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O povo hebreu possui uma trajetória de vida particular e muitas vezes, ligada pela
guerra. A Bíblia, principal fonte de informações sobre o povo hebreu, contém narrações
heróicas sobre batalhas, grandes feitos de reis e líderes, derrotas ocasionadas pela
desobediência de leis e vitórias que foram obtidas com o auxílio de seu Deus, Iahweh, o
Senhor dos Exércitos. O Pentateuco, conjunto dos cinco primeiros livros da Bíblia
(Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio) , é onde se encontram os
primeiros passos da trajetória do povo hebreu no mundo antigo. Nestes livros
encontramos a história do começo dos povos, a eleição de um povo escolhido por Deus,
o hebreu, a promessa que Deus daria uma terra especial para este povo e as leis que o
hebreu deveria seguir para prosperar.
Moisés e a Lei Mosaica: episódio fundador central na identidade cultural e religiosa dos hebreus.
Esses dois povos por muito tempo disputaram a hegemonia territorial política da região
e, até hoje, protagonizam um dos mais antigos conflitos da história. Os hebreus têm
origem semita e se consolidaram ao longo do Rio Jordão praticando atividades agro-
pastoris. Foi aproximadamente no II milênio a.C. que o povo hebreu passou a organizar
um movimento populacional de motivação religiosa: a busca da “Terra Prometida”,
região equivalente ao território da Palestina.
Esse importante episódio da civilização hebraica ficou conhecido como Êxodo e iniciou
uma extensa fase de peregrinação do povo hebreu rumo à região Palestina. Durante esse
período, de acordo com a narrativa bíblica, os hebreus empreenderam diversas lutas que
restabeleceram a hegemonia hebraica na região Palestina. Josué, sucessor do líder
Moisés, foi responsável por dividir os antigos clãs em doze tribos distintas. O contato
com os povos vizinhos influenciou os costumes e as tradições hebraicas.
Os Hebreus
O povo hebreu tem o início de sua organização na Mesopotâmia.
Segundo Jaime Pinsky, “Isso é contado na Bíblia e comprovado por diversas
evidências. O hebraico é uma língua semita, pertencente ao mesmo grupo do
aramaico e de outras faladas na Mesopotâmia, baseada em estrutura de raízes
triconsonantais, uma particularidade delas. Notável mesmo é verificar a
utilização de mitos mesopotâmicos entre os hebreus.” Mitos mesopotâmicos
incorporados na teologia judaica, como o Dilúvio, a Epopéia de Gilgamesh. Da
Mesopotâmia os hebreus migraram para o território hoje conhecido como
Palestina, sempre travando contato, usualmente belicoso, com seus vizinhos
mais próximos desde tempos imemoriais.
Moisés e o monoteísmo
O Mito
Versão Gnosiológica
Tu estás diante (da gente), mas eles não vêem o teu caminho.
Tu as fizestes levantar.
Ó Senhor da eternidade!
Tu fazes as estações
Quando te afastas
Tu fazes com que ele seja instruído em teus ensinamentos e em teu valor.
E se vive de ti.
O Êxodo
Moisés é, até hoje, o profeta mais reverenciado pelos judeus. Aqui cabe
uma breve digressão para a nomenclatura. Os termos “hebreu”, “israelita” e
“judeu” são usados no senso comum como sinônimos. De fato, “hebreu” é uma
expressão derivada das línguas mesopotâmicas para designar o povo
originário “do outro lado” do Eufrates. Quando deixaram o Egito e se instalaram
em Canaã após subjugar os povos que ali viviam, passam a se chamar
“israelitas”, principalmente após o reinado de Davi. O termo “judeu” refere-se a
um povo e uma religião, aquela instituída por Moisés há mais de 3.000 anos.
Em nossos dias, embora seja teoricamente possível a conversão ao judaísmo,
esta é de rara a inexistente na prática. O fator “sangue” ou “descendência”
pesa muito neste caso.
Juízes
Reis
O primeiro rei hebreu foi Saul. Durante o seu reinado o povo hebreu foi
politicamente unificado. O reinado de Saul foi marcado por uma série de
campanhas militares contra os filisteus (palestinos) e demais povos vizinhos.
Naquele período ocorreu ainda um certo enfraquecimento político do Egito e
dos Estados Mesopotâmicos, favorecendo o fortalecimento do Estado Hebreu.
