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HANNIGAN, John A. Sociologia ambiental: a formação de uma perspectiva social.

Lisboa, Instituto
Piaget, 1997. [cap. 2, 4, 5 e 10].

John A. Hannigan

SOCIOLOGIA AMBIENTAL: A FORMAÇÃO DE UMA PERSPECTIVA SOCIAL

Capítulo 2

A construção social dos problemas ambientais

A abordagem construcionista dos problemas ambientais tem múltiplas origens, mas é melhor
compreendida se voltarmos ao início dos anos 1970 quando explicações convencionais para a existência dos
problemas sociais foram seriamente afrontados pela primeira vez.

Formulação dos problemas sociais

Há perto de um século, a sociologia dos problemas sociais começou a passar por um conflito
paradigmático fundamental com a aparição de um artigo seminal, de Malcolm Spector e John Kitsuse (1973)
intitulado «Social Problems: a reformulation». Aqui, e no livro subsequente (1977), Spector e Kitsuse
desafiavam, a abordagem «estruturalmente funcional» aos problemas sociais que até então tinham dominado
a área. O funcionalismo, tal como foi exemplificado pelo trabalho de Merton e Nisbet (1971), tomou por
certa a existência de problemas sociais (crime, divórcio, doenças mentais), os quais eram produtos directos
das condições objectivas prontamente identificáveis, distintas e visíveis. Os sociólogos eram vistos como
peritos que empregam métodos científicos para localizar e analisar estas violações morais e aconselhar os
fonnuladores de políticas na melhor forma de enfrentar a situação. Além disso, o papel dos sociólogos era
suscitar ao público leigo uma consciencialização e compreensão das condições preocupantes, especialmente
onde estas não eram prontamente evidentes (Gustfield 1984: 39).


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Spector e Kitsuse argumentam que os problemas sociais não são condições estáticas, mas
«seqüências de acotecimentos» que se desenvolvem com base nas definições coletivas. Em conformidade
com esta teoria eles definiram os problemas sociais como «as atividades de grupos que fazem asserções de
agravos e reivindicações às organizações, agências e instituições sobre algumas condições aceitáveis» (1973:
146). Deste ponto de vista o processo de criação de exigências é tratado como mais importante, do que a
tarefa de avaliar se as estatísticas destas exigências são verdadeiramente válidas ou não. Por exemplo, em
vez de documentar o aumento do nível de criminalidade, o analista dos problemas sociais é impelido a
centrar-se na forma como este problema é «gerado e sustentado pelas acívidades de gupos de reclamação e
respostas institucionais a elas» (1973: 158).
Desde 1973 que a formulação social se tem direcionado cada vez mais no sentido do âmago da
teorização dos problemas sociais gerando uma massa crítica de contribuições teóricas e empíricas (ver
especialmente Best 1989a; Cusfield 1981; Holstein e Miller 1993; Loseke 1992; Schneider 1985; Schneider
e Kitsuse 1984). A formulação tem igualmente ganho atualidade noutras áreas de especialização curricuIar,
nomeadamente na ciência e tecnologia (Knorr-Cetina 1983: Latour e Woolgar 1986; Pinch e Bijker 1987),
relações de género (Laws e Schwartz 1977; Mackie 1987) e os estudos da comunicação social (Altheide
1976; Fishman 1980; Schlesinger 1978). Em cada caso, o que uma análise construcionista tem em comum é
uma preocupação com a forma como as pessoas determinam o significado do seu mundo (Best 1989b: 252).

Controvérsias

Apesar de a abordagem social construcionista ter transformado e revitalizado a sociologia dos


problemas sociais, não tem sido imune a controvérsias. Um debate central na análise construcionista diz
respeito à natureza relativa ou contingente dos problemas sociais. Os analistas dos problemas sociais avisam
que a construção corre o risco de negar a existência danosa de problemas graves da «vida real» - uma
acusação que está, de forma semelhante, ao nível da perspectiva social construcionista sobre o ambiente.
Fazem-no, reclamam eles, sujeitando estas condições aos caprichos da definição social. No outro lado do
espectro, outros críticos atribuem as tarefas dos construcionistas aos fracassos em abandonar integralmente
os resíduos objetivos da teoria funcionalista. De forma mais proeminente,

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Woolgar e Pawluch (1985) acusam o construtivismo de se empenhar na estratégia do «enredo ontológico».


Querem eles dizer com isto que os autores construcionistas continuam a identificar arbitrariamente as
condições problemáticas ou comportamentos válidos para estudo, ao mesmo tempo que relativizam as
definições e exigências feitas sobre elas. Tipicamente, uma condição, como a da utilização de heroína, é
tratada como objetivamente real e constante ao longo do tempo, enquanto que a avaliação social deste estado
como problemático ou não varia de era para era. Segundo Woolgar e Pawluch isto é internamente
inconsistente, visto que faz a distinção entre um conjunto de estados fixos, tal como são identificados pelo
analista de problemas sociais, e um conjunto de estados contextuais que mudam, tal como é proposto pelos
participantes nos problemas sociais.
Os construcionistas sociais responderam a esta acusação de enredo ontológico de diversas formas.
Os «construcionistas rigorosos» mantêm a teoria de que temos de estar vigilantes ao fazer quaisquer
afirmações sobre as condições sociais. Em vez disso, defendem que adoptemos a perspectiva
etnometodológica, por forma a descobrir novas formas de escrever os textos da formulação social, os quais
se centram inteiramente na interpretação e práticas dos participantes no problema da construção social. Por
outro lado, os construcionistas contextuais argumentam que qualquer afirmação pode ser avaliada com base
na dura evidência de, por exemplo, estatísticas oficiais, ou questionários da opinião pública (Best 1989b:
247), mesmo que sejam, em si próprios, construções sociais. Por exemplo, Best (1993: 139) sugere que o
analista dos problemas sociais pode razoavelmente duvidar das reclamações relativas ao facto de os
satânicos sacrificarem 60000 vítimas anualmente enquanto aceitam números fornecidos pelos Centros para o
Controlo de Doenças para os números de vítimas americanas da SIDA. O investigador é particularmente
encorajado a ter em consideração o complexo histórico no âmbito dos quais as reclamações dos problemas
sociais foram formuladas, por forma a explicar o surgimento e avaliar a validade da sua reclamação (Rafter
1992).
A formulação social foi igualmente dividida em termos da utilidade da «história natural» dos
problemas sociais. A formulação original de Spector e Kitsuse continha quatro fases para o modelo de
história natural, no qual a criação das exigências vai desde as tentativas para transformar os problemas
privados em questões públicas através do reconhecimento oficial, a insatisfação com a forma como

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as organizações burocráticas estão a lidar com as condições atribuídas, e finalmente, o desenvolvimento de


instituições paralelas ou as contra-instituições alternativas para procurar radicalmente as novas soluções para
os problemas percepcionados. Contudo, tal como Schneider (1985: 225) realçou, este tipo de modelo de
história natural encoraja-nos a exagerar a extensão dos tipos de atividades que ocorrem apenas em certas
fases no processo de criação das exigências. De fato, as fases propostas por Spector e Kitsuse tendem a
sobrepor (1981), em vez de seguir uma sucessão ordenada. Hilgartner e Bosk (1988) argumentam que é
agora tempo de ir para além dos modelos de história natural e propor um modelo de alternativa ecológica em
que a população dos potenciais problemas sociais compete pela atenção social no âmbito das áreas públicas.

Construcionismo como ferramenta analítica.

Best (1989b: 250) realçou que o constiucionismo não é apenas útil como uma posição teórica, mas
poderá ser igualmente útil como uma ferramenta analítica. A este respeito, ele sugere três focos para o
estudo dos problemas sociais a partir de uma perspectiva construcionista: as próprias exigências; os
formuladores das exigências e o processo de criação das exigências.
Natureza das Exigências

Tal como foi inicialmente conceptualizado por Spector e Kitsuse, as exigências foram exigências em
relação às condições sociais que os membros do grupo entenderam como ofensivo e indesejável. Segundo
Best (1989b: 250), existem várias questões a ser consideradas quando se analisa o conteúdo da exigência: O
que é dito sobre o problema? Como é que o problema está a ser tipificado? Qual é a retórica da criação das
exigências e como é que as exigências são apresentadas por forma a persuadir o seu público? Destas, foi a
terceira questão a que gerou mais interesse entre os analistas contemporâneos dos problemas sociais.
Utilizando o exemplo das «crianças desaparecidas», isto é das fugas, arrebatamento e rapto por
estranhos, Best (1987) analisa o conteúdo das exigências dos problemas sociais centrando-se na retórica da
criação das exigências. A retórica implica a utilização deliberada

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da linguagem, por forma a persuadir. As afirmações retóricas contêm três componentes principais ou
categorias de afirmações: bases, garantias e conclusões.
As bases, ou dados, fornecem os fatos básicos que moldam o discurso subsequente da criação de
exigências. Existem três tipos principais de afirmações de base: definições, exemplos e estimativas
numéricas. As definições estabelecem as fronteiras ou domínio do problema, e dão-lhe orientação; isto é, um
guia da forma como a interpretamos. Os exemplos tornam mais fácil para os corpos públicos identificarem-
se com as pessoas afetadas pelo problema, especialmente quando se vêem a si próprias como vítimas
indefesas. As histórias de atrocidades são um tipo de exemplo particularmente efetivo. Através da estimativa
da magnitude do problema, os formuladores ele exigências estabelecem a sua importância, o seu potencial
para o crescimento e o seu alcance (muitas vezes de proporções epidémicas).
As garantias são justificações para exigir que seja levada a cabo uma ação. Estas podem incluir a
apresentação da vítima como inocente, realçando ligações com o passado histórico ou ligando as exigências
a direitos básicos e liberdades. Por exemplo, ao analisar a literatura profissional sobre o «abuso de idosos»,
Baumann (1989) identificou seis garantias primárias:

1) Os idosos são dependentes;


2) Os idosos são vulneráveis;
3) O abuso põe em perigo a vida;
4) Os idosos são incompetentes;
5) O envelhecimento provoca strees nas famílias;
6) O abuso dos idosos indica, muitas vezes, outros problemas familiares.

As conclusões tornam clara a ação que é necessária para aliviar ou erradicar um problema social. Isto
envolve frequentemente a formulação de novas políticas sociais de controle por instituições burocráticas
existentes ou a criação de novas agências para levar a cabo estas políticas.
Best propõe posteriormente dois temas retóricos ou tácticas que variam segundo a natureza do público
alvo. A retidão retórica (valores ou moralidade requerem que o problema receba atenção) é mais eficaz no
seu início numa campanha de criação de exigências em que os públicos são mais polarizados, os ativistas
têm menos experiência e a procura primária é um problema para ser visto de uma nova forma. Pelo
contrário, a retórica da racionalidode (ratificar uma exigência

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dará ao público algum tipo de benefícios) funciona melhor nas últimas fases da construção dos problemas
sociais quando os formuladores de exigências são mais sofisticadas, quando a procura primária destina-se às
agendas políticas e os públicos são mais facilmente persuadidos. Rafter (1992: 27) juntou outra tática
retórica à lista de Best: a da formação do arquétipo. Os arquétipos são os modelos a partir dos quais os
estereótipos são inventados e têm, portanto, um poder persuasivo considerável como parte da campanha de
criação das exigências 1.
Um conjunto posterior de estratégias retóricas na criação das exigências foi proposto por Ibarra e
Kitsuse (1993) que esboçaram uma variedade de idiomas retóricos, motivos e estilos de criação de
exigências.
Os idiomas retóricas são grupos de imagens que oferecem à exigências um significado moral. Eles
incluem uma «retórica da perda» (da inocência, natureza, cultura, etc.); uma «retórica da insensatez» que
invoca imagens de manipulação e conspiração; uma «retórica da calamidade» (num mundo cheio de
condições deteriorantes, proporções epidêmicas são reclamadas por alguns; por exemplo, a SIDA ou o efeito
de estufa): uma «retórica de titularidade» (justiça e Jair play exigem que a condição, ou como Ibarra e
Kitsuse o designam, a «categoria-condição», seja reformulada), e a «retórica do perigo» (categorias-
condição põem riscos intoleráveis à saúde e segurança pessoais).
Os motivos retóricos são metáforas atuais e outras figuras de estilo (a SIDA como uma «praga», a
destruição da camada de ozono como uma «bomba relógio») que realçam algum aspecto de um problema
social e o impregnam de significado moral. Alguns motivos referem-se aos agentes morais, outros a práticas
e outros ainda a magnitudes (Ibarra e Kitsuse 1993: 47).
Os estilos de criação das exigências referem-se à forma de uma exigência, para que esteja em
sincronia com o público pretendido (corpos públicos, burocratas, etc.). Exemplos dos estilos de criação das
exigências incluem um estilo científico, um estilo cômico, um estilo teatral, um estilo cívico, um estilo legal
e um estilo subcultural. Os formuladores de exigências deverão combinar um estilo certo para a situação e
públicos certos.

