inicialmente, estas globulinas provêm do sangue
• Intercostais externos materno e, pela placenta, vão ao feto, desapare-
• Intervertebrais cendo mais ou menos no 3º mês de vida; após o
• Esternocleidomastoideo nascimento a criança repõe a gama-globulina G e,
aos 5 meses, está reposta a mesma quantidade que
Expiradores a mãe lhe doou. Daí até os 16 anos de idade
• Intercostais internos aumenta, para, então, estabilizar sua taxa.
• Abdominais
As tonsilas palatinas são obstrutivas à respiração
• Peitorais menores nasal. Às vezes, quando estão muito hipertrofiadas,
pressionam a parede posterior da faringe, quando a
CAUSAS MAIS COMUNS boca é muito aberta e inicia-se o reflexo do vômito.
Estas crianças são conhecidas como “vomitadoras
DA RESPIRAÇÃO ORAL crônicas” ou “chronic gaggers” (Todd). Em relação
ao volume das tonsilas, segundo Worms e Le Mee,
Amígdalas ou Tonsilias
citados por Vieira Romeiro, “A tonsila mais suspeita
Constam de tecido linfóide, que aparecem mais ou é a que mais se esconde”. O problema das
menos no 6º mês de vida-uterina com infiltrações tonsilectomias é da maior importância. Há cerca de
subepiteliais com linfócitos, e que se assenta no teto 30 ou 40 anos, a conduta era simples e sucinta. Se
e na parede súpero-posterior da nasofaringite. existirem, renovam-nas. Hoje, com os recursos da
Apresenta cinco ou mais fissuras antero-posteriores, eletroforese, que estuda as proteínas do plasma,
com muitas criptas tubulares que se abrem para o aprendeu-se que as imunoglobulinas produzidas pelos
interior da mesma. Os folículos linfóides, com seus tecidos linfóides são muito importantes na função
núcleos, estão dispostos ao longo dos lados destas imunológica.
fissuras ou criptas.
Muitos casos de otite média em que foram removidas
As amígdalas (ou tonsilas) se dividem em palatina,
as tonsilas no sentido de resolver o problema, nada
ou anéis de Waldeyer, e as faríngeas ou de Luschka,
ocorreu, em virtude das trompas do Eustáquio serem
sendo que esta não apresenta criptas e é revestida
congenitamente pequenas.
por um epitélio pseudo-estratificado cilíndrico ciliado
(epitélio respiratório). As tonsilas palatinas diferem Também, na maioria dos casos de alergias as
das faríngeas ou adenóides, no epitélio estratificado adenotonsilectomias não resolvem. As indicações
escamoso que cobre e na presença de tecido fibroso atuais são as seguintes:
capsular. • Tonsilite folicular – Recorrente, aguda, que culmina
A função essencial das tonsilas é a elaboração dos com infecção crônica e hipertrofia tonsilar.
linfócitos. Os nódulos secundários são considerados • Abscesso peritonsilar.
como tendo um importante papel na produção de • Obstrução mecânica – Esta é a causa muito
anticorpos e estão separados do mundo exterior só importante de respiração oral, valendo acentuar que,
por uma camada de epitélio e em constante contato muitas vezes, se estabelece um círculo vicioso, isto
bacteriano. Segundo Fairchild (1968), como outros é, as tonsilas infectam em virtude da respiração oral,
tecidos de natureza linfóide, constituem fonte e e com isso agravam esta respiração, até que se
imunoglobulinas. estabeleça um quadro crônico.
Estas imunoglobulinas (Ig), são gama M, A e G. A • Infecções do ouvido médio – Há autores, incluindo
Ig M ocorre no feto, e seu aumento é grande nos 6 Ricketts, que asseveram que a adenotonsilectomia

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 115


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cura espontaneamente a maloclusão. Acreditamos trajeto. É formado pela lâmina perpendicular do


que tal seja verdadeiro só em casos de diagnóstico etmóide pelo vômer e pela cartilagem quadrangular.
muito precoce. Sabemos que ao nível do sistema vômer/etmóide, é
onde está a maior atividade de crescimento e também
Pólipos Nasais onde se formam as cristas e espinhas.
São produzidos pelo edema da submucosa do meato
A parte limite da zona cutânea e mucosa do tabique
médio, geralmente dependem de inflamação crônica
nasal, devido ao fato de sofrer a ação de vários
de sua mucosa ou de supuração de um ou vários
agentes, apresenta modificações que fazem perder
seios paranasais. Às vezes, um pólido originado no
parte de suas glândulas mucosas e se transforma
seio maxilar., invade a fossa nasal, saindo através
numa zona lisa, sujeita a processos irritativos.
do óstio secundário, e não principal.
Podem ser de dois tipos: mucosos e fibrosos. É raro Segundo Roydhouse, 70% dos recém-nascidos
que haja um só pólido. Em geral um volumoso, apresentam a parte ínfero-posterior da cabeça situada
oculta outros menores. para anterior e para o lado esquerdo. Também foi
comprovado que 70% dos desvios de septo nasal
São massas branca-acizentadas ou rosadas, lisas de
são do lado esquerdo. Durante a passagem do feto
consistência mole ou gelatinosa. São pediculados,
pelo canal de parturição, ocorre comumente pressão
sempre móveis. Podem ser de tal volume que saiam
do lado direito do nariz. Isto é considerado como
pelos orifícios nasais ou pelas coanas. Sua presença
agente causal de deslocamento do septo nasal para
provoca hiper-secreção marcada. Às vezes, sua
a esquerda, que é mínimo e sem sintomas no recém-
inserção pode ser nas coanas e o paciente apresenta
nascido, mas aumenta com o subseqüente crescimento
sensação de corpo estranho na nasofaringe,
do nariz, especialmente, se agravado por trauma.
transtornos auditivos, etc.

Vegetações Adenóides Alergia

São hipertrofias do tecido adenóideo normal da Mais propriamente, rinite alérgica, é conhecida desde
nasofaringe, ou mais precisamente da tonsila de 1919, descrita por Bostock, citado por Alcântara e
Luschka. Geralmente, obstruem os orifícios nasais Marcondes. Foi denominada inicialmente febre do
posteriores. A hiperplasia de todos os tecidos linfóides feno, denominação imprópria, pois na realidade não
ocorre entre 2 e 6 anos de idade (período de há febre e a rinite não é provocada pelo feno, mas
hiperplasia linfóide fisiológica). Constam de 4 a 6 pelo pólen de várias plantas, por diversos antígenos
lóbulos implantados na parte superior do cavum, à inalantes ou alimentares. O quadro se caracteriza
altura da apófise basilar do occipital, aderidos uns por rinorréia mais ou menos intensa, espirros em
aos outros e dirigidos de cima para baixo. Seu salva, coriza clara, prurido nasal, ocular ou palatino,
volume varia desde um espessamento até o e fases de obstrução nasal com dificuldade
fechamento total do cavum. respiratória e sensação de obstrução nos ouvidos.
Pêlos, penas, mofos, alimentos inalação de drogas
Propagando-se para o ouvido, causam surdez são incriminados. Alguns explicam-na como sendo
intermitente ou otite média com ou sem supuração; causada por alimentação à base de vaca no período
para a laringe e traquéia, produzem tosse intermitente neonatal (muito cedo), o que ocasiona edema
e espasmódica e, para o intestino, pela descida de persistente. As mucosas nasal e paranasal,
germes, podem causar enterite. A hiperplasia alergicamente edematosas, causam estase venosa
fisiológica das massas linfóides faríngeas na maxila e estruturas adjacentes pela pressão das
provavelmente explica a respiração oral comum entre veias. Em adição, a ação histamínica causa dilatação
o 4º e 12º anos de vida, quando a atrofia fisiológica marcada da rede aérea capilar nasal, palatina e
das tonsilas e o aumento das dimensões das vias alveolar.
aéreas nasofaríngeas explicam o fato de a respiração
oral obstrutiva ser pouco encontrada no adulto jovem. Lincock, citado por Marks, estudando este processo
em índios Chipewa, jamais observou um caso de
Desvios de Septo Nasal alergia e atribui o fato à alimentação nos primeiros
O septo nasal deve, como dissemos, ser teoricamente meses de vida Ter sido só no seio materno, sem
vertical, não apresentando irregularidades em seu alimentos suplementares ou água. Quando o leite de

116 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


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vaca ou outros alimentos eram dados na dieta, os meses de inverno, quando a umidade é baixa,
eczema e outras manifestações apareciam. seca a bainha ou camada mucosa e causa
congestão nasal.
Como os alérgenos são os mais variados, e seus
efeitos são contínuos e prolongados (às vezes, durante As crostas mucosas acumulam-se nas passagens
toda a vida do indivíduo) podem conduzir a nasais e causam obstruções mecânicas à respiração
respiração oral quase totalmente crônica. A obstrução normal. Em certos locais industriais onde o ar é
é particularmente severa durante as horas de sono, contaminado, agrava-se tal condição. Em áreas onde
e pode ser completa se o paciente estiver em decúbito característica facial é do tipo estreito e alto, e o
dorsal. clima, desfavorável, ocorre aumento na incidência
de respiradores orais. “Existem mais respiradores orais
Predisposição (passagem aérea estreita) por acre na Inglaterra que em qualquer outro país”
A passagem aérea superior consiste em duas porções: (Osler, citado por Brash).
a nasal e a nasofaringe. Estas se conectam com a
via aérea inferior (árvore traqueobronquial e alvéolos Rinite Crônica e Sinusite
terminais dos pulmões, laringe). As passagens estreitas As rinites são extremamente comuns e foram
são mais facilmente ocluídas pelas obstruções nasais. apontadas como uma sensibilidade da mucosa, em
Isto explica porque a respiração oral ocorre com clima seco e ar contaminado de partículas. Estes
mais freqüência em dolicocefalos, ectomofos, nos insultos repetidos, inevitavelmente rompem as defesas
quais o espaço faríngeo é normalmente alto, mas nasais, que resultam em congestão crônica e
muito estreito (Poncher, Schour e Massler). ocorrência de infecção. Se estabelece um círculo
vicioso e a respiração oral torna-se inevitável,
Brash sugere que as adenóides sejam conseqüência
resultando em congestão crônica.
da fala de espaço na nasofaringe. Linder, Aronson
e Backstom, citados por Watson e colaboradores,
Rinite Atrófica
estudaram as dimensões faciais nasais e orais e
encontraram que crianças altas com faces estreitas e A atrofia da mucosa nasal ocorre ocasionalmente,
palatos ogivais apresentam menor resistência nasal resultando que, embora a passagem aérea nasal se
que as baixas, com face largas e palatos amplos. apresente aumentada, o estímulo reflexo pelo ar ou
Holick relacionou, através de exames teleradio- por via nervosa está perdido. Sobrevém a respiração
gráficos, relação entre a respiração oral e oral.
desenvolvimento da musculatura oral, especialmente
Atresia Congênita das Coanas
os músculos da língua.
Ocasionalmente, as coanas posteriores estão cobertas
Condições climáticas por uma membrana que oclui completamente a
passagem aérea nasal. Isto ocorre raramente.
As fossas nasais modificam o estado higrométrico e
térmico do ar. A temperatura e a velocidade do ar
Hábito Residual
variando, a mucosa nasal é capaz de modificar a
quantidade de secreção, devido a sua inervação Não deve ser confundido com a criança que, embora
vegetativa. Conhece-se bem as modificações respirando pelo nariz, mantém a boca aberta. Este
circulatórias por alterações térmicas. Quando o ar é hábito pode persistir após a remoção da causa
úmido e frio, o nariz aumenta as anfractuosidades, mecânica de obstrução ou, então, ser um hábito que
com isto, o ar se aquece e se depura melhor, se transformou em vício.
enquanto que com ar seco e quente os cornetos
diminuem de tamanho. Imitação

Assim, quando o indivíduo passa de um ambiente É uma característica muito comum na personalidade
quente para o frio, o nariz aumenta as de algumas crianças.
anfractuosidades, produz-se ingurgitação,
aumentando a secreção que, quando exagerada, Hábito de Manter a Boca Aberta
termina em coriza. Concluímos, então, que o ar A respiração nasal é o primeiro instinto da criança.
quente e seco de locais superaquecidos, durante Muitas crianças que mantêm a boca aberta

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 117


Prática Pediátrica - A visão do especialista
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habitualmente, na realidade, não estão respirando Alterações otorrinolaringológicas


pela boca. Este hábito pode levar à respiração oral, • Rinite.
por ser esta posição mais fácil de respirar que pelo
• Faringite.
nariz.
• Fonação alterada.
Posição de Dormir • Otites.
A posição da cabeça voltada para trás mantém os • Deglutição atípica.
músculos abaixados da mandíbula tensos e a boca • Audição diminuída.
aberta, contribuindo para a instalação da respiração • Nariz deprimido.
oral.

Alterações Esqueléticas e Musculotorácicas


Outras
• Tórax carenatum.
Podem ocorrer causas combinadas onde a
complexidade terapêutica é maior. • Tórax excavatum.
• Tórax plano.
• Tórax enfisematoso.
SINAIS E SINTOMAS
• Tórax inspiratório.
DECORRENTES DA
• Ombros propulsados e caídos.
RESPIRAÇÃO ORAL
• Escápulas aladas.
Alteração dentamaxilofaciais (musculares e
• Alterações raquideanas.
esqueléticas)
• Cifose.
• Protrusão dentária.
• Lordose.
• Apinhamento dentário.
• Escoliose.
• Endognatia.
• Assimetrias pélvicas.
• Infra-oclusão.
• Hipotonias.
• Supraoclusão.
• Trabalho muscular inadequado.
• Músculos depressores aumentado em comprimento.
• Ventre proeminente.
• Músculos elevadores diminuídos em comprimento.
• Pés planos.
• Distância subnasal, gnátion maior que subnasal ofrion.
• Sulco nasogeniano borrado.
Alterações Psíquicas
• Lábio superior curto e atônico.
• Distúrbios de conduta.
• Lábio inferior grosso e pendente.
• Distúrbios de escolaridade.
• Mordida aberta.
• Sobreproteção.
• Incisivos superiores fraturados (quedas freqüentes).
• Sono inquieto.
• Palato ogival.
• Enurese noturna.
• Gengivite.
• Aprosexia (falta de concentração).
• Fluxo salivar alterado.
• Cáries dentárias.
Alterações do aparelho digestivo
• Gustação alterada.
• Aerofagia.
• Processos alveolares verticalmente desenvolvidos.
• Curva de oclusão acentuada.
Alterações do Metabolismo Geral
• Alteração de olfato.
• Emagrecimento.
• Pômulos achatados. • Insuficiência glandulares.
• Ronco. • Crescimento diminuído e retardado.

118 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica - A visão do especialista
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Alterações do Aparelho Ocular 18 - GRABER, T.M. et al: Ortopedia dentofacial versus


ortodontia. Trib. Odont. Buenos Aires, 55(13):70,1971.
• Obstrução do canal lacrimal.
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São Paulo, Sarvier, 1970. 7.ed. São Paulo, Procienx, p. 328, 1963.

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56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 119


Prática Pediátrica - A visão do especialista
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120 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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Artrites Agudas
MARIA ODETE ESTEVES HILÁRIO

INTRODUÇÃO ARTRITE SÉPTICA (AS)

A artrite aguda é caracterizada por um processo A artrite séptica constitui-se em uma urgência
inflamatório (dor, calor, rubor e edema) ao nível reumatológica e deve ser precocemente diagnosticada
articular, com duração de dias a poucas semanas. e tratada. É uma patologia que acomete qualquer
Esta manifestação faz parte do espectro clínico de articulação, podendo determinar danos anatômicos
uma infinidade de doenças, muitas das quais não irreversíveis, principalmente quando seu diagnóstico
são diagnosticadas devido à fugacidade de seu é retardado. Ocorre em qualquer idade, mas é
quadro clínico e limitação laboratorial. Entretanto, principalmente observada em recém-nascidos,
algumas causas de artrite aguda devem ser lembradas lactentes e crianças menores de dois anos de idade,
e afastadas pelo pediatra ou reumatologista após um quadro de infecção de pele ou de vias
pediátrico, em virtude da necessidade de diagnóstico aéreas superiores.
precoce e tratamento adequado, os quais estão O quadril é a articulação mais acometida, seguido
diretamente relacionados ao bom prognóstico de pelo joelho e cotovelo. A AS apresenta-se geralmente
algumas dessas doenças. Deste modo, poderemos como monoartrite, porém duas ou mais articulações
ainda evitar que a criança seja submetida a podem estar envolvidas. O quadro clínico instala-se
tratamentos errôneos, como também a investigações rapidamente e é exuberante, com a presença de
invasivas desnecessárias. febre e queda do estado geral, manifestações estas
que poderão estar ausentes na fase inicial de alguns
casos. Ao exame articular observamos aumento de
TRAUMA
volume da articulação, dor intensa com limitação
O trauma é provavelmente a causa mais freqüente funcional, além de calor e rubor.
de monoartrite aguda em crianças na fase escolar e
O diagnóstico impõe-se principalmente nas crianças
adolescentes. O aumento da articulação pode ocorrer
com monoartrite e deverá ser confirmado através da
minutos após o trauma e é devido à hemorragia
punção articular (artrocentese) para análise do líquido
intra-articular ou fraturas. Havendo estiramento ou
sinovial. Na AS o líquido geralmente é purulento,
ruptura de componentes da articulação, o
tem intensa celularidade ( >50.000/mm3), os níveis
aparecimento de derrame pode levar algumas horas
de glicose estão diminuídos e são visualizadas
ou até mesmo alguns dias. Em nosso meio, o pediatra
bactérias com a coloração pelo Gram. É obrigatória
deve estar atento aos casos de maus-tratos a crianças,
a realização de cultura em meios apropriados
que, infelizmente, estão se tornando cada vez mais
(aeróbios e anaeróbios), que é positiva em cerca de
freqüentes. Nestas situações o exame radiológico
70% dos casos. No hemograma encontramos
pode ser útil, revelando múltiplas fraturas, em diferentes
leucocitose em desvio para a esquerda e a
fases de consolidação.
velocidade de hemossedimentação (VHS) geralmente
está aumentada.
ARTRITE INFECCIOSA
ARTRITE FÚNGICA (AF)
É um processo articular inflamatório caracterizado
pela presença de um agente etiológico na cavidade A artrite fúngica é rara na infância, quase não sendo
articular. observada no período neonatal. A artrite por Candida,

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 121


Cardiologia e Reumatologia
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geralmente com osteomielite, é uma entidade ARTRITE REATIVA A OUTRAS BACTÉRIAS


reconhecida no recém-nascido imunocomprometido. Excluindo-se a FR, são raras as artrites reativas a
O quadro clínico mais comum da AF é o de infecções bacterianas na infância. Destacam-se entre
monoartrite, podendo evoluir para artrite crônica, estas quatro patógenos entéricos, que potencialmente
simulando a artrite reumatóide juvenil (ARJ). O podem levar ao comprometimento articular pós-enterite
diagnóstico é feito com o auxílio da biópsia sinovial. infecciosa: Shigellla flexneri, Campylobacter jejuni,
Yersinia enterocolitica e Salmonella species.
ARTRITE TUBERCULOSA (AT) Nestes casos, a artrite pode durar de semanas a
Tipicamente, a artrite tuberculosa apresenta-se como poucos meses, afeta geralmente poucas articulações
uma monoartrite pouco dolorosa. Ocorre com e caracteriza-se por dor intensa. As provas de
freqüência em coluna, coxofemural ou joelho, podendo atividade estão geralmente alteradas. O diagnóstico
levar à destruição da articulação e dos ossos é geralmente difícil e baseia-se em uma história clínica
adjacentes. Embora a AT seja geralmente crônica ela detalhada, ausência de patógenos no líquido sinovial
deve ser lembrada em qualquer paciente, devido à e pesquisa cuidadosa das bactérias nas fezes.
alta prevalência da doença em nosso meio.A
epidemiologia é muito importante para o diagnóstico ARTRITE REATIVA A PARASITAS INTESTINAIS
e a má resposta da artrite aos antiinflamatórios deve
Além dos sintomas gastrintestinais habituais, os parasitas
chamar a atenção do clínico para esta possibilidade.
intestinais (Strongyloides stercoralis, Giardia lamblia,
entamoeba histolytica, Ascaris lumbricoides,
Ancylostoma duodenais, Taenia sp e Schistosoma
ARTRITES REATIVA S mansoni) podem ser responsáveis por manifestações
A artrite reativa é um processo inflamatório articular em outros locais. Acredita-se que as alterações
causado, provavelmente, por reação imunológica a articulares não sejam tão raras quanto se imaginava
uma infecção conhecida ou suspeitada, na qual não e que na verdade o que existe é um subdiagnóstico
se consegue isolar o agente etiológico no espaço desta condição. A resposta aos anti-inflamatórios não
articular. Esta infecção é geralmente de vias aéreas é boa, sendo necessário o uso de anti-helmínticos.
superiores, trato gastrointestinal ou geniturinário.

HEMOGLOBINOPATIAS
ARTRITE REATIVA A VÍRUS
As artrites reativas a vírus são mais freqüentes em As hemoglobinopatias, entre elas a doença falciforme
adultos, porém podem ser encontradas em e a talassemia, podem desencadear sintomas ósteo-
adolescentes. Um exemplo clássico de artrite reativa articulares por vários mecanismos, como a isquemia
à infecção viral é o da hepatite B, na qual são por fenômenos trombo-oclusivos e a proliferação
encontrados imunocomplexos circulantes que estariam intensa da medula óssea.
envolvidos na patogenia do quadro articular.
Os pacientes com quadro articular reativo a vírus DOENÇA FALCIFORME (DF)
geralmente apresentam artrite de caráter fugaz e As manifestações ósteo-articulares são freqüentes na
que não deixa seqüelas. As provas de atividade DF, sendo causadas, principalmente, por fenômenos
inflamatória poderão estar normais. trombo-oclusivos e osteomielite secundária. Podem
se apresentar como dor óssea intensa, síndrome mão-
FEBRE REUMÁTICA (FR) pé (em lactentes) ou poliartrite migratória. Esta última,
Entre os critérios de Jones, a artrite é o menos quando associada à anemia leve e sopro cardíaco,
específico e, portanto, o de mais difícil diagnóstico. constitui-se em um importante diagnóstico diferencial
Ela é geralmente aguda, fugaz, habitualmente para a febre reumática.
migratória, podendo ser aditiva e afetando, em
especial, as grandes articulações dos membros HEMOFILIA
inferiores. Tem ainda como características a dor A hemorragia intra-articular (hemartrose) recorrente é
intensa, geralmente limitando a deambulação, poucos um achado típico da hemofilia A (deficiência, no
sinais inflamatórios e a boa resposta aos salicilatos. plasma, da atividade coagulante do fator VIII) e é

122 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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uma das causas mais importantes de morbidade da sua evolução. Na maioria das vezes a dor é difusa,
doença. A freqüência de hemartrose está diretamente em ossos longos, preferencialmente nas regiões
relacionada ao grau de atividade do fator VIII e metafisárias. Algumas vezes há artralgia e/ou artrite,
geralmente é desencadeada por trauma. Embora ela principalmente em grandes ar ticulações,
seja mais freqüente a partir do segundo ano de especialmente nos joelhos. O número de articulações
vida, poderá ocorrer mesmo antes que a criança acometidas normalmente é pequeno. A artrite pode
comece a andar. As articulações mais acometidas ter caráter migratório e agudo, simulando a da
são os joelhos, cotovelos, tornozelos, ombros e coxo- febre reumática ou aditivo e crônico, mimetizando
femurais. Este fenômeno é geralmente transitório; a da artrite reumatóide juvenil. Muitas vezes o
entretanto, a sua repetição por traumas sucessivos diagnóstico diferencial é difícil. No entanto, alguns
poderá levar à destruição articular. achados clínicos como anemia importante e dor
articular ou óssea noturna, intensa e desproporcional
aos sinais flogísticos devem chamar a atenção do
DOENÇAS LINFOPROLIFERATIVAS pediatra.

O primeiro diagnóstico a ser considerado em uma LINFOMA


criança com dor ósteo-articular, principalmente se
O comprometimento ósteo-articular é pouco freqüente
houver recusa em andar, é o de doença linfo-
nos linfomas e, quando ocorre, é geralmente por
proliferativa.
contigüidade da massa tumoral. Observa-se nas
crianças um maior comprometimento ósseo em
LEUCEMIA
relação aos adultos, provavelmente devido à maior
A leucemia é a doença neoplásica mais freqüente freqüência de casos graves nesta faixa etária.
na infância e a que causa dor ósteo-articular com Clinicamente, encontramos dor óssea e ao exame
maior freqüência, tanto no seu início quanto durante radiológico podem ser evidenciadas lesões líticas.

Febre Reumática
MARGARIDA DE FÁTIMA FERNANDES CARVALHO

INTRODUÇÃO EPIDEMIOLOGIA
A febre reumática (FR) é a conectivopatia mais comum Aproximadamente 3% dos pacientes com infecções
da infância, sendo a principal causa de cardiopatia estreptocócicas de vias aéreas superiores não tratados
adquirida em nosso meio na criança e no adulto desenvolvem a FR. Destes, até 30% evoluem com a
jovem. forma grave da doença, a cardite reumática.

Afeta ambos os sexos, podendo aparecer em Embora sua incidência, prevalência, número de
qualquer idade, porém com maior incidência entre recorrências e gravidade tenham decrescido nos
cinco e quinze anos de idade. Apresenta grande últimos anos em alguns países da Europa e nos
tendência a recidivas. Estados Unidos, a FR continua sendo um importante
problema de saúde pública em países pouco
A manifestação clínica mais freqüente é a artrite e a desenvolvidos e o Brasil ocupa o 12º lugar em
mais grave é a cardite. incidência da doença.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 123


Cardiologia e Reumatologia
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ETIOLOGIA e de ordem clínica (febre, artralgia ou história de


febre reumática prévia) ou laboratoriais (leucocitose,
Evidências epidemiológicas, clínicas e sorológicas
aumento da velocidade de hemossedimentação e
provam que o estreptococo β hemolítico do grupo A
aumento do espaço PR no eletrocardiograma).
é o agente causador da FR que, no entanto, nunca
foi encontrado nos tecidos lesados. ➣ Sintomas gerais
Nem todos os estreptococos estão implicados na Febre alta (superior a 39ºC) é comum acompanhando
etiologia da febre reumática. Dos 70 ou mais a artrite e a cardite. Melhora rapidamente com
sorotipos M de estreptococos do grupo A, antiinflamatórios como a aspirina, por exemplo. Dor
aproximadamente uns 20 estão associados com abdominal e epistaxe são inespecíficas. No entanto,
epidemias da doença. O M5 é o sorotipo que mais suas presenças obrigam a suspeitar da possibilidade
se relaciona a essas epidemias nos Estados Unidos. de um novo surto num paciente que já tenha o
Outros sorotipos reumatogênicos freqüentes são: M1, diagnóstico de FR.
M5, M3, M6, M14, M18, M19 e o M24.
➣ Artrite
É a manifestação mais freqüente da FR e a poliartrite
PATOGENIA migratória de grandes articulações, de curta duração
(máximo 10 dias), extremamente dolorosa constitui a
O mecanismo que desencadeia a febre reumática forma clássica de apresentação da doença. No
ainda é desconhecido, mas várias teorias têm sido entanto, quadros articulares atípicos, como artrite
formuladas. Fatores ambientais, socioeconômicos e, aditiva, de duração mais prolongada,
principalmente, genéticos parecem ter importância comprometimento de pequenas articulações, das
fundamental na compreensão de como apenas uma ênteses e das colunas lombar e cervical também
parte da população acometida pela infecção podem ser encontradas dificultando o diagnóstico,
estreptocócica em orofaringe consiga desenvolver a que muitas vezes somente será feito quando a artrite
doença. estiver acompanhada de outras manifestações clínicas
A teoria mais amplamente aceita é a auto-imune, como a coréia ou a cardite.
que sugere que as lesões nos diversos órgãos e A artrite desaparece 12 a 48 horas após a
tecidos acometidos pela doença sejam causadas introdução de antiinflamatórios e sua cura ocorre
pelos anticorpos que o próprio organismo produz sem seqüelas, exceto na síndrome de Jaccoud, uma
como resposta à infecção estreptocócica através de fibrosite periarticular, sem sinovite, caracterizada por
similaridade antigênica entre componentes teciduais desvio ulnar e subluxação das articulações
do hospedeiro e o estreptococo. metacarpofalangeanas que pode ocorrer após surtos
repetidos de FR.

CLÍNICA ➣ Cardite

O diagnóstico de FR é fundamentalmente clínico e É a manifestação mais importante pois dita o


deve sempre ser lembrado entre outras causas de prognóstico da doença.
artrites, principalmente em crianças em idade escolar O miocárdio, o endocárdio e o pericárdio podem
que se apresentem com febre e com manifestações estar afetados isoladamente ou de forma conjunta
articulares, desde que precedida por um episódio (pancardite). É precoce, manifestando-se nas três ou
de faringoamigdalite (mesmo assintomática) pelo quatro primeiras semanas da doença. Taquicardia e
estreptococo em vias aéreas superiores (o impetigo sopros são sinais de envolvimento miocárdico e
estreptocócico não desencadeia a doença). endocárdico respectivamente. A pericardite é a
Após um período de latência assintomático de uma manifestação menos freqüente, raramente evoluindo
a três semanas, aparece um quadro clínico complexo para o tamponamento cardíaco.
no qual a artrite, a cardite, a coréia, o eritema Nas fases mais tardias, as valvas deformadas levam
marginado e os nódulos subcutâneos aparecem a insuficiências ou a estenoses valvares. A valva
como as principais manifestações. As alterações mais afetada é a mitral, seguida da aórtica e da
secundárias da febre reumática são menos específicas tricúspide.

124 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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A insuficiência cardíaca congestiva é rara nos surtos A cultura de orofaringe raramente é positiva, devido
iniciais, aparecendo principalmente nos pacientes ao tempo decorrido entre o início da infecção e a
gravemente comprometidos. coleta. Elevação dos títulos séricos de ASLO são
encontrados em pelo menos 80% dos pacientes com
➣ Coréia FR. Quando os títulos iniciais de ASLO não estiverem
A coréia reumática ou de Sydenham aparece após aumentados, recomenda-se a repetição do exame
um período de latência maior do que o observado em duas a três semanas, pela possibilidade de se
na cardite e na artrite (3-6 meses). Caracteriza-se detectar ascensão dos valores prévios. Outros
por movimentos incoordenados, involuntários, anticorpos antiestreptocócicos como a antiDNAse B
predominando nos segmentos distais das e a anti-hialuronidase, estão aumentadas em, pelo
extremidades, na face e na língua que se menos, um dos dois testes, em 90% dos pacientes.
acompanham com hipotonia muscular e labilidade Alterações eletrocardiográficas como bloqueio átrio
emocional. Tem como principal característica o seu ventricular de primeiro, segundo e terceiro graus,
desaparecimento com o sono. É patognomônica da ritmo nodal, extra-sístoles, sobrecarga ventricular
FR, podendo ser usada como critério isolado para o esquerda e fibrilação atrial podem ser observadas
diagnóstico da doença. A duração desses sintomas durante o curso da cardiopatia reumática.
varia de quatro a oito semanas. Alargamento do espaço PR e extra-sístoles também
podem ser encontrados em crianças sem cardite.
➣ Eritema marginado
Erupção cutânea plana e indolor com uma região Em algumas crianças com cardite observa-se
central mais pálida que desaparece com a pressão, cardiomegalia no RX de tórax.
não pruriginosa, fugaz, que ocorre no tronco e nas O ecocardiograma deve ser solicitado sempre que
extremidades e frequentemente está associado à possível a todos os pacientes com diagnóstico de FR
cardite. Pode ser isolada ou coalescente formando para detecção precoce de lesões valvares.
um padrão serpiginoso e aparecendo em caráter
O estudo hemodinâmico deve ser reservado aos
intermitente por vários meses.
casos com comprometimento cardíaco mais
➣ Nódulos subcutâneos significativo, de acordo com a orientação do
cardiologista pediátrico.
Ocorrem nas superfícies extensoras de joelhos, cotovelos,
tornozelos, no occípcio e nos processos espinhosos
das vértebras torácicas e lombares. Têm consistência
DIAGNÓSTICO
firme e podem ou não ser dolorosos. São raros,
persistindo por mais de quatro semanas e geralmente Os critérios de Jones modificados combinando
estão associados à cardite e ao eritema marginado. manifestações clínicas e laboratoriais (presença de
dois sinais maiores ou de um sinal maior e dois
menores) aliados à evidência de estreptococcia
EXAMES LABORATORIAIS anterior são importantes e devem sempre ser utilizados
como um guia no diagnóstico da FR (quadro 1).
E MÉTODOS DE IMAGEM
Os exames laboratoriais na FR têm por finalidade
demonstrar a reação inflamatória aguda, evidenciar DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
a infecção estreptocócica anterior e auxiliar na
O diagnóstico diferencial deve ser evocado em todos
exclusão de outras doenças.
os pacientes que apresentem manifestações mono
Leucocitose, anemia, elevação da proteína C reativa, ou poliarticulares, inflamatórias ou álgicas, que
das α-2 globulinas, da α-1 glicoproteína ácida e da preencham ou não os critérios de Jones, nos quais
velocidade de hemossedimentação são comuns em também devem ser afastadas outras doenças
doenças inflamatórias como a FR. A exceção é a inflamatórias da infância que cursam com
coréia como manifestação isolada da doença, onde manifestações osteoarticulares como a artrite
o indicadores de processo inflamatório podem estar reumatóide juvenil, o lúpus eritematoso sistêmico, as
ausentes. artrites pós infecciosas, a doença de Lyme, a

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 125


Cardiologia e Reumatologia
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Quadro 1 - Critérios de Jones modificados para o diagnóstico de febre reumática

CRITÉRIOS MAIORES CRITÉRIOS MENORES

cardite* febre
poliartrite** artralgia**
eritema marginado elevação proteínas fase aguda (VHS***PCRr***, mucoproteínas)
coréia de Sydenham alargamento de PR no ECG*
nódulos subcutâneos febre reumática anterior

*Cardite como sinal major exclui alargamento de PR no ECG como sinal minor
**Poliartrite como sinal major exclui artralgia como sinal minor
***VHS = velocidade de hemossedimentação; ***PCR= proteína C reativa;

*ECG= eletrocardiograma

Evidência de infecção estreptocócica recente é obrigatória para o diagnóstico de FR (aumento de ASLO ou outros
anticorpos antiestreptocócicos ou cultura positiva para estreptococo do grupo A em orofaringe ou escarlatina recente)

Diagnóstico: 2 critérios maiores ou 1 maior e 2 menores.

Exceções: Coréia de Sydenham (patognomônica de FR) e evidências de cardiopatia insidiosa ou tardia, sem outra
explicação.

endocardite infecciosa, a anemia falciforme, a As cáries dentárias devem ser evitadas ou tratadas
leucemia linfoblástica aguda e o neuroblastoma. e a higienização de escovas de dentes e aparelhos
ortodônticos deve ser rigorosa pois esses objetos
podem servir de meios de cultura para o
TRATAMENTO estreptococo.

O tratamento baseia-se na administração de A profilaxia da endocardite bacteriana deve ser


antiinflamatórios hormonais ou não hormonais, realizada nas crianças com seqüela valvar submetidas
antibióticos (erradicação e prevenção) e orientação a cirurgias odontológicas, de vias aéreas superiores
quanto ao repouso. Uma vez controlada a fase aguda e a procedimentos endoscópicos. Infecções em outros
da doença, a prevenção de possíveis recorrências é focos como pele e trato geniturinário também devem
fundamental. ser erradicadas precocemente nas crianças com
comprometimento cardíaco.
O repouso varia de duas semanas (em crianças sem
cardite) a seis semanas ou mais (naquelas com
cardite), especialmente quando acompanhada de
insuficiência cardíaca, nas quais devem ser EVOLUÇÃO E PROGNÓSTICO
consideradas a necessidade de digitalização,
O curso, a duração e o prognóstico de um surto de
restrição hídrica, diuréticos e oxigenoterapia.
febre reumática aguda é muito variável, estando
A abordagem esquemática da terapêutica das relacionado com a intensidade do surto e se há ou
manifestações clínicas – artrite, cardite e coréia de não comprometimento cardíaco. Geralmente, o tempo
Sydenham - estão resumidas no quadro 2. médio de duração de um surto é de um a três meses
podendo chegar a seis meses nos pacientes com
Durante o XXX Congresso Brasileiro de Pediatria,
coréia. As recorrências ocorrem principalmente nos
realizado no Rio de Janeiro, em outubro de 1997,
cinco anos que se seguem ao primeiro surto.
foi realizado um Consenso para debater sobre as
profilaxias primária e secundária da FR. O novo Pesquisadores nacionais e americanos têm
protocolo para as profilaxias e o tempo de tratamento demonstrado a correlação entre distúrbios obses-
estão representados nos quadros 3, 4 e 5. sivo-compulsivos e infecções estreptocócicas,

126 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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Quadro 2 - Abordagem terapêutica das principais manifestações clínicas

Aspirina - 90 - 100 mg/Kg/dia VO 6/6 h por duas semanas, com redução progressiva em
ARTRITE quatro a seis semanas
Melhora é rápida, ocorrendo em no máximo 48 horas após a introdução do antiinflamatório
Dose máxima: 3 a 4 g/dia
Prednisona 1 - 2 mg/Kg/dia VO (não ultrapassar 60 mg/dia) 6/6h ou
CARDITE

de 8/8h durante 10 - 14 dias até melhora clínica


Passar para dose única matinal, iniciando a redução,
até a retirada completa em 8 - 12 semanas
Haloperidol iniciar com 2 mg VO/dia 12/12h. Após 72h se não houver
melhora, aumentar 1mg/dia até 4 - 6 mg/dia Cautela com
sinais de impregnação
CORÉIA

Ácido valpróico 20 - 40 mg/Kg/dia VO 6/6h ou 8/8h


Clorpromazina 1 - 3 mg/Kg/dia VO 6/6h ou 8/8h
Fenobarbital 5 - 7 mg/Kg/dia VO 6/6h ou 8/8h
Tempo terapêutico Aproximadamente 3 meses

Quadro 3 - Profilaxia primária - erradicacão do estreptococo

Penicilina benzatina - em dose única IM


1ª escolha crianças < 25Kg - 600.000 U
crianças > 25 Kg - 1.200.000 U
DROGAS

2ª escolha Penicilina V-50.000 U/Kg/dia VO 6/6 h


Alergia a penicilina estereato de eritromicina - 40 mg/Kg/dia por 10 dias
(não se recomenda a (dose máxima 1 g/dia)
realização de testes cefalosporinas - 10 dias
cutâneos ou oculares azitromicina - em pacientes > 16 anos por 5 dias
com penicilina) (1g no 1º dia + 500mg/dia, dose única diária, por mais 4 dias)

Não é recomendado o uso de SULFAS, TETRACICLINAS e CLORANFENICOL

Quadro 4 - Profilaxia Secundária - prevenção de novos surtos

1ª escolha Penicilina benzatina – 21/21 dias IM


crianças < 25Kg - 600.000 U
crianças > 25 Kg - 1.200.000 U
2ª escolha Penicilina V
200.000 U VO 2x/dia <25 Kg
DROGAS

500.000 U VO 2x/dia >25 Kg 50.000 U/Kg/dia


estereato de eritromicina
250 mg 2x/dia - crianças < 25 Kg
Alergia à penicilina 500 mg 2x/dia - crianças > 25 Kg
(medicamentos de uso Monitorar provas de função hepática nos primeiros seis meses.
diário e por todo o ou
tempo de tratamento) sulfadiazina
250 mg VO 2x/dia < 25 Kg
500 mg VO 2x/dia > 25 Kg

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 127


Cardiologia e Reumatologia
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Quadro 5 - Tempo de tratamento

Forma articular pura até os 18 anos* ou no mínimo cinco anos


Ou consecutivos de profilaxia
Coréia pura

Pacientes com risco profissional: tratamento pelo tempo da permanência do contato


pessoas que têm contato direto com estreptococcias
como as professoras primárias, profissionais da
saúde ou indivíduos que trabalhem com crianças
na faixa etária escolar

Pacientes que estiverem fazendo Serviço Militar manter o tratamento até o término do serviço

Cardite por toda a vida


por orientação da OMS aqueles com episódio
único e sem seqüelas valvares - até os 25 anos

*Após os 18anos - o intervalo entre as doses poderá ser ampliado na dependência, sobretudo, do tipo de
atividade exercida pelo paciente como trabalho em hospitais, escolas e outros locais com alto risco de
contaminação

principalmente nos pacientes que apresentaram coréia incentivo à profilaxia primária do estreptococo e a
na infância ou na adolescência, o que reforça a facilitação do acesso do paciente com FR aos serviços
importância das profilaxias primária e secundária do de saúde para a administração de penicilina benzatina
estreptococo. O grupo de estudo americano criou para a profilaxia secundária da doença, cursos
um nome bastante peculiar para esses distúrbios – itinerantes de atualização para a classe médica, além
PANDAS (pediatric autoimmune neuropsychiatric da criação de campanhas educacionais para a
disorders associated with streptococcal infections). população, visando a diminuição e, talvez um dia, a
sua erradicação da doença em nosso país.
Até o momento não existe vacina antiestreptocócica.
A prevenção da FR deve ser feita pelo uso
sistemático de penicilina benzatina ou V para o
Bibliografia
tratamento de todas as anginas agudas sintomáticas,
01 - Brook I, Gober AE. Persistence of group A beta-hemolytic
principalmente em indivíduos com baixas condições streptococci in toothbrushes and removable orthodontic
socioeconômicas. appliances following treatment of pharyngotonsillitis. Arch
Otol & Neck Surg. 1998; 124: 993-995.
No Brasil, a cardiopatia reumática crônica é 02 - Feldman T. Rheumatic heart disease. Curr Op Cardiol
considerada uma das doenças de maiores custos para 1996; 11: 126-130.
o Sistema Previdenciário. Anualmente, segundo dados 03 - Guilherme L, Weidebach W, Kiss MHB et al. Association
do Ministério da Saúde, são realizadas 10.000 of human leukocyte class II antigens with rheumatic fever
or rheumatic heart disease in a Brazilian population.
correções valvares o que corresponde a 30% das Circulation 1991; 83: 1995-98.
cirurgias cardíacas realizadas no país. Esse percentual 04 - Snitcowsky R. Rheumatic fever prevention in industrializing
pode elevar-se até 90% quando observadas as countries: problems and approaches. Pediatrics, 1996;
97 (supll): 996-98.
cirurgias cardíacas realizadas em crianças.
05 - Stollerman, GH. Rheumatic fever. Lancet 1997; 349:
Desde 1997, reumatologistas pediátricos de todo o 935-42.
Brasil e representantes do Ministério da Saúde 06 - Guilherme L, Cunha-Neto E, Coelho V, Snitcowsky, R et
constituíram um grupo de trabalho que tem como al.: Human-infiltrating T cell clones from rheumatic heart
disease patients recognize both streptococcal and cardiac
principais objetivos o diagnóstico da real situação da proteins. Circulation 1995; 92: 415-20.
doença no nosso meio, o reconhecimento dos locais 07 - Markowitz M. Rheumatic Fever-A Half-Century Perspective.
de maior incidência e dos sorotipos prevalentes, Pediatrics 1998: 102(1S): 272-4.

128 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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Avanços no Tratamento da
Insuficiência Cardíaca Congestiva
ANTÔNIO CARLOS DE CAMARGO CARVALHO

O tratamento da insuficiência cardíaca congestiva nestes casos o retorno, com tratamento, aos níveis
(ICC) dependeu, por muitos anos, da utilização de normais de neurohormônios, é associado a um melhor
digital e diuréticos e também do conceito de prognóstico. Finalmente, também ficou evidente que
tratamento da ICC como decorrente de uma falência há substâncias vasodilatadoras secretadas pelo
da bomba, no caso um ou ambos os ventrículos. organismo na tentativa de combater o
desenvolvimento de ICC e que estas substâncias
Ambos os conceitos mudaram radicalmente. Hoje
(bradicinina, fator natriurético atrial, prostaglandinas),
temos uma variedade muito maior de opções
embora superadas pela noradrenalina e congêneres
terapêuticas, empregando diversas formas de
nos estados de ICC, constituem excelente fonte de
medicamentos. Além disso, as alterações
pesquisa terapêutica para o futuro.
neurohumorais passaram a ser extremamente
valorizadas e têm sido responsáveis pelo Houve portanto nos últimos anos uma ênfase em
encaminhamento das soluções terapêuticas hoje utilizar um conjunto de medicamentos sem depender,
existentes. como acontecia previamente, de apenas um ou
O que não mudou e não vai mudar é o diagnóstico dois compostos. Faz parte hoje da rotina de
clínico de ICC. O reconhecimento de ICC passa tratamento da ICC a utilização de inibidores da
por reconhecimento do quadro de taquicardia e enzima de conversão da angiotensina e a
taquipnéia (que são inespecíficos), além de espironolactona. Estão começando a ser utilizados
hepatomegalia. Não se deve esperar pela presença os beta bloqueadores e os inibidores do
de estase jugular, sopros (ajudam só quando angiotensinogênio.
presentes), estertores e edema. Os inibidores da ECA diminuem a produção de
Em neonatos e lactentes é ainda imperativo angiotensina, diminuindo a vasoconstrição e fatores
reconhecer o quadro clínico de baixo débito cardíaco de proliferação celular. Seus efeitos em diminuir pré
em que a criança apresenta, às vezes em poucas e pós-carga facilitam o esvaziamento ventricular. Deve
horas, quadro de irritação, gemência, palidez, pulsos ser iniciado com dose pequena para não provocar
finos e entra em choque com grave acidose hipotensão arterial na primeira dosagem. Entre seus
metabólica, evoluindo para óbito rapidamente. Este efeitos colaterais destacamos ainda tosse seca,
quadro, que se confunde com sepsis, é usualmente incoercível, que desaparece em poucos dias com a
decorrente de lesões obstrutivas críticas e miocardites retirada do medicamento. Pode ocorrer também hiper-
fulminantes, por exemplo. potassemia e aumento da creatinina. O medicamento
mais utilizado é o captopril na dosagem de 0.5 a
Estudos desenvolvidos em adultos envolvendo milhares
2.0 mg/kg/dia, dividido em três a quatro tomadas.
de pessoas deixam claro, de forma indiscutível, que
há uma nítida piora de sobrevida em pessoas com A espironolactona é um diurético poupador de
elevações neurohumorais do tipo aumento de potássio e potência não exagerada. Possui ação
noradrenalina circulante, além de renina, anti aldosterona eficaz. Em adultos o estudo Rales
angiotensina, aldosterona. Mais ainda, demonstraram demonstrou de forma categórica a melhora de
que a diminuição dos níveis destes hormônios, após alterações neuro humorais após a utilização de
tratamento, era associada com queda importante de espironolactona, com aumento significante na
mortalidade. Além disso, ficou muito claro que existe sobrevida destes pacientes, mesmo já estando em
uma fase pré ICC clínica, em que já existe disfunção uso de digital, diuréticos e inibidores da ECA. Em
ventricular e aumento hormonal, implicando uma crianças é utilizado na dosagem de 1 a 2 mg/kg/
situação de falência em desenvolvimento. Também dia, divididos em duas tomadas, após as refeições.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 129


Cardiologia e Reumatologia
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Mais recentemente, em 1997 e 1998, também em da hipotensão inicial pode ocorrer extrasístoles. Em
adultos, o uso de beta bloqueadores em alguns pacientes com insuficiência renal é necessário diminuir
estudos multicêntricos de grande porte revelou-se a dosagem de manutenção. Casos com ICC refratária
benéfico para portadores de ICC. Isto é podem ser submetidos à diálise peritonial,
aparentemente contraditório, pois os beta sempre transitoriamente, para remoção de hipervolemia. Esta
foram considerados como inotrópicos negativos e terapêutica é utilizada em situações extremas e está
em ICC habitualmente existe algum grau de falência associada com mortalidade na faixa dos 50%.
de bomba. No entanto, devido a seu efeito benéfico Além do uso de medicamentos com bases
neurohumoral, os beta bloqueadores também têm neurohumorais e de novas drogas vasoativas, os
demonstrado benefícios quando aplicado a pacientes avanços no manuseio da criança com ICC grave
com ICC. É necessário, entretanto, cautela no seu passam pelo diagnóstico não invasivo mais preciso
uso, iniciando com doses bem baixas e com o e mais precoce, por intervenções hemodinâmicas e
paciente já bem compensado de seu episódio prévio por intervenções cirúrgicas.
de ICC. Mesmo assim, em 15 a 20% dos casos há
piora transitória com o início de uso dos beta e há • O diagnóstico não invasivo hoje, principalmente
portanto necessidade de ajuste de inibidor de ECA com o ecocardiograma transtorácico com Doppler a
e diurético. O propranolol é utilizado na dosagem cores, sofreu uma revolução. Doenças que antes só
de 2 a 6 mg/kg/dia em três a quatro tomadas. Os eram diagnosticadas com estudo hemodinâmico
inibidores do angiotensinogênio são utilizados em passaram a ter seu diagnóstico feito à beira do leito
casos de intolerância ao uso de inibidores de ECA e de forma não invasiva. O eco, por ser não invasivo,
e embora pareçam promissores na terapêutica da também pode ser usado de forma seqüencial,
ICC, seu uso ainda não se encontra largamente repetitiva mesmo, propiciando uma análise adequada
difundido, com experiência mínima em crianças. da evolução de uma cardiopatia. Outros métodos
não invasivos, como a ressonância magnética,
As drogas vasoativas usuais são a Dopamina (2 a progrediram muito e hoje propiciam imagens de
15 mcg/kg/min), a Dobutamina E1 (5 a 20 mcg/ altíssima definição em três planos. A cine ressonância
kg/min), o Nitroprussiato de Sódio (0,25 a 3 mcg/ provavelmente substituirá em pouco tempo as imagens
kg/min) e a Noradrenalina (0.01 a 1.0 mcg/kg/ angiográficas convencionais que hoje empregamos.
min). Duas novas drogas são hoje importantíssimas Este diagnóstico não invasivo preciso e precoce foi
para o tratamento de cardiopatas, especialmente um grande “empurrão” para o desenvolvimento
neonatos: a Prostaglandina (Prostin), fundamental na adicional da hemodinâmica intervencionista e da
estabilização de cardiopatas canal dependente, seja cirurgia cardíaca neonatal.
pulmonar ou sistêmico-dependente. Com o Prostin
• O cateterismo intervencionista, que começou com
praticamente desapareceu a necessidade de
o balão de Rashkind para propiciar melhor mistura
intervenção de emergência, geralmente com a criança
em transposição, através da feitura de um CIA,
em acidose grave e já em pré-parada. O Prostin
progrediu muito. Hoje se consegue dilatar válvulas
é usado na dosagem de 0.025 a 0.4 mcg/kg/min
estenóticas mesmo em recém- nascidos e em estenose
e entre seus efeitos colaterais destacam-se a apnéia,
pulmonar o balão praticamente eliminou a intervenção
febre, calor local, hipotensão e convulsões.
cirúrgica. Hoje se realizam, além das dilatações,
O Milrinone (Primacor) é um inibidor da intervenções para fechar defeitos atriais, ventriculares
fosfodiesterase e tem efeito semelhante ao da e tipo canal arterial. A coarctação de aorta passou
associação entre nitroprussiato de sódio e dopamina. a ser tratada com balões e com stents. Molas e
Tem sido usado em casos de não resposta ao balões destacáveis passaram a ser empregados para
tratamento convencional, mas em alguns centros norte- oclusão de shunts ou fístulas artério-venosas e
americanos já é hoje a droga de segunda escolha fulguração ou ablação para eliminação de arritmias
para o tratamento de ICC grave. É feito um “bolus” tipo Wolff-Parkinson-White. Em síntese, atualmente
inicial de 0.05 mg/kg em 20 a 30 minutos, sendo cada vez mais o estudo hemodinâmico é empregado
muitas vezes necessária a utilização simultânea de como método terapêutico e não mais apenas
volume pela diminuição de pressão arterial que o diagnóstico. Neonatos, lactentes e crianças com ICC
Milrinone pode provocar. A seguir é utilizada uma têm portanto o potencial de poderem ser beneficiadas
infusão contínua de 0.25 a 0.5 mcg/kg/min. Além por intervenção hemodinâmica.

130 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Cardiologia e Reumatologia
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• A cirurgia cardíaca pediátrica também se esforços somados é que propiciou os resultados


desenvolveu muito e criou condições para o excelentes que hoje são alcançados com cirurgia
tratamento com sucesso de cardiopatias neonatais cardíaca pediátrica.
graves. Hoje há nos Estados Unidos e Canadá vários
centros oferecendo resultados excepcionais, com • Encerrando, gostaríamos de lembrar que o
mortalidade neonatal abaixo de 1% para correção diagnóstico etiológico é essencial em todos os casos
de Transposição, com cirurgia de Jatene. As razões que desenvolvem ICC. A terapêutica deve ser
principais que levaram a resultados tão espetaculares individualizada e a intervenção para o tratamento
passam por um melhor diagnóstico pré-operatório, do defeito deve ser programada o mais rápido
com metodologia não invasiva, maior estabilização possível para os defeitos graves. Os objetivos
pré-intervenção com o uso, por exemplo, de modernos do tratamento da ICC passam portanto
prostaglandinas, uma melhora evidente da proteção por: a) impedir a progressão da história natural da
miocárdica intra operatória, bem como de melhor doença; b) prevenir dilatação e hipertrofia importantes
técnica cirúrgica. Finalmente, houve também melhora de VE e VD; c) diminuir mortalidade e d) melhorar
no cuidado pós-operatório. A conjugação destes qualidade de vida.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 131


Cardiologia e Reumatologia
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132 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Defesa Profissional
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O Pediatra e os Convênios
MILTON MACEDO DE JESUS

A crise que se instalou no exercício profissional da I Fórum, como também tem cobrado “ações efetivas
medicina no Brasil atingiu os mais diferentes setores. e imediatas para melhorar a remuneração dos
Certamente os clínicos e os pediatras foram os mais pediatras”.
severamente atingidos.
Diversas Filiadas Estaduais realizaram reuniões
Nos últimos anos as várias entidades representativas preparatórias ao “I Fórum de Defesa Profissional da
dos médicos brasileiros têm desenvolvido numerosas SBP”. A Sociedade de Pediatria de São Paulo
ações visando melhorar as condições de trabalho e produziu o documento “Carta da SPSP”, publicada
remuneração de seus associados. A Associação na íntegra na página seguinte.
Médica Brasileira deu o primeiro e importante passo
A pesquisa “Perfil do Médico”( FIOCRUZ - CFM/
criando uma tabela de honorários médicos, com
1995) constatou que a Pediatria é a atividade que
diversas versões, culminando com a Lista de
reune o maior número de médicos no Brasil: 13,5%
Procedimentos Médicos- Valores Referenciais/1999.
dos médicos brasileiros. A mesma pesquisa detectou
Afinal, temos o direito de definir nossos honorários. que, já em 1995, 79% dos médicos mantinham
Quanto vale nossa consulta, ou melhor, nosso algum tipo de convênio em seu exercício profissional.
“Atendimento Pediátrico”? A pesquisa da SBP sobre o perfil dos pediatras
provavelmente indicará que a quase totalidade atende
O Conselho Federal de Medicina tem estado sempre
convênios.
presente.
Atualmente as cooperativas e convênios éticos
A Sociedade Brasileira de Pediatria tem incluído a
constituem o maior mercado de trabalho. Precisamos
“Defesa Profissional” nos mais diversos eventos
de assessoria jurídica competente para negociar, não
(Serões, Cursos, Congressos),tendo realizado, em
abrindo mão de princípios básicos: credenciamento
março de 1999, no Rio de Janeiro, o “I Fórum de
universal, livre escolha, honorários dignos repassados
Defesa Profissional da SBP”. (Leia neste livro resumo
diretamente, sem glosas e atrasos.
“A SBP e a Defesa Profissional”).
Devemos recusar trabalhar para empresas mercantilistas
Devemos reconhecer o empenho pessoal do atual
que só visam lucro e oferecem valores vis ao
presidente da SBP, Dr. Lincoln Marcelo Silveira Freire,
profissional mais resolutivo e mais barato: o Pediatra.
que não só participou de todas as reuniões do
Departamento Científico de Defesa Profissional e do Nossa luta, com dignidade e ética, será vitoriosa!

O que é Ser Cidadão

“O cidadão é o indivíduo que tem consciência de seus direitos e deveres e participa ativamente de todas
as questões da sociedade. Tudo o que acontece no mundo, seja no país, na minha cidade ou no meu
bairro, acontece comigo. Então eu preciso participar das decisões que interferem na minha vida. Um
cidadão com sentimento ético forte e consciência da cidadania não deixa passar nada, não abre mão
desse poder de participação.”
Herbert de Souza (Betinho)

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 133


Defesa Profissional
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Carta da Sociedade de Pediatria de São Paulo

FÓRUM: “O MÉDICO PEDIATRA X MERCADO DE TRABALHO


Conclusões – Carta da Sociedade de Pediatria de São Paulo

1. O trabalho do pediatra como clínico generalista de crianças e adolescentes apresenta características próprias e
complexas, ultrapassa os limites de uma consulta médica, representando o que no Fórum convencionou-se chamar
de “Atendimento Pediátrico”.
2. O “Atendimento Pediátrico”, em virtude da sua grande abrangência, diminui a necessidade de encaminhamentos
a serviços especializados, exames complementares e procedimentos, minimizando dissabores à criança e à família
e reduzindo radicalmente o custo.
3. Torna-se necessária uma remuneração justa, adequada às características peculiares do “Atendimento Pediátrico”,
diferente de um simples valor atual de consulta médica das listas de procedimentos médicos.
4. O trabalho do pediatra compreende o atendimento da população desde o nascimento (recém-nascido) até o final
da adolescência (18-20 anos).
5. As entidades de pediatras (Sociedade de Pediatria Estaduais e Brasileira), como representantes dos mesmos, devem
ser ouvidas pelo poder público e pelas empresas intermediadoras de serviços médicos nas discussões relativas à
saúde das crianças e dos adolescentes, na remuneração e na regulamentação do trabalho do pediatra, a fim de
que se expresse sua real importância, irrelevada na última década em benefício da dispendiosa tecnologia sem
limites.
6. É necessário uma ampla discussão sobre a formação e distribuição dos pediatras brasileiros.

Código de Ética Médica

Art. 3º – A fim de que possa exercer a medicina com honra e dignidade, o médico deve ter boas condições de
trabalho e ser remunerado de forma justa.
Art. 10º – O trabalho do médico não pode ser explorado por terceiros com objetivo de lucro, finalidade política
ou religiosa.
Art. 86º – É vedado ao médico receber remuneração pela prestação de serviços profissionais a preços vis ou
extorsivos, inclusive através de convênios.

Lista de Procedimentos Médicos AMB 1999

Credenciamento Universal e Livre Escolha


8.1 – A AMB recomenda às entidades contratantes de serviços médicos que adotem o credenciamento
universal feito através das sociedades científicas de especialidades ou departamentos de convênios
visando permitir a livre escolha do médico pelo paciente.
9.1 – A remuneração dos valores expressos na LPM deverá ser paga, pelas entidades contratantes,
diretamente aos médicos prestadores dos serviços.
9.2 – Os procedimentos médicos que eventualmente não constarem desta lista deverão ter sua remuneração
discutida e ajustada entre as partes interessadas.

134 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Defesa Profissional
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06 - CARVALHO, José Américo Penteado de; “Ética e condições


Referências Bibliográficas: de trabalho médico”, in “Arquivos do Conselho Regional
de Medicina do Paraná” – vol. 15, nº 59, julho –
01 - ASSOCIAÇÃO MÉDICA BRASILEIRA; Lista de Procedi- setembro/98, páginas 126-135.
mentos Médicos, Janeiro/1999.
02 - “Honorários do SUS: não dá mais para suportar”, in 07 - “Defesa Profissional”, in “Revista da Associação Médica
“Medicina – Conselho Federal”, nº 104, abril/1999. de Londrina”, nº 135, maio/1999.