Com a morte de Saul subiu ao trono Davi, sob cujo reinado o Estado de
Israel de fato se consolidou. Toda a palestina foi subjugada e Jerusalém
proclamada capital do Reino. Sob seu reinado criou-se um exército real e
permanente – contando inclusive com mercenários estrangeiros; organizou-se
uma forte burocracia estatal e um rigoroso sistema de impostos dotando ainda
a monarquia de um caráter sagrado.
Cisma
Anos mais tarde o Ciro, rei dos Persas, autoriza o retorno dos hebreus à
Palestina, onde reconstruíram Jerusalém. O Templo também é reconstruído.
Israel começa a ressurgir como província do grande Império Persa. Após o jugo
persa os hebres viram-se sucessivamente dominados pelos helenísticos
(Grécia-Macedônia), pelos egípcios e finalmente pelos romanos.
Diáspora
Não uma raça, mas muito mais que uma religião, o povo judeu geralmente é descrito como
sendo o centro de um triângulo constituído por um Deus, a terra de Israel, e o seu texto
sagrado, a bíblia.
A bíblia tem sido a fonte do grande impacto que este pequeno povo (com um número de
aproximadamente 13 milhões) tem tido na cultura e na fé mundiais. Os seus primeiros cinco
livros são conhecidos como a Torá, que significa ensinar, um termo que se expandiu para
incluir uma grande quantidade de conhecimento judaico transcrito durante os séculos.
Entretanto, para muitos judeus, os seus ensinamentos são destilados em um único comando
pronunciado pela primeira vez por um sábio judeu há cerca de dois mil anos atrás: "Não faça
com os outros o que você não gostaria que fizessem consigo."
A bíblia contém os Dez Mandamentos (no livro bíblico Êxodos, 20:1-13), os ensinamentos
morais incluem, entre outros, não só proibições de assassinato e roubo, mas também o
comando de manter um dia de descanso semanal, o Shabat, uma marca da fé e da cultura
judaica, e o comendo de honrar seu pai e a sua mãe. A bíblia é a base para os ensinamentos
de Jesus e do cristianismo, e para o Novo Testamento.
Através dos séculos os judeus acrescentaram o Talmude aos seus textos sagrados. Este é um
complemento à Bíblia, que se desenvolveu principalmente depois do povo judeu ser exilado da
sua pátria, Israel (veja abaixo), mas lutou para manter conexões uns com os outros, com Deus
e com a sua terra. Aprender a bíblia e o Talmude, e o estudo em geral, se tornaram um
elemento importante da cultura judaica, como também a antiga língua da bíblia, o hebraico, que
foi renovado nos tempos modernos.
Talvez a história mais famosa da bíblia seja o Êxodo, no qual Moisés liderou o povo, então
chamado de israelitas e dividido em 12 tribos, da escravidão do Egito para a liberdade.
Eventualmente os israelitas entraram na Terra de Israel que, de acordo com a bíblia, Deus
prometeu ao primeiro patriarca, Abrão. As doze tribos são descendentes do Abrão através do
seu neto, Jacó, que também era chamado Israel.
O evento melhor conhecido na vida de Abrão foi quando Deus o testou chamando-o para
sacrificar o seu filho Isaque, apesar de Deus não realmente ter deixado que Abrão o fizesse.
Davi também é uma figura judia religiosa importante. Ele é o antepassado do salvador tão
esperado (o Messias), e o autor de algumas das poesias religiosas mais emocionantes da
bíblia, os Salmos. Davi também fez de Jerusalém a capital do povo judeu, comprando a terra
no Monte Moriá onde Abrão foi testado, e onde posteriormente o grande santuário conhecido
como o Templo seria construído
O Monte Moriá é conhecido hoje em dia como o Monte do Templo. Salomão construiu ali o
Primeiro Templo em cerca de 950 aC, que foi destruído pelos babilônios, que exilaram os
judeus de sua terra em 586 aC. Mas cerca de 50 anos depois os judeus retornaram e
construíram o Segundo Templo, que foi embelezado pelo Rei Herodes perto da época de
Jesus. Este também foi destruído em 70 AD pelos romanos.