Formuladores de exigências

Ao olhar para a identidade dos formuladores de exigências, Best (1989: 250) aconselha que
levantemos algumas questões. Os formuladores

1 Ibarra e Kitsuse (1993) realçam igualmente um conjunto de «estratégias anti-retóricas» que têm por objectivo bloquear as
tentativas dos reivindicadores pflra construir um problema e ou exigências de acção.

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de exigências estão filiados em organizações específicas, movimentos sociais, profissões ou grupos de


interesse? Eles representam os seus próprios interesses ou de terceiros? Eles têm experiência ou são novatos
(como vimos, isto pode influenciar a escolha de tácticas retóricas)?
Muitos estudos que foram levados a cabo no modo de formulação social apontaram para a
importância do papel desempenhado pelos profissionais de medicina e cientistas na construção das
exigências dos problemas sociais. Outros observaram a importância das políticas e dos «empresários de
questões» - políticos, firmas de advocacia de interesse público, funcionários públicos cujas carreiras
dependem da criação de novas oportunidades, programas e fontes de financiamento, etc. Os formuladores de
exigências podem também estar presentes nos meios de comunicação social, especialmente visto que a
criação de notícias depende dos jornalistas, editores e produtores que encontram constantemente novas
tendências, formas e questões. O elenco dos formuladores de exigência que se combinam para promover um
problema social podem, por vezes, ser muito diversificados. Por exemplo, Kitsuse et al. (1984) identificam
três categorias principais de formuladores de exigências na identificação do problema de kikokushijo no
Japão, isto é, a vantagem educacional das crianças japonesas em idade escolar cujos pais as levaram para o
estrangeiro por fazerem parte de uma empresa ou do corpo diplomático: funcionários em agências
governamentais influentes e prestigiosas; grupos informalmente organizados de esposas de diplomatas ou
empresários; e o «meta» - um grupo de apoio de jovens adultos que foram vítimas da experiência do
kikokushijo.

Processo de criação de exigências

Wiener (1981) representou a definição coletiva dos problemas sociais como uma interação com
retrocesso entre os três subprocessos: animação do problema (estabelecimento de direitos territoriais,
desenvolvimento de eleitorados, limitação dos conselhos e revelação de capacidades e informação);
legitimação do problema (usar o conhecimento e prestígio de outrem, redefinir a sua abrangência por
exemplo, de uma questão moral, para uma questão legal, construir o respeito, manter uma identidade
separada); e demonstração do problema (competir pela atenção, combinar-se pela força, isto é,
estabelecendo alianças com outros formuladores de exigências, seleccionar dados

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de apoio, convencer ideologias opostas, alargar as fronteiras da responsabilidade). Estas são sobreposições,
em vez de processos sequenciais que em conjunto resultam numa arena pública construída à volta dos
problemas sociais.
Hilgartner e Bosk (1988) identificaram estas arenas do discurso público como um excelente local
para a avaliação das definições dos problemas sociais. Contudo, em vez de examinar as fases do
desenvolvimento do problema, eles propõem um modelo que realça a competição entre potenciais problemas
sociais que requerem atenção, legitimidade e recursos sociais. Diz-se que os formuladores das exigências ou
«operadores» adaptam deliberadamente as suas exigências para os problemas sociais, por forma a que estes
se encaixem nos seus ambientes alvo; por exemplo, através da reunião das suas exigências num romance,
sob uma forma sucinta e dramática ou através da estruturação das exigências numa retórica politicamente
aceitável.
Best (1989b: 251) levanta um número de questões úteis sobre o processo de criação das exigências.
A quem é que os formuladores das exigências se dirigem? «Os outros formuladores de exigências
apresentaram exigências rivais?» Que preocupações e interesses é que o público dos formuladores de
exigências levantaram, e como é que moldaram as respostas dos públicos às exigências? Como é que a
natureza das exigências ou a identidade dos formuladores de exigências afetam a respostas dos públicos?

O Construcionismo Social e o Ambiente

Tal como observámos, os problemas ambientais são semelhante, em muítos formas, aos probemas
social em geral. Existem, contudo, algumas diferenças importantes, enquanto os problemas sociais passam
de um discurso médico para as áreas do discurso e ação públicas (Rittenhouse 1991: 412), eles, contudo, têm
como origem de muito do seu poder retórico os argumentos morais, em vez dos factuais. Por exemplo, a
recente elevação da «violação num encontro» ao estatuto de problema social deve-se provavelmente mais à
mudança da paisagem das relações entre sexos, do que à evidência científica que sugere um súbito impulso
na incidência desta condição. Pelo contrário, os problemas ambientais, como o envenenamento por
pesticidas ou o aquecimento global, enquanto moralmente condenados, são ligados mais diretamente as
descobertas e exigencias científicas (Yearley 1992: 117).

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Além disso, embora eles sejam identificados com agentes humanos os problemas têm uma base física
mais impositiva do que os problemas sociais gue estão mais enraizados nos problemas sociais que se
converteram em questões públicas (Mills 1959).
Apesar de o ambiente nunca ter tido grande interesse para os investigadores sociais, recebeu alguma
atenção limitada, primeiramente nos textos de estudantes universitários sobre os problemas sociais.2 Quase
de modo uniforme, os problemas ambientais são representados como reais, identificáveis e intrinsecamente
danosos. Num texto do início dos anos 1980, os autores denominam inclusivamente uma seção do seu
capítulo ambiental «Dimensões objetivas do problema» e prosseguem discutindo a «extensão» da poluição
do ar, água e pesticidas (Wright e Weiss 1980). Um segundo texto dos problemas sociais, publicado no
mesmo ano, estrutura o seu capítulo no «Ambiente», em torno de quatro questões: Qual é a causa da crise
ambiental? Quais são os efeitos da poluição a longo prazo? Como é que podemos lidar com a diminuição
crescente dos recursos? Poder-se-á evitar um desastre ecológico? Os autores, referem-se aos sociólogos
americanos James Coleman e Donald Cressey, ilustram resumidamente a definição construtivista de um
problema social realçando que a «poluição não se tornou um problema social, até os ativistas ambientais
serem capazes de convencer outros a preocuparem-se com as condições que existiram na realidade durante
algum tempo». Contudo, eles enfraqueceram este princípio interrogando-se: «Se milhares de pessoas não
sabiam que estavam a ser envenenadas pela fuga de radiação de uma central nuclear, a poluição pela
radiação seria ainda um problema social?» (1980: 3-4).
Um dos poucos textos sobre os problemas sociais que tentou deliberadamente formular uma
perspectiva conctrucionista foi o livro de Armand Mauss de 1975, Social Problems as Social Movements.
Num capítulo, com a colaboração do sociólogo Stan Albrecht, Mauss lida brevemente com tópicos como
«definições culturais do meio ambiente» e «interesses políticos e científicos e públicos», embora grande
parte do resto do capítulo seja dedicado a uma história do movimento ambiental americano.

2 Um exemplo recente e notável disto é o capítulo de Riley Dunlap intitulado «Dos problemas ambientais aos problemas
ecológicos» in Calhoun e Ritzer (1993). Contudo, tal como foi discutido no capítulo 1, a análise de Dunlap tem as suas raízes
numa abordagem «ecológica» normativa dos problemas ambientais.

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Enquanto os autores construtivistas sociais contemporâneos utilizam, por vezes, exemplos que se
relacionam com as questões e problemas ambientais (cf Ibarra e Kitsuse 1993), nenhum dos problemas
sociais principais editados que os leitores levaram a cabo a partir desta perspectiva incluem um artigo sobre
os problemas ambíentais. Em vez disso, o ímpeto para uma perspectiva social construcionista sobre o meio
ambiente tem, em grande parte, a sua origem na própria sociologia 3.
Diversos autores de renome neste campo apelaram para o desenvolvimento de um modelo
construcíonista que poderia ajudar a guiar futuras investigações para a criação e legitimação do
conhecimento e riscos ambientais, Freudenburg e Pastor realçaram uma perspectiva conceptual que incide
sobre a estrutura dos debates sobre os riscos, levados a cabo pelos atores institucíonaís. A sua «construção
social dos conflitos de risco» é justificada com base no fato de «criar riscos para a Sociologia, em vez de o
inverso, realçando em vez de esconder as lutas políticas e discursivas inseridas nos riscos tecnológicos»
(1992: 398). Numa linha semelhante, Buttel e Taylor argumentaram que a sociologia ambiental deve dar
mais atenção à construção social do conhecimento ambiental. A construção global das questões ambientais
é, argumentam eles, tanto ou mais uma questão de construção social e políticas de conhecimento da
produção, visto tratar-se de uma reflexão direta da realidade biofísica» (1992: 214). Um terceiro autor que
utiliza explicitamente um modelo construtivista é Stella Capek. Capek (1993) utiliza uma variedade de
fontes, desde a literatura sobre o movimento social e os problemas sociais incluindo Best, Gusfield e Spector
e Kitsuse para explicar a emergência de uma estrutura de «justiça ambiental» e o seu poder mobilizador nas
lutas comunitárias contra a contaminação tóxica no Sul dos Estados Unidos. Finalmente, Steven Yearley
(1992) que também utilizou os pensamentos de Spector e Kitsuse, examinou o «caso dos verdes», isto é, o
aumento da consciência ambiental e a sua ação ao longo dos dois últimos decénios, a partir de uma
perspectiva de empreendimento moral e de criação de exigências.
Empiricamente, o papel central das atividades de criação de exigências para moldar as agendas
ambientais, avaliações e políticas têm sido examinadas em análises de contaminações químicas

3 Isto inclui a «Sociologia do risco» com sobreposições significativas, mas não é contíguo com a sociologia ambiental (ver
Freudenburge Pastor 1992; Covello e Johnson 1987; Short 1992).

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(Aronoff e Gunter 1992), mudança climática global (Hart e Victor 1993; Ungar 1992), cobertura dos meios
de comunicação social das questões ambientais e conflitos (Burgess e Harrisson 1993; Hansen 1991; Mazur
e Lee 1993; Schoenfeld ct aI. 1979) e as questões relacionadas com o risco e a segurança ( Spencer e Triche
1994; Stallings 1990).
Se a perspectiva social construcionista for compatível com qualquer outra abordagem do meio
ambiente, é provavelmente a da economia política. Tal como será observado de forma diversificada nas
próximas páginas, a forma como o conhecimento e risco ambientais são concetualizados e o relativo êxito
destas construções, são impelidas e canalizadas para as estruturas existentes do poder econômico e político.
Contudo, a economia política por si só não é suficiente para explicar os passos da carreira dos problemas
ambientais. A percepção é mais do que simplesmente uma função de poder; depende de um grande número
de outros fatores que se relacionam com a cultura e o conhecimento. É importante, portanto, abordar a
questão de Benton e Redclift:

Quais são os processos de comunicação, processamento discursivo, orientação normativa, «empreendimento


moral» através dos quais os antagonismos do debate ambiental são formados e transformados? (1994: 9)

Tarefas/processos fundamentais

Ao definir os problemas ambientais, despertando a atenção da sociedade e levando à ação, os


formuladores de exigências deverão empenhar-se numa variedade de atividades. Algumas destas atividades
dizem centralmente respeito à definição coletiva dos problemas potenciais, outras à ação coletiva necessária
para os minorar (Cracknell 1993:4). Isto não significa que os elementos da definição e ação não se inter-
relacionem constantemente. Contudo, os problemas ambientais seguem uma certa ordem temporal de
desenvolvimento, visto que progridem desde a descoberta inicial até à política de implementação.
Nesta seção do capítulo identifico três tarefas principais que caracterizam a construção dos
problemas ambientais. Ao fazer isso, utilizei dois modelos: os três processos de Carolyn Wiener (1981)

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através dos quaís é construída uma área pública em torno de um problema social, e as três tarefas de William
Solesbury (1976) que são necessárias a uma questão ambiental para originar, desenvolver-se e crescer
poderosamente no âmbito do sistema político.
Tal como já foi observado anteriormente neste capítulo, no seu livro The Politics of Alcoholism,
Wiener representou a definição coletiva de problemas sociais como uma interação de retrocesso entre estes
três processos: animação, legitimização e demonstração do problema. Estes são apresentados como
sobrepostos, em vez de um processo sequencial; isto é, eles interagem um com o outro, em vez de operarem
independentemente.
O esquema de Solesbury está mais preocupado com o destino político das preocupações ambientais.
Ele observa que a «mudança contínua na agenda das questões ambientais», a qual pode ser parcialmente
justificada pelas mudanças na agenda do Estado do próprio meio ambiente (ver Ungar 1992) e parcialmente
através da mudança das visões do público em relação aos assuntos que são importantes e aos que não são.
Todas as questões ambientais, afirma ele devem passar por testes separados: liderar a atenção, exigir
legitimidade e apelar para a ação. Tal como Wiener, Solesbury afirma que estas tarefas devem ser realiza as
simultaneamente sem nenhuma ordem em particular (Cracknell 1993:5), embora fosse presumivelmente
difícil apelar para as mudanças de política antes de o problema ser reconhecido e legitimado.
Ao considerar a formulação social dos problemas ambientais, é impossível identificar três tarefas
fundamentais: reunião, apresentação e constestação das exigências (quadro 1, página 42)