03 - “SUS: Mobilização Necessária”, in “Medicina – Conselho 08 - “Prática Profissional”, in “Manual do 53º Curso Nestlé de
Federal”, ano XIV, nº 105, maio/1999. Atualização em Pediatria”, Manaus/1996.
04 - “Pediatras dizem não ao managed care”, in “SBP
09 - “Defesa Profissional”, in “Manual do 55º Curso Nestlé de
Notícias”, nº 04, ano I, fevereiro – março/99.
Atualização em Pediatria”, Brasília/1998.
05 - “Pediatra e Mercado de Trabalho”, in “Boletim da
Sociedade de Pediatria de São Paulo”, VIII, nº 75, 10 - Constituição da República Federativa do Brasil, 21ª edição
março/99. atualizada e ampliada até 1999 – Editora Saraiva.

Cooperativas e Centrais de Convênios


ARNALDO PINESCHI DE AZEREDO COUTINHO

O médico é um profissional autônomo e liberal, sucateamento de toda a rede pública de assistência


caracterizando-se por isso como aquele que tem a médica e um encarecimento da assistência privada.
prerrogativa da liberdade moral e intelectual bem Esses dois fatores, piora da rede pública e
como da independência de princípios e de encarecimento da rede privada, aliados a um
condutas. Não deve por isso, em prol de seu crescente empobrecimento da população,
paciente e do bom exercício de sua profissão, ter contribuíram para que, gradativamente fosse se
sua prática limitada por fatores que fujam aos limites desenvolvendo um outro mercado ligado à saúde
éticos existentes. Limites esses que norteiam os formado pelas empresas de medicina de grupo,
princípios fundamentais da Medicina e a colocam seguradoras e outras, com propostas de tornar a
como uma profissão a serviço da saúde do ser saúde acessível a qualquer indivíduo e, de maneira
humano e da coletividade, devendo ser exercida subliminar, com a indução da substituição da rede
sem nenhuma discriminação, na medida em que o pública pelo atendimento por convênios e
médico não pode renunciar à sua liberdade credenciamentos. A partir daí o médico ganhou o
profissional, evitando que quaisquer restrições ou seu terceiro satélite e criou com esse uma ligação de
imposições venham prejudicar a eficácia e a inter dependência visando a segurança e o mercado
correção do seu trabalho. de trabalho.
No modo atual de exercício liberal da Medicina o Dentro de um contexto onde são patentes a
médico é colocado no centro de um sistema alienação, a despolitização e o individualismo do
dinâmico, orbitando em sua volta seus pacientes, médico, associados à formação médica voltada
seus funcionários e as empresas de convênios ou as primordialmente para o técnico-científico, à má
cooperativas. No passado, esses satélites do médico distribuição do profissional pelo território nacional,
eram somente os pacientes e os funcionários. Porém ao excesso de faculdades de Medicina e à falên-
a evolução social da Medicina em nosso país foi cia do sistema público de saúde, o que se vislum-
atropelada por uma agressão, num processo bra é tão somente a desigualdade de oportuni-
antinatural de evolução, sofrendo um grande dades, fazendo com que se presencie um relacio-
retrocesso causado por vários fatores (políticos e namento caótico no que diz respeito ao vínculo
administrativos), tendo como resultado um grande existente entre as empresas intermediadoras e os

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 135


Defesa Profissional
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médicos. Isso, claro, como fruto de uma ausência À vista do exposto, que constata o estado atual do
de conscientização, de mobilização e de organiza- exercício da Medicina, encontra-se a justificativa e a
ção da categoria para tentar o equacionamento do explicação para os resultados da pesquisa do Perfil
problema. dos Médicos, quando mostra que 49% dos médicos
vêem o trabalho como atividade liberal, 79% afirmam
A pesquisa do Perfil do Médico (Fiocruz / CFM -
ser a profissão uma grande fonte geradora de
1995) vem mostrar que a Pediatria é a especialidade
desgaste e 41% têm uma visão pessimista sobre o
que reúne o maior número de médicos no país, com
futuro da profissão (17% vêem esse futuro com
13,5% da categoria e, desse universo, a pesquisa
incertezas).
mostra que 79 % mantêm convênios em sua atividade
profissional. Esses médicos têm sua inserção no
mercado de trabalho pelos vários segmentos, quais QUAL A SAÍDA ?
sejam as Cooperativas, as seguradoras, as empresas
Quais os novos rumos do exercício da Medicina e,
de medicina de grupo e as empresas de auto gestão.
especificamente, do exercício da Pediatria? Com
Mas, diante de uma primeira análise, cabe a primeira
certeza a saída não será encontrada num passe de
pergunta: “Há vantagens nessa situação? “ Como
mágica ou num a bola de cristal.
possíveis respostas podemos auferir: facilitação no
início das atividades de consultório, fonte de clien- Diante dessa situação, a saída significa ter,
tes, divulgação do nome do profissional e reserva obrigatoriamente, coragem e determinação para
de mercado. concretizar um trabalho de mobilização e
conscientização para se criar estruturas que possam
No contraponto vêm as possíveis desvantagens e,
reverter o vínculo de dependência que hoje existe
dentre várias, destacam-se: clientelismo exercido pelas
entre o médico e as empresas intermediadoras. Mister
empresas intermediadoras, tempo excessivo para
se faz a existência de um bom assessoramento jurídico
recebimento dos honorários, glosas sem justificativa,
para que no relacionamento com essas empresas
honorários defasados e demanda reprimida pelo
não só os deveres bilaterais, mas também os direitos
poder do credenciamento.
existam.
Logo, há que se considerar a influência dos convênios
Na balança que hoje se apresenta para o exercício
no mercado de trabalho e nos honorários profissio-
da Medicina há que se considerar que o equilíbrio
nais. A regulação do mercado de trabalho faz-se
tem que chegar sem que se comprometa a ética e
pela observância aos seguintes corolários:
a qualidade. Há que se pesar a prática do Managed
1 - Necessidades e interesses do profissional; Care em confronto com a prática das Cooperativas
2 - Necessidades e expectativas do cliente; e das Centrais de Convênios.
3 - Necessidades e expectativas da empresa. Dentro de um processo de valorização do trabalho
há que se considerar a criação da Unimed como
Os convênios influenciam o mercado de trabalho à
medida que promovem: modelo de cooperativa de trabalho medico. No rastro
desse modelo surgiram as cooperativas de
1 - Regulação do mercado pela manipulação do especialidades. Mais recentemente surgiram as
credenciamento e descredenciamento; centrais de convênios. As duas formas organização
2 - Reserva de mercado pelo direcionamento de do trabalho visam, entre vários outros, a construção
clientes (Managed Care); de uma rejeição ao estado atual de exploração do
3 - Ameaça à liberalidade do médico pela indução trabalho médico.
dos clientes aos credenciados. Antes de tecer comentários sobre essas variantes de
Também influenciam os honorários à medida que: organização de trabalho, cabem algumas considera-
ções sobre a mais recente ameaça à autonomia e
1 - Causam desvalorização por não cumprimento de
à liberalidade da Medicina, que é o Managed
tabelas atualizadas;
Care, já citado anteriormente nesse artigo. O prin-
2 - Praticam as tabelas como referencial máximo e cípio fundamental desse sistema é maximizar o
não mínimo; lucro, minimizando a assistência, tendo como estra-
3 - Praticam atrasos e glosas sem justificativa técnica. tégia principal o pagamento “per capita“. Sobre o

136 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Defesa Profissional
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funcionamento, há que se esclarecer alguns concei- ao receber seus honorários calculados “per capita”
tos, quais sejam: terá, a cada despesa adicional, seja pela
1 - Managed Care = Cuidado Gerenciado: Conjunto necessidade de outro médico ou de exames
de estratégias destinadas a maximizar os lucros das complementares, uma diminuição de seu rendimento.
empresas prestadoras de assistência médica. Baseado Cria-se assim um confronto de origem comercial,
no pagamento “per capita“. Transforma o médico de fazendo com que esse sistema se caracterize por
profissional de saúde em administrador de lucros. uma incoerência, já que o médico porteiro ganha
mais pelo não atendimento ou pelo mau
2 - Capitation = Pagamento per capita: Pagamento atendimento.
pelos cuidados de saúde feito através de preço fixo
mensal para cada paciente cadastrado junto a um Claro fica que esse sistema causa interferências na
determinado médico (Gatekeeper). Nenhum outro ética médica, quais sejam:
pagamento é admitido, em que pesem os cuidados 1 - Na liberdade do paciente escolher seu médico
necessários ao paciente. e de aceitar o tratamento proposto (art. 56);
3 - Gatekeeper = Médico porteiro Quem tem o 2 - Na relação médico paciente quando o médico
poder de restringir a passagem através de um portão deixar, em prol do lucro, de oferecer aquilo que de
de acesso. Quanto maior a restrição ao acesso do melhor existir para seu paciente (art. 5-8-57);
paciente aos ser viços de diagnóstico ou
3 - No relacionamento entre médicos, confrontando
especializados, maior o lucro do médico. “Médico
o “generalista” com o “especialista” ou induzindo a
de Família?“
acordos que aumentem a lucratividade daquele em
4 - H M O - Health Mantenance Organization = prol da qualidade do atendimento (art. 9-19);
Organização mantenedora de saúde, que é o veículo
4 - Quando o médico recebe “per capita”,
para a implantação do sistema de Managed Care.
antecipadamente e por serviço que não realizou
São consideradas empresas financeiras de assistência
(art.87);
à saúde.
5 - Quando o médico porteiro, em prol do lucro,
5 - P H O - Physician Hospital Organization =
atuar fora de sua área de conhecimento, podendo
Organização médico - hospitalar que controla, do
errar por imperícia ou imprudência e comprometer a
ponto de vista médico - financeiro, uma determinada
saúde do paciente (art.29).
área ou região. São os patrões dos médicos porteiros
da região, com riscos à autonomia econômica dos E qual o contraponto, qual a saída, qual o mote
médicos que estiverem fora do esquema. “Sistema para a recuperação do espaço perdido e para a
feudal “. recuperação das características da profissão?
Ao longo dos tempos, situações foram criadas, Com certeza é a concretização das Cooperativas
intencionalmente ou não (sempre haverá a dúvida) de Especialidades e das Centrais de Convênios,
que hoje contribuem para a instalação do Managed que não se opõem mas, ao contrário, podem se
Care. São elas: somar pela comunhão de idéias e pelas coincidências
1 - Excesso de faculdades de medicina = excesso de fatores marcantes.
de médicos no mercado;
Tanto um como o outro têm objetivos fundamentais,
2 - Diminuição das vagas de Residência Médica; que podem ser relacionados como:
3 - Necessidade de sobrevivência do médico recém 1 - Preservar o caráter liberal da profissão e valorizar
formado; o trabalho do médico;
4 - Grade curricular defasada no tempo. 2 - Tornar possível o livre acesso e livre escolha de
Por suas características o Managed Care leva a médico pelo paciente, já que ambos os sistemas
um confronto entre o médico porteiro, generalista, visam aglutinar todos os médicos de uma ou várias
médico de família (ou outra denominação que se especialidades;
queira dar) e o especialista (tanto de área clínica, 3 - Habilitação universal do médico = direito de
cirúrgica ou SADT). Do universo de pacientes sob atender a qualquer paciente, preservando sua auto
a cobertura de determinado médico porteiro, este determinação de trabalho e honorário;

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 137


Defesa Profissional
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4 - Democratizar o acesso ao mercado de trabalho A grande expectativa é que, tanto com as Centrais
na substituição do contrato individual pelo contrato de Convênios como com as Cooperativas de
coletivo na relação médico-empresa; Especialidades, haja um fim do apadrinhamento no
5 - A Central de Convênios abrigará as Cooperativas credenciamento, efetivando a universalização das
de Especialidades e aqueles médicos não filiados a oportunidades, com reflexos positivos na regulação
nenhuma cooperativa. do mercado de trabalho e dos honorários.

Managed Care
EDUARDO DA SILVA VAZ

No final da década dos 80, os Estados Unidos influencia direta do managed care. Por outro lado o
embarcaram numa grande experiência com o seu custo com saúde nos Estados Unidos vem aumentado
sistema de saúde, mal planejada e impulsionada alem da inflação americana que é de 3% ao ano.
pelo mercado. A paternidade deste sistema deve-se Os prêmios das seguradoras no ano passado
aos empresários, que ficaram cansados de pagar aumentaram cerca de 6%, e espera-se um aumento
custos cada vez mais elevados para o acesso à de 9% para este ano. O aumento dos prêmios da
saúde de seus empregados. Ela postulava que se os Kaiser permanente chegará a 11,7%.
médicos fossem encurralados e obrigados a aceitar A face cruel é que os excluídos americanos, isto é,
os planos do Managed Care ( cuidado gerenciado) os sem condições de terem planos de saúde
e HMOs, o custo da assistência médica seria aumentaram de 31 milhões em 1987 para 43
controlado e o crescimento alarmante no número milhões em 1998. Enquanto na última década a
das famílias sem seguro seria interrompido, tudo isso população americana aumentou em 9% o número
com a mão forte do governo dando o seu aval. de crianças excluídas de planos de saúde aumentou
Atualmente 92% dos médicos americanos trabalham em 25%, atualmente são 10,5 milhões de crianças
sob alguma forma de Managed care, em razão sem assistência médica nos Estados Unidos. Outro
disto a Associação Médica Americana na sua última dado para análise são os salários auferidos pelos
assembléia no mês de Junho em Chicago, com a executivos deste sistema famigerado. USA Family uma
participação 474 delegados, sugeriu que os médicos entidade de Washigton de defesa do consumidor
americanos com consultórios se sindicalizassem. publicou no ano passado que em 1996 os executivos
chefes de 25 maiores HMOs receberam mais de 4
Atualmente a lei norte americana proíbe o médico milhões de dólares cada. Outro dado estarrecedor
de consultório ser sindicalizado. A sindicalização é o comprometimento dos governos latino americanos
seria a única forma dos médicos americanos com o FMI e o Banco Mundial. Estes governos se
defenderem seus direitos contra as empresas de comprometem cortar custos na saúde publica e
managed care. Alguns médicos são obrigados a implementar as ações das empresas de Managed
atender pacientes a cada 7 minutos, 8 pacientes em Care na América Latina, afim de que possam se
uma hora. Aqueles que se enquadram no sistema beneficiar de recursos destes organismos
recebem benefícios extras, os que se recusam são internacionais (publicado no New England em Abril
descredenciados do sistema. de 1999).
Pesquisa recente da Associação médica Americana A regulamentação dos planos de saúde com aval
(AMA) mostra que o rendimento médio dos do governo e congresso brasileiro permitiu que estas
profissionais diminuiu nos últimos quatro anos por empresas multinacionais que operam planos de saúde

138 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Defesa Profissional
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(managed care) se instalassem no Brasil. Entre estas se comprometem junto as empresas a restringir o
podemos citar a Aetna (associada a Sul-America) número de exames solicitados, isto é perdem a
que com o Banco do Brasil fundaram a Brasil Saúde, autonomia profissional. Se responsabilizam pelo
empresa que fez contrato com o governo da Bahia atendimento global do paciente, dificultando a ida
e já esta forçando valores de consulta abaixo de 14 do paciente ao especialista.
reais. Prudential associada a Bradesco, que em varias Este sistema como foi descrito inicialmente surgiu dos
regiões do Brasil já conta com rede referenciada, Estado Unidos, com aval do governo, achando que
diferente da credenciada, em que os médico se a responsabilidade pelos aumentos do custo na saúde
comprometem a atender dando descontos na consulta. deviam-se aos médicos. A história americana mostrou
Em Joinville, Santa Catarina, o Bradesco implantou que a finalidade destas empresas e dos empresários
o Managed care clássico descredenciando vários que as administram é o lucro, tem eles compromissos
consultórios e ficando com uma pequena rede de com seus acionistas. Isto serve também para o
referencia. A Cigna é outra empresa multinacional Brasil. Precisamos prestigiar o nosso Sistema Único
associada a Golden Cross. de Saúde, as nossas cooperativas médicas.
O que vem a ser o Managed care? Este sistema na Lutar pela implantação das cooperativas de
realidade é uma forma de gerenciamento de planos especialidades e Centrais de Convênios, afim de
de saúde que visam maximizar os lucros, combatendo garantir a LIBERDADE DE ESCOLHA DO MÉDICO
a livre escolha de pacientes pelos médicos, isto é, PELO PACIENTE e AUTONOMIA DO MÉDICO
referenciando poucos médicos. Estes ganham menos, FRENTE AO PACIENTE.

A SBP e a Defesa Profissional


ELIANE DE SOUZA

Certamente a Defesa Profissional é hoje um dos Hoje o principal motivo do desgaste profissional
principais desafios para a atuação da SBP. Nestes é o excesso de trabalho/multiemprego, seguindo
tempos de globalização, o exercício da medicina pela baixa remuneração, más condições de
enfrenta muitas dificuldades. trabalho, responsabilidade com a “vida”, área de
atuação/especialidade, relação médico-paciente,
A criança e o adolescente não são respeitados como
conflito/cobrança da população e perda da
cidadãos “de primeira ordem”, pois não detêm poder
autonomia.
econômico. Conseqüentemente, os profissionais que
cuidam da infância e da adolescência também não A tabela do SUS, o valor das consultas pagas pelos
são valorizados e respeitados. convênios e os salários pagos pelo Serviço Público
determinam nossa remuneração.
Somos a maior especialidade médica do país, com
24.650 pediatras. A maior atividade da categoria Diante desta situação, a SBP realizou em março
se encontra no setor público (81,3%), seguindo com deste ano, na cidade do Rio de Janeiro, o Fórum
56% no setor privado e em consultório (70,6%), sobre Defesa Profissional, com planejamento
tendo 2 a 3 atividades (60,7%) com uma renda estratégico, identificando os principais problemas,
média de US$2.163,70 (Pesquisa “Perfil dos suas linhas e a atuação que orientarão a ação da
Médicos no Brasil”, Fiocruz/CFM, 1995). Diretoria.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 139


Defesa Profissional
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Grupo: O Pediatra e Outras Formas de Intermediação do Trabalho

PROBLEMAS LINHAS DE ATUAÇÃO


1. Relação individual com 1. Criar uma campanha nacional de conscientização dos pediatras:
as empresas. – contra o Managed Care;
2. Falta de participação – participação profissional na SBP;
dos pediatras na elaboração – descredenciamento universal e ter apenas relação com o departamento
das tabelas. de convênios e/ou cooperativas.
Criar fóruns regionais com as entidades representativas para definir a
intermediação do trabalho pediátrico.
2. Criar protocolos pediátricos.
SBP solicitar criação de código de especialidade na LPM.

Grupo: Os Pediatras e a Relação com o Estado

PROBLEMAS LINHAS DE ATUAÇÃO


1. Falta de condições mínimas 1. Formação de GT da SBP para avaliar os parâmetros conhecidos
de trabalho no setor público. e relacionados à prática da pediatria.
2. Remuneração inadequada no Formulação de normatização própria da SBP, que inclua:
setor público: – nº de atendimentos / pediatra;
– salários baixos – suporte técnico-estrutural indispensável.
– tabela inadequada: Articulações com os CRMs para estimular criação de Câmaras
remuneração; tempo Técnicas de Pediatria.
de permanência. 2. Atuação da SBP junto com entidades nacionais através da Assessoria
3. Falta de critérios para Parlamentar da SBP junto ao Congresso Nacional e Executivo.
a formação do número Para reapresentação e aprovação do projeto do piso salarial do médico.
de pediatras. Recomendar às entidades médicas que elaborem projeto de PCCS
4. Falta de política da SBP para encaminhamento para as instituições públicas.
em defesa do pediatra junto Avaliação das novas propostas de tabelas do setor público
à gestão pública. (TUNEP, CONASSEM) e posicionamento da SBP.
Elaboração de proposta de tabela alternativa com as especificidades
da pediatria.
Criação de Assessoria Técnica da SBP sobre tabelas de procedimentos
e honorários.
3. Remeter o problema e linhas de atuação para o GT Ensino e Residência.
Perfil diagnóstico por Estado:
– nº de pediatras existentes;
– nº de pediatras necessários.
Perfil diagnóstico por Estado:
– nº de residências médicas;
– vagas por residência médica;
– nº de estágios em pediatria.
Regulamentação com maior rigor dos estágios fornecidos para pediatras.
Extensão do selo de qualidade para os estágios de pediatria. Proposta polêmica.
4. Estimular a atuação das filiadas junto aos órgãos de defesa da criança
e do adolescente e aos conselhos gestores, do CNS, na defesa do
exercício profissional.
Posicionamento da SBP contra as falsas cooperativas no setor público
(buscas de apoio nas outras entidades).

140 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Defesa Profissional
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Grupo: O Pediatra e o Cliente

PROBLEMAS LINHAS DE ATUAÇÃO

1. Muitos médicos exercem a 1. (Facilitação.) Incentivo às federadas, pela SBP, para a realização
Pediatria sem formação do TEP (custos reduzidos, conteúdo mais prático...).
adequada. – Incentivar cursos de reciclagem médica e enfermagem –
– Ausência de vínculo entre “melhor treinamento”.
o médico e o paciente e – Influenciar o Governo (as três esferas) a exigir a titulação
sua família. para os concursos públicos.
– A comunicação entre o – Contemplar os aspectos da humanização no atendimento pediátrico.
médico e o paciente é – Reivindicar a presença da SBP nas discussões nacionais (MEC)
obstruída pelas condições sobre o currículo da disciplina Pediatria nas escolas.
de trabalho. – Divulgação do manual (de MG) de Prevenção do Erro Médico.
2. Tempo destinado às consultas – Propor aos programas de residência a realização do TEP ao final desta.
é muito pequeno. 2. Campanha nacional pela SBP para aumentar o tempo da
3. Deficiências no suporte consulta pública por paciente.
propedêutico e terapêutico 3. Atuação da SBP nas discussões nacionais sobre o atendimento à criança.
nos serviços públicos. 4. Atuação do Dep. De Defesa Profissional das regiões junto ao
4. Despreparo do médico ao Ministério Público e à Imprensa.
para lidar com a imprensa. – Estimular a formação da Comissão Estadual do Médico em todos
– A imprensa busca denúncia os Estados.
sensacionalista a respeito do – Posicionamento público da SBP em defesa do colega INJUSTAMENTE
erro médico. denunciado.
– Atuar (ocupar) espaço nos meios de comunicação, agindo de maneira
preventiva.

Grupo: Os Pediatras e o Associativismo

PROBLEMAS LINHAS DE ATUAÇÃO


1. Pletora de médicos no mercado, Reconhece a formação de COOPEDs e/ou Centrais de Convênio como
com baixa qualificação. caminhos favoráveis para promover o associativismo entre os pediatras e se
2. Desinformação dos médicos propõe a buscar uma atuação conjunta com as mesmas.
sobre associativismo. A SBP recomenda às filiadas o apoio à formação de cooperativas de
3. O cooperativismo tem um limite de pediatras, constituídas somente por sócios da SBP.
absorção dos novos pediatras Proposta sobre manifestação explícita em relação à UNIMED será remetida
que entram no MERCADO. aos foros deliberativos da SBP.
4. Individualismo. A SBP deve estimular a formação de Câmaras Técnicas de Pediatria nas
5. Autofagia: liderança – colegas. UNIMEDs.
6. UNIMED não considera o Descentralização das filiadas estaduais / campanha de valorização do TEP e
trabalho do pediatra como filiações.
atendimento pediátrico. SBP deve fazer negociação com Federação de UNIMEDs para indicar a
7. Algumas UNIMEDs comportam-se aprovação de protocolo pelas singulares.
como medicina de grupo ou O protocolo de atendimento elaborado pelo Dep. Científico de Defesa
seguradoras na valorização Profissional da SBP deverá nortear as negociações das filiadas e da SBP com
do trabalho. as singulares da UNIMED, devendo ser negociado nos próximos 60 dias.
8. Ausência da SBP (Política Organizar Dep. De Defesa Profissional em todas as filiadas.
de implantação das COOPEDs). Cabe ao Dep. Científico de Defesa Profissional da SBP estabelecer os
9. Pode haver um enfraquecimento critérios para o apoio logístico à criação e à atuação efetiva das COOPEDs,
da SBP diante do crescimento que representarão a ligação da SBP com as Centrais de Convênios dos
econômico da COOPED. Estados.
10. Falta de interação entre as
COOPEDs.
11. Centrais de convênio: dificuldade
de implantação em grandes cidades
onde já há estruturação dos serviços.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 141


Defesa Profissional
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142 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
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Asma Aguda na Infância


MÁRIO ROBERTO HIRSCHHEIMER

I – INTRODUÇÃO II – ETIOLOGIA
A asma é uma doença inflamatória crônica das vias A resposta inflamatória na asma é orquestrada por
aéreas, de caráter obstrutivo, com evolução recurrente linfócitos T auxiliadores 2-símile (Th2-like cells) que
e reversível, conseqüente à hipereatividade a uma secretam citocinas que ativam linfócitos B, para a
variedade de estímulos, com espasmo da musculatura produção de IgE, e mastócitos, macrófagos e
lisa brônquica, edema de mucosa e hipersecreção eosinófilos, que liberar mediadores inflamatórios como
de muco, afetando difusamente ambos os pulmões. histamina, leucotrienos, prostaglandinas e bradicininas.
A crise de asma é um episódio agudo de Estes promovem broncoconstrição, secreção de muco,
broncoespasmo com hipoxemia, que se manifesta exsudação de plasma e hiperresponsividade da via
por tosse (predominantemente noturna e matutina), aérea. Os neuropeptídios podem amplificar esta
opressão torácica, sibilância, dispnéia e, às vezes, inflamação (asma neurogênica).
fadiga respiratória e alteração do nível de O excesso de IgE antígeno-específica para alergenos
consciência. inaláveis fica ligado à membrana de mastócitos e
O estado de mal asmático é uma crise de asma que basófilos do trato respiratório. Uma nova exposição
não responde ao esquema terapêutico inicial com ao antígeno resulta na sua interação com esta IgE e
oxigênio, broncodilatadores e corticosteróides que determina a liberação de mediadores inflamatórios
tende a evoluir para insuficiência respiratória grave. por estas células, que causam broncoconstrição em
No atendimento ao paciente asmático é importante três fases.
reconhecer as situações que contribuem para esta
A primeira fase, conseqüente à liberação de histamina,
má evolução:
inicia-se até 15 minutos após a exposição ao alérgeno
• crianças menores de 3 anos; e reverte espontaneamente ou com o tratamento inicial.
• pouca aderência a tratamentos propostos O uso prévio de cromoglicato dissódico e de
anteriormente; antagonistas da histamina pode inibir esta fase.
• necessidade do uso de broncodilatadores de ação
A segunda fase, conseqüente à liberação de
rápida maior que 2 vezes por semana;
mediadores inflamatórios broncoconstritores, inicia-
• hipóxia grave, alteração do nível de consciência se 3 a 8 horas após a exposição ao alérgeno e
ou necessidade de ventilação pulmonar mecânica se caracteriza por broncoconstrição intensa e
em episódio prévio; aumento do edema submucoso. O uso prévio de
• início súbito de crise grave; corticosteróides pode inibir esta fase.
• início súbito de crise associada a exposição a
A terceira fase é caracterizada por broncoconstrição
alergeno;
severa, prolongada e resistente à terapêutica. A
• início tardio do tratamento efetivo; liberação de fatores quimiotáticos causa mobilização
• abandono ou redução da corticoterapia no decorrer de células inflamatórias para a submucosa e para a
do mês prévio ao episódio atual; luz das vias aéreas. Estas liberam mediadores
• alterações da dinâmica familiar com história de citotóxicos que causam descamação irregular da
reações emocionais anormais. mucosa, hiperplasia de glândulas mucosas e células

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 143


Emergências
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caliciformes, rolhas de muco no lúmem das vias respiratório e do consumo de oxigênio progride
aéreas, reduzem a produção de fatores relaxantes acidose metabólica pela com dificuldade de manter
derivados do epitélio e aumentam a interação das a hiperventilação. Com a fadiga e/ou progressão do
células inflamatórias com os alérgenos inalados. Nos quadro, começa a haver hipercarbia e piora da
pacientes com asma prolongada ocorre remodelação hipóxia que resultam em acidose mista, que contribui
da parede das vias aéreas por hipertrofia e para a depressão cardiocirculatória e para o óbito.
hiperplasia da musculatura da parede brônquica,
neoformação vascular e deposição de colágeno sob
a membrana basal subepitelial, causando obstrução
IV – QUADRO CLÍNICO
irreversível. O diagnóstico asma deve ser considerado quando
Outros fatores etiológicos que podem desencadear ocorre tosse ou sibilância ou aperto no peito após
a crise asmática são: infecções do trato respiratório exposição a alergenos inalados ou poluentes, ou
inferior, algumas drogas (como os antiinflamatórios quadro sugestivo de resfriado comum que cursa com
não hormonais), aditivos alimentares, exercícios físicos, aumento da secreção pulmonar ou que tem duração
inalação de ar frio ou de irritantes químicos, fatores maior que 10 dias. As infecções virais são
endócrinos e estresse psicológico. desencadeantes comuns de asma em crianças
pequenas. Tosse recorrente, predominantemente
O reflexo broncoconstritor colinérgico deve-se ao noturna, também pode ser manifestação de asma. A
aumento GMP cíclico (GMPc) e a broncodilatação crise pode ser desencadeada por exercício.
mediada por receptores β implica no aumento do
AMP cíclico (AMPc), pelo estímulo à sua formação A anamnese deve procurar a ocorrência e as
pelas substâncias β2-adrenérgicas, e pelo bloqueio características de episódios graves prévios, a
de sua destruição por inibidores da fosfodiesterase. freqüência das crises, a duração da crise atual, a
Nos pacientes asmáticos pode ocorrer resposta medicação em uso (doses e horários) e falhas atuais
colinérgica excessiva e/ou resposta β2 adrenérgica ou pregressas das medicações habituais.
reduzida. A tabela 1 apresenta os principais sinais a serem
valorizados no exame físico.
Para estabelecer o diagnóstico é necessário que o
III – FISIOPATOLOGIA quadro clínico seja pelo menos parcialmente reversível
A alteração fundamental é a obstrução do fluxo aéreo com o uso de β2-adrenérgicos.
que resulta em aumento do volume residual e A medida do pico de fluxo expiratório (PFE), medido
hiperinsuflação pulmonar, determinando aumento do pelo “peak flow meter” serve para quantificar a
espaço morto (relação ventilação/perfusão V/Q alta). gravidade da crise e acompanhar sua evolução em
Há diminuição da complacência pulmonar e crianças maiores de 6 anos de idade em condições
conseqüente aumento do trabalho respiratório. O clínicas para colaborar. O PFE normal para a altura
aprisionamento de ar aumenta a pressão intra-alveolar, pode ser calculado aproximadamente usando a
que diminui o fluxo sangüíneo nos capilares alveolares fórmula:
(relação V/Q alta). Em outras áreas do pulmão a
FEM em ml/min = 150 + 5,3 x (Altura em cm - 110)
obstrução das vias aéreas causa hipoinsuflação e
atelectasias (relação V/Q baixa = “shunt”
Quando a medida do PFE não é aplicável, o escore
intrapulmonar).
clínico para asma de Wood e Downes pode ajudar
Os distúrbios da relação V/Q resultam em hipoxemia a quantificar a gravidade e avaliar a evolução da
e hipercarbia. A acidose aumenta ainda mais a crise. (Tabela 2)
resistência vascular pulmonar, com maior queda da
O diagnóstico diferencial inclui doenças que requerem
relação V/Q e piora da condição hemodinâmica.
abordagem diagnóstica e terapêutica específica,
No início do quadro ocorre só hipoxemia até o limite como insuficiência cardíaca, massas mediastinais,
de tolerância do paciente. A tentativa de compensá- displasia broncopulmonar, mal formações
la através da hiperventilação ocasiona hipocapnia traqueobrônquicas, refluxo gastroesofágico,
com alcalose respiratória. O aumento do trabalho incoordenação da deglutição, imunodeficiências,

144 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Tabela 1 - Classificação da intensidade das crises de asma

Parâmetro Leve Moderada Grave

Uso de músculos Leve ou ausente Subcostal e de Intercostal e batimento asas


acessórios esternocleidomastoideo nasais, respiração paradoxal

Dispnéia Ao deambular Ao falar Em repouso


Fala/Choro Frases completas Frase ou choro curtos Só palavras ou gemido
Alimentação Normal Dificuldade para comer. Não consegue comer
Posição Fica deitado Prefere sentar-se Fica só sentado

Posição preferencial Indiferente Prefere sentar Senta-se ereto

Nível de consciência Normal Normal ou agitado Agitado ou hipoativo

Ausculta Sibilos no fim Sibilos em toda Sibilos ex e inspiratórios


da expiração expiração

FC (em rel. ao normal) normal 100 a 120% > 120%

FR Normal até + 1 DP de 1 a 2 DP > 2 DP

Pulso paradoxal (mmHg) < 10 de 10 a 20 20 a 40

Sat O2 > 95% 91 a 95 % < 91%

Pico de fluxo expiratório > 80% 50 a 80% < 50%

PO2 sob FiO2 21% (mmHg) Normal > 60 mmHg < 60 mmHg


PCO2 (mmHg) Normal < 42 > 42 ou 5/hora

Tabela 2 - Escore clínico para asma de Wood e Downes

0 1 2

Uso de músculos acessórios Nenhum Moderado Máximo

Cianose Nenhuma Ar ambiente FiO2 a 40%


(PaO2 > 70 mmHg) (PaO2 < 70 mmHg) (PaO2 < 70 mmHg)

Ruídos Inspiratórios Normais Variados Diminuídos ou ausentes

Sibilância expiratória Mínima Moderada Intensa

Função cerebral Normal Deprimido ou agitado Coma

deficiência de α1-antitripsina, raquitismo, fibrose ocorrência de desidratação por vômitos, febre, recusa
cística, corpo estranho, infecções respiratórias e alimentar e taquipnéia requerendo fluidoterapia por
síndrome de Löffler. via IV.
Para a reversão do broncoespasmo, inicialmente
utiliza-se um agonista β2 específico de efeito rápido,
V – TRATAMENTO
preferencialmente por via inalatória. Pode-se fazer
Na abordagem inicial, oxigênio deve ser oferecido até 3 inalações em uma hora (uma a cada 20
para manter a SatO2 acima de 90%, sendo rara a minutos), se necessário, avaliando a resposta ao

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 145


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

término de cada uma. Em crianças que não toleram • Terbutalina: 0,1 a 0,2 mg/Kg/dose, até o máximo
a inalação, pode-se usar a via subcutânea. de 4 mg/dose. Na apresentação em gotas a 1%,
usa-se uma gota/3 Kg/dose. Por via SC há a
Os agonistas β 2 estimulam o relaxamento da
apresentação injetável a 0,5% - 0,01 a 0,02 ml/
musculatura lisa da via aérea e a depuração
Kg/dose, até o máximo de 0,8 ml/dose.
mucociliar e inibem a secreção de mediadores
inflamatórios. Seus principais efeitos colaterais são: O uso de corticosteróides no início do tratamento
tremores; hipopotassemia; aumento da pressão deve ser considerada nas seguintes situações:
sistólica; diminuição da pressão diastólica; taquicardia • crise tendendo a moderada ou grave;
com palpitações; aumento no desbalanceo da relação • 2º atendimento pela mesma crise;
V/Q com conseqüente queda da PaO2.
• 3ª crise leve no último mês;
O agonista β2 usado por via inalatória, diluído em • internação por crise asmática moderada no último
2 a 4 ml de soro fisiológico, com um fluxo de mês;
oxigênio de 6 L/min, induz ao máximo a estimulação • mais de 3 internações por crise asmática moderada
β2 com um mínimo de efeitos colaterais. O uso de no último ano;
oxigênio minimiza as conseqüências do desbalanceo
• internação por crise asmática grave no último ano;
da relação V/Q. Os mais utilizados são:
• Fenoterol: 0,05 a 0,1 mg/Kg/dose, até o máximo Usa-se prednisona ou prednisolona, por VO, ou metil-
de 2,5 mg/dose. Na apresentação em gotas a prednisolona, por via IM, (início de ação = 2 a 6
0,5%, usa-se uma gota/3Kg/dose, até o máximo horas, tanto IM como VO) na dose inicial de 2 mg/
de 10 gotas. Kg (máximo = 125 mg), seguida de 1 mg/Kg/dose
(máximo = 60 mg) a cada 6 horas, até haver melhora.
• Salbutamol: 0,1 a 0,2 mg/Kg/dose, até o máximo
de 5 mg/dose. Na apresentação em gotas a 0,5%, Os corticosteróides agem em múltiplas etapas da
usa-se uma gota/2Kg/dose, até o máximo de 20 cascata inflamatória da via aérea, suprimindo-a e
gotas. restaurando sua função.

Classificação da resposta ao uso de β2 agonista de efeito rápido

Parâmetro Completa Incompleta Ruim

Uso de músculos acessórios Ausente Presente Intensa

Sat O2 > 95% 91 a 95 % < 91%

FR e FC Normais Aumentadas Muito aumentada

Dispnéia Ausente Presente Intensa

Ausculta Normal Sibilos presentes Sibilância intensa

PFE > 80% 50 a 80% < 50%

Duração do efeito > 4 horas < 2 horas Sem efeito

Obtendo-se uma resposta completa que se mantém 60 mg/dia, uma vez pela manhã), deve ser
por 4 horas, continua-se com as inalações a cada mantido por mais 5 a 7 dias e, se o paciente já
4 a 6 horas por mais 5 dias ou até ficar 2 a fazia uso de corticosteróide inalatório para
3 dias sem sintomas. Se indicado na abordagem tratamento entre as crises, recomenda-se que faça
inicial, o corticosteróide por VO (Prednisolona uso do dobro da dose habitual nos próximos 5 a
ou Prednisona – 1 mg/kg/dia, no máximo 7 dias.

146 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Por ocasião da alta é importante assegurar que o 1 mcg/Kg/min, quando associa-se o β2-agonista
paciente está bem orientado quanto ao uso dos por via inalatória de 1/1 hora por 6 a 12 horas.
medicamentos e quanto à continuidade do tratamento
São indicativos da eminência de uma parada
de manutenção fora das crises de asma.
cardiorrespiratória e, portanto, indicações para
Se houver resposta incompleta ou crise moderada, intubação traqueal e ventilação pulmonar mecânica.
mantém-se as inalações com β2 agonista a cada 20 • excitação ou depressão do nível de consciência;
minutos, com reavaliações nos intervalos, e inicia-se
• choro curto, dificuldade para completar uma
o uso de corticosteróide por via oral ou IM. Após a
sentença ou deglutir em uma respiração;
introdução deste, acrescenta-se na inalação um
• confusão mental ou tontura;
anticolinérgico (brometo de ipratrópio), também a
cada 20 minutos na primeira hora e, depois, a • movimentos tóraco-abdominais paradoxais;
cada 4 a 6 horas. • bradi ou taquicardia;

A dose de brometo de ipratrópio é de 4 a 7 µg/Kg • ausência de murmúrio vesicular;


ou, para crianças até 4 anos, de 0,125 a 0,250 mg/ • pulso paradoxal > 40 mmHg ou ausente (fadiga
dose e, para crianças maiores, 0,250 a 0,500 mg/ respiratória?);
dose (solução a 0,025% – 10 gotas = 0,125 mg). • pH < 7,2; PaO2 < 60 mmHg e PaCO2 > 42
mmHg;
Havendo resposta completa, procede-se como
descrito anteriormente. A intubação traqueal é um procedimento de risco e
pode piorar o broncoespasmo. Antes da intubação,
Persistindo a resposta incompleta, mantém-se a
deve-se fornecer uma FiO2 de 100% e oferecer
corticoterapia e o brometo de ipratrópio e passa-se
líquidos, por via IV ou IO, 10 ml/Kg, para melhorar
a utilizar nebulizações de salbutamol - 0,5 mg/Kg/
o retorno venoso que provavelmente diminuirá pela
hora, ou fenoterol - 0,3 mg/Kg/hora, de modo
aplicação da pressão positiva. A anestesia pode
intermitente (1/1 hora) ou contínuo, dependendo da
minimizar este risco, com o uso, por via IV ou IO ,de
tolerância do paciente ao uso de máscara, diluindo
bloqueio vagal com atropina - 0,01 a 0,03mg/Kg
a droga em 20 ml de SF e sob fluxo de O2 de 6
( dose mínima = 0,1mg e dose máxima = 0,4mg),
L/min. Esta solução deve ser trocada a cada 4
sedação com cetamina - 2 a 4mg/Kg - 2 a 4
horas. Nas crianças que não toleram nebulização
minutos e midazolam – 0,1 a 0,2mg/Kg em 2 a
pode-se usar a terbutalina, na dose de 0,01 ml/Kg
4 minutos (máximo = 6mg) e bloqueio neuromuscular
de 1/1 hora, por via SC.
com vecurônio - 0,08 a 0,1mg/Kg, ou atracurio -
Havendo resposta completa que se mantém por 4 a de 0,3 a 0,5mg/Kg. A succinilcolina e o tiopental
6 horas, procede-se como descrito anteriormente. são contra-indicados pois podem exacerbar o
broncoespasmo.
Nas crises graves é aconselhável continuar o
tratamento em UTI. Usa-se o β2-agonistas por via IV, Após a intubação, deve-se oferecer oxigênio (FiO2)
mantendo a corticoterapia, agora por via IV lenta, e suficiente para conseguir PaO2 > 70 mmHg e SatO2
o brometo de ipratrópio, por via inalatória. As drogas > 91%. A correção da hipoxemia reduz parcialmente
mais utilizadas são o salbutamol ou a terbutalina a hipertensão pulmonar.
(500mcg/ml) na dose de ataque de 10 mcg/Kg, IV Os objetivos da ventilação pulmonar mecânica são:
em 10 minutos, seguida de infusão de 0,2 a 0,4 promover oxigenação adequada (PO2 > 70mmHg)
mcg/Kg/min, diluída em soro fisiológico, com até que a medicação broncodilatadora e
aumentos de 0,1 mcg/Kg/min a cada 30 minutos antiinflamatória exerçam seus efeitos; aliviar a fadiga
(máximo = 4 mcg/Kg/min ou FC > 200 bpm). Seu muscular e compensar a acidose. (pH > 7,3).
uso prolongado e intensivo produz hipopotassemia,
que deve ser monitorada. A analgesia e sedação são mantidas por pelo menos
24 horas com midazolam - 0,06 a 0,12mg/Kg/
Assim que houver melhora clínica evidente que hora e fentanil - 1 a 5 mcg/Kg/hora. Eventualmente
se mantém por pelo menos 4 horas, inicia-se sua é necessário manter o bloqueio neuromuscular com
retirada de 1 mcg/Kg/min a cada 2 a 4 horas até vecurônio - 0,08 a 0,1 mg/Kg, a cada 60 minutos

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 147


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

ou, de modo contínuo, 0,05 a 0,1 mg/Kg/hora, VII – Referências Bibliográficas:


ou atracurio - 0,1mg/Kg, a cada 20 a 45 minutos
01 - CARVALHO, W.B.; OLIVEIRA, N.F.: Estado de mal
ou, de modo contínuo, 0,4 a 0,8 mg/Kg/hora. asmático. In: MATSUMOTO, T.; CARVALHO, W.B.;
HIRSCHHEIMER, M.R.: Terapia Intensiva Pediátrica –
Pode ser realizada com aparelhos ciclados a volume 2ª edição. São Paulo, Atheneu, 1997, p 301-314.
ou a tempo com pressão limitada. Inicia-se com 02 - DOBYNS, E.L.; DURMOWICZ, A.G.; HENRY, D.B.;
LOFTNESS, S.L.; STERMARK, K.R.: Critical care. In: HAY
uma freqüência respiratória de ciclagem baixa Jr., W.W.; HAYWARD, A.R.; LEVIN, M.J.; SONDHEIM,
(10 a 20 ciclos/min), volume corrente de 8 a J.M. (Ed): Current Pediatric Diagnosis and Treatment -
10 ml/Kg, aceitando-se a possibilidade de 14th Ed.. Stanford, Appleton & Lange, 1999, p 325-327.

hipercapnia e acidose respiratória moderadas 03 - FREW, A.J.: Choosing therapy for childhood astham.
N. Engl. J. Med. 337: 1, 1997.
(hipercapnia permissiva ou hipoventilação 04 - HIRSCHHEIMER, M.R.; CARVALHO, W.B.: Asma aguda
controlada). A relação inspiração:expiração deve na infância. Ped. Moderna, 31 (1): 5, 1995.
ser de 1:2 até 1:4. 05 - NATIONAL HEART, LUNG AND BLOOD INSTITUTE:
Guidelines for Diagnosis and Management of Asthma. In
Uma expiração incompleta resulta em pressão Expert Panel Report 2. Bethesda, NIH Publication, 97 -
4051, July 1997.
alveolar positiva no final da expiração (auto-PEEP).
06 - NICHOLS, D.: Respiratory Failure - Asthma. In NICHOLS,
Na asma grave há distribuição regional heterogênea D.: Golden hour: the handbook of advanced pediatric
dos gases, com as unidades normais expostas a life support, 2nd ed, St Louis, Mosby, 1996: p: 63-71.
pressão de distensão e volume excessivos pode 07 - PIVA, J.P.; CANANI, S.F.; PITREZ, P.M.C.; STEIN, R.T.:
Asma aguda grave na criança. Jornal de Ped. 74 (supl.1):
ocasionar barotrauma, volutrauma e alterações S59, 1998.
hemodinâmicas. Pode-se reduzir o volume inspiratório 08 - RODRIGUES, J.C.; SILVA FILHO, L.V.R.F.S.: Crise asmática.
final diminuindo o volume corrente e aumentando o In: Protocolo de conduta da assistencia médico hospitalar
do Hospital Israelita Albert Einstein, 1999.
tempo expiratório.
09 - SHEFFER, A.L.; BARTAL, M.; BOUSQUET, J; et cols.: Global
strategy for asthma management and prevention. In NHLBI/
A utilização de tratamentos mais complexos, que WHO WORKSHOP REPORT: A Practical Guide for Public
requerem equipes especializadas no manejo de Health Officials and Health Care Professionals.: Bethesda
equipamentos sofisticados de elevado custo, como – USA & Ghent – Bélgica, Global Initiative for Asthma,
1997.
oxigenação de membrana extracorpórea, hipotermia
10 - SOLÉ, D.; NUNES, I.C.; RIZZO, M.C.V.; NASPITZ, C.K.:
e suporte de vida com remoção extracorpórea de A asma na criança: classificação e tratamento. Jornal de
CO2, deve ser considerada apenas quando não se Ped. 74 (supl.1): S48, 1998.

consegue êxito com a terapêutica convencional acima 11 - TAKETOMO, C.K.; HODDING, J.H.; KRAUS, D.M.:
Pediatric dosage handbook – 6th Ed. Hudson, Lexi-Comp
exposta. Inc, 1999, p 1079-1085.

Estado de Mal Epilético


SÉRGIO ANTÔNIO ANTONIUK

O “estado de mal epiléptico” é definido como crises fisiopatológica, anatômica e etiológica9. A definição
epilépticas tão freqüentemente repetidas ou do tempo de crise é muito discutida e ainda não
prolongadas que criam uma condição epiléptica fixa existe um consenso. Para alguns, cinco minutos de
e duradoura. Shorvon tem proposto a seguinte crise generalizada tônico-clônica já envolve falha
definição: é uma desordem cuja atividade epiléptica dos mecanismos inibitórios para controle da crise, o
persiste por trinta minutos ou mais, causando um que implica no tratamento imediato. Outros
amplo espectro de sintomas e uma variável base consideram vinte minutos como o tempo máximo de

148 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

crise relacionada a seqüelas6,10.O termo tem sido cerebelo, no tálamo e nas camadas corticais médias
aplicado a crises contínuas que durem no mínimo desenvolve-se após 60 minutos de estado de mal.
trinta minutos, mesmo quando a consciência não
Desde que os neurônios vulneráveis podem sucumbir
está comprometida. O estado de mal epiléptico é
no estado convulsivo, apesar de uma oxigenação
atualmente classificado como:
cerebral adequada e suprimento de glicose e energia,
1 - Estado de mal epiléptico convulsivo, no qual o suspeita-se que a morte celular resulte de um aumento
paciente não recupera o estado de alerta entre as excessivo nas necessidades metabólicas dos neurônios
crises tônico-clônicas repetidas. continuamente em descarga. Além disso, demonstrou-
2 - Estado de mal epiléptico não convulsivo, como se que após 20 minutos de estado convulsivo as
o estado de ausência e o estado parcial complexo, reduções na pressão parcial de oxigênio e no citocromo
no qual a apresentação é um estado prolongado de aa3 do córtex cerebral diminuem, e uma insuficiência
semi-consciência. de oxigênio regional adiciona-se à subsequente injúria
3 - Crises parciais contínuas nas quais a consciência celular. O estado convulsivo e as descargas elétricas
é preservada. neuronais devem ser interrompidas o mais rápido
possível, desde que os acontecimentos moleculares que
levam à injúria celular seletiva já estão ocorrendo durante
RISCOS ASSOCIADOS AO as primeiras duas ou três convulsões. Uma outra razão
ESTADO DE MAL EPILÉPTICO6,11,12 pela qual o estado convulsivo não deve prolongar-se
O estado de mal epiléptico tônico-clônico é uma além de 60 minutos é o aparecimento de complicações
emergência neurológica e deve ser interrompido o metabólicas secundárias.
mais rapidamente possível. Não se deve permitir
Após 60 minutos de estado, a acidose lática se
que se prolongue por mais de 20-60 minutos, quando
torna proeminente e a pressão do liquor aumenta.
ocorre dano cerebral permanente ou morte. A
Há hiperglicemia inicial, seguida por hipoglicemia e
duração média do estado convulsivo em pacientes
hipertermia, sudorese excessiva, desidratação,
que vêm a falecer é de 13 horas. Os índices de
hipertensão seguida por hipotensão e choque
mortalidade atualmente vão de 2,5 a 6%;
eventual. A atividade muscular excessiva pode
anteriomente variavam de 5 a 50%.
produzir miólise e mioglobulinúria levando a nefrose.
Estudos experimentais demonstram que dano celular Podem ocorrer insuficiência cardiovascular,
permanente no hipocampo, na amígdala, no respiratória ou renal

No atendimento ao paciente com Estado de Mal Epiléptico temos quatro objetivos:

1) Manter os sinais vitais, assegurar uma boa ventilação;

2) parar as crises, se possível antes de 20 a 30 minutos, quando iniciam lesões que poderão ser irreversíveis.

3) Realizar exames complementares durante o tratamento do estado de mal*.

4) Identificar e tratar a etiologia do estado de mal**.

* Liquor ** Estado de mal - etiologia


Eletroencefalograma Grupo I - estática
Hemograma, amônia, Transaminases, – exacerbação de crises em epilépticos
Perfil metabólico completo, glicemia, ácido lático Grupo II - aguda
Coagulograma – acidente vascular
Tomografia computadorizada do crânio ou – trauma
ressonância magnética – infecção
Triagem toxicológica – encefalopatia anóxica
Pesquisa para erros inatos do metabolismo – causa metabólica
Culturas de sangue, urina e liquor

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 149


Emergências
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Manejo Terapêutico do Estado de Mal Epilético1,2,4,7,8,9,10,

TEMPO DE TRATAMENTO PROCEDIMENTO

0-10 minutos 1) Verifique a função cardiorespiratória assim que o estado de mal epiléptico é
diagnosticado. Se não há certeza do diagnóstico, observe uma crise tônico-clônica
e verifique a presença de inconsciência ao fim da crise. Insira uma cânula de guedel
e administre 02 se necessário. Instale uma via endovenosa. Colha sangue venoso para
determinação de nível de anticonvulsivantes, glicose, creatinina, eletrólitos e hemograma.
Colha sangue arterial para determinação imediata de pH, pO2, pCO2, Bic, BE.
Monitore a respiração, pressão sangüínea se possível, eletroencefalograma.
2) Inicie infusão endovenosa de glicose a 10%, 2 ml/kg, desde que o Dextrostix esteja
em 45% mg/dl ou menos.
3) Infunda Diazepam EV*, (0,4 mg/kg/dose) não mais rapidamente que 1 mg/min.,
até cessar a crise ou que um máximo de 10 mg seja aplicado. Administração Retal
(0,5 mg/kg) ** pode ser usado, repetir a dose em 10 minutos Midazolam (Dormonid
3 ml = 15 mg) na dose de 0,2 mg/kg/Im ou EV pode ser utilizado como opção
inicial ou após Diazepan2,3,5. A seguir, infusão de difenilhidantoína ***, não mais
rapidamente que 1 mg/kg/min. em um total de 15-20 mg/kg (diluir em 20 a 30 ml
de soro fisiológico e aplicar em 20 min.). Se surgir bradicardia ou hipotensão diminua
a velocidade de infusão. (*) Valium (2ml=10mg). (**) Máximo de 10 mg (***)
Hidantal (5 ml = 250 mg).

30 - 60 minutos 4) Se as convulsões persistirem, aplicar Fenobarbital não mais rapidamente que


1 mg/kg/min. (em 20 a 30 minutos) na dose de 15 a 20 mg/kg, ou Midazolan
0,2 mg/kg E.V. (dose de ataque) seguido de 1 a 18 mcg/kg/minuto ou 0,06 a
1 mg/kg/hora em bomba de infusão contínua (efeito em 1,5 a 5 minutos/vida média
de 1 a 5 horas)2,3,5.

60 a 120 minutos Neste momento temos 2 opções de tratamento:


1) Uso de outras drogas ou
2) Anestesia Geral
Nós preferencialmente realizamos anestesia geral com Thionembutal (1 a 3mg/kg/EV
em Bolo, seguido de infusão contínua com bomba de infusão na dose de 10 -
100 ucg/kg/min) e bloqueio neuromuscular com curare.

Outras Drogas

PARALDEÍDO Se houver disponível, iniciar infusão de 0,3 ml/kg, com dose intraretal a cada 2 -
4 horas, endovenoso 5 ml/kg de ataque e manutenção com 0,5 ml - 15 ml/kg/hora.

LIDOCAÍNA 3 mg/kg E.V. em SG 5% em bolo - diluição 1 a 2 mg/ml manutenção -


1 a 3 mg/kg/hora.

ÁCIDO VALPRÓICO 30 mg/kg via retal diluído em água dest. 1:1.

CARBAMAZEPINA 10 a 20 mg/kg via sonda nasogástrica.

HIDRATO DE CLORAL a 8% 0,5l/kg via SNG de 8/8 horas

150 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
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Tratamento do Estado de Mal Epilético - Criança

História DIAZEPAN Aspiração das vas


Exame 0,4 mg/kg EV Oxigenação
0,5 mg/kg/via retal Monitoração Card-Resp
ou Glicose 10% - 2ml/kg-EV
MIDAZOLAN (medir c/ Destrotix)
0,2 mg/kg/IM


Coleta de Sangue
Perfil Metabólico
10 minutos
Gicemia, Hemograma,
TGO, TGP,
Repetir Diasepan Uréia, Creatinina, etc



DIFENILHIDANTOÍNATO Fenobarbital
15-20 mg/kg/EV 10 minutos 15-20 mg/kg/EV


MIDAZOLAM
0,2mg/kg/EV
Manutenção = 1 a 18
mcg/kg/minuto
ou 0,06 a 1,0mg/kg/dia

OUTRAS DROGAS
THIONEMBUTOL

Referências Bibliográficas 06 - Scott RE, Surtees RAH, Nevirle BGR. Status Epilepticus:
pathophysiology, epidemiology and outcomes. Arch Dis
Child 79:73-77, 1998.
01 - Delgado - Escueta, A.V.; Waterlain, C.; Treiman, D.M. 07 - Shildz W.D. Estatus Epilepcticus. Ped. Clin. North Americ.
and Porter, R.J.: “Management of Epilepticus”. N. Engl. J. 36 (2) 383 - 393, 1989.
Med. 306: 1337 – 1340, 1982. 08 - Shinnar, S & Gross-Tsur, V. Convulsive Status Epilepticus in
02 - Kumar A & Blecker T.P. Intravenous midazolan for treatment Children. Epilepsia, 34 (suppl.1): 12-S 20, 1993.
of refractory Status Epilepticus Crit. Med. 20: 483 09 - Shorvns S. Status epilepticus: its clinical features and
488, 1992. treatment in adults and children. Cambridge University
Press, 1994.
03 - Lal Koul R, Ray Aithal G, Chacho a, Joshi R, Seif Elbualy
M. Continuous midazolan infusion as treatment of status 10 - Tasker RC. Emergency treatment of acute seizures and
epilepticus. Arch Dis Child 76: 445-448, 1997 status epilepticos. Arch Dis Child 79: 78-83, 1998
11 - Walton. N.Y. Systemic Effects of Generallized Convulsive
04 - Ramsay, R.E. Treatment of Status Epilepticus. Epilepsia, 34 Status Epilepticus. Epilepsia, 34 (suppl.1): S 54 - S 58,
(suppl.1.): 71-S 81, 1993. 1993.
05 - Rivera R, Segnini M, Baltodano A, Peruzu Midazolan in 12 - Wasterlain, C.G. et al. Pathophysiological Mechanisms of
the treatment of status epilepticus in children. Crit Care Brain Damage from Status Epilepticus Epilepsia, 34
Med 21: 991-994, 1993. (suppl.1): S 37 - S 53, 1993.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 151


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Trauma Pediátrico
ZULEIDE MUNIZ ALVES

O trauma continua sendo uma causa importante de e o tratamento é considerado crítico. Estes dois picos
morte e deficiência física na faixa etária pediátrica. de mortalidade integram as chamadas horas de
Como a criança, vítima de trauma, tem grande ouro do atendimento de urgência, quando a
potencial de recuperação, a ressuscitação deve intervenção médica é fundamental para a redução
começar o mais rápido possível, após a lesão, da morbi-mortalidade. As mortes tardias integram o
preferencialmente no local onde o trauma ocorreu. terceiro pico de morte por acidente, ocorrendo dias
e semanas após o trauma, sendo causada por
Qualquer pediatra pode, repentinamente, deparar-se
distúrbios cardiorespiratórios, metabólicos, falência
com uma vítima de múltiplos traumas. Os primeiros
de múltiplos órgãos ou infecção.
20 minutos de tratamento são essenciais para a
determinação do prognóstico da criança Existem particularidades na criança, em relação ao
politraumatizada. adulto, que tornam o trauma mais crítico. Assim, a
massa craniofacial é maior, o pescoço relativamente
No Brasil, óbitos por tipo de causas externas em
mais curto e a musculatura cervical mal desenvolvida,
crianças de 0 a 19 anos tínhamos um total de
aumentando o risco de traumatismo craniano e lesão
20.678 em 1995. Desses, 30% foram por acidentes
cervical.
com transporte, 27% por agressões e violência, 22%
por causas mal definidas. A elasticidade e flexibilidade dos tecidos
proporcionam reduzida proteção aos órgãos
As regiões do corpo mais atingidas no Politraumatismo
subjacentes e permitem a absorção de maior
são: cabeça, 59%; coluna, 2%; extremidades, 26%;
quantidade de energia sem fratura, logo, uma criança
tórace e abdômen, 12%.
é capaz de não ter fratura após um forte impacto,
Chamamos paciente pediátrico politraumatizado podendo, porém, apresentar um trauma de víscera.
aquele cujas lesões envolvem um órgão ou mais, ou O tamanho reduzido da cavidade abdominal da
um sistema ou mais, incluindo a área psíquica. criança e sua propensão a deglutir ar, com
Portanto, é sempre necessário uma equipe. A conseqüente distensão gástrica, associam-se e
condução da equipe fica a cargo do profissional comprometem a ventilação. A vítima pediátrica, por
com mais experiência em trauma. ser pequena, é fácil de ser transportada e numa
O atendimento na primeira hora é fundamental para situação de emergência, devido à rapidez no
que sejam prestadas a assistência inicial e a atendimento, ela pode ser mobilizada erroneamente,
estabilização do paciente, além de servir como fator o que causa ou agrava as lesões, ex.: fletindo o
de prognóstico. pescoço, expondo as fraturas.

