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CORPOS

Hélcio José Gomes

Corpo inerte no chão, deitado na calçada, coberto de jornais.


Nas manchetes do mesmo jornal lemos notícias sobre os planos do governo para a
segurança, para a erradicação da pobreza, para melhorar a saúde.

Na academia, jovens sarados, malham corpos suados para, mais tarde, gastarem suas
energias nas danças funks, consumirem celulares, bebidas energéticas, serem vistos
pelos olhares gulosos dos consumidores de corpos.

Nas vitrines das lojas e nos desfiles de modas, a exclusão dos corpos redondos e, na
produção de roupas, a exclusão dos “acima-do-peso”, relegados à marginalidade da
moda.

No IML, um corpo desconhecido, sem identificação, sem eira nem beira, sem velório,
sem túmulo, sem lágrima que o enterre. Sem família que o chore, ou que chora sem
saber dele ali. Exames de corpo-delito, exames de NDA, exames...

Na beira da estrada, um caminhante, levando às costas a enxada da capina do roçado, a


matula com restos de pão seco, faz lembrar o verdejar das plantações, e quem o olha
não percebe nele o sentido da semente que se transformou sob a batuta de suas mãos.

Corpo descarnado da anoréxica que se impõe jejum insano;


corpo roliço do cervejeiro que, de tantas “adiposidades circundantes”, afrouxa o cinto;
corpos nomeados como perfeitos e imperfeitos, como mercadoria.
Lá se vão vazios de alma e prenhos de desejos, como se pudessem, por si só, conterem
todo o ser.
Ser, esta busca de uma humanidade que se desumaniza na violência cotidiana das ruas,
nas novelas da TV, nas revistas masculinas e nas revistas de moda nas bancas.
Ser, uma necessidade, mas estamos na era das aparências.
Nem mais nos parece a era do ter, mas do parecer ter.
Devo parecer culto, devo parecer rico, devo parecer crente, devo parecer saudável...
devo parecer, já que, no fundo, não sei o que e quem sou.

Adolescentes seguem o modelo dos ídolos, os ídolos seguem os desejos dos


adolescentes.
A mulher se veste para o marido, que olha a mulher do outro, que se veste para o
marido.
A plástica corrige as rugas, escondendo a idade.
Há uma inutilidade no ar.

Aonde o corpo animado, aonde o corpo que contém alma, que se faz representante de
uma vida que manifesta a presença do humano que caminho ao encontro do amanhã?
Qual será o amanhã deste corpo sarado quando, velho, não tiver mais o vigor da carne
e só lhe sobrar lembranças, desejos vagos?

É necessário retomar a busca por um sentido pessoal para a existência, pela busca de
uma identidade pessoal que leve em consideração a continuidade de um projeto
existencial que fundamente os atos, que oriente a rota.
Não queimemos índios Galdinos só porque estão deitados à margem, debaixo daquelas
folhas de jornal.
A vida não é constituída de currículos, mas da essência humana.
A melhor imagem que podemos deixar é a maneira como vivemos a vida e, não, nos
títulos que penduramos na parede.

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