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Jane Doe de António Rego

X7DW_7 hours (1 hora correspondente a cada dia da semana) / Hamburg 2004 – Cor
Glasgow People 24¹09² / 1996 - Cor - Som
Love Story 49¹17¹¹/ London 2002 - Cor – Som
Ahooooo! 18¹26² / London 2001/03 - Cor - Som

Tudo é uma questão de retrato. Questione-se o que seja um retrato, isso é certo. Há que questionar-se, tanto
quanto nem o próprio se saiba retrato, retratado, susceptível de ser retrato.
Em todos os 4 vídeos temos questão de retrato, retratados, então auto-retratos, de certo modo, entendendo-os
assim. Pois, no caso dos artistas, escritores e demais autores, pode ser questão de auto-retrato directo ou
diferido, intermedial (ou intermediado). Os retratos podem apresentar pessoas denominadas e conhecidas ou
podem ser anónimos. No caso dos anónimos pode ser caso de reconhecimento ou caso de total e absoluta
ausência de identidade. Pois, nunca se causa nem cansa a identidade. Talvez. Os anónimos, não reconhecidos
ou reclamados por ninguém ganharam um nome: John Doe (masculino) & Jane Doe (feminino). O anonimato, a
não identificação tem sexo, género ou raça. Não, nem quero lembrar os corpos na série Morgue de Andres
Serrano.

Pois, em X7DW_7 [X=anónimo 7=Seven Days Week]1, o


protagonista – que não sabe ser protagonista – está vivo, acho,
melhor, quero acreditar que sim; vivo da forma melhor que haja para
se saber (existir) vivo. Pensei, o que sentiria X7DW_7 (vamos atribuir-
lhe o título do vídeo) se, por um acaso da sorte (azar da fortuna…),
olhasse o vídeo nesta mostra. Reconhecer-se-ia a si? Querer-se-ia a
si? Onde estar consigo mesmo, onde ser, pensaria. Não sei. As
pessoas têm ritmos, ganham distanciamento quanto a decisões que
um dia assumiram e depois repetiram. Aí, os comportamentos de si
mesmo debruçam-se para fora, nos atributos que são rituais,
paranóias saudáveis ou terríveis. X7DW_7 sugere conceitos
equívocos que se inscrevem em efabulações estéticas e poéticas, tais
como as antinomias (?) de flânerie, de Wanderer ou revêries figurais
transpostas. A obra videográfica X7DW_7 é composta por 7 unidades, cada uma delas correspondendo à
duração diária de 1 hora de gravação realizada por António Rego ao longo de uma semana. A cada dia da
semana corresponde um visionamento que se encontra aferido a quem visite a mostra, replicando assim a
passagem e a extensão dos dias vividos pelo indivíduo que foi filmado – de forma incógnita e supondo uma certa
dose de voyeurismo…O quotidiano, a rotina instituída por motivos que se desconhecem para o protagonista
X7DW são-nos devolvidos na sua genuidade, seus enigmas e dramas.
1 X7DW – sete dias/semana

Glasgow People – os retratos fixos quando estagnam do movimento


natural, carecem contemplações tanto quanto nos contemplam.
Questiono, recordando Guido Ceronetti, se os rostos fazem parte do
corpo…pois de quando em vez também eu me sinto inclinada a
duvidar…Surgem desde algures; nos rostos vejam-se os olhos e, com
mais pregnância ainda, pergunto-me, os olhos residem nos rostos,
estão ou existem, para além de, onde? Olham-nos desde de lá detrás
do ecrã ou do monitor, atravessando parede e recordando-me Jean
Cocteau e sua teoria de Zone (reveja-se o seu filme Orpheus). Zone é
esse território onde tudo parece ser e não é; esse terreno da memória,
tão desejada ou temida, que se repete, subsumada a propriedade do
tempo mítico como assinalou Octávio Paz. Então, os retratados que
olham os seus espectadores são seres sem tempo, que ultrapassam o
tempo e o armadilham, iludindo-nos por os acreditarmos ali – Da Bleiben, Da Sein…parafraseando Heidegger.
Olhares interpelativos, designativos ou vislumbrando intimidação, os retratados são “common people”…parcelas
identitárias integrando fotografias dribladas em vídeo (reversíveis ou não) que é um documento, um testemunho
societário quanto estético. A não assunção denominativa que visibiliza de cada um dos sujeitos presentes neste
vídeo poderá supor, numa leitura iconológica quanto antropológica, a perda ou retracção das respectivas
identidades. Todavia, a sustentação dos sujeitos/figuras/retratados direccionam-nos para uma outra apropriação,
outorgando-lhes a nota identitária que no rosto possui a totalidade de ser singular e individual. Através da
impositividade, interpelação das imagens cativadas em Glasgow People, a viagem intersubjectiva ganha novos
territórios. O olhar, o olho que vê, a percepção nutrida por uma metodologia e estoicismo que se revê nos outros.
A estratégia do reflexo na arte ocidental fixa uma tradição que, procedendo da pintura, expandiu o seu
virtuosismo para a fotografia e os registos de movimento, quer no cinema quer no vídeo.