Temos três picos de mortalidade, em função do tempo.


O primeiro pico são mortes imediatas que ocorrem
na 1ª hora, após o acidente. Estas mortes são
Atendimento Inicial
causadas, em 95% das vezes, por lacerações do A avaliação inicial é feita por profissionais de saúde,
cérebro, do tronco cerebral, da medula espinhal, do responsáveis pela assistência pré-hospitalar, que
coração e dos grandes vasos. mantêm a via respiratória, protegem a coluna cervical,
estabelecem o acesso endovenoso e ressuscitação
O segundo pico refere-se a mortes precoces, nas
hídrica, transportando o paciente para um serviço
primeiras quatro horas, pós trauma. São causadas
adequado.
por hemorragia intensa, resultante de lesões no sistema
respiratório, em órgãos abdominais, como fígado, A criança politraumatizada pode apresentar tanto
baço e vísceras ocas e no SNC, incluindo hematoma falência respiratória, como choque, ambos
subdural ou epidural, como pneumotórace e aumento necessitando de tratamento rápido e eficaz. A
de pressão intracraniana. As lesões desse grupo são avaliação e o suporte da função cardiopulmonar
consideradas tratáveis e o intervalo entre o acidente são aspectos fundamentais do atendimento nos

152 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

primeiros minutos. Ao mesmo tempo em que a criança com traumatismo craniano e no


avaliação cardiopulmonar está sendo feita, um reconhecimento e tratamento da hemorragia interna.
rápido exame torácico abdominal deve ser realizado,
Escores para a quantificação do trauma têm sido
a fim de detectar lesões no tórax, quando representem
pouco utilizados em pediatria. Um dos mais usados
risco de vida ou que possam interferir com o sucesso
é o Escore de Trauma Pediátrico ou Escore de Tepas.
da ressuscitação.
O escore máximo tem 12 pontos que correspondem
Os erros mais comuns na ressuscitação pediátrica ao trauma mínimo. Todo paciente com escore Tepas
do trauma são: falha na abertura e manutenção da menor do que 8 deverá ser transferido para um
via aérea, na oferta adequada de fluído para a Centro de Referência.

Escore de trauma pediátrico ou escore de Tepas

Valor + 2 + 1 – 1
Peso > 20 kg 10 a 20 kg < 10 kg
Via aérea Normal Mantida/O2 Insustentável/Intubada
PA sistólica > 90 mmHg 50-90 mmHg < 50 mmHg
Nível de consciência Acordada Confusa Coma
Ferimento Ausente Mínimo Grave ou penetrante
Fratura Normal Fechada Exposta ou múltipla
Modificado de Tepas JJ.Mollit Dt. Talbert JL et al. 1987

Pressão Arterial (mmHg)

Idade Sistólica Diastólica


R.N. 70 45
1 Ano 80 60
4 Anos 85 60
6 Anos 90 60
8 Anos 95 60
10 Anos 100 65
12 Anos 110 70

A regra do ABC do trauma é uma conduta válida avaliação neurológica, E - Exposição (retirada da
e eficaz: A - Via aérea, B - Respiração, C - roupa), reavaliação - avaliação dos demais sistemas
Circulação, D - Deficiência, (incapacitação) rápida e etiologia da parada.

A - Vias Aéreas

Avaliar Tratamento
Permeabilidade da via respiratória Estabilização cervical
Nível de consciência Aplicar O2 a 100%
Traumatismo Maxilofacial Abrir a via aérea
Intubar: Glasgow < 8
Reflexo de engasgo (–)
PaO2 < 50 ou PaCO2 > 50

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 153


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Abrir - Abrir a via aérea com manobra modificada segundos, perguntando-lhes seu nome ou outros
de elevação da mandíbula, enquanto se mantém a dados. A capacidade de responder confirma a
estabilização manual linear da coluna cervical, é presença de uma via respiratória pérvia e dá idéia
difícil no paciente pediátrico com trauma. A via aérea de comprometimento neurológico. Deve-se oferecer
é estreita sendo obstruída com facilidade por materiais oxigênio mesmo com a criança consciente através
estranhos como sangue, muco e fragmentos dentários de máscara ou cateter nasal até que se assegure de
que devem ser removidos. que não é mais necessário. Se houver distensão
gástrica e comprometimento do sensório, faz-se
Em relação aos adultos a coluna cervical da criança
necessário a colocação de uma sonda gástrica para
é mais elástica e tem maior mobilidade. A vértebra
descompressão do estômago e para evitar vômito.
é menos rígida. A cabeça da criança é maior do
que a do adulto; portanto, tem maior risco de ser São as seguintes as indicações de entubação
lançada durante uma queda ou ser propelida de um endotraqueal da criança vítima de trauma:
automóvel. • Parada respiratória
O comprometimento da coluna cervical pode ser • Insuficiência respiratória (hipoventilação, hipoxema
anatômicas ou funcional. A alteração anatômica está arterial mesmo com oferta de oxigênio e ou acidose
associada à alteração óssea vertebral, enquanto a respiratória)
alteração funcional consiste de comprometimento de • Obstrução da via aérea
medula espinhal sem anormalidade radiológica. Isto
• Coma - escore de Coma Glasgow = menor ou
é devido à relativa frouxidão dos ligamentos da
igual a 8
coluna cervical ao desenvolvimento incompleto da
musculatura do pescoço. Por definição, este tipo de • Necessidade de suporte ventilatório prolongado
lesão de medula não pode ser excluído por (ex.: lesões torácicas, grave instabilidade
radiografia. Sendo assim, o comprometimento da hemodinâmica)
coluna cervical deve ser considerado como estando A intubação endotraqueal da criança vítima de trauma
presente em todas as crianças com politrauma pode ser difícil, uma vez que o pescoço precisa
especialmente naquelas que apresentam apnéia, permanecer em posição neutra. A via preferencial
exigindo que sejam tomadas precauções para evitar para intubação é a oral pois a via nasal pode levar
piora da lesão. Colocar um colar cervical de tamanho a sangramento, obstruindo a visibilidade e retardando
adequado e fixar a cabeça com blocos de espuma a intubação, além de comprometer possíveis fraturas
ou rolos de lençol e fita de contenção. A extensão de ossos da base do crânio.
da cabeça deve ser discreta. A imobilização
Um tubo endotraqueal 3 a 3,5 mm de diâmetro
adequada da coluna cervical é alcançada com a
interno é adequado para recém-nascidos a termo e
utilização de uma prancha longa .
crianças pequenas, de 4 mm de diâmetro interno
Na criança consciente podemos avaliar a no 1º ano e de 5 mm para o 2º ano. Uma fórmula
permeabilidade da via respiratória em poucos usada para crianças maiores de 2 anos é:

Idade x Calibre da Cânula Endotraqueal


(Calibre Interno)

Idade Diâmetro Interno

Prematuro 2,5 a 3,0


Recém-nascido 3,0
Recém-nascido - 6 meses 3,5
6 meses - 12 meses 3,5 a 4,0
12 meses - 2 anos 4,0 a 4,5
Acima de 2 anos Idade (anos) + 16
4

154 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

A sedação da criança com trauma em ventilação O uso do sedativo e narcóticos é contra-indicado se


mecânica deve ser feita com agente de curta duração, o paciente estiver hipotenso.
se está normovolêmica usamos o thiopental 3 a 5 Cricotireoidostomia é um procedimento de urgência
mg/kg dose eventualmente associada a um utilizado em crianças nas quais a ventilação por
bloqueador neuro muscular como a succinicolina 1 máscara e a intubação endotraqueal não foram
a 2 mg/kg/dose. No paciente hipovolêmico ou em possíveis ou em traumas faciais e faríngeos extensos.
choque sem hipertensão intracraniana usamos Com o laringoscópio de fibra ótica caiu muito a sua
ketamina 1 a 2 mg/kg/dose no lugar do Fentanol. necessidade. A traqueostomia é reservada para
Sedativos e narcóticos só devem ser utilizados por circunstâncias controladas normalmente, uma ou duas
uma equipe que esteja familiarizada com o seu uso. horas após a estabilização.

B - Respiração

Avaliar Tratamento

Freqüência respiratória Pneumotórax hipertensivo


Ritmo (respiração paradoxal) Hemotórax
Movimentos torácicos simétricos Pneumotórax aberto
Timpanismo ou macicez à percussão - Contusão/fragilidade torácica
ferimentos aberto

Vamos agora avaliar a dinâmica respiratória, tânea de realizar uma radiografia de tórace,
observando a expansibilidade torácica simétrica e punciona-se o lado suspeito com cateter agulhado
adequada bilateralmente, ou não, a freqüência números 14 ou 16 no 4º ou 5º espaço intercostal,
respiratória presença de lesões penetrantes. Auscultar na linha axilar média ou posterior, para promover
o tórace procurando presença de hemotórace ou a retirada do ar ou sangue aprisionados. Quando
pneumotórace. Verificar ausência de cianose e medir o volume retirado for grande, deve-se drenar
a saturação de hemoglobinas com oxímetro de pulso, imediatamente o tórace, no local da punção como
esperando uma saturação maior do que 90%. dreno tubular de grosso calibre. Pode também ser
Hiperventilação se houver suspeita de hipertensão puncionado no 2º espaço intercostal na linha
craniana, pois reduz a pressão. hemiclavicular. Se a ventilação está dificultada,
Se identificar um pneumotárace hipertensivo ou reavalie se há obstrução ou mau posicionamento
hemotórace, não havendo possibilidade momen- do tubo endotraqueal.

C - Circulação

Avaliar Tratamento
Reenchimento capilar retardado Sinais vitais (5 min)
Pulso periférico Oximetria e ECG
Taquicardia, pele fina e moteada Acesso vascular (2)
Alteração do sensório Ressuscitação volumétrica
Papa de hemácias - 10 ml/kg

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 155


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

O trauma na criança freqüentemente resulta em de sangue totaliza mais de 15% da volemia são
significativa perda de sangue, sendo a freqüência observados sinais de falência circulatória (taquicardia,
cardíaca, perfusão sistêmica, monitores do débito diminuição da intensidade dos pulsos periféricos,
cardíaco. Quando a criança apresenta perda de enchimento capilar lento e extremidades frias. A
sangue, a transfusão sangüínea é de extrema vasoconstricção causada pela hipovolemia pode
importância, a fim de restaurar a oferta de oxigênio manter a pressão arterial com até 25% de perda do
bem como o volume intravascular. A falência no volume sangüíneo. Os sinais de choque podem
reconhecimento e controle da hemorragia interna inicialmente ser súbitos na criança e difíceis de se
parece ser a principal causa de óbito passível de diferenciar dos sinais de dor ou medo.
prevenção em crianças com múltiplas lesões. A
Após o trauma ocorre perda para o terceiro espaço,
intervenção cirúrgica pode ser necessária para
que é proporcional à extensão do trauma e perda
controle da hemorragia. Por esta razão, uma
sangüínea. Embora não haja consenso a reposição
avaliação e estabilização da perfusão da criança
dessas perdas é feita com soluções cristalóides.
precisa ser realizada rapidamente com a participação
Utilizamos até 60 ml/kg (soro fisiológico ou Ringer
precoce do cirurgião.
lactab). A necessidade de mais volume para
Sinais de choques podem ser observados ao evoluir reposição deve ser suprida com coloides. O sangue
gradualmente após o trauma. Quando a perda aguda é preferido a partir da Classe III do choque.

Classificação do choque hemorrágico em pacientes pediátricos


vítimas de trauma baseada em sinais sistêmicos

Classe I Classe II Classe III Classe IV


Sistema Hemorragia muito Hemorragia leve Hemorragia moderada Hemorragia grave
leve (perda < 25% (perda 15% a 25% (perda 26% a 39% (perda ≥ 40%
da volemia da volemia da volemia da volemia

Cardiovascular Freq. cardíaca Taquicardia Taquicardia Taquicardia


normal ou significante intensa
discretamente elevada
Pulsos normais

Pressão arterial Pulsos periféricos Pulsos periféricos Pulsos centrais


normal podem estar diminuídos filiformes filiformes
pH normal Pressão arterial normal Hipotensão Hipotensão significante
pH normal Acidose metabólica Acidose significante

Respiratório Freqüência normal Taquipnéia Taquipnéia moderada Taquipnéia severa

Sistema nervoso Ligeiramente Irritado, confuso Irritado ou letárgico Letárgico


central ansioso Combativo Resposta à dor diminuída Coma

Pele Quente, rósea Extremidades frias, Extremidades frias, Extremidades frias,


redilhado rendilhado ou palidez palidez ou cianose
Enchimento capilar Enchimento capilar Enchimento capilar
ativo retardado prolongado

Rins Débito urinário Oligúria, densidade Oligúria, uréia Anúria


normal aumentada aumentada

Texbook of Pediatric Emergency Medicine, 2ª ed. Baltimore.

Deve-se ter um bom acesso venoso (dois periféricos), femural. A utilização de veia tronco (subclávia,
se em 90 segundos não obtivermos essa via, tentar jugular) só poderá ser realizada após exclusão de
o acesso intra-ósseo em crianças com menos de 6 lesões nessa área.
anos ou dissecção de safena nos maiores. Se O sangue deve ser administrado em bolus de
houver fracasso nesses dois métodos utilizar a veia 10 ml/kg. O aquecimento de produtos sangüíneos

156 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

auxilia no aumento da velocidade da transfusão e Deve-se lembrar a possibilidade de anemia aguda


no reaquecimento do paciente. Estes bolus devem sem sangramento aparente nos grandes hematomas
ser repetidos até que a perfusão sistêmica torne-se de retroperitonio, ou focos de fratura de bacia ou
adequada. Caso após a infusão de 20-40 ml/kg femur. Nestes locais é possível a coleta de grandes
de solução cristaloide não ocorrer melhora da volumes sangüíneos nem sempre evidentes.
perfusão, da pressão arterial e do nível de Se há choque presente em uma criança com trauma
consciência, instala-se venóclise profunda para de crânio e não houver algum sangramento externo
verificar a pressão venosa central. a ser identificado, provavelmente estará ocorrendo
Corrigida e controlada a hipotensão, deve-se um sangramento interno e a hemorragia intra-
pesquisar a sede do sangramento para controlá-lo. abdominal precisa ser descartada.
Na maioria das vezes, o local do trauma sugere o Os sinais de sangramento intra-abdominal causam
foco da hemorragia hemotórace associado a fratura dor por ruptura orgânica, incluem abdômen tenso e
de costelas, ruptura de víscera parenquimatosa distendido que não melhora com a descompressão
nas contusões abdominais, hematúria nas lesões pela sonda nasogástrica e sinais de choque. O
de rins e bexiga após contusões pélvicas e/ou sangramento intra-abdominal, se associado ao choque,
lombares ou sangramentos externos em ferimentos é uma emergência cirúrgica, com risco de vida que
lacerantes. precisa ser avaliado e tratado por pessoa qualificada.

D - Deficiência/Incapacitação

Avaliar Tratamento

Nível de consciência Comunicar neurocirurgião


Glasgow: Melhor resposta verbal Intubar e hiperventilar
Melhor resposta motora Assegurar perfusão cerebral
Abertura ocular Assegurar oxigenação cerebral

Uma rápida avaliação do estado neurológico assegurando adequada perfusão cerebral e


é a próxima prioridade. Neste exame sumário oxigenação.
verificamos as pupilas (tamanho, simetria e O valor do Glasgow tem correlação com o prognós-
resposta à luz), o estado de consciência, tico. Graus abaixo de 8 estão relacionados com
utilizando-se a escala de coma de Glasgow. mortalidade alta e graves seqüelas neurológicas. A
Estes sinais podem ser indicativos de mortalidade é zero e as seqüelas são mínimas em
intubação endotraqueal e hiper ventilação pacientes politraumatizados com Glasgow acima de 8.

E - Exposição

Avaliar Tratamento

Examinar da cabeça aos artelhos Sonda nasogástrica


Chegar temperatura Cateter vesical
Examinar embaixo de roupas Aquecimento
Examinar embaixo de imobilizações Sangue que é bioquímica
Examinar as costas RX de coluna, tórax e pelve

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 157


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

A etapa final refere-se à exposição completa do prescritas para membros da família. Apenas em
paciente para definir todos os possíveis traumas. A 3,4% desses casos a medicação tinha sido prescrita
retirada da roupa é essencial para o exame e para para a criança.
permitir o procedimento. Colocação de sonda
O segundo grupo das intoxicações pediátricas é a
gástrica é necessário no paciente pediátrico, usamos
dos jovens e adolescentes de 12 a 19 anos que
de preferência uma sonda nasogástrica, exceto nos
ingerem medicações em tentativas ou gestos de
casos de fratura de base de crânio, quando usamos
suicídio.
orogástrica. A sonda vesical em todas as crianças
com lesão pélvica e politraumatismos graves com
esmagamento. A sondagem pode ser essencial nos 1. ESTABILIZAÇÃO
casos de controle do débito urinário mantido 1 a Avaliação rápida inicial das condições clínicas para
2 ml/kg/hora. verificar se o paciente apresenta alguma manifestação
Uma vez estabilizadas as condições de risco, uma que represente risco iminente de morte.
história detalhada deve ser obtida, assim como um Rotina de atendimento do paciente intoxicado na
exame físico completo. Exames laboratoriais, Raios X, emergência e/ou na UTIP.
que antes não era de importância vital, podem ser
a) Verificação dos sinais vitais do paciente: freqüência
obtidos. Após essas medidas iniciais na sala de
cardíaca e respiratória, pressão arterial e temperatura
emergência, os pacientes mais graves são transferidos
axilar;
para a UTI ou Centro Cirúrgico onde serão tratados
e observados. b) A anamnese deve obter o maior número de
informações em relação ao agente intoxicante (nome,
volume, recipiente, horário de exposição, local, uso
INTOXICAÇÕES AGUDAS
de medicações pela família) e evolução dos sintomas,
NA INFÂNCIA deve ser realizada concomitante ao exame físico.
As intoxicações agudas na infância são responsáveis Guardar os recipientes que sejam trazidos pela
por um grande número de atendimento nos serviços família;
de emergência pediátrica, e por uma porcentagem
c) Exame físico completo: retirar roupas e objetos
significativa das internações em Unidades de Terapia
contaminados, proceder à higiene ocular e da pele
Intensiva.
quando indicada; atentar para a pele, diâmetro
As intoxicações podem envolver dois grupos de pupilar, reação pupilar à luz, orofaringe e hálito,
crianças. O primeiro grupo é constituído pelas odor, nível de consciência, padrão ventilatório e
crianças com menos de cinco anos de idade que, circulatório (realizar hemoglioteste). Para avaliar a
pela curiosidade natural ou imitação dos pais, intensidade do coma em pacientes intoxicados,
ingerem acidentalmente produtos ou medicamentos utiliza-se a escala de Matthew, visto que a escala
encontrados em casa. Desses, os produtos de coma de Glasgow só tem valor prognóstico nos
domésticos são mais freqüentes. Estudos feitos por casos de trauma neurológico (quadro 1); avaliar a
Craft na Inglaterra, no período de 1974 a 1985, necessidade de suplemento de oxigênio, e até
das mortes de crianças com menos de 5 anos, mesmo de intubação e suporte ventilatório. Também
83% estavam relacionadas com medicações nesse momento inicial de avaliação do paciente,

Quadro 1 – Escala de coma de Matthew

Grau ZERO Normal


Grau 1 Sonolento, resposta a estímulo vocal
Grau 2 Coma, resposta a estímulo doloroso
Grau 3 Coma, resposta a estímulo máximo
Grau 4 Coma, sem resposta

158 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

verificar hidratação e perfusão periférica e instalar e) Identificação do agente toxicológico através o


acesso venoso e hidratação parenteral; Screening tem suas limitações pelo custo elevado e
demora dos resultados;
d) A necessidade de exame radiológico deve ser
individualizada. Exames laboratoriais: glicemia f) Síndromes tóxicas alguns sinais e sintomas
eletrólitos, prova de função renal e hepática, podem auxiliar no diagnóstico do tipo do veneno
hemograma coagulograma e gasometria são ou grupo de drogas responsáveis pelo quadro
úteis; clínico. (quadro 2).

Quadro 2 – Síndromes tóxicas

Síndromes Manifestações clínicas Principais agentes Monitoração clínica

Colinérgica Vômitos, diarréia, cólicas, Inseticidas Acompanhamento rigoroso


mal-estar, lacrimejamento, organofosforados, da função respiratória.
sialorréia, hipersecreção carbamatos, Nível de consciência.
brônqui-ca incontinência acetilcolina, nicotina, Avaliar resposta a antídotos.
urinária, bradicardia, cogume-los.
miose (muscarínicos),
tremores musculares,
paralisia, taquicardia,
hipertensão (nicotínicos)

Anticolinérgica Mucosa e pele secas, Atropina e derivados Nível de consciência.


rubor, sede, midríase, anti-histamínicos, Diâmetro pupilar.
hipertermia, delírio, anti-depressivos Controle TA
retenção urinária, tricíclicos. Monitoração cardíaca.
aluci-nações,
insuficiência respiratória.

Simpaticomimética Excitação do SNC, Efedrina, aminofilina, Monitoração cardíaca.


taquicardia, hipertensão, fenilpropanolamina Controle de TA
convulsões. (descongestionantes
tópicos e sistêmicos),
cocaína.

Narcótica (copiácea) Depressão do SNC, Morfina, codeína, Acompanhamento rigoroso


hipoventilação, miose, heroína, propoxífeno, da função pulmonar.
hipotensão, edema. difenoxilato. Nível de consciência.
Diâmetro pupilar.
Monitoração cardíaca.
Controle da temperatura.

Barbitúrica Depressão respiratória, Fenobarbital Acompanhamento da função


coma, miose, hipoter-mia, pulmonar.
vesículas cutâneas. Nível de consciência.
Diâmetro pupilar.
Monitoração cardíaca.
Controle da temperatura.

Barbitúricos Depressão respiratória, Fenobarbital.


coma, miose, hipoter-mia,
vesículas cutâneas.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 159


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

2. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Algumas patologias devem ser consideradas no diagnóstico diferencial das intoxicações exógenas.

Quadro 3 – Diagnóstico Diferencial

Endocrinopatias Hipoglicemia
Hipotermia
Hipotireoidismo
Hipoadrenalismo
Cetoacidose diabética

Alterações metabólicas Erros inatos do metabolismo


Síndrome de Reye
Distúrbios eletrolíticos
Coma urêmico

Distúrbios neurológicos Infecção do SNC


Trauma do SNC
Processos expansivos do SNC
Distúrbios convulsivos com estado pós-ictal

Hipoxia ou isquemia —

3. DESCONTAMINAÇÃO Xarope de Ipeca:


A descontaminação gástrica, seja por emese ou O xarope é composto de vidro com 15 ml.
lavagem, deve ser realizada independentemente do
• Extrato de ipeca 7,0 ml 1,05 ml
tempo que tenha ocorrido a ingestão, a menos que
haja contra indicação específica. • Glicerina 10,0 ml 1,50 ml
• Xarope simples q.s.p. 100,0 ml 15,00 ml
a) O tóxico foi ingerido.
Tem capacidade de remover 30-40% do tóxico se
1. O tóxico ingerido está identificado e é potente.
realizado entre 1-2 horas pós ingestão; esta taxa de
Realizar esvaziamento gástrico, desde de que em
remoção pode aumentar significativamente se a emese
tempo útil (geralmente entre duas a quatro primeiras
é obtida em 30 minutos pós ingestão.
horas após a ingestão). Contudo, o lavado gástrico
pode ser eficaz muitas horas após a ingestão de
Doses do xarope de Ipeca:
medicações como os anticolinérgicos e os salicilatos
que retardam o esvaziamento gástrico, e respeitadas – Crianças de 6 meses a 1 ano:
algumas contra indicações: a) ingestão de produtos • 7,5 ml seguidos, após cinco minutos de 200-250
cáusticos, b) ingestão de derivados de petróleo, c) ml de água. Repetir a dose inicial após 20 minutos
paciente muito agitado ou apresentando convulsão, se não ocorrerem vômitos.
d) paciente com intensa depressão do sistema nervoso
central (torpor ou coma). • Dose máxima: 15 ml.

O Esvaziamento gástrico poderá ser realizado por: – Crianças de 1 a 12 anos:

a – Medidas provocadoras de vômitos: emese • 15 ml seguidos, após cinco minutos de 200-250


mecânica (estímulo do reflexo nauseoso), apomorfina ml de água. Repetir a dose inicial, após 20 minutos,
(0,06-0,1 mg/kg por via subcutânea), xarope de se não ocorrerem vômitos.
Ipeca. • Dose máxima: 30 ml.

160 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

– Adultos: 5. Fixadores
• 15-30 ml seguidos, após cinco minutos, de 200 Leite - Apesar de ser considerado um bom agente
a 250 ml de água. A dose inicial pode ser repetida antitóxico e de largo uso popular para essas
se não ocorrerem vômitos em 20 minutos. finalidades, existem algumas restrições importantes.
• Dose máxima: 60 ml.
1. O leite não é bom agente antitóxico.
• Não aplicar o carvão ativado junto ao xarope de
Ipeca, pois este perde a sua eficácia. 2. O leite pode favorecer a absorção de vários
• Se não ocorrer vômitos com o xarope de Ipeca, tóxicos, geralmente potentes, tais como os inseticidas.
indicar o lavado gástrico. 3. O leite retarda a progressão do conteúdo gástrico
• Usado como indicado, produz efeitos adversos para o duodeno e assim a sua administração pode
leves e previsíveis, como vômitos repetidos, diarréia, ser útil para uso na criança que logo a seguir será
letargia ou irritabilidade, febre e sonolência em 20%. submetida a lavagem gástrica.
O uso prolongado está associado a miopatias
4. O leite pode ser usado como demulcente na
periféricas e cardiopatias muitas vezes fatais.
ingestão de substâncias tóxicas.
b) Lavagem gástrica: demorada, copiosa e
6. Carvão Ativado
cuidadosa; utilizar sonda de maior calibre possível
introduzida de preferência por via oral; o líquido de É um pó preto vegetal tratado no sentido de aumentar
lavagem deve ser aquele que for mais facilmente seu poder de adsorção. É eficaz para todos os
disponível, usualmente água ou soro fisiológico, sendo produtos químicos, exceto cianetos, ácidos minerais,
que a água é reservada para os adultos; volumes bases fortes, ácido bórico, sulfato ferroso e lítio.
adequados para lavagem gástrica: Devido ao seu amplo espectro de capacidade de
Recém-nascido 500 ml adsorção e rapidez de ação, é considerado como
Lactente (até 2 anos) 2 a 3 litros o mais valioso agente isolado para o tratamento das
intoxicações medicamentosas. Foi demonstrado que
Pré escolar 4 a 5 litros
o carvão ativado reduz a meia vida, acelera a
Escolar 5 a 6 litros
depuração do fenobarbitol e da teofilina
Adulto 6 a 10 litros administrados E.V.
Nas fases finais, utilizar solução de carvão ativado Administração do Carvão Ativado
a 20%. Introduzir e deixar no estômago durante
algum tempo. A seguir continuar a lavagem. • Dose em crianças: 0,5 a 1 g/kg (máximo 25 g),
a cada quatro horas, por S.NG, misturado com
Eficácia da lavagem gástrica – tem um valor limitado, 100 a 200 ml de água ou solução fisiológica nas
se feita quatro horas após a ingestão de substâncias primeiras 12 horas e após, a cada seis horas por
rapidamente absorvidas. O lavado, pode, contudo, 36 a 48 horas.
ser eficaz muitas horas após a ingestão de
medicações, como os anticolinérgicos e os salicilatos c) Catárticos Salinos
que retardam o esvaziamento gástrico.
Estão rotineiramente indicados após o carvão ativado,
2. O tóxico está em contato com a pele. por propulsionarem o material ingerido ou o complexo
Realizar lavagem corporal com água corrente, com car vão-tóxico com mais rapidez pelo trato
especial atenção aos sítios de depósito como cabelos, gastrointestinal. As doses são:
unhas, umbigo, orelhas, regiões genital e axilar. Retirar Sulfato de magnésio 250 mg/kg
as vestes do paciente durante o procedimento. Não
Sulfato de sódio 250 mg/kg
misturá-las com as de outras pessoas.
3. O tóxico foi inalado ou aspirado - Remover o Citrato de Magnésio
paciente do ambiente contaminado. O socorrista deve Atualmente o sorbitol e outros agentes osmó-
se proteger contra possível exposição ao tóxico. ticos, como a lactulose (15 ml a cada seis horas)
4. O tóxico está em contato com a mucosa ocular e o manitol (50 ml a cada seis horas), associa-
– Lavagem ocular com água ou soro fisiológico dos ao carvão ativado, também têm sido recomen-
durante cerca de 15 minutos. dadas.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 161


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Contra indicações aos catástricos Salinos: MEDIDAS DIALIZADORAS


• Ileo adinâmico Diálise peritonial – é ineficiente e tem complicações.
• Diarréia grave A lentidão com que remove o tóxico limita o seu uso.
• Trauma abdominal Hemodiálise – a eficiência desse método depende
• Obstrução intestinal do peso molecular, permite a correção dos distúrbios
hidroeletróliticos. As desvantagens são que as drogas
• Insuficiência renal
fortemente ligadas às proteínas não são removidas.
• Insuficiência cardíaca
Hemoperfusão é o método mais rápido, remove as
• Etilenoglicol (fosfosada) contra indicado em crian- drogas de grande peso molecular.
ças.
Antídotos Específicos

4 – ELIMINAÇÃO Quando se conhece o tóxico e se dispõe de antídotos


específicos, estes devem e podem ser usados,
Conjunto de medidas que tem por objetivo favorecer
dependendo da gravidade do caso.
a eliminação mais rápida e intensa do tóxico
absorvido pelo organismo. Consulta ao Psiquiatra
Qualquer suspeita de simulação ou tentativa de
a) Poliuria aquosa
intoxicação intencional deve ser levado a sério, e
Administração de água por via oral ou de soluções deve ser solicitada a ajuda do especialista.
hidroeletróliticas por via intravenosa. Medida
considerada de pouca eficácia, pois não atua na Consulta ao Serviço Social
reabsorção tubular, principal mecanismo de Muitos casos de intoxicação na infância são de um
reabsorção do tóxico. certo grau de negligência ou abuso dos pais. Nesse
caso deve ser contatado o Serviço Social.
b) Diurese osmótica
Centro de Informação Toxicológica
Administração de medicamentos osmóticos,
principalmente do manitol. Dose usual de 10 a Pela grande importância que representa na profilaxia
12,5 ml/kg da solução a 20%, por via intravenosa. e no tratamento das intoxicações, é indispensável
que cada serviço de urgência e UTI mantenha um
c) Diurese medicamentosa contínuo e produtivo contato com essas entidades.
Administração de medicamentos diuréticos, As intoxicações em crianças resultam da interação
principalmente da furosemida. Dose usual 1-3 mg/ de um hospedeiro suscetível, um tóxico disponível e
kg/dia, por via oral, ou de 0,5-1 mg/kg por via um ambiente temporariamente instável. Verificamos
parenteral podendo atingir 6 mg/kg, se necessário. então, que a melhor política nesse tipos de problema,
é a sua prevenção, que deve ser iniciada nas
d) Diurese iônica
consultas de puericultura, ou mesmo após um episódio
Administração de medicamentos que alteram pH
de intoxicação na própria emergência ou UTIP.
urinário.

Alcalinização – Bicarbonato de sódio dose usual 1-


2 m Eq Hg diluído em 15 ml/kg de soro fisiológico Referências Bibliográficas
e glicosado em infusão intravenosa durante cerca de
3 horas. Ex.: intoxicação por ácido acetilsalicílico, 01 - Tobias JD. Rasmussen GE. Yaster M. Multiple trauma in
the pediatric patient. In:Rogers MC. Textbook of Pediatric
barbitúricos, outros ácidos fracos e acidose
Intensive Care, 3 ed. Baltimore, Williams & Wilkins,
metabólica de origem desconhecida. 996, 1.467-503.
02 - Cavinatto JN. Bellizia Neto L. Abordagem inicial do
Acidificação – Cloreto de amônio dose usual 75 politraumatizado. In: Troster EJ. Abramovici S. Pinus J et
mg/kg/dia por via oral 4-6 vezes por via intravenosa al. A Criança Politraumatizada . São Paulo, Roca,
1994, 5-10.
em soluções 1-2%. Ex.: intoxicação por anfetaminas,
alcalase metabólica de origem tóxica. Procedimento 03 - Tepus JJ. Mollit DL. Talbert JL et al. The pediatric trauma
score as a predictor of Injury severity in the injured child.
pouco utilizado devido aos seus riscos. J. Pediatric Surg. 1987: 22-18.

162 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

04 - ATLS – Advanced Trauma Life Support Course for Physicians 07 - Moront ML et al. A criança traumatizada. Clínicas
by American College of Surgeons. 1991. Pediátricas da América do Norte. 1994; 41:1.225-51.
05 - Christophersen ER. Prevenção de acidente em cuidados 08 - Schvartsman S. Intoxicações Agudas. São Paulo; Sarvier;
primários. Clínicas Pediátricas da América do Norte. 1991.
1986; 33: 971-9.
09 - Fohrman BP. Piatric Critical Care. St. Louis, 1992.
06 - Burd EG et al. Politrauma na infância: experiência no
Hospital de Pronto-Socorro de Porto Alegre. Revista do 10 - Schvartsman S. Antídotos Antagonista e Medicamentos
HPS. Porto Alegre, 1993; 39: 32-5. Úteis em Toxicologia. São Paulo, Andef. 1989.

Cetoacidose Diabética
ROMOLO SANDRINI NETO

A cetoacidose diabética é uma manifestação Insulina:


metabólica grave, decorrente de deficiência total ou – Aumenta a entrada da glicose na célula;
parcial de insulina e aumento dos chamados
– Aumenta o consumo intracelular de glicose;
hormônios contra-reguladores: glucagon, adrenalina,
cortisol e hormônio do crescimento. Caracteriza-se – Inibe a liberação de glicose do fígado pela
por hiperglicemia, cetonemia, acidose metabólica, supressão da glicogenólise e da gliconeogênese;
desidratação, juntamente com aumento dos lipídeos, – Estimula a síntese de proteína;
glicosúria e cetonúria. – Aumenta a lipogênese a partir de hidratos de
Para melhor entendermos a etiopatogenia da carbono e inibe a lipólise.
cetoacidose, veremos algumas das ações da insulina A figura 1 sumariza as alterações decorrentes da
e as conseqüências de sua falta. falta de insulina.

Figura 1

FALTA DE INSULINA

{

LIPIDES TOTAIS
HIDRATOS DE CARBONO PROTEÍNAS LÍPIDES COLESTEROL
HIPERGLICEMIA CATABOLISMO LIPÓLISE TRIGLICERIDES
➪ ➪

➪ ➪

➪ ➪

GLICOSÚRIA AMINOACIDEMIA ÁCIDOS GRAXOS

DIURESE OSMÓTICA URÉIA CORPOS CETÔNICOS



PERDA DE ÁGUA ➪ CETOSE


E ELETRÓLITOS ACIDOSE

➪ PERDA DE ÁGUA E
ELETRÓLITOS
DESIDRATAÇÃO CETONÚRIA

PERDA DE ÁGUA E
ELETRÓLITOS

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 163


Emergências
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Importantes também são as alterações hidro- em consideração que o cálculo por peso costuma
eletrolíticas concomitantes. oferecer mais líquidos que o cálculo por EEC. Nestas
circunstâncias, deve-se repor as perdas em 24 horas.
Sódio:
– Hiponatrenemia dilucional devido à redistribuição OBSERVAÇÕES:
da água causada pela hiperosmolaridade; 1) Cálculo do volume do EEC por faixa etária:
– diminuição do sódio total devido à perda renal de – RN: 40% do peso
sódio que ocorre juntamente com a glicosúria e – Lactente: 30%
cetonúria.
– Pré-escolar: 25%
O potássio apresenta-se normal ou aumentado no
2) Cálculo das necessidade calóricas diárias para
plasma. Contudo há diminuição importante do
base do cálculo das necessidade hidroeletrolíticas:
potássio total devido à:
– < 10 kg = 100 Kcal/kg
– catabolismo aumentado
– 11-20 kg = 1.000 Kcal. mais 50 Kcal. por Kg.
– acidose metabólica
acima de 10 kg.
– perda renal
– > 20kg = 1.500 Kcal. mais 20 Kcal. por Kg.
O fósforo também apresenta alterações importantes acima de 20kg.
e que podem necessitar correção. Devido ao
3) A reposição da depleção deverá ser sempre na
catabolismo aumentado, o fósforo vai para a corrente
forma de solução fisiológica e não com solução
sangüínea e é eliminado pelo rim. Embora geralmente
glicosada - transformada em glicofisiológica.
esteja normal no plasma, o fósforo total costuma
estar diminuído.

2. CORREÇÃO DA
TRATAMENTO DA ACIDOSE METABÓLICA
CETOACIDOSE DIABÉTICA A acidose metabólica só deverá ser corrigida quando
Na correção da cetoacidose diabética os itens for grave:
importantes a serem considerados são: – BE inferior a - 18 mEq/l ou
1) Correção imediata do choque ou hipovolemia – presença de taquipnéia profunda com ou sem
severa. gemência.
2) Correção da acidose grave, elevando-se o
Calcula-se o bicarbonato a administrar pela fórmula:
bicabornato plasmático somente até 12 mEq/l.
3) Administração de insulina em pequenas doses. Bic a administrar = (12 - Bic encontrado) x EEC em litros x 2
4) Administração de doses adequadas de potássio.
Utilizar a solução de bicarbonato na concentração de
5) Vigilância constante de diurese, que costuma ser
1,25%, pois nessa diluição a quantidade de sódio é
intensa, dificultando a correção da hipovolemia.
semelhante à solução fisiológica (150 mEq/l). A
correção deverá ser feita nas primeiras 6 (seis) horas.

1. CORREÇÃO DA PERDA OBSERVAÇÕES:


HIDROELETROLÍTICA 1) Na impossibilidade de realizar-se gasometria e
havendo taquipnéia profunda considerar o
Em vigência de choque hipovolêmico expandir, em
bicarbonato encontrado como 6 mEq/1.
1 (uma) hora, com solução fisiológica na quantidade
de 30-40ml/100 Kcal, endovenosa. Em seguida, 2) O volume da solução de bicabornato a 1,25%
faz-se a correção da depleção de 30% do espaço deverá ser descontado do volume de solução
extra celular (EEC) em 12 a 24 horas. Se não estiver fisiológica utilizado para a correção da depleção
em choque, corrigir a depleção de 10 a 25%, do do EEC.
EEC, em 12 horas. Pode-se utilizar as fórmulas 3) Geralmente é necessária uma segunda tomada
próprias de cada serviço para hidratar, levando-se de veia para permitir a infusão adequada de líquidos.

164 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
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3. ADMINISTRAÇÃO DE OBSERVAÇÕES:
INSULINA DE AÇÃO RÁPIDA 1) A hipoglicemia é a complicação mais freqüente
Dose inicial: 0,25 U/kg de insulina de ação rápida, e grave. Na impossibilidade de realizar glicemias,
intramuscular. é preferível corrigir mais lentamente a hiperglicemia
do que correr o risco de induzir uma hipoglicemia.
Doses posteriores: 0,1 U/Kg de 1/1 hora, intramus-
Em condições adversas de tratamento, achamos mais
cular, até a glicemia diminuir para 300 mg/dl. Utilizar
seguro o uso de menos insulina.
ao menos 2 aplicações de 0,1 U/Kg
2) Toda administração de insulina deverá ser feita
Se a glicemia de entrada for menor que 300mg/dl,
pelo médico, ou sob a sua supervisão direta, se
introduzir o plano básico a 7,5% ou 10% de glicose
serviço não estiver habituado com o manejo da
para que a glicemia ultrapasse os 300 mg/dl (vide
tabela do item 5), e se posa usar insulina suficiente cetoacidose.
para diminuir a lipólise e formação de corpos cetônicos.
Com glicemias menores que 200 mg/dl ou glicosúria
4. ADMINISTRAÇÃO DE
de + + + a + + + + sem cetonúria e após a
aplicação de ao menos a dose inicial e mais 2
POTÁSSIO PARENTERAL
doses de 0,1 U/kg, pode-se utilizar insulina na dose O potássio deve ser administrado logo após a
de 0,4 U/kg, de 4/4 horas. Na presença de primeira micção ou mesmo antes, se estiver abaixo
glicosúrias menores, suspender temporariamente a de 4 mEq/l no plasma, quando da admissão. A
administração da insulina. forma e a dose utilizada é a seguinte:

POTASSEMIA na admissão, em mEq/l

acima de 6 6-4 abaixo de 4

ANTES DA 1ª DIURESE Não usar Não usar 4 mEq/100 kcal/dia

APÓS A 1ª DIURESE 2 a 4mEq/ 4 a 6 mEq/ 6 a 8 (10)mEq/


100cal/dia 100 kcal/dia 100/kcal/dia

OBSERVAÇÕES: 5. CÁLCULO DAS NECESSIDADES


1) A administração de potássio acima de 6mEq/ HIDROELETROLÍTICAS BÁSICAS
100 cal/dia deverá ser acompanhada com
DE 24 HORAS
monitorização eletrocardiográfica.
2) Quando não for possível determinar a potassemia, Acrescentar à solução glicosada, sódio na quantidade
considerá-la como estando entre 4 a 6 mEq/1. de 3mEq/100 cal/dia.

Glicemia na Admissão e Evolução

SOLUÇÃO GLICOSADA 5% acima 300mg/dl


a ser usada 7,5% 200 a 300mg/dl
(100ml/100cal/dia) 10% abaixo 200mg/dl

OBSERVAÇÃO:
1) Na impossibilidade de se saber a glicemia, iniciar com plano a 7,5% de glicose.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 165


Emergências
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6. REPOSIÇÃO DA – VHS;
DIURESE EXCESSIVA. – Hemocultura;

A diurese de 24 horas equivale a 60ml para cada Na evolução:


100 kcalorias, ou seja, 2,5ml para cada 100 – A cada hora - glicemia, enquanto estiver na fase
kcalorias por hora. de uso da insulina intramuscular, ou mais frequente
Toda diurese superior a 2,5ml/100kcal/hora deverá quando a glicemia estiver abaixo de 300mg/dl ou
ser reposta na forma de + em solução fisiológica e na suspeita de hipoglicemia.
+ em solução glicosada a 5%. – A cada 6 horas - gasometria;
eletrólitos plasmáticos;
Exemplo: criança de 25kg (equivalente a 1600 kcal/
glicemia;
dia) urinou 400ml em 4horas;
– Com 24 horas - todos os da admissão exceto a
diurese esperada = 2,5ml x 1600 kcal x 4h=160ml; hemocultura.
100
diurese em excesso = 240ml; deverá ser reposto Realizar glicosúria e cetonúria a cada micção no
120ml. de solução fisiológica e 120 de solução primeiro dia.
glicosada a 5%.

OBSERVAÇÕES: 8. ALIMENTAÇÃO
1) Quando a perda urinária mantiver-se superior à
Durante a fase de hidratação, o paciente deverá
velocidade de administração da reposição
permanecer em jejum até estar lúcido e sem vômitos.
hidroeletrolítica e o paciente estiver na fase de uso
Iniciar com líquidos, principalmente água, suco de
de insulina de ação rápida, subcutânea, deverá
laranja e leite desnatado. Sólidos só devem ser
temporariamente voltar a usar a via intramuscular.
liberados após um período adequado de aceitação
2) Quando a aceitação oral de líquidos for de líquidos na quantidade necessária para suprir as
adequada, o excesso de diurese poderá ser reposto necessidade básicas diárias e as perdas excessivas.
por esta via com os líquidos descritos no item 8.

7. CONTROLE LABORATORIAL 9. INTRODUÇÃO DA


Na admissão: INSULINA DE AÇÃO LENTA
– pH e gases A insulina de ação lenta deverá ser iniciada após a
– Eletrólitos plasmáticos (sódio, potássio, cloro, cálcio, correção dos distúrbios hidro-eletrolíticos e estando o
fósforo); paciente com boa aceitação alimentar. Iniciar pela
– Glicemia; manhã, na dose de 0,5 U/kg. A complementação
– Uremia; com insulina de ação rápida, S.C, deverá ser feita
– Creatinemia; conforme as glicemias ou, na impossibilidade,
– Osmolaridade plasmática; segundo as glicosúrias e cetonúrias, realizadas antes
– Hemograma; das principais refeições, pela tabela abaixo:

INSULINA SIMPLES (U.I.)


GLICEMIA GLICOSÚRIA CETONÚRIA
PESO ABAIXO 20 KG. PESO ACIMA 20 KG.
.> 400 + + + ou + + + + + + ou + + + 8 10
> 300 + + + ou + + + + + 4 6
> 200 + + + ou + + + + — 2 4
com poliúria
< 200 + + + ou + + + + — — —
sem poliúria
+ ou + + — ou + — —

166 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Emergências
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No dia seguinte, a dose de insulina de ação lenta será OBSERVAÇÃO:


a soma da dose inicial de insulina lenta, mais metade
da dose total de insulina rápida usada para comple- Utilização de Fósforo na correção da cetoaci-
mentação no dia anterior, na forma de insulina lenta. dose:

EXEMPLO: - Criança com 26kg - dose inicial de - Fósforo abaixo de 2,5 mg/dl na entrada ou
insulina NPH=13 unidades. Durante o dia necessitou - Fósforo abaixo de 1,0 mg/dl na evolução:
de complementação com mais 30 unidades de
insulina de ação rápida. Dose de insulina NPH a ser Utilizar fosfato ácido de potássio 2 mEq/kg/dia
usada no dia seguinte = 13 + 30 = 28 unidades. EV ou VO
2

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 167


Emergências
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168 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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Principais Dermatoses na Infância


LEIDE PAROLIN MARINONI

ESCABIOSE O tratamento é feito com soluções tópicas como o


monossulfiram diluído 1:3 por três dias, benzoato de
Zoonose causada pelo ácaro Sarcoptes scabiei
benzila diluído 1:1 por três dias. Repetir após 7
variedade hominis. Muitas outras espécies de ácaros
dias, pois este agente é acaricida, mas não ovicida.
que parasitam cães, gatos, ratos e alimentos podem
Anti-histamínicos podem ser associados quando o
também infestar o homem. O S. scabiei pode
prurido for intenso.
sobreviver por dois a cinco dias fora da pele e o
período de incubação pode ser de até um mês. Orientar a família de que o prurido pode persistir
mesmo após o término do tratamento e que isto não
Os locais característicos são as pregas axilares e do
significa persistência da infestação. Às vezes os restos
antebraço, punhos, espaços interdigitais, pés, região
dos ácaros ou seus produtos podem provocar uma
infra-mamária, auréola e genitália. A cabeça
reação de hipersensibilidade, o que perpetua o
geralmente está poupada no adulto, mas não na
prurido. Orientar a hidratação da pele, já que a
criança.
maioria das substâncias utilizadas para o tratamento
No lactente, é comum a erupção de pápulas podem ressecá-la e a xerose pode ser a causa da
eritematosas generalizadas e um dado bastante persistência do prurido. Se o prurido continuar pode-
característico é o acometimento de palmas e plantas. se manter o anti-histamínico por mais alguns dias
As lesões podem se distribuir linearmente, formando após o tratamento.
um túnel ou estarem escarificadas pelo ato da
Lesões nodulares podem se formar como uma reação
coçadura. A eczematização é freqüente e podem
de corpo estranho aos restos do ácaro e podem
ocorrer lesões nodulares nas axilas e genitais.
durar semanas ou meses. O tratamento é feito com
Observar lesões semelhantes na mãe, principalmente
corticóide oclusivo ou mesmo infiltração intralesional
em antebraços e região infra-mamária.
de corticóide.
– Crianças maiores: a distribuição é a mesma do
adulto.

Tratamento: se houver infecção secundária ou PRURIDO ESTRÓFULO


eczematização, estas devem ser tratadas primeiro e, OU URTICÁRIA PAPULAR
após a melhora, realiza-se o tratamento da escabiose. É uma afecção relativamente comum, ocorrendo
Em crianças abaixo de um ano ou em mesmo crianças preferencialmente nas crianças entre dois e cinco
maiores cujas lesões estão eczematizadas, prefere- anos de idade. Decorre de uma reação de
se a utilização do enxofre de 6 a 8% em loção hipersensibilidade a diversos agentes, principalmente
cremosa ou vaselina, durante três noites e repetido toxinas injetadas na pele após a picada de insetos.
após uma semana. Permetrina a 5% em única Os agentes mais comuns são mosquitos e pulgas
aplicação para crianças acima de 2 meses. (tanto do cão e gato como do homem), bem como
É importante a orientação para a troca diária da percevejos, formigas e ácaros. É comum o
roupa de cama nos dias de tratamento e a passagem antecedente de atopia pessoal ou familiar.
da roupa com ferro quente, bem como o tratamento Caracteriza-se pelo aparecimento de pápulas
SIMULTÂNEO de todos os contatos. eritematosas, que podem ou não ter vesiculação

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 169


Prática Pediátrica
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central (pápula de Tomazoli), pruriginosas. O local cervical e febre. Acredita-se que este tipo de tinea
depende do tipo de inseto envolvido: se mosquitos, capitis se dê em indivíduos imunocompetentes que se
mais freqüente em áreas expostas; se pulgas, mais expõem ao fungo pela primeira vez, resultando em
em áreas cobertas ou de pressão e geralmente uma reação imunológica importante como tentativa
dispostas linearmente. O ato da coçadura pode levar de destruição do fungo. Por este motivo, às vezes as
a escoriações, formação de crostas hemáticas, que pesquisas de fungo podem ser negativas. Esta forma
podem se infectar secundariamente, tornando-se é conhecida como Kerion Celsi.
melicéricas e geralmente evoluindo para cicatrizes
Tratamento: por acometer a haste do cabelo, as
hipo ou hipercrômicas. O desaparecimento das lesões
medicações tópicas não são eficazes, pois não
se dá em 1 a 2 semanas e a tendência à melhora
conseguem penetrar na cutícula nem nas camadas
espontânea da reação de hipersensibilidade é a
mais profundas da pele, de forma a atingir a raiz do
regra ao redor dos cinco anos de idade.
cabelo. O tratamento deve ser sistêmico, sendo
Tratamento: Griseofulvina a droga de escolha na criança. Sabe-
• Orientação para erradicação do agente ou se que esta medicação é fungistática e tem poucos
diminuição da exposição ao mesmo efeitos colaterais na criança. A dose é de 20 mg/
Kg/dia, em administração única após uma refeição
• Aplicação de repelentes, uso de mosquiteiros
rica em gordura, para sua melhor absorção. Outros
• Tiamina via oral na dose de 75 a 150mg dia antifúngicos orais como o Cetoconazol, Itraconazol
(Benerva cp. 300mg ou complexo B), faz com que (também fungistáticos) e a Terbinafina (fungicida)
haja a excreção pela pele de seu odor que repele podem ser utilizados, com eficácia semelhante, porém
os insetos. Funciona para mosquitos e não para de maior custo para o paciente e, às vezes, com
pulgas. mais efeitos colaterais. O tempo médio de tratamento
• Pós anti-pulga, exposição dos cobertores e colchão é de dois meses.
ao sol, dedetização
O uso de xampus de sulfeto de selênio a 1 ou
• Tópico: uso de anti-histamínicos tópicos (cuidar com 2,5%, duas a três vezes por semana, pode reduzir
fotossensibilização) ou CTC de baixa ou média o número de esporos viáveis, diminuindo o tempo
potência por curtos períodos de tempo, antibiótico de afastamento das crianças de suas atividades
associado ao CTC se a infecção for secundária escolares, de 2 meses para 2 semanas. Deve-se
• Sistêmico: anti-histamínicos se o prurido for procurar os possíveis vetores e tratar os cães e gatos
importante, antibiótico se infecção for extensa. infectados.
• Dessensibilização: para crianças com quadros Nos casos de Kerion Celsi, onde o processo
graves, que não melhoram espontaneamente. inflamatório é importante, pode-se utilizar CTC
Indicado após os cinco anos. Via subcutânea de um sistêmicos, na dose de 1mg/Kg /dia nos primeiros
macerado da parte picadora e sugadora de vários três a cinco dias de tratamento.
insetos, em concentrações crescentes, aplicações
semanais por 1 a 2 anos. A vacina sublingual parece Além disso, é importante separar objetos de uso
não ter eficácia. pessoal, como escovas e toalhas e orientar o uso de
bonés até que o tratamento seja concluído.

KERION CELSI
VERRUGAS
Forma inflamatória de tinea capitis, mais comum nas
As verrugas são tumores intra-epidérmicos causados
infecções por fungos zoofílicos ou geofílicos, já que
pelo Papilomavírus humano (HPV) do grupo Papova.
o homem não é um hospedeiro habitual, provocando
um processo inflamatório importante, foliculite até Classificam-se em verruga vulgar, plana, plantar e
abscessos extensos, que podem ser diferenciados dos condiloma acuminado. Vistas em 7-10% da
bacterianos por serem frios e menos dolorosos. Deve população, são uma das afecções de pele mais
ser suspeitada sempre que um abscesso no couro freqüentes em crianças, com incidência maior entre
cabeludo apresente alopécia e não responda ao 10-19 anos. Inoculáveis de um local para outro e
tratamento antibiótico. Pode haver linfonodomegalia de um indivíduo para outro.

170 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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• Vulgar: predomina na superfície dorsal das mãos lesão eritematosa, edemaciada, brilhante e com limites
e região periungueal. Arredondadas, cor da pele, bem nítidos e formação rápida de vesículas e bolhas
crescimento gradual, tornando-se amareladas, sobre a lesão. Nos casos graves ou em crianças
acinzentadas ou amarronadas, com pontos pretos, desnutridas pode evoluir para necrose da pele.
que correspondem a vasos trombosados pelo vírus.
Pode ocorrer em qualquer localização, mas é mais
• Plana: face, pescoço, braços e pernas. Pápulas freqüente na face, couro cabeludo e períneo. Na
cor da pele ou discretamente amarronadas e face e no períneo costuma ser mais grave e de
elevadas, 2-5mm de diâmetro. Fenômeno de Koebner evolução mais rápida.
é freqüente.
A forma clássica com cordão linfático e linfadenite
• Plantar: área de apoio dos pés. Crescem para
é mais rara na criança de baixa idade.
dentro por causa da pressão sobre a lesão, dando
a aparência de um olho de peixe. Profundas e Conduta:
dolorosas. Diferenciam-se das calosidades pela dor • penicilina procaina I.M. durante dez dias
à compressão lateral, sendo que os calos doem • penicilina V por via oral durante dez dias.
quando comprimidos no centro da lesão. Outra
característica é a presença de pontos pretos na lesão Quando localizada na face ou no períneo:
que correspondem aos vasos trombosados pelo vírus. internação com administração de penicilina cristalina
I.M. ou EV.
• Condiloma acuminado: verrugas macias, cor da
pele, ao redor de junções mucocutâneas ou áreas
intertriginosas (glande, genitália, perianal). Pode ser
CELULITE ESTREPTOCÓCICA
doença sexualmente transmissível ou pode estar
associado a verrugas em outros locais. O contato PERIANAL
pode ser venéreo ou não, pelo uso de toalhas Infecção cutanea superficial da região perianal,
contaminadas, contato próximo com adultos que exclusiva da criança, causada pelo S.beta hemolítico
tenham lesões semelhantes ou verrugas vulgares. do grupo A.
Diagnóstico diferencial com o condiloma plano.
Caracterizada por eritema bem definido na região
Tratamento: procurar o tratamento menos agressivo, perianal, associado a prurido, dor a defecação e
já que a virose é relativamente benigna e tem caráter obstipação.
auto-limitado.
O diagnóstico e confirmado por “swab” e cultura e
• Sugestão o tratamento é feito com penicilina V por via oral.
• Ácido nítrico fumegante em aplicações semanais
• Ácido salicílico e ácido lático em colódio elástico
aplicados após o banho e com proteção ao redor GRANULOMA PIOGÊNICO
das lesões, seguido de oclusão com esparadrapo.
É uma lesão vascular comum nas crianças,
Usar diariamente até queda da lesão.
provavelmente resultante de reação proliferativa
• Crioterapia: sessões semanais ou quinzenais, vascular associada a trauma ou à presença de
provocando um congelamento rápido e descon- bactérias piogênicas. Apesar da possível associação
gelamento lento. com bactérias não é um processo infeccioso.
• Vacina anti-rubeólica
Normalmente é uma lesão única que se desenvolve
• Podofilina 25% no condiloma acuminado rapidamente sob a forma de tumor vermelho brilhante,
• Ácido retinóico tópico nas planas moderadamente firme, pedunculado de um a dois
centímetros de diâmetro e que tem como principal
característica sangrar facilmente, mesmo ao menor
ERISIPELA traumatismo, diminuindo sensivelmente de tamanho,
É uma forma de celulite superficial com envolvimento para aumentar de volume novamente.
linfático causada pelo S. beta hemolítico do grupo A.
Diferencia-se dos hemangiomas, cujo aspecto clínico
Causada pela inoculação da bactéria em solução de e histológico é muito semelhante pela idade de
continuidade da pele e após dois a cinco dias surgem aparecimento e sangramento fácil.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 171


Prática Pediátrica
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Conduta: cirurgia feita durante a fase de crescimento, ulceração


Remoção cirúrgica, com tratamento esclerozante, cicatrizes pela
clioterapia, etc.
Cauterização.

HEMANGIOMA ALOPÉCIA AERATA


Proliferação vascular benigna que aumenta Caracterizada pela queda abrupta do couro
rapidamente durante a infância até a idade média cabeludo em áreas arredondadas (bem definidas)
de 18 meses, apresenta em fase de estabilização localizada sob a forma de faixa que inicia na região
seguido de período lento de evolução que varia de posterior e se estende bilateralmente para o anterior
três a cinco anos. da cabeça (ofiasica); todo o couro cabeludo (totalis)
Embora não esteja presente no nascimento, em 90% e quando atinge o restante dos pêlos do corpo
dos casos é detectado durante os primeiros meses (universal).
de vida. De causa desconhecida, mas com evidências de ser
Pode apresentar-se sob várias formas, tamanhos e causada por mecanismos imunes pela associação
localizações, mas são mais freqüentes na face, que tem com doenças autoimunes (diabetes, tireoidite
pescoço e região perineal. de Hashimoto, atopia, vitiligo, etc,...) e com maior
incidência em crianças portadoras da síndrome de
Mais freqüentes no sexo feminino ( 60 a 70%).
Down.
Pela sua história natural e com a tendência à
Caracterizada por áreas de alopécia, únicas ou
regressão completa, ou quase completa, na maioria
múltiplas, inicialmente de pequenas dimensões, com
dos casos não necessita terapêutica. Deve ser
posterior aumento de tamanho, podendo haver
acompanhado durante o seu desenvolvimento,
progressão para a forma totalis.
observando-se seu crescimento e possível complicação
(infecção, ulceração), que é rara e evitando A pele do couro cabeludo permanece normal,
tratamentos agressivos. brilhante e sem descamação. A prova de tração do
cabelo é positiva.
Quando houver dificuldade na aceitação pelos pais
do tratamento conservador devem ser enfatizadas as Em 10 a 20% dos casos pode haver alteração
vantagens deste método de tratamento, usar simultânea das unhas, com depressões horizontais e
fotografias selecionadas mostrando o resultado em verticais, “pitting”, e opacificação.
casos semelhantes, dar apoio psicológico aos pais
Na criança pode ser desencadeada por estresse
e mostrar a necessidade da criança ser considerada
orgânico ou emocional.
normal em casa para sentir-se confiante e segura.
Deve ser feito diagnóstico deferencial com
O resultado final dos hemangiomas não tratados
tinha captis (descamação do couro cabeludo e
ativamente é superior àqueles sob várias formas de
cabelos tonsurados) com tricotilomania (áreas
tratamento.
irregulares de alopécias, localização nas regiões
Margilete et al em obser vação com 336 frontais, ocipital e parientais e cabelos de vários
hemangiomas verificou que os resultados cosméticos tamanhos).
foram excelentes, com apenas 5% de complicações,
Conduta:
em contraste com 56% de complicação nos dos
grupos tratados ativamente. Apoio psicológico para o paciente e familiares;
Alguns tipos de hemangiomas necessitam de Esclarecer que quando o processo é limitado o
tratamento ativo, aqueles cujo tamanho compromete prognóstico é bom, havendo repilação num período
estruturas ou funções vitais como: olhos, nariz, faringe, de 12 meses em 90% dos casos e em menor número
laringe, compressão da árvore traqueobronquica ou quando for extensa.
aqueles com ritmo de crescimento alarmante.
Existem vários tratamentos, porém todos com possíveis
As complicações diferem de acordo com o tipo de efeitos colaterais ou traumatizantes: corticóides
tratamento: cicatriz e recidiva do hemangioma na intralesional, aplicação de DNCB-(dinitroclo-

172 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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robenzeno), substâncias rubifacientes, (ácido acético Leitura recomendada:


glacial 0,5g, cloral hidratado 5%, éter sulfúrico
q.s.p.30g) e crioterapia. 01 - Hurwitz, S Clinical Pediatric Dermatology. A textbook of
skin disorders of childhood and adolescence, W.B. Saunders
Company Philadelfia,1993.
A crioterapia é um método que utiliza o nitrogênio
líquido sob a forma de jato superficial de “spray” 02 - Ruiz Maldonado,R, Parish LC, Beare JM, Textbook of
Pediatric Dermatology , 1989, Grune & Stratton, Philadelfia,
na área de alopécia com a finalidade de irritar o 1989.
couro cabeludo para estimular o crescimento do 03 - Margileth Am, Museles M, Cutaneous hemamgiomas in
cabelo. children J. A .M.A . , 1995.