Junção das exigências ambientais

A tarefa de reunir as exigências ambientais diz respeito à descoberta inicial e elaboração de um


problema inicial. Nesta fase, é necessário envolver-se numa variedade de atividades específicas: designar o
problema, distingui-Io em relação a outros problemas semelhantes ou mais abrangentes, determinar a base
legal, moral ou técnica de uma exigência e estimar quem é responsável por levar a cabo uma ação de
melhoria.
Os problemas ambientais são frequentemente originados no mínimo da ciência. Uma das razões para
isto e o fato das pessoas comuns não terem nem o conhecimento, nem os recursos para encontrar novos
problemas. Por exemplo, o conhecimento sobre a camada

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de ozono não está ligado à nossa experiência diária; fica apenas disponível através da utilização das
investigações da alta tecnologia numa atmosfera acima das regiões polares (Yearley 1992: 116).
Alguns problemas, contudo, relacionam-se muito mais de perto com as nossas experiências de vida.
A preocupação com os resíduos tóxicos começa, muitas vezes, junto dos cidadãos locais que esboçaram uma
ligação causal entre a infiltração das lixeiras e um aumento da incidência de leucemia, abortos, defeitos de
nascimento e outros problemas. Isto foi o que aconteceu nas Cataratas do Niagara, no estado de Nova Iorque
onde Lois Gibbs e os seus vizinhos foram os primeiros a associar os seus problemas de saúde relacionados
com os resíduos químicos enterrados há trinta anos no abandonado Love Canal. Aqueles cujos trabalhos ou
objetivos os colocaram em contado próximo com a natureza diariamente (agricultores, funcionários que
trabalham com a vida selvagem) podem igualmente constituir a fonte inicial das exigências devido ao fato de
recolherem cedo os sinais ambientais de aviso, tais como os problemas reprodutivos no gado ou as mutações
no peixe. A chuva ácida surge pela primeira vez como um problema ambiental contemporâneo quando um
inspector das pescas numa área remota da Suécia telefonou para o investigador Svante Oden fazendo a
observação de que parecia haver uma ligação entre a subida da incidência de peixes mortos e um aumento na
acidez dos lagos e rios da área.
O conhecimento prático sobre o meio ambiente tem, muitas vezes, origem na experiência do
quotidiano dos aldeãos, pequenos agricultores nas sociedades do Sul. Sir Albert Howard, muitas vezes visto
como criador da agricultura orgânica, esboçou muitas das suas ideias a partir da consulta de camponeses
agricultores na Índia, a quem ele chamava os seus «catedráticos» (Howard 1953: 22), uma estratégia que foi
considerada revolucionária no contexto da administração colonial britânica. Mais recentemente, os ativistas
provenientes do povo nos países do Terceiro Mundo enfatizaram a importância do «conhecimento vulgar»
(Lindblom e Cohen 1979) que depende mais da observação perspicaz e do senso comum do que das técnicas
profissionais. Este conhecimento vulgar é acumulado nas redes do povo local através da respiração do ar,
beber água, lavrar o solo, colher as produções na floresta e pescar nos rios, lagos e oceanos (Breyman 1993:
131). De modo semelhante, os povos nativos nas sociedades do Norte acumulam conhecimento em primeira
mão sobre o meio ambiente que não poderá estar disponível para os

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observadores não indígenas. Por exemplo, foi sugerido 4 que os biólogos que fazem a estimativa do efeito
dos megaprojetos sobre a ecologia dos rios no Norte do Canadá poderão omitir a existência de um número
de espécies de peixe simplesmente porque nunca se preocuparam em perguntar aos nativos residentes que
conhecem profundamente a terra (Richardson et al.·1993: 87).
Ao procurar as origens das exigências ambientais, é importante para o investigador perguntar de onde
é que vêm as exigências, a quem pertencem ou quem lida com elas, que interesses econômicos e políticos os
formuladores das exigências representam e que tipo de fontes elas trazem para o processo de criação das
exigências.
No início do movimento de conservação dos Estados Unidos, as exigências ambientais foram
apanágio de uma elite da costa Leste que utilizava uma rede de velhas amizades para assegurar o
financiamento e a ação política. Os amadores entusiásticos dominaram as direções dos jardins zoológicos, os
museus de história natural e outras instituições públicas a partir das quais foram capazes de dirigir
campanhas para salvar as sequélas, as aves migratórias, o bisonte americano e outras espécies e habitat em
perigo (Fox 1981). Da mesma forma, a ameaça aos pássaros britânicos, locais de vida selvagem e outros
elementos da natureza foram proclamados no final do século XIX e principio do século XX por um número
de grupos de conservação frequentados por membros de classe elevada (Evans 1992; Sheail 1976).
Contrastando com esta situação, é mais provável que os formuladores de exigências ambientais
atuais tornem a forma de movimentos sociais profissionais com pessoal administrativo e de investigação
pago. Programas de angariação de fundos fortes e sofisticados, ligações institucionalízadas em relação aos
meios de comunicação social e aos legisladores. Alguns grupos usam inclusivamente angariadores porta a
porta que são pagos à hora ou ganham uma percentagem das suas solicitações. As campanhas são planeadas
de antemão, muitas vezes de forma pseudomilitar. Não é encorajada a participação do povo para além do
«papel de membro» com controle centralizado nas mãos de um grupo central de ativistas a tempo inteiro. O
processo de reunião de uma cadeia de exigências
4 Isto foi sugerido nas audiências públicas sobre a proposta ela fábrica Alberta-Pacific de branqueamento ela pasta de papel por
Cindey Ciclay, dos Territórios do Nordeste, a única nativa (e mulher) presente no Alpac EIA Review Board (ver capítulo 5).

61

ambientais envolve, muitas vezes, uma divisão rude do trabalho. Enquanto existem excepções notáveis, os
cientistas que investigam estão normalmente limitados a uma combinação de advertências didáticas,
utilização excessiva do escalão técnico e inexperiêncía em lidar com os meios de comunicação social.
Consequentemente, uma descoberta importante pode permanecer incógnita durante decénios até ser
transformada numa exigência pelas organizações empresariais (Greenpeace, Friends of the Earth, Sierra
Club) ou individuais (Paul Ehrlich, Jeremy Rífkin). A atividade de formulação das exigências do
Greenpeace, por exemplo, não faz muito para ir para além da sua capacidade para construir problemas
ambientais inteiramente novos, mas para a partir do seu génio selecionar, estruturar e elaborar interpretações
científicas que teriam, de outra forma, passado despercebidas ou sido deliberadamente censuradas (Hansen
1993b: 171). Na verdade, a natureza da relação entre a comunicação social e os grupos de pressão ambiental
como o Greenpeace têm-se tornado suficientemente institucionalizada (Anderson 1993: 55), tornando-se
difícil para um problema emergente penetrar na área dos meios de comunicação social sem, pelo menos,
uma validação simbólica dos últimos. Na reunião de um problema ambiental nem todas as explicações são
criadas de igual forma. As exigências que permanecem com dificuldade em compreender os conceitos como
«entropia» têm muito menos possibilidades de se adaptar, do que aqueles que têm no seu núcleo construções
mais prontamente compreensíveis, por exemplo, «extinção» ou «excesso demográfico». Por vezes, a
explicação básica de uma exigência apenas se torna compreensível no contexto de uma «crise» política,
económica ou geográfica. Foi este o caso em 1973 quando a ação concertada da OPEP (Organização dos
Países Exportadores de Petróleo), o cartel dos produtores de petróleo, criou uma crise de energia nas nações
industriais no Ocidente. De forma semelhante, o Verão anormalmente quente de 1988 deu ao problema do
aquecimento global um realce experimental visível.

Apresentação das exigências ambientais

Ao apresentar uma exigência ambiental os empresários têm um duplo formato: precisam liderar a
atenção e legitimar a sua exigência (Solesbury 1976). Enquanto não estiverem relacionadas, constituirão
duas tarefas bastante distintas. Como o modelo de Hilgartner e Bosk realça (1988), as áreas através das quais
os problemas sociais

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vieram a ser definidos e transmitidos ao público são altamente competitivas. Para liderar a atenção, um
problema ambiental potencial deve ser visto como novidade, importante e compreensível - os mesmos
valores que caracterizam uma nova seleçâo em geral (Cans 1979). Um modo efetivo de liderar a atenção é
através da utilização pelos reivindicadores de figuras gráficas, verbalizações apelativas e figuras visuais.
Assim, a extrema redução da camada de ozono tornou-se muito mais «vendável» como problema ambiental
quando representada como um «buraco» que se expande; o entreterimento para crianças americana, Bill
Shontz, gravou inclusivamente uma canção de sucesso intitulada Buraco no Ozono. De forma semelhante, os
efeitos da chuva ácida foram dramatizados com êxito quando os ambientalistas alemães começaram a utilizar
o termo Waldsterben (morte das folhas da floresta). A linguagem visual pode ser especialmente poderosa em
levar a cabo esta tarefa. Por exemplo, os dados técnicos sobre o tamanho dos grupos de focas e dos stocks de
bacalhau perderam instantaneamente relevância quando Brian Davics e outros ativistas publicaram
fotografias, nos meios de comunicação social, de filhotes de focas a serem espancados até à morte nos
campos de gelo de Labrador. Não é invulgar, contudo, que estas imagens sejam expostas por forma a realçar
uma imagem central. Mazur e Lee (1993: 711) deram vários exemplos marcantes disto. As fotografias do
satélite da NASA da camada de ozono por cima da Antárctida tornaram-se um «logotipo» do problema,
transformou gradações contínuas na concentração real do ozono numa escala ordinal que é codificada com
cores, transmitindo a impressão errada de que um buraco discreto e identificável poderia na realidade estar
localizado na atmosfera por cima do Pólo Sul. Em Agosto de 1988, um artigo do New York Times sobre a
destruição da floresta tropical foi acompanhado por uma impressionante fotografia de satélite da Amazônia
em chamas e que foi criada por Alberto Setzer do Instituto Brasileiro de Investigação Espacial. A fotografia
mostrava o que pareciam ser cerca de 100.000 fogos; contudo, foi na realidade uma montagem de muitas
fotografias separadas e incluía fogos em áreas de crescimento da floresta secundária, assim como da floresta
virgem. As questões ambientais podem ser forçadas a tornarem-se proeminentes quando são exemplificadas
por acidentes particulares ou acontecimentos, por exemplo, os acidentes nucleares em Chernobyl e Three
Mile Island, o desastre químico de Bhopal, o naufrágio elos petroleiros Torreu Canyon e Exxon Valdez.
Acontecimentos dramáticos como estes são importantes porque ajudam à identificação política da natureza
de uma questão,

63

as situações a partir das quais surgem, as causas e os efeitos, a identidade das atividades e os grupos na
comunidade que estão envolvidos na questão (Solesbury 1976: 384-5). Staggenborg (1993) identificou seis
tipos principais de «acontecimentos críticos» que afec]tam os movimentos sociais como o movimento
ambiental. Os acontecimentos políticos e sócio-econômicos em larga escala como guerras, depressões e
eleições nacionais influenciam as oportunidades de ação coletiva devido à alteração da percepção das
queixas e às ameaças; por exemplo, a eleição do Presidente dos EUA Ronald Reagan, em 1980, conduziu ao
aumento dos membros em grupos ambientais 5, visto que aumentou o espectro da livre corrida empresarial
descontrolada nos parques nacionais e outros locais selvagens. Os desastres nacionais e as epidemias podem
representar um ponto de viragem no movimento, realçando as queixas e levando ao crescimento do
movimento. De forma semelhante, os acidentes nucleares e industriais podem ser potencialmente úteis no
movimento através da simples utilização de políticas e características da estrutura do poder que estão
normalmente escondidas; por exemplo, o poder das companhias de petróleo no derrame de petróleo em
Santa Bárbara (Molotch 1970). Encontros críticos envolvem interação frente a frente entre as autoridades e
outros actores dos movimentos centrando a sua atenção nas questões do movimento. Um exemplo recente
desta série de confrontações entre os protestantes e a polícia juntamente com o derrubada de árvores de
Clayoquot Sound na ilha de Vancôver. As iniciativas estratégicas são acontecimentos criados por ações
deliberadas levadas a cabo por apoiantes ou opositores dos movimentos avançados ou objetivos dos
contramovimentos. Os acontecimentos que tem lugar e são característicos das campanhas do Greenpeace são
disto exemplos, como a publicação de livros polêmicos como o de Paul Ehrlich The Population Bomb e o de
Jeremy Rifkin Befond Reef. Finalmente, os resultados das políticas são respostas oficiais à ação colectiva por
um movimento ou contramovimento - conjunturas críticas em que os movimentos são forçados a renegociar
as suas estratégias, táticas e objetivos em consequência das mudanças no ambiente político. A decisão da
administração de Roosevelt em 1914, de começar a construção da barragem de Hetch Hetch no Parque
Nacional de Yosemite, por forma a fornecer água ao oleoduto de São Francisco foi

5 O número total de membros das cerca de doze organizações ambientais nacionais nos EUA aumentou de quatro milhões em
1981 para, aproximadamente, sete milhões em 1988 (Bramble e Parker 1992: 317).