Em Love Story, António Rego apresenta-nos inúmeros casos de


pessoas que residem com um suposto alter-ego ou ipso-ego.
Nomeadamente, apresenta-se a si mesmo, confirmando que, por
vezes, o auto.retrato é aquele que melhor comporta a obra do artista
em si – e para os outros. A alteridade do eu exerce-se em tempos
desincronizados e em tomadas de vista deslocadas, no relativo ao
díptico instituído. A cada pessoa apresentada (e não representada)
corresponde uma existência musical específica que lhes assegura a
identidade, procriando posturas, determinismos gestuais que
são sustentados flagrantemente em acto de fumar. Se considerar
sejam presentificações de identidades, o que se pretende? Enfatizar a
plasticidade ontológica individual, coreografando a equivocidade
diferenciada de instantes e duração, concluindo tão à maneira de
Peter Handke? Perguntei-me se todos seriam fumadores convictos ou ocasionais. Se esse acto seria uma
genuinidade ou um simulacro. De todas formas, os retratados - fumantes ou não fumantes – dão réplica à
intencionalidade do autor em os tornar presentes, em os presentificar para além de os apresentar. Usando
artifícios que estimulem a constituição de identidades que são designativas, denominativas, contrariamente ao
caso de Glasgow People. Para o receptor (não meramente espectador) a actuação, o desempenho de cada
uma das pessoas exige uma duração estética quanto antropológica.
Entenda-se cada uma das pessoas, captadas enquanto emissor portador de uma mensagem, dirigindo-se a
outrem – talvez, tanto quanto para o próprio se auto-comunica/ se auto-reflecte, dada a densidade introspectiva
que se percepciona.

Este movimento, virado para dentro, conduz para uma certa


antropofagia que se revela visceral em Ahooooo! As
intermitências entre evocações inclinadas, instituindo eixos
diagonais que definem um espaço predominantemente
bipolarizado em termos cromáticos é usado – através de uma
suposta neutralidade – para exacerbar a crueza pujante da cor. A
simbologia e a densidade de um pigmento visceral, evocam a “bi-
conceptualização” deleuziana acerca do caso de Francis Bacon.
Nesta obra videográfica de António Rego, mescla-se um efeito
caleidoscópico, algo literal com conteúdos de teor antropológico,
que remete para conceptualizações escatológicas gerando
camadas sucessivas também em termos semântico.
A acutilância com que o humano irrompe na carne (chair et
viande) do animal, transfigura este em condição quase antropomorfizada que solicita horrores de violência e
guerra. É uma iconologia apocalíptica que atinge o vómito, recuperando-se a alma do espectador através da
austeridade arquitectural dos edifícios reconduzidos por caminhos inclinados de um autor mergulhado sobre
suas próprias entranhas. O ritmo da filmagem, compósita e irreversível, propicia alucinações que são parte
integrante de todo e qualquer ritual em tempos prévios a um conhecimento filosófico. Pois o tempo cronológico
ancestral, de primordial absorção cenográfica (e dramatúrgica) das imagens retrocede para a sua efectividade
mítica, nem sequer mitológica. Culto, ritual e sagrado quanto profano (e profanação), exaltam ao sacrifício,
organizando uma volúpia iconoclasta se não fosse de uma tão radical concupiscência estética.

Mª de Fátima Lambert
Janeiro 2009

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