Abordagem da Cefaléia em Pediatria


ALEXANDRA PRUFER DE QUEIRÓZ C. ARAÚJO

INTRODUÇÃO AVALIAÇÃO DO
PACIENTE COM CEFALÉIA
A cefaléia é uma queixa freqüente entre crianças1.
Até um terço das crianças de até sete anos de idade A história será a ferramenta fundamental na
apresenta um episódio de cefaléia anual. Esta cifra determinação do diagnóstico correto. Deve-se incluir
atinge a grande maioria da população quando perguntas para o paciente e o seu responsável.
incluímos os adolescentes. Engloba a abordagem da cefaléia propriamente dita
acrescida das etapas habituais da anamnese
A cefaléia pode também ocorrer de forma repetida
pediátrica.
nas crianças1. Apresenta-se pelo menos mensalmente
em boa parte desta população, obedecendo a uma As informações obtidas com as perguntas referentes
elevação na prevalência destas formas à medida à cefaléia devem ao final da história permitir que se
que avançamos na idade de nossos pacientes (5 a defina:
20%). As causas para tal sintoma são variáveis. 1. aspectos temporais: idade de início, freqüência,
Doenças febris comuns, distúrbios craniofaciais, duração, evolução;
situações de tensão, enxaqueca e distúrbios 2. aspectos qualitativos (pulsátil, constante, pontada),
associados à hipertensão intracraniana são alguns de localização e intensidade;
exemplos2,3,4,5,6,7,8. As doenças infecciosas como as
3. sintomas associados: gastrointestinais, fonofobia,
virais, a sinusite e a faringite estreptocócica
fotofobia, neurológicos (afasia, hemiparesia, vertigem,
representam dois terços das causas de cefaléia
oftalmoplegia, distúrbio da consciência), gerais;
atendidas em serviços de emergência2. Esta também
é a etiologia da maioria das crianças atendidas em 4. fatores precipitantes (circunstâncias, alimentos,
ambulatórios gerais 3 . Nesta última instância medicamentos, atividade), agravantes (posição,
encontram-se com elevada freqüência as cefaléias manobra de Valsalva, atividades) e atenuantes
de causas psicosociais e a enxaqueca3,4,5,7. (atividades, medicamentos).

A cefaléia em cada uma dessas situações pode ser Embora a maioria dos pacientes com cefaléia
suspeitada com base na história clínica e no exame apresente o exame físico integralmente normal, este
físico do paciente. Este texto objetiva ajudar o deve necessariamente incluir:
pediatra a reconhecer algumas das principais causas 1. temperatura axilar, pressão arterial, pulso;
de cefaléia. 2. peso, altura e exame da pele;

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 173


Prática Pediátrica
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3. perímetro cefálico, ausculta craniana, sinais com base no tipo de cefaléia que o seu paciente
meníngeos; apresenta. Auxilia neste sentido rever os aspectos
temporais do sintoma, tentando classificar a cefaléia
4. fundoscopia e movimentos oculares.
em uma das seguintes categorias: (quadro 1): aguda,
Após estas duas etapas da avaliação, o médico aguda recorrente, crônica não progressiva, crônica
deverá ser capaz de formular hipóteses etiológicas progressiva.

Quadro 1 – Classificação da cefaléia de acordo com aspectos temporais

Aguda Aguda recorrente Crônica Crônica progressiva

Febre Enxaqueca Enxaqueca Tumor


Meningite Vasculite Contração muscular Hidrocefalia
Trauma Tensão Tensão Pseudotumor
Trombose Hipertensão Temporo-mandibular Hemorragia subdural
Hemorragia subaracnóide Sinusite Oftalmológica Hemorragia epidural
Distúrbios metabólicos Oftalmológica
Intoxicação
Odontológica
Oftalmológica

A realização de exames complementares para Nas cefaléias agudas e nas crônicas progressivas
confirmação da etiologia deve ser orientada de podem vir a ser indicados exames de sangue, do líquido
acordo com as principais hipóteses. A extensão desta cefalorraquiano e de imagem. A maioria dos pacientes
investigação variará de acordo com cada caso, classificados nas categorias aguda recorrente ou crônica
havendo alguns nos quais estes serão desnecessários não progressiva apresenta exame neurológico normal
e outros nos quais serão imprescindíveis (quadro 2). e prescinde de exames complementares.

Quadro 2 – Indicação para investigação de cefaléia na criança

Sinais de alerta

1. cefaléia aguda
2. cefaléia crônica, mas com mudança de padrão recente ou com menos de 6 meses de evolução
3. “a cefaléia mais intensa já apresentada na vida”
4. cefaléia unilateral sem alternância dos lados
5. exame neurológico anormal
6. mudanças de personalidade ou comportamento
7. declínio de função cognitiva

CONDUTA O tratamento sintomático deve ser instituído em todas


as formas de cefaléia, exceto na suspeita de cefaléia
O paciente com cefaléia e sua família geral- relacionada ao uso crônico de analgésicos6. Ao
mente esperam do médico mais do que a simples tratamento sintomático com analgésicos habituais, será
prescrição de um medicamento. Necessitam infor- acrescido, quando indicado, o específico, como por
mações acerca do significado e prognóstico do exemplo uso de antibiótico, encaminhamento a especia-
sintoma. lista ou procedimentos cirúrgicos de emergência.

174 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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ENXAQUECA EM PEDIATRIA a) vertigem paroxística benigna

Como etiologia neurológica predominante nas cefaléias b) torcicolo paroxístico


recorrentes de qualquer idade, a enxaqueca merece c) vômitos cíclicos
considerações específicas. Qualquer que seja o critério d) dor abdominal cíclica
adotado9,10,11 esta cefaléia se caracteriza por ocorrer
e) hemiplegia alternada
em crises intervalada por períodos assintomáticos,
acompanhada por sintomas gastrointestinais e O tratamento dos episódios de cefaléia de pacientes
tipicamente de localização unilateral. Este último com enxaqueca obedece à conduta básica de
aspecto, apesar de figurar dentre os critérios, não qualquer cefaléia: a instituição de um analgésico
costuma ser evidenciado com freqüência nos pacientes comum. Caso se possa associar um antiemético ao
pediátricos8. analgésico se obterá um efeito sinérgico no controle
da dor nesta situação. Deverão ser encaminhadas
Observa-se ainda que cada episódio dura em torno
ao especialista as crianças que apresentem episódios
de horas, a dor assume qualidade pulsátil, a
freqüentes de enxaqueca (mais de dois ao mês),
intensidade varia de moderada a intensa, é precipitado
pois nestes casos deverá ser avaliado a instituição
ou agravado por exercício e atenuado pelo sono e
de tratamento intercrítico.
é acompanhado de foto e fonofobia.
As enxaquecas são acompanhadas de acordo com
outras manifestações que porventura se associem em: REFERÊNCIAS
a) enxaqueca ou migrânea sem aura: é a forma 01 - Bille BS. Migraine in scholl children. Acta Pediatr 51
(suppl 136): 1-151, 1962.
mais comum, por isso também conhecida como
02 - Burton LJ, Quinn B, Pratt-Cheney JL, Pourani M. Headache
enxaqueca comum; etiology in a pediatric emergency department. Pediatr
Emerg Care 13(1): 1-4, 1997.
b) enxaqueca ou migrânea com aura: quando
03 - Van der Wouden JC, van der Pas P, Bruijnzeels MA,
precedida (ou acompanhada) de sintomatologia Brienen JA, van Suijlekom-Smit LW. Headache in children
neurológica (visual é a mais comum) de minutos de in Dutch general practice. Cephalalgia 19(3): 147-50,
1999.
duração, ocorre em até um terço dos casos;
04 - Anttila P, Metsahonkala L, Sillanpaa M. School start and
b1) enxaqueca basilar: quando a aura se relaciona occurence of headache. Pediatrics 103(6): e80, 1999.
ao território da artéria basilar (vertigem, diplopia, 05 - Egger HL, Angold A, Costello EJ. Headaches and
psychopathology in children and adolescents. J Am Acad
ataxia e estado confusional); Child Adolesc Psychiatry 37(9): 951-8, 1998.
b2) enxaqueca hemiplégica: associada a hemiplegia 06 - Vasaconcellos E, Pina-Garza JE, Millan EJ, Warner JS.
Analgesic rebound headache in children and adolescents.
de no máximo 24 horas de duração; J Child Neurol 13(9): 443-7, 1998.
07 - Barea LM, Tannhauser M, Rotta NT. An epidemiologic
c) enxaqueca oftalmoplégica: quando ocorre ptose, study of headache among children and
paralisia de movimentos oculares e dor retro-orbitária, 08 - 1996.
com a paralisia podendo durar dias; 09 - Fontenelle LMC, Cwaijg S. Arq Neuropsiquiatr
56(3-B):553-8, 1998.
d) enxaqueca retiníaca: com episódios curtos (até 10 - Valquist B. Migraine in children. Internat Arch Allergy
minutos) de cegueira monocular 7:348-55, 1955.
11 - Prensky AL. Migraine and migrainous variants in pediatric
Além destes quadros, as síndromes periódicas nas patients. Pediatric Clinics of North America 23:461-71,
crianças são interessantes e freqüentes. Elas podem 1976.
preceder ou ocorrer concomitante com uma das 12 - Maytal J, Young M, Schechter A, Lipton R. Pediatric migraine
and the International Headache Society (IHS) criteria.
formas de enxaqueca acima. Podemos encontrar: Neurology 48:602-7, 1997.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 175


Prática Pediátrica
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Dor Abdominal Recorrente


DIOCLÉCIO CAMPOS JÚNIOR

1) CONSIDERAÇÕES GERAIS Appley registrou incidência de DAR em 10,8% de


escolares, com ligeira tendência de predomínio nas
Entre as manifestações dolorosas crônicas da criança meninas, entre as quais a incidência foi de 12,3%,
prevalece, em praticamente todas as faixas etárias, comparada a 9,5 % entre os meninos. Notou,
a chamada Dor Abdominal Recorrente (DAR). também, que havia história de dor crônica em
Reconhecida como quadro sindrômico desde a familiares de 50% dessas crianças, assinalando ainda
década de 60, essa entidade clínica tem que a ocorrência de cefaléia e distúrbios nervosos
representado um desafio crescente para os que era nitidamente mais comum nos parentes dos
exercem a medicina da criança, mercê dos complexos portadores de DAR do que nos controles. Os sintomas
componentes de natureza biopsicossocial que estão mais freqüentemente associadas à DAR foram vômitos
na gênese de suas manifestações sintomáticas mais (66%), palidez (50%) cefaléia (20%) e sonolência
relevantes e das fortes implicações familiares que pós crise (25%).
contribuem, muitas vezes, para tumultuar-lhe a
evolução.
Não obstante o caráter benigno da maioria dos 3) DEFINIÇÃO
casos, há evidências cada vez mais veementes de
O conceito clássico de DAR foi formulado por Appley,
que a DAR na criança possa ser o prenúncio da
que a caracterizou como manifestação dolorosa de
Síndrome do Cólon Irritável no adulto(1). Ademais,
localização geralmente periumbilical, afetando
em virtude dos avanços tecnológicos na área
crianças com mais de 3 anos de idade, com
diagnóstica, a identificação de causas orgânicas
freqüência de três ou mais episódios de dor, capazes
subjacentes vem se fazendo com maior freqüência,
de modificar suas atividades diárias, ocorridos num
permitindo melhor fundamento para a abordagem
período não inferior a 3 meses.
terapêutica específica.
A definição atual, resultante da experiência
Por outro lado, tratando-se de condição sujeita a
acumulada ao longo dos anos, é mais abrangente
recidivas freqüentes, a DAR impõe amiúde ao pediatra
e considera a DAR como manifestação dolorosa
um verdadeiro exercício de paciência, que pressupõe
paroxística, que pode se traduzir por episódios de
firmeza diagnóstica, aliada à contínua vigilância para
dor periumbilical ou mesoepigástrica, ocorrendo
a possível presença de doenças mais raras como
diariamente ou várias vezes por semana, ao longo
causa do quadro sindrônico em questão. É a situação
de semanas a meses, sem relação evidente com as
bem descrita por Levine M. D. e Rappaport L.A.+,
refeições, estresse ou exercícios, podendo ou não
que chamam a atenção para o risco de verdadeiro
interromper as atividades normais da criança4.
isolamento do pediatra no contexto sociofamiliar das
crianças portadoras de DAR: “O pediatra poderá
sentir-se solitário e abandonado, tentando uma
peregrinação pelas subespecialidades, perseguido pela
4) ETIOPATOGENIA
inquietante dúvida: estarei omitindo alguma coisa?” As causas orgânicas da DAR são identificadas
atualmente em pouco mais de 10% dos casos, e sua
relação é muito extensa, incluindo quase uma centena
2) IMPORTÂNCIA DO PROBLEMA de doenças de natureza diversa. Algumas delas,
O clássico estudo realizado em Bristol por Appley3, contudo, são mais comumente responsabilizadas pela
envolvendo 1.000 escolares, continua sendo referência etiologia da DAR, merecendo citação as gastrites,
para os principais aspectos epidemiológicos da DAR, úlcera péptica, intolerância à lactose, à sacarose,
posto que seus resultados foram confirmados por vários doença celíaca, pielonefrite, giardíase, ascaridíase,
outros estudos feitos em distintas populações. divertículo de Meckel e litíase renal.

176 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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Na imensa maioria das crianças que sofrem Outra constatação de natureza etiopatogência
dessa manifestação não se diagnostica doença importante refere-se ao aumento da sensibilidade
orgânica, sendo o quadro sindrômico definido como dolorosa à distensão do íleo, reto-sigmóide e ano-
Dor Abdominal Recorrente Funcional, uma vez que reto, o que reforça o significado da chamada
a antiga concepção de dor puramente psicogênica Constipação Oculta da Infância como causa da DAR6.
perdeu significado diante da evidência de que, Trata-se da condição presente em algumas crianças
nesses pacientes, os sintomas costumam ser que costumam reter suas fezes, tornando-se constipadas
expressão clínica de um distúrbio da sensibilidade sem se darem conta do fato. A distensão do cólon
gastrointestinal provocado pelo estresse físico ou desencadeia cólicas abdominais de caráter intermitente,
psicológico. de localização variável, geralmente referidas à região
periumbilical ou ao quadrante inferior esquerdo. São
Conhecimentos adquiridos nas últimas décadas
crianças que aparentam ter hábitos intestinais regulares
fortalecem a abordagem biopsicossocial da criança
mas que, na verdade, apresentam defecação
portadora de DAR, com base na caracterização de
incompleta, situação que pode ser revelada pela
dois mecanismos essenciais: a) Nociceptor, constituído
presença de fezes no reto, ao raio x simples de
pelo nervo periférico e receptor sensorial visceral,
abdômen, em posição supina e após micção completa.
encarregado da recepção e transmissão do estímulo
doloroso; b) Afetivo, representado pelo estado mental, Em síntese, a DAR resulta da somatória de
responsável pela gradação da resposta à dor. Fatores experiências de natureza sensorial, emocional e
genéticos, a experiência pessoal e o ambiente cultural cognitiva, particularizadas pelas diferenças individuais
interagem, estreitamente, para influenciar esse dois na captação das sensações viscerais, pelo grau de
mecanismos e determinar as características da reação estresse vivenciado pela criança, pelo tipo de sua
individual à dor. personalidade e pelo maior ou menor reforço dos
sintomas, provocado pelo comportamento dos
Define-se, assim, a existência de um Eixo Cérebro-
circunstantes em relação à sua queixa. Não há,
Intestinal ligando os sistemas nervosos central e
contudo, um padrão psicopatológico que assemelhe
entérico, de tal modo que as vias nervosas bidirecio-
os portadores de DAR.
nais desta estrutura comunicam as sensações viscerais
aferentes com a função motora intestinal, ambas
modificadas pelos centros corticais superiores. Assim, 5) CARACTERÍSTICAS CLÍNICAS
a condução dos estímulos originados nos receptores E ASPECTOS DIAGNÓSTICOS
nociceptivos, até à medula e cérebro, é regulada
pelo corno posterior da medula, sendo a dor A DAR costuma ter início entre dois e três anos de
finalmente influenciada pelos centros cognitivos e idade. Quando se manifesta antes desta faixa etária,
emocionais. são maiores as chances de causa orgânica.
A dor se localiza, caracteristicamente, na região
Admite-se que alterações nos receptores sensoriais
periumbilical ou no quadrante inferior esquerdo do
do intestino, na modulação da transmissão sensorial
abdômen, valendo o princípio de Stone e Barbero7,
no SNC ou periférico, na percepção cortical e na
segundo o qual, quanto mais próxima do umbigo for
memória da dor, possam criar uma situação de
a dor, menor é a chance de que sua origem seja
Hiperalgesia Visceral, que baixa o limiar para o
orgânica.
fenômeno doloroso, fazendo com que as referidas
estruturas transmitam estímulos que normalmente não O tipo da dor é mal definido pelo paciente, e seu
causam dor5. aparecimento se faz em qualquer hora do dia,
podendo, às vezes, despertar a criança de seu sono
Sabe-se, além disso, que os nervos sensoriais da
noturno. O sintoma pode melhorar durante os fins de
pele e músculos da parede abdominal estabelecem
semana, quando diminuem os estresses, ou durante
sinapses em vários interneurônios da medula, que
as férias, pela mesma razão.
atravessam alguns dermátomos. Essa peculiaridade
anatômica e fisiológica, conhecida por Convergência O início dos episódios é gradual, a dor é pouco
Víscerossomática, gera uma verdadeira difusão do intensa, e sua duração pode se estender por vários
campo da dor, e pode tornar difícil a diferenciação minutos ou, às vezes, se prolongar por horas ou
entre suas origens musculoesquelética e visceral. dias. Em outras ocasiões, o paciente refere uma

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 177


Prática Pediátrica
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sensação dolorosa contínua, que não interfere, 6) AVALIAÇÃO LABORATORIAL


contudo, em suas atividades diárias.
A avaliação laboratorial a se fazer na maioria dos
Não há relação clara com as refeições nem com casos, isto é, na ausência de causa orgânica
hábitos intestinais, nem tampouco se caracteriza aparente, inclui poucos exames laboratoriais, a saber:
periodicidade da dor, sendo sua freqüência hemograma, VHS, EAS, urocultura, exame parasi-
imprevisível, alternando-se episódios isolados em tológico de fezes e Rx simples de abdômen em
intervalos de semanas ou com duração de alguns posição supina.
dias. Nas situações em que há causa orgânica para
As investigações mais amplas, visando diagnosticar
a DAR, a dor costuma ser persistente, mantendo
possíveis doenças orgânica como causas da DAR,
igual intensidade ou revelando intensidade crescente.
deverão ser feitas quando houver sinais clínicos
Sintomas tais como cefaléia, palidez, náuseas, sugestivos ou, então, sempre que se caracterizar um
vômitos, tontura e cansaço podem se associar aos ou mais indícios da seguinte relação dos chamados
episódios de dor, não tendo, contudo, significado “sinais vermelhos”, ou de risco, citados por Levine:
preditivo quanto a eventual causa orgânica. 1) Perda de peso ou diminuição do apetite;
Entre os episódios de DAR o paciente se mantém em 2) Aparecimento de sintoma com alguma especifi-
bom estado geral, e seu crescimento é normal. Duas cidade: mudança de hábitos intestinais, poliúria,
variantes desta enfermidade, mais comuns no adulto, distúrbios menstruais, vômitos, etc;
merecem ser citadas porque podem, às vezes, ocorrer 3) Anemia, leucocitose, aumento do VHS, eosinofilia,
na criança, principalmente no adolescente, com alteração da morfologia das células sanguíneas;
algumas particularidades clínicas. São elas: a
4) Alteração do EAS, urocultura positiva;
Síndrome do Cólon Irritável, na qual a dor abdominal
se associa a diarréia intermitente e constipação, sem 5) Hemorragia oculta ou franca em qualquer orifício;
evidência de causa orgânica; e a Dispepsia não 6) História familiar positiva para alguma doença
Ulcerosa, que corresponde ao quadro revelado por (exemplo: úlcera péptica);
alguns pacientes com sintomas sugestivos de úlcera 7) Sintomas constitucionais de doença crônica (febre
péptica, que respondem bem aos antiácidos e recidivante, aspecto doentio, retardo de crescimento,
apresentam endoscopia do trato gastrointestinal edema articular).
superior normal.
É importante, contudo, firmar o diagnóstico de DAR
Considerando-se a multiplicidade dos fatores pelas características clínicas e psicossociais do
etiopatogênicos de que dependem as características paciente. O diagnóstico por exclusão deve ser evitado
da DAR, é fundamental que, na anamnese, se busque porque tal atitude médica poderá agravar a ansiedade
a identificação de possíveis estados de estresse da família, na medida em que fica para ela a
intrafamiliares ou escolares, atitudes familiares de impressão de que deve estar ocorrendo doença grave
reforço em relação à queixa da criança (dispensa não revelada pelos exames. Claro está que um mínimo
das aulas, uso de medicamentos nos episódios de de investigação laboratorial será necessário para
dor, maior atenção e preocupação com possível diagnóstico e tratamento mais seguros.
doença grave)¸ e antecedentes familiares da Sindrome
do Cólon Irritável, Enxaqueca e Ulcera Péptica.
7) TRATAMENTO
O Exame físico levará em conta o fato de que a
Na grande maioria dos casos, caberá ao pediatra
DAR pode ser resultado de inúmeras doenças
geral o papel mais importante na condução do
sistêmicas. Por isso, o exame será completo, notando-
tratamento. O êxito terapêutico depende de uma
se que perda de peso é um indicador sensível de
relação de confiança estabelecida com o paciente
doença orgânica. O exame abdominal observará,
e sua família.
ainda, distensão, sensibilidade aumentada,
visceromegalias ou massas palpáveis, em casos de O primeiro e mais relevante princípio desta relação
DAR de origem orgânica. O exame retal permitirá consiste em saber valorizar a queixa da criança,
detectar a presença de fezes endurecidas na ampola lembrando que a inexistência de causa orgânica
retal, em caso de constipação, ou, ainda, revelar não significa que a dor não exista. Vale dizer que,
massas abdominais ou pélvicas suspeitas. na imensa maioria dos casos, a dor é verdadeira.

178 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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Cumpre, pois, assegurar aos pais que a manifestação Sempre que se suspeitar de intolerância a carboidratos
dolorosa é real, e interagir com eles no sentido de presentes em outras fontes alimentares, tais com a
restabelecer a tranquilidade na vida da criança, frutose das bebidas carbonatadas, o sorbitol ou o
assegurando-lhes que não há doença orgânica amido dietético, o tratamento consistirá de exclusão
causando os sintomas de seu filho. O outro passo do alimento suspeito, a título de prova terapêutica.
decisivo é explicar, com paciência e detalhe, o
O uso de medicamentos como antiespamódicos e
mecanismo da dor, seus fatores predisponentes e
anticolinérgicos será reservado como ultima instância
agravantes.
na tentativa de atenuar a intensidade do fenômeno
Nesse sentido, é sempre de valor ter em mente a doloroso.
possibilidade de atuação nos quatro grupos de fatores
assinalados por Rapparport, cuja interação atua seja
como elemento desencadeador do fenômeno doloroso, 8) EVOLUÇÃO
seja como modulador de sua natureza e intensidade. Com a condução adequada do tratamento,
O primeiro deles é composto pela PREDISPOSIÇÃO, implicando profundas modificações ambientais e
DISFUNÇÕES E DOENÇAS SOMÁTICAS. O exemplo comportamentais, cerca de um terço das crianças
principal de atuação neste caso é a terapêutica responde favoravelmente, livrando-se dos sintomas
laxante, aliada a modificações dietéticas instituídas da DAR. O restante dos casos evolui, na idade
para reverter a constipação, quando presente. O adulta, seja para síndrome do cólon irritável ( 30 a
segundo grupo de fatores é constituído pelos ESTILOS 50%), seja para outros quadros sintomáticos crônicos,
DE VIDA E HÁBITOS. Para sua normalização são como a cefaléia.
necessárias mudanças nas rotinas diárias da criança,
que possam estar contribuindo para a DAR, como é
o caso, por exemplo, dos longos períodos diante da
TV levando à retenção de fezes e constipação. O
9) BIBLIOGRAFIA
terceiro grupo refere-se ao MEIO AMBIENTE E 01 - Walker LS, Guite JW, Duke M. Recurrent abdominal pain:
a potential precursor of irritable bowel syndrome in
EVENTOS CRÍTICOS. Sua trama esconde estresses adolescence and young adults. J. Ped. 132(6):1010-1015,
importantes que estão na gênese da DAR, devendo, 1998.
por isso mesmo, ser identificados e afastados. 02 - Levine MD, Rappaport LA. Dores abdominais recidevantes
na criança escolar: A solução do médico a longa distância.
Finalmente o quarto grupo de fatores é representado Clin. Ped. Am. Norte: 05 : 1017-1040,1984.
pelos TEMPERAMENTOS E MODELOS DE RESPOSTA 03 - Appley J, Naish N. Recurrent Abdominal pains: a field
APRENDIDAS. Seu controle pressupõe atuação em survey of 1000 school children. Arch. Dis. Child 33:165,
1958.
várias frentes que propiciem normalização da
04 - Ling Kodayk. Dor abdominal recorrente in Barbieri D.
reatividade da criança à dor, e supressão dos Gastroenterologia Pediátrica.
comportamentos familiares que reforcem reações 05 - Hyams JS, Hyman PE. Recurrent abdominal pain and the
negativas ou respostas desfavoráveis aprendidas. É biopsychososial model of medical practice. J. Ped: 133(04):
473-478,1998.
preciso fazer com que os pais saibam apoiar a criança 06 - Barr RG, Levine MD. Chronic and occult stool retention.
e não a dor. A clínical tool for its evaluttion in school-aged
children.Clin.Pediatr.18:674,1979.
Quando estiver presente a intolerância à lactose, o 07 - Stone RJ, Barbero G.J. Recurrent abdominal pain in
tratamento estabelecerá dieta restritiva deste açúcar. childhood. Pediatrics, 45:732,1970.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 179


Prática Pediátrica
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Problemas de Crescimento
MARCO ANTONIO BARBIERI

Crescimento em estatura é um processo dinâmico que pesquisadores antropológicos, a alta estatura


começa na concepção e termina na idade adulta. predispõem à liderança (estatura é status). A média
Taxas de crescimento e capacidade para o crescimento de estatura de populações é o melhor índice de
são geneticamente codificadas na concepção, e desenvolvimento de uma região, melhor inclusive que
interações complexas entre secreções hormonais, certos índices econômicos. Deste modo, a estatura
estado nutricional e estado de saúde influenciam a tem importância individual e em Saúde Pública.
expressão genética. Portanto, crescimento é um dos
Numa análise de 10 anos de existência do
melhores indicadores de saúde. O pediatra é
Ambulatório de Problemas de Crescimento e
testemunha de como o crescimento ocorre, e seu papel
Desenvolvimento do Hospital das Clínicas da
primordial é monitorizar se o crescimento é adequado,
Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, observou-
detectar desvios e agir quando anormalidades estão
se que o diagnóstico mais freqüente foi a baixa
presentes. A detecção de problemas de crescimento
estatura, com aproximadamente 82% dos casos. Os
é baseada na análise de medidas seriadas,
casos de baixa estatura como variante normal (baixa
principalmente, do peso e da altura.
estatura constitucional, familiar e constitucional com
Deficiência no crescimento e baixa estatura devem ser ambos os componentes - familiar e constitucional)
distinguidas uma da outra. Enquanto deficiência no representaram em torno de 75% dos diagnósticos,
crescimento sempre se refere a um processo patológico seguidos pela Síndrome de Turner com 5,5%,
básico, baixa estatura não é necessariamente um sinal disgenesias ósseas com 4,9%, Síndrome de Silver-
de doença. Essa distinção tem implicações óbvias Russel com 2,5% e outras 2,9%. A baixa estatura
para os pediatras: as deficiências no crescimento causada por déficit de GH foi verificada em somente
necessitam ser investigadas sem demora, enquanto 0,9% dos casos. A alta estatura representou 0,9%
baixa estatura acompanhada por uma taxa de dos diagnósticos. Os demais casos ainda estavam
crescimento normal usualmente requer pouca em fase de avaliação, sem diagnóstico definitivo.
investigação. A deficiência de crescimento é definida
por uma velocidade de ganho em altura abaixo do
percentil 10 da curva de velocidade de crescimento BAIXA ESTATURA
da população de referência. Já a baixa estatura se
refere a altura abaixo do percentil 3 da curva de 1. CONCEITO
altura usada como referência.
É considerado com baixa estatura todo indivíduo
Crescimento é um indicador bastante sensível para que apresentar estatura menor do que o percentil 3
medidas de saúde tanto a nível individual como da curva de referência.
populacional. Provavelmente nenhum outro parâmetro
2. AVALIAÇÃO DO CRESCIMENTO NA BAIXA
isolado reflete melhor o estado de saúde da criança.
ESTATURA
O crescimento está freqüentemente diminuído ou
estacionado em crianças que sofrem de doenças 2.1. ANAMNESE
crônicas de qualquer tipo. A deficiência de
É importante avaliar condições de nascimento, sendo
crescimento é especialmente comum durante períodos
essenciais peso e comprimento ao nascer. No período
de crescimento rápido, como ocorre nos primeiros
pós-natal lembrar de asma grave em tratamento com
dois anos de vida e na puberdade.
corticosteróide sistêmico por longo período. A
O acompanhamento do crescimento e suas alterações velocidade de crescimento é mais importante do que
é conhecimento fundamental da formação do uma simples medida de estatura, já que esta pode
pediatra, sendo uma das atividades que o diferenciam não mostrar o padrão de crescimento. Uma velocidade
do clínico geral. A estatura do indivíduo é um de crescimento abaixo do percentil 3 tem muita chance
verdadeiro cartão de visitas biológico. Para de ser uma situação patológica. Como o crescimento

180 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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não ocorre de maneira linear e sofre influência sazonal, É importante avaliar também a história do
a velocidade de crescimento é melhor avaliada quando desenvolvimento puberal dos pais, principalmente: a
as medidas forem realizadas com intervalos de pelo idade da menarca materna, se o pai ainda cresceu
menos 4 meses. após se apresentar no serviço militar e se começou
a barbear-se cedo ou tarde.
Para avaliação do potencial genético, importante
para verificar se o padrão de crescimento da criança
tem caráter familiar, é necessário que se obtenha a 2.2. EXAME FÍSICO E ANTROPOMETRIA
altura dos pais. Para isso as fórmulas para o cálculo No exame físico da criança é importante verificar a
do canal familiar (CF) estão representadas a seguir: presença de alguns estigmas que possam sugerir
• crianças do sexo feminino: patologias genéticas, cromossômicas ou gênicas, e
mesmo associadas com distúrbios metabólicos e
CFF = (P - 13) + M ± 9 doenças endócrinas.
2
A precisão da medida de peso e estatura é a chave
para uma correta avaliação do crescimento. A
• crianças do sexo masculino: precisão engloba instrumentos calibrados e técnicas
CFM = P + (M + 13) ± 10 de medidas adequadas. Além disso é importante
2 colocar estas medidas frente a uma curva de
referência. São importantes também outras medidas
Onde “CFF” é o canal familiar feminino; “CFM” é o como altura sentado, e outras proporções corporais
canal familiar masculino; M é a altura da mãe em (para a distinção de baixa estatura proporcionada e
cm; P é a altura paterna em cm. O canal familiar desproporcionada), pois elas auxiliam no diagnóstico
máximo e o canal familiar mínimo correspondem, diferencial.
respectivamente, ao extremo superior e inferior do
intervalo do intervalo de confiança (95%). Para o 2.3. AVALIAÇÃO DO DESENVOLVIMENTO PUBERAL
sexo feminino o número 9 representa 2 desvios Ainda como parte do exame físico, a avaliação dos
padrões (um desvio padrão é 4,5 cm), a adição de estágios puberais é baseada nos critérios descritos
9 encontra o limite superior do canal e o limite por TANNER (1962), usando padrões de
inferior do canal é encontrado diminuindo-se 9. Para desenvolvimento para mamas e pelos pubianos nas
o sexo masculino o número 10 representa 2 desvios meninas e genitais e pelos pubianos para os meninos,
padrões ( um desvio padrão é 5 cm), a adição de com uma escala que varia de 1 a 5. O primeiro
10 encontra o limite superior do canal e o limite sinal de puberdade na menina é o aumento da mama
inferior é encontrado diminuindo-se 10. e do menino é o aumento do testículo (> 3 cm3 do
A constante “13” refere-se ao valor em centímetros volume avaliado pelo orquidômetro de Prader).
na estatura final que os homens tem, em média, a As meninas apresentam a menarca aproximadamente
mais que as mulheres. Estes centímetros são obtidos 2 anos após o início do desenvolvimento mamário,
devido aos 2 anos posteriores no desenvolvimento enquanto os homens completam a puberdade 2 a
puberal dos meninos, o que lhes dá 11 cm a mais 4 anos após.
(5,5 cm/ano) e os outros 2 cm é a diferença no
pico máximo de crescimento dos homens em relação 2.4. AVALIAÇÃO DA IDADE ÓSSEA
às mulheres.
A idade óssea é verificada através da radiografia
Lembrar que este cálculo só é bom referencial quando de punho e mão esquerda comparada com o Atlas
usado no período da equação da reta na curva de de Greulich-Pyle. O tempo de início da puberdade
crescimento, ou seja, de 2 a 3 anos de idade até está mais relacionado com a maturidade óssea do
9 a 10 anos de idade. A partir desta idade o canal que com a idade cronológica. A média de idade
de crescimento depende do tipo de maturação, se do início da puberdade em mulheres (mamas no
esta é precoce, mediana ou tardia, podendo a curva estágio II de Tanner) é a idade óssea de 10,9
de crescimento ficar por algum período fora do canal anos, e para homens (testículos >3 cm3) é a idade
familiar, que irá se restabelecer após o início da óssea de 11,5 anos. A idade óssea dá informações
puberdade. relativas ao potencial do crescimento, porque a

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 181


Prática Pediátrica
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estatura final é influenciada pela velocidade de 3 e 97), a família pode ser tranqüilizada. Neste
crescimento e a maturidade esquelética. Uma criança caso, o acompanhamento com avaliação da idade
tem potencial de crescimento aumentado se a idade óssea é suficiente. A estatura final pode ser predita
óssea for atrasada em relação a idade cronológica. por vários métodos, mas eles são pouco válidos para
crianças com velocidade de crescimento anormal.
3. EVOLUÇÃO DIAGNÓSTICA Se a história e/ou exame físico levarem a outras
Uma boa anamnese e um bom exame físico, incluindo suspeitas diagnósticas, outros exames laboratoriais
o estadiamento puberal, leva na maioria das vezes a podem ser necessários, como avaliação dos
um diagnóstico preciso. A anormalidade da velocidade hormônios tireoideanos e sexuais, cariótipo. Em
de crescimento é que mais distingue entre presença situações em que forem descartadas outras patologias,
ou ausência de doença. Se a velocidade de testes para avaliação do GH são necessários.
crescimento é normal para a idade (entre o percentil

4. PRINCIPAIS CAUSAS DE BAIXA ESTATURA

4.1. VARIANTES NORMAIS


A) Baixa estatura familiar
B) Baixa estatura constitucional
C) Baixa estatura constitucional com componente familiar

4.2. BAIXA ESTATURA DE CAUSA PATOLÓGICA

A) Baixa estatura desproporcionada


1. Displasia óssea
2. Raquitismo

B) Baixa estatura proporcionada


1. Início pré-natal - Retardo do crescimento intra-uterino –Síndrome de Silver-Russell
2. Início pós-natal
a) Causas endócrinas – pan-hipopituitarismo, hipotiroidismo, excesso de glicocorticóides, déficit de GH
b) Anomalia Cromossômica – Sindrome de Turner.
c) Anomalia Gênica - Síndrome de Noonan.
d) Causas não endócrinas - nanismo psicossocial, desnutrição, doenças cardíacas e pulmonares, anemia
crônica, doenças renais, doenças gastrointestinais e mucopolissacaridoses.

4. PRINCIPAIS CAUSAS DE BAIXA ESTATURA mesmo porque os estudos não mostraram vantagens
no uso de GH em pacientes com este tipo de
4.1.VARIANTES NORMAIS diagnóstico. Os pais devem ser orientados quanto
ao padrão normal e genético do crescimento da
A) BAIXA ESTATURA FAMILIAR – Este diagnóstico é
criança.
feito quando a criança tem percentil de estatura para
idade menor do que 3, não tem idade óssea B) BAIXA ESTATURA CONSTITUCIONAL – Esta é a
atrasada, não apresenta característica de alterações causa mais comum atendida em clínicas de problemas
gênicas ou cromossômicas, é apropriada para o de crescimento. Este diagnóstico é feito quando a
canal familiar ou potencial genético e tem velocidade criança tem percentil de estatura para idade menor
de crescimento normal. O estirão puberal ocorre na do que 3, tem idade óssea atrasada, velocidade de
idade cronológica normal. O tratamento é expectante, crescimento normal e não segue o canal familiar.

182 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Prática Pediátrica
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Estes pacientes têm comprimento de nascimento c) Anomalia Gênica – Síndrome de Noonan – Trata-
normal e a desaceleração do crescimento ocorre se de uma anormalidade gênica e não cromossômica
nos primeiros 2 anos de vida. Eles têm atraso da que ocorre no sexo masculino ou feminino, em que
puberdade e consequentemente atraso do estirão de o paciente tem características clínicas da síndrome
crescimento. O tratamento é expectante e requer de Turner.
tranqüilizar a criança e a família.
d) Causas não endócrinas – As causas não
C) BAIXA ESTATURA CONSTITUCIONAL COM endócrinas são mais comuns do que as causas
COMPONENTE FAMILIAR – Este diagnóstico é feito endócrinas. O paciente tem proporções corporais
quando a criança tem percentil de estatura para normais. Em geral a história e o exame físico são
idade menor do que 3, tem idade óssea atrasada, suficientes para fazer o diagnóstico definitivo. As
velocidade de crescimento normal e segue o canal causas mais freqüentes são: nanismo psicossocial,
familiar. O canal familiar por sua vez situa-se parcial desnutrição, doenças cardíacas e pulmonares, anemia
ou totalmente abaixo do percentil 3. crônica, doenças renais, doenças gastrointestinais e
mucopolissa- caridoses.
4.2. BAIXA ESTATURA DE CAUSA PATOLÓGICA
A) BAIXA ESTATURA DESPROPORCIONADA
CONCLUSÃO
1. Displasia óssea Pacientes com baixa estatura podem não ser
2. Raquitismo reconhecidos se medidas rotineiras e precisas não
forem realizadas. Uma precisa avaliação do
B) BAIXA ESTATURA PROPORCIONADA crescimento requer medidas confiáveis e precisas, e
1. Início pré-natal - Retardo do crescimento intra- correto uso de padrões de crescimento. Isto pode ser
uterino – A criança apresenta comprimento e/ou feito em ambulatório de cuidados primários,
peso ao nascer abaixo do 3o percentil para a idade anualmente ou em cada visita médica.
gestacional. Fica classificada nesta situação a Quando avaliamos crianças com baixa estatura,
Síndrome de Silver-Russell em que, além do dados prévios de crescimento, história alimentar,
comprimento ser menor do que o percentil 3, história do nascimento, altura dos pais e história do
apresenta uma assimetria do tronco ou dos membros. desenvolvimento puberal dos pais são extremamente
2. Início pós-natal importantes. Muitas crianças com baixa estatura não
tem anormalidade endócrina e o pouco crescimento
a) Causas endócrinas – A baixa estatura de causa
é o único problema. Se o diagnóstico da causa não
endócrina é menos comum do que as de causas
foi feito pela história e exame físico, exames
não endócrinas. Pode-se citar: pan-hipopituitarismo,
laboratoriais individualizados para cada paciente
hipotiroidismo, excesso de glicocorticóides, déficit
podem determinar o diagnóstico. Algumas crianças
de GH (baixa estatura por déficit de GH é incomum).
necessitam de testes especializados, como cariótipo
b) Anomalia Cromossômica – a principal representante ou teste para verificar déficit de GH. A terapêutica
é a Sindrome de Turner. É baixa estatura que ocorre para baixa estatura depende do entendimento da
no sexo feminino, podendo apresentar também sinais etiologia. Na maioria das vezes a tranquilidade de
físicos típicos como: pescoço alado, implantação baixa pediatra, criança e familiares, além de necessária,
da orelha, cabelo em tridente, tórax em “escudo”, é totalmente suficiente.
valgismo cubital e encurtamento do 3º metacarpo. Na
idade puberal o hormônio folículo estimulante e
luteinizante estão aumentados, indicando falha primária REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
do ovário, pois estas meninas têm gônodas
01 - BERTRAND J, RAPPAPORT R, SIZONENKO PC. Pediatric
rudimentares, “em fita fibrosa”. O tratamento endocrinology. 2.ed. Baltimore, Willians & Willians, 1993.
estrogênico deve ser iniciado quando a velocidade 02 - CAMERON N. The prediction of adult height. In: TANNER
de crescimento começar a estacionar. Geralmente não JM., HAUSPIE R, LINDGREN G, FALKNER F.(eds).
há deficiência de GH, mas sua reposição parece Essays on auxology. London, Castlemead Publications,
p.126-140, 1995.
determinar um aumento da velocidade de crescimento 03 - FOX LA. Evaluation of Short Stature. Comprehensive
e aumento da estatura final. Therapy, v.21, n.3, p.15-121, 1995.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 183


Prática Pediátrica
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

04 - GREULICH WW & PYLE SI. Radiographic Atlas of skeletal 07 - MARCONDES E. Desenvolvimento da criança -
development of the hand and wrist. Second edition. desenvolvimento biológico – crescimento. Rio de Janeiro,
Stanford, California, Stanford University Press, 1959. Sociedade Brasileira de Pediatria, 1994.
05 - KRISTIANSSON B, ASCHER H. Growth failure in
gastrointestinal disease: pathophysiology and treatment 08 - NURKO S. Growth in chronic disease: Introduction.
International Seminars in Paediatric Gastroenterology and International Seminars in Paediatric Gastroenterology and
Nutrition, 6 (3): 3-7, 1997. Nutrition, 6 (3): 1-3, 1997.
06 - MAES M, UNDERWOOD LE. Growth failure in chronic
disease: pathophysiology and treatment. International 09 - TANNER JM. Métodos auxológicos no diagnóstico
Seminars in Paediatric Gastroenterology and Nutrition, diferencial de baixa estatura. Anais Nestlé. v.41, n.2,
6 (3): 8-15, 1997. p.1-16, 1985.

184 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP)


e o Aleitamento Materno
SÔNIA MARIA SALVIANO MATOS DE ALENCAR

1. SITUAÇÃO DA SAÚDE amamentação é relativamente curta e o aleitamento


NO BRASIL materno exclusivo durante seis meses, como é
recomendado, não é adequadamente praticado.
O Brasil, com uma população estimada de 160
milhões de habitantes, é o quinto maior país do Em estudos realizados em 1986 e 1996 onde se
mundo. A taxa de mortalidade infantil é de 57,5 comparam porcentagens de criança recebendo leite
por mil nascidos vivos e, 7,8% das crianças, nascem materno em suas dietas em diferentes faixas etárias,
pesando menos de 2.500 gramas. No grupo de observa-se no grupo de zero a 4 meses um aumento
crianças com menos de 5 anos de idade, 5,7% são de 74% para 85%; no grupo de 10 a 14 meses de
desnutridas, havendo variações que vão de 25% 28% para 37%; e no grupo de 22 a 26 meses de
nas áreas pobres do Nordeste rural, a 2% em áreas 10% para 15% nos respectivos anos.
da região sul. A diarréia continua sendo uma doença Isto mostra uma tendência no aumento da duração
comum e chega a ser responsável por um terço das do aleitamento materno, o que é atribuído aos
mortes na infância, na região Nordeste do País. esforços de promoção realizados por organismos
Pesquisa realizada no Brasil mostrou que crianças de públicos, ONGs e demais instituições envolvidas com
dois meses de idade que mamavam exclusivamente a prática da amamentação. Dados recentes são muito
no peito tiveram 25 vezes menos risco de morrer por mais claros com relação à situação do aleitamento
diarréia e quatro vezes menos risco de morrer por materno exclusivo. Estudo realizado em 1996 mostra
infecções respiratórias, quando comparadas com que, no primeiro mês de vida, 49% das crianças
crianças da mesma faixa etária que não eram recebem água, 23% recebem leite de vaca; 23%
amamentadas. Crianças alimentadas com a recebem substitutos do leite materno e 16% recebem
mamadeira apresentaram dez vezes maior risco de outros alimentos.
serem hospitalizadas devido à infecção bacteriana, As razões para este declínio do aleitamento materno
do que aquelas que receberam leite materno. exclusivo após o nascimento, de acordo com
No Brasil, o custo da alimentação de um bebê com publicação do Ministério da Saúde e UNICEF, são:
mamadeira é alto e chega a consumir até 25% do • Forte cultura da mamadeira e mitos sobre o
salário mínimo. Quando se comparam estes valores aleitamento materno, como a crença de que somente
com a renda de milhões de famílias, especialmente o leite materno é insuficiente para a nutrição do
do Nordeste, que recebem mensalmente menos de bebê;
um salário mínimo, não há como negar a importância
• Falta de informação correta para as mães;
de se promover, proteger e apoiar a amamentação.
• Práticas hospitalares inadequadas, como o início
retardado da primeira mamada, ausência de
2. PADRÕES DO alojamento conjunto, introdução de substitutos do leite
ALEITAMENTO MATERNO materno e uso de mamadeiras;
A maioria das crianças brasileiras (92,5%) é • não-cumprimento das leis que protegem o direito
amamentada no início. Porém, a duração média da de amamentar.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 185


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

3. O LEITE HUMANO exclusivo, sem uso de água, chás ou outros líquidos


para todas as crianças até os seis meses e
O leite humano possui atributos qualitativos em sua complementado adequadamente até os dois anos
constituição, capazes de atender às características de idade ou mais.
da fisiologia e do metabolismo da criança, de forma
O sucesso da amamentação depende, em grande
integral. Cada um dos constituintes se adequa às
parte, da rotina dos serviços de saúde, das práticas
necessidades das crianças, garantindo qualidades
hospitalares e da postura dos profissionais de saúde.
não encontradas em nenhum outro tipo de leite.
Atualmente propaga-se no Brasil a afirmativa de
Assim, os altos níveis de IgA, secretora do leite humano, que o pediatra detém a maior responsabilidade
representam uma resposta à imaturidade imunológica sobre o desmame precoce das crianças. Esta
do recém nascido. A relação metionina-cistina significa afirmativa se torna verdadeira partindo-se do
uma adequação à capacidade inicial do bebê para princípio de que o pediatra é o profissional que
realizar a transmutação destes aminoácidos. O baixo atende à demanda da faixa etária em discussão,
teor tamponante, um ajuste à necessidade gástrica, a bem como é um formador de opinião nos serviços
existência da lipase uma compensação para o seu de saúde materno-infantil. Portanto, não adianta
déficit nos primeiros dias de vida. As quinonas e dispor de estruturas hospitalares ou serviços de saúde
vitamina E do leite humano são indispensáveis para propícios ao aleitamento materno se não contarmos
proteger a mucosa dos danos oxidativos. com um pediatra engajado, consciente e capaz de
A presença de fatores de crescimento estimula os realizar adequadamente o manejo da amamen-
sistemas vitais do bebê, enquanto os ácidos graxos tação.
poliinsaturados de cadeia longa favorecem o processo O aleitamento materno, embora seja biologicamente
de mielinização e, consequentemente, o desenvolvi- determinado, é também socialmente condicionado
mento do sistema nervoso central. Os oligossacarídeos e, por isso, sofre influências negativas quanto à sua
nitrogenados favorecem a instalação da flora bífida, valorização. Por esta razão, precisa ser aprendido
que é protetora importante do trato gastrointestinal. por todos as mulheres a partir da infância, do início
O leite humano é composto de mais de 150 de sua formação, passando por exemplos
substâncias, todas com funções biológicas bem apropriados na família, na escola e em toda sua
definidas. O componente presente em maior trajetória até a idade reprodutiva. A gestante requer
quantidade é a água. As proteínas presentes na estímulo e apoio permanente, assim como preparo
fração suspensão têm a função de promover o adequado para a amamentação.
crescimento estrutural celular. Já as presentes no soro No pré-natal, todas as mulheres deveriam ter
têm a função protetora contra os inúmeros agentes oportunidade de discutir com o pediatra os planos
infecciosos. Os carboidratos funcionam como fonte para alimentação, assim como outros aspectos
de energia e os lipídeos e as substâncias lipossolúveis referentes aos cuidados do seu bebê. As vantagens
desempenham funções múltiplas. Os elementos e técnicas da amamentação, os cuidados com a
minerais, assim como os hormônios, enzimas e fatores mama, como o leite é produzido, como manter a
específicos do leite humano, são elementos lactação até os 2 anos, o retorno ao trabalho e os
indispensáveis à nutrição da criança. Enfim, no leite riscos do uso de bicos, chupetas e mamadeiras, e
humano se encontra todo um conjunto de compostos também do desarme precoce, devem ser
químicos a serviço das necessidades da criança, o obrigatoriamente discutidos.
que torna a amamentação uma forma inigualável e
insubstituível de se alimentar o ser humano nos dois O pediatra deve assegurar o direito de a mãe
primeiros anos de vida. amamentar o bebê na primeira meia hora após o
nascimento, supervisionando e dando o apoio
necessário para o envolvimento de toda a equipe
de saúde. O início da amamentação na sala de
4. O ALEITAMENTO MATERNO
parto favorece o fortalecimento do vínculo afetivo
O Depar tamento de Aleitamento Materno entre a mãe e o filho, assim como propícia
da Sociedade Brasileira de Pediatria reco- apojadura mais precoce. O pediatra também deve
menda, enfaticamente, o aleitamento materno assegurar ao bebê a permanência 24 horas ao

186 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

lado de sua mãe, no alojamento conjunto, e a não- 5. METAS DO DEPARTAMENTO DE


utilização de líquidos ou fórmulas. ALEITAMENTO MATERNO DA SBP
Durante a permanência da mãe na maternidade I - Integração e interação com outras instituições e
todo esporte necessário deve ser oferecido para se organizações governamentais e não-governamentais
garantir um posicionamento adequado e confortável
da mãe, de modo que o bebê também seja • Ministério da Saúde
posicionado com o corpo alinhado, barriga bem Participação na elaboração e definição de novas
próxima à da mãe, que esteja firmemente apoiada políticas relacionadas à promoção, proteção e apoio
pelas nádegas, com a boca bem próxima ao peito. à amamentação da Área da Saúde da Criança e
É indispensável o conhecimento dos reflexos de Aleitamento Materno da Secretaria de Políticas de
busca, procura e sucção. Assim sendo, deve-se Saúde e referentes à implementação e avaliação da
estimular a mãe a tocar o bico do peito na boca Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC),
do bebê para que o mesmo possa abrir o suficiente implementação da Rede Nacional de Bancos de
para abocanhar mais ou menos dois terços da Leite Humano; implementação do cumprimento da
aréola mamaria. norma brasileira de comercialização de alimentos
Desta forma, com certeza o bebê vai conseguir retirar para lactentes, capacitação de profissionais nos
do peito todo o leite que necessita. As mamadas cursos de aconselhamento em Amamentação; cursos
não devem ser predeterminadas, nem tão pouco o de 18 horas da IHAC, cursos de avaliadores da
tempo deve ser definido. A livre demanda tem de IHAC; cursos de capacitação em processamento e
ser estimulada e a sucção do leite anterior e posterior controle de qualidade do leite humano; planejamento
devem ser garantidas. Quando a oferta de leite é da semana mundial da amamentação; participação
maior do que a demanda, a mãe deve ser estimulada no planejamento e discussão da pesquisa de
a retirar o excesso, preferencialmente por ordenha prevalência do aleitamento materno que acontecerá
manual, acondicionar apropriadamente em utensílio em todas as capitais do Brasil em outubro de 1999,
de vidro com tampa de plástico previamente na organização do I Congresso Internacional de
esterilizado, congelar e doar ao banco de leite mais Bancos de Leite Humano e II Congresso Brasileiro de
próximo à sua residência. Bancos de Leite Humano, que se realizará em junho
do ano 2000 em Natal (RN); elaboração do manual
O monitoramento do bebê amamentado é também
e cartaz sobre amamentação e uso de drogas; revisão
tarefa do pediatra. A observação e avaliação da
do livro “Aleitamento Materno e o Município”;
mamada de todos os bebês que mamam no peito
implementação do Método Mãe Canguru no Brasil,
são condições indispensáveis para o sucesso da
e participação na expansão do projeto Carteiro
amamentação. É observando e avaliando uma
Amigo para todos os Estados do Nordeste; parceria
mamada que se pode definir se a amamentação
na realização do concurso de monografias, com
está indo bem ou não, pois desta forma se consegue
termas sobre amamentação, feitas por médicos
estabelecer a real causa das dúvidas quanto à
residentes de pediatria, lançado na semana mundial
crenças sobre leite fraco, pouco leite ou quanto ao
de amamentação.
bebê que não estar ganhando peso adequadamente.
• UNICEF
Freqüentemente, a causa destas situações está numa
mamada com técnica errada. Orientando, Parceria na elaboração do boletim da Iniciativa
reforçando os conhecimentos da mãe e corrigindo Hospital Amigo da Criança (IHAC) e na realização
a técnica da amamentação, o aleitamento materno do concurso de fotografias de mães amamentando,
exclusivo prossegue com total sucesso. A mãe que feitas por pediatras, que foi lançado na semana
apresenta dúvida ou dificuldade na amamentação mundial da amamentação e também planejamento
deve ser monitorada mais de perto até que o caso da citada semana.
esteja controlado. Amamentar não é apenas uma
forma de alimentar o bebê, é muito mais. É • Rede IBFAN
transformá-lo num cidadão seguro, competente e Discussão e apreciação com a REDE IBFAN das
com condição de competir pelo melhor espaço no denúncias de violação à norma brasileira de
mundo onde está. comercialização de alimentos para lactentes.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 187


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

• Pastoral da Criança se encerra em 31 de julho de 2000. A premiação


será a seguinte: 1º lugar R$ 3 mil; 2º lugar, R$ 2
Apreciação e revisão do Manual de Aleitamento
mil e 3º lugar, R$ 1 mil.
Materno da Pastoral da Criança.
Nos Estados do Nordeste, pediatras de todas as
II - Interação com outras entidades de classe filiadas atuarão como multiplicadores no treinamento
Integração com os comitês de aleitamento materno para todos os carteiros que participarão do projeto
das sociedades de ginecologia e obstetrícia e de Carteiro Amigo. E a SBP estará lançando um cartaz
mastologia. e um folder sobre o tema da semana deste ano.

III - Manual sobre Aleitamento Materno VI - Eventos científicos

O Departamento de Aleitamento Materno já iniciou Departamento de Aleitamento Materno da SBP


os trabalhos de elaboração de um manual para participa, desde agosto de 1998, de todos os
pediatras, cujos os capítulos já foram definidos e eventos científicos nacionais sobre amamentação e
começaram a ser escritos pelos membros do bancos de leite humano.
departamento.
VII - Página na Internet
IV - Difusão de informação Está em processo de construção, com trabalhos de
Além dos veículos de difusão de informações da recuperação da história já sendo realizados.
SBP, o departamento, em parceria com a rede
Nacional de Bancos de Leite Humano, está
viabilizando o envio do boletim Gota de Leite para
todos os pediatras sócios da SBP e, em parceria Referências bibliográficas
com algumas filiadas, está viabilizando o envio do 01 - Akre J, Alimentação infantil: Bases fisiológicas. Instituto de
boletim da IHAC para os pediatras em vários Estados. Saúde. São Paulo. 1989.
02 - Almeida JAG, Amamentação: um híbrido natureza - cultura.
V - Semana Mundial da Amamentação Fiocruz - Rio de Janeiro. 1999
03 - King FS, Como ajudar as mães a amamentar. Ministério
A partir deste ano, todas as filiadas foram motivadas da Saúde. Brasília. 1994.
a elaborar uma programação conjunta dentro do 04 - Lamounier JA, Leão E. Estratégias para aumentar a prática
tema “Amamentar – Educar para a Vida”, inspirada de amamentação. Jornal de pediatria (RJ) 1998,
74(5):355-356.
na experiência da Sociedade Paulista de Pediatria,
05 - Lamounier JA, Situação do Aleitamento Materno e o papel
que implica na prestação de serviço da Sociedade da SBP. Anais do 55º Curso Nestlé de Atualização em
à comunidade, fornecendo orientações e tirando Pediatria. Brasília, 1998. 102-115.
dúvidas por telefone por um dia, entre 1 e 7 de 06 - Organização Mundial de Saúde (OMS), Proteção,
outubro. promoção e apoio ao aleitamento materno: O papel
especial dos serviços materno - infantis. Editora da OMS.
Genebra. 1989.
O departamento está lançando este ano um concurso
07 - Organização Mundial da Saúde (OMS), Aconselhamento
de fotografias feitas por pediatras e também um
em Amamentação. Instituto de Saúde. São Paulo. 1997.
concurso de monografias feitas por médicos residentes
08 - Pesquisa Nacional sobre demografia e saúde (1996).
de pediatria, cujos orientadores sejam sócios da Amamentação e Situação Nutricional das Mães e
SBP. Todos os participantes dos concursos receberão Crianças. BENFAM. Rio de Janeiro. 1997:125-138.
certificados e o autor principal das três melhores 09 - Rede interagencial de informações para a saúde.
Indicadores e dados básicos - IDB Brasil 97. Ministério
monografias receberá como prêmio a inscrição, a da Saúde. Brasília. 1999.
passagem aérea e a hospedagem para o XXI 10 - Victora, C. G, Huttly SRA, Barros fo, Lombardi C, Vaughan
Congresso Brasileiro de Pediatria, que será realizado JP. Maternal education in relation to early and late child
health outcomes: finding from a Brazilian cohort study.
em Fortaleza em outubro do ano 2000. O prazo Soc. S Med. 1992; 34:899-905.
para entrega das monografias vai até 31 de maio 11 - Unicef. Situação Mundial da Infância. Unicef. Brasília.
de 2000. Já o prazo para o concurso de fotografias 1998.