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uma decisão desse géneto, visto que destruía qualquer possibilidade de uma aliança posterior entre a fonte
dos conservadores dos recursos representados por Gifford Pinchot e os preservaclores liderados por John
Muir. A discussão de Staggenborg dirigia-se primariamente às questões da mobilização e estratégias do
movimento social, mas a sua tipologia de acontecimentos é relevante para a representação das exigências
ambientais à medida que as organizações ambientais representam, muitas vezes, os formuladores primários
das exigências nesta fase da construção dos problemas ambientais. Claro que nem todos os acontecimentos
críticos são garantidos no sentido de gerar um problema de importância. Segundo Enloe (1975: 21), um
acontecimento dá origem a uma questão ambiental quando:

1) Estimula a atenção dos meios de comunicação social;


2) Envolve alguma arma do governo;
3) Exige uma decisão governamental;
4) Não é eliminado; pelo público como um fenômeno que acontece apenas uma vez; e
5) Relaciona-se com os interesse pessoais de um número significativo dos cidadãos.

Estes critérios são parcialmente uma função do próprio incidente, mas depende igualmente da
exploração com êxito do acontecimento pelos promotores ambientais. Ao apresentar as exigências
ambientais, os líderes do movimento entram no que Show et al. (1986) designou por processo de
«alinhamento estrutural», isto é, grupos ambientais inserem-se e manipulam as preocupações e percepções
públicas existentes: por forma a alargar o seu apelo. Por exemplo, o Greenpeace escolhe primariamente os
tópicos e organiza campanhas em áreas que podem emprestar a si próprias a maior ressonância pública
possível (Eyerman e Jamison 1989: 112) enquanto evitam aqueles que estão divididos. De forma
semelhante, os opositores dos movimentos ambientais tentam apelar a um público mais vasto através da
ligação de novas tecnologias ou programas a questões e causas populares. Assim, a indústria da
biotecnologia tem tido êxito em alimentar a imagem pública de uma tecnologia benigna e de incrementação,
o que é útil na promoção do desenvolvimento econômico (Plein 1991). Liderar a atenção não é, contudo,
suficiente para levantar uma nova questão na agenda para debate público (Solesbury 1979: 387). Em vez
disso, os problemas ambientais emergentes devem ser legitimados em múltiplas áreas - meios de
comunicação social, ciência e público. Uma forma para atingir esta legitimidade é através da utilização das

65

táticas e estratégias retóricas mencionadas por Best (1987) e Ibarra e JKitsuse (1993). Em vez de seguir uma
ordem cronológica, como sugere Best, a retórica ambiental tornou-se cada vez mais polarizada. As
ecofeministas, ecologistas profundos e outros críticos da sociedade pós-industrial têm tendência para adoptar
uma «retórica da retidão» que justifica a consideração os problemas ambientais sob bases estritamente
morais. Pelo contrário, os pragmáticos ambientais, que advogam diversas versões de «desenvolvimento
sustentável», têm tendência para uma retórica da racionalidade. O negócio «verde», por exemplo, é baseado
na premissa de que o ambientalismo pode ser socialmente útil e proveitoso. Esta clivagem pode ser ilustrada
no caso da perda da floresta tropical no Brasil, Malásia e Indonésia. Os pragmáticos argumentam que a perda
destas florestas tropicais é um grave problema visto conduzir à extinção de insetos, plantas e animais
indígenas raros que são valiosos para as companhias farmacêuticas como fontes de novas drogas milagrosas.
Os puristas ambientais, por outro lado, baseiam as suas exigências numa retórica que realça o valor espiritual
inerente a estes habitats em perigo 6.
As exigências ambientais podem igualmente ser legitimadas quando os seus patrocinadores se
tornam fontes de informação legitimas e proeminentes. Hansen (1993b) demonstrou que o Greenpeace
alcançou este tipo de êxito sustentado como formulador de exigências de diversas formas: agindo com uma
conduta para a disseminação de novos desenvolvimentos científicos entre a comunidade de investigadores e
os meios de comunicação social; tornando-se o «significado da estenografia» para tudo o que é ambiental -
cuidados com o ambiente, modos de vida ecológico, atitudes ambientais conscientes - e através da produção
de conhecimento e informação que pode ser utilizado nas arenas de debate público (ver Eyman e Jamison
1989). Por vezes é possível precisar um acontecimento que constitui o ponto de viragem para o problema
ambiental e quando entra na zona da legitimidade. Relativamente ao aquecimento global, isto aconteceu nas
audições do senado americano em 1988 quando o Dr. James Hansen fez a exigência de que ele estava 99 por
cento certo de que o aquecimento dos anos 1980 não se devia ao acaso, mas ao aquecimento global. No caso
da redução da camada de ozono, o acontecimento principal foi um relatório da NASA/NOAA de 1988 que
forneceu

6 Note-se, porém, que no decurso da angariação de fundos e lobbies, importantes organizações de conservacionistas têm tendência
a utilizar as duas retóricas, ancorando os seus apelos nos pressupostos morais e racionais (Yearley 1992: 26).

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uma dura prova que implica pela primeira vez os CFC (Clorofluorocarbonetos) na destruição da camada de
ozono. Com as dioxinas das fábricas de papel, foi o lançamento do «estudo de 5 fábricas de papel» que
mostrou vestígios deste químico tóxico detectado em vários produtos de papel domésticos e que resultou na
história de primeira página no New York Times, lançando este problema nos Estados Unidos e, mais tarde,
no Canadá (Harrinson e Hoberg 1991). Contudo, as descobertas científicas e o seu testemunho não são
sempre suficientes para impulsionar um problema ambiental, para além do ponto de ruptura da legitimidade.
No caso do aquecimento global, o testemunho inicial ao senado do Dr. Hansen em 1986, onde ele previu que
o aquecimento global significativo poderia ser sentido dentro de cinco a quinze anos não atraiu uma
cobertura ou preocupações comparáveis. Isto só aconteceu dois anos mais tarde quando se deu uma mudança
significativa nas práticas dos meios de comunicação social e na atenção do público (Ungar 1992: 492). De
forma semelhante, a publicação por Molina e Rowland em 1984 no jornal Nature da sua teoria sobre a
destruição da camada de ozono pelos CFC apenas originou uma cobertura limitada na imprensa californiana.
Foi apenas mais tarde quando a questão se ligou a reclamações de que outros gases ele latas de aerossóis,
nomeadamente o cloreto de vinil, estavam ligados ao cancro da pele, que foi prestada uma ampla atenção e
legitimidade pelos meios de comunicação aos seus dados (Mazur e Lee 1993: 686).

Contestação das exigências ambientais

Mesmo se uma exigência ambiental emergente conseguir transcender o liminar da legitimidade, isto não
assegura automaticamente uma ação de melhoramento a ser tomada. Tal como Cold et al. (1993: 229)
realçaram, pode-se interpretar a história da proteção ambiental a partir da posição que os movimentos
ambientais têm sido muito mais bem sucedidos na entrada na ampla lista da agenda internacional, do que em
conseguir a institucionalização das suas políticas no âmbito desta agenda, especialmente onde estas políticas
possam requerer a recolocação de fontes longe de interesse de capitais em larga escala e atores burocráticos
do Estado. Solesbury (1976: 392-5) observou um número de fatores que podem contribuir para uma questão;
que se perca no ponto de decisão ou ação. Limitações externas importantes, tais como a instalação de uma
crise econômica nacional

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podem conduzir a um problema que é adiado, e depois abanado no seu conjunto. Um problema pode ser
transformado numa questão política menos ameaçadora. Os opositores no âmbito das burocracias
governamentais podem utilizar um número de táticas - adiamento da discussão, recorrer de um item para
posterior investigação ou emenda - assegura que um problema não será imediatamente alvo de legislação.
Consequentemente, apelar para a ação numa exigência ambiental exige uma contestação em ação pelos seus
formuladores procurando efetuar uma mudança política e legal. Enquanto o apoio científico e atenção dos
meios de comunicação social continuam a constituir uma parte importante do pacote de exigências, o
problema é principalmente contestado no âmbito da arena política. Contestar um problema ambiental no
âmbito da corrente política é uma arte, dadas as pressões com que os legisladores se deparam.
Consideremos, por exemplo, um artigo recente (Geddes 1994) sobre grandes quantidades de
interesses em conflito que devem ser dirigidos pela ministra do Ambiente Sheila Copps, à medida que ela se
prepara para introduzir novos regulamentos controversos sobre a avaliação do ambiente federal. Se os
reguladores forem demasiado ambiciosos, Copps «recorrerá a uma serra circular» proveniente das províncias
do Quebeque e Alberta que interpretará isto como uma incursão nos seus poderes constitucionais. Se os
regulamentos forem demasiado rigorosos, os lobbies dos negócios, especialmente os setores do petróleo e do
gás, objetarão energicamente. Se ela fizer muito pouco, os grupos ambientais serão críticos, acusando-a de
fracassar para concretizar bem as promessas durante a eleição do Partido Liberal em introduzir regulamentos
muito mais duros do que os propostos pelo anterior governo conservador. Os empresários ambientais devem
guiar com destreza as suas propostas através de um aglomerado de grupos de interesse político, muitas vezes
conflituosos, a quem foi atribuída responsabilidade, sendo cada um deles capaz de impedir o trabalho ou
derrubar as propostas. Tal como observou Walker:

As políticas (ambientais) raramente resultam de um processo racional em que os problemas são identificados
com precisão e, depois, cuidadosamente ligados a soluções optimizadas. A maior parte das políticas emergem
duvidosamente, aos poucos a partir de uma complicada série de contratos e compromissos que refletem as tendências,
objetivos e necessidades de realce das agências estabelecidas, comunidades profissionais e empresários políticos
ambiciosos.
(981:90)

68
Kingdon (1980) observa que as propostas de políticos que sobrevivem nesta selva política satisfazem
geralmente este critério básico.
Primeiro, os legisladores devem ser convencidos de que uma proposta é tecnicamente exequível, isto
é, se decretada, a ideia resultará. Este poderá não ser o caso do que devia ter sido feito; por exemplo, a Lei
das Espécies em Perigo nos Estados Unidos resultou de forma muito menos perfeita na sua implementação
do que no papel. Contudo, uma proposta deve, pelo menos, inicialmente parecer ser cientificamente e
politicamente administrável.
Em segundo lugar, uma proposta que sobrevive na comunidade política deve ser compatível com os
valores dos formuladores de políticas. Visto que a maior parte dos burocratas e políticos não partilham as
visões ecocêntricas do vice-presidente americano AI Gore, isto significa que as soluções que refletem o
Novo Paradigma Ecológico têm fortes possibilidades de ir muito longe, a menos que exista uma percepção
generalizada de crise. Em vez disso, as soluções ambientais que parecem superficialmente ser neutrais têm
mais possibilidades de ser aceites, do que aquelas que parecem ideologicamente fracas. Além disso, os
problemas que são estruturados em termos utilitários vão, muitas vezes, mais além daqueles que não o são.
Isto significa que os argumentos feitos com interesses financeiros em mente - números e estatísticas
traduzidas em dólares (libras) - têm mais possibilidades de encontrar eco do que aqueles apresentados
unicamente com base nas justificações morais (Hunt et aI. 1994: 200-1).
A política ambiental não é, de forma nenhuma, uma empresa perfeitamente previsível e consistente.
Por exemplo, Milton (1991) sugeriu que o governo britânico adopta regularmente uma abordagem
contraditória em relação ao ambiente. Nas questões da poluição doméstica adopta uma posição rígida e
hierárquica que tende a retardar a mudança. Isto foi bastante evidente, por exemplo, na resposta britânica ao
problema das chuvas ácidas. Pelo contrário, nos problemas ambientais internacionais, tais como o
aquecimento global, o Reino Unido adotou uma abordagem «mais empresarial». Nas questões da vida
selvagem e de conservação é favorecida uma abordagem que constitui uma mistura hierárquica e
empresarial. Por vezes, levantar-se-á uma questão na agenda política por razões totalmente inesperadas. Isto
aconteceu com o efeito de estufa que inicialmente alcançou a expressão de gravidade, não em termos de
ameaça a longo prazo para o clima mundial, mas em relação ao que era basicamente uma questão
secundária: as implicações

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ambientais do desenvolvimento em larga escala do avião de transporte supersónico (55T) no início dos anos
1970 (Hart e Victor 1993-4).