História
Para criar uma religião mundial, o Jesus libertador do povo judeu foi
transformado no Filho de Deus e ganhou o nome de Cristo
Maurício Tuffani
Três tempos
Paulo (acima, no quadro Monte de Marte, de Rafael) prega sua
mensagem sobre Jesus (no centro, no mosaico Ressurreição, da
Igreja da Transfiguração, em Massachusetts), que permanece até
hoje sob a orientação do Vaticano (abaixo)
A religião cristã não começou com Jesus. Segundo estudos recentes feitos por historiadores e
teólogos cristãos, a imagem desse homem como Filho de Deus surgiu alguns anos após sua
morte em Jerusalém por volta do ano 30 do que hoje chamamos Era Cristã. Mais ainda: a
versão de que Jesus teria sido condenado pelo povo judeu passou a ser construída muito
depois de sua morte, com a elaboração dos evangelhos. Diante de um mundo dominado pelos
romanos, o cristianismo evitou complicações políticas e se distanciou de sua origem: uma seita
judaica formada por homens contrários à dominação estrangeira. Liderada por Tiago, irmão de
Jesus, a seita praticamente desapareceu no massacre de Jerusalém pelos romanos na revolta
que terminou no ano 70. Para seus integrantes, Jesus era o Messias, descendente do rei Davi
que nascera para libertar o povo judeu da opressão e fora morto sob acusação de rebelião.
Fora da Palestina o trabalho iniciado pelo apóstolo Paulo prosseguiu, com a mensagem de um
Cristo divino e descomprometido com a política.
Por muito tempo, a versão aceita pela tradição cristã fez do ato de terror do
Império Romano um crime dos judeus
Baseados em diversos relatos, como os de Flávio Josefo (35-100 d.C.), autor de A Guerra
Judaica, e nos princípios do Direito Romano, esses historiadores estão convencidos de que a
condenação de Jesus foi apenas mais uma entre as milhares realizadas pelos romanos na
Palestina. "Foi basicamente um ato oficial de terrorismo. Roma não tolerava rebeliões em seus
domínios", afirma o teólogo Fernando Altemeyer Júnior, professor da Pontifícia Universidade
Católica (PUC) de São Paulo. A morte na cruz era a pena imposta pelos romanos para os
delitos contra o império.
A cidade da execução
Jerusalém, onde hoje vivem israelenses e palestinos, teve seu antigo Templo
destruído e, no Gólgota (local do suposto sepultamento de Jesus), está hoje a
Igreja do Santo Sepulcro
Ameaça ao grupo
A acusação contra Jesus por parte dos judeus se restringiu aos saduceus, a facção que
apoiava a dominação romana e controlava a nomeação dos sumos sacerdotes. Jesus teria sido
uma ameaça para eles, segundo o teólogo Hermínio Andrés Torices, professor da PUC de
Campinas e do Instituto Teológico de São Paulo. "Tudo indica que houve um complô desse
grupo restrito, mas não uma vontade coletiva dos judeus de Jerusalém", diz Torices. O
judaísmo na época de Jesus era muito diversificado, mas
apesar das muitas facções, o sentimento contra a "Os evangelhos falam pouco
dominação estrangeira era geral e muito forte na população sobre os atos dos romanos na
local. Palestina. Seria o mesmo que
contar a história da França de
Um outro tema tratado nos evangelhos, a libertação de 1940 a 1945 sem falar nos
Barrabás, serviu para temperar essa suposta vontade alemães."
coletiva dos judeus de condenar Jesus à morte. O privilégio Hyam Maccoby, da Universidade de Leeds,
de os judeus poderem pedir durante a Páscoa a libertação na Inglaterra, em entrevista ao
documentário O Verdadeiro Jesus Cristo,
de um condenado não passa de uma lenda, segundo produzido pelo Channel 4
diversos estudiosos, como Paul Winter (1904-1969), em
seu livro póstumo Sobre O Processo de Jesus, de 1974.
Acredita-se que, escritos a partir da grande revolta dos judeus contra Roma (66-70 d.C.), os
evangelhos evitaram acusar o Império pela morte de Cristo. "Há uma nítida tendência para
amenizar as tensões entre romanos e cristãos, até mesmo nos séculos seguintes", afirma
Torices. Essa tendência só termina no ano 313, quando o imperador Constantino decreta o
Edito de Milão, estabelecendo uma política de liberdade religiosa. Por pouco, segundo Winter,
Pilatos não foi canonizado, assim como aconteceu com sua mulher pela Igreja Grega por ter
sido advertida em um sonho que Jesus era inocente (Mateus, 27,19).