188 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

O Aleitamento Materno e os Medicamentos


ANTONIO CARLOS BAGATIN

As evidências científicas que recomendam o leite mecanismos que levam um medicamento a ser
materno como alimento exclusivo nos primeiros seis excretado no leite materno e variáveis da criança
meses de vida são inúmeras e certamente outras que determinarão maior ou menor resposta
ainda serão relatadas. Portanto, todo e qualquer farmacológica.
fator que possa interferir ou dificultar o aleitamento
Independente da via de administração da droga, o
deve ser cuidadosamente considerado. As drogas
nível plasmático se constitui um dos elementos mais
utilizadas pelas mães que amamentam se constituem
importantes na correlação com os níveis detectados
freqüentemente em um fator indutor de desmame.
no leite materno. Quanto maior o nível plasmático
Existem, no entanto, regras básicas que podem
materno maior o nível da droga encontrado no leite
auxiliar o médico diante da necessidade de prescrever
materno. O pico de concentração no leite ocorre
a uma mulher que esteja amamentando.
quase que concomitante ao pico plasmático materno.
Os medicamentos podem interferir no processo de
Estima-se que, em média, a quantidade de um
aleitamento de duas maneiras diferentes: interferindo
medicamento que é transferida para o leite não
na produção do leite e agindo farmacologicamente
ultrapasse a 2% da dose ingerida pela nutriz.
no lactente.
A partir da corrente sangüínea, a droga atinge o
citoplasma da célula mamária, chegando ao ápice
INTERFERÊNCIA NA PRODUÇÃO da célula. A partir daí a droga será transportada
para o leite por três mecanismos principais: difusão,
Alguns medicamentos podem levar à diminuição da
pinocitose reversa e secreção apócrina. A difusão
produção do leite por intermédio de diferentes
passiva é o mecanismo principal na transferência
mecanismos. Os diuréticos podem provocar perdas
das drogas para o leite. A difusão transcelular,
hídricas; drogas com atividade simpaticomiméticas
intercelular e a ligação com proteínas carreadoras
ou que produzam vasiconstrição levam à diminuição
se constituem em outros mecanismos de transporte.
do fluxo sangüíneo à mama, como a atropina, a
nicotina, os descongestionantes nasais e os As propriedades físico-químicas exercem influência
estimulantes do SNC. importante na transferência das drogas do plasma
para o leite. Dentre estas propriedades destacam-se:
Alguns medicamentos produzem aumento na liberação
lipossolubilidade, peso molecular, grau de ionização
de fatores inibidores da liberação da prolactina:
e ligação com as proteínas.
bromocriptina, pridoxina, levodopa, inibidores da
monoaminooxidase. Por outro lado, alguns Quanto maior a lipossolubilidade, maior a facilidade
medicamentos suprimem a liberação dos fatores de transferência da droga para o leite. A fração
inibidores da prolactina agindo como lactagogos: lipossolúvel é a fração não ionizada de uma droga.
metoclopramida, sulpiride, cimetide e alguns anti- Algumas drogas estão quase que permanentemente
hipertensivos como a reserpina, clonidina e metildopa. ionizadas, como os compostos quaternários do amônio,
sendo pouco transferidos para o leite. As bases fracas
predominam em sua forma não ionizada no pH mais
AÇÃO FARMACOLÓGICA alto do plasma e passam ao leite materno, que tem
um pH ligeiramente mais ácido, onde são ionizadas
NO LACTENTE
e se concentram em maior quantidade que no plasma.
A maior preocupação do médico, no entanto, ao Ácidos fracos como barbitúricos, diuréticos e
prescrever à mãe que amamenta, está relacionada benzilpenicilinas têm uma concentração igual ou menor
ao possível efeito farmacológico do medicamento que no plasma. Moléculas de alto peso molecular,
no lactente. Daí a importância de se conhecer os como a heparina e insulina, não são excretadas no

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 189


Aleitamento Materno
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leite. Drogas com alta ligação com as proteínas sulfas, anti-maláricos e outros medicamentos oxidantes,
plasmáticas apresentam maior dificuldade para serem mesmo quando em baixa dosagem.
transferidas para o leite.
Ao se revisar a literatura sobre o assunto, verifica-se
A relação entre a concentração da droga no leite que os efeitos adversos provocados por uma droga
e no plasma se expressa pela razão leite/plasma. utilizada durante a amamentação, constituem-se, na
Preocupação maior deve se ter quando esta relação maioria das vezes, de relatos de casos isolados,
é igual ou superior a 1. Aspecto importante a ser faltando os preceitos metodológicos que habitualmente
considerado quanto ao possível efeito farmacológico se requer na investigação científica.
são as características do lactente. O volume do Portanto, a avaliação do risco/benefício deve sempre
leite por ele ingerido dependerá da idade e se o prevalecer na decisão quanto à conduta a ser
aleitamento é exclusivo ou não. Tratando-se de um tomada. Apesar do número enorme de medicamentos
prematuro ou de uma criança menor que 3 meses, utilizados no dia a dia, são muitos poucos os efeitos
deve-se considerar a sua menor capacidade adversos relatados. Dessa maneira, a lista de
hepática e/ou renal de metabolizar as drogas, bem medicamentos que efetivamente devem ser contra-
como se for portador de uma hepatopatia ou indicados é constituída por um número pequeno de
nefropatia. medicamentos
Algumas drogas são excretadas pelo leite, porém Algumas medidas podem limitar a exposição do
não são absorvidas pelo lactente. É o que se observa lactente a medicamentos excretados no leite materno:
com os aminoglicosídeos, que não são absorvidos
• Usar medicamentos mais conhecidos
pelo tubo gastro-intestinal e as tetraciclinas, cuja
absorção é muito pobre devido à formação de • Usar dose terapêutica mínima
quelatos com íons de cálcio do leite materno. • Prescrever o medicamento para ser tomado após
as mamadas
Fatores ambientais, genéticos e sensibilidade
individual podem determinar respostas diferentes à • Utilizar dose noturna quando possível
exposição medicamentosa. Lactentes deficientes em • Considerar a idade e o estado clínico do lactente
G-6-PD são particularmente sensíveis a desenvolver • Monitorar clinicamente e dosar níveis plasmáticos
quadro hemolítico quando expostos a cloranfenicol, no lactente dependendo do medicamento

Dentro desse contexto pode-se agrupar os medicamentos em três categorias:


– Uso contra-indicado na lactação
– Uso criterioso durante a lactação
– Uso compatível com a lactação

Fonte: Amamentação e Uso de Drogas - Manual do Ministério da Saúde)

USO CONTRA-INDICADO Bromocriptina


Cabergolina
NA LACTAÇÃO Lisurida
Sais de ouro Misoprostol
Anfetaminas Mifepristone
Cocaína Estrógenos em doses elevadas
Heroína Amiodarona
LSD Citotóxicos
Maconha Imunossupressores
Tamoxifen Fenindiona
Andrógenos Substâncias Radioativas.

190 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
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USO CRITERIOSO diclofenaco, piroxicam, naproxeno, cetoprofeno,


DURANTE A LACTAÇÃO ibuprofeno, colchicina, paracetamol, dipirona, uso
de curta duração: morfina, codeína, petidina.
(Podem ser utilizados em doses ocasionais/e ou
habituais, devendo-se monitorar a criança para efeitos Antibióticos e Anti-Infecciosos: penicilinas, ampicilina,
colaterais) amoxicilina, carbenicilina, oxacilina, cefalosporinas,
Analgésicos aminoglicosídeos, aztreonam, teicoplanina,
vancomicina, eritromicina, azitromicina, claritromicina,
Antitérmicos
lincomicina, tetraciclinas, rifampicina, tuberculostáticos,
Opiáceos aciclovir, idoxuridine, escabicidas (exceto lindano e
Anti-Inflamatórios: fenilbutasona, indometacina, monossulfiran), antimicóticos9miconazol, nistatina,
dextropropoxifeno, doses elevadas ou uso prolongado fluconazol, clortrimazol, anfotericina B, griseofulvina,
de morfina, codeína, petidina e salicilatos. anti-helmínticos, anti-esquistossomóticos, pentamina,
antimoniato de meglumina.
Antibióticos e Anti-infecciosos: clindamicina,
cloranfenicol, imipenem,sulfametoxasol, sulfonamidas,
nitrofurantoína, ácido nalidíxico, quinolonas (evitar MEDICAMENTOS QUE
ciprofloxacin, preferir norfloxacin), antivirais,
escabicidas (lindano e monossulfuran), antimicóticos ATUAM NO SNC
(cetoconazol, itraconazol, terconazol, isoconazol), Oxazepam, lorazepam, carbamazepina, ácido
metronidazol, tinidazol, furazolidona, antimaláricos, valpróico, clomipramina.
primetamina, clofazimina e dapsona.
Hormônios e Antagonistas: adrenalina, tiroxina,
anticoncepcionais que contem progesterona,
MEDICAMENTOS QUE espermaticidas, DIU com progesterona, corticos-
teróides (uso de curta duração).
ATUAM NO SNC:
Miscelânia: anti-acidos, cimetidina, ranitidina,
Antidepressivos (amitriptalina, imipramina, litio,
famotidina, cisaprida, metoclopramida, bromoprida,
moclobemida, fluoxetina, maprotilina, paroxetina),
alisaprida, domperidona, anti-histamínicos (preferir
anticonvulsivantes (fenobarbital, butabrbital, primidona,
loratadina, descongestionantes, mucolíticos (exceto
difenilhidantoina, etosuximida, clonazepam),
iodetos), broncodilatadores, heparina, warfgarin,
antipsicóticos (haloperidol, droperidol, pimozida,
dicumarol, betabloqueadores (preferir propanolol e
sulpirida, clorpromazina, levopromazina, flufenazuna,
labetolol), bloqueadores de canais de cálcio
periciazina, tioridazina epipotiazina), derivados da
(nifedipina, verapamil), anti-hipertensivos (metildopa,
ergotamina (anti-enxaqueca), antiparkinsonianos.
captopril, hidralazina, diuréticos, digitálicos,
Hormônios e Antagonistas: hipoglicemiantes orais, lidocaina, laxativos, vitaminas, imonoglobulinas,
propiltiouracil, carbamizol, metimazol, doses elevadas vacinas.
ou uso prolongado de corticosteróides, ocitocina,
ergonovina.
Miscelânia: omeprazol, lansoprazol, pantoprazol,
teofilina, aminofilina, iodetos, iodopovidona, BIBLIOGRAFIA
antitussígenos, nafazolina, oximetazolina, fenilefrina 01 - Briggs GG et al. Drugs in Pregnancy and Lactation.
carisoprodol, clonidina, pizotifeno, reserpina, bebidas Ed. Willians & Wilkins,4th edition,1994.
alcoólicas, nicotina. 02 - Amamentação e Uso de Drogas. Manual do Ministério
da Saúde(no prelo).
03 - Nation, RL et al.Drugs and breast-feeding.Med J Aust
USO COMPATÍVEL COM 1987;147:308-313.

A LACTAÇÃO 04 - VEGA,EE.Excrecion de Drogas en La Leche Materna. Boletin


Centro Información Medicamentos (San Juan-Puerto Rico)
(Uso potencialmente seguro em doses habituais) 1989;15(2).

Anagésicos, Antitérmicos, Opiáceos e Anti- 05 - American Academy of Pediatrics, Committee on Drugs.


The transfer of drugas and other chemicals into human milk
Inflamatórios: ácido mefenâmico e flufenâmico, breast. Pediatrics. 1994;93:137-150.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 191


Aleitamento Materno
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Aleitamento Materno e Prematuridade


ÂNGELA SARA JANUSSE DE BRITO

A alimentação do RN prematuro com leite materno para os prematuros maiores, com idade gestacional
é uma arte que envolve não só conhecimentos próxima do termo, é a melhor forma de oferecer os
científicos e técnicos, mas também experiência , componentes nutritivos, principalmente pelas
empenho e dedicação de toda a equipe que trabalha propriedades de defesa e função estrutural. O leite
com a mãe e a criança. materno das mães de RN prematuros tem composição
diferente do leite das mães dos nascidos a termo,
Apesar de as mães se declararem intencionadas e
apresentando maior valor calórico com maior
esforçarem-se para oferecer seu leite ao bebê
concentração de proteínas, sódio e cloretos e menor
prematuro internado, muitas vezes acabam desistindo,
de lactose.
ao terem alta da maternidade ou no período
subseqüente, se não tiverem um apoio consistente
que começa nas consultas do pré- natal e continua
pelo período imediato após o parto, passando pela PARTICULARIDADES DO LEITE
fase de risco na UTI, no período estável de ganho
MATERNO QUANTO À
ponderal e no preparo para a alta, seguindo nas
revisões pós-alta.
ADEQUAÇÃO AOS PREMATUROS
Alguns estudos realizados nos Estados Unidos na Composição
década de 80 demonstraram que mais da metade O conteúdo protéico total do leite prematuro é maior
das mães que pretendiam amamentar seus recém- que o do leite a termo, diminuindo nas duas primeiras
nascidos prematuros desistiam antes da alta dos bebês semanas, chegando a uma mesma concentração por
da UTI, apesar de todo o esforço, declarando que volta da quarta semana.
o insucesso da lactação se devia a obstáculos
Na composição das proteínas do leite materno
próprios da internação, tais como informações
predomina a lactoalbumina no soro(60%) em vez da
incoerentes e contraditórias sobre a lactação, falta
caseína(30%) proporcionando maior solubilidade do
de apoio dos médicos e enfermagem, dificuldades
coágulo, promovendo esvaziamento gástrico mais
no esvaziamento das mamas no período em que o
lento. As proteínas do soro consistem fundamentalmente
bebê ainda não sugava e ausência de local
de α lactoalbumina, importante na síntese da lactose.
apropriado para amamentação.Quanto ao insucesso
Praticamente não tem β globulina, fração responsável
após a alta citavam também informações insuficientes
por mecanismos de reação alérgica.
e conflitantes com as que tinham recebido durante a
internação. A relação metionina/cisteína do leite materno próxima
a 1 é fundamental aos prematuros por apresentarem
O crescimento extra- uterino ideal do prematuro ainda
diminuição da síntese da cisteína e os baixos teores
é mal definido, apesar de exaustivamente discutido.
de fenilalanina e tirosina também os beneficiam pela
A nutrição do recém-nascido prematuro tem como
incapacidade de metabolização devido a imaturida-
objetivo proporcionar um crescimento adequado
de hepática.
comparável ao padrão intra-uterino até a 40ª semana
de gestação. Suas necessidades nutricionais variam A digestão e absorção dos lipídeos do leite materno
conforme peso, idade gestacional, método de são facilitadas pela complexa organização dos
alimentação usado, alterações metabólicas causadas glóbulos de gordura, pelo padrão dos ácidos graxos,
por doenças que possam apresentar e métodos pela distribuição das moléculas de triglicerídeos e
terapêuticos a que são submetidos. pela presença da lipase.

Não existe dúvida que para o recém-nascido a termo Os ácidos graxos de cadeia longa aracdônico e
o leite materno é recomendado como fonte completa docosaexaenóico, derivados do ácido linoleico e
e exclusiva de nutrientes até o sexto mês de vida e linolênico, respectivamente, apenas encontrados no

192 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
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leite materno, são importantes componentes dos O LEITE MATERNO E O


fosfolípidios das membranas das células do cérebro PREMATURO DE MUITO
e das hemácias. Esses ácidos graxos têm papel
BAIXO PESO
fundamental na fase de crescimento rápido das células
cerebrais, na função cognitiva e visual. A composição do leite materno é variável conforme
o período de lactação, podendo sofrer alterações
Quanto aos carbohidratos, a lactose e oligossacarídeos
com perda dos componentes durante a coleta,
são componentes importantes não só como fonte
estocagem e métodos? utilizados para alimentar o
nutritiva mas também por outras propriedades. O
bebê.
prematuro é capaz de absorver em torno de 90% da
lactose do leite. O restante não absorvido, está A maior fonte de energia do leite humano é a
relacionado à consistência mais pastosa das fezes, a gordura (50%), no entanto é o componente que
colonização intestinal com flora bacteriana menos mais sofre variações, sendo diferente de mãe para
patogênica e com melhor absorção de minerais, mãe, no decorrer do dia, aumentando levemente
principalmente do ferro. Os oligossacarídeos do leite durante a lactação e apresentando concentrações
proporcionam ação protetora impedindo a ligação diferentes, menores no início (leite do começo) e
de bactérias à mucosa. maiores no fim da mamada (leite do fim). O
componente gorduroso do leite separa-se quando
Função gastrointestinal deixado em repouso e pode aderir a seringas, aos
recipientes de coleta e às paredes de sondas,
O esvaziamento gástrico é mais rápido nas crianças
perdendo-se em parte, com diminuição da oferta
alimentadas com leite materno comparado a fórmulas
calórica. O efeito das perdas de gorduras é
artificiais. No leite materno existem fatores que
diminuído com os cuidados e aperfeiçoamento das
promovem o crescimento e a motilidade gastrointes-
técnicas de coleta, estocagem e oferta por sondas.
tinal, importantes para amadurecimento da função
? O tempo de repouso em frascos e recipientes que
digestiva.
aderem gordura deve ser diminuído, e, quando se
Propriedades de defesa pretende aumentar a oferta calórica, usar leite do
fim da mamada.
Os fatores de defesa como IgA, lactoferrina, lisosima,
oligossacarídeos, fatores de crescimento e componentes Evitando a pasteurização e aquecimento o co-
celulares estão presentes em maior quantidade no lostro e o leite materno fresco da própria mãe
leite de mães de prematuros e são fundamentais na são os únicos a proporcionar todos os fatores de
proteção aos recém nascidos que permanecem defesa com biodisponibilidade incomparável dos
internados e expostos à flora bacteriana hospitalar. nutrientes.

A colononização intestinal do RN alimentado com Apesar das qualidades, alguns estudos mostraram
leite materno, predominante com Lactobacillus bifidus, que recém nascidos prematuros de muito baixo
inibe o crescimento de flora mais patogênica e o peso (<1500g), que recebem leite materno,
sistema imune enteromamário, ativo no recém nascido apresentam crescimento mais lento e que alguns
a termo, pode ser proporcionado ao prematuro nutrientes do leite materno não são suficientes
quando o contato precoce pele a pele for praticado. para as necessidades da fase de crescimento
rápido principalmente quanto à calcificação óssea.
Desenvolvimento neurológico A diminuição do conteúdo de proteínas e do
sódio após as primeiras semanas de lactação
Recém nascidos de muito baixo peso que receberam
despertam preocupação quanto a hipoalbuminemia
leite materno precocemente durante a hospitalização,
e hiponatremia.
quando avaliados aos 7.5 a 8 anos de idade,
apresentaram melhores resultados em testes de As concentrações de cálcio e fósforo do leite humano
inteligência com melhor desempenho e expressão tanto das mães de prematuros quanto das mães
verbal. Estudo realizado em recém nascidos a termo de recém nascidos a termo são semelhantes, em
mostrou que habilidades motoras e cognitivas a longo torno de 25 mg/dl de cálcio e 15 mg/dl de
prazo, foram diretamente relacionadas com duração fósforo, bastante inferiores às necessárias para pro-
do aleitamento materno. mover a incorporação desses minerais comparável

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 193


Aleitamento Materno
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à intra uterina, que teriam no 3º trimestre da ges- dos efeitos sobre o crescimento e desenvolvimento
tação. Se o volume de leite materno diário ingerido a curto e a longo prazo.
pelo prematuro for o adequado para a oferta
calórica, em torno de180 a 200 ml/kg ele estará
recebendo 45 a 60 mg/kg/dia de cálcio e 22
NORMAS DE ALEITAMENTO
a 30 mg/kg/dia de fósforo menos que as neces- MATERNO AOS PREMATUROS
sidades diárias que são130 a 150 mg/kg/dia Com o objetivo de aumentar os índices de aleitamento
de cálcio e 75 a 85 mg/kg/dia de fósforo, po- materno seguimos atualmente em nosso serviço a
dendo levar a hipomineralização óssea e suas seguinte normatização aos prematuros que
consequências. permanecem internados após alta da mãe:
Frente a essas particularidades, algumas soluções 1. Ordenha precoce das mamas logo nas primeiras
têm sido propostas. Pesquisas mais recentes tem horas após o parto continuando a seguir com
demonstrado o efeito da suplementação do leite intervalos regulares. Procedimentos realizados e
materno, aumentando a concentração de proteínas, orientados pela enfermagem da unidade e do banco
sódio, cálcio, fósforo, vitaminas e melhorando a oferta de leite.
calórica. Tem sido utilizados como suplementação, 2. Leite fresco ordenhado da própria mãe,
somente o acréscimo de proteínas obtidas de conservado no refrigerador, oferecido em bolo por
centrifugado de leite materno de banco até fórmulas sonda gástrica até iniciarem sucção.
comerciais contendo multinutrientes em forma de pó 3. Volumes iniciais e aumentos conforme peso do
ou líquido. Os produtos comerciais contém proteínas RN e tolerância digestiva.
liofilisadas do leite humano ou do leite de vaca,
4. Intervalo de ofertas de 2 a 4 horas.
cálcio e fósforo em diferentes formas de sais, açúcares
e vitaminas. Utilizados há algum tempo, nos Estados 5. Prematuro de muito baixo peso, volumes iniciais
Unidos e em alguns países da Europa, estes produtos mínimos, em torno de 10 ml/kg/dia como nutrição
estão disponíveis em nosso meio como fortificantes trófica, com pequenos aumentos diários, nunca
do leite materno. maiores que 20 ml/kg/dia. Ao atingir dieta enteral
de 150 ml/kg/dia, suplemento ao leite da própria
Estudos comparando a alimentação dos prematuros mãe ou do banco de leite, com formula comercial
de muito baixo peso com leite materno de multinutrientes até capacidade de sucção total no
suplementado, ou não, foram realizados para seio.
avaliar o crescimento, o desenvolvimento neurológico
5. Retorno precoce após alta com orientações e
e o metabolismo ósseo. Os resultados principais
apoio no ambulatório de revisão de prematuros e
têm demonstrado que a curto prazo a suplementação
clínica de lactação.
promove aumento de ganho ponderal, da estatura
e do perímetro cefálico. Não exercem efeito nos
níveis séricos de fosfatase alcalina. O conteúdo
mineral ósseo e a retenção nitrogenada parecem
estar aumentados.

Os resultados atuais no entanto, são insuficientes para REFERÊNCIAS BLIBLIOGRÁFICA


avaliar crescimento e desenvolvimento neurológico a
01 - LAWRENCE, R.A. Breastfeeding the infant with a problem.
longo prazo. Não parece haver aumento de efeitos In: LAWRENCE,R.A. Breastfeeding - A guide for the medical
adversos com a fortificação, embora o total de recém profession. 4.th. St. Louis: Mosby, 1994. Chap.2, p.418
nascidos estudado e a falta de dados de recém 02 - MEIER, P.P.;MANGURTEN,H.H. Breastfeeding the pre-term
nascidos randomizados que foram retirados do estudo infant. In: RIORDAN, J.; AUERBACH,K.G. Breastfeeding
and human lactation.1.th.Boston: Jones & Bartlet Publishers,
reduzem a confiança dos resultados. 1993.Chap.10,p.253

Conclui-se que para avaliar o uso de diferentes 03 - PEREIRA,G.R. Nutritional care of the extremely premature
infant. Clinics in Perinatology, v.22, n.1, p.61-75, mar.
preparados de multinutrientes em recém nascidos 1995.
prematuros de muito baixo peso, são necessárias
04 - SCHANLER,R.J. Suitability of human milk for the low
mais pesquisas, comparando suplementação versus birth weight infant. Clinics in Perinatology, v.22, n.1,
não suplementação do leite materno, com análise p.207-23, mar. 1995.

194 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Aleitamento Materno
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

05 - SCHANLER,R.J. The role of human milk fortification for 10 - WAUBEN,I.P.et al. Moderate nutrient supplementation of
premature infants. Clinics in Perinatology, v.25,n.3. mother’s milk for preterm infants supports adequate bone
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06 - LUCAS, A.; MORLEY,R.; COLE,T.J.; ANDGORE,S.M.
A randomised multicentre study of human milk versus formula 11 - MATALOUN,M.M.G.B. ; LEONE,C.R. Peculiaridades do
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07 - LUCAS, A., .FEWTRELL, M.S.,MORLEY,R. et al. Randomised
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p.142-51, aug. 1996
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08 - LUCAS,A.; MORLEY,R. ; COLE,T.J. Randomised trial of 13 - KUSCHEL,C.A.; HARDING,J.E. Multicomponent fortification
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BMJ,v.317, p1481-7, nov.1998. na Internet via www. URL: Erro! A origem da referência
não foi encontrada.. Arquivo capturado em 10/06/99.
09 - PETTIFOR,J.M. et al. Mineral homeostasis in very low
birth weight infants fed either own mother’s milk or pooled 14 - HURST,N.M.; VALENTINE,C.I.; RENFRO,L. et al. Skin-to-skin
pasteurized preterm milk. J. Pediatr. Gastroenterol. Nutr., holding in the neonatal intensive care unit influences maternal
v.5, n.2, p.248-53, 1986. milk volume. J.Perinatology, v.17,n.3,p.213-17,1997

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 195


Aleitamento Materno
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196 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neurologia
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Convulsões no Período Neonatal


MITSURU MIYAKI

INTRODUÇÃO mioclônicas e cada uma delas pode ser focal,


multifocal ou generalizada. A forma sutil caracteriza-
A crise convulsiva é um dos sinais mais precoces e se por paroxismos de movimentos piscatórios, desvio
mais significativos de doença neurológica no recém- (geralmente horizontal) conjugado dos olhos, olhar
nascido, pois raramente ela é de origem idiopática. fixo, movimentos de sucção espontânea, movimentos
Sua freqüência exata é difícil de ser estabelecida, de extremidades do tipo pedalar e boxear,
tendo em vista os variados critérios para o seu alterações autonômicas como oscilações da pressão
diagnóstico, além das dificuldades de detectar as arterial, da oximetria de pulso e taquicardia e
formas sutis de crise. O cérebro imaturo do recém- apnéia. A apnéia convulsiva é mais comum no
nascido é mais propenso a manifestar crise recém-nascido a termo e difere da apnéia da
convulsiva, sendo sua freqüência no período prematuridade por não cursar com bradicardia, além
neonatal muito mais comum do que em qualquer de estar associada em concomitância a outras
outro período da vida. Esta predisposição maior manifestações sutis.
possivelmente reflete o desenvolvimento primeiro das
sinapses excitatórias, com o seu conseqüente
predomínio sobre as influências inibitórias neste ETIOLOGIA
período do desenvolvimento. Sua incidência
estimada é de 0,7 a 2,7/1000 recém-nascidos As principais doenças que podem levar o recém-
vivos a termo e de 57,5 a 132/1000 recém- nascido a apresentar crise convulsiva são a
nascidos abaixo de 1.500g de peso de nascimento. Encefalopatia Hipóxico-Isquêmica (30-65%),
Hemorragia Cerebral (15-25%), Infecções no Sistema
É importante a detecção da crise convulsiva, a Nervoso Central (10-15%), Infartos Cerebrais e
determinação de sua etiologia e o seu pronto Distúrbios Metabólicos (Hipoglicemia, Hipocalcemia,
tratamento por três motivos: Hipomagnesemia, Hipo e Hipernatremia). Mais
1. a convulsão geralmente está relacionada a uma raramente, a convulsão pode ser a exteriorização de
doença grave que, eventualmente, requer conduta Erro Inato do Metabolismo, Síndrome de Abstinência,
específica, como por exemplo a hipoglicemia; Intoxicação Medicamentosa, Má-formação Cerebral
2. se não tratada, pode evoluir por período ou formas mais raras de epilepsia, como a Forma
prolongado com conseqüente interferência na função Idiopática Benigna e a Forma Familial.
respiratória, cardiovascular e tolerância alimentar; A Encefalopatia Hipóxico-Isquêmica, geralmente
3. a convulsão per si pode levar ao dano neuronal. secundária à Asfixia Perinatal, é a causa mais
comum tanto em recém-nascidos a termo como pré-
termo. A crise convulsiva é uma das complicações
CLASSIFICAÇÃO DA das formas moderada e grave de encefalopatia e,
CRISE CONVULSIVA caracteristicamente, manifesta-se nas primeiras 12
A exteriorização da crise convulsiva no período horas de vida e torna-se rapidamente mais freqüente
neonatal difere de forma importante das crianças e severa nas próximas 12 a 24 horas, não sendo
maiores. Em ordem decrescente de freqüência, elas infreqüente a sua evolução para o estado de mal
são classificadas em sutis, tônicas, clônicas e epiléptico.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 197


Neurologia
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INVESTIGAÇÃO A hipoglicemia deve ser tratada com a infusão


endovenosa de 2 ml/kg de solução de glicose a
É fundamental uma avaliação completa da história
10%, seguido da infusão contínua de 6 a 10mg/kg/
perinatal do recém-nascido e uma avaliação rápida
hora, de acordo com o controle seriado da glicemia.
das etiologias mais comuns que necessitam de terapia
específica, como a possível existência de distúrbios A hipocalcemia deve ser corrigida com a infusão
metabólicos e de infecção do sistema nervoso central. endovenosa de 2 ml/kg de gluconato de cálcio a
A investigação inicial, portanto, requer as 10%, sob monitorização cardíaca, seguido de
determinações de glicemia, hematócrito, sódio, manutenção com 200 a 400 mg/kg/dia.
potássio, cálcio, magnésio plasmático, pH e gases A hipomagnesemia deve ser tratada com a
arteriais, punção lombar, hemocultura, ecografia administração intramuscular de 0,2 mg/kg de sulfato
cerebral e eletroencefalograma. Dependendo da de magnésio.
avaliação clínica, podem ser necessários a tomografia
cerebral computadorizada, ressonância magnética, Os critérios para a utilização de medicação anticonvul-
investigação de doença crônica intra-uterina (TORCHS) sivante incluem: freqüência de crises maior do que 1/
e investigação de erro inato do metabolismo. hora e duração da crise superior a 1 minuto ou acom-
panhada de hipoxemia, arritmia respiratória ou apnéia.
O eletroencefalograma é fundamental para verificar
se a manifestação sutil é ou não crise convulsiva, O fenobarbital é o medicamento inicial a ser
para diagnosticar crise em recém-nascido submetido administrado na dose de ataque de 20 mg/kg,
à paralisação medicamentosa e para auxiliar na infundido endovenosamente em 10 minutos. Se houver
avaliação prognóstica. Um padrão de base de surto- persistência das crises, poderá ser administrado novas
supressão ou de baixa voltagem geralmente está doses de 5 a 10mg/kg até um máximo de 40mg/
associado à má evolução neurológica em mais de kg de dose de ataque. A dose de manutenção deve
90% dos recém-nascidos. ser de 3 a 5mg/kg/dia e o nível sérico deve ser
mantido entre 20 e 40µg/ml.
Os estudos de monitorização contínua de EEG
evidenciam que até 79% das crises eletrográficas são Se houver persistência das crises, deve-se adicionar
clinicamente silenciosas, em especial no recém-nascido fenitoína na dose de ataque de 20mg/kg infundido
pré-termo. Por outro lado, nem toda crise clínica é EV em 20 a 30 minutos, sob monitorização do traçado
detectada ou confirmada no estudo eletroencefalo- eletrocardiográfico. A manutenção, sempre por via
gráfico, particularmente as formas sutis, as crises tônicas EV, deve ser de 3-5mg/kg/dia e o nível sérico
generalizadas e as mioclônicas focais e multifocais. adequado de 10 a 20 µg/ml.Outras drogas, em
Duas são as explicações para esta dissociação eletro- não havendo controle das crises, incluem o Midazolan,
clínica: origem subcortical das crises e que não se Clonazepan, Carbamazepina e o Valproato de sódio.
propagam para o córtex pela sinaptogênica imatura
A duração do tratamento está na dependência da
ou que estas manifestações não sejam de fato epilépticas
resposta à medicação anticonvulsivante, do controle
e sim manifestações de liberação de estruturas mais
das crises, da persistência de alteração clínica e
primitivas, como o tronco cerebral.
eletroencefalográfica evolutivas.
A ecografia cerebral, à beira de leito, hoje é uma
facilidade disponível nos centros de referência com UTI
Neonatal e é útil na exclusão de hemorragia paren-
PROGNÓSTICO
quimatosa, peri e intraventricular e má-formação do
sistema nervoso central. Se este exame for normal e o As variáveis relacionadas ao prognóstico neurológico
recém-nascido continuar apresentando crises ou tem o de longo prazo incluem: etiologia da convulsão,
exame clínico anormal, deve ser solicitado a tomografia tipo de manifestação clínica, duração e intensidade
computadorizada ou a ressonância magnética. das crises e padrão de base do eletroencefalo-
grama interictal. São sinais de mau prognóstico
neurológico: convulsões tônicas ou mioclônicas
TRATAMENTO generalizadas, convulsão intratável e surto-supres-
Os cuidados gerais incluem a homeostase térmica, são ou baixa voltagem persistente no traçado
hemodinâmica, ventilatória e hidro-eletrolítica. eletroencefalográfico.

198 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neurologia
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Distúrbios Paroxísticos de Origem não Epilética


FERNANDO KOK

INTRODUÇÃO intoxicação exógena, etc.). As crises epilépticas


comportam múltiplas manifestações: podem apresentar
Sob a denominação de distúrbios paroxísticos de fenômenos de natureza motora pouco elaborados,
origem não epiléptica (DPONE) reúne-se um grupo do tipo clônico ou tônico, quando então são
heterogêneo de condições clínicas bastante freqüentes chamadas de convulsões; podem ser parciais ou
na faixa etária pediátrica e que se caracterizam generalizadas e finalmente podem ou não vir
pelo aparecimento súbito de sintomas que podem ter associadas à perda ou alteração de consciência.
alguma semelhança com os observados nas crises
As crises epilépticas comportam diversos diagnósticos
epilépticas, mas que são decorrentes de mecanismos
diferenciais, que devem ser considerados frente à
distintos.
suspeita desta condição. Muitos destes diagnósticos
A crise epiléptica é um evento abrupto decorrente de diferenciais estão incluídos entre os DPONE.
descarga excessiva de um grupo de neurônios
cerebrais. Este mesmo mecanismo não está presente
nos DPONE. Emprega-se o nome epilepsia quando CLASSIFICAÇÃO
as crises epilépticas ocorrem de forma recorrente, Os DPONE podem ser fisiológicos ou psicogênicos
sem desencadeante externo definido (p.ex., febre, e os principais estão referidos na tabela 1.

Tabela 1 - Principais distúrbios paroxísticos de origem não epiléptica

Fisiológicos

Síncopes Perda de fôlego (pálida ou cianótica)

Distúrbios do sono Sonambulismo


Sonilóquio
Terror noturno
Jactatio captitis e jactatio corporis
Mioclonia do sono

Cefaléia vascular Enxaqueca clássica (com aura)


Enxaqueca “complicada” (hemiplégica, vértebro-basilar, etc.)

Intoxicação exógena

Vertigem paroxística da infância

Psicogênicos

Pseudo-crises epilépticas (crises factícias)

Síndrome de Munchausen por procuração

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 199


Neurologia
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APRESENTAÇÃO CLÍNICA por diminuição do fluxo sangüíneo cerebral ou da


oxigenação. A redução da perfusão é consequente à
1. Síncopes diminuição da frequência cardíaca mediada pelo nervo
A síncope caracteriza-se por perda do tono e da vago ou por vasodilatação também mediada pelo
postura, acompanhada muitas vezes de palidez, nervo vago. Raramente alterações cardíacas podem
sudorese e hipotonia muscular. Este quadro é decorrente causar síncopes; neste caso, elas podem surgir
de redução do aporte energético cerebral causado espontaneamente ou aos esforços.

Tabela 2 - Alguns fatores desencadeantes de síncope

Hipotensão ortostática (medicamentos, mudança de postura)


Dor (p.ex., trauma de injeção)
Tensão emocional
Cardiopatia (estenose aórtica, taquiarritmia ventricular, distúrbio de condução AV)

2. Perda de fôlego 3. Distúrbios do sono (parasonias)


A perda de fôlego é uma condição bastante frequente, Os distúrbios do sono são eventos extremamente
ocorrendo em até 4% dos lactentes, podendo-se iniciar comuns em crianças e incluem: sonilóquio (falar
após os 5 meses e geralmente não ocorrendo além dos durante o sono), sonambulismo (atos motores
2-3 anos de idade. Reconhece-se duas formas de complexos, inclusive deambulação, durante o sono),
apresentação: cianótica e pálida. A primeira é mais terror noturno (despertar associado a medo, freqüente
comum e caracteriza-se por episódio breve de perda em lactentes e pré-escolares), jactatio capitis e jactatio
de consciência, acompanhado de desvio dos olhos corporis (movimentos repetidos da cabeça ou de
para cima e da cabeça para trás, que ocorre após todo o corpo, de forma rítmica, ocorrendo no início
episódio de choro prolongado em expiração. O choro do sono). Eles são em geral facilmente reconhecíveis
é desencadeado por contrariedade, medo ou trauma, e não tem significado patológico. É importante
obedecendo seqüência estereotipada: choro ou menção lembrar no entanto que algumas epilepsias costumam
de choro, expiração forçada, perda de consciência se manifestar especialmente durante o sono e devem
por alguns segundos. Estes episódios podem ser ser consideradas no diagnóstico diferencial de
recorrentes, especialmente quando existe receptividade distúrbios fisiológicos do sono.
da família com relação a este comportamento. Acredita-
se que a perda de consciência seja consequente à 4. Enxaqueca
redução do fluxo cerebral.
A causa mais freqüente de cefaléia, independente da
A perda de fôlego pálida é menos freqüente, idade, é a enxaqueca. Esta condição caracteriza-se
correspondendo a cerca de 20% das perdas de fôlego por episódios recorrentes de cefaléia, com intervalo
e pode ser mais facilmente confundida com um quadro livre de sintomas. Além da cefaléia, pelo menos duas
convulsivo. Caracteriza-se por rápida perda da das seguintes características devem estar presentes:
consciência acompanhada de palidez, que se segue unilateral, pulsátil, melhora com o sono, presença de
geralmente à trauma inesperado, especialmente aura, associada à náusea ou vômitos e história familiar
quando há impacto na região posterior da cabeça. positiva para esta condição. A prevalência de
Muitas vezes ocorre hipertonia, mas a duração é enxaqueca na infância é da ordem de 4%. As formas
curta e a recuperação rápida. O mecanismo envolvido mais típicas de enxaqueca, com ou sem aura não
(vasovagal) é o mesmo observado nas síncopes costumam oferecer dificuldade diagnóstica. No entanto,
reflexas, em que há bradicardia em conseqüência da quando existem outros sintomas associados, como
hiperatividade vagal. ocorre nas chamadas formas “complicadas” de

200 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neurologia
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enxaqueca, tais como estado confusional, hemiplegia, a existência de fenômenos dos mais variados, inclu-
ataxia e sinais de comprometimento de nervos sive crises epilépticas. Isto acaba levando a realiza-
oculomotores, o diagnóstico de enxaqueca nem sempre ção de investigações extensas e que algumas vezes
é considerado. colocam em risco a criança, além da instituição de
diversos esquemas terapêuticos.
5. Intoxicação exógena
A possibilidade de intoxicação exógena deve sempre
ser lembrada em crianças com fenômenos motores
INVESTIGAÇÃO E TRATAMENTO
de aparecimento agudo que simulam convulsões. Na maior parte das vezes, a história clínica sugere
Medicamentos com atuação sobre o sistema nervoso o diagnóstico do DPONE, não sendo necessário
central, tais como antieméticos (metoclorpramida, investigação complementar. No entanto, existem
bromopride e outros) e antipsicóticos (haloperidol e algumas exceções, conforme já apontado. Assim,
fenotiazínicos), podem levar ao aparecimento de uma síncope aos esforços ou sem desencadeante
hipertonia com desvio vertical para cima dos olhos, definido pode levar à investigação de uma causa
parkinsonismo e dificuldade. cardiológica. Um evento paroxístico recorrente
ocorrido durante o sono que não é característico de
6. Vertigem paroxística da infância uma parasonia clássica pode levar à investigação
de epilepsia. E finalmente, os distúrbios paroxísticos
É uma condição benigna, ocorrendo em geral entre
psicogênicos podem ser de difícil elucidação e vão
1 e 5 anos de idade e que se caracteriza por
necessitar experiência por parte do médico para
episódios de poucos minutos de duração em que a
serem diagnosticados. A maior parte dos DPONE
criança mostra-se desequilibrada, recusa-se a
descritos previamente não necessita de tratamento
caminhar e procura apoio de quem está próximo.
específico, devendo a família ser tranqüilizada quanto
Estes episódios podem se repetir mais algumas vezes
à natureza benigna desses eventos.
e deixam de ocorrer após os 6 anos de idade.

7. Distúrbios paroxísticos psicogênicos


CONSIDERAÇÕES FINAIS
As pseudo-crises epilépticas podem ser difíceis de
Os DPONE são como um todo muito freqüentes em
serem distinguidas de crises verdadeiras. Elas são
pediatria, certamente mais comuns que as crises
mais freqüentes em adolescentes mas podem ocorrer
epilépticas. O diagnóstico é na maior parte das
em crianças menores. Os sintomas são variados e
vezes baseado na história e exame clínico e a simples
podem incluir fenômenos motores localizados ou
orientação da família frente a estes fenômenos é, na
generalizados, muitas vezes incoordenados. O
maior parte das vezes, a conduta mais apropriada.
diagnóstico correto é critico para o tratamento
A investigação complementar com exames como
adequado, uma vez que está contraindicado o uso
eletrocardiograma, ecocardiograma, eletroencefa-
de medicação antiepiléptica.
lograma e tomografia computadorizada de crânio
A síndrome de Munchausen por procuração é uma deve ser solicitada apenas em circunstâncias
psicopatologia mais grave, na qual um familiar relata especiais.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 201


Neurologia
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Distúrbios do Déficit da Atenção - Hiperatividade (DDAH)


JOSÉ LUIZ DIAS GHERPELLI

I. INTRODUÇÃO encontradas e por não ser possível estabelecer quais


seriam os mecanismos patogênicos responsáveis pelo
O distúrbio do déficit da atenção – hiperatividade
comprometimento do SNC. Atualmente há uma
(DDAH) é uma síndrome controversa e comum,
tendência cada vez maior entre os especialistas de
caracterizada pela presença de hiperatividade
que ele deva ser abandonado.
anormal para a idade, impulsividade e dificuldade
de concentração. Esse distúrbio, que se mantém
durante toda a vida, tem início na infância e é
caracterizado por uma atividade motora excessiva,
II. QUADRO CLÍNICO
mesmo quando ajustada para a idade da criança, A sintomatologia básica do DDAH é constituída por
e um controle comportamental limitado, o que faz graus variados de déficit da atenção, hiperatividade
com que crianças severamente comprometidas e impulsividade que são inadequados do ponto de
encontrem inúmeras dificuldades de adaptação vista do desenvolvimento da criança e que interferem
familiar, escolar e social. em seu desempenho social, acadêmico ou
ocupacional. Os sintomas se iniciam antes dos 7
Do ponto de vista histórico, o DDAH evoluiu a partir
anos de idade e persistem por um período de 6
de observações feitas por neurologistas, psiquiatras
meses aproximadamente e em pelo menos 2
e psicólogos. A pandemia de encefalite letárgica,
ambientes (casa e escola). Os sintomas do déficit
na década de 20, fez muitas crianças apresentarem
da atenção variam de acordo com a idade da
seqüelas caracterizadas por um quadro de
criança. Aqueles listados na Tabela 1 são
hiperatividade, impulsividade, agressividade e
particularmente válidos para a idade escolar. A
labilidade emocional. Isto levou à suspeita de que
aplicabilidade dos critérios em crianças pré-escolares,
uma disfunção neurológica seria a base para explicar
adolescentes e adultos ainda não foi validada.
esses sintomas.
Freqüentemente, as crianças com DDAH apresentam
O conceito da Disfunção Cerebral Mínima (DCM)
sintomas associados que não são essenciais para o
foi criado na década de 60, incluindo crianças que
diagnóstico. Estes sintomas incluem anormalidades
apresentavam uma série de sintomas na linha dos
no desenvolvimento motor (fino ou grosseiro), distúrbios
distúrbios de comportamento, aprendizado e
da coordenação motora, tiques, distúrbios do
coordenação motora “fina”, exercendo uma grande
aprendizado, atrasos no desenvolvimento da
influência sobre a postura médica, educacional e
linguagem, distúrbios do sono, enurese, encoprese,
psicológica em relação a essas crianças. O termo
imaturidade emocional, desorganização, dificuldade
DCM se aplicava a “crianças com inteligência normal
na interação social, negativismo, distúrbios emocionais
que apresentavam distúrbios do aprendizado ou do
e comportamentos anti-sociais. Eles podem ser mais
comportamento, de intensidade moderada ou severa,
problemáticos do que a hiperatividade ou o déficit
associados a disfunções do sistema nervoso central
da atenção, e podem ser a causa primária da procura
(SNC). Esses distúrbios poderiam manifestar-se por
da ajuda profissional.
uma combinação do comprometimento da percepção,
conceitualização, linguagem, memória e no controle
da impulsividade ou da função motora”.
III. PREVALÊNCIA
Algumas dessas crianças apresentavam, como parte
do quadro clínico, dificuldade de concentração nas Estudos populacionais mostram que o DDAH parece
atividades do cotidiano, além de um grau de ser uma entidade reconhecida na população
dispersão acentuado e hiperatividade motora. O pediátrica, com uma incidência variável que vai de
conceito da DCM, com o tempo, foi criticado por 1,7 a 17,8%. Essa discrepância se deve às
não ser seletivo em relação às anormalidades diferenças existentes nos diversos estudos, quanto

202 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neurologia
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Tabela 1. Critérios Diagnósticos para DDAH (DSM-IV)2.

A. Déficit da Atenção definido pela presença de pelo menos seis (6) dos seguintes itens:
1. Freqüentemente falha em dar atenção a detalhes ou comete erros grosseiros nas atividades escolares,
deveres ou outras atividades.
2. Freqüentemente tem dificuldade em manter a atenção em tarefas ou atividades lúdicas.
3. Freqüentemente parece não escutar quando lhe falam diretamente.
4. Freqüentemente não consegue seguir completamente instruções e não consegue terminar tarefas escolares,
atividades domésticas ou deveres (não devido a atitudes negativistas ou falha na compreensão das instruções).
5. Freqüentemente tem dificuldade em organizar tarefas e atividades.
6. Freqüentemente evita, não gosta, ou fica relutante em se engajar em atividades que necessitam de um esforço
mental contínuo (tais como deveres escolares, ou trabalhos domésticos).
7. Freqüentemente perde coisas necessárias para suas atividades ou trabalhos (p.ex.: brinquedos, deveres escolares,
lápis, livros, ferramentas, apetrechos de uso pessoal).
8. Freqüentemente é facilmente distraído por estímulos externos.
9. Freqüentemente se esquece das suas atividades diárias.

B. Hiperatividade/Impulsividade definidas pela presença de seis (6) dos nove critérios abaixo, dos quais seis dizem
respeito à hiperatividade e três à impulsividade:

Hiperatividade
1. Freqüentemente inquieto com as mãos e pés, ou se mexendo constantemente quando sentado.
2. Freqüentemente deixa o seu assento na classe ou em outras situações quando se espera que permaneça
sentado.
3. Freqüentemente corre ao redor, ou trepa nas coisas, em situações onde isso não é apropriado (em adolescentes
ou adultos isto pode se limitar a uma sensação subjetiva de inquietude).
4. Freqüentemente tem dificuldade em brincar ou se engajar em atividades de lazer de forma quieta.
5. Freqüentemente está “pronto para decolar”, ou freqüentemente age como se estivesse “ligado a um motor”.
6. Freqüentemente fala excessivamente.

Impulsividade
7. Freqüentemente responde de forma intempestiva antes que a pergunta esteja completamente formulada.
8. Freqüentemente tem dificuldade para aguardar pela sua vez.
9. Freqüentemente se intromete ou interrompe os outros (p.ex.: se intromete em conversas ou em jogos).

aos critérios operacionais utilizados na definição da IV. ETIOLOGIA


síndrome e à inclusão de outros distúrbios do
A causa do DDAH é desconhecida. O DDAH é
comportamento que não se enquadram no DDAH.
provavelmente a via final comum de múltiplas causas.
Quando critérios estatísticos baseados em escalas
Etiologias das mais variadas foram implicadas na
padronizadas são utilizados, a incidência cai para
sua etiopatogênese, como afecções neurológicas
valores mais modestos, em torno de 2 a 3%3.
adquiridas (meningite, traumatismo craniencefálico
A diferença quanto ao sexo também varia de acordo etc.), síndromes epilépticas (epilepsia, ausência da
com o estudo, existindo uma nítida predominância infância), e mesmo a exposição fetal ao álcool. A
no sexo masculino, com valores situando-se entre prevalência da síndrome foi relacionada com um
3:1 e 9:1. sem número de “fatores de risco” pré-natais, tais

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 203


Neurologia
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como fumo, retardo de crescimento intrauterino e do sistema dopaminérgico relacionado à


distúrbios emocionais maternos. Ela é maior em hiperatividade 14. As evidências relacionando a
crianças que nasceram com peso muito baixo. Foi norepinefrina são menos consistentes.
relatada uma associação entre o DDAH e um gene
As evidências sugerem que no DDAH os três sintomas
transportador de dopamina5.
básicos – déficit de atenção, hiperatividade e
impulsividade – originar-se-iam de um substrato
neurobiológico comum, o que justificaria a ampla
V - BASES BIOLÓGICAS sobreposição existente entre eles.
O DDAH apresenta um substancial componente
genético com taxa de herança de 0,75 a 0,91.
VI - DIAGNÓSTICO
Estudos em gêmeos, irmãos e familiares de crianças
com DDAH, sugerem um forte componente genético A maior parte dessas crianças procura atendimento
no DDAH6. Aproximadamente 25% dos parentes em médico na idade escolar, com a queixa de
1o grau das crianças com DDAH apresentam déficits dificuldade no aprendizado. Entretanto, os distúrbios
da atenção, e há um maior risco do aparecimento de conduta decorrentes da hiperatividade e
da síndrome em parentes de 2o grau do que em impulsividade levam com freqüência os pais a
controles. procurarem atendimento especializado antes do
Os estudos genéticos se detiveram sobre genes aprendizado formal. As queixas mais freqüentes são:
envolvidos na transmissão dopaminérgica. Uma a hiperatividade (“não consegue ficar quieto”), o
variante comum (polimorfismo) da região que codifica baixo rendimento escolar, a impulsividade, a
o gene do transportador dopaminérgico DAT1, dificuldade na concentração em atividades nas quais
responsável pela inativação da dopamina, foi ela é necessária, o fato de distrair-se facilmente (“anda
relacionado ao DDAH. no mundo da lua”, “sonha acordado”), ser
“desastrado” e “confuso”.
Estudos morfológicos do sistema nervoso central
sugerem um comprometimento do lobo frontal na A história clínica revela que algumas dessas crianças
etiologia do DDAH7. Além disso, foram identificadas foram bebês que apresentaram distúrbios do sono e
anormalidades nos gânglios da base (núcleo irritabilidade sem causas definidas. O desenvolvimento
caudado), o que levaria à hipótese de uma possível neuropsicomotor é normal, na maioria dos casos,
disfunção fronto-estriatal4. podendo eventualmente ocorrer um discreto atraso
no desenvolvimento da linguagem. A hiperatividade
Estudos funcionais revelaram resultados variados. é um sintoma reconhecido precocemente, já no
Alguns estudos com isótopos radiativos mostraram segundo ou terceiro ano de vida da criança.
comprometimento do fluxo sanguíneo cerebral em Entretanto, ela é freqüentemente subestimada pelos
áreas do córtex pré-motor e pré-frontal superior17. familiares, até que a criança se encontre num
Outros revelaram diminuição de fluxo nas regiões ambiente socialmente estranho, o que se dá, em
estriatais11. Entretanto, avaliações do metabolismo geral, quando começa a freqüentar a escola. Dados
cerebral realizados através do PET-scan não sobre o comportamento da criança na escola devem
conseguiram revelar diferenças entre jovens com ser obtidos sistematicamente já que, com alguma
DDAH e controles18. freqüência, os pais tendem a valorizar, subestimar
Exames dos potenciais evocados auditivos revelaram ou desconsiderar certos aspectos importantes do
um aumento da latência e duração na transmissão e comportamento da criança que são essenciais para
assimetria das ondas a nível do tronco cerebral10. o diagnóstico adequado.

A bioquímica do déficit da atenção e da hiperatividade Normalmente, quando os pais procuram atendimento


deriva de considerações farmacológicas decorrentes médico, é freqüente o encontro de distúrbios
do efeito de algumas drogas específicas. As emocionais, como auto-estima baixa, agressividade,
substâncias mais estudadas foram a dopamina e a atitudes negativistas e comportamentos anti-sociais.
norepinefrina. As anfetaminas e o metilfenidato são Esses comportamentos são, na sua maioria,
potentes agonistas dopaminérgicos. Existem algumas consequência de atitudes inadequadas do meio
evidências experimentais e clínicas de uma deficiência ambiente, tanto em nível familiar, quanto pedagógico.

204 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neurologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

O exame clínico e neurológico tradicional nessas VII - PROGNÓSTICO


crianças geralmente se encontra dentro da
normalidade. O exame neurológico evolutivo revela O prognóstico do DDAH depende da idade ao
freqüentemente sinais neurológicos “menores” (soft diagnóstico, das patologias associadas, do nível
neurological signs), principalmente nos testes de cognitivo, e de algumas características externas à
persistência motora, equilíbrio estático e síndrome, tais como a duração do segmento e o tipo
coordenação motora fina. A avaliação psicológica de população estudada. Alguns trabalhos mostraram
que, no segmento a longo prazo de crianças
revela os componentes reativos do DDAH. A
hiperativas, havia a persistência de pelo menos um
avaliação psiquiátrica deverá excluir outras causas
dos sintomas: inquietude, diminuição na capacidade
que podem ser confundidas com a síndrome, tais
de concentração ou impulsividade, que interferiam de
como depressão, mania e distúrbios pervasivos da
forma moderada ou severa nas atividades de vida
conduta.
diária16. Distúrbios de personalidade na linha anti-
Exames laboratoriais, tais como o eletroencefalograma, social foram observados em aproximadamente 1/4
potenciais evocados, tomografia computadorizada e dos casos. Estudos semelhantes mostram que o
ressonância nuclear magnética, não contribuem desempenho educacional e ocupacional foi mais baixo
diretamente para o diagnóstico, que é essencialmente entre os pacientes previamente diagnosticados com
clínico. DDAH, bem como uma maior incidência de
drogadição12. Não foram identificadas variáveis que
A avaliação psicopedagógica é uma parte integrante
permitissem prever o prognóstico com base nos
e importante na avaliação desses casos. Nos países
sintomas apresentados na infância.
desenvolvidos, onde a abordagem multidisciplinar
destas crianças é feita precocemente e de forma
integrada, os pais e professores participam ativamente VIII - TRATAMENTO
da avaliação, através de questionários, sendo também
valorizada a observação direta na escola, quando O tratamento multidisciplinar enfocando as áreas
possível, e a aplicação de testes através do cognitiva, emocional, pedagógica e social é
computador para a medida da atenção (vigilância importante para prevenir um prognóstico indesejável.
e grau de distração). Este tratamento multidisciplinar é superior ao tratamento
medicamentoso isolado.
Em resumo, o diagnóstico é realizado não só através
A orientação pedagógica adequada é um aspecto
do preenchimento dos critérios diagnósticos
muito importante no manejo das dificuldades do
mostrados na Tabela 1, mas de uma avaliação
aprendizado dessas crianças. Tratamentos
multidisciplinar, onde os vários aspectos do DDAH
psicoterápicos para as crianças e para os pais estão
são avaliados, a fim de que seja feito o diagnóstico
indicados em casos selecionados. Isto não substitui
diferencial com outros distúrbios da linha psicológica
uma orientação familiar, com o objetivo de esclarecer
e psiquiátrica.
dúvidas com relação ao diagnóstico e modificar
O diagnóstico deve incluir diferentes condições que, comportamentos inadequados, a fim de que eles
embora não afetem primariamente os mecanismos possam entender o problema e adequar suas atitudes
de controle da atenção, podem manifestar em em relação à criança.
alguma fase de sua evolução um déficit de atenção, As drogas estimulantes continuam sendo as de escolha
de forma transitória ou permanente, sendo difícil a no tratamento farmacológico do DDAH. Aproxima-
distinção com o DDAH. As principais condições damente 70% das crianças respondem às drogas
são a deficiência mental leve, distúrbios específicos estimulantes, entretanto a resposta não é uniforme e
da linguagem, certos tipos de epilepsia, síndrome não está diretamente relacionada com melhora no
de Tourette, estágios iniciais de neurodegenerações, rendimento escolar13. Há uma diminuição na atividade
distúrbios metabólicos (anemia ferropriva, motora, impulsividade e agressividade, enquanto
intoxicações), distúrbios sensoriais da visão e da ocorre uma melhora no comportamento escolar e na
audição, e fatores ambientais adversos de âmbito relação da criança com seus pares e com a família.
familiar, educacional, escolar, e socioeconômico- Medicamentos como metilfenidato, pemolina,
cultural9. D-anfetamina e imipramina são utilizados.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 205


Neurologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Entretanto, é preciso deixar claro que o tratamento 07 - Giedd JN et al. Quantitative morphology of the corpus
callosum in attention deficit hyperactivity disorder. Am J
medicamentoso não deve ser usado indiscriminada- Psychiatry 1994;151:665-9.
mente. Os efeitos colaterais mais comuns são a 08 - Halperin JM, Matier K, Bedi G, Sharma V, Newcorn JH.
irritabilidade, anorexia, insônia e efeito “rebote” Specificity of inattention, impulsivity, and hyperactivity to
the diagnosis of attention-deficit hyperactivity disorder.
comportamental (com drogas de ação curta). Não há J Am Acad Child Adolesc Psychiatry 1992;31:190-6.
evidências de que a utilização do aspartame ou açúcar
09 - Kelly DP, Aylward GP. Attention deficits in school-aged
modifique o quadro clínico dessas crianças15. children and adolescents. Current issues and practice.
Pediatr Clin North Am 1992; 39: 487-512.
O treinamento cognitivo isolado ou combinado com
10 - Lahat E et al. BAEP studies in children with attention deficit
drogas estimulantes não parece ser eficaz em crianças hyperactivity disorder. Dev Med Child Neurol
hiperativas1. 1995;37:119-23.
11 - Lou HC, Henriksen L, Borner H, Nielsen JB. Striatal
dysfunction in attention deficit and hyperkinetic disorder.
Arch Neurol 1989;46:48-52.
12 - Mannuzza S, Klein RG, Bessler A, Malloy P, LaPadula M.
Adult outcome of hyperactive boys. Arch Gen Psychiatry
IX - Referências Bibliográficas 1993;50:565-76.

01 - Abikoff H. Cognitive training in ADHD children: less to it 13 - Rapport MD. Controlled studies of the effects of psycho
than meets the eye. J Learn Disabil 1991;24:204-9. stimulants on children’s functioning in clinic and classroom
settings. In Conners K, Kinsbourne M. (eds.), Attention
02 - American Psychiatric Association. Diagnostic criteria from Deficit Hyperactivity Disorder. München: Medizin Verlag,
DSM-IV. Washington DC: American Psychiatric Association, 1990: 77-111.
1994: 63-6.
14 - Rosemberg PB. Attention deficit. Pediatr Neurol
03 - Conners K. Diagnosis of attention deficit hyperactivity 1991;7:397-405.
disorder (ADHD). In Conners K, Kinsbourne M. (eds.), 15 - Shaywitz BA et al. Aspartame, behavior, and cognitive
Attention Deficit Hyperactivity Disorder. München: Medizin function in children with attention deficit disorder. Pediatrics
Verlag,1990:17-35. 1994;93:70-5.
04 - Castellanos FX et al. Quantitative morphology of the caudate 16 - Weiss G, Hechtman LT. The adult hyperactive: psychiatric
nucleus in attention deficit hyperactivity disorder. Am J status. Hyperactive children grown up. 2nd ed. New York:
Psychiatry 1994;151:1791-6. Guilford Pr, 1993:61-83.
05 - Cook EH Jr et al. Association of attention-deficit disorder 17 - Zametkin AJ et al. Cerebral glucose metabolism in adults
and the dopamine transporter gene. Am J Hum Genet with hyperactivity of childhood onset. N Engl J Med
1995;56:993-8. 1990;323:1361-6.
06 - Faraone SV, Biederman J. Genetics of attention deficit 18 - Zametkin AJ et al. Brain metabolism in teenagers with
hyperactivity disorder. Child Adolesc Psychiatr Clin N Am attention-deficit hyperactivity disorder. Arch Gen Psychiatry
1994;3:285-301. 1993;50:333-40.