Assim, contestar com êxito em relação a uma exigência ambiental na arena política requer uma única
mistura de conhecimento, tempo e sorte. Este processo é, muitas vezes, pela condução dos acontecimentos
em relação a um desastre como o acidente nuclear de Three Mile Island que abriu as «janelas políticas»
(Kingdon 1984: 213) que, de outra forma, permaneceriam fechadas. Isto não significa que o estabelecimento
da agenda e a ação legislativa sejam totalmente casuais, mas que o processo é altamente casual segundo um
número de fatores internos e externos, muitos os quais não estão ligados aos momentos óbvios do caso.
Ao mesmo tempo, poderá existir igualmente concorrência em relação à «pertença» de um problema
ambiental. Isto pode tornar-se particularmente rancoroso quando uma das partes que contesta é afastada das
fileiras daqueles diretamente vitimados por um problema. Existem muitos exemplos disto no campo dos
problemas sociais, indo desde os «movimentos de liberação em relação aos padrões», tais como a campanha
dos direitos das «prostitutas americanas» (Jeness 1993; Weitzer 1991) até aos grupos de direitos de vítimas;
por exemplo, o que foi formado recentemente para as doentes de cancro da mama. Isto é menos comum em
relação aos problemas ambientais que geralmente têm um impacto mais difuso. Contudo, um exemplo
significativo é a atual disputa em relação à questão da pertença da «biodiversidade» como recurso e como
problema ambiental (ver capítulo 8). Esta luta opõe uma coligação de pequenos agricultores, ativistas
ecológicos e outros no Terceiro Mundo contra o estabelecimento da conservação: biólogos, burocratas de
organizações não governamentais e ministérios governamentais que lidam com o comércio e questões
ambientais.
Hawkins (1993) identificou três paradigmas de tipos ideais que ocupam cada vez mais o discurso
contestado sobre o futuro ambiental. A continuação do «paradigma de gestão global» advoga a detecção e
solução, dos problemas no povo em geral, através de uma configuração existente de Estados e organizações
internacionais apoiadas por peritos científicos e ambientalistas profissionais no âmbito das ONG
(Organizações Não Governamentais). Esta abordagem diminui o papel das percepções e definições locais
dos problemas, e poderá na ocasião culpar inclusivamente os pobres das

70

nações do Terceiro Mundo por causarem a degradação ambiental. O «paradigma do desenvolvimento


redistributivo» reconhece a necessidade de uma maior equidade nos assuntos relativos ao desenvolvimento
nos países do Sul. Propõe que tais desigualdades possam ser redefinidas através de um número de medidas
inovadoras, tais como o Fundo Verde no Banco Mundial ou as negociações em relação à natureza da dívida.
O «Novo paradigma da ordem de apoio internacional» apela a uma reestruturação fundamental da ordem
mundial, de tal forma que as nações do Terceiro Mundo exigem uma voz mais direta no estabelecimento do
equilíbrio entre o pacto económico e social.
Hawkins representa a construção do ambientalismo internacional como o reflexo de uma luta entre os
apoiantes destes três paradigmas. A disputa para a pertença da biodiversidade é uma manifestação recente
disto; o conflito relativo à mudança climática global é outro. Até mesmo a linguagem utilizada na definição
desta área contestada é em si própria socialmente construída. Por exemplo, os países do Norte adaptaram
uma linguagem «globalizada» para descrever a situação nas nações do Sul em que os «nossos» problemas
ambientais (mudança climática, destruição da camada de ozono) são causados pelos «seus» problemas de
desenvolvimento (perda da floresta, excesso demográfico), situação que é resolúvel apenas abraçando
estratégias de «desenvolvimento sustentáveis» (Redclift e Woodgate 1994: 64-5). Atualmente, os dois
primeiros paradigmas ainda predominam, mas o novo paradigma da ordem de apoio internacional parece
estar a fazer algumas incursões significativas.

Audiências para as exigências ambientais

Para além das capacidades dos formuladores de exigências e a gravidade da própria situação, o êxito
de uma exigência ambiental reconhecida pode também ligar-se à magnitude do público que é mobilizado em
torno da exigência, isto e, a onda de apoio do público, não marca apenas o aumento da consciência de um
problema, mas pode constituir também uma valiosa fonte para captar a atenção política
Para os sociólogos, o problema está na forma segura como pode medir o tamanho e influência do
público. Tal como Ungar

71

(1994: 298) realçou, o potencial para os formuladores de exigências ambientaís para utilizar a opinião
pública como fonte é paradoxalmente aumentada e limitada nos questionários levados a cabo. Isto é, os
questionários feitos ao público hoje em dia raramente representam o apoio às posições contestadas, optando,
em vez disso, por medidas mais abrangentes de preocupação ambiental, tais como a «Nova Escala do
Paradigma Ambiental» desenvolvida por Riley Dunlap e os seus colegas. Isto produz um barômetro tão vago
da opinião pública que virtualmente qualquer grupo do lado «pro-ambiental» pode exigir representá-Ia, mas,
ao mesmo tempo, torna difícil medir reações específicas a questões específicas. Alternativamente, poder-se-a
procurar por outros indicadores de apoio público - comportamento de reciclagem, consumo «verde»,
participação nos acontecimentos e mobilizações ambientais, mas estas são igualmente medi-à-as imperfeitas
da opinião pública.
Contudo, uma onda de opinião pública pode levar uma exigência até à agenda política, por vezes, de
um modo dramático. Na controvérsia de «Alar» nos Estados Unidos, por exemplo, os receios do público em
relação às toxinas, traduzidos no boicote a curto prazo do consumo das maçãs, embora os dados sobre os
riscos tenham mais tarde sido considerados menos seguros do que se pensou originalmente. De forma
semelhante, a preocupação pública com a «Doença das Vacas Loucas» na Grã-Bretanha foi suficientemente
séria para os governos terem agido de uma forma preventiva, nem sempre muito evidente no caso dos riscos
potenciais.
É claro que nem todas as exigências ambientais tiveram êxito no sentido de elevar a bandeira
vermelha para as preocupações do público. Algumas exigências são vistas como demasiado extremistas,
demasiado misantrópicas ou demasiado complexas. Outras, levantam-se contra poderosas contra-exigências.
Algumas fracassam devido ao fato de os mandatos de respostas mitigantes ou as condições preventivas
serem um sacrifício para a vida toda demasiado grande.
A o considerar a razão por que algumas exigências ambientais captam a atenção do público e outras
não, poderá ser útil olhar para a área da investigação publicitária. Num estudo comparativo recente em larga
escala que examinou as atitudes de 30 000 consumidores em 21 países, a agência nova-iorquina de
publicidade Young & Rubicon elaborou um modelo de marketing, o «Brand Asset Valuator» (avaliador de
produto) que isola quatro fatores

72

fundamentais que prevêem o impacto de um produto no mercado: exclusividade, relevância, estatura e


familiaridade (Escócia 1994).
No caso das exigências ambientais, o exclusivo ou particularização refere-se até que ponto o público
se apercebe de um problema como distinto de outros de natureza semelhante. Por exemplo, os formuladores
de exigências em relação às chuvas ácidas tiveram êxito na "distinção feita desta condição em relação a outra
categoria mais abrangente da poluição atmosférica. As estratégicas retóricas são aqui importantes, na criação
de classificações distintivas para os problemas emergentes, assim como para a invenção de códigos
simbólicos que se podem ligar a uma exigência, por forma a conferir uma identidade distintiva.
A relevância, refere-se ao grau de interesse de um determinado problema ambiental para o cidadão
comum. Isto nem sempre é fácil de demonstrar, mesmo quando o problema acontece nos próprios quintais
das pessoas. É especialmente difícil no caso dos problemas ambientais globais que têm as suas origens em
zonas distantes do mundo. Assim, a extensão das condições de seca nas nações pobres vida África tem pouca
relevância no Sudoeste dos Estados Unidos, contudo, as faltas de água a nível regional obrigando a que os
cidadãos locais deixem de regar os seus relvados e encher as piscinas, são bastante significativas.
A estatura denota o quanto um consumidor sente e pensa em relação a uma determinada marca. No
caso do ambiente, este refere-se às atitudes do público em relação ao local, pessoas ou espécies em perigo.
Não é casual o fato de o movimento de protecção da vida selvagem, mobilizado pela primeira vez no século
XIX, devido ao perigo em que se encontravam os nossos tão adorados pássaros canoros, por causa dos
caçadores e do comércio de penas. De forma semelhante, os parques nacionais e os monumentos - o Yellow
Stone Park nos Estados Unidos, o Lake District na Grã-Bretanha, o Great Barrier Reef na Austrália - têm
uma estatura simbólica considerável que virá ao de cima se estes lugares forem postos em perigo. Pelo
contrário, as comunidades negra e hispânica de baixo rendimento da América do Sul, que se deparam com
graves ameaças de poluentes tóxicos, foram de há muito consideradas de baixa estatura, especialmente pelo
público da classe média.
Finalmente, a familiaridade refere-se ao quanto um determinado problema é conhecido do público.
Os meios de comunicação social têm um papel importante na educação sobre o meio ambiente, espécies e
lugares que poderão ter estado para além do nosso domínio

73

ou experiência pessoal. Por exemplo, em 1992 foi anunciado que cientistas no Vietname central tinham
descoberto a sao Ia, um mamífero desconhecido até então do resto do mundo, e parecido com uma cabra.
Quase de um dia para o outro, a sao Ia tornou-se uma superestrela dos meios de comunicação social, em
consequência do frenesi dos meios de comunicação social motivados pelos cientistas, ambientalistas e
imprensa 7. Celebrizada nas páginas das revistas National Geographic e People, tornou-se «o equivalente
zoológico à descoberta de um novo planeta» (Shenon 1994). Em alguns casos, os ativistas ambientais podem
levar a cabo uma ação coletiva, por forma a familiarizar o público com a exigência. Por exemplo, as práticas
de destruição óbvia nas velhas florestas da British Columbia tornaram-se recentemente amplamente
conhecidas na Europa e América, em parte devido à extensa cobertura dos meios de comunicação social dos
protestos pelos ativistas ambientais nas estradas feitas com o derrube de árvores e relativos às ações da
legislatura provincial. Contudo, em vez de aumentar o desenvolvimento de uma exigência a familiaridade
pode, em última análise, produzir o cansaço por parte do público em geral, especialmente se não surgirem
novos desenvolvimentos. É este o caso mesmo que o problema seja distinto e relevante. De fato, o público
tem um sentido inerente de Jair play que dita que atividades como a insensível e «esmagadora poluição» são
inaceitáveis, mesmo que o criticismo seja devidamente merecido.
As exigências ambientais com êxito devem, pois, possuir elementos de vitalidade e desenvolvimento
que assegurem que eles não desapareceram num mar de desinteresse ou irrelevância.

Fatores necessários para a construção com êxito de um problema ambiental

É possível identificar seis fatores que são necessários para a construção com êxito de um problema
ambiental. São os seguintes:
Primeiro, um problema ambiental deve ter uma autoridade científica para a validação das suas
exigências. A ciência poderá muito bem
7 Infelizmente, a sao Ia ficou recentemente em perigo de extinção, devido ao facto de coleccionadores de todo o mundo tentarem
obter um exemplar, chegando a oferecer quantias até um milhão de dólares (Shenon 1994).

74

ser um «amigo incerto» para o movimento ambiental, tal como Yearley (1992) sugeriu, mas, apesar de tudo
é virtualmente impossível para uma condição ambiental ser transformada com êxito num problema sem um
corpo de dados de confirmação que tenha origem nas ciências físicas e da vida ...

1. Autoridade científica para a validação das exigências.


2. Existência de «propagadores» que possam estabelecer a ligação entre o ambientalismo e a ciência.
3. Atenção dos meios de comunicação social onde o problema é «estruturado» como novidade e
importante.
4. Dramatização do problema em termos simbólicos e visuais.
5. Incentivos económicos para tomar uma ação positiva.
6. Emergência de um patrocinador institucional que possa assegurar legitimidade e continuidade.

