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Elaborado por Valéria da Silva Nunes, juíza federal em São Paulo (SP).
PROC. : 2000.03.99.040539-2 AC 608335
ORIG. : 9900000974 /SP
APTE : Instituto Nacional do Seguro Social - INSS
ADV : LUIZ CARLOS BIGS MARTIM
APDO : VALDOMIRO APARECIDO MAGRI
ADV : ANTONIO FLAVIO ROCHA DE OLIVEIRA
REMTE : JUIZO DE DIREITO DA 2 VARA DE SANTA FE DO SUL SP
RELATOR : JUÍZA CONV. VALÉRIA NUNES / SEGUNDA TURMA
RELATÓRIO
Apela a autarquia, alegando, preliminarmente, ser a sentença ultra petita, uma vez que não
se manifestou sobre o cálculo com base nas últimas 36 contribuições, conforme pedido da
parte autora. Alega não haver um início razoável de prova material a comprovar a atividade
rurícola, nem tampouco laudo probatório da atividade exercida em condições especiais.
Pede isenção da verba honorária, que o cálculo da correção monetária seja efetuado nos
termos da Súmula 148 do STJ e que os juros sejam calculados à taxa de 6% (seis por cento)
ao ano, nos termos da legislação.
Com contra-razões, subiram os autos a esta instância, e, após distribuição, vieram-me
conclusos.
É o relatório.
VOTO
A Exma. Juíza Federal VALÉRIA NUNES (Relatora): A douta decisão recorrida julgou
procedente o pedido formulado pelo autor face ao Instituto Nacional do Seguro Social –
INSS, pleiteando a aposentadoriapor tempode serviço.
Preliminarmente, o fato de não ter sido especificada expressamente a forma de cálculo a ser
efetuado não configura sentença ultra petita, pois, por consequência lógica, o cálculo
haverá de observar a forma vigente à época da implementação dos requisitos legais.
Embora referida norma não especifique a natureza de início razoável de prova material,
quer em sua potencialidade, quer em sua eficácia, a prerrogativa de decidir sobre a validade
dos documentos e concluir pela sua aceitação, ou não, cabe ao juiz. Qualquer que seja ela e
particularmente a escrita, deve levar à convicção sobre o fato probando, isto é, além de
pertencer à época dos fatos, deve fornecer indicações seguras de que houve o evento que se
pretende provar.
Nesse passo, verifico que foram juntados aos autos os seguintes documentos: certificado de
dispensa de incorporação (fls.30), título de eleitor (fls.30) e certidão de casamento (fls.31),
constituindo tais documentos, a meu sentir, início razoável de prova material, estando em
consonância com a prova testemunhal produzida, com validade para suprir eventuais
lacunas deixadas pelos documentos juntados.
Verifico do exame dos documentos juntados aos autos que o autor laborou de 30/11/63 a
31/12/74 nas lides rurais sem registro em CTPS, de 01/01/75 a 31/07/76 como frentista, de
02/08/76 a 31/7/79 como faxineiro, de 04/03/96 a 01/10/99 como auxiliar de limpeza, de
01/07/79 a 01/09/95 como autônomo, contribuinte individual, conforme comprovam as
cópias de carnês de contribuição anexadas aos autos.
Com relação ao período de carência de que trata o art. 142 da mesma lei, vinha eu
decidindo que o período exercido na atividade rurícola anteriormente à Lei n.º 8.213/91
poderia ser computado independentemente do recolhimento das contribuições
previdenciárias, em função da decisão liminar proferida na ADIN n.º 1664-4, na qual o
Supremo Tribunal Federal afastou a aplicação do inciso IV do art. 96 da Lei n.º 8.213/91
quanto ao tempode serviço do trabalhador rural, enquanto estava este desobrigado de
contribuir. Sucede que a mencionada ADIN foi julgada prejudicada por perda de seu
objeto, em decisão proferida pela Relatora Ellen Gracie aos 20/03/2002 (DJ 04/04/2002),
de modo que devo reexaminar a questão, considerando até mesmo a edição da Lei n.º
9.528/97, que trouxe alterações ao artigo 55 da Lei n.º 8.213/91 e tomando em consideração
também o quanto disposto no art. 39, II do mesmo diploma legal.
Feitas tais considerações, concluo que o tempode serviço em atividade ruralanterior à Lei
n.º 8.213/91 poderá ser computado para efeito de contagem de tempo, mas não pode ser
considerado para efeito de carência, consoante dispõe o § 2.º do art. 55 da Lei n.º 8.213/91,
norma explicitada no § 3.º do art. 26 do Decreto n.º 3.048/99.
O tempode serviço do trabalhador urbano, por outro lado, para efeito de carência, pode
ser comprovado mediante mera anotação em carteira, pois a contribuição
previdenciária nesse caso sempre foi compulsória e, mesmo que não tenha havido o
recolhimento das contribuições previdenciárias pelo empregador urbano, tal fato não
invalida o direito à contagem do tempotambém para efeito de carência, sobretudo porque a
obrigação de arrecadar as contribuições, descontando-as em parte da remuneração do
empregado, compete exclusivamente ao empregador. Caberia à autarquia comprovar
eventual falsidade das anotações contidas na CTPS relativas ao período exercido em
atividade urbana. Em não o fazendo, restam as mesmas incólumes e aptas à formação da
convicção do magistrado no exercício de sua função judicante.
In casu, não há como acolher a totalidade do período pleiteado, vez que o período mais
remoto efetivamente atestado com prova documental é o ano de 1967, de forma que
reconheço como tempode serviço prestado em atividade rural, sem registro em carteira, o
período de 01/01/67 a 31/12/74, ante o irrefutável início de prova material, acrescido da
prova testemunhal idônea; tal período, embora não podendo ser admitido para efeito de
carência, há de ser considerado para efeito de contagem de tempo.
O artigo 142 da Lei n.º 8.213/91 outorga as aposentadorias por idade, tempode serviço e
especial, desde que o segurado tenha implementado as condições necessárias à obtenção do
benefício. Essa norma traz também uma tabela consistente no ano de implementação das
condições e os meses de contribuiçãoexigidos, partindo de 1991 (ano da vigência da lei)
até 2011, quando o segurado completará 180 meses de contribuição.
Dessa forma, embora reconhecido o tempode serviço na qualidade de rurícola, para efeito
de carência há de ser observada a tabela inscrita no art. 142 do mesmo diploma legal, de tal
forma que na espécie dos autos não há como deixar de considerar a necessidade de
cumprimento de uma carência de 108 meses de contribuições previdenciárias, pois a
propositura da ação data de 1999, requisito que efetivamente foi cumprido pelo autor, que
comprovou nos autos ter vertido aos cofres previdenciários só em carnês como contribuinte
individual mais de 165 contribuições.
Não se há de confundir período de carência com período de tempode serviço prestado, pois
os dois são requisitos distintos para a aposentadoriapor tempode serviço, ou seja:
tempomínimo exigido por lei e cumprimento do período de carência nos termos do artigo
142 da legislação de benefícios previdenciários.
A Lei n.º 9.032/95 promoveu perniciosa alteração no art. 57 e parágrafos da Lei n.º
8.213/91, retroagindo em prejuízo dos segurados, ao suprimir a expressão "conforme
atividade profissional", passando a exigir do segurado a apresentação de provas quanto à
efetiva exposição aos agentes nocivos, bem como das condições especiais prejudiciais à
saúde.
O Decreto n.º 611, de 21/07/92, manteve a vigência dos anexos I e II aos referidos Decretos
53.831/64 e 83.080/79 para efeito de concessão de aposentadorias especiais (art. 292), regra
que só veio a ser revista a partir da edição do Decreto n.º 2.172, de 05 de março de 1997 e
posteriormente com o Decreto n.º 3.048, de 06/05/99, cujo art. 70 estabelece:
.................................................."
Portanto, hoje a matéria relativa à aposentadoria especial encontra-se regulada nos artigos
57 e seguintes da Lei n.º 8.213/91, com as alterações introduzidas pelas Leis n.º 9.032/95,
n.º 9.528/97, n.º 9.732/98 e 9.711/98 e respectivo decreto regulamentador n.º 3.048/99, que
expressamente revogou os Decretos 83.080/79 e 2.172/97 (art.3.º).
"A nova lei só deverá incidir sobre os fatos que ocorrerem durante sua
vigência, pois não haverá como compreender que possa atingir efeitos já
produzidos por relações jurídicas resultantes de fatos anteriores à sua
entrada em vigor." (5)
Entendo assim que estamos trabalhando nas fronteiras do direito adquirido e o que interessa
é como se dá a aquisição dos direitos decorrentes de elementos autônomos que se
realizaram de forma autônoma e válida de acordo com a lei anterior ou seja, com fatos
iniciados, mas não completados quando a lei nova é editada.
É de todos sabido que o benefício é regido pela lei em vigor no momento em que reunidos
os requisitos para sua fruição, mas, em se tratando de direitos de aquisição complexa, a lei
mais gravosa não pode retroagir exigindo outros elementos comprobatórios do exercício da
atividade insalubre, antes não exigidos, sob pena de agressão à segurança jurídica que o
ordenamento jurídico visa preservar.
2..................................................
3..................................................
A Lei n.º 9.711/98, bem como o Decreto n.º 3.048/99 resguardam o direito
dos segurados à conversão do tempode serviço especial prestado sob a
vigência da legislação anterior, in casu, o Decreto 53.831/64 até
14/10/1996. Precedentes desta Corte.
Há, portanto, de ser perquirido se à época em que realizada a atividade laborativa, era a
mesma considerada insalubre. Nesse passo, há de ser observado o quadro a que se refere o
art. 2.º do Decreto n.º 53.831/64, que expõe uma relação de atividades insalubres, penosas e
perigosas, classificando as atividades profissionais segundo agentes nocivos e fornecendo
respaldo ao Judiciário no que concerne a prerrogativa de decidir acerca da natureza especial
ou não do trabalho desempenhado pelo autor.
Nesse sentido, verifica-se que a atividade de frentista de 1975 a 1976 era considerada de
natureza especial, em virtude do contato direto com gasolina (cód. 1.2.11 do anexo do
decreto 53.831/64 e do anexo IV do decreto 2.172/97).
Por outro lado, a atividade exercida como faxineiro não se encontra elencada no rol das
atividades especiais, não tendo a parte autora juntado documento que efetivamente
comprovasse ser a referida atividade insalubre. Inclusive, o documento acostado aos autos
(fls.28/29) foi elaborado sem a presença do INSS, conforme exige a lei, razão pela qual este
período laborado como faxineiro não pode ser considerado como insalubre.
Todavia, apesar do reconhecimento da atividade ruralsomente a partir de 1967, bem como
da atividade insalubre somente exercida na condição de frentista, a somatória do período a
ser averbado, com o devidamente registrado em carteira e a respectiva conversão da
atividade especial exercida, além dos recolhimentos individuais comprovados, todos estes
elementos somam mais de trinta anos de serviço, o que autoriza a concessão do benefício
da aposentadoriaproporcional por tempode serviço, pois que também foi cumprida a
carência exigida.
Os honorários advocatícios foram fixados abaixo dos limites fixados pela jurisprudência da
Turma, mas não podem ser alterados à míngua de recurso da parte, não se prestando a
remessa oficial a prejudicar a autarquia.
Diante do exposto, por meu voto, dá-se parcial provimento à apelação do INSS e à
remessa oficial para reconhecer a atividade ruralexercida pelo autor somente no período de
01/01/67 a 31/12/74, bem como para declarar como atividade especial somente o trabalho
exercido na condição de frentista (01/01/75 a 31/07/76), concedendo ao autor o benefício
da aposentadoriaproporcional por tempode serviço, a ser calculado na forma prevista no
art. 53, inciso II da Lei n.º 8.213/91.
É o voto.
VALÉRIA NUNES
Juíza Federal Convocada (Relatora)
EMENTA
III – O período de trabalho como rurícola somente poderá ser considerado para efeito de
carência (Lei n.º 8.213/91) se o segurado comprovar o recolhimento das contribuições
previdenciárias facultativas.
III- É de natureza especial a atividade do segurado que trabalhou em contato direto com
gasolina (cód. 1.2.11 do anexo do decreto 53.831/64) de 1975 a 1976, entendimento
cristalizado pela Súmula 212 do STF, sendo aplicável ao exame da matéria a legislação
vigente quando da efetiva realização do trabalho insalubre.
IV – A Lei n.º 9.711/98 (art.28), bem como o Decreto regulamentador n.º 3.048/99 (art.70 §
único) resguardam o direito adquirido dos segurados de terem convertido o tempode
serviço especial prestado sob o império da legislação anterior em comum até 28/05/98,
observados, para fins de enquadramento, os Decretos então em vigor à época da prestação
do serviço.
V - As novas exigência impostas pelos arts 57 e 58 da Lei n.º 9.032/95 só podem valer para
o futuro, ante o princípio da irretroatividade da lei mais gravosa e também em obediência
ao aforismo "tempus regit actum".
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, ACORDAM
os integrantes da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade,
em dar parcial provimento à remessa oficial e à apelação do INSS, na conformidade da Ata
de Julgamento e nos termos do voto da Juíza Federal Convocada Relatora.
São Paulo, 16 de setembro de 2002. (Data do julgamento)
VALÉRIA NUNES
Juíza Federal Convocada (Relatora)
NOTAS
1. TRF 5ª Região, AC n.º 9605290561/RN, Rel. Juiz Nereu Santos, 3ª Turma, j.:
29/10/1998, DJU : 20/11/1998 pág : 1060)
2. EDRESP 256846/SP, STJ, 5ª Turma, Relator Ministro José Arnaldo da Fonseca, j.
22/05/2001, v. u., DJ 13/08/2001, pág. 210.
3. RESP n.º 232746/RS, STJ, 5ª Turma, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j.02/12/99,
v. u DJ 14/02/2000, pág. 67.
4. Daniel Machado da Rocha e outro in "Comentários à Lei de Benefícios da
Previdência Social", Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2000, pág. 213.
5. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro Interpretada, Ed. Saraiva, 2ª edição,
1996, pág. 178.
6. "Isenção e Subvenção Distinção entre os institutos – irretroatividade da lei – direito
adquirido", RT-508, págs. 49/62.
7. "A irretroatividade das leis e o direito adquirido", Ed. RT, 1982, 3ª edição,
págs.232/233.
8. AC n.º 3800033993-9/98/MG, TRF 1ª Região, Primeira Turma, Relator Juiz
Antonio Savio de Oliveira Chaves, j. 24/04/2001, DJ 16/07/2001, pág.35.
9. AC n.º 384103, TRF 4ª Região, Quinta Turma, Relator Juiz Marcos Roberto Araújo
dos Santos, j. 25/06/2001, v. u., DJ 11/07/2001, pág.373.
10. STJ, REsp. n.º 425.660, Relator Ministro Felix Fischer, 5ª Turma, ,j. 11/06/2002,
v.u., DJ 05/08/2002, pág. 407.
11. STJ, Resp. n.º 313.089, Relator Ministro Fernando Gonçalves, 6.ª Turma, j.
16/05/2002, v. u., DJ 10/06/2002.