206 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Pneumologia
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Tuberculose
CLEMAX COUTO SANT’ANNA

1. INTRODUÇÃO correspondem aos menores de 15 anos (crianças).


Em ambos os grupos, há predomínio da forma
Tuberculose é a doença causada pelo Mycobacterium pulmonar sobre as demais. No caso de adultos, a
tuberculosis ou eventualmente por outras micro- forma pulmonar corresponde a 90% do total, enquanto
bactérias. que em crianças, este percentual é de 75%.
O número de casos novos registrados no Brasil em
1996-7 foi de aproximadamente 90.000.
2. DIAGNÓSTICO
Cerca de 85% dos casos de tuberculose no país, O diagnóstico, na prática, está sintetizado no
ocorrem em maiores de 15 anos; os 15% restantes Quadro 1

Quadro 1

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 207


Pneumologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

1. As manifestações clínicas podem ser variadas. O outros métodos diagnósticos, tais como broncoscopia,
dado que chama atenção na maioria dos casos é punções e até mesmo biópsia pulmonar por
a febre, habitualmente moderada, persistente por mais toracotomia. Nestas condições, além de exame
de 15 dias e freqüentemente vespertina. É comum a bacteriológico, pode-se proceder a exame cito ou
sudorese noturna, às vezes profusa, enquanto que o histopatológico para aumentar a chance de
relato de hemoptise é relativamente raro. positividade.
Muitas vezes a suspeita de tuberculose acontece em Há perspectivas de diagnóstico rápido da
casos de pneumonia que não apresentam melhora tuberculose através de testes imunológicos que
com o uso de antimicrobianos para germes comuns. pesquisam antígenos e anticorpos e da biologia
Há predomínio da localização pulmonar sobre as molecular, cujo exemplo mais importante foi
demais formas de tuberculose, isto é, as formas alcançado com as sondas de DNA. Os métodos
extrapulmonares. imunológicos, dentre eles o ELISA, cujo rendimento
é melhor observado em líquidos de serosas, são
2. Os achados radiográficos da tuberculose pulmonar mais simples quando há dificuldade de obter
mais compatíveis são: adenomegalias hilares e/ou secreções acessíveis, embora não possam ser
paratraqueais (gânglios mediastínicos aumentados de empregados na rotina atualmente.
volume); pneumonias com qualquer aspecto
radiológico, de evolução lenta, às vezes associadas O método PCR (reação em cadeia da polimerase)
a adenomegalias mediastínicas, ou que cavitam envolve a identificação de cadeias de DNA
durante a evolução; infiltrado nodular difuso (padrão específicas do M. tuberculosis e pode ser realizado
miliar). O diagnóstico diferencial com tuberculose em diversos materiais (escarro, lavado gástrico e
deve sempre ser feito em crianças com pneumonia broncoaspirado). Ainda há poucos trabalhos sobre
de evolução lenta, isto é, quando o paciente vem sua utilização em pediatria.
sendo tratado com antibióticos para germes comuns 2.1. DIAGNÓSTICO DA TUBERCULOSE
sem apresentar melhora após duas semanas. EXTRA-PULMONAR
3. A história de contágio com adulto tuberculoso Algumas localizações extrapulmonares da tuberculose
bacilífero ou não, deve ser valorizada principalmente são mais freqüentes na infância, atingindo gânglios
nas crianças até a idade escolar periféricos, pleura, ossos e meninges. A tuberculose
do aparelho digestivo (peritonite e intestinal),
4. O teste tuberculínico, realizado com PPD através
pericardite, gênito-urinária e cutânea são mais raras.
da reação de Mantoux, pode ser interpretado da
seguinte maneira: A tuberculose ganglionar periférica acomete geralmente
• não reator - inferior a 5 mm. cadeias cervicais, em geral é unilateral, com
adenomegalias de evolução lenta, superior a três
• reator fraco - entre 5 e 9 mm
semanas. Os gânglios têm consistência endurecida e
• reator forte - 10 mm ou mais podem fistulizar (escrófula ou escrofulodrema). É comum
O teste tuberculínico pode ser considerado positivo a suspeita em casos de adenomegalia que não
(reator) quando superior a 10 mm em crianças não responderam ao uso de antibióticos.
vacinadas com BCG ou vacinadas há mais de 2 A meningoencefalite tuberculosa costuma cursar com
anos; ou superior a 15 mm em crianças vacinadas fase prodrômica de uma a oito semanas, quase
com BCG em qualquer época.
sempre com febre, irritabilidade, paralisia de pares
5. Em crianças até 5 anos que estejam internadas cranianos que pode evoluir com sinais clínicos de
para investigação de tuberculose pode ser tentada a hipertensão intracraniana, como vômitos, letargia e
realização de cultura para M. tuberculosis de rigidez de nuca. O liquor é claro, com glicose baixa
espécime proveniente de lavado gástrico. Em serviços e predomínio de mononucleares.
ambulatoriais o lavado gástrico não é recomendado. A forma osteoarticular mais encontrada situa-se na
O exame de escarro (baciloscopia e cultura), em
coluna vertebral, constituindo-se no Mal de Pott. Cursa
geral só é possível a partir dos 5 ou 6 anos. com dor no segmento atingido e posição antálgica
Dependendo do quadro clínico-radiológico nas lesões cervicais e torácicas, paraplegias e
apresentado pela criança podem ser necessários gibosidade.

208 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Pneumologia
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3. TRATAMENTO Levando em conta a grande evasão escolar existente


no país, o Ministério da Saúde optou por recomendar
O tratamento com rifampicina (RMP), isomiazida (INH) o reforço da vacinação BCG à entrada da escola
e pirazinamida (PZA), conhecido como esquema RIP e não na adolescência, porém deixando porém a
é bem tolerado em crianças. O tratamento padrão da cargo dos Estados eleger a época de maior
tuberculose, obedece ao esquema I, proposto pelo abrangência desta revacinação. Assim, esta deverá
M.S. (Quadro 2). O tratamento da meningoencefalite ser feita por volta dos 6 anos, quando a criança
tuberculosa deve ser feito com o Esquema II (6) . for admitida à escola.
Em condições normais, não há necessidade de A revacinação está indicada também em crianças
monitorização de enzimas hepáticas durante o que receberam a vacina e não desenvolveram cicatriz
tratamento. até 6 meses após. É contra-indicada em crianças
Até o momento não há evidência, na prática, de HIV positivas, com AIDS, com outras imunodeficiências
grande número de casos de tuberculose multirresistente congênitas ou adquiridas à idade escolar(18).
(TBMR) na infância em nosso meio. Entende-se por Do mesmo modo, por razões operacionais, é
multirresistência às drogas anti-tuberculose a situação dispensável o teste tuberculínico prévio. Além do
na qual o doente não fica curado com os esquemas mais, a revacinação ofereceria uma proteção
terapêuticos padrão descritos, isto é, apresenta adicional contra a hanseníase.
resistência à RMP, INH, PZA, EMB, SM, além de
outras, necessitando, pois, de esquemas alternativos.
6. QUIMIOPROFILAXIA
A quimioprofilaxia ou quimioterapia preventiva da
4. VACINAÇÃO BCG tuberculose é realizada em pessoas infectadas pelo
A vacina BCG (Bacilo de Calmette e Guérin) originou- M. tuberculosis , no sentido de impedir seu
se de um bacilo tuberculoso bovino após mutações adoecimento. Mais recentemente, estudos mostraram
genéticas que o tornaram avirulento e com também o papel protetor da quimioprofilaxia em
propriedades imunogênicas protetoras contra a indivíduos HIV positivos.
tuberculose, constituindo-se no Mycobacterium bovis
Emprega-se a isoniazida, na dose diária de 5 a
BCG. Há consenso na literatura de que o BCG
10 mg/K (até o máximo de 300 mg/ dia), durante
protege contra formas graves de tuberculose, como
6 meses, podendo ser repetida após 2 anos, se
a miliar e a meningoencefalite.
houver necessidade de proteção adicional.
A vacina BCG pode ser aplicada em recém-nascidos
No Brasil, as normas do M.S. recomendam a
ou lactentes HIV positivos, de acordo com a
quimioprofilaxia em comunicantes de bacilíferos,
orientação da OMS adotada no país. Está contra-
menores de 5 anos, não vacinados com BCG,
indicada em crianças com peso inferior a 2 quilos
reatores fortes à prova tuberculínica, com radiografia
ou naquelas com manifestações clínicas de AIDS
de tórax normal e assintomáticos em relação à
Freqüentemente observa-se aumento ganglionar, tuberculose.
muitas vezes volumoso, na região axilar direita e
Existe uma modalidade especial de quimioprofilaxia,
nas cadeias supraclaviculares, cer vicais ou
denominada primária, indicada em indivíduos ainda
intercostais que não significam complicação vacinal.
não infectados, empregada em recém-nascidos que
Se a adenomegalia não é dolorosa e não há sinal
coabitam com bacilíferos. A isoniazida é administrada
de supuração, deve-se apenas manter conduta
por 3 meses, na dose convencional e ao final deste
expectante.
período é feito o teste tuberculínico. Se o resultado
for reator forte, a quimioprofilaxia deve ser
5. REVACINAÇÃO BCG prolongada por mais 3 meses. Se o teste for não
reator, a criança deve ser vacinada com BCG.
A revacinação BCG foi introduzida no Brasil em
1994, como reforço à primo-vacinação feita ao Em 1997, o I Consenso Brasileiro de Tuberculose
nascer (18). Ainda não foi publicado nenhum ensaio recomendou a ampliação de sua indicação para os
controlado sobre revacinação BCG. seguintes grupos:

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 209


Pneumologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

• Comunicantes domiciliares ou próximos de 02 - Sant’Anna,C.C., March, M.F.B.P. - Tuberculose. PRONAP-


Sociedade Brasileira de Pediatra, 1998; 2: 3- 31
tuberculosos, afastada a possibilidade de doença
03 - Brasil. Ministério da Saúde. Manual de normas para o
em atividade, reatores (> 5mm) ao PPD, independen- controle da tuberculose. Fundação Nacional de Saúde.
temente da vacinação BCG. Brasília, DF. 1995

• Conversores (de PPD não reator para reator forte) 04 - Diaz,E.S. Inmunologia de tuberculosis: metodos
diagnosticos. In: Seminario Regional de Tuberculosis,
recentes (até 2 anos) ao teste tuberculínico. OPAS/OMS, 1988 (pub. cient. 511)
• Reatores ao PPD com condições clínicas associadas 05 - Kritski, A L., Rossetti, M.L., Bonfim, G., Castelo, A, Mello,
F.C.Q.- Reação em cadeia da polimerase (RCP/PCR)
à imunodepressão e à elevada incidência de aplicada ao diagnóstico da tuberculose. J. Pneumol 1997;
tuberculose, como: diabéticos insulinodependentes, 23: 33-42.
nefropatas graves, pessoas sob corticoterapia 06 - Melo,F.A F., Ide Neto, J., Seiscento, M., Pinto ,J. A,
Afiune,J.B. - Tuberculose multirresistente. J. Pneumol. 1993;
prolongada ou quimioterapia antineoplásica, 19: 73-82
indivíduos HIV positivos
07 - Starke,J.R. - Tuberculose na criança: diagnóstico e
• Portadores de imagens radiográficas compatíveis tratamento. Anais Nestlé vol. 56, 1998
com tuberculose inativa (lesões fibróticas) sem história 08 - March, M.F.B.P.,Sant’Anna, C.C. - Aspectos da eficácia
da vacinação e da revecinação BCG. Pulmão RJ 1996;
de quimioterapia prévia adequada. 5: 152-156.
Nos comunicantes de pacientes tuberculosos 09 - Brasil. Ministério da Saúde - 2o Informe sobre a
vacinação/revacinação BCG. Fundação Nacional de
multirresistentes (TBMR) ainda não há normas bem Saúde. Brasília, DF. 1994
definidas até o presente, ficando de ser definidas 10 - Rosemberg,J. - Tuberculose atual no mundo e no Brasil.
pelos centros de referência. Bol. Soc. Paulista Pneumo. Tisio., ano 3, n.4, ago. 1995
11 - Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia -
I Consenso brasileiro de tuberculose - 1997. J. Pneumol.
REFERÊNCIAS 1997; 23: 279-346.
12 - Dalcolmo, M., Macedo, E. A., Menezes. L.L., Paiva, M.
01 - Sant’Anna, C.C. - Formas clinico-radiológicas In: Sant’Anna A .S., Sant’Anna, C.C. - Prevenção de tuberculose:
C.C., Bethlem,N. - Tuberculose na infância. 2a ed. Rio vacinação BCG e quimioprofilaxia. J. Pneumol.
de Janeiro, Cultura Médica, 1988. p.36-52 1993;19:60-2.

Pneumonias de Evolução Prolongada


VITOR COSTA PALAZZO

A pneumonia aguda constitui-se numa das principais pneumonia persistente ou recorrente. Em alguns
causas de morbidade e mortalidade infantil em todo estudos, a pneumonia foi amplamente definida como
o mundo, principalmente nos países em desenvol- tosse, dispnéia ou taquipnéia associadas com
vimento. Conforme relatos da Organização Mundial achados de exame físico de macicez a percussão,
de Saúde, estima-se que aproximadamente 4 milhões estertores, sibilos, diminuição do murmúrio vesicular,
de crianças com idade inferior a 5 anos morram ou aumento do frêmito tóraco-vocal.
anualmente, sendo que aproximadamente 2/3 destas
com idade inferior a 1 ano. Embora os vírus sejam Estes sinais e sintomas clínicos foram usualmente (mas
responsáveis pela maioria das pneumonias na nem sempre) confirmados por imagens radiográficas
população pediátrica, as bactérias são responsáveis anormais com localização lobar, segmentar,
por 20% a 30% de todos os casos nesta faixa etária. subsegmentar ou broncovascular.

Uma definição clara é necessária para discutir-se o A pneumonia recorrente é definida como uma
diagnóstico e o enfoque terapêutico da criança com pneumonia que recidivou depois da resolução destes

210 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Pneumologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

sinais e sintomas anteriormente referidos, sendo uma c. pulmonares:


segunda enfermidade respiratória com novas – seqüestro pulmonar.
alterações radiográficas. – má formação cística adenomatóide do pulmão.
– hipoplasia pulmonar.
A pneumonia persistente é definida como uma
pneumonia de curso clínico com duração maior do d. cardiovascular:
que o esperado. Ambas são difíceis de ser – anel vascular.
distinguidas, pois a involução das alterações – doenças cardíacas congênitas.
radiográficas e a completa resolução dos sinais e 08. Anomalias do “clearance” mucociliar.
sintomas, nem sempre são documentadas nos
09. Fibrose cística.
pacientes. Por isso, ambos os tipos são consideradas
conjuntamente. 10. Displasia broncopulmonar.

A maioria dos pacientes com pneumonia de evolução 11. Defeitos ciliares estruturais ou discinesia ciliar.
adequada terá as imagens radiográficas involuídas – síndrome dos cílios imóveis.
em 2 a 3 semanas, como no caso das viroses 12. Anomalias fisiológicas congênitas:
respiratórias (VSR, parainfluenza, etc.); de 6 a 8 – traqueomalácia.
semanas nas pneumonias pneumocócicas e acima – broncomalácia.
de 12 meses nas pneumonias pelo adenovírus-21. 13. Alterações ambientais (cigarro, etc.).
Infelizmente, o diagnóstico etiológico para a maioria
das pneumonias em crianças é desconhecido, 14. Outras alterações do clearance mucociliar:
– seqüelas de infecções.
fazendo com que estes dados não sejam utilizados
na prática. – defeitos da deglutição.
– reparos de anomalias congênitas.
As pneumonias com alterações radiográficas lobares,
15. Outras desordens associadas com obstrução das
segmentares ou difusas persistentes, as quais
vias aéreas.
permaneçam inalteradas ou piores por um período
– compressões adquiridas (linfonodos, massas,
igual ou superior do que 2 semanas - apesar da
etc.).
terapia antimicrobiana para patógenos comuns -
– desordens imunológicas locais e sistêmicas.
constituem-se em indícios significativos da existência
de algum problema básico e que podem ser Devido ao fato de não existir uma definição
classificados em diversas categorias. universalmente aceita de pneumonia recorrente e
persistente, a real incidência deste problema clínico
Fatores Etiológicos:
é desconhecida. O termo persistente deixa implícito
Pneumonias Recorrentes / Persistentes
cronicidade, o que faz com que aflore um
01. Síndrome aspirativas. questionamento crítico de quando então uma
02. Corpos estranhos. pneumonia seria considerada como crônica.

03. Anormalidades das vias aéreas. A duração dos sintomas ou a persistência das
04. Distúrbios de deglutição: alterações radiográficas por um período igual ou
– imaturidade dos mecanismos de deglutição. superior a 3 meses é freqüentemente utilizada para
– desordens neurológicas e neuro-musculares. definir uma pneumonia como crônica. Outros autores
definem arbitrariamente como pneumonia persistente
05. Refluxo gastro-esofageano.
ou recorrente o encontro de anormalidades
06. Técnicas inadequadas de alimentação. radiográficas além do prazo esperado, tosse crônica
07. Anomalias congênitas: que está presente na maioria dos dias por 3 meses,
ou ambas as situações.
a. das vias aéreas:
– síndrome de Pierre Robin. É muito difícil de determinar se uma pneumonia é
– fenda palatina, laringotraqueal. persistente ou recorrente, a não ser que tenha ocorrido
– fístula traqueo-esofágica. um intervalo livre de manifestações clínicas durante
b. broncopulmonares: o qual as alterações radiográficas anteriormente
– cisto broncogênico. presentes mostrem-se ausentes.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 211


Pneumologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

O reaparecimento de alterações radiográficas numa nhecimento tardio e/ou inadequado pelo médico
mesma área em exames subseqüentes pode ser e, por último, condutas inadequadas, quer na
atribuído a casos de recorrência, enquanto que investigação, como no acompanhamento dos
alterações que não desaparecem falam a favor de diferentes casos.
pneumonias persistentes.
2º) Fatores relacionados aos pacientes, pois
Tendo em vista a diversidade de enfoques que as sabemos que as infecções respiratórias incidem de
pneumonias podem se enquadrar, se persistentes, forma diferente de acordo com a idade, estado
recorrentes ou crônicas e, verificando a dificuldade nutricional, existência de patologias associadas,
que temos numa freqüência relativamente expressiva estado imunológico, vacinal e alterações do meio
em conduzir o seu tratamento apropriado, gostaríamos ambiente.
de dar uma conotação diferente, sob nosso ponto
3º) Fatores relacionados ao agente etiológico, seja
de vista, de cunho inteiramente prático, baseado
nas dificuldades de sua identificação nas diferentes
nos diferentes graus de dificuldades em tratar nossos
fases da doença, assim como também dependência
pacientes.
da virulência, do tempo de evolução decorrido antes
Pudemos observar recentemente, que apesar do do diagnóstico e início do tratamento, da investigação
conhecimento dos diferentes agentes etiológicos, das realizada e da terapêutica adequada.
modernas técnicas de investigação laboratorial e
4º) Fatores relacionados ao tratamento propriamente
radiológica, nem sempre disponíveis ao alcance
dito, importando a escolha correta das medicações,
de todos, da grande variedade de agentes
muitas vezes de alto custo, os procedimentos
antimicrobianos que dispomos e que muitas vezes
invasivos e a presteza com que foram realizados,
são utilizados de maneira não criteriosa, tivemos
nas intercorrências esperadas, nas iatrogênicas e,
uma grande incidência de casos nos quais não
nas limitações terapêuticas, quer na fase de
apresentaram uma evolução conforme era de
investigação, como na do tratamento propriamente
se esperar, permanecendo hospitalizados por
dito.
períodos 2 a 3 vezes maiores aos encontrados na
literatura nacional e internacional. São pacientes Certamente existem outros fatores que deixaram de
que necessitaram de múltiplos agentes ser lembrados e que poderiam estar aqui incluídos.
antimicrobianos, intervenções não usuais - e muitas Após uma análise criteriosa de todas as condições
vezes com resultados nada satisfatórios e com a que interferem no reconhecimento das patologias que
incidência elevada de seqüelas –, além de limitações acometem nossa crianças, depois de esgotados todos
para uma vida normal sob todos os pontos de os recursos disponíveis muitas vezes de uma maneira
vista. desigual para uma investigação diagnóstica ideal e
ainda após empregado todo o arsenal terapêutico
Por isso, abordamos este tema por um prisma
de maneira racional e criteriosa, poderemos
diferente, baseado na análise evolutiva de alguns considerar nossa missão cumprida independente das
casos, procurando uma provável causa para a
adversidades encontradas.
ocorrência dos mesmos. Sendo assim, deduzimos
que a evolução arrastada de alguns pacientes
poderia estar enquadrada dentro de alguns
fatores.
Bibliografia:
1º) Fatores relacionados ao diagnóstico da
patologia, com implicações diretas relacionadas à 01 - Grisi SJEF. Pneumonias Bacterianas Agudas. Rozov T, ed.
Doenças Pulmonares em Pediatria: Diagnóstico e
maneira como nossas crianças são atendidas pelos Tratamento. São Paulo: Editora Atheneu, 1999.
profissionais da área de saúde, tendo em vista a
02 - Correa & Stark. Bacterial Pneumonias. Edwin Kendig, ed.
desproporção entre o número de profissionais e o Disorders of the Respiratory Tract in Children. 6th edition.
número de consultas/dia e o tempo disponível para W.B. Saunders Company, 1998.
cada caso. Incluímos aqui os fatores dependentes 03 - Churgay CA. Community-Acquired Respiratory Infections
in Children. Prim Care Dez 1996;23(4)821-35.
do reconhecimento pela mãe que seu filho
está doente e que necessita de atendimento 04 - Orens JB, Sitrin RG, Lynch III JP. The Approach to
Nonresolving Pneumonia. Med Clin North Am 1994
especializado; fatores dependentes do reco- 87(5)1143-72.

212 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Pneumologia
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Bronquite Viral Aguda (BVA)


JOSÉ DIRCEU RIBEIRO

CONSIDERAÇÕES INICIAIS: O VSR apresenta–se em dois grupos sorológicos (A


e B) e causa de 70 a 85% dos episódios agudos
A bronquiolite é uma doença respiratória aguda, de BVA. Outros episódios de BVA são devidos ao
causada por infecção viral (BVA) que resulta na parainfluenza 1 e 3, influenza A e B, rhinovirus e
obstrução das vias aéreas de pequeno calibre. adenovirus. A infecção concomitante com outros vírus
Acomete principalmente lactentes de ambos os sexos, ou microorganismos, como Chlamydia trachomatis,
freqüentemente na faixa etária de 1 a 8 meses de ocorre em 5-10% das infecções por VSR. No Brasil,
idade. A conseqüência mais freqüente é insuficiência segundo os dados de Cox et al. e Fischer, os estados
respiratória aguda leve, moderada ou grave. Os do sul do país apresentam maior incidência nos
surtos epidêmicos acontecem geralmente nos meses meses de outono e inverno. Crianças que freqüentam
de inverno. creches são mais susceptíveis. As infecções cruzadas
Atinge cerca de 10% de todas as crianças, sendo em hospitais podem ser reduzidas drasticamente pela
que até 75% apresentam sibilância após o quadro equipe de saúde com o hábito de lavar as mãos.
agudo. A necessidade de hospitalização varia de
1/10 a 1/100 dos lactentes afetados e a entubação
para ventilação mecânica é necessária em cerca de FISIOTATOLOGIA
5% dos indivíduos.
Muitas crianças, quando examinadas após o segundo
Fatores de risco têm sido documentados e incluem: ano de vida, mostram evidências sorológicas de
I- relacionados ao indivíduo: sexo masculino, idade infecção prévia pelo VSR, mas somente uma pequena
inferior a 6 meses, doença pulmonar crônica, parcela teve bronquiolite, evidenciando que a
cardiopatias, prematuridade, baixo peso ao nascer, infecção com o VSR pode ser assintomática ou
fibrose cística, desnutrição, deficiência de vitamina localizar-se em outra parte do sistema respiratório. O
A, imunodeficiências, displasia bronco pulmonar e VSR causa infecções das vias aéreas superiores, como
Síndrome de Down. II. não relacionados ao indivíduo: otites, laringites e algumas vezes pnemonia em 80
idade materna, tamanho da família, ordem de a 90% dos lactentes e pré-escolares. Ainda não se
nascimento, múltiplos irmãos, fumaça de cigarro, sabe por que alguns lactentes desenvolvem
tempo curto de aleitamento materno, poluição intra bronquiolite quando entram em contato com o VSR.
e extradomiciliar, creches, aglomerações e internação
em UTIP. Os fatores de gravidade para a doença O VSR replica-se rapidamente na mucosa dos
são os lactentes com displasia bronco pulmonar, bronquíolos, causando necrose das células epiteliais,
cardiopatias congênitas, fibrose cística, imunode- infiltração peribronquiolar de células, edema de
ficientes e prematuros. submucosa, aumento na produção de muco e
alterações no “clearance” muco-ciliar. Estes eventos
levam à obstrução da luz dos bronquíolos, áreas
ETIOLOGIA: de colapso e hiperinsuflação. A obstrução aumenta
a resistência respiratória, o trabalho da respiração e
O Vírus sincicial respiratório, um RNA vírus, foi
consumo de oxigênio. As alterações na relação
descrito pela primeira vez em 1956 na coriza de
ventilação/ perfusão, levam à insuficiência respiratória
macacos chimpanzés e em 1957 em humanos.
leve, moderada ou grave. As formas graves podem
Apresenta alta contagiosidade, com período de
levar à exaustão com hipoxemia e retenção de CO2,
incubação de 2 a 7 dias, podendo persistir até
acidose respiratória e metabólica e apnéia.
21 dias nos portadores. Quadros clínicos e
sorológicos de reinfecção podem ser evidenciados Após um mês o epitélio pode voltar ao normal. Em
de 27 a 45% dos lactentes após o primeiro episódio alguns casos e principalmente naqueles secundários
de BVA. ao adenovirus sorotipos 7 e 21, existe dano

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 213


Pneumologia
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permanente nos bronquíolos, obstrução irreversível grave devem receber de 70 a 80% dos valores
das vias aéreas, colapso lobar ou segmentar e diários por via IV. Broncodilatadores: a utilização
hiperinsuflação (Bronquiolite Obliterante). de agentes broncodilatadores na BVA permanece
controversa. Como estas drogas podem causar
hipoxemia, elas devem sempre ser administradas
DIAGNÓSTICO com oxigênio, monitorização clínica e da saturação
de O2. O medicamento Ribavirin está disponível
O diagnóstico da bronquiolite é essencialmente
desde 1985. É um nucleosídeo sintético, utilizado
clínico. Coriza e febre precedem tosse seca e a
na forma de aerossol, que tem atividade
seguir inicia-se dispnéia progressiva. Os sibilos são
bacteriostática contra muitos vírus, incluindo o VSR.
quase sempre audíveis. Dificuldade e recusa para
Apresenta riscos de teratogenicidade e mulheres
alimentar são freqüentes. Apnéia e cianose podem
grávidas devem evitar entrar em contato com o
ser encontradas em 10 a 20% das indivíduos
aerossol. Sua pouca atividade em reduzir a
acometidos. O fígado e o baço freqüentemente
gravidade e a duração da BVA, além de seu preço
podem ser palpados devido a hiperinsuflação dos
elevado, têm desestimulado a sua utilização.
pulmões e rebaixamento do diafragma. Os aumentos
Esteróides: O uso de esteróides na BVA ainda não
das freqüências respiratória (50-100 ipm) e cardíaca
tem suporte científico definido e deve ser reservado
(120-200 bpm) é um achado comum.
para casos onde há dúvida de asma no diagnóstico.
Para o diagnóstico diferencial é importante lembrar Diferentemente da fase aguda, os esteróides têm
das enfermidades obstrutivas das vias aéreas comuns sido preconizados no tratamento da sibilância após
aos lactentes, que incluem a pneumonia por bronquiolite. Embora a fase aguda da BVA
Clamydia trachomatis, síndrome de Loefler, fibrose desaparece no máximo de 10 a 20 dias, muitos
cística e asma. lactentes podem persistir com tosse, sibilância e
dispnéia durante meses ou anos. Sabe-se que terapia
anti-inflamatória com cromolin sódico ou corticóides
COMPLICAÇÕES E SEQÜELAS: inalatórios tem efeito em pacientes asmáticos ou
Muitos investigadores têm mostrado que até 75% com hiperreatividade brônquica induzida por
dos lactentes com bronquiolite moderada e grave bronquiolite. Infelizmente, não há marcadores ideais
apresentam sibilância após o quadro agudo. para se identificar os pacientes que desenvolverão
Hiperreatividade brônquica e/ou alterações na sibilos após bronquiolite ou quais deles seriam
função pulmonar podem estar presentes até dez anos beneficiados por tratamento anti-inflamatório precoce.
depois. De acordo com o estudo de Reijonen et al. as
crianças atópicas se encaixariam nesta situação.
As causas da hiperreatividade permanecem obscuras
Recomenda-se três a quatro meses de tratamento
e são decorrentes de vários fatores, entre eles a
anti-inflamatório com cromolin sódico ou budesonide
inflamação causada pela infecção viral associada
para as crianças atópicas que necessitem de
a níveis elevados de IgE. Atualmente existem muitas
internação no episódio agudo de bronquiolite, sendo
evidências de que o Vírus Sincicial Respiratório (VSR)
que o uso do cromolin sódico, um agente não
estimula o desenvolvimento de células TH2 e
esteroidal, foi quase tão eficaz quanto o do
produção de IL4, que é a interleucina estimuladora
budesonide. Para os pacientes não atópicos ou
da síntese de IgE. Vários autores têm mostrado que
àqueles que não requeiram internação no episódio
após episódios de bronquiolite viral aguda pelo VSR
agudo, recomenda-se tratamento apenas se houver
os níveis de IgE ficam muito aumentados. Estes
recorrência dos sibilos.
lactentes apresentam maior incidência de asma em
seguimentos de longo prazo, quando comparados
aos lactentes que não tiveram BVA.
PREVENÇÃO:
Nenhum tratamento tem mostrado reduzir a
gravidade ou diminuir a duração da bronquiolite. A prevenção ativa com vacinas ainda está em
O oxigênio é o único agente que reduz a desenvolvimento. A profilaxia passiva com
hipoxemia. Quanto à hidratação, raramente o imunoglobulina intravenosa (VSR - IGIV) (Respigam),
lactente com BVA desidrata-se. Aqueles com doença tem mostrado ser eficiente em reduzir de 41 a 63%

214 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Pneumologia
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as hospitalizações de lactentes prematuros e 9) A maior gravidade da doença pode ser vista nos
portadores de doenças pulmonares crônicas. A dose lactentes com displasia bronco pulmonar, cardiopatias
é de 750 mg/kg uma vez ao mês. congênitas, fibrose cística, imunodeficientes e
prematuros.
Recentemente, a Academia Americana de Pediatria
liberou a utilização de anticorpos monoclonais 10) A prevenção ativa com vacinas ainda está em
humanizados e específicos contra o VSR chamados desenvolvimento. A profilaxia passiva com
PALIVIZUMAB. (PALI = Prevention/Palliative; VI = virus; imunoglobulina intravenosa (VSR – IGIV - Respigam),
zu = Humanized; MAB = Monoclonal antibody. Este e com anticorpos monoclonais humanizados e
produto é disponível para aplicação IM na dose de específicos contra o VSR: (PALIVIZUMAB-Synagis)
15 mg/kg, uma vez ao mês. tem sido utilizada.

CONSIDERAÇÕES FINAIS
As 10 características importantes da BVA que todo REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
pediatra necessita saber:
01 - Amantéa SL & Abreu e Silva, F. Bronquiolite Viral Aguda.
1) A BVA afeta cerca de 10% dos lactentes e é a Jornal de Pediatria, 74; Suplemento 1; s37 - s47, 1998.
infecção respiratória baixa mais comum nesta faixa 02 - Reijonen, T et al. Anti-inflamatory therapy reduces wheezing
etária. after bronchiolitis. - Arch. Pediatric Adolesc. Med., 150:
512-517, 1996.
2) O microorganismo mais encontrado em 70-85%
dos casos é o VSR. 03 - Cox, MJ et al. – Seroepidemiological study of RSV in São
Paulo State, Brasil. - J. Med. Virol., 55: 234-239, 1996.
3) O diagnóstico é clínico. Febre e coriza são
04 - Epler, GR. Diseases of the Bronchioles. Raven Press Ltd.
rapidamente seguidas de tosse seca e dispnéia. New York, 1994.
4) A mortalidade chega a 10-20% em imunodefi-
05 - Fischer, GB. Bronquiolite Viral Aguda. Tese de Doutorado.
cientes, prematuros e cardiopatas. Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul. Porto Alegre, 1994
5) Hipoxemia é a conseqüência fisiopatológica mais
importante e os níveis de oxigênio arterial podem ser 06 - Hemming, VG. – The Enigmatic Respiratory Syncytial Virus:
A Global Perspective. New approaches in the prophylaxis
monitorizados por oximetria de pulso. of RSV. Supplement to: Infections in Medicine, 9-14,
6) Nenhum tratamento tem mostrado reduzir a February, 1999.
severidade ou a duração da BVA. O oxigênio é o 07 - Kimpen JL, Schaad UB. Treatment of respiratory syncytial
único agente capaz de reduzir a hipoxemia. virus bronchiolitis: 1995 poll of members of the European
Society for Paediatric Infectious Diseases. Pediatr Infect
7) Todo lactente com insuficiência respiratória aguda Dis J.; 16(5): 479-81, May 1997.
grave deve ser transferido para UTIP 08 - Simoes, EAF. Respiratory Syncitial Virus Infection: A Global
8) Entre os fatores risco para adquirir a doença Perspective. New approaches in the prophylaxis of RSV..
Supplement to: Infections in Medicine, 24 – 30, February,
encontram-se os lactentes, freqüentadores de creches, 1999
com múltiplos irmãos, submetidos a fumaça de
09 - Wang SZ, Forsyth KD. Asthma and respiratory syncytial
cigarro, internados em UTIP e aqueles com tempo virus infection in infancy: is there a link? – Clin. Exp.
curto de aleitamento materno. Allergy, 28 (8): 927 – 935, 1988.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 215


Pneumologia
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216 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Gastroenterologia
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Refluxo Gastroesofágico: Diagnóstico e Tratamento


ROSA HELENA PORTO GUSMÃO

O refluxo gastroesofágico (RGE) é caracterizado pela que apresentam RGE fisiológico daqueles com RGE
passagem involuntária e intermitente do conteúdo patológico. O início e evolução dos sintomas e
gástrico em direção ao esôfago. Na criança, o RGE possível associação entre os mesmos, além da
está freqüentemente associado à presença de avaliação do estado geral e nutricional da criança
regurgitações e/ou vômitos que ocorrem principalmente são dados que contribuem para uma impressão
nos primeiros quatro meses de vida, constituindo-se diagnóstica inicial.
em importante motivo de consultas em pediatria(1,2).
Exames complementares
Para adequada abordagem diagnóstica e terapêutica
da criança com RGE torna-se necessário o Quando a anamnese e o exame físico da criança
conhecimento de alguns conceitos como: RGE sugerem RGE fisiológico, não há necessidade da
fisiológico- é aquele que se manifesta apenas por solicitação de exames complementares, sendo
regurgitações e/ou vômitos, que ocorrem geralmente importante a avaliação clínica periódica do paciente
no período pós-prandial, tornam-se menos freqüentes para que se confirme esta hipótese inicial. Os exames
à medida que a criança assume uma postura mais complementares serão solicitados nos casos de RGE
ereta e inicia a alimentação mais sólida e, em geral, patológico e RGE oculto (4).
desaparecem por volta dos 9-24 meses de idade;
Estudo Radiológico Contrastado do Esôfago,
RGE patológico ou doença do refluxo gastroesofágico
Estômago e Duodeno.
(DRGE), quando, além das regurgitações e/ou vômitos,
o RGE provoca outras manifestações clínicas, sendo Este exame possibilita a avaliação dos aspectos
as mais freqüentes o baixo ganho pôndero-estatural, anatômicos e funcionais do trato digestivo alto, como
sintomas de esofagite de refluxo e/ou dismotilidade obstruções, hérnia hiatal, alterações da deglutição e
esofágica (pirose, disfagia, anemia, choro e da motilidade esôfago-gástrica. Tem como
irritabilitadade), quadro respiratório de repetição (asma, desvantagem o curto período de observação do
pneumonia, otite); RGE oculto, quando tais paciente, o que contribui para uma baixa
manifestações de DRGE ocorrem na ausência de sensibilidade e especificidade (em torno de 60%).
regurgitações e/ou vômitos. O RGE patológico em No entanto, é importante como exame inicial para
geral está associado às alterações funcionais do crianças com DRGE (5).
esôfago e/ou estômago, como redução do tônus do
Cintilografia Gastroesofágica
esfincter esofágico inferior (EEI), episódios de
Aproximadamente 50% das crianças com DRGE
relaxamentos transitórios do EEI e aumento do tempo
apresentam retardo do esvaziamento gástrico e este
de esvaziamento gástrico (3).
exame é considerado um bom médoto para avaliar
este aspecto funcional do estômago. A cintilografia
DIAGNÓSTICO também está indicada para crianças com problemas
respiratórios, quando há suspeita de que estes sejam
Anamnese e exame físico decorrentes do RGE. Ao alimento habitual da criança
A história clínica é de fundamental importância para é adicionado o radioisótopo, sendo este “rastreado”
o início da abordagem médica da criança com no abdome e tórax. Com sensibilidade e especifici-
RGE. Objetiva-se deste modo diferenciar os pacientes dade semelhantes ao exame anterior, a cintilografia

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 217


Gastroenterologia
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requer, no entanto, quantidade menor de irradiação. gástrica e conseqüentemente da ocorrência do refluxo.


A necessidade de imobilização da criança e o tempo Embora nem sempre seja observada uma correlação
de observação limitado ao período pós-prandial são entre espessamento da dieta e redução do RGE
as desvantagens deste exame(6). medido através da pHmetria, esta prática tem sido
amplamente recomendada por estar associada à
Esofagogastroduodenoscopia redução das regurgitações e/ou vômitos, das crises
Este exame é realizado na criança sob sedação e, de choro e ao aumento do período de sono da
em geral, em ambiente hospitalar. A endoscopia criança. O espessamento da dieta pode ser obtido
associada à biópsia e ao exame histopatológico do através da adição de cereais como o arroz à
esôfago tem como principal indicação o diagnóstico alimentação habitual ou através do uso de fórmula
da esofagite de refluxo, além dos casos de RGE industrializada, específica para crianças que
oculto, controle do tratamento clínico ou cirúrgico de apresentam RGE. As principais vantagens da fórmula
esofagite graves, incluindo-se o esôfago de Barrett, espessada industrialmente estão relacionadas a sua
condição pré-maligna onde há substituição do epitélio adequada viscosidade (importante medida anti-refluxo)
escamoso estratificado do esôfago por epitélio e equilíbrio nutricional. As crianças em aleitamento
colunar(7,8). natural devem continuar recebendo o leite materno.
Ressalte-se ainda que o esclarecimento aos pais sobre
Phmetria Intra-Esofágica as diferenças entre RGE fisiológico e patológico
A phmetria, realizada por período de 18-24 horas, favorece a adesão destes às medidas acima
é considerada o melhor exame para o diagnóstico preconizadas (13,14).
do RGE. Detecta principalmente refluxos ácidos (pH
menor que 4). As características dos episódios de TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
refluxo como frequência, duração, “clearence” O tratamento medicamentoso está indicado para as
esofágico entre outros, podem auxiliar no diagnóstico crianças que apresentam RGE patológico.
diferencial entre RGE fisiológico e patológico. Outro
Pró-cinéticos:
objetivo da pHmetria é o de estabelecer uma relação
temporal entre o RGE registrado e alguma Os pró-cinéticos promovem o aumento da motilidade
manifestação clínica observada durante o exame, o do trato digestivo através de dois mecanismos: 1-
que infelizmente nem sempre ocorre(9,10). estimulando a liberação de um agonista como a
acetilcolina e 2- inibindo o efeito de um inibidor da
musculatura lisa como a dopamina. Estão incluídas
neste grupo a cisaprida, domperidona, metoclopra-
TRATAMENTO
mida. A cisaprida, freqüentemente usada na DRGE
O tratamento das crianças que apresentam RGE da criança, age estimulando a liberação de
fisiológico consiste na adoção de medidas gerais de acetilcolina nos plexos mioentéricos, levando a um
como evitar situações que proporcionam o aumento aumento da atividade propulsora do esôfago e
da pressão intra-abdominal (refeições volumosas, estômago, aumento do tônus do EEI e da velocidade
movimentos bruscos durante a troca de fraldas, uso do esvaziamento gástrico. A dose recomendada é
de roupas que comprimam o abdome) tratamento de 0,2 a 0,3 mg/kg/dose em 3-4 tomadas diárias.
postural e dietético. Tais medidas devem ser também Os efeitos colaterais mais freqüentes são: diarréia,
prescritas para as crianças com RGE patológico. constipação e dor abdominal. Em crianças em
tratamento simultâneo com cetoconazol ou
TRATAMENTO POSTURAL macrolídeos podem ocorrer arritimias cardíacas
O decúbito elevado em um ângulo de 20-45 graus graves. A domperidona é um antagonista periférico
reduz a ocorrência de refluxos, observados durante da dopamina, a dose recomendada é a mesma da
a pHmetria. Há, no entanto, controvérsias com cisaprida e seus efeitos adversos menos frequentes.
relação às posições supina e prona (11,12). A metoclopramida é um inibidor central e periférico
da dopamina. A dose recomendada é 0,1 a 0,15
TRATAMENTO DIETÉTICO mg/kg/dose, em quatro tomadas diárias. Agitação,
O alimento oferecido em volumes menores e com sonolência e sintomas extrapiramidais têm restringido
maior freqüência proporciona redução da distensão a sua utilização em pediatria.

218 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Gastroenterologia
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O tratamento com pró-cinéticos é de, em média, 6- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


8 semanas (15,16).
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Curr Publ Surg, 33: 1-70,1996.
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02 - Vandenplas Y, Belly D et al. Current concepts and issues
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Acta Paediatr, 85: 531-4,1996.
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necessidade de doses elevadas (0,5 a 1,5 mg/kg/ Gastroenterol Clin North Am, 18: 315-37, 1989.
1 e 3 horas após as refeições) e os seus efeitos 04 - Herbst JJ. Gastroesophageal reflux. J Pediatr, 98: 859-70,
colaterais (diarréia/ constipação) têm limitado seu uso. 1981.
05 - Hillemeier AC. Gastroesophageal reflux: diagnostic and
therapeutic approaches. Pediatr Clin North Am, 43: 197-
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A histamina é um dos mediadores da estimulação roentgenography. Am J Dis Child, 141: 917-21, 1987.
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A ranitidina e cimetidina são os bloqueadores H2 Gastroenterol Nutr, 7: 52-6, 1988.
mais freqüentemente utilizados no tratamento da 08 - Dahms B, Rothstein FC. Barrett’s esophagus in children: a
esofagite de refluxo da criança. As doses consequence of chronic gastroesophageal reflux.
Gastroenterology, 86: 318-23, 1984.
preconizadas são: ranitidina, 5-10 mg/kg/dia,
09 - Sondheimer JM. Continuous monitoring of distal esophageal
cimetidina 20-40 mg/kg/dia, em 2 a 3 tomadas, pH: a diagnostic test of gastroesophageal reflux in infants.
6 a 12 semanas. Os efeitos colaterais dessas drogas J Pediatr, 96: 804-7, 1980.
mais freqüentes são diarréia, dor abdominal, cefaléia. 10 - Vandenplas Y, Belli D. et al. A standardized protocol for
A ranitidina provoca menos efeitos adversos se the methodology of esophageal pH monitoring and
interpretation of the data for diagnosis of gastroesophageal
comparada à cimetidina (17, 18). reflux. J Pediatr Gastroenterol Nutr, 14: 467-71, 1992.
11 - Orenstein SR, Whitington PE. Positioning for prevention of
INIBIDORES DA BOMBA DE PRÓTONS infant gastroesophageal reflux. J Pediatr, 103: 534-7,
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Omeprazol e lanzoprazol inibem a bomba de
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drogas estão indicadas nos casos muito graves de for therapy of GER. J Pediatr 110: 181-6, 1987.
esofagite de refluxo, após tentativas de tratamento 14 - Valverde AM, Calvo MTA. Estudio del tratamiento
com bloqueadores H2 da histamina. A dose dietético de las regurgitaciones mediante una leche para
lactantes de consistência modificada. In: Ensayos Clínicos
recomendada tem sido 0,7 a 3,3 mg/kg/ uma vez Nidina AR, Barcelona, Nestlé, 15-9, 1998.
ao dia, durante 8-12 semanas. As reações adversas
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descritas são taquicardia/branquicardia, angina, gastroenterology. Gastroenterol Clin North Am, 18: 437-
cefaléia, sedação, síncope, hipocalemia, 57, 1989.
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prolonged episodes of reflux in infants. J Pediatr
Gastroenterol Nutr, 12: 44-7, 1991.
TRATAMENTO CIRÚRGICO 17 - Ogorek CP, Fisher RS. Detection and treatment of
gastroesophageal reflux disease. Gastroenterol Clin North
A cirurgia anti-refluxo está indicada nas complicações Am, 18: 293-313, 1989.
graves da esofagite de refluxo (estenoses, esôfago
18 - Kahrilas PJ. Gastroesophageal reflux disease. Jama,
de Barrett) e nos casos graves de DRGE, como os 276:983-8, 1996.
que evoluem com crises de apnéia, após tentativas 19 - Kato S, Ebina K et al. Effect of omeprazole in the treatment
sem sucesso no tratamento clínico. A fundoplicatura of refractory acid-related disease in childhood, endoscopic
de Nissen, que consiste no envolvimento da porção healing and twenty-four intragastric acidity. J Pediatr, 128:
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distal do esôfago pelo fundo gástrico, tem sido o
20 - Opie JC, Chaye H et al. Fundoplication and pediatric
procedimento cirúrgico mais freqüentemente esophageal manometry: actuarial analyses over 7 years.
empregado, com eficácia de 60-90% (20). J Pediatr Surg, 22: 935-9, 1987.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 219


Gastroenterologia
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Constipação na Criança
MAURO BATISTA DE MORAIS

Constipação intestinal constitui um problema freqüente que as estimativas de prevalência apresentassem


na população pediátrica. No nosso país, o interesse grande variabilidade, como pode ser observado na
em definir a prevalência deste problema na Tabela 1.(1-7) É interessante que na literatura estrangeira
comunidade surgiu há mais de uma década. Em são poucos os estudos avaliando a prevalência de
geral, os estudos têm sido realizados em escolas ou constipação na criança. No Canadá, observou-se
em unidades públicas de assistência pediátrica, onde que 16% dos pais entrevistados consideraram que
são obtidas as amostras adotadas como seus filhos eram portadores de constipação.(8) Estudo
representantes da comunidade. Ao que tudo indica, realizado na Grécia publicado recentemente(9) mostrou
a heterogeneidade dos critérios para caracterização constipação crônica em 15,4% das 1893 crianças
da presença ou ausência de constipação fez com avaliadas, na faixa etária entre 2 e 12 anos.

Tabela 1. Estimativa da prevalência de constipação na população pediátrica brasileira

Autor/Cidade Local do Estudo/ Faixa Etária Prevalência de Constipação

ZASLAVSKY et al. (1988) Ambulatório


Porto Alegre, RS < 12 anos 36,5%

SANT’ANNA et al., (1995) Escola


Rio de Janeiro, RJ 8 a 10 anos 12,0%

MAFFEI et al., (1997) Escola


Botucatu, SP 6 a 16 anos 28,8% - 38,4%

MOTTA & SILVA (1998) Comunidade


Recife, PE < 11 anos 17,5%

BORGO (1998) Creche


Baúru, SP 6 a 40 meses 8,8% - 17,5%

AGUIRRE (1998) U.B. Saúde


Embu, SP < 2 anos 21,5%

DEL CIAMPO (1999) U.B. Saúde


Ribeirão Preto, SP 1 a 10 anos 26,8%

Apesar da relativa diversidade conceitual observada conceitos normalmente adotados em nosso meio,
nos estudos de prevalência de constipação, onde escape fecal ou “soiling” indica a perda
acreditamos que constipação pode ser definida como involuntária de parcela do conteúdo retal em
a eliminação de fezes endurecidas, com esforço, portadores de constipação crônica, muitas vezes
dor ou dificuldade, associada ou não a aumento no associado à presença de fezes impactadas no reto
intervalo nas evacuações, escape fecal e sangramento e/ou cólon. Por sua vez, encoprese pode ser
em torno das fezes. É importante, também, definir entendida, em analogia com enurese, como sendo
escape fecal (“soiling”) e encoprese. Com freqüência, o completo ato da defecação em sua plena seqüência
na literatura estrangeira, “soiling” e encoprese são fisiológica, porém em local e/ou momento
utilizados como sinônimos, em contraposição aos inapropriado, sendo, em geral, associada a distúrbios

220 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Gastroenterologia
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psicológicos ou psiquiátricos. Rigorosamente, escape intestinal, o ciclo vicioso entre evacuações dolorosas
fecal deve ser caracterizado somente após o quarto com conseqüente comportamento de retenção
ano de vida. Entretanto, em algumas oportunidades fecal(10,11,12,13) e fatores dependentes dos hábitos
observa-se crianças menores com esta manifestação, alimentares, especialmente da dieta pobre em fibra
principalmente quando o controle esfincteriano ocorreu alimentar. (9,14,15)
antes do seu aparecimento. Finalmente, o termo
Na avaliação inicial, deve-se decidir qual a
incontinência fecal fica reservado para a falta de
terapêutica a ser adotada.(10,11,12,13) Casos leves
controle esfincteriano decorrente de causas orgânicas,
identificados pelo interrogatório complementar devem
como as anormalidades anorretais e disfunções
receber, em uma primeira etapa, orientação alimentar
neurológicas.(10,11)
baseada na correção de erros alimentares, aumento
Com relação às manifestações clínicas, na maioria da oferta de líquidos e fibra alimentar. Deve ser
das vezes não é difícil caracterizar o quadro de assegurado livre acesso ao banheiro e condições
constipação, apesar de que as características das para apoiar os pés durante a defecação. É
fezes possam apresentar grande variabilidade, desde importante, também, que a criança permaneça cerca
a ocorrência de evacuações diárias de fezes de 10 minutos no vaso sanitário após uma refeição,
endurecidas em cíbalos até a eliminação de fezes na tentativa de aproveitar o reflexo gastro-cólico como
volumosas e endurecidas, a cada 5 ou 7 dias, que estímulo para a evacuação. Os pais e o paciente
além de poder ferir a criança, podem entupir o vaso devem ser informados da importância de cada um
sanitário. Deve ser ressaltado que as manifestações destes procedimentos, dando ênfase à dismistificação
clínicas variam com a idade. Nos lactentes é comum de conceitos falsos relativos à constipação e ao seu
se observar a eliminação, com esforço, de fezes tratamento.
ressecadas em cíbalos. Nesta fase da vida é
importante diferenciar, na vigência do aleitamento A catarse inicial deve ser indicada em todos os
natural, a constipação da pseudoconstipação. A pacientes que apresentam fezes impactadas. Tem o
pseudoconstipação se caracteriza pela eliminação objetivo de eliminar as fezes ressecadas retidas no
de fezes amolecidas e amorfas, normalmente sem reto e colo e permitir que as outras medidas
dor ou dificuldade, em intervalos prolongados que terapêuticas possam agir de maneira adequada. Em
podem ultrapassar 5 dias. Nos pré-escolares é comum nosso ambulatório, são utilizados enemas osmóticos
o comportamento de retenção. Na anamnese é de fosfato ou sorbitol, realizados uma vez ao dia. É
freqüente a caracterização de medo e de atitudes recomendável que os enemas sejam realizados no
para evitar a evacuação. Aversão ao vaso sanitário ambulatório, especialmente o enema de fosfato, com
e tentativas de evacuações em locais não habituais atenção redobrada caso não ocorra completa
são relatados com freqüência. A partir dos 4 ou 5 eliminação do volume administrado. O esvaziamento
anos, aumenta a freqüência do escape fecal como reto-colônico geralmente é conseguido após 2 a 4
motivo de procura por assistência médica, quando é dias, entretanto, casos mais graves podem requerer
possível constatar longo histórico pregresso de período mais prolongado. Os enemas esvaziatórios
constipação.(10,11,12,13,14) É importante enfatizar que devem ser suspensos quando o paciente começa a
em aproximadamente 10% dos pacientes atendidos eliminar fezes amolecidas, uma ou duas vezes ao
em ambulatório de Gastroenterologia Pediátrica, o dia, prosseguindo-se, então, com o tratamento de
diagnóstico de constipação foi estabelecido a partir manutenção.
de complicações da constipação, como alterações
O tratamento de manutenção inclui todas as medidas
urinárias e escape fecal, em crianças com evacuações
recomendadas para os casos leves e o correto
diárias consideradas normais. Trata-se da constipação
emprego de laxantes. Em nossa prática, costumamos
oculta(14).
utilizar como primeira escolha o óleo mineral e o leite
A fisiopatogenia da constipação crônica funcional de magnésia. O óleo mineral não deve ser utilizado
não está plenamente esclarecida, mas, ao que tudo no primeiro ano de vida e em crianças com problemas
indica, múltiplos fatores influenciam no neurológicos pelo risco de aspiração que ocasiona
desenvolvimento deste processo, entre os quais quadro de pneumopatia extremamente grave. A dose
características constitucionais e hereditárias associadas varia de acordo com a gravidade e a resposta de
ou responsáveis por provável distúrbio da motilidade cada paciente. Portanto, o paciente deve ser

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 221


Gastroenterologia
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reavaliado em consultas realizadas a curto prazo. 03 - MAFFEI, H. V. L.; MOREIRA, F. L.; OLIVEIRA Jr., W. M.;
SANINI, V. - Prevalência de constipação intestinal em
Como referência, pode-se utilizar 1 a 2 ml/Kg de escolares do ciclo básico. J. pediatr. (Rio J), 73:340-4,
peso de óleo mineral ou leite de magnésia na dose 1997.
diária inicial, subdividida em duas ou três tomadas. 04 - MOTTA, M.E.F.A. & SILVA, G.A.P. - Constipação intestinal
crônica funcional na infância: diagnóstico e prevalência
A dieta é a medida mais importante para assegurar em uma comunidade de baixa renda. J. pediatr. (Rio J.),
o controle da constipação a longo prazo. Deve-se 74:451-4, 1998.
ter em mente as dificuldades para promover mudanças 05 - BORGO, H. C. - Hábito intestinal de lactentes de quatro
nos hábitos dietéticos do paciente e, às vezes, em creches de Bauru-SP: avaliação retrospectiva e prospectiva
por 1 a 4 semanas. Botucatu, 1998. (Tese – Mestrado
sua família, no sentido de aumentar a quantidade – Faculdade de Medicina de Botucatu, Universidade
de fibras na alimentação. Dependendo da idade do Estadual Paulista)
paciente, os seguintes alimentos devem ser incluídos 06 - AGUIRRE, A.N.C. – Constipação intestinal, consumo de
ou aumentados na alimentação: feijão, ervilha, fibra alimentar e hábitos alimentares em crianças menores
de 2 anos. São Paulo, 1998. (Tese – Mestrado –
lentilha, grão de bico, pipoca, verduras, frutas, aveia Universidade Federal de São Paulo – Escola Paulista de
em flocos e ameixa preta. O farelo de trigo e outros Medicina)
produtos industrializados ricos em fibras podem ser 07 - DEL CIAMPO, I. R. L. - Constipação intestinal crônica na
utilizados; entretanto, nem sempre são aceitos com infância: prevalência, diagnóstico e valorização dos seus
sinais e sintomas em unidade básica de saúde. Ribeirão
facilidade. É necessário, também, levar em Preto – SP, 1999 (Tese – Mestrado – Faculdade de
consideração o custo destes produtos. Medicina Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo)

A indicação de exames subsidiários depende, 08 - ISSENMAN, R. M.; HEWSON, S.; PIRHONEN, D.;
TAYLOR, W.; TIROSH, A. - Are chronic complaints the
fundamentalmente, da gravidade do caso e da má result of abnormal dietary patterns? Am. J. Dis. Child.,
evolução clínica quando o tratamento é realizado 141:679-82, 1987.
de forma correta. Nesta situação, deve ser ressaltada 09 - ROMA, E.; ADAMIDIS, D.; NIKOLARA, R.;
a necessidade de descartar a possibilidade da CONSTANTOPOULOS, A.; MESSARITAKIS, J. - Diet and
chronic constipation in children: the role of fiber. J. Pediatr.
doença de Hirschsprung, especialmente, a Gastroenterol. Nutr., 28:169-74, 1999.
aganglionose com segmento curto ou ultra-curto.
10 - MORAIS, M. B. & FAGUNDES-NETO, U. - Constipação
Levando em conta que normalmente nos ambulatórios em Pediatria. Pediatr. Mod., 31:1030-42, 1995.
gerais o único exame disponível é o enema opaco,
11 - MORAIS, M.B. – Constipação intestinal em pediatria.
pode ser considerado recomendável que, nestas Programa Nacional de Educação Continuada em Pediatria
circunstâncias, os pacientes com constipação de difícil – PRONAP. Número Extra I. Sociedade Brasileira de
Pediatria, 1998. p. 30-53.
controle sejam avaliados em um ser viço
especializado. 12 - LOENING-BAUCKE, V. Chronic constipation in children.
Gastoenterology, 105: 1557-64, 1993.

13 - LOENING-BAUCKE, V. - Encopresis and soiling. Pediatr.


Clin. North Am., 43: 279-98, 1996.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
14 - MAFFEI, H. V. L.; MOREIRA, F. L.; KISSIMOTO, M.;
01 - ZASLAVSKY, C.; ÁVILA, E. L.; ARAÚJO, M. A.; PONTES, CHAVES, S. M. F.; EL FARO, S.; ALEIXO, A. M. - História
M. R. N.; LIMA, N. E. - Constipação Intestinal da Infância. clínica e alimentar de crianças atendidas em ambulatório
Um Estudo de Prevalência. Rev AMRIGS, 32:100-2, 1988. de gastroenterologia pediátrica com constipação intestinal
crônica funcional e suas possíveis complicações. J. pediatr.
02 - SANT’ANNA, A. M. G. A.; OLIVEIRA, N. A.; GRACIA, (Rio J), 70: 280-6, 1994.
J.; GUERRA, S. R. N. P.; BARBOSA, S. S.; BONFIM, M.
C. P. O.; CALÇADO, A. C. - Constipação intestinal 15 - MORAIS, MB.; VÍTOLO, MR; AGUIRRE, ANC;
funcional na infância, um estudo de prevalência. In: FAGUNDES-NETO, U. Measurement of Low Dietary Fiber
CONGRESSO BRASILEIRO DE GASTROENTEROLOGIA Intake as a Risk Factor for Chronic Constipation in Children.
PEDIÁTRICA, 8, Londrina, 1995. Anais. Londrina, 1995. J Pediat Gastroenterol Nutr (Em vias de publicação).