Isto acontece especialmente com os problemas ambientais mais recentes, aqueles cuja existência repousa
sobre uma construção científica nova (ver discussão da perda da bíodiversidade no capítulo 8).
Em segundo lugar, é crucial ter um ou mais propagadores científicos que possam transformar o que, de
outra forma, permaneceria uma investigação fascinante, mas esotérica numa exigência ambiental pro-ativa.
Em alguns casos (por exemplo, Edward Wilson, Paul Ehrlich, Barry Commoner), os propagadores podem
eles próprios ser empregues como cientistas; noutros (por exemplo, Jonathan Porrit, Jeremy Rifkin), eles são
autores ativistas cujo conhecimento científico vem em segundo lugar. Seja quais forem os seus antecedentes,
estes propagadores assumem um papel de empresários, reestruturando e construindo exigências, para que
possam apelar aos editores, jornalistas, líderes políticos e outros opinion-makers.
Em terceiro lugar, um problema ambiental esperado deve receber a atenção dos meios de comunicação
social, em que a exigência relevante é «estruturada» como real e importante. Tem sido este o caso em muitos
dos sobejamente conhecidos problemas do presente decénio; por exemplo, a destruição da camada de ozono,
a perda da biodiversidade, a destruição da floresta tropical, o aquecimento global. Pelo contrário, outros
problemas ambientais significativos fracassam em chegar até à agenda pública, devido ao fato de eles não
serem considerados especialmente válidos pra se tornarem notícia. Por

75

exemplo, em muitas cidades canadianas a falta de tratamento dos esgotos urbanos é endêmica, mas isto
recebeu uma cobertura exígua comparado com outros problemas de poluição. Tal como o diretor executivo
do Sierra Legal Defense Fund recentemente realçou, um volume de esgotos equivalente a trinta e dois
petroleiros do tamanho do Exxon Valdez são despejados todos os dias em rios ou baías locais, contudo, é
feito fora do alcance do público com virtualmente nenhuma atenção por parte dos meios de comunicação
social (Westell1994).
Em quarto lugar um problema ambiental potencial deverá ser dramatizado em termos altamente
simbólicos e visuais. A destruição da Camada de ozonio foi uma das candidatas à preocupação generalizada
do público até o declínio da concentração ter sido geograficamente representado como um buraco sobre a
Antártida. As práticas maliciosas das principais companhias florestais apenas se tornou um assunto de
afronta internacional quando o Greenpeace e outros grupos ambientais começaram a exibir fotografias
dramáticas de destruições óbvias na ilha de Vancôver, sendo a área designada por «Brasil do Norte».
Imagens como estas fornecem um tipo de atalho cognitivo comprimindo uma discussão complexa numa que
pode ser facilmente compreensível e eticamente estimulante.
Em quinto lugar, deverão existir incentivos econômicos víveis no sentido da ação sobre um
determinado problema ambiental. Isto acontece com cada uma das três historias detalhadas de casos que
serão apresentados em futuros capítulos deste volume. No caso das chuvas ácidas, uma variedade de grupos
de interesse, desde agricultores florestais a associações de caçadores da Floresta Negra no Sul da Alemanha
até aos produtores de xarope de bordo da Nova Inglaterra e Canadá oriental, apoiaram a afirmação dos
cientistas e ambientalistas de que as emissões de dióxido de enxofre das fundições e centrais elétricas
estavam a causar a destruição da floresta. O caso de agir corajosamente para parar a perda da biodiversidade
foi levantado com base na discussão de que as florestas tropicais continham uma riqueza de produtos
farmacêuticos que ainda não foram utilizados, e que desapareceria para sempre se nada fosse feito.
A campanha contra a hormona geneticamente gerada BST encontra um grande apoio nos agricultores
e legisladores em diversos Estados do Norte, nos quais os produtos derivados do leite enfrentam uma perda
de rendímento se a biotecnologia se tornar amplamente utilizada. Ao mesmo tempo, as exigências
ambientais que trazem consigo incentivos econômicos para um grupo, podem igualmente implicar custos
para outros, provocando assim uma severa oposição.

76

Este foi certamente o caso das chuvas ácidas; dos produtores de dióxido sulfúrico, como O Comité da
Central Geradora de Electricidade na Crã-Bretanha contestou vigorosamente a definição e os parâmetros do
problema, tal como foram apresentados pelos formuladores de exigências ambientais.
Finalmente, para um problema ambiental esperado ser completamente contestado com êxito, deveria
existir um patrocinador institucional que pudesse assegurar a legitimidade e continuidade. Isto é
especialmente importante quando o problema tenha feito a agenda política e se procure a legislação.
Internacionalmente, isto pode ser visto no importante papel desempenhado pelas agências e ONG associadas
às Nações Unidas.

Conclusão

Desenvolverei esta visão social construcionista do meio ambiente nos capítulos 3-6, começando pela
análise da natureza emergente e colaboradora dos riscos ambientais e do conhecimento. Eu sustento que o
conceito de ambientalismo é uma construção em si própria multifacetada que consolida um conjunto e
filosofias, ideologias, especialidades científicas e iniciativas políticas. Como parte desta discussão, são
dedicados capítulos separados ao papel central do discurso dos meios de comunicação social e ao da ciência
na interpretação e moldagem dos contextos, as condições e consequências da crise ambiental.
Apresento depois, três estudos de casos para ilustrar a dinâmica através da qual os problemas
ambientais são pressagiados, legitimados e contestados. O primeiro destes problemas são as chuvas ácidas, é
um problema ambiental maturo que tem sido alvo da atenção das pessoas há mais de um quarto de século.
Ao contrário do aquecimento global ou da destruição da camada de ozono, os seus efeitos têm sido mais
continentais, do que globais, embora provas da precipitação ácida tenham sido encontradas em sítios tão
distantes quanto a Antárctida. Um segundo e mais recente problema, a «perda da biodiversidade» tornou-se
um dos problemas mais proeminentes dos anos 1990, tal como é evidenciado pelas características do seu
desenvolvimento na Conferência do Rio em Junho de 1992. Não tem um impacto físico sobre todo o planeta
ao mesmo tempo, como acontece com outros problemas ambientais. Contudo, a política e a economia da
perda da biodiversidade são de tal forma que alcançam todo o

77
Norte e Sul, exigindo, assim, soluções no âmbito da arena política internacional. Um terceiro problema,
biotecnologicamente como risco ambiental, é examinado através do caso específico da somatotropina
recombinante bovina BST, uma hormonio formada pela bioengenharia que foi aprovada recentemente para
utilização na indústria americana do produtos lácteos. A controvérsia da BST 8 oferece um exemplo onde se
verifica que uma furiosa contestação continua a fazer parte das preocupações dos ambientalistas, ativistas
dos direitos dos animais e outros formuladores de exigências, quer esta seja julgada válida ou não. Embora,
tenha sido, até agora, limitada primariamente a um estabelecimento nacional, a natureza intrinsecamente
relacionada do sistema agro-alimentar global implica que pressões pró e contra a sua utilização na
agricultura transcendera inevitavelmente as fronteiras nacionais.
No último capítulo, a formulação social do risco e conhecimento ambiental é examinado no contexto
do debate teórico mais amplo no âmbito da Sociologia ao longo da trajetória das sociedades contemporâneas
no sentido de um futuro «da última modernidade» versus «pós-modemidade». Depois de analisar duas
tentativas para concetualizar as preocupações ecológicas no âmbito de um contexto social mais abrangente -
a teoria da «sociedade de risco» de Ulrich Beck a versão da «teoria da modernização ecológica» de MoI e
Spaargaren. Eu sugiro diversas formas onde a formulação ambiental e pós-moderna interagem. O livro
termina com algumas sugestões para o curso futuro da investigação do meio ambiente a partir de uma
perspectiva da formulação social.

8 Esta controvérsia é refletida nos diferentes acrónimos que são utilizados na discussão desta hormona formada pela
bioengenharia. Os opositores tentam distingui-Ia da sua forma natural designando-a de BST ou RBGH, enquanto a indústria e os
defensores reguladores que alegam que não existe qualquer diferença na utilização dos acrónimos BST ou BHG.

78

Capítulo 4

A ciência como atividade geradora de exigências ambientais


É raro encontrar um problema ambiental que não tenha origem num corpo de investigação científica.
As chuvas ácidas, a perda da biodiversidade, o aquecimento global, a destruição da camada de ozono, a
desertificação e envenenamento por dioxinas, são exemplos de problemas que começaram com um conjunto
de observações científicas. Em última instância, é o suporte científico destes problemas ambientais que os
segue acima de muitos outros problemas sociais que dependem mais de exigências de base moral (Yearley
1992:17)
Além disso, os investigadores científicos atuam como «porteiros», à procura de potenciais exigências
para lhes atribuir credibilidade. Em 1988, quando a organização ambiental britânica Ark, montou uma
campanha de publicidade em que alegava que o degelo das calotas glaciais devido ao aquecimento global
aumentaria o nível do mar cinco metros nos próximos sessenta anos, cobrindo assim a maior parte da Grã-
Bretanha com água, estimativas científicas mais sensatas que referiam menos de um metro de aumento do
nível rapidamente desacreditaram a iniciativa da Ark (Pearce 1991: 288-29). Contudo, paradoxalmente, a
própria ciência é frequentemente o alvo deste debate contemporâneo sobre a engenharia genética e os seus
efeitos potencialmente danosos sobre o meio ambiente (ver capítulo 9). Em casos como estes, os
formuladores de exigências rejeitam explicitamente a racionalidade técnica da ciência a favor de uma
alternativa de racionalidade cultural que apela ao «conhecimento do povo, grupos relacionados e tradições»
(Krimsky e Plough 1988: 107). A ciência é severamente criticada por intervir com a ordem natural, em vez
de admirada por emprestar a sua autoridade a uma exigência.

103

A ciência como atividade geradora de exigências

O perfil da ciência apresentado até agora pareceria sugerir que as descobertas científicas refletem a
realidade física do mundo natural de uma forma relativamente direta. A ciência pareceria, portanto, ser uma
investigação da verdade em que o objetivo global é obter uma reflexão clara da natureza, o mais desprendida
possível de quaisquer influências sociais e subjetivas que poderiam distorcer os «fatos».
Contudo, a junção do conhecimento científico está grandemente dependente de um processo de
formulação de exigências. A este respeito, Aronson (1984) identificou dois tipos de exigências de
conhecimento feitas pelos cientistas: exigências cognitivas exigências interpretativas.
As exigências cognitivas têm por objetivo converter as observações experimentais, hipóteses e
teorias em conhecimento público factual acreditado. Blakeslee (1944) descreve este processo de conversão
como um processo em que os cientistas devem habilmente apostar em novas exigências enquanto, ao mesmo
tempo, as encaixam numa tradição de investigação estabelecida. Ela dá como exemplo o processo cognitivo
de formulação de exigências no jornal de física, Physical Review Letters, no qual as cartas dos colaboradores
anunciam inovações se assemelharam a relatos jornalísticos de descobertas científicas completas com um
arsenal de estratégias retóricas.
As exigências interpretativas, por outro lado, são designadas para estabelecer as implicações mais
amplas das descobertas resultantes da investigação para um público não especializado. As exigências
interpretativas pedem implicitamente ao público que se certifique da utilidade social da investigação, e o
conteúdo da exigência fornece a razão porque deveriam fazê-lo, Por exemplo, no caso do aquecimento
global, a exigência cognitiva é a seguinte: os gases dos carros, das centrais de energia e das fábricas estão a
criar o efeito de estufa que aumentará a temperatura significativamente ao longo dos próximos setenta e
cinco anos. A exigência interpretativa aqui é de que esta tendência para o aumento da temperatura é
potencialmente perigosa porque, entre outras coisas, causará a destruição da geografia existente na Terra, a
inundação das áreas de menor altitude, como a Holanda ou Nova Orleães e a seca de regiões agrícolas como
o centro da América.
Os cientistas não só fazem exigências de conhecimento, mas eles constroem igualmente, de forma
rotineira, «exigências de ignorância» (Smithson 1989). Isto significa que os investigadores realçam «fossos»

104

no conhecimento científico disponível, por forma a construir um caso para um posterior fundo para a
investigação ou, pelo contrário, para atrasar mais a ação da política nas áreas em que não existem dados
suficientes para justificar a regulação ou atividade legislativa (Stocking e Holestein 1993). Como será visto
no capítulo 7, este foi o caso da investigação sobre as chuvas ácidas patrocinada pelas instituições da
indústria na Grã-Bretanha e nos Estados Unidos valorizada pela natureza circunstancial dos dados
disponíveis. Aronson aponta três tipos de exigências interpretativas que os cientistas fazem: as do problema
técnico, cultural e social.
A formulação das exigências interpretativas têm lugar quando os investigadores atuam como
conselheiros científicos para a indústria e governo. Isto envolve, muitas vezes, a avaliação dos riscos
provocados pelas tecnologias controversas (poder nuclear, engenharia genética) poluentes tóxicos suspeitos
(dioxina, mercúrio) e os riscos globais (destruição da camada de ozono, aquecimento global). Enquanto se
mantêm na teoria, os conselheiros científicos estão limitados a um papel de avaliação técnica restrito; na
realidade, incorporam as suas próprias agendas políticas e exigências de conhecimento nas suas
interpretações e recomendações.
Salter (1988) utiliza o termo «ciência mandatada» para se referir à ciência que é utilizada para
propósitos de formulação ele políticas públicas, incluindo estudos comissionados pelos representantes e
reguladores dos governos para auxiliar nas suas tomadas de decisão. A uma face de necessidade que é
emitida pelos peritos da ciência, os membros de painéis de peritos fazem regularmente escolhas e exigências
políticas e morais. Estas escolhas são formadas tanto pelas considerações políticas, quanto pelas normas
científicas. Por exemplo, um comité de aconselhamento científico que lida com a segurança em relação aos
pesticidas pode ter igualmente consciência de que banir um componente químico afetará negativamente uma
indústria de 500 milhões de dólares, ao passo que recomendar a sua utilização poderia ter efeitos graves
sobre a saúde que apenas se tornariam evidentes dez anos depois. Este conhecimento, observa Salter, afeta as
recomendações do comitê, tanto quanto os seus dados técnicos, imbuindo, através disso, as suas atividades
de um sabor fortemente interpretativo.
As exigências interpretativas culturais tentam desenvolver o apoio ideológico para os gastos com a
investigação científica e para a autonomia da ciência. Os meios de comunicação social através dos quais as
exigências são apresentadas, constituem discursos públicos e artigos