As pesquisas das últimas décadas mostram como a pequena seita judaica criada por Jesus
conseguiu sobreviver de maneira surpreendente à guerra de 66-70 d.C., em que os romanos
praticamente massacraram os judeus. Isso ocorreu por obra de um homem que havia sido um
implacável perseguidor desse povo convertido: o apóstolo Paulo, nascido em uma família
israelita de Tarso, na atual Turquia, com o nome de Saulo. Segundo os Atos dos Apóstolos,
após presenciar de forma cúmplice o apedrejamento de Estevão em Jerusalém, Saulo
"devastou a Igreja: entrando pelas casas arrancava homens e mulheres e metia-os na prisão".
Isso ocorreu até que, em uma viagem a Damasco, Jesus teria aparecido após uma luz intensa
vinda do céu tê-lo cegado, fazendo-o cair no chão. Depois da visão, ele deixa de lado o nome
judaico e passa a se chamar Paulo, da língua do Império Romano, o latim. E começa sua
missão com os gentios (não-judeus) em viagens a Chipre, à Ásia Menor e à Grécia.
Ruptura entre facções
Para Tiago e seus seguidores, Jesus era o Messias, que teria vindo ao mundo para livrar o
povo judeu da opressão. Era o escolhido para implantar o Reino de Deus, isto é, governar
Israel conforme a Lei. Paulo, porém, apresentava Jesus sob o nome grego Cristo, cujo
significado era o mesmo de Messias em hebraico: "Ungido". O Cristo anunciado por ele era o
Filho de Deus. Tiago e os outros apóstolos o tinham conhecido em vida, mas Paulo alegava ter
visto o Cristo celestial. Em sua Primeira Epístola aos Coríntios (15,8), ele se declara como o
último dos que viram o Filho de Deus ressuscitado. Paulo ensina que o cristão é livre do
pecado pelo seu amor a Cristo e que a Lei era obsoleta. "Vamos pecar porque não estamos
mais debaixo da Lei mas sob a graça? De modo algum!" (Romanos, 6,15).
As desconfianças se agravam. Paulo faz uma violenta acusação "Este (Paulo) é o primeiro
na Epístola aos Gálatas (2,4) aos "falsos irmãos que se cristão, o inventor do
infiltraram para espiar a liberdade que temos em Cristo Jesus, a cristianismo. Até então
fim de nos reduzir à escravidão". Ele segue para um encontro havia apenas alguns
com Tiago em Jerusalém, possivelmente no ano 58. sectários judeus."
Reconhecido no Templo como aquele que pregava o abandono
da Lei, é ameaçado de morte, apela para sua cidadania romana Friedrich Nietzsche (1844-1900),
filósofo alemão, em Aurora
e escapa do linchamento ao ser preso pelos soldados. Tiago é
morto por apedrejamento quatro anos depois. Paulo é
decapitado em Roma depois por ordem de Nero. Mas o mundo conhecerá somente o Cristo de
Paulo.
Segundo o que se conhece sobre aqueles tempos turbulentos, a Igreja cristã de Jerusalém
praticamente morreu com o massacre comandado por Tito no ano 70. Tiago e seus seguidores
teriam sido judeus de origem humilde, talvez com modesta formação intelectual, afirma Robert
Eisenman, diretor do Instituto de Estudos das Origens Judaico-Cristãs, da Universidade do Sul
da Califórnia, em Long Beach, nos EUA. O sofisticado Paulo, ao contrário, tivera sólida
formação na cultura greco-romana e preparou o caminho para que a expansão cristã pudesse
prosseguir após sua morte. "Além de fazer uma peregrinação missionária original, criando
vínculos em cidades importantes, ele soube escolher pessoas para multiplicar seu trabalho",
afirma o teólogo Fernando Altemeyer Júnior. "Se fosse nos dias de hoje, ele usaria a internet."
Paulo permaneceu 18 meses em Corinto, na Grécia, pregando aos trabalhadores do porto e
marinheiros, que passaram a difundir sua mensagem. "Paulo enxergava a direção que tomava
o mundo e agiu para fazer o cristianismo crescer no futuro", diz o teólogo Hermínio Andrés
Torices.
A intuição do apóstolo faz com que ele apresente a fé cristã com uma dramatização comovente
e arrebatadora para os homens de um mundo sob domínio político opressivo. Paulo, que
conhecera os filósofos estóicos, como o romano Sêneca (4 a.C.- 65 d.C.), cria uma doutrina
semelhante em alguns aspectos ao pensamento deles. O estoicismo, que esvaziava da filosofia
o conteúdo político em favor da moral e da realização subjetiva, surgira a partir da perda da
liberdade política das cidades-estado gregas para os conquistadores macedônios no século 4
a.C. A liberdade do cristão, diz Paulo, é a salvação obtida somente por meio da fé e do amor
em Cristo.
Além de não se opor aos dominadores, o cristianismo teria desvirtuado a imagem de facções
judaicas, como o farisaísmo, que apregoava a rigorosa observação da Lei, e criticava tanto os
saduceus, cúmplices dos romanos, como os zelotas, que pegavam em armas contra eles. "Na
tradição cristã, a palavra ‘fariseu’ tornou-se sinônimo de
‘hipócrita’, ou se aplica àqueles que se atêm a minúcias sem
atender ao que importa", diz Winter. "Eu vos faço saber, irmãos,
que o evangelho por mim
Outros pesquisadores, como Geza Vermes, da Universidade anunciado não é segundo o
de Oxford, na Inglaterra, vão mais além na crítica às origens homem, pois eu não o recebi
cristãs. "No relato de João da vida de Jesus, eles (os judeus) nem aprendi de algum
são um bando sedento de sangue que desde o início procurou homem, mas por revelação
matá-lo e não desistiu até ter sucesso em seus planos de Jesus Cristo."
nefandos", diz Vermes no livro A Religião de Jesus, o Judeu. Paulo, Epístola aos Gálatas, 1, 11
"Eis a origem da tendência cristã de demonizar os judeus, a
origem do antijudaísmo religioso, tanto moderno quanto
medieval, que direta ou
indiretamente conduz ao
Holocausto."
Apesar de todas essas críticas, o Novo Testamento continua sendo a fonte mais rica e mais
detalhada das origens cristãs. Mas, felizmente, o cristianismo passou nos últimos 50 anos, a
partir de João 23, a rever seus procedimentos no dia-a-dia. "As barreiras de desconfiança
mútua se dissolveram. Nunca houve tantos encontros oficiais de católicos com a comunidade
judaica visando caminhar para uma verdadeira fraternidade", diz o rabino Henry Sobel,
presidente do Rabinato da Congregação Israelita Paulista, em São Paulo. "Esse é um caminho
para valer, sem volta."
Essas considerações se aplicam à passagem bíblica alusiva à escolha de Pedro por Jesus
como a pedra sobre a qual se ergueria sua Igreja. Muitas passagens dos evangelhos são
comuns às quatro versões. Três desses livros – os de Marcos, Mateus e Lucas – são
chamados pelos especialistas de evangelhos sinóticos, pois é possível fazer uma sinopse
única de grande parte de seu conteúdo. Nessa sinopse, porém, não entra a famosa
citação de Mateus, pois ela consta somente do seu evangelho. Segundo vários
estudiosos, o texto desse apóstolo foi escrito em Antioquia, na Síria, cidade onde o
próprio Pedro realizou grande parte de seu apostolado. Mateus teria, portanto, como se
diz, "puxado a sardinha" para o seu lado. E conseguiu o milagre de multiplicá-la.
Se Jesus realmente disse a Pedro o que Mateus escreveu, ele não o teria incumbido de
construir um templo religioso, nem de fundar uma nova Igreja no sentido que essa
palavra tem de religião. A frase teria sido dita em aramaico, língua falada na Palestina
no dia-a-dia (o hebraico só era usado em atividades religiosas), mas as versões mais
antigas do texto de Mateus estão em grego, o idioma oficial mesmo sob a dominação
romana. "Igreja" é a tradução do grego "enklesía", que significava então comunidade.
Uma nova comunidade não era necessariamente uma nova religião.
Galileu: Se o essencial, portanto, não era fundar uma nova religião, qual
teria sido o eixo da mensagem de Jesus?
Vasconcellos: Ele trouxe uma nova
perspectiva para o que era chamado
de Reino de Deus. Para a tradição,
esse reino seria um futuro de justiça e
de santidade. Para Jesus, ele estaria
entre aqueles que vivem o aqui e
agora. Como disse John Dominic
Crossan, pesquisador irlandês
A Ceia de Emaús radicado nos Estados Unidos, em seu
Jesus, um homem comum, no livro O Jesus Histórico, "o importante
quadro de Caravaggio (1601) não é possuir uma intuição especial
para poder ver o Reino do futuro, e sim ter a habilidade de reconhecê-lo
como uma realidade presente".
Imagens conflitantes
Três anos antes de Zuurmond, o irlandês John Dominic Crossan, professor de estudos
bíblicos da Universidade De Paul, em Chicago, nos Estados Unidos, já reclamava do
número cada vez maior de pesquisadores competentes gerando imagens conflitantes de
Jesus. "A pesquisa do Jesus Histórico está virando uma piada sem graça", diz ele em seu
livro O Jesus Histórico.
Uma das principais fontes de problemas dos estudos científicos da Bíblia está na
excessiva especialização de alguns pesquisadores. O risco dessa tendência na pesquisa
dos evangelhos, assim como em outras áreas, está na dificuldade de admitir como
válidas cientificamente as conclusões obtidas fora dos princípios da área de
especialidade. Seria o caso, por exemplo, de arqueólogos bíblicos que desconsiderariam
evidências históricas ou lingüísticas sem suporte em registros arqueológicos. "Um
número cada vez menor de estudiosos consegue enxergar além dos limites – por eles
mesmos traçados – de sua especialidade", diz Zuurmond.
O teólogo holandês não poupa nem mesmo seus colegas de batina: "Mais de uma vez
ouvi um colega dizer, a respeito de determinada interpretação de um texto bíblico: 'Sim,
é verdade, mas no púlpito não podemos dizer essas coisas'. (…) Acredito que seríamos
desonestos se por 'motivos pastorais' escondêssemos nossas convicções como
cientistas".
Em seu livro A Religião de Jesus, o Judeu, de 1993, o húngaro Geza Vermes, professor
de estudos judaicos da Universidade de Oxford, na Inglaterra, já assinalava que em
nenhum trecho dos evangelhos Jesus contesta qualquer mandamento da Torá, a Bíblia
judaica. "As declarações controvertidas giram em torno de leis conflitantes, quando uma
cancela a outra", diz Vermes referindo-se a declarações atribuídas a Jesus nos
evangelhos.
Muitos estudiosos atualmente não descartam a hipótese de Jesus ter sido um fariseu. Em
uma outra obra, recentemente lançada no Brasil, Sábios Fariseus – Reparar uma
injustiça, Evaristo de Miranda e José Schorr Malca ressaltam o espírito
antifundamentalista dos fariseus, que valorizavam o confronto de idéias opostas e
defendiam a interpretação e discussão dos textos bíblicos, mesmo que fossem
conflitantes. "O fundamentalismo não admite discussão nem o enfrentamento de idéias.
Eles (os fundamentalistas) crêem-se travando uma guerra contra forças destruidoras de
seus valores mais sagrados e dogmáticos", diz o livro de Miranda e Malca, para quem
Jesus usava as mesmas parábolas e metáforas dos fariseus.
Apesar do rigor da reconstituição dos britânicos, não se quer dizer que agora
sabemos como era o rosto de Jesus. O crânio usado pode ser de um homem
que não era nada parecido com ele.
Tudo indica, portanto, que Jesus jamais teve a intenção de fundar uma nova Igreja. A
dúvida que fica para quem não pertence ao restrito grupo dos estudiosos é o que
significava o Reino de Deus, a mensagem central de Jesus. "Em sua pregação, ele
simplesmente levou muito a sério o que a religião de seu povo pedia. E foi na sua
experiência humana que ele aprendeu isso", afirma Storniolo. "Para Jesus, 'Shalom' (paz
em hebraico) era cada um ter sua terra, seu cultivo, poder sentar sob sua figueira ou sua
videira e viver em paz na comunidade."