222 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Gastroenterologia
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Avanços no Tratamento e Prevenção da Diarréia Aguda


ARISTIDES SCHIER DA CRUZ

CONCEITO E EPIDEMIOLOGIA agentes enteropatogênicos. Na tabela 1 estão listados


os principais enteropatógenos bacterianos, virais e
Também denominada gastroenterocolite aguda, a
protozoários.
diarréia aguda é um processo sindrômico de etiologia
infecciosa, que cursa com diarréia e perda A principal complicação imediata da diarréia
hidroeletrolítica de intensidade variável, e tem aguda é a desidratação e outros distúrbios
evolução potencialmente autolimitada, não metabólicos associados, sendo o choque
ultrapassando 14 dias. Aproximadamente 10% das hipovolêmico a manifestação mais temida e letal.
diarréias agudas ultrapassam 14 dias e passam a Outra complicação intimamente relacionada à
se chamar diarréia persistente. diarréia aguda é a desnutrição. Ela ocorre devido
É uma das enfermidades de maiores taxas de a 3 mecanismos: a) anorexia e desvios metabó-
morbimortalidade em todo o mundo. Seu impacto é licos próprios dos quadros infecciosos; b)
muito mais grave nos países pobres e emergentes, comprometimento das funções digestivo-absortivas
ou em comunidades rurais e urbanas carentes. É devido à infeção intestinal; c) prática popular e
responsável por grande número de atendimentos em orientação médica impróprias, no sentido de
ser viços de emergência pediátrica e de promover jejum prolongado ou administração de
hospitalizações em enfermarias de pediatria. Estima- dietas restritivas, pobres em gorduras ou
se que morrem por ano em torno de 3,5 milhões de carboidratos. A perda de peso em cada episódio
crianças abaixo de 5 anos de idade nos países do de diarréia aguda varia de 100g a mais de 1Kg.
Terceiro Mundo, vítimas de diarréia aguda. Se o lactente ou pré-escolar é acometido por
episódios recorrentes de diarréia aguda, o que é
bastante comum ocorrer em comunidades carentes,
ETIOLOGIA E FISIOPATOGENIA estes mecanismos se somam por longos períodos e
Os microorganismos causadores de infecção do trato a desnutrição se instala de modo mais grave,
digestivo e diarréia aguda são conhecidos como aumentando o risco de vida.

Tabela 1. Agentes Enteropatogênicos

BACTÉRIAS: Vibrio cholerae


Escherichia coli enteropatogênica
Escherichia coli enteroagregativa
Escherichia coli enteroaderente
Escherichia coli enterotoxigênica
Escherichia coli enteroinvasora
Escherichia coli enterohemorrágica
Salmonella sp.
Shigella sp.
Campylobacter sp.
Yersinia enterocolitica
Clostridium difficile

VÍRUS: Rotavirus
Adenovirus
PROTOZOÁRIOS: Giardia lamblia
Entamoeba histolytica
Cryptosporidium

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 223


Gastroenterologia
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TRATAMENTO quadro e, quando se prolongam por muitos dias,


agravam o estado nutricional do paciente.
São semelhantes os protocolos de orientação
Foi surpreendente a constatação de que nos Estado
terapêutica na diarréia aguda em crianças, sejam os
Unidos, em 1992, aproximadamente 50% dos
da Organização Mundial da Saúde (OMS) e UNICEF,
pediatras estavam orientando o consumo de líquidos
Academia Americana de Pediatria, Sociedade
inadequados para a TRO, jejum prolongado e dieta
Européia de Gastroenterologia e Nutrição Pediátrica
restritiva para crianças com diarréia aguda. A terapia
ou Sociedade Brasileira de Pediatria. A orientação
de reidratação endovenosa é indicada com
sempre deve estar voltada para a prevenção e
freqüência muito maior que o necessário. Na Europa
tratamento das duas principais complicações da
também foram constatadas as mesmas práticas
diarréia aguda: a desidratação e a desnutrição.
inadequadas por grande contingente de pediatras,
Portanto, a hidratação oral e a alimentação da criança
até o ano de 1997. Diversos outros estudos em
são as preocupações básicas no tratamento.
países pobres e desenvolvidos têm demonstrado
As campanhas foram intensivas no Brasil a partir de doença mais prolongada e maior prejuízo nutricional
1980 e a população aprendeu o que deve ser feito em crianças submetidas a jejum prolongado e dietas
de imediato diante de uma criança com diarréia. A restritivas, em comparação com aquelas tratadas de
oferta de líquidos por via oral, para prevenir ou acordo com os protocolos recomendados.
tratar a desidaratação, é a primeira medida que os
A diarréia aguda é potencialmente autolimitada, sendo
familiares adotam nos últimos 15 anos. Os líquidos
este conceito muito importante, já que deixa claro
utilizados são de vários tipos. A solução de
que medicamentos são desnecessários. As drogas
reidratação oral (SRO) com 90 mmol/L de sódio,
antidiarréicas (inibidoras da motilidade, anti-secretoras,
introduzida na década de 1970 e recomendada
adsorventes), os probióticos (reconstituidores da flora
pela OMS, tem salvo nos últimos 15 anos cerca de
intestinal) e os antimicrobianos empíricos, são drogas
1,5 milhão de vidas por ano, em crianças com
que aumentam inutilmente o custo do tratamento, são
menos de 5 anos. Por este motivo, a terapia de
ineficazes e, muitas vezes, potencialmente perigosas,
reidratação oral (TRO) foi considerada um dos maiores
não devendo ser prescritas. A auto-medicação por
avanços médicos do século 20. Acredita-se que, se
parte da população deve ser combatida. O grande
fosse melhor indicada e aplicada, a TRO poderia
perigo com o uso de medicamentos na diarréia aguda
salvar mais 1,5 milhão de vidas por ano. Nos casos
é o fato de que desviam a atenção para um recurso
refratários à TRO, ou de choque hipovolêmico e
ineficaz e induzem a família a negligenciar as duas
outras complicações, a terapia de reidratação
principais atitudes na diarréia aguda: reparação das
endovenosa é colocada em prática, o que se mostra
perdas hidro-eletrolíticas com o soro oral e alimentação
necessário em apenas 10% dos casos de diarréia
da criança. É claro que antimicrobianos devem ser
aguda com desidratação.
indicados em infecções específicas por alguns
Diversos estudos realizados nos últimos 10 anos, enteropatógenos, tais como cólera, Shigella ,
demonstraram que a oferta de alimentação Campylobacter, Clostridium, ameba e Giárdia.
equilibrada e própria para a idade, em lactentes e
crianças com diarréia aguda, permite menor perda AVANÇOS NO TRATAMENTO
de peso e recuperação mais rápida. Sendo assim, DA DIARRÉIA AGUDA
mostrou-se desvantajosa a orientação de jejum
Após esta breve revisão do tratamento tradicional da
prolongado e consumo restrito de alimentos
diarréia aguda, alguns avanços recentes, ainda não
hipoenergéticos, tais como torradas, chá, maçã,
implantados nos protocolos, podem ser descritos. Entre
arroz, etc. Portanto, não é aconselhável que o
eles estão uma possível modificação na composição
paciente receba a tão popular “dieta para diarréia”,
da solução de reidratação oral (SRO) e o surgimento
pobre em gorduras e carboidratos. Caso o paciente
de probióticos efetivos.
esteja desidratado, deve permanecer em jejum até
estar reidratado, o que é conseguido em apenas 4 1) COMPOSIÇÃO DA SOLUÇÃO DE
horas. Os vômitos e a anorexia rebelde são fatores REIDRATAÇÃO ORAL:
limitantes para a alimentação. Impedem em alguns A SRO, de acordo com os critérios recomendados
casos a boa assimilação dos alimentos no início do pela OMS, é composta por 90 mmol/L de sódio,

224 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Gastroenterologia
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20 de potássio, 80 de cloro, 30 de citrato e organismo é classificado como probiótico quando


111 mM de glicose. Estas proporções de eletrólitos apresenta a propriedade de, ao ser ingerido,
e glicose compõem uma solução isotônica, no início prevenir ou tratar uma condição patológica
considerada como a ideal, que permitiria no lúmem específica. De todos os organismos estudados, o
intestinal a melhor absorção da água, glicose e que está revelando melhores resultados é o
eletrólitos. Estudos realizados há mais de 10 anos Lactobacillus casei, cepa GG (Lactobacillus GG).
sugeriram que uma solução hipotônica, com menor Os demais não se mostram tão eficazes, tanto em
concentração de sódio, tem a capacidade de crianças quanto em adultos. Estudos randomizados
maximizar a absorção de sódio estimulada por antigos, que avaliavam os probióticos disponíveis
glicose. Estudos realizados em crianças com na época, não encontravam qualquer efeito benéfico
diarréia aguda demonstraram que a concentração destes produtos em diarréia aguda em crianças.
de sódio de 60 mmol/L é mais efetiva do que a Nos últimos 8 anos há pelo menos 6 estudos
solução isotônica recomendada pela OMS. Na realizados com metodologia adequada
Europa esta solução hipotônica já é adotada demonstrando real eficácia do Lactobacillus GG
nos últimos anos. Há inclusive perspectivas de que para crianças com diarréia aguda. Reduz em
uma solução com 45 mmol/L de sódio seja aproximadamente 1 dia a duração média da
mais efetiva em determinadas situações. O Brasil diarréia e diminui o volume hidroeletrolítico perdido,
tem no mercado farmacêutico soluções hipotônicas, em comparação com as crianças tratadas com
mas adota a solução da OMS para distribuição placebo. Este efeito é observado nas diarréias por
nas unidades de saúde e hospitais. Portanto, é rotavírus e nas diarréias bacterianas, mas não nas
possível que a OMS venha a modificar a diarréias sanguinolentas. Um outro estudo
composição do SRO nos próximos anos, randomizado-controlado também demonstrou efeitos
dependendo de estudos que estão em andamento. benéficos com a utilização de Saccharomyces
Ainda falta determinar as concentrações ideais e boulardii em crianças com diarréia aguda.
sua efetividade universal, independente da faixa
Para sua liberação no mercado, deve ser
etária e do tipo de diarréia, por cólera ou por
comprovada cientificamente a sua segurança e
outros enteropatógenos.
incapacidade de promover infecção ou efeitos
Outra tentativa de melhorar a SRO é a substituição adversos. Deve ser comprovada sua viabilidade na
da glicose por carboidrato complexo, em especial embalagem, permanecendo ativo por longo período
o amido. Foram testados o arroz, tapioca, goma de estocagem, em concentrações extremamente
arábica, carboximetilcelulose, glicerol, aminoácidos, elevadas (109 a 1011 UFC/ml). É muito difícil que
e o principal efeito benéfico foi o incremento notável estas características sejam conseguidas sem custos
na absorção de água, em comparação com o uso elevados por parte da indústria. A fiscalização da
da SRO com glicose. Pode haver inclusive algum vigilância sanitária teria que ser rigorosa, pois este
impacto na recuperação da mucosa intestinal lesada. produto pode facilmente perder a viabilidade. Sendo
Especula-se que este benefício ocorre devido à assim, é pouco provável que venham a ser
menor osmolaridade da solução, à maior empregados rotineiramente no tratamento da diarréia
fermentação no cólon, ou outros motivos. No aguda em crianças. Os custos seriam muito altos
entanto, esta modificação na SRO poderia aumentar para uma enfermidade que atinge principalmente
muito o seu custo, e isto só seria justificado se os as populações mais pobres, e os benefícios não
benefícios clínicos conseguidos justificassem este seriam proporcionais ao grande investimento. Além
investimento. Seja como for, a SRO ideal a ser disto, podem desviar a atenção dos pais, os quais
recomendada pela OMS no futuro, deverá ser a negligenciariam a hidratação oral e alimentação.
que tiver melhor poder de reidratação, menores No entanto, há a perspectiva de que venham a ser
custos, melhor palatabilidade e disponibilidade local indicados em situações especiais, como no
dos seus ingredientes. tratamento da diarréia aguda em crianças com AIDS
ou outras imunodeficiências, na diarréia induzida
2) PROBIÓTICOS: por antibióticos e colite pseudomembranosa, além
Diversos microorganismos vêm sendo investigados de inúmeras outras situações clínicas não
em sua ação como agentes probióticos. Um relacionadas à diarréia aguda.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 225


Gastroenterologia
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AVANÇOS NA PREVENÇÃO DA nas regiões onde a mortalidade infantil é muito alta


DIARRÉIA AGUDA e muito prevalente a desnutrição e deficiência de
vitamina A. O Ministério da Saúde no Brasil já adota
Nos últimos 15 anos, três importantes acontecimentos esta prática em algumas regiões do país. Como a
no Brasil foram responsáveis pela notável queda nas maior parte da população brasileira não se encaixa
hospitalizações e mortalidade por diarréia aguda, nestes critérios de risco, os lactentes não recebem
sendo inclusive os principais motivos para a queda estas mega-doses de vitamina A. É prudente, portanto,
do coeficiente de mortalidade infantil pós-neonatal: que os profissionais de saúde cuidem de orientar
a) o combate ao desmame precoce; b) a divulgação individualmente a oferta por via oral de gotas diárias
e aplicação da TRO; c) a extensão do saneamento desta vitamina, principalmente para lactentes de
básico. condições de vida mais precárias.
Neste mesmo período, muitos estudos realizados em O enteropatógeno que mais causa diarréia aguda
países do Terceiro Mundo demonstraram que em em todo o mundo é o rotavírus, tanto em clima
comunidades com mortalidade infantil superior a 60 tropical quanto temperado. Estima-se que é
a 80/1.000, a prevalência populacional de responsável por 800 mil a 1 milhão de mortes por
desnutrição e deficiência subclínica de vitamina A é ano em crianças com menos de 5 anos. As vacinas
muito elevada na infância. Foram administradas mega- desenvolvidas para prevenir infecção intestinal pelos
doses de vitamina A por via oral, nas unidades de vários grupos e sorotipos de rotavírus revelaram-se
saúde, por ocasião da vacina dos 6 meses e outra efetivas, capazes de diminuir a incidência geral e,
vez perto de 1 ano. Em comparação com as crianças principalmente, as formas graves da doença, aquelas
que não receberam a vitamina A, houve queda de que evoluem para desidratação grave e morte em
15 a 25% na mor talidade infantil global, lactentes. Portanto, a imunização universal de lactentes
principalmente por doenças diarreicas e sarampo. contra o rotavírus é aguardada como uma estratégia
O motivo disto é que a deficiência de vitamina A efetiva para reduzir a diarréia aguda grave, devendo
determina maior dificuldade na recuperação dos inclusive ter impacto mundial sobre a mortalidade
epitélios lesados. Com isto, aumenta a probabilidade infantil. Alguns países desenvolvidos já introduziram
de a diarréia aguda levar a maiores perdas, evoluir esta vacina no calendário de vacinação. Nos Estados
para diarréia persistente, agravar o estado nutricional Unidos, após alguns meses, foi interrompida sua
e colocar em risco a vida da criança. A OMS aplicação, por suspeita de reação vacinal adversa.
recomendou que todos os países promovam programa No Brasil, está em vias de ser testada na Região
de administração de mega-doses de vitamina A por Norte, com perspectivas de ser liberada após
via oral, embutido no calendário vacinal obrigatório, comprovação de sua eficácia.

226 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
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Desnutrição
FERNANDO JOSÉ DE NÓBREGA

A desnutrição pode resultar da interação de vários fatores, como indica a figura 1.

Figura 1

Como nosso tempo é escasso, vamos nos ater Tal situação tem origem nos primeiros trabalhos realiza-
a um ponto que achamos muito importante e dos em São Paulo e na Bahia que mostraram de forma
ainda não foi muito divulgado: o Fraco Vínculo Mãe/ muito semelhante que as mães de desnutridos, em sua
Filho. grande maioria, não são desnutridas (figuras 2,3,4 e 5).

Figura 2 Figura 3

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 227


Nutrição
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Figura 4 Figura 5

Por outro lado, quanto maior o número de irmãos 6), mas, dado importante, a mãe quanto maior número
mais chance a criança tem de ser desnutrida (figura de filhos, mais condição tem de ser obesa (figura 7).

Figura 6 Figura 7

Concluímos que cerca de 80 a 85% das mães de Procuramos explicar essa situação segundo os
desnutridos não são desnutridas, significando que o aspectos psicológicos e concluímos que
alimento chega a sua casa. Fraco Vínculo Mãe/Filho representa importante
Outros trabalhos foram realizados em Niterói e Vitória papel na gênese da desnutrição (figuras 8, 9
com resultados semelhantes. e 10).

Figura 8 Figura 9

228 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
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Figura 10

Para a constituição de um bom Vínculo Mãe/Filho é necessário“ a atuação de muitos fatores, como mostra
a figura 11.

Figura 11

Nas figuras 12, 13, 14, 15, 16 e 17, mostramos as situações que podem afetar a ligação da mãe com
o filho.

Figura 12 Figura 13

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 229


Nutrição
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Figura 14 Figura 15

Figura 16 Figura 17

Assim, temos procurado atuar nesta linha, isto é, no tratamento, recuperação e prevenção da desnutrição
fortalecimento do Vínculo Mãe/Filho, visando o como aparece nas figuras 18 a 26.

Figura 18 Figura 19

230 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Figura 20 Figura 21

Figura 22 Figura 23

Figura 24 Figura 25

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 231


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Figura 26

Na nossa experiência, as mães que aceitam violência, usuários de drogas que não permitem a
participar do trabalho desta forma vêem seus filhos recuperação nutricional, o que não passa pela área
recuperados. Acreditamos que, em São Paulo, cerca da saúde.
de 80% dos desnutridos podem ser recuperados É Entretanto, poderíamos fazer muito atuando com
claro que há condições de extrema pobreza, crianças recuperáveis que, afinal, são muitas.

Obesidade na Infância
RENATO JUNGER DE OLIVEIRA

Obesidade define-se como o excesso de gordura necessidade de se ter uma avaliação da gordura
corporal total em relação com o peso corporal. Para corporal específica. Para isto utiliza-se a medida da
diagnosticar obesidade, os critérios utilizados ainda prega cutânea a nível tricipital, bicipital, subescapular,
não são ideais, a começar pelo índice de massa suprailiaco e ou de panturrilhas. Sendo a mais
corporal ( IMC=P(kg)/A2 (m) ). Quando o IMC utilizada, a prega tricipital sendo superior ao percentil
encontra-se acima do percentil 90 ou dois desvios 95 ou dois desvios acima da média considera-se
acima da média para idade, a criança é considerada obesidade, embora na prática utilizemos a
obesa. Outros consideram obesidade na infância observação clínica e a relação peso/estatura.
quando o IMC é igual ou superior a 120%, sendo Métodos sofisticados como densiometria,
o IMC de 100% uma criança de peso e altura ultrasonografia, bioimpedância, tomografia axial
média, 110% de IMC como sobrepeso e IMC de computadorizada, condutividade elétrica corporal total
140% superobesidade. (TOBEC) e a absorciometria de fótons(DEXA) são
utilizados em pesquisa.
Deve-se salientar que massa muscular e estrutura óssea
fazem parte do peso corporal, e uma criança com A obesidade pelo Third National Health and Nutrition
uma massa muscular desenvolvida, poderá ter um Examination Survey (NHANES III) acomete de 20 a
IMC elevado. Na situação colocada, observa-se a 27% de todas as crianças e adolescentes, e 33%

232 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

dos adultos. Esse mesmo estudo mostrou um aumento momento, as fobias, angústias, sofrimentos e
da prevalência da obesidade em crianças de 6 a apelações por que passam a criança e o adolescente
11 anos em 54%, e de superobesidade em 98%, obesos. Não será com críticas negativas que se
no período de 1976 a 1987. conseguirá atingir o objetivo desejado, ou seja, a
perda e posterior manutenção de peso.
As implicações da obesidade na infância sobre a
saúde são: transtornos psicossociais, ortopédicos, Não utilizamos fármacos na terapêutica da obesidade
dermatológicos, cardiorrespiratórios, risco de na infância e adolescência, bem como procedimentos
obesidade no adulto (40% das crianças obesas serão cirúrgicos, os quais tem sido utilizados em casos de
adolescentes obesos e 80% dos adolescentes obesos superobesidade grave.
permanecem obesos na idade adulta). Além destes
transtornos, estão sendo relatadas a elevação da
incidência de Diabetes Mellitus tipo II em crianças
obesas, em níveis preocupantes. Referências:
A abordagem terapêutica da obesidade na infância 01 - Coutinho W. Consenso Latino-Americano de Obesidade.
e na adolescência visa o crescimento e desenvol- Arq Bras Endoc Met 1999 Fev, 43:1, 21-67

vimento normais, com conseqüente bem-estar social. 02 - Cook VV; Hurley JS. Prevention of type 2 diabetes in
childhood. Clin Peduatr(Phla), 1998 Febm 37:2, 123-9
Para tal, trabalhamos sobre o binômio - ingesta
03 - Neufekd ND, Raffek LJ, London C, Chen YD, Vadheim
calórica x gasto energético. CM. Earky presentation of type 2 diabetes in Mexican-
American youth. Diab Care, 1998 Jan, 21:1, 80-6
Para aumentar o gasto energético tem de se estimular
a atividade física através de esportes, que devem 04 - Ogden CL; Troiano RP, Brufek RR, Kucznarski RJ; Flegal
Km; Johnson CL. Pediatrics, 1997 apr, 99:4 E1
ser adequados à cada faixa etária, à aptidão e às
05 - Schonfeld-Warden N, Warden CH. Obesidade pediatrica.
possibilidades da criança. Clinic Pediat Am Nort 1997-2:343-66
Quanto à ingesta calórica, faz-se necessário 06 - Seidel JC. Obesity: a growing problem. Acta Paed Suppl,
1999 Feb, 88:428, 46-50
procedermos uma reeducação alimentar/nutricional.
Para tanto, necessitaremos de apoio dos familiares e 07 - Story M; Evans M; Fabsitz RR; Clay TE; Holy Rock B;
Broussard B. The epidemic of obesity in American Indian
muitas vezes de um acompanhamento psicológico. communites and... . Am J Clin Nutr, 1999 Apr, 69:4
Trata-se de um trabalho contínuo e permanente, onde Supl, 747S-754S
o relacionamento da criança com o médico, o 08 - Takahashi E; Yoshida K; Sugimori H; Miyakawa M;
Izuno T; Yamagami T; Kagamimori S. Influence factors on
nutricionista, o psicólogo e o professor de educação the development of obesity in 3-year-old children... . Prev
física tem que ser bom. É preciso entender, em cada Med, 1999 Mar, 28:3, 293-6

Suplementação Com Ferro e Vitamina A


SUZANA DE SOUZA QUEIROZ

A hipovitaminose A (HV-A) e a anemia carencial de 05 anos, com risco de deficiência desta vitamina,
ferropriva (ACF) são, até hoje, consideradas grandes podendo resultar entre 250.000 a 500.000 novos
problema de Saúde Pública no mundo, principalmente casos de cegueira irreversível, a cada ano. Já a
nos países em desenvolvimento. Quanto a vitamina deficiência de ferro, foi constatada em cerca de 1,5
A, a OMS estima 05 a 10 milhões de crianças, a 2 bilhões de pessoas no mundo, principalmente
com manifestações clínicas e com deficiência sub- nos países em desenvolvimento. Entretanto, tanto o
clínica por ano e 124 milhões de crianças menores ferro como a vitamina A podem ser encontrados em

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 233


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

vários alimentos, tanto nos de origem animal (carnes, Não resta nenhuma dúvida que o país que se
ovos, leite e derivados) como em alimentos de origem encontra sob estas circunstâncias arca com um custo
vegetal como verduras de folhas verdes escuras, que social e monetário em função desta situação.
juntamente com as frutas amarelas, são excelentes
As opções para a minimização deste grave problema
fontes de carotenóides (pró-vitamina A).
são muitas e a um custo baixíssimo, evitando-se, desta
As recomendações diárias de vitamina A e de ferro forma, esta situação injustificável. De modo geral, as
para lactentes são muito pequenas. Para vitamina A práticas adotadas por diversos países para o aumento
é da ordem de 370 ER (equivalente retinol) para do consumo de micronutrientes abrangem a
crianças de 6 a 12 meses; 400 a 700 ER para pré suplementação medicamentosa, aumento de alimento
- escolares; de 800 a 1000 ER para adolescentes ricos em vitamina A, e a fortificação de alimentos.
e mais, respectivamente do sexo masculino e feminino;
800 ER para gestantes e de 1200 a 1300 ER para
lactantes. Quanto ao ferro situa-se em torno de 10 2. AÇÕES
mg/ dia, considerando-se que a absorção do sal
de ferro é cerca de 10%, aumentando para 12mg 2.1. Levantamentos Diagnósticos: o diagnóstico da
(masculino) e 15 mg (feminino) já no período de HVA e da ACF podem ser feitos pelas seguintes
adolescência, sendo que esta quantia praticamente avaliações: Indicador do Consumo Alimentar; Sinais
dobra na gestação. Portanto, a oferta diária de Clínicos; Indicadores Bioquímicos e para HVA ainda
alimentos corretos e balanceados poderia suprir as Histológicos e Fisiológicos.
necessidades do organismo. A OMS definiu pontos de corte para caracterizar a
Entretanto, a situação referida no mundo aponta HV-A problema de Saúde Pública (em crianças acima
vários fatores como responsáveis pela gênese da de 01 ano), por meio de exames de retinol sérico,
em: Leve: dados inferiores a 20 µg / dl em mais de
ACF e da HV-A, como: dietas inadequadas;
problemas na absorção, no transporte e no 10% da população; Moderada: quando dados
metabolismo e aumento das necessidades, como inferiores a 20 µg / dl atingirem mais que 10 até
20 % da população; Grave: quando mais que 20%
em períodos de gestação, lactação e primeiros anos
de vida. Além disso, em países em desenvolvimento, da população apresentar estes níveis séricos. A
verifica-se associação de vários outros fatores como situação ideal é que mais de um tipo de avaliação
seja feita para caracterizar a deficiência de vitamina
baixo nível sócio-econômico, baixa distribuição de
renda e escolaridade, infecções repetidas, A em nível de Saúde Pública. A OMS também definiu
desnutrição e abandono precoce do aleitamento uma série de pontos de corte para as lesões oculares
que caracterizam problema de Saúde Pública e que
materno.
podem ou não estar associadas com os níveis baixos
As conseqüências da ACF para o organismo são de retinol sérico.
inúmeras, podendo em suas formas mais graves,
A dosagem de hemoglobina é considerada pela
levar à falência cardíaca e morte. Pela baixa
OMS um bom indicador no diagnóstico de uma
oxigenação dos tecidos há comprometimento no
população e considerou pontos de corte para
crescimento, no desenvolvimento, sendo esperados
caracterizar anemia: 06 meses – 05 anos: hb <11
distúrbios neuropsicológicos, déficits de atenção e
g/dl; 06 meses- 14 anos: hb <12 g/dl; homens:
no índice intelectual. Ao nascimento são esperados
hb < 13 g/dl; mulheres: hb < 12 g/dl; gestantes:
maiores índices de prematuridade, de baixo peso o
hb <11 g/dl.
nascer e de mortalidade fetal. Em adultos
freqüentemente são esperados reduções na 2.2. Conscientização da População e dos
capacidade física e de trabalho. Profissionais de Saúde: os resultados dos
levantamentos diagnósticos devem ser utilizados na
Como uma das principais funções da vitamina A é
conscientização dos profissionais de saúde, em
a sua atuação sobre a imunidade, bem como sobre
relação a magnitude e gravidade da situação, bem
a integridade dos epitélios, a sua deficiência acarreta
como para o encontro de soluções.
maior morbimortalidade infantil, além dos problemas
oculares conhecidos, que podem levar à cegueira 2.3. Medidas Preventivas: na tentativa de se evitar
irreversível. que, por volta dos 4 aos 6 meses de vida, a criança

234 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

já venha a se tornar com deficiência de Vitamina A Introdução do Esquema de Tratamento e/ou Profilaxia
e de ferro, algumas medidas são desejáveis como: com Vitamina A e ferro, caso seja necessário, como
em casos de baixo – peso e prematuridade (ver
2.3.1. Nível Individual
indicações abaixo).
• Pré-Natal: deve ser adequado, de maneira a serem
evitados os nascimentos prematuros ou de baixo peso. • CRIANÇA – Primeiros Anos de Vida
Neste momento são desejáveis práticas que devem Ações Básicas de Saúde: deve continuar periodica-
estar incluídas as seguintes ações: educação mente. A mãe deve ser orientada quanto ao desmame
nutricional com ênfase à ingestão de alimentos ricos (4º – 6º mês de vida), quando a introdução de
em ferro e vitamina A; incentivo ao aleitamento alimentação mais diversificada e rica em alimentos
materno; avaliação da condição nutricional da fontes de vitamina A e ferro deve ser estimulada.
gestante; incentivo ao parto normal; Neste momento
também é de fundamental importância a profilaxia Profilaxia Medicamentosa:
medicamentosa, que tanto pode ser diária (40 mg Ferro: caso a criança seja prematura, de baixo peso
de ferro elementar por meio de sulfato ferroso a ou que esteja em aleitamento artificial, de acordo
partir da comprovação da gestação), como semanal com o seguinte esquema: recém nascidos de termo,
(120 mg de ferro elementar). de peso adequado para a idade gestacional: a
• Parto: este é um momento de fundamental partir do início do desmame, até o 24º mês de
importância e, se bem conduzido, torna-se um bom vida, receberão 1 mg de ferro elementar/ kg de
começo, principalmente quanto ao aleitamento peso/dia, ou dose semanal de 45 mg, exceto nas
materno. Desta forma, o parto normal , o alojamento crianças com fórmulas infantis fortificadas com ferro.
conjunto, a orientação adequada, facilitam o Prematuros e recém–nascidos de baixo peso: a partir
aleitamento materno e tornam a mãe mais segura. do 30º dia de vida: 2 mg/kg de peso/dia, durante
Altas com menos de 24hs, devem ser evitadas. 2 meses. Após este prazo, 1 mg/kg/dia, até o 24º
mês de vida. A ingestão de alimentos fortificados
• Puerpério: Retorno à UBS com no máximo 07 dias
deve ser incentivada, podendo substituir a
após o nascimento, quando devem ser introduzidas
suplementação medicamentosa.
as seguintes práticas:
Vitamina A: caso seja detectado que a dieta da
MÃE: O monitoramento da alimentação da lactante população alvo é deficiente e quando for detectado
é de fundamental importância, não só para a saúde altas prevalências de hipovitaminose A, a OMS/
da lactante, mas também pela do lactente, que recebe IVACG/ UNICEF preconizam o seguinte esquema para
a maior parte de suas necessidades, para a formação a suplementação medicamentosa de Vitamina A
de reservas adequadas de retinol, neste momento da
vida. A Suplementação Medicamentosa com vitamina Todas as Regiões: (Esquema de Tratamento Individual
A é necessária, (caso seja detectado região de alto em Hospitais, Clínicas Pediátricas e Salas de
risco), até 4 semanas após o parto. Quanto ao ferro, Desnutridos)
o ideal é que seja mantida a sua suplementação por Casos de Xeroftalmia (03 doses); Sarampo (02
mais 2 a 3 meses, não em função do recém – doses); DEP, Diarréia Crônica (01 dose):
nascido, mas para repor as reservas maternas de 1ª dose de 200.000 UI , no diagnóstico;
ferro espoliadas durante a gestação.
2ª dose de 200.000 UI, no dia seguinte;
Este talvez seja o momento mais importante para 3ª dose de 200.000 UI , 4 semanas mais tarde.
garantir a manutenção da lactação. A mãe deve ser
sendo + dose (100.000 UI) para crianças de 6-12
encorajada e estimulada na tentativa de reduzir sua
meses, ou que pesam menos de 8 kg e + de dose
ansiedade e manter a sua segurança.
(50.000 UI), para as crianças de 0- 6 meses de
CRIANÇA: o monitoramento da criança deve ocorrer idade.
já com alguns dias de vida por meio de Ações
Básicas de Saúde (controle das doenças diarréicas Regiões de Alto Risco (Tratamento e Prevenção):
e respiratórias, incentivo ao aleitamento materno Devem ser conduzidos em locais comunitários
exclusivo até o 4 – 6 mês de vida; acompanhamento (creches, favelas) ou acopladas às campanhas de
do crescimento e do desenvolvimento; vacinações); vacinação.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 235


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

A identificação das regiões de alto risco deve se 3.2.2. Alimentos Fortificados: creches, pré-escolas e
feita por dados de prevalência, entretanto, se esta escolas
não for disponível, podem ser considerados os fatores
Não resta dúvida que a fortificação de alimentos
de risco, a saber: desnutrição, zonas ecológicas,
com vitamina A tem sido uma boa estratégia para
regiões áridas, campos de refugiados, grupos de
a resolução deste grave problema, principalmente
baixa cobertura de programas e de vacinação.
quando se deseja soluções no âmbito de saúde
Crianças de 6-12 meses pública e mais à longo prazo, desde que a prática
100.000 UI (1 dose a cada 4-6 meses) da suplementação medicamentosa é difícil de ser
Crianças de12- 72 meses mantida por longos períodos. A fortificação pode
200.000 UI (1 dose a cada 4-6 meses) ser feita localmente, por meio de “mix” ou por
alimentos industrializados.
Crianças menores de 6 meses e que são amamenta-
das, devem receber 50.000 UI a cada 4-6 meses Recomenda-se a confecção de um “mix”, que após
2.3.2. Nível Coletivo a diluição deve conter 9mg de ferro elementar sob
a forma de ferro-aminoácido-quelato, por litro de
3.2.1. Profilaxia Medicamentosa em Creches, Pré-
leite; 2000 UI de vitamina A e 400 UI de vitamina
Escolas
D. O ideal é ainda se acrescentar um aromatizante.
Recomenda-se a administração do sulfato ferroso que O “mix” pode ser adquirido em farmácias, ou com
tanto pode ser diário (12 mg de ferro elementar-o representantes específicos. A quantidade em cada
sulfato ferroso contém 20% de ferro elementar, cápsula deve ser estabelecida pelo local, de acordo
devendo ser oferecidas 10 gotas diárias), como com o volume dos produtos que serão fortificados
semanal (40 mg de ferro elementar uma vez por (5,10 ou 20 litros de leite, suco, etc) nos locais.
semana). O importante é que se tenha a certeza Recomenda-se a utilização de farmácias de manipu-
que o medicamento esteja sendo oferecido, lação para a pesagem do ”mix” e formação das
necessitando, portanto de profissionais treinados e cápsulas, que serão distribuídas nos locais. A quan-
motivados para esta ação. Agentes Comunitários de tidade de ferro pode ser monitorada por meio dos
Saúde podem participar da administração do sulfato levantamentos diagnósticos. Após o controle da
ferroso na prática semanal, em locais comunitários anemia, a quantidade de ferro pode ser reduzida
ou em visitas domiciliares. para 0,6mg ou 0,3 mg/litro.
Administração do sulfato ferroso por meio da água: A profilaxia com ferro, pode ser feita por meio de
este tipo de profilaxia foi testada com bom resultados alimentos industrializados, desde que o mercado já
por grupo de pesquisadores de Ribeirão Preto (20 se apresenta com uma série de produtos (pão, leite,
mg de ferro elementar por litro de água da talha, sucos, macarrão) e que podem fazer parte da me-
sendo a ingestão à vontade). renda escolar.

Anemia da Prematuridade
LUÍS EDUARDO VAZ MIRANDA

Dentre as inúmeras adaptações fisiológicas exibidas hemácias, concentração de hemoglobina e


pelos diversos aparelhos e sistemas do recém- hematócrito progressivamente crescentes, com o
nascido, destacam-se aquelas observadas ao longo passar da gestação (tabela 1), segue-se uma queda
das primeiras semanas de vida extra-uterina, nos pós-natal constante dessas determinações, que
valores da série vermelha sangüínea. Após uma atingem seu nadir por volta de 6 a 10 semanas
existência fetal caracterizada por número de (figuras 1 e 2).

236 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Tabela 1. Hematimetria* durante a gestação

Idade Contagem de Concentração de Hematócrito


Gestacional Hemácias Hemoglobina
(semanas) (x1.000.000.000/ml) (g/dl) (%)

18 – 21 2,85 ± 0,36 11,7 ± 1,3 37,3 ± 4,3


22 – 25 3,09 ± 0,34 12,2 ± 1,6 38,6 ± 3,9
26 – 29 3,46 ± 0,41 12,9 ± 1,4 40,9 ± 4,4
> 36 4,70 ± 0,40 16,5 ± 1,5 51,0 ± 4,5

(*) valores médios ± 1 desvio padrão


(modificado de Stockman JA III, Oski FA. Physiologic anemia of infancy and the anemia of prematurity. Clin. Hematol.
7:3, 1978)

Figura 1

26
Hemoglobina (g/dl)

22

6
1 5 7 14 21 28
dias de vida

Valores médios (+2 SD) da concentração de hemoglobina em prematuros (extraído de Stockmann JÁ III, Oski FA. Clin
Hematol 7:3

(Enquanto esse estado de anemia é habitualmente bem crianças nascidas a termo, ele é tão mais precoce e
tolerado e considerado mesmo como fisiológico nas pronunciado quanto mais prematura tiver sido a criança.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 237


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Figura 2

18 BLOOD HAEMOGLOBIN 14
CONCENTRATION

TOTAL BODY HAEMOGLOBIN


BLOOD HAEMOGLOBIN 16 12
CONCENTRATION G/DL TOTAL BODY
HAEMOGLOBIN

(GRAMS)
14

12 8

10 6
BODY WEIGHT (GRAMS)

RETICULOCYTE COUNT

RETICULOCYTES %
3000

6
2000

2
1000

0 2 4 6 8
TIME (WEEKS)

Concentração de hemoglobina, hemoglobina corporal total, contagem de reticulócitos e peso durante evolução de um
prematuro (extraído de Doyle JJ, Schmidt B, Blanchette V, Zipursky A. Neonatology, by Avery G, et pp 1045, 1.999

Mesmo que agravada por outros fatores, como retira- inicial conseqüente às variações nas práticas de liga-
da excessiva de sangue para atender a múltiplas dura do cordão umbilical e hemodiluição secundária
determinações laboratoriais necessárias ao acompa- ao rápido crescimento, a anemia da prematuridade é
nhamento de uma grande variedade de condições tida como um exagero da queda habitual dos valores
médicas e cirúrgicas experimentadas pelos prematuros, hematimétricos observados na anemia fisiológica do
perdas extraordinárias, diferenças na hematimetria recém-nascido (tabela 2).

Tabela 2. Concentração seriada de hemoglobina em recém-nascidos de baixo peso

Idade em semanas

Peso de nascimento (g) 2 4 6 8 10

800 – 1.000 16,0 (14,8-17,2) 10,0 (6,8-13,2) 8,7 (7,0-10,2) 8,0 (7,1- 9,8) 8,0 (6,9-10,2)
1.001 – 1.200 16,4 (14,1-18,7) 12,8 (7,8-15,3) 10,5 (7,2-12,3) 9,1 (7,8-10,4) 8,5 (7,0-10,0)
1.201 – 1.400 16,2 (13,6-18,8) 13,4 (8,8-16,2) 10,9 (8,5-13,3) 9,9 (8,0-11,8) 9,8 (8,4-11,3)
1.401 – 1.500 15,6 (13,4-17,8) 11,7 (9,7-13,7) 10,5 (9,1-11,9) 9,8 (8,4-12,0) 9,9 (8,4-11,4)
1.501 – 2.000 15,6 (13,5-17,7) 11,0 (9,6-14,0) 9,6 (8,8-11,5) 9,8 (8,4-12,1) 10,0 (8,6-11,8)
Modificado de Williams ML, Shott RL, O’Neal PL, et al> Dietary iron and fat in vitamin E deficiency anemia of infancy. N.Engl.J.Med.
292:877, 1975

238 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Embora tenham uma boa resposta in vitro A anemia da prematuridade está associada a sintomas
à eritropoietina, os prematuros são mais “tole- (tabela 3) em até 40% das crianças nascidas com menos
rantes” à anemia e apresentam uma sensi- de 32 semanas. Enquanto algumas crianças resistem
bilidade diminuída à hipóxia tissular. Além bem a concentrações muito baixas de hemoglobina,
de justificar, em grande parte, a complexa outras acabam denunciando suas grandes dificuldades
fisiopatologia da anemia da prematuridade, os de modo bastante ostensivo. O caráter imprevisível e
níveis menores de eritropoietina endógena inespecífico dos sintomas tem levado a grandes variações
observados nessas crianças vêm estimulando seu nas indicações de transfusão de concentrado de hemácias
uso terapêutico. praticadas por diferentes Serviços.

Tabela 3. Sintomatologia da anemia da prematuridade

taquicardia (170 - 180 bpm)


taquipnéia (70 - 80 irpm)
apnéia (>2 severas / dia)
ganho ponderal < 10 g / dia
perfusão lentificada
atividade diminuida
acidose lática

Além de se buscar diminuir as repetidas retiradas de da hematimetria, o estado clínico da criança. Se há


sangue das crianças de baixo peso, o tratamento boa evolução, ganho de peso satisfatório e ausência
usual da anemia da prematuridade segue sendo a de sintomas, a transfusão estará indicada apenas
administração de concentrado de hemácias. E, como quando o hematócrito for inferior a 20% (25%,
o hematócrio periférico costuma ultrapassar em até quando se antecipa alta hospitalar para os próximos
10 pontos o central, este precisa ser considerado dias). Buscando-se corrigir o hematócrito para 40 –
quando se avalia a necessidade de transfusão. 45%, o volume a ser transfundido pode ser estimado
pela fórmula:
Com a atitude mais conservadora, encontrada hoje
na maioria dos Serviços, tem diminuído muito as volume a transfundir = ∆ hematócrito* x peso (kg)
indicações de transfusão de papa de hemácias entre
prematuros. Embora muito variáveis, os critérios de * (∆ hematócrito = hematócrito desejado - hematócrito
transfusão (tabela 4) levam em conta, além dos valores encontrado)

Tabela 4. Indicações de transfusão de concentrado de hemácias

Hematócrito (%) Condição clínica


<20 Assintomático
<25 Sintomático
<30% insuficiência respiratória leve
ou pré e pós-operatório
<35% Insuficiência respiratória moderada
<35% Insuficiência respiratória severa

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 239


Nutrição
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Na presença dos sintomas de anemia da 2 mg/kg/dia, iniciada de 6 a 8 semanas ou mais


prematuridade, temos indicado a transfusão de cedo, se amamentados ao seio materno. Tal dose
concentrado de hemácias quando o hematócrito for pode ser dobrada para aqueles com pesos de
inferior a 25%. Crianças com capacidade limitada nascimento inferior a 1.000 gramas ou submetidos
para tolerar e compensar para anemia, como as a múltiplas coletas de sangue.
portadoras de displasia broncopulmonar, são
Embora ainda considerada como droga
transfundidas mais cedo.
experimental, aguardando a definição de um melhor
Mesmo sabendo-se que a deficiência de múltiplos protocolo de uso, a eritropoietina vem sendo
fatores nutricionais como ferro, ácido fólico, vitaminas empregada em prematuros selecionados, numa
B12, C, e E podem limitar a eritropoiese, é pequena tentativa de diminuir o número de transfusões e
sua participação no desenvolvimento da anemia da de exposição a múltiplos doadores. Doses de
prematuridade. A recomendação atual para 200 mg/kg são administradas por via subcutânea
suplementação de ferro nos prematuros é de (ou venosa) em dias alternados.

240 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Infectologia
••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

Calendário Vacinal
REINALDO MENEZES MARTINS

O calendário vacinal é um instrumento de trabalho, coberturas vacinais altas e a apuração das ações
devendo ser adaptado à situação epidemiológica e de vacinação, permitindo a análise das estratégias
à disponibilidade de vacinas. Portanto, precisa ser empregadas.
revisto periodicamente. Deve também ser de fácil
compreensão e aplicação. É preciso levar em conta as particularidades dos
setores público e privado. Ambos devem seguir as
Sua aplicação deve ser flexível, isto é, procurando
mesmas normas de vacinação, mas deve-se
fazer os pequenos ajustes necessários no dia-a-dia
reconhecer, como fato da realidade, que os serviços
de trabalho. Deve-se fazer o possível para aplicar o
particulares podem oferecer de rotina uma gama
maior número possível de vacinas no menor número
maior de vacinas à sua clientela.
possível de consultas. Em situações especiais, por
exemplo, pacientes que tenham indicação de receber Darei a seguir quatro exemplos de esquemas vacinais,
vacina pneumocócica, contra varicela ou hepatite A, para mostrar como são variados. A fonte principal
encaminhá-los para os CRIEs (Centros de Referência dos dados apresentados é o Dr. David Salisbury, em
de Imunobiológicos Especiais). capítulo do livro “Vaccines” de Plotkin & Orenstein,
O calendário tem por objetivos racionalizar as 3ª ed, 1999, p.1033-1046 (“Immunization in
práticas de vacinação, facilitar a obtenção de Europe”).

Esquemas de vacina Hib Esquemas de vacinação BCG

País Esquema País Esquema


Finlândia 4, 6, 14-18 m Bulgária 0, 7, 12, 17 anos
França 2, 3, 4, 15 m Rep. Checa 4d-6 sem; 11 anos
Irlanda 2, 4, 6 m Noruega 16 anos
Suécia 3, 5, 12 m Reino Unido 12 anos (risco)
Reino Unido 2, 3, 4 m França 6 anos(risco)

Esquemas de vacinação DTP Esquemas de vacinação Tríplice Viral

País Esquema País Esquema


Finlândia 3, 4, 5, 20-24 m Finlândia 14-18 m, 6 anos
França 2, 3, 4, 16-18 m França 12 m, 11-13 anos
Portugal 2, 4, 6, 18 m; 5 anos Itália 15 m
Espanha 3, 5, 7, 15-18 m Reino Unido 13 m, 4 anos
Reino Unido 2, 3, 4 m EUA 12-15 m, 4-6 anos

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 241


Infectologia
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O calendário vacinal de rotina do Ministério da Saúde é o seguinte:

Vacina Esquema

BCG 0, 6 anos
Hepatite B 0, 1, 6 m
DTP, pólio oral 2, 4, 6, 15 m
Hib 2, 4, 6 m
Febre amarela 9 meses e mais
Sarampo 9 m
Tríplice viral 15 m
dT 10/10 anos

Observação: As vacinas contra rubéola ou rubéola e sarampo devem ser aplicadas nas
puérperas.

O calendário vacinal de rotina da Sociedade Brasileira de Pediatria – Comitê de Infectologia - é o seguinte:

Vacina Esquema

BCG 0, 7-10 anos


Hepatite B 0, 1, 6 m
DTP, pólio oral 2, 4, 6, 15 m, 4-6 anos
Hib 2, 4, 6, 15 m
Sarampo, Febre amarela? 9 m
Tríplice viral 15 m, 6-10 anos
DT 14-16 anos
Observações: vacinas contra hepatite A e varicela devem ser aplicadas sempre que possível.
As puérperas devem ser vacinadas contra rubéola.A idade inicial para vacinação
contra febre amarela está sendo estudada pelo Comitê de Infectologia nesse momento.

O calendário vacinal de atópicos é igual ao de não por exemplo, vacinação dos susceptíveis contra
atópicos. varicela.
Os imunocomprometidos graves não devem receber Prematuros devem ser vacinados normalmente, nas
vacinas vivas. idades cronológicas habituais, com exceção da BCG,
que só deve ser aplicado quando a criança tiver
Pacientes recebendo corticosteróides em dose de
dois quilos ou mais.
imunossupressão (2mg/kg/dia de prednisona ou
equivalente durante 14 dias ou mais) não devem Deve-se apurar a história vacinal e imunoló-
receber vacinas vivas durante os 30 dias seguintes. gica dos adolescentes, aplicando-se as vacinas
indicadas, como a tríplice viral, hepatite B, dT,
Outros imunossupressores contraindicam as vacinas
varicela e hepatite A, estas duas últimas caso sejam
durante os três meses seguintes.
disponíveis.
Transplantados de medula óssea não devem receber
As puérperas e seus maridos devem ser vacinados
vacinas inativadas durante um ano e vivas durante
contra rubéola e sarampo. Caso haja atraso ou falta
dois anos.
em relação a outras vacinas, deve-se encaminhar ao
Pessoas que estão em contato com imunocom- Posto de Saúde ou serviço equivalente para
prometidos graves devem receber proteção especial, atualização do calendário.

242 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Infectologia
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Tratamento da Infecção pelo HIV em Crianças


REGINA CÉLIA DE MENEZES SUCCI

Os conhecimentos recentes sobre a dinâmica da incorporação dentro do DNA proviral sintetizado pela
replicação viral na infecção pelo HIV revelaram que transcriptase reversa viral. Por exemplo; o trifosfato
o vírus se multiplica intensamente durante todos os de zidovudina inibe a transcriptase reversa em
estágios da infecção. Quando a terapia antiretroviral competição com o trifosfato de timidina.
não é capaz de suprimir significantemente essa
2) Inibidores da transcriptase reversa não
replicação viral, emergem cepas virais resistentes,
nucleosídeos: Nevirapina e Delavirdina, Efavirenz.
além de aumentar a chance de deterioração mais
Estes inibidores da transcriptase reversa não
precoce do sistema imune. A terapia antiretroviral
nucleosídeos realizam uma supressão altamente
tem por finalidade suprimir ao máximo a replicação
seletiva da replicação do HIV em cultura de células
viral, preservar a função imunológica do paciente e
e têm baixa citotoxicidade. Eles não requerem
reduzir o desenvolvimento de resistência viral à
ativação intracelular (fosforilação) e então não
medicação. A terapia antiretroviral potente modificou
interferem com o metabolismo dos inibidores da
o prognóstico da criança com AIDS e alterou muito
transcriptase reversa nucleosídeos análogos.
a sua qualidade de vida, melhorando o seu
Entretanto, a resistência viral emerge rapidamente.
crescimento e desenvolvimento e levando à importante
queda na morbi-mortalidade destas crianças. 3) Inibidores da protease (IP): Indinavir, Nelfinavir,
Ritonavir e Saquinavir. A protease tem por função
O tratamento antiretroviral em crianças apresenta
clivar os precursores polipeptídicos que produzem
enormes dificuldades de aderência: as formulações
as proteínas estruturais e as enzimas do vírus:
das drogas para uso pediátrico disponíveis são
transcriptase reversa, integrase e a própria protease.
poucas e não têm boa palatabilidade; há grande
A protease é essencial para a montagem e maturação
impacto da agenda medicamentosa na qualidade
dos virions infectantes. A resistência do vírus aos
de vida do paciente. Nem sempre os responsáveis
inibidores da protease desenvolve-se mais dificilmente
pela criança ou adolescente têm habilidade na
com estas drogas. Estão liberados para uso na
manipulação e administração do complexo regime
população pediátrica: o Ritonavir e o Nelfinavir.
terapêutico. É grande a capacidade do vírus
desenvolver resistência às drogas precocemente, Há alguns anos, a terapia anti-retroviral era indicada
especialmente se os regimes terapêuticos não são somente para crianças que apresentavam sintomas
oferecidos com regularidade. clínicos e deficiência imunológica bem evidentes.
Nesta época, o esquema terapêutico inicialmente
O tratamento adequado da criança infectada pelo
proposto era a monoterapia com AZT. Atualmente
HIV pressupõe a identificação das mulheres infectadas
com o aparecimento crescente de resistência viral e
pelo HIV antes e durante a gestação, objetivando
com a descoberta de novos antiretrovirais, a terapia
prevenir a transmissão perinatal, além de iniciar preco-
combinada está recomenda para tratamento inicial
cemente as medidas profiláticas para o lactente filho
em todas as crianças.
de mãe infectada. Esforços devem ser feitos para se
realizar o diagnóstico precoce da infecção no lactente Quando comparada com a monoterapia, a terapia
e avaliação dos parâmetros imunológicos e virológicos, combinada retarda a progressão da doença, aumenta
que é fundamental para a adequação da terapia. a sobrevida e diminui a carga viral com maior
intensidade. A associação de duas ou três drogas
Os anti-retrovirais disponíveis atualmente em nosso
tem sido recomendada. O Ministério da Saúde do
meio são classificados em três categorias:
Brasil recomenda, segundo normas publicadas em
1) Inibidores da transcriptase reversa núcleosideos 1998, o uso de dois inibidores da transcriptase
análogos: ddI, 3TC, d4T, ddC, AZT, Abacavir(ABC). reversa nucleosídeos análogos para a terapia inicial:
Nesta categoria de anti-retrovirais, a droga ativa, AZT+ddI ou AZT+ 3TC. No entanto, o CDC (Centers
compete com o nucleotídeo trifosfato endógeno pela for Disease Control and Prevention) sugere como

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 243


Infectologia
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regime terapêutico preferencial o uso de um inibidor 3) Critério virológico: devem receber terapia anti-
de protease associado a dois inibidores da retroviral as crianças que apresentarem CV elevada
transcriptase reversa nucleosídeos análogos. A ou em progressivo aumento.
monoterapia não é recomendada, exceto para a
4) Grupo Especial: a maioria dos pesquisadores
profilaxia da transmissão perinatal do vírus.
sugere que as crianças detectadas como infectadas
Acredita-se que a introdução precoce do esquema durante o primeiro ano de vida, independentemente
terapêutico, sobretudo em crianças durante o primeiro dos critérios clínico, imunológico e virológico, devem
ano de vida, determine uma diminuição rápida da iniciar terapia antiretroviral.
carga viral, antes que haja comprometimento do
Uma vez iniciado o esquema terapêutico, além da
sistema imune e aparecimento de cepas virais
avaliação clínica, controles trimestrais ou quadri-
resistentes.
mestrais devem ser feitos para avaliar a evolução da
As indicações para se iniciar a terapêutica anti- carga viral e contagem de células CD4+ com a
retroviral em crianças obedecem aos seguintes finalidade de detectar falhas terapêuticas e intolerân-
critérios: cia medicamentosa. Ocorrendo isso, estará indicada
a mudança da terapêutica.
1) Critério clínico: devem receber terapia antiretroviral
as crianças que estão classificadas nas categorias Antes de indicar mudança terapêutica baseada em
clínicas A, B e C (Tabela 1) sinais de intolerância, considerar que os sintomas mais
freqüentes, como náuseas, vômitos, dor abdominal,
2) Critério imunológico: devem receber terapia
diarréia e cefaléia são leves e geralmente desapare-
antiretroviral as crianças que estão classificadas nas
cem após as primeiras semanas de uso das drogas.
categorias imunológicas 2 e 3 (Tabela 2) ou
apresentam rápido declínio de CD4 (absoluto ou É importante lembrar que todas estas normas
relativo) para os níveis da categoria 2. utilizadas, tanto para início quanto para mudança

Tabela 1: Classificação da Infecção pelo HIV em crianças - Categoria Clínica

Alteração Sinais e sintomas clínicos

imunológica Ausente N Leves A Moderados B Graves C

Ausente 1 N1 A1 B1 C1

Moderada 2 N2 A2 B2 C2

Severa 3 N3 A3 B3 C3

Tabela 2: Valores de CD4 de acordo com a idade

Alteração imunológica Contagem de CD4 e idade

< 12meses 1 a 6 anos 6 a 12 anos

Ausente 1 >1500 (>20%) > 1000 (>25%) > 500 (>25%)

Moderada 2 750-1499(15-24% 500 - 999 (15-24%) 200-499(15-24%)

Severa 3 < 750 (<15%) < 500 (<15%) < 200 (<15%)

244 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Infectologia
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de terapêutica, devem ser consideradas apenas como Referências Bibliográficas


parâmetros, uma vez que os casos que se apresentam 01 - Brasil- Ministério da Saúde, 1998 - Secretaria de Política
fora dos padrões estabelecidos, devem ser conduzi- de Saúde - Coordenação Nacional de DST e AIDS -
dos pelo bom senso do profissional que acompanha Guia de Tratamento Clínico da Infecção pelo HIV em
crianças.
o paciente. 02 - Brasil- Ministério da Saúde. Boletim Epidemiológico AIDS-
XI (3), 1998.
Novas e pormissoras drogas vêm sendo estu- 03 - Centers for Disease Control and Prevention. CDC
dadas com a finaidade de diminuir de forma Guidelines for the Use of Antiretroviral Agents in Pediatric
HIV - lnfection. MMWR 47(RR4): 1-43.1998.
mais rápida e duradoura a carga viral, melho- 04 - Ho, DD. Time to hit HIV, early and hard. N Engl J Med.
rando o prognóstico das crianças infectadas: drogas 333: 450- 451, 1995.
que poderiam bloquear a entrada do HIV-1 05 - Mueller, BU e cols.- Individual prognoses of Long Term
Responses to antiretroviral treatment based virological,
dentro das células, por interferência nos recep- immunological and pharmacological parameters measured
tores de quemoquina, especialmente CCR-5; during the first week under therapy – AIDS 12:191 -
hidroxiuréia que pode ser um adjuvante útil aos 196,1998.
06 - Ramilo, O MD e cols - Early experience with protease
agentes anti-retrovirais nucleosídeos análogos, entre inhibitors in human immunodeficiency virus infected children
outros. - Pediatr. Infect. Dis.J. 17:728-738,1998.

Meningites Bacterianas
CALIL KAIRALLA FARHAT

As meningites bacterianas continuam sendo influenzae à ampicilina e ao cloranfenicol, e também,


diagnosticadas com bastante freqüência e, devido do pneumococo à penicilina. A resistência destes
aos seus coeficientes elevados de morbidade, de dois agentes, disseminada em porcentagem variável
letalidade e ao número apreciável de complicações por praticamente todo o país, tem sido responsável
e seqüelas, elas continuam representando um por mudanças na conduta terapêutica, principalmente
destacado problema de Saúde Pública. nos locais onde sua presença é mais acentuada.
Em nosso meio, os agentes etiológicos continuam os Assim sendo, drogas antes amplamente utilizadas
mesmos, tendo havido na última década alterações para o tratamento empírico inicial das meningites
apenas quantitativas na participação destas bactérias bacterianas, como o cloranfenicol e a ampicilina,
no conjunto etiológico. Hoje, 80% dos casos de são atualmente relegadas à categoria de
meningites bacterianas internados no Instituto de medicamentos de segunda escolha. A velha penicilina
Infectologia Emílio Ribas, em São Paulo, são causados G, outrora rotineiramente empregada em algumas
pela Neisseria meningitidis, 10% a 11% pelo infecções do SNC, hoje somente é indicada para o
Haemophilus influenzae, 5 a 6% pelo Streptococcus tratamento das infecções comprovadamente
pneumoniae e 0,8% a 1% pelo Mycobacterium meningocócicas.
tuberculosis . A maciça predominância do Ao nos depararmos com paciente suspeito de
meningococo que tem sido observada desde 1988 meningite bacteriana, devemos proceder, o mais
é devida, na maior parte, ao meningococo do grupo rapidamente possível, à coleta de líquido
B (60% aproximadamente) e, em parte menor, ao do cefalorraquidiano, sangue, urina, raspado de lesão
grupo C (35% a 40%). cutânea, etc., e encaminhar esse material para
Um problema que merece particular atenção na exames laboratoriais com a finalidade de diagnóstico
atualidade é o da resistência do Haemophilus clínico-etiológico.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 245


Infectologia
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Diante de suspeita bem fundamentada de meningite (gentamicina ou amicacina) ou também com


bacteriana inicia-se o tratamento: ampicilina associada à cefalosporina de terceira
– Dexametasona: 0,15 mg/kg, EV, de 6/6 horas geração (cefotaxima é a preferida para o período
por um período de dois a quatro dias. Preconiza- neonatal).
se administrar o corticosteróide, cerca de 15 a 20 – Equilíbrio hidroeletrolítico: o paciente com meningite,
minutos antes da aplicação da primeira dose de desidratado, deve ser reidratado adequadamente,
antimicrobiano. com reposição normal de líquidos e eletrólitos segundo
– Antibióticos: em crianças a partir dos dois meses determinado pelos cálculos presumidos das perdas.
de idade, adolescentes e adultos, dá-se preferência Restrição hídrica somente será feita para os pacientes
à monoterapia, com uma cefalosporina de terceira com hiponatremia e sem sinais de desidratação.
geração, preferentemente com ceftriaxona. – Procurar fazer o diagnóstico precoce de choque,
Para recém-nascidos e lactentes até dois meses de CIVD, edema cerebral agudo, síndrome da secreção
idade, o tratamento inicial pode ser feito com a inapropriada de hormônio antidiurético, orientando
associação de Ampicilina com um aminoglicosídeo corretamente a conduta terapêutica.

246 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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Hiperbilirrubinemia do Recém-Nascido - Manejo


NAVANTINO ALVES FILHO

I. INTRODUÇÃO II. TRATAMENTO


A icterícia é o sinal mais comum observado em A criança que desenvolve icterícia “patológica” causa
recém-nascidos em berçário ou alojamento conjunto. preocupação e requer identificação do fator causal.
O recém-nascido, retirado de seu ambiente intra- Através do Quadro 1, descrevemos as causas mais
uterino, tem necessidade de ajustar-se à vida extra- comuns de icterícia neonatal devidas ao excesso de
uterina e, uma vez ocorridas a expansão pulmonar formação de bilirrubina a partir do catabolismo
e as mudanças cardiocirculatórias exigidas para as acelerado da hemoglobina, à doença hepatocelular
trocas gasosas teciduais, passa a depender de ou à obstrução à excreção fecal do pigmento. É
substratos para a manutenção de seu ritmo de importante um diagnóstico, pois ele ditará a
crescimento e suportar as exigências energéticas de terapêutica mais apropriada para interromper o
sua massa tecidual. Essa necessidade calórica é, acúmulo da bilirrubina e facilitar a sua eliminação.
basicamente, dependente da competência da função
Como podemos antever, o tratamento da hiper-
hepática, onde, através da neoglicogênese, há
bilirrubinemia neonatal consiste na prevenção da
constante aporte de glicose para os tecidos extra-
encefalopatia bilirrubínica. Temos, atualmente, três
hepáticos, usando como fonte os aminoácidos, já
métodos de tratamento:
que as reservas hepáticas de glicogênio, quando do
nascimento, são quase totalmente exauridas pelo (1) Remoção mecânica da bilirrubina indireta
metabolismo anaeróbio que acompanha a hipoxia (exsangüineotransfusão);
fisiológica do trabalho de parto.
(2) uso de vias metabólicas alternativas que,
Entre as muitas funções homeostáticas do fígado, a normalmente, são pouco utilizadas para a excreção
capacidade de excretar metabólitos endogenamente normal de bilirrubina indireta (fototerapia);
formados, alguns tóxicos acumulados em
(3) aceleração do metabolismo normal de excreção
concentrações excessivas nos líquidos corporais,
da bilirrubina indireta por meios farmacológicos
através de biotransformação, encontra na excreção
(fenobarbital).
de amônia e de bilirrubina, produtos naturais finais
do catabolismo de aminoácidos e hemeproteínas,
um dos mais significativos exemplos, dependentes
A. Exsangüineo transfusão
que são de uma boa maturidade funcional hepática
para a sua eliminação do organismo. Quando tal Neste capítulo, é indicada para a correção de uma
maturidade enzimática se encontra transitoriamente anemia secundária à doença hemolítica perinatal
comprometida, acumulam-se metabólitos endógenos grave ou para tratar uma hiperbilirrubinemia potencial
ou exógenos (estes oriundos da administração de ou atual. Pode ser imediata (logo após a adaptação
agentes farmacológicos), sugerindo os quadros cardiorrespiratória neonatal), precoce (primeiro dia
classicamente conhecidos de hiperbilirrubinemia, de vida) ou tardia; repetidas ou não. Há três diferentes
hiperamoniemia ou iatrogenia de drogas, tão comuns tipos de procedimentos: exsangüíneo com
no dia-a-dia das unidades neonatais, levando não concentrado de hemácias, exsangüíneo com sangue
só à mortalidade mas à morbidade em sobreviventes, total, exsangüíneo precedida de infusão de albumina
limitando a qualidade de vida do ser humano. humana. Cada variedade destina-se a aumentar a

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 247


Neonatologia
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Quadro 1 - Causas de hiperbilirrubinemia patológica durante a vida neonatal

Produção aumentada Excreção diminuída Forma mista

A. Incompatibilidade sangüínea G. Endócrino/metabólicos I. Sepse neonatal


materno-fetal (Rh, ABO, outras) 1. Icterícia não-hemolítica
familial (tipos 1 e 2) J. Infecções intra-uterinas
2. Síndromes de Gilbert, 1. Toxoplasmose
B. Esferocitose hereditária Rotor, Dubin-Johnson 2. Rubéola
3. Galactosemia 3. Citomegalovírus
C. Anemias hemolíticas 4. Hipotireoidismo 4. Herpes simples
não-esferocíticas 5. Tirosinose 5. Sífilis
1. Deficiência G-6-P-D 6. Hipermetioninemia 6. Doença de Chagas
2. Def. piruvatoquinase 7. Drogas e hormônios 7. Hepatite vírica
3. Outras def. enzimáticas a. Novobiocina (C, não-A / não-B)
eritrocitárias b. Drogas colestáticas 8. Outras (parvovírus,
4. Alfa-talassemia c. Pregnanediol AIDS, etc.)
5. Gama-talassemia d. Alguns leites humanos K. Hepatite vírica A
6. Hemólise induzida pela vit. K3 e. Síndrome Lucey-Driscoll
D. Coleções extravasculares de f. Ocitocina (mãe)
sangue (petéquias, hematomas g. Outras drogas obstétricas
cerebrais / pulmonares / ocultos) 8. Filho de mãe diabética
E. Policitemia 9. Prematuridade
1. Transfusão materno- 10. Hipopituitarismo
fetal ou feto-fetal 11. Insuficiência cardíaca
2. Ligadura tardia do congestiva
cordão umbilical 12. Aberrações cromossômicas
F. Aumento da circulação 13. Outros erros inatos do
êntero-hepática metabolismo
1. Estenose pilórica
2. Atresia ou estenose H. Obstrutivas
intestinal (incluindo 1. Atresia / estenose biliar
pâncreas anular) 2. Cisto colédoco
3. Doença de 3. Fibrose cística
Hirschsprung 4. Obstrução biliar
4. Íleo meconial / síndro- extrínseca
me de rolha meconial (bandas, tumores)
5. Jejum prolongado / 5. Síndromes colestáticas
outras síndromes de a. Progressiva
hipoperistaltismo (ácidos biliares
6. Íleo paralítico induzido séricos elevados)
por drogas (paregórico, b. Não progressiva
hexametônio) (ácidos biliares
7. Sangue deglutido séricos normais)
c. Intermitente

248 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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eficácia do método em crianças anêmicas ou ictéricas flebotomia pode ser realizada antes do início da
a risco de kernicterus. Foi Hart (1925) quem primeiro exsangüíneo. A exsangüíneo com sangue total é
a usou em um caso de doença hemolítica Rh grave. indicada nas icterícias hemolíticas graves, como
Era o nono filho de uma mãe que perdera seis bilirrubinemias menores do que 10 mg%, no primeiro
anteriores com anemia e edema. Usou o seio sagital dia de vida, antecipando uma indicação futura e em
por punção no escalpe, e a criança sobreviveu. No todas as outras indicações já citadas. A criança que
entanto, foi com Diamond (1945), com o uso da teve ligadura precoce do cordão umbilical recebe
veia umbilical como via de acesso, que o tratamento um cateter introduzido 10-12 cm, alcançando, assim,
se estabeleceu, e hoje usam-se dois volumes de a veia cava inferior; mede-se a pressão venosa pela
sangue da criança (80 mg/kg x 2), o que se mostra altura da coluna de sangue que se eleva no cateter
eficiente para a troca de 85% das células do receptor e inicia-se a troca de 10/10 ml ou 20/20 ml, na
pelas do doador. Na doença hemolítica, a transfusão dependência do peso da criança, deixando sempre
de substituição está indicada quando o hematócrito um déficit inicial de volume (10 ml - 20 ml). Use
é menor do que 45% e a bilirrubina indireta maior sangue ABO específico e Rh negativo na
do que 4 mg% no sangue do cordão, ou quando há incompatibilidade Rh (ou sangue O Rh negativo).
aumento de mais de 0,5 mg%/hora de bilirrubina Sangue fresco, conservado em ACD ou CPD, é
não-conjugada por mais de seis horas, ou na melhor do que o heparinizado (este eleva os ácidos
presença de metalbuminemia. Se não há hemólise, graxos não-saturados que competem com a bilirrubina
está indicada quando a bilirrubina indireta alcança pela albumina), apesar de apresentar uma glicemia
18 mg% por mais de 48 horas ou 20 mg% em de cerca de 300 mg%, sódio de 180 mEq/l,
qualquer dosagem, em recém-nascidos a termo ausência de cálcio e um pH baixo (6,9-7,0). Na
normais, dentro dos primeiros 15 dias de vida. eritroblastose, há hiperplasia das ilhotas de
Quando se trata de recém-nascidos pré-termo, temos Langerhans, com hiperinsulinismo semelhante ao do
exsangüinado com valores tão baixos quanto 12-15 filho de mãe diabética, e esta hiperglicemia no
mg% para aqueles de peso de nascimento menor do sangue doado pode provocar rechaço hipoglicêmico,
que 1.500 g, ou idade gestacional inferior a 34 caso não se mantenha uma linha venosa de glicose
semanas, mesmo na ausência de outras patologias a 5% nas 24 horas seguintes ao procedimento. É
associadas. desnecessária a administração de 1 ml de gluconato
de cálcio a 10% para cada 100 ml de sangue
O Quadro 2 é útil, pois mostra critérios práticos,
trocado. No entanto, na presença de taquicardia,
valorizando outras variáveis, mas peca pela
irritabilidade, prolongamento do intervalo S-T no
generalização. Os Quadros 3 e 4 também são
monitor cardíaco, o cálcio deve ser injetado
válidos, mas suscetíveis ao mesmo erro.
lentamente, sob monitoração da freqüência
O uso de papa de hemácias é apropriado para cardíaca, lavando-se bem como soro fisiológico o
aqueles severamente anêmicos e que necessitam de tubo contendo sangue ACD. O sangue é aquecido
uma exsangüíneo imediata. Durante a troca, o sangue por 30 minutos em temperatura ambiente, deve
da criança com hematócrito tão baixo quanto 10% receber uma irradiação simples de 3 rads ao RX
é substituído, volume por volume, por sangue (para destruição dos linfócitos T e B), agitado 3-4
compatível do doador, concentrado a um hematócrito minutos durante o procedimento e utilizado após
de 70%. Isto aumenta o transporte de oxigênio aos prova cruzada com o sangue receptor.
seus tecidos sem sobrecarregar a circulação, e usa- Complicações existem decorrentes do cateter
se apenas um volume de sangue da criança para a umbilical, hemodinâmicas e metabólicas. O cateter
troca. Infelizmente, haverá apenas remoção parcial pode introduzir infecções ou êmbolos gasosos,
das hemácias sensibilizadas da doença Rh ou podendo também levar à trombose aórtica ou da
intrinsecamente deficientes da alfa-talassemia ou da veia porta. Hemorragia ao nível da veia umbilical
deficiência de piruvatoquinase. As hemácias residuais ou a temível enterocolite necrosante aguda. Muita
serão destruídas, e uma exsangüineotransfusão rapidez no procedimento pode levar a choque
padrão, com dois volumes de sangue total, é hemodinâmico com deterioração cardiorrespiratória,
posteriormente necessária. Como essas crianças e sangue gelado pode produzir arritmias ou parada
severamente anêmicas, edemaciadas, com ascite, cardíaca. Ainda, hipoglicemia de rechaço,
apresentam uma pressão venosa umbilical elevada, hipocalcemia, hiperpotassemia (K+ eleva-se 1 mEq/

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 249


Neonatologia
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l/dia em sangue guardado), acidose metabólica, (1982) encontrou um aumento de 41% na eficiên-
hipoxia tecidual (2-3 DPG das hemácias diminuem cia em remover bilirrubina, especialmente em pe-
10% por dia, comprometendo a cur va de quenos prematuros. Não esquecer que 1 g de
dissociação do oxigênio ao nível dos tecidos), albumina eleva o volume plasmático em 17 ml, em
hipotermia (cuidado com queimaduras com uso de função de seu poder oncótico, o que contra-indica
colchão elétrico), alcalose metabólica pós- na vigência de edema ou hipoalbuminemia severa.
transfusional e fibroplasia retrolental (toxicidade da Quando usamos albumina prévia, devemos aumentar
HbA/O2). Freqüentemente, indicamos o uso de uma em 34 ml (17 ml x 2) por quilo o volume total de
transfusão de albumina humana a 25% (1 grama / sangue do doador a ser utilizado, ultrapassando os
kg), 60-90 minutos antes da exsangüíneo, e Odell dois volumes usuais.

Quadro 2 - Normas para tratamento da hiperbilirrubinemia neonatal (Pn > 1.000 g)*

Bilirrubina Peso
sérica de < 24 horas 24-48 horas 48-96 horas 5° ao 10° dia
mg/100 ml nascimento

< 5 Qualquer

5-9 Qualquer Fototerapia


se hemólise

10-14 < 1.500 g Exsangüíneo Fototerapia Fototerapia


se hemólise

> 1.500 g Fototerapia

15-19 < 1.500 g Exsangüíneo Fototerapia Fototerapia Fototerapia


Considerar Considerar
exsangüíneo exsangüíneo

> 1.500 g Fototerapia Fototerapia Fototerapia Fototerapia

> 20 Qualquer Exsangüíneo Exsangüíneo Exsangüíneo Considerar


exsangüíneo

Observar Investigar icterícia


* Usar fototerapia após toda exsangüineotransfusão

Em presença de:
1. Asfixia perinatal
2. Sofrimento respiratório
3. Acidose metabólica (pH 7,25 ou abaixo) Considerar como fatores de risco
4. Hipotermia (temperatura abaixo de 35°C) que exigem conduta individualizada
5. Proteína sérica baixa (5 g/100 ml ou menos) para cada paciente (ver Quadro 3)
6. Peso ao nascer < 1.000 g
7. Sinais de deterioração clínica ou do SNC

(Modificado de Brown, A.K., Klaus, M.H. e Fanaroff, A.A.) (Alves Filho, N – 1999)

250 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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Quadro 3 - Máximo de bilirrubina indireta sérica recomendado como seguro para o SNC (mg/dl)

Peso de nascimento (em gramas) Curso clínico não-complicado Curso clínico complicado*
Menos de 1.250 13 10
1.250 - 1.499 15 13
1.500 - 1.999 17 15
2.000 - 2.499 18 17
Mais de 2.500 20 18
* Curso clínico complicado inclui asfixia perinatal, acidose, hipotermia significativa e persistente,
hipo-albuminemia, meningite, sepse, hemólise, hipoglicemia.
** Lee, K.S. et al. – Clin. Perinatolog., 4:305, 1977.

Atualmente, a irradiação de recém-nascidos ictéricos fototerapia, 2 a 6% da bilirrubina sérica total são


durante a vida neonatal com luzes fluorescentes é o constituídos por lumirrubina, ao contrário da
tratamento mais comum da icterícia do recém-nascido. fotobilirrubina, que chega a 20% do total. Lumirrubina
Após a publicação despretensiosa de Cremer (1958) é um isômero estrutural, e não espacial, sendo
sobre o efeito de luz fluorescente na queda da eliminado do organismo mais facilmente do que o
hiperbilirrubinemia indireta, nos 25 anos subseqüentes isômero configuracional ZZ, EE, numa razão de duas
o tratamento foi universalmente aceito e objeto de horas para o primeiro contra 15 horas para o segundo
múltiplas publicações e debates. Estudiosos latino- em média. Apesar de a lumirrubina ser um fotoproduto
americanos como Mellone (São Paulo), Azarias que aparece em menor quantidade, pela sua rapidez
Carvalho (São Paulo), Obes Polleri (Montevidéu) e de excreção e por ser um composto irreversível, torna-
Larguia (Buenos Aires) mantiveram acesa a chama se mais importante do que a fotobilirrubina ou a
da eficiência do tratamento, apesar de bilirrubina. Costarino e cols. (1988), expondo
desconhecerem quase tudo do seu mecanismo de prematuros extremos à luz azul (12 microwatts/cm2/
ação, até que Lucey (1969) redescobriu a fototerapia nm) ou mesmo à luz verde, que começa a ser
para a língua inglesa. Desde então, vantagens e preconizada nos EUA (Maisels, Levin, 1993),
desvantagens do método se somam anualmente, sem conseguiram aumentar de 0,7% para 1,3% a
contudo diminuir o mérito de sua eficiência. proporção de lumirrubina sérica, mostrando que ela
também aumenta com maior concentração de
Entendemos que sua aplicação atual está na
irradiação sobre a pele, e ao contrário dos outros
prevenção de hiperbilirrubinemias progressivas que
dois produtos de fotodegradação da bilirrubina tem
levariam à transfusão de substituição ou como
uma relação dose-resposta que a torna a mais
coadjuvante desta.
importante de todas. Vários tipos de luz fluorescente
A bilirrubina não-conjugada, tanto em tubos de vêm sendo usados nos aparelhos, desde a luz branca-
laboratório quanto na pele, é fotoisomerizada pela fria, luz azul comum, luz azul especial e ultimamente
luz fluorescente, na faixa azul do espectro solar, luz branca com filamento de tungstênio. Considerando
comprimento de onda 425-475 nm e irradiância maior que o pico de irradiação entre 425-475 nanômetros
do que 4 microwatts/cm2 de pele, para um isômero de comprimento de onda, ideal para ser absorvido
transparente, hidrossolúvel, não-neurotóxico, conhecido pela bilirrubina, é mais bem encontrado nas luzes
como fotobilirrubina (bilirrubina E). Mais recentemente, monocromáticas azuis, não encontramos razão para
reconheceu-se que uma ciclização intramolecular da o uso de luz branca, desde que não haja contra-
bilirrubina ocorre na presença da luz de 450 nm, indicação em manter-se o recém-nascido debaixo de
formando uma outra substância, conhecida como um facho de luz monocromática. Os aparelhos devem
lumirrubina, excretada pela bile sem necessidade de ter um mínimo de seis lâmpadas azuis de 20 watts
conjugação, assim como pela urina. Durante cada, dispostas a 50 cm de altura da criança, bem

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 251


Neonatologia
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fixadas e impedidas de hiperaquecimento através de num isômero, diazopositivo, não-conjugado, que é


cuidadosa instalação elétrica. A luminância dessas assim eliminado pela bile e pelas fezes,
lâmpadas parecerá, aos nossos olhos, menos intensa sobrecarregando a circulação êntero-hepática de
do que a das luzes brancas, pois terão bilirrubina, caso haja diminuição do trânsito intestinal
proporcionalmente menos watts de intensidade luminosa ou jejum prolongado (fotobilirrubina). Até recentemente,
que as últimas. No entanto, a irradiação, medida em acreditava-se que o mecanismo predominante ou até
unidades flux, será 2-3 vezes mais intensa nas luzes único era o primeiro, onde a luz, através de uma
azuis comuns existentes no mercado brasileiro (Silvânia reação de auto-sensibilização da bilirrubina indireta,
A-2, GE azul, Philips blue) do que nas brancas (“luz capta oxigênio livre na circulação, reação que se
do dia”). No entanto, sabe-se que a luminância, que processa com o uso de um elétron (da luz) para cada
é medida pelos fotômetros fotográficos, não se perde molécula de bilirrubina. Lightner (1979) demonstrou
senão em meses, enquanto a irradiação, que é medida que outro mecanismo distinto dessa decomposição
por espectrofotômetros, perde-se com rapidez, de modo por oxidação existe na ação da luz sobre a bilirrubina
que a meia-vida da lâmpada azul comum, fabricada IX-alfa (ZZ), levando à formação de três isômeros,
no Brasil, de pior qualidade que as importadas chamados fotobilirrubinas. Não há necessidade de
(Carvalho e cols., 1993), utilizada em aparelho que utilização de oxigênio, é mais rápido do que a
se aqueça pouco, encontra-se em torno de 700-1.000 fotoxidação aeróbica e requer muito menos intensidade
horas, tempo decorrido que exigirá a troca das luminosa.
lâmpadas, para manter-se a eficiência da fototerapia.
Esses isômeros, IX-alfa (EZ) e IX-alfa (EE), não têm as
Vogl (1978) e Santella (1982) vêm valorizando a
ligações hidrogeniônicas intramoleculares da forma
fototerapia intermitente (15 minutos acesa / 60 minutos
ácida natural ZZ, sendo mais polares, menos
apagada). Indyk (1976) sugere seis horas acesas e
lipofílicos, mais ácidos, transportados pelo plasma
seis horas apagadas. Isto contribui para uma perda
até o fígado, onde são excretados sem glicuronização
irregular do fósforo existente no vácuo do bulbo. Esta
e, ao nível do intestino, estimulam o peristaltismo.
deterioração limita à metade a vida útil de uma
No plasma, as fotobilirrubinas são dosadas junto
lâmpada para fototerapia. Indyk (1982) encontrou
com a bilirrubina indireta, pelo diazorreagente,
eficiência indiscutível, in vivo, com o uso de um
aumentando os valores dessa bilirrubinemia.
aparelho que funciona como um flash, que se repete
1.440 vezes no decorrer de 24 horas. Vecchi (1982) Assim, produzem uma sobrecarga de retorno ao
utilizou luz verde contínua e Ennever (1983) comprovou plasma pela circulação êntero-hepática, já que a
que luz azul em fototerapia contínua deve ser o reação é reversível, voltando a fotobilirrubina à sua
procedimento utilizado, à luz dos conhecimentos atuais, forma original IX-alfa (ZZ) no tubo intestinal, longe do
retirando-se a criança apenas para a amamentação efeito da luz. O sítio de ação para esse efeito da
e o estímulo à ligação pais-filhos. fototerapia são a pele e o leito capilar cutâneo
superficial (2 mm de espessura), de modo que isso
Concluiu, também, que a eficiência das lâmpadas explica o que todo neonatologista confirma, na
deve ser confirmada por espectrofotômetro a cada prática, qual seja a presença de pele intensamente
200 horas, já que não há previsão confiável para corada de amarelo sob as bandas oculares, nas
sua vida útil. Se não temos condição de confirmar axilas e em outros locais onde há pouca incidência
essa eficiência, sempre que existir uma falha clínica de luz e fototerapia, quando comparada com a pele
do aparelho, trocar as lâmpadas, independente de exposta. Também parece que a luz consegue alcançar
sua idade de uso. Quanto ao efeito da luz sobre o a intimidade do fígado, incidindo no hipocôndrio
metabolismo da bilirrubina, devemos reconhecer três direito, pois Rubaltello comprovou a diminuição de
processos distintos que são responsáveis pela sua resultado quando essa região era ocluída durante a
aplicação terapêutica. fototerapia. Como a interação do fóton sobre a
No primeiro, a bilirrubina é oxidada a biliverdina, molécula de bilirrubina na pele ocorre em fração de
pigmento mais polar, diazonegativo, hidrossolúvel, segundos e acredita-se que em menos de um minuto
excretado pela bile e fezes e menos pela urina. outra molécula ZZ ocupa o lugar daquela EE (principal
fotoisômero) que já ganha o plasma, surgiram os
No segundo, a bilirrubina, sob ação da luz, sofre defensores da fototerapia descontínua ou em flashs.
uma fotoisomerização geométrica, transformando-se Parece que esse mecanismo de fotoisomerização

252 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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geométrica da bilirrubina IX-alfa (ZZ), onde os anéis Vários possíveis efeitos biológicos e complicações
pirrólicos A e D realizam uma rotação de 180°, da fototerapia foram copilados nos últimos anos da
levando ligações nitrogenadas e lactâmicas literatura. Citaremos apenas aqueles que o autor
hidrogeniônicas, a se exporem ao ambiente externo, considera mais importantes:
tornando o produto final muito hidrossolúvel, 1. Alterações de ritmos circadianos mediados pela
compreende cerca de 80-85% do efeito da luz, como menarca, ovulação, função gonadal,
fototerapia. Portanto, é mais importante do que a função supra-renal, síntese de gonadotrofina, síntese
formação da biliverdina. Isso explica por que Storey de melanina, síntese de vitamina D.
(Austrália, 1974), estudando gêmeos monozigóticos,
2. Hipertermia, queimaduras, desidratação,
encontrou efeito sensível da luz sobre o gêmeo ictérico
hemoconcentração. O uso de lâmpadas azuis ou a
tratado quando os valores plasmáticos de bilirrubina
colocação de dois vidros de plexiglás sob as
indireta ultrapassaram 9 mg%; portanto, com pele
lâmpadas brancas diminui a presença de raios
impregnada, quando comparado com o gêmeo não-
infravermelhos (> 600 nm) ou ultravioletas (< 350
tratado. Também explica a pouca ação da fototerapia
nm), que podem aumentar de 2-3 vezes a perda
profilática em prematuros extremos, em riscos de
insensível de água pela pele.
icterícia, e sugere que recém-nascidos com pele negra
(raros) sejam pouco sensíveis ao procedimento. 3. Dano retiniano. Ocluir os olhos, com higiene
diária para impedir conjuntivite. Cuidado para não
No terceiro processo, também sob fototerapia, há
obstruir as narinas. A oclusão ocular parece
uma fotoisomerização estrutural, já citada, levando
responsável por distensão abdominal.
ao aparecimento da lumirrubina — “talvez o mais
importante produto de degradação de bilirrubina 4. Alteração no trânsito intestinal. Acreditava-se haver
indireta atualmente conhecido” (Maisels, 1994). redução no trânsito intestinal, associada à diarréia
Convém lembrar também que, à luz desses recentes por deficiência de lactase. Parece haver, sim,
conhecimentos, a bilirrubina direta que impregna muito peristaltismo normal ou aumentado, ausência de
mais facilmente a pele (é o caso na hepatite vírica) lactase na borda em escova dos enterócitos,
também é fotoisomerizada para um pigmento escuro, substâncias redutoras nas fezes líquidas e necessidade
chamado pigmento desconhecido (unknown pigment), de aumentar em 10-20% o balanço diário de água,
antes considerado como porfirina polimerizada, que sódio, potássio e nitrogênio.
também ganha a bile, dando-lhe uma coloração 5. Pouco ganho pondoestatural. Apenas durante o
marrom-escura, mas principalmente impregna por uso da fototerapia. Manter amamentação regular
meses a pele da criança, na chamada “síndrome do (Maisels, 1994).
bebê de bronze”.
6. Aumento da circulação periférica. Causa
Atualmente, em nosso serviço, indicamos a fototerapia acentuação clínica de cianose preexistente. Com uso
nas seguintes situações: (1) doença hemolítica de luz azul, fica prejudicado o diagnóstico de
perinatal, como preventiva da exsangüineotransfusão cianose.
(principalmente na ABO) ou como coadjuvante pós- 7. “Rashes” cutâneos. A injúria da pele causa
exsangüíneo (impedindo repetição); (2) recém-nascido fotossensibilização nos mastócitos, com liberação de
doente onde a bilirrubina indireta alcança 8-10 mg% histamina (Levine, 1993).
e onde a bilirrubina direta não ultrapassa 2 mg%
8. Hemólise. Fotossensibilização das hemácias e
(“risco de bebê de bronze”); (3) recém-nascidos sadios
talvez das plaquetas, levando à anemia e
e de bom peso onde a bilirrubina indireta alcança
plaquetopenia (50.000 / mm3) sem significado
mais de 15 mg% antes do quinto dia de vida.
clínico. Haveria indicação para o uso de vitamina E
Com essa conduta, tentamos diminuir a iatrogenia (Valaes, 1992).
da separação desnecessária pais-filhos e o uso
9. Dano ao DNA intracelular. A luz excessiva é
abusivo da fototerapia, mascarando quadros clínicos
considerada mutagênica, com a agravante de estar
ainda sem diagnóstico. Não usamos colestiramina
incidindo num organismo que viveu toda a gestação
para diminuir a circulação êntero-hepática de
no escuro.
fotobilirrubina, nem oclusão dos testículos (efeito calor),
mas sim a oclusão ocular com tampão preto e 10. Diminuição de riboflavina no plasma. Com
hidratação oral abundante. vitamina fotossensível, uma deficiência transitória

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 253


Neonatologia
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ocorrerá especialmente naqueles alimentados com Também em todas as situações semelhantes, onde se
leite humano, pobre nessa vitamina. Não há prevê uma icterícia neonatal acentuada.
significado clínico conhecido.
A dose de 50-75 mg/dia deve ser dada à mãe na
11. Outros: Hipocalcemia (via pineal?), queda nos semana que antecede o parto. Drogas de efeito
níveis de ácidos graxos livres, aumento de crises de semelhante seriam a antipirina, os salicilatos, a
apnéia em pequenos prematuros, priapismo, sucção heroína, o álcool, os derivados do DDT, sem
pobre, sonolência, avaliação prejudicada de icterícia, aplicação clínica.
estrabismo futuro, acidentes elétricos, trauma por Em doença hemolítica perinatal muito severa, por
queda da lâmpada sobre a criança, impacto incompatibilidade Rh, o feto morre in utero, de anemia
emocional sobre os familiares. e hidropisia, antes que possa nascer. Numa tentativa
Em conclusão, apesar de não ser um tratamento de prolongar a vida intra-uterina de tais crianças, em
isento de riscos, desde que afastada a iatrogenia da uma gestação onde o risco de prematuridade não é
má indicação e respeitados a ligação mãe-filho e o muito grande, a transfusão intraperitoneal fetal intra-
estímulo ao aleitamento materno, não há uterina foi desenvolvida. Historicamente,
comprovação de que os benefícios da redução de Recklinghausen (1863) experimentou transfusão
até 7 mg% por dia nos níveis da bilirrubina indireta intraperitoneal em animais. Ponfick (1875) realizou
pela fototerapia bem-feita possam ser superados pelos a primeira transfusão intraperitoneal no homem, e
malefícios dos efeitos colaterais conhecidos (Polin, Golgi (1880) mostrou evidente aumento da
1994).Recentemente, foram apresentados novos hemoglobinemia após transfusão intraperitoneal. Em
aparelhos de fototerapia de 4a geração, utilizando 1936, Allan fotografou a passagem de hemácias
diiodos emissores de luz (LEDs) de nitrito de galio, em estomas existentes entre as células mesoteliais
de megaintensidade de irradiação, altamente peritoneais.
resolutiva em ratos Gunn (Lan-Chan et al) (SPR-1999). Courtice e cols. (1953) comprovaram que a absorção
dos elementos figurados ocorre através do duto
C. Fenobarbital e outros linfático direto. Com esses e outros conhecimentos
Vários agentes farmacológicos são capazes de induzir bem estabelecidos, Liley (1963), na Nova Zelândia,
o sistema de captação, conjugação e excreção de transfundiu in utero um feto Rh positivo isoimunizado.
bilirrubina indireta ao nível do hepatócito. Como Freda e Adamson (1964) realizaram uma
vimos, o fenobarbital pode promover essa indução exsangüineotransfusão intra-uterina, e Hinselman e
enzimática e de transporte, abolindo a fase I da Kubli (1968), uma transfusão intra-amniótica de
icterícia “fisiológica” e reduzindo os níveis sangüíneos sangue, com resultados duvidosos. Desde então, a
de pigmento na síndrome de Crigler-Najjar tipo II. técnica de Liley se firmou e hoje é praticada
unicamente naqueles casos de gestantes Rh negativo
Também parece diminuir a circulação êntero-hepática isoimunizadas em que, seguramente, seus fetos
de bilirrubina. No entanto, cerca de 48 horas são morreriam antes que se pudesse realizar um parto
necessárias para o início de sua ação no hepatócito, prematuro com alguma maior possibilidade de
além de levar à sonolência e pobre sucção ao recém- sobrevivência (Friesen e Bowman, 1969).
nascido, o que, praticamente, o contra-indica na
icterícia neonatal das doenças hemolíticas e outras As provas de gravidade da doença que indicam o
com rápida elevação dos níveis plasmáticos do procedimento excepcional incluem: (1) história anterior
pigmento de reação indireta. Atualmente, ganha de gestações afetadas com alto grau de
entusiasmo o seu uso em gestantes grupo sangüíneo acometimento fetal (prova anamnésica); (2) altos títulos
O cujos maridos são do grupo A ou B, naquelas de anticorpos maternos anti-Rh (índice de
que terão filhos certamente prematuros, nas gestantes sensibilização); (3) estudo espectrofotométrico do
Rh negativo sensibilizadas cujos fetos apresentam a líquido amniótico indicando zona de transfusão intra-
doença hemolítica, nas diabéticas com parto cesáreo uterina nos gráficos de Freda ou Liley (prova
programado para 38 semanas, nas japonesas fundamental). Deve ser ela intravascular, por
grávidas ou nas gestantes habitantes da ilha de Lesbos cordocentese.
(Grécia), onde há 15% de incidência de deficiência Apesar de a transfusão intra-uterina em fetos Rh
de G-6-P-D em recém-nascidos do sexo masculino. positivo anêmicos ser procedimento salva-vidas,

254 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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requer grande habilidade, não está isenta de peri- porquanto oferece uma moderada percentagem de
gos e não é substitutiva da cesárea eletiva em êxitos, devendo ser encorajada nos maiores centros
casos moderadamente afetados, ou quando sufici- brasileiros.
entemente maduro o feto (32 semanas). As condi-
ções para a realização de transfusões intra-uterinas
exigem plena concordância materna e paterna (con- IV. PREVENÇÃO
dição jurídica), gestante informada sobre as possi- Tanto a fototerapia quanto o fenobarbital podem ser
bilidades de êxito e fracasso da operação e de usados para a prevenção da hiperbilirrubinemia, mas
que o feto certamente morreria in utero sem possi- seu uso profilático não encontra indicação, pois
bilidade de sobrevivência se precipitado o parto, apenas 5% dos recém-nascidos poderiam beneficiar-
para decisão com pleno conhecimento de causa e se deles.
tranqüilidade para o ato cirúrgico (condição médi-
A alimentação precoce é fundamental aqui, para
co-psicológica). As condições fetais exigem vitali-
diminuir a circulação êntero-hepática de bilirrubina,
dade para beneficiar-se da transfusão, conhecimen-
talvez o principal fator causal da icterícia própria do
to da idade gestacional e comportamento do feto
recém-nascido (“fisiológica”). É evidente que há uma
intra-útero, só a realizando antes de 32 semanas.
necessidade crescente de melhor conhecimento do
As condições do operador devem ser de prudência
metabolismo da bilirrubina e da sua toxicidade para
respeitosa, membro de uma equipe responsável e
o SNC e outros tecidos. Contribuição importante foi
com progressiva e evidente melhora de sua técnica
o advento da imunoglobulina anti-Rh (D) para a
com experiência firmada. Em Belo Horizonte, há
prevenção de isoimunização Rhesus. Desde 1992,
um Centro Regional de Atendimento às Gestantes
Valaes, Vreman, Stevenson e outros (EUA, Canadá,
Rh negativo, coordenado por Mário Dias Corrêa,
Europa) vêm investigando o uso de inibidor de
já com mais de uma centena de transfusões intra-
hemeoxigenase, tin-proto-porfirina (TPP), SC ou IM
uterinas realizadas, bons resultados e acompanha-
logo ao nascer para prevenção da icterícia neonatal
mento das crianças tratadas (prova prospectiva).
em RN e risco maior. É um fotossensibilizador e não
Condições técnicas difíceis existem em fetos peque-
deve ser usado com fototerapia. Proto e mesoporfirinas
nos, na gemelaridade, estando contra-indicado o
contendo estanho (Tin), zinco, manganês, crômio,
procedimento em fetos hidrópicos (“sinal do halo”
níquel, magnésio vêm sendo estudadas já que a
positivo no couro cabeludo fetal). A assistência
metaloporfirina ideal como inibidora deve conter um
neonatal exige pediatra treinado para a correção
metal biocompatível, não degradável em tecidos,
da hipoglicemia e acidose metabólica,
sem reações fotossensíveis e de alta eficiência. É um
hipoalbuminemia, anemia severa, icterícia muito
tratamento não ortodoxo, de engenharia biológica,
precoce, insuficiência cardíaca e ascite que
de conseqüências pouco conhecidas e ainda não
prejudica a respiração. SARI grave é precoce, e
aprovado para uso clínico. A individualização das
hipoxia perinatal, importante. O prognóstico
crianças a risco de toxicidade pela bilirrubina precisa
depende da gravidade do acometimento fetal no
ter metodologia mais simplificada. A correlação com
momento de se tomar a decisão pelo procedimento,
circunstâncias clínicas associadas dentro dos primeiros
do número de transfusões, da prática e experiência
anos de vida torna-se imperativa, através de estudos
do grupo de trabalho e do bom resultado das
prospectivos de crianças tratadas ou não. A arte no
exsangüineotransfusões imediata e precoce.
reconhecimento e na conduta da hiperbilirrubinemia
A correção dos distúrbios metabólicos, sempre neonatal tem progredido muito nos últimos anos, de
presentes na primeira semana de vida pós-natal, exige modo que estamos entrando numa era altamente
cuidados intensivos. Em conclusão, a transfusão intra- científica nesta área, onde a prevenção certamente
uterina é um método razoável de tratamento, substituirá o tratamento, na maioria dos casos.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 255


Neonatologia
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Anemias no Período Neonatal


FLÁVIO ADOLFO COSTA VAZ

O oxigênio, fonte geradora de energia, é a substância chamamos Cascata de Eritropoese. Na observação


vital contida no sangue. Encontra-se misturado a outros da Cascata, já podemos destacar a ação de um
gases e poluentes no ar atmosférico, é captado nos hormônio ( EPO), atuando nos BFU-E maduros, CFU-
pulmões pelo eritrócito através do seu pigmento, a E, Pró-Eritroblastos, Eritroblastos Basófilos, Eritroblastos
hemoglobina, fixado e transportado através dos vasos Policromáticos, Eritroblastos Ortocromáticos,
pela ação da bomba cardíaca até a intimidade dos Reticulócitos e Eritrócitos. É importante salientar que
tecidos, onde será liberado para a célula a fim de a EPO promove e estimula o crescimento e a
participar de reações bioquímicas envolvendo diferenciação de células eritróides, mas não as
oxirredução e produzir a energia necessária ao sintetiza.
crescimento e desenvolvimento do ser.
Analisemos então algumas situações que precisam
O sistema hematopoético é o primeiro a ser formado ser clareadas e entendidas em sua fisiologia, a fim
no ser humano, na segunda semana da vida de permitir o bom uso da EPO. No feto humano, do
intrauterina, a partir de células pluripotentes do 3º ao 5º mês lunar (12ª a 20ª semana de vida intra-
mesênquina do saco vitelino (tecido conectivo uterina), o fígado é órgão fundamentalmente
embrionário). Para a produção do eritrócito e de sua hematopoético: sintetiza EPO, 50% das células
hemoglobina serão necessários proteínas, Fe, hepáticas são percursores eritróides, produz maior
hormônios, vitaminas, sais minerais e enzimas. percentual de HbF e sedia a hemocaterese. Destaque
Para cada estágio do desenvolvimento embrionário, para a EPO que foi isolada de urina humana e
fetal e neonatal haverá um órgao principal purificada por Miyake e col, em 1977. O genoma
respondendo pela produção do eritrócito e da do DNA humano responsável pela produção de EPO
hemoblobina. Eritrócito especial e hemoglobina foi identificado e clonado (técnica do DNA
especial, próprios para satisfazer a demanda de 02 recombinante – Lee Huang, 1984). A EPO natural e
para aquela etapa da vida do ser humano. a EPO-rHU são comparáveis biológica e
imunologicamente (Jacobs e col, 1985 e Lin e col.,
O embrião tem no tecido conectivo embrionário do 1985) enquanto que Shannon, em 1987, mostrava
órgão hematopoético principal; o feto o tem no fígado que colônias eritróides de sangue de RN-PT
e, posteriormente, também na medula óssea e o respondem igualmente à EPO-rHU e à EPO isolada
recém-nascido, na medula óssea. É evidente que a de sangue humano.
passagem do comando da eritropoese de um órgão
ou sistema para outro é sempre gradativa, em função Vários outros autores também demonstraram que a
da idade gestacional. EPO aumenta durante a vida intra-uterina, apresen-
tando níveis elevados no sangue do cordão, em
Pelas suas características atômicas e ser metal de
recém-nascidos hipoxiados, anêmicos e pequenos
transição, o ferro (Fe) foi destinado a compor a
para a idade gestacional. Demonstraram também
hemoglobina. A sua importância no processo todo é
que: 1- A célula hepática é menos sensível à hipoxia,
tal que o organismo não possui um sistema (ou órgão)
requerendo maior tempo de estímulo hipóxico para
para excretar o Fe proveniente da hemocaterese. Ele
a produção de EPO (10% da produção renal de
é totalmente armazenado no(s) órgão(s) eritropoéticos.
EPO ao mesmo estímulo – Zallmann, 1974). 2- O
Na eritropoese, parte-se da C.P.P. (célula primitiva aumento de Hb-F estimula a produção fetal de EPO;
pluripotente), que junto com os nutrientes (Fe, o aumento de Hb-A no feto diminui a produção de
proteínas, etc.) e sob ação de glicoproteínas com EPO. Disto decorre que deficiência relativa causará
função de regulação da hamatopoese as citoquinas anemia tardia da prematuridade (Phibbs e col., 1994
(fatores estimuladores de colônia e as interleucemias) e Shannon e col., 1992). 3- Existem prematuridade
e a eritropoetina (EPO) e termina no eritrócito com (Ohls, 1994). 4- A ação do sensor de O2: proteína
sua hemoglobina, num processo complexo que contendo grupo heme é exposta na superfície de

256 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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células produtoras de EPO, sensível às variações de tecidual decorrente da alteração dos transportadores
pO2. Em 1999, Costa e cols., em São Paulo, de oxigênio, da capacidade de liberá-lo às células
demonstraram que a administração subcutânea de e estas, de o aproveitar.
400 U/Kg de EPO em RN-PT, de diferentes idades
gestacionais, pós-natal e de peso, sem nenhum efeito A anemia neonatal poderá ser classificada,
adverso, elevou a concentração plasmática da EPO etiopatogenicamente, em cinco tipos:
já nas primeiras horas, atingindo o pico em termo 1. Anemia por produção sangüínea inadequada;
da 6ª hora, decrescendo a seguir, mantendo na 72ª
hora concentração praticamente dobrada em relação 2. Anemia por perda de sangue;
à inicial, antes da administração. 3. Anemia por destruição de sangue;
Consideremos um problema de elevada importância
4. Anemia paradoxal (cardiopatas cianóticos,
no período neonatal: a anemia. A anemia poderá
variações bruscas de altitude, etc);
ser conceituada do ponto de vista metabólico como
afecção caracterizada por deficiência de oxigênação 5. Anemia da prematuridade.

Dor no Recém-Nascido
RENATO SOIBELMANN PROCIANOY

1. DEFINIÇÃO Anand e colaboradores mostraram que recém-nascidos


que eram submetidos a ligadura cirúrgica de canal
Segundo a Associação Internacional para o Estudo arterial sem cuidados de analgesia tinham aumento
da Dor a definição de dor é: “A dor é uma dos níveis séricos de adrenalina, noradrenalina,
experiência sensorial e emocional desagradável glucagon, aldosterona e corticosteróides e também
associada a uma lesão tecidual real, potencial ou apresentavam maior número de complicações no pós-
descrita como tal lesão. A dor é sempre subjetiva.” operatório .

Hoje se sabe que os recém-nascidos a termo e


2. DOR NO RECÉM-NASCIDO prematuros sentem dor e apresentam alterações
Durante muitas décadas imaginou-se que o recém- fisiológicas e comportamentais decorrentes dos
nascido não sentia dor por imaturidade do sistema estímulos dolorosos.
nervoso central e pela baixa mielinização de suas
fibras nervosas.
3. AVALIAÇÃO DA DOR
Dessa forma, inúmeros procedimentos que
sabidamente eram dolorosos para adultos, eram feitos NO RECÉM-NASCIDO
em recém-nascidos sem qualquer cuidado analgésico. Alterações fisiológicas e comportamentais são
Somente, a partir da década de 80, surgiram alguns utilizadas para avaliar a presença de dor no recém-
estudos sugerindo a possibilidade de que o recém- nascido, uma vez que o aspecto verbal não está
nascido sentisse dor. presente.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 257


Neonatologia
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3.1. Indicadores fisiológicos 3.2 . Indicadores comportamentais


Os indicadores fisiológicos que se avalia para a Os indicadores comportamentais são os mais
presença de dor são as respostas cárdio - vasculares adequados para a detecção da presença de dor,
e respiratórias e as respostas endócrino - metabólicas. pois parecem ser mais sensíveis e específicos que os
As respostas cárdio – vasculares e respiratórias indicadores fisiológicos.
observadas são: aumento da freqüência cardíaca,
da freqüência respiratória e da pressão arterial Os indicadores comportamentais observados são:
sistólica, diminuição da saturação de oxigênio e da choro, expressão facial e resposta motora.
pressão parcial de oxigênio no sangue.
O choro é menos utilizado como critério de existência
As respostas endócrino - metabólicas observadas são: de dor, uma vez que o recém-nascido pode chorar
aumento das catecolaminas, corticosteróides por outros motivos.
,hormônio do crescimento e glucagon e diminuição
da insulina. Ocorre também aumento da glicemia e A expressão facial é avaliada através da escala
aparecimento de acidose láctica . NFCS.

Sistema de Codificação da Atividade Facial Neonatal – NFCS

Movimento Facial 0 Pontos 1 Ponto

Fronte Saliente Ausente Presente

Fenda Palpebral Estreitada Ausente Presente

Sulco Naso-Labial Aprofundado Ausente Presente

Boca Aberta Ausente Presente

Boca Estirada (horizontal ou vertical) Ausente Presente

Língua Tensa Ausente Presente

Protrusão da Língua Ausente Presente

Tremor de Queixo Ausente Presente

Escore máximo: 8 pontos. Considera-se a presença de dor quando três ou mais movimentos faciais aparecem de
maneira consistente, durante a avaliação da presença de dor.

A resposta motora é avaliada pela escala NIPS.

NIPS 0 pontos 1 ponto 2 pontos

Expressão Facial Relaxada Contraída –

Choro Ausente “resmungos” vigoroso

Respiração Relaxada diferente do basal –

Braços Relaxados fletidos/estendidos –

Pernas Relaxadas fletidas/estendidas –

Estado de Consciência Dormindo/calmo Desconfortável –

A pontuação varia de zero a sete , definindo-se dor para valores ≥ 4 pontos

258 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA


Neonatologia
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4. TRATAMENTO DA DOR No tratamento medicamentoso opióide utiliza-se


morfina ou fentanil.
Indica-se tratamento da dor no recém – nascido em:
procedimentos dolorosos, procedimentos cirúrgicos,
Morfina: 0,1 mg/kg/dose 4/4/ horas EV ou infusão
enterocolite necrosante, tocotraumatismo e ventilação
contínua para recém-nascido a termo: 5 a 20 mcg/
mecânica.
kg/hora e para recém-nascido prematuro: 2 a 5
O tratamento pode ser não medicamentoso através da mcg/kg/hora.
sucção não nutritiva (uso de chupeta) ou uso de solução
de água com açúcar 2 minutos antes do estímulo doloroso.
Fentanil: 1 a 4 mcg/kg/dose 4/4 horas EV ou
No tratamento medicamentoso feito com medicação infusão contínua para recém-nascido a termo: 0,5 a
não opióide utiliza-se paracetamol na dose de 10 a 2,0 mcg/kg/hora e para recém-nascido prematuro:
15 mg/kg/dose por via oral. 0,5 a 1,0 mcg/kg/hora.

Diagnóstico Diferencial de
Distress Respiratório no Recém-Nascido
WILMAR MENDONÇA GUIMARÃES

O diagnóstico diferencial de recém nascidos com medida que a resistência vascular pulmonar diminui
dificuldade respiratória é o desafio mais freqüente passando a perfundir o parênquima . Isto é perfusão
que se apresenta ao pediatra e neonatologista. Nem pulmonar.
sempre muito difícil , pode algumas vezes desafiar As manifestações clínicas costumam ser diferentes
a argúcia pois são numerosas as possibilidades das da criança maior por vários motivos. Como
diagnósticas. O uso do raciocínio clínico cotejando exemplo, a cianose só costuma aparecer quando a
os dados obstétricos e os achados no recém nascido tensão de oxigênio é menor de 40 mm de Hg, pela
oferecem os elementos diagnóstico na maioria das grande afinidade da hemoglobina fetal pelo gás.
vezes. Igualmente a maior complacência da caixa torácica
A transição da vida intra para a extra-uterina exige faz as retrações mais acentuadas, especialmente nos
grandes mudanças adaptativas no aparelho prematuros. O batimento da asa do nariz é a solução
respiratório . Em poucos minutos, o líquido pulmonar do RN para a redução da resistência nasal ,
presente nos pulmões é retirado ou absorvido, os responsável por 50% da resistência da via aérea. O
pulmões enchem-se de ar progressivamente. A gemido expiratório é respiração com as cordas
instalação da capacidade residual funcional é vocais parcialmente fechadas representa o esforço
importante pois propicia condições fisiológicas de de prolongar o ciclo respiratório para aumentar as
troca gasosa, mesmo durante a fase expiratória da trocas de gases.
ventilação. Isto é ventilação pulmonar. O fluxo O diagnóstico diferencial inclui as enfermidades do
sangüíneo pulmonar aumenta acentuadamente à quadro 1.

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 259


Neonatologia
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Quadro 1 – Causas

Desordens pulmonares
Membrana hialina
Aspiração de mecônio
Pneumonia
Taquipnéia transitória
Hemorragia pulmonar
Escapes de ar
Displasia broncopulmonar
Anomalias do desenvolvimento
Hipoplasia pulmonar
Enfisema lobar congênito
Quilotórax
Má formação adenomatóide cística
Cisto lobar congênito
Linfangiectasia pulmonar
Vias aéreas altas
Atresia de coanas
Micrognatia , Síndrome de Pierre Robin
Obstrução laringea
Paralisia , estenose , malácea de cordas vocais
Obstrução traqueal
Anormalidades diafragmáticas
Hérnia diafragmática
Eventração
Lesão de nervo frênico
Cardiovascular
Arritmias
Cardiopatia estrutural
Miocardiopatias
Hematológicas
Policitemia
Anemia
Doença neuromuscular
Sepsis - infeção
Deformidades da parede torácica
Doença metabólica
Hipoglicemia
Erros inatos do metabolismo
Outros
Asfixia
Hipotermia
Hipertermia

DOENÇAS RESPIRATÓRIAS inversa com a idade gestacional, aparece em cerca


ADQUIRIDAS de 80% dos RN entre 28 e 30 semanas de idade
gestacional. Outros fatores de risco incluem : diabetes
Membrana hialina materno, asfixia, sexo masculino, segundo gêmeo, e
É a causa mais comum de distress respiratório no história de recém nascido de gestação anterior com
RN prematuro, ocorrendo em 10 a 15% dos bebês o mesmo problema. Apresentam grau variado de
com menos de 2500 gr. Relacionada de forma taquipnéia ao nascer, batimento de asa do nariz,

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Neonatologia
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retrações, gemidos e cianose . Os sintomas costumam O quadro radiológico pode ser de condensação
aparecer nas primeiras 6 horas de vida. Apnéia e extensa ou esparsa. No prematuro o aspecto
diminuição dos ruídos respiratórios, são secundários ragiográfico pode simular a doença de membrana
a atelectasia que acompanham os acometimentos hialina. A existência de efusão pleural sugere E Coli,
mais graves. A dificuldade tende a piorar em 2 a 3 estáfilo ou estreptococo. Neutropenia < 1500 cel
dias e então inicia-se a melhora em 72 horas. RX de mm3 ou > 15000 cels mm3, relação de neutrófilos
tórax mostra padrão característico “em vidro moído“, imaturos sob totais igual ou maior de 0,2 e
diminuição do volume pulmonar e silhueta brônquica trombocitopenia sugerem a infeção.
visível os chamados “broncogramas aéreos“. Nas
formas severas o aspecto radiológico pode ser Taquipnéia transitória do recém nascido
completamente opaco. Mais freqüente nos meninos recém nascidos de parto
cesárea, também é chamada de distress tipo II.
Síndrome de aspiração de mecônio Comumente é uma desordem auto limitada que se
Cerca de 10 a 20 % de todos os nascituros podem apresenta nas primeiras horas de vida com taquipnéia,
estar tintos de mecônio, crescendo esta incidência gemidos e retrações que habitualmente não são graves.
com a chegada da pós maturidade. O síndrome de Raramente será necessário ventilação mecânica. Os
aspiração de mecônio porém é raro antes de 37 sintomas desaparecem dentro de um a dois dias sendo
semanas pelo padrão imaturo da motilidade intestinal. raro além do terceiro dia. Ao Rx líquido nas cisuras
Destes 10 a 20% apenas 2% aspiram líquido pulmonares , com acentuação da trama peri hilar.
amniótico com mecônio. As crianças apresentam grau
Discreta cardiomegalia pode ser vista algumas vezes.
de insuficiência respiratória proporcional á quantidade
de mecônio que entra nos pulmões. Cianose, Escapes de ar
taquipnéia e acidose predominam as manifestações
clínicas. A aspiração com a forma particulada de Os escapes pulmonares de ar (air leaks), corres-
mecônio, leva a hipoventilação acentuada e aumento pondem ao pneumotórax, pneumomediastino e ao
da resistência ao fluxo aéreo . A gasometria mostra enfisema intersticial pulmonar. A incidência de
hipercapnia, acidose respiratória e hipóxia de graus pneumotórax espontâneo é de 2% entre todos os
variáveis. Rx de tórax mostra quadro polimorfo com recém nascidos, sendo mais raro antes das 34 se-
graus variáveis de atelectasia, condensações e áreas manas.
de hiperinsuflção entremeadas a hipoventilação. O Quando existe uma enfermidade respiratória
diâmetro antero-posterior do tórax está freqüentemente subjacente a incidência aumenta acentuadamente
aumentado. Podem ser encontrados sinais de podendo chegar a 40% das crianças com distress
comprometimento do SNC. respiratório por mecônio e membrana hialina e 10%
na taquipnéia transitória. O pneumopericárdio é raro
Pneumonia neonatal e ocorre sempre em pacientes com ventilação
Menos de 1% das crianças a termo tem pneumonia mecânica. O enfisema intersticial pulmonar ocorre
neonatal, incidência que aumenta muito no prematuro, mais em prematuros que tem tecido conjuntivo de
cerca de 10%. O diagnóstico associa-se com sustentação da bainha dos vasos mais frouxo. A
freqüência a ruptura de membranas amnióticas por maioria dos pacientes com pneumotórax espontâneo
mais de 24 horas, especialmente nos partos e penumomediatino é assintomática.
prematuros e a achados clínicos no bebê como Clinicamente, além dos sintomas de dificuldade
instabilidade térmica, icterícia, dificuldades respiratória pode ser encontrado aumento do diâmetro
alimentares, vômitos, letargia em conjunção com antero-posterior do tórax, deslocamento do ictus e
distress respiratório. Petéquias, hepato-esplenomegalia hipotensão. O enfisema intersticial leva a progressiva
e microcefalia estão associados a pneumonias virais deterioração ventilatória, hipóxia e anormalidade na
intra-uterinas. Quando a pneumonia é provocada perfusão periférica. Radiografia de tórax de um
pelo estreptococo do grupo B pode ter curso pneumotórax mostra área de hiperlucência sem trama
fulminante precoce na primeira semana de vida ou broncovascular , com imagem do pulmão colabado.
ter uma evolução mais arrastada na segunda semana No pneumomediastino se observa área hiperlucente
associando-se a meningite e lesões ósseas e de pele. retroesternal na incidência de perfil e ao redor das

56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA 261


Neonatologia
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estruturas centrais do mediatino na antero-posterior. Com maior freqüências estas crianças intercorrem
No pneumopericárdio gás ao redor do coração pneumotórax e hipertensão pulmonar persistente. O
delineia o órgão. A imagem do enfisema intersticial diagnóstico radiológico é sugerido quando se observa
pulmonar é de hiperinsuflação com delineamento das campos pulmonares pequenos e dependendo do
bainhas vasculares nos hilos , que pode ser localizada grau, desvio do mediatino para o lado afetado.
ou difusa e aparecimento de pequenos cistos que
deixam estas áreas hipelucentes. Quilotórax
O quilotórax é causa rara de efusão pleural nos
Diplasia broncopulmonar
primeiros dias de vida sendo duas vezes mais
Ë uma doença crônica do pulmão do recém nascido freqüente nos meninos. O lado direito mais afetado
submetido a ventilação mecânica e oxigênio-terapia que o esquerdo sendo na maioria das vezes de
prolongados no período neonatal. Caracterizado por causa desconhecida apesar de se especularem causa
necessidade de oxigênio suplementar após 28 dias. como: 1) ruptura do ducto torácico por trauma
O bebê mostra sinais de hipóxia e dificuldade obstétrico, 2) erro no desenvolvimento do ducto
respiratória quando se retira suporte ventilatório. Durante linfático 3) presença de fístula entre a cavidade pleural
a internação na UTI, as manifestações são variáveis e o ducto torácico. Metade das crianças com
com a idade pós natal e o tempo de ventilação quilotórax tem distress nas primeiras 24 horas e 75%
mecânica. Este quadro é visto em paciente de UTI e tem até a primeira semana de vida.
egressos dela. Tem tórax enfisematoso, com diâmetro Os ruídos respiratórios são diminuídos no lado
AP aumentado, ausculta pulmonar rica e ao Rx imagens correspondente e o mediatino é desviado para o
variadas com acentuação da trama a cistos múltiplos. outro lado. O líquido pode ser seroso inicialmente
tornado-se leitoso a medida que se inicie a
Hemorragia pulmonar
alimentação.
Está associada quase sempre a outra doenças como
distress respiratório, asfixia, cardiopatia congênita, Enfisema lobar congênito
infeção, hipotermia e distúrbios da coagulação. O São os bebês a termo que são geralmente acometidos
diagnóstico é sugerido quando ocorre súbita e podem ser assintomáticos ou com acentuado distress
deterioração, choque e cianose. Pode aparecer sangue respiratório. Metade são sintomáticos no primeiro
na cânula endotraqueal, geralmente após 2 a 4 dias mês de vida e quase todos tem sintomas com 6
de idade. A imagem radiológica pode ser de meses. Os pacientes tem sintomas típicos de distress
infiltrados difusos a opacificação completa do pulmão. respiratório com diminuição das excursões torácicas
no lado afetado. O ictus está desviado para o outro
lado. Cerca de 20 % tem associação com
ANOMALIAS DO
cardiopatia congênita.
DESENVOLVIMENTO
A hiperinsuflação é geralmente de um só lobo
Hipoplasia pulmonar pulmonar, secundário a um mecanismo valvular, resulta
A suspeita diagnóstica surge quando aparecem em atelectasia do pulmão ao redor. Mais freqüente
eventualidades na história obstétrica como 1) no lobo superior esquerdo ( 40%), lobo médio (30%)
oligodramnia importante secundária a ruptura e lobo superior direito (20%). Ocorre desvio do
prematura de membranas amnióticas, ou mediatino para o lado contra lateral.
anormalidades renais. 2) Hérnia diafragmática
congênita. 3) desordens neurológicas como Mal formação adenomatóide cística
anencefalia e 4) anormalidades esqueléticas do tórax. Condição rara, quase sempre unilateral, sendo que
Clinicamente as crianças com hipoplasia pulmonar os lobos são afetados em igual freqüência . Inúmeros
se apresentam com grau variado de insuficiência cistos entremeiam a lesão.
respiratória, dependendo da extensão. Por exemplo, Um terço aparece no período neonatal e o restante
quanto menor a idade gestacional ocorrer a ruptura no primeiro ano. As crianças tem grau variado de
das membranas, maior será a sintomatologia dificuldade respiratória sendo que as mais velhas
hipoplasia. podem ter infeções respiratórias de repetição.

262 56º CURSO NESTLÉ DE ATUALIZAÇÃO EM PEDIATRIA

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