105

em revistas científicas populares (New Scientist, Scientific American) e nas páginas de jornais influentes
(New York Times, Washington Post, The Times (Londres), testemunham perante os inquéritos parlamentares
e participação nos comitês e painéis do governo-indústria. Em alguns casos, o reconhecimento científico
internacional permite ao investigador uma plataforma exclusiva a partir da qual ele pode esboçar
preocupações políticas e sociais mais abrangentes. Isto foi o que aconteceu no Canadá quando John Polanyi
ganhou o Prémio Nobel de Química e aproveitou a propagação da atenção pública para esboçar uma
quantidade de assuntos ao governo, desde os baixos fundos das universidades, ao desarmamento nuclear e à
paz. Noutros casos, a ameaça de uma crítica pública do trabalho científico no sentido de fazer exigências
interpretativas culturais. Por exemplo, Krimsky (1979) demonstrou que a ameaça de intervenção e controlo
externo na investigação da molécula recombinante de ADN nos anos 1970 transformou os cientistas
americanos em lobbies surpreendentemente eficazes para a autonomia científica e liberdade de auto-
regulação.
As exigências de problemas sociais interpretativos alegam a existência de um problema social que
apenas uma especialidade científica particular está equipada para resolver. Aronson identificou três tipos de
condições sob as quais os cientistas têm tendência para fazer tais exigências.
A primeira é quando uma nova disciplina não tem nenhuma base no mundo acadêmico e terá,
portanto, de apelar a zonas externas para obter fundos e apoio político para o seu trabalho. Até certo ponto,
isto tem sido o caso da ciência ambiental que tem sido continuamente criticada por muitos cientistas da
corrente principal por fazerem investigação que é defensiva e de baixa qualidade (Rycroft 1991).
A segunda condição é quando cientistas de empresas, sempre na procura de novos fundos de
investigação obtidos publicamente, tentam mostrar que a sua investigação em curso contribui para a solução
de um problema social reconhecido ou de que resolverá com êxito um problema não reconhecido
anteriormente. Isto foi característico da investigação do cancro nos anos 1970, e da investigação da SIDA
nos anos 1980.
Uma terceira condição no âmbito da qual existem possibilidades da formulação das exigências
relativamente aos problemas ambientais terem lugar, é quando os cientistas são confrontados com
movimentos sociais que procuram restringir a sua investigação. Nesta situação, os cientistas são forçados a
reunir e promover o seu próprio conjunto de exigências interpretativas, quer para justificar porque razão um
problema existe e a sua investigação deveria continuar, ou porque é que a sua investigação não deveria ser
interpretada como constituindo um problema.

106
Aronson argumenta que existe uma tendência para as duas primeiras formas de exigências
interpretativas, técnicas e culturais serem eventualmente transformadas ou serem incluídas na forma do
problema social, devido ao fato de que o que está basicamente em risco ser a utilidade social da ciência. Isto
é, os investigadores reconhecem que é uma estratégia melhor construir pro-ativamente um caso pelos
benefícios sociais do seu trabalho, em vez de esperar e subsequentemente ter de justificá-lo numa atmosfera
de ceticismo e corte orçamental.

Incerteza científica e a construção de problemas ambientais

O que particularmente abre portas à criação e contesta dos problemas ambientais é a incapacidade da
ciência em dar pravas absolutas - prova inequívoca de segurança. Em vez disso, os cientistas são reauzidos à
oferta de estimativas de probabilidades que muitas vezes variam amplamente umas das outras. Esta falta de
certeza

107

permite aos formuladores de exigências, dentro e fora da ciência, afirmar que a situação é alarmante, que o
risco é demasiado alto e que a sociedade deveria fazer alguma coisa.
Além disso, a corrente principal da ciência e os ativistas «verdes» diferem fundamentalmente em
relação à necessidade da intervenção para proteger o meio ambiente. Esta diferença de perspectiva é
agradavelmente ilustrada num debate que teve recentemente lugar nas páginas da revista de ciência britânica
New Scientist.
Brian Wynne, diretor de investigação do Centro para a Mudança Ambiental na Universidade de
Lancaster, e Sue Mayer, diretora científica do Greenpeace no Reino Unido, argumentam que a decisão de
levar ou não a cabo uma ação oficial em relação aos riscos ambientais deveria ser governada por um
princípio de prevenção. Isto assegura que se existir alguma razão para suspeitar que uma determinada
substância ou prática está a pôr em perigo o meio ambiente dever-se-ia, então, levar a cabo uma ação
imediata, mesmo que a prova não seja difícil de desfazer. A base lógica por detrás desta visão é de que será
demasiado tarde para responder efetivamente se esperarmos por uma resolução científica final durante
muitos anos. Nos locais em que o ambiente está em perigo, eles argumentam, «não existe nenhuma fronteira
clara entre ciência e política» (Wynne e Mayer 1993: 33).
A posição oposta é apresenta a por Alex Milne, um químico consultor que passou trinta e quatro anos
a trabalhar na indústria de tintas. Milne rejeita o princípio de prevenção, que ele classifica como uma das
doutrinas centrais da «ciência verde», constitui uma abordagem inteiramente errada. É pior, alega ele, do que
o princípio legal da Alice nos País das Maravilhas, onde o padrão foi «sentenciado primeiro, e o veredicto
veio depois; aqui é o veredicto primeiro, o julgamento depois e não há nenhuma necessidade de prova»
(1993: 37). O princípio de prevenção, conclui ele, não tem nada a ver com a ciência: é inteiramente um
assunto político e administrativo.
Uma grande parte do desacordo anda em torno da forma como a ciência deveria ser feita. Na ciência
tradicional, predomina um princípio reducionista. Isto significa que os investigadores dividem um problema
no menor número possível de partes constituintes e observam cada uma delas separadamente, controlando o
mais possível cada variação. Se quiser observar o efeito dos tóxicos químicos sobre o padrão respiratório dos
peixes, isola o peixe num ambiente experimental, varia os números dos químicos e regista os resultados em
termos de nascimentos. Pelo contrário, um principio fundamental da ciência «verde» é a necessidade de
observar o modo de forma hostil.

108

Visto que tudo está ligado a tudo o resto, não faz sentido desmontar uma teia ecológica experimentalmente.
Por exemplo, a imunidade é um sistema complexo que está ligado a uma variedade de fatores, desde a
genética à poluição ambiental ao stress sociopsicológico. A causalidade poderá ser indireta ou múltipla,
tornando-a tudo menos invisível à perspectiva reducionista da «boa ciência tradicional» Wynne e Mayer
1993: 34).
Em termos políticos, a boa ciência manifesta-se sob a forma de uma abordagem assimiladora que se
propõe definir cientificamente a capacidade de um ecossistema para assimilar os poluentes sem incutir
danos, e licenciar, depois, as descargas industriais dentro destes limites de segurança «provados». O que isto
ignora, acusam os ambientalistas, é a possibilidade de uma interação química entre os poluentes químicos, o
que cria um potencial para terminar os efeitos que não foi antecipado pelo modelo de assimilação.
Tal como Salter (1988) observou, são aplicados conjuntos de critérios muito diferenciados
dependendo do contexto em que a prova de investigação é avaliada. A ciência convencional possuí uma
capacidade profundamente enraizado para lidar com a ambiguidade; na verdade, a maior parte dos artigos
dos jornais terminam sempre com uma advertência «é necessário mais investigação».
Pelo contrário, o fardo da prova é mais rigoroso quando os cientistas aparecem perante as audições
reguladoras ou na sala de audiências. Aqui, os conceitos legais tais como a «dúvida razoável» são um
anátema proeminente para os cientistas que estão socializados para exprimir sempre as suas conclusões em
termos condicionais. A este respeito Yearley (1992: 142) realça que a especialidade científica depende dos
elementos e julgamentos e capacidade de astúcia, aspectos informais da ciência que pode ser realçado numa
audição reguladora ou legal para fazer com que as provas científicas pareçam uma mera opinião. Esta
tendência é ainda mais exagerada quando os grupos ambientalistas comunicam utilizando um discurso moral
num ambiente onde a convenção exige um discurso predominante científico, legal ou regulador. Este
princípio de prevenção é um bom exemplo de um princípio ambiental que opera num plano diferente de
certeza em relação às instituições sociais de controlo 1.

1 A Alemanha constitui uma excepção a isto, onde o princípio de prevenção foi consagrado historicamente.

109

O dilema crucial é, pois, de que as exigências dos problemas sociais interpretativo que se mantêm em
provas científicas sólidas são geralmente mais «robustas» do que as exigências apenas apoiadas pela opinião
(Yearley 1992: 76), mas existe um desacordo fundamental entre ambientalistas, cientistas, reguladores e
legistas sobre o que constitui uma prova científica.
Blowers (1993) observou que a prova científica é problemática como base para a formulação das
políticas ambientais de cinco formas. Primeiro existe um problema de causa e efeito que temos estado a
discutir: isto torna difícil estabelecer responsabilidades pelos efeitos externos produzidos pelas atividades
poluidoras. Em segundo lugar, existe um problema de impactos previsíveis: por exemplo, a incerteza em
relação à incidência, distribuição, temporização e efeitos do aquecimento global. Em terceiro lugar, a
incerteza em relação às consequências das ações presentes e os riscos impostos às gerações futuras pela ação
presente. Por vezes, outro foco do cenário futuro - o fardo arrasador de uma dívida nacional em espiral
poderá desencorajar a tomada de passos profiláticos e audaciosos de melhoramento no momento. Em quarto
lugar, a ausência frequente ou escassez dos dados ambientais, não só torna mais difícil fornecer julgamentos
científicos sólidos, mas abre as portas à manipulação pelos interesses investidos que exigem que os
ambientalistas exageraram o perigo. Finalmente, as interpretações muitas vezes frágeis da ciência ambiental
podem facilmente encontrar dificuldades da política em que os conflitos de interesses dominam. Isto é
especialmente o caso em que se lida com ideias amplamente especulativas, tais como a hipótese de Gaia, em
vez de sistemas articulados mais restritos e mais facilmente capturáveis empiricamente.

Identificação dos problemas ambieniais como questões científicas

É, de fato, raro encontrar um problema ambiental que aparece inesperadamente de um dia para o
outro sem alguns antecedentes de debate e observação científica. Em vez de crescer com um caminho linear,
o processo através do qual os problemas ambientais são identificados e evoluem como questões científicas é
caracterizado pela criação

110

de uma grande quantidade de conhecimentos que se expandem por acaso em direções inesperadas (Kowalok
1993). Os pedaços individuais de dados neste conjunto podem ser gerada através de projetos que empregam
os métodos reducionistas da ciência tradicional, mas, no fim, é uma manifestação de análise holística que
conduz à compreensão final.
Apesar das aparências no sentido contrário, a delineação básica de muitos problemas ambientais tem
sido uma realidade há muito tempo. Por exemplo, a teoria de que o aquecimento do efeito de estufa é
causado por emissões de dióxido de carbono geradas pelos humanos é conhecida há mais de um século, mas
o efeito de estufa não foi considerado um problema prioritário até aos anos 1980 (Cline 1992: 13-14). De
forma semelhante, o termo «chuvas ácidas» juntamente com os seus princípios fundamentais foi pela
primeira vez apresentada pelo químico Robert Angus Smith em 1872, mas não emergiu como um problema
científico completamente desenvolvido até aos anos 1970 (ver capítulo 7).
O que impulsiona um problema ambiental de longa permanência numa exigência científica atual de
proporções críticas?
Em primeiro lugar, a magnitude real ou sentida de uma condição poderá subitamente assumir
proporções de «crise». Por exemplo, a extínção das espécies tem-se tomado cada vez mais permanente desde
1600, à medida que os humanos se estabeleceram por todo o globo. Recentemente, contudo, tem sido
alegado que nós temos desequilibrado a balança entre o aparecimento de novas espécies e a extinção das
existentes (Tolba e El-Kholy 1992). Ao mesmo tempo, a perda de velhas florestas e de plantas e animais
chamam a atenção e provoca a preocupação dos biólogos conservadores e outros formuladores científicos de
exigências precisamente porque estas fontes naturais estão a baixar até aos últimos 20, 10 ou 1 por cento,
fazendo a preservação parecer crucial.
Em segundo lugar, os novos métodos, instrumentos de investigações ou bancos de dados poderão
permitir aos cientistas chegar a conclusões que eram impossíveis anteriormente. Por exemplo, os dados
fomecidos pela Rede de Química Atmosférica Europeia que começou em 1950 permitiu ao investigador
sueco Svante Oden avançar com as suas teorias pioneiras sobre as chuvas ácidas, enquanto as comparações
de James Lovelock, sobre as concentrações de fluorocarbonetos na atmosfera inferior com quantidades
anuais de produção industrial, abriram as portas aos químicos Mario Molina e Sherwood Rowland para a
documentação de uma ligação chave entre os produtos com CFC e a destruição da camada de ozono
(Kowalok 1993).

111

Em terceiro Iugar, o caráter holístico dos ecossistemas globais significa que aumentar o interesse
científico e público sobre um problema ambiental gera prontamente interesse noutro problema inter-
relacionado. Assim, a preocupação científica com a desflorestação espalhou-se muito para além das
fronteiras da silvicultura devido, em larga medida, ao papel fundamental que a perda das florestas tropicais
tem no que é considerado hoje os dois problemas ambientais mais importantes: o aquecimento global e a
perda da diversidade biológica. Mazur e Lee (1993) ilustram isto de um modo esquemático, demonstrando a
forma como o aumento da preocupação pública com o problema do meio ambiente global é, na realidade, a
interligação de diversas preocupações individualizadas, tendo cada uma delas surgido em diferentes alturas.
Esta sinergia não é evidentemente sempre prontamente aparente e os empresários científicos podem ter
necessidade de estabelecer explicitamente a relevância de uma questão por outra.
Em quarto lugar, o estabelecimento de programas de investigação oficiais, centros e redes podem
criar uma estufa em que um problema ambiental pode ser alimentado com êxito, mesmo se esta não for a
intenção original. Por exemplo, a decisão de Dezembro de 1979 pelo Conselho da então Comunidade
Europeia para estabelecer um programa de investigação plurianual no campo da climatologia, foi levado a
cabo, em parte, devido à preocupação com o que era essencialmente um problema regional - a seca de 1976
que afetou algumas áreas africanas e europeias. Uma vez concretizado este programa tomou-se o centro e a
investigação de base no processo físico-químico relacionado com o aumento das concentrações de gases de
estufa na atmosfera, e uma fonte a partir da qual as descobertas científicas e termos como «o efeito de
estufa» e «mudança climática» circularam para fora dos círculos de formulação de políticas na CE
(Liberatore 1992).
Em tudo isto a identificação e caracterização das ameaças ambientais está altamente dependente da
rede de conferências e colaborações científicas internacionais (Kolwalok 1993: 36-7). Isto permite, não só
aos investigadores tomar conhecimento de novas metodologias técnicas ou encontrar as peças que faltam nos
seus próprios puzzles, mas ajuda a edificar a confiança de que não estão sozinhos, uma tentativa
especialmente importante de promover a moral quando uma teoria parece radicalmente nova e controversa.
Este foi o caso com a investigação que abriu caminho em relação ao problemas das chuvas ácidas, em que os
investigadores americanos e canadianos não apreciaram totalmente a relevância global das suas próprias
descobertas

112

até se depararem com descobertas semelhantes na Escandinávia, tal como foram apresentadas por Oden na
sua digressão de palestras pela América do Norte (Cowling 1982).

O surgimento: comunicação de novos problemas ambientais ao mundo não científico

A transição de exigências ambientais cognitivas para interpretativas científicas é comparável a uma


cerimónia de «aparecimento» em que o ingênuo faz uma representação pública de identidade. Até um certo
ponto, a circulação de informação num círculo científico essencialmente fechado é interrompida e a urgência
e proeminência de um problema é partilhada com o mundo exterior.
Uma forma comum de fazer isto é juntar um fórum público, no qual uma mistura de cientistas,
ambientalistas e administradores esboçam em conjunto as várias dimensões do problema com todo o
resplendor da publicidade dos meios de comunicação social. Alternativamente, uma exigência pode ser
articulada nas audições dos congressos ou parlamentos em que a cobertura dos meios de comunicação social
é geralmente assegurada. Por exemplo, a declaração de Peter Raven e Edward Wilson no Congresso de
1981, nos Estados Unidos foi importante para o estabelecimento da utilidade econômica da preservação das
espécies de insetos em perigo, tais como a borboleta ou a abelha de mel particularmente para o
desenvolvimento de novas colheitas, drogas e fontes de energia renováveis (Kellert 1986). De forma
semelhante, a questão da destruição da camada de ozono na Grã-Bretanha não foi efetivamente lançada até
às audições parlamentares terem lugar no Verão de 1988; estiveram presentes fortes representações em
ambos as câmaras com a finalidade de o Reino Unido se tornar um líder mundial no apelo para proteger, a
camada de ozono (Benedick 1991). Um terceiro canal, para a disseminação pública de novos problemas
ambientais recentemente formulados, é uma conferência com fins didáticos na qual os repórteres dos
principais jornais estão presentes na procura de teorias «arrasadoras». Isto foi o que aconteceu em Setembro
de 1974, quando o New York Times descobriu um negócio de entrega de papel que ameaçava a camada de
ozono com os CFC; o artigo do Times «assinalou o início da preocupação pública em relação aos CFC e a
sua utilização nas latas de aerossóis e frigoríficos» (Kowalok 1993: 19). Noutros casos,
113

contudo, este procedo é deturpado quando os empresários científicos vão diretamente para os meios de
comunicação social. Svante Oden, o cientista sueco do solo que primeiro proclamou a teoria das chuvas
ácidas, publicou um relatório no jornal sueco de Estocolmo, o Dagens Nyheter; um ano antes tinha
publicado num jornal científico, e a questão surgiu cinco anos antes na Conferência das Nações Unidas para
o Ambiente em 1972. De forma semelhante, na Alemanha, a hipótese do bioquímico Bemhard Ulrich de que
grandes quantidades de floresta alemãs estariam mortas dentro de cinco anos devido aos danos causados
pelas chuvas ácidas foi apresentada como fato adquirido num artigo do Der Spiegel, um periódico de grande
circulação, provocando um amplo alarme nacional (ver capítulo 7).
O quanto um canal é eficaz, comparado com outro, depende de um número de fatores. Se não existir
nenhum consenso entre os próprios cientistas e a dura oposição da indústria, uma abordagem mais individual
poderá resultar melhor. Apesar das tentativas dos periódicos para levantar a questão, o problema do
envenenamento com pesticidas nos Estados Unidos estava a ser efetivamente suprimido 2, até que Rachei
Carson publicou a sua acusação em Silent Spring. Subsequentmente, um número de cientistas avançou em
sua

2 A preocupação científica com o envenenamento por pesticídas começou duas décadas antes da publicação de Silent Spring.
Muito antes, em 1945, a própria Rachei Carson tentou, evidentemente sem êxito, interessar o Reader's Digest para autorizar um
artigo sobre a sua investigação que estava a ser levado a cabo por colegas no Paxutent Wildlife Research Center, o qual indicava
que o pesticida DDT tinha efeitos adversos na reprodução e sobrevivência dos pássaros depois de várias aplicações (Lear
1993:33). No início dos anos 1950, um consenso emergente no campo da saúde pública nos Estados Unidos em relação ao facto de
a utilização de químicos na produção dos alimentos precisar de ser mais rigorosamente regulada, levou a 46 dias de audições do
Congresso. Contudo, a questão foi vista como limitada e técnica e recebeu pouca atenção dos meios de comunicação social. Ao
contrário da eventual campanha ambiental activada pelo livro de Carson, a evidência de que os pesticidas poderiam vir a causar
danos não impeliu tanto os meios de comunicação social e o público quanto as imagens dramáticas dos peixes mortos (Bossa
1987:80).
Nos anos de 1957 a 1959 deram-se uma série de incidentes relacionados com pesticidas, nomeadamente uma elevada
mortalidade ao longo do Estado de Nova lorque devido a uma campanha de uso de sprays contra as traças, e o Grande Susto da
Arando (uva-da-monte), em que as vendas de arando decaíram em dois terços depois de alguma desta fruta ter sido considerada
contaminada por resíduos de herbicida aminotriazole. Contudo, estas controvérsiasforam vistas como sendo isoladas e não foram
suficientes para mudar O staius quo.

114

defesa e o problema foi legitimado quando, em Maio de 1963, uma lista de jurados do Comitê de
Aconselhamento do Presidente Científico lançou um relatório em que era critícada a indústria de pesticidas.
Por outro lado, adiantar-se ao estabelecimento do conselho científico poderá dar resultado no sentido de
captar a atenção dos meios de comunicação social e a atenção do público, mas arriscando-se a originar
pressão de colegas cientistas. Isto foi o que aconteceu em 1988, quando James Hansen, diretor do Instituto
da Nasa para os Estudos Espaciais, testemunhou perante o Comitê do Senado dos EUA que as ondas de calor
do Verão, tais como a que se estava a experimentar na altura, se deviam diretamente ao efeito de estufa. Esta
norma no âmbito da ciência contra a revelação prematura, foi, sem dúvida, fortalecida em consequência do
«engano» em relação à fusão do frio em que os investigadores anunciaram as suas descobertas numa
conferência de imprensa em Utah, antes de o sujeitarem à análise e comentário dos seus colegas.

A formulação de políticas amoientais e científicas

Para que uma questão científica se torne uma política deverá ser traduzida em algo que é «tratável».
Em consequencia disso, na fase de formulação científica a contribuição dos cientistas naturais diminui
geralmente enquanto o papel dos peritos técnicos e sócio-econômicos aumenta. Por exemplo, Liberatore
(1992) achou que enquanto as descobertas das ciências naturais tinham ainda um papel importante no debate
internacional sobre o aquecimento global, foi o input dos economistas, analistas políticos e peritos da
tecnologia energética que foram cruciais para moldar a natureza da resposta da União Europeia.
A relação entre a ciência e a formulação de políticas foi captada de forma adequada pelos cientistas
políticos que usam estes dois conceitos: comunidades epistêmicas e janelas de políticas.
Comunidades epistêmicas

Haas descreveu a contribuição das «comunidades epistêmicas» como críticas para alcançar os
acordos de cooperação internacionais sobre as questões ambientais. As comunidades epistêmicas são «redes
de conhecimento baseado na comunidade organizadas transnacionalmente»:

115

isto é, ligadas internacionalmente a grupos de especialistas que oferecem aconselhamento técnico aos
formuladores de decisões políticas.
Aquilo que lhes dá um papel político num processo geralmente fechado aos «não-políticos» é a
natureza incerta dos problemas ambientais. Os líderes políticos podem ter grandes capacidades para
negociação de pactos de intercâmbio ou tratados militares, mas sentem-se a uma distância desvantajosa para
lidar com as condições ameaçadoras do planeta, relacionadas com as mudanças atmosféricas ou sobrecargas
químicas. Sob tais circunstâncias, a informação é valiosa como fonte estratégica, e quanto aos políticos, por
forma a reduzirem uma tal incerteza, «poder-se-a esperar deles que tomem conta os indivíduos que poderão
fornecer conselhos especializados sobre a quem atribuir a culpa por um fracasso político, ou simplesmente
como medida para parar acalmar o clamor público de ação» (Haas 1992: 42).
As comunidades epistêmicas, defende Haas, não estão apenas ligadas pela especialização técnica
comum, mas partilham igualmente um número de crenças casuais e de princípio. No caso das questões
ambientais, estas comunidades de conhecimento têm sido amplamente constituídas por ecologistas que
partilham uma crença comum na necessidade de uma análise holística - uma visão que transfere para a
política o aconselhamento que eles dão. Isto foi característico de uma comunidade epistêmíca de ecologistas
e cientistas marítimos que lideraram esforços intergovernamentais nos anos 1980 para controlar a poluição
no mar Mediterrâneo (Haas 1990).
Uma comunidade epistêmica tem a capacidade de influenciar a definição das dimensões do problema
e a identificação das soluções possíveis. Por exemplo, Haas demonstra como uma comunidade epistêmica
transnacional de cientistas atmosféricos teve êxito em influenciar as negociações que conduziram à
assinatura do Protocolo de Montreal para a proteção da camada de ozono, em Setembro de 1987, através de
«discussões de obrigatoriedade em relação à ampla quantidade de substâncias a serem cobertas e a rapidez
dos regulamentos» (Haas 1992: 49). Logo que a comunidade epistêmica organizar os parâmetros básicos do
acordo, depende, depois, dos líderes políticos decidir aquilo que compromissos têm de ser assumidos para
obter o acordo.
Dever-se-é notar, contudo, que nem todos os analistas políticos concordam com a elevação das
coligações científicas de Haas a um lugar central no processo de tomadas de decisão ambientais. Diz-se

116

que o modelo de Haas quebra o grau do poder de autonomia acordado pela comunidade epistêmica. Isto é, as
coligações científicas utilizam as suas fontes para realçar um problema, mas elas deverão compreender
líderes políticos das suas nações individualmente, para terem um impacto real sobre as negociações dos
tratados. Estes líderes poderão considerar vantajoso tomar, parte na resolução de problemas internacionais,
mas eles são, em última análise, guiados pelas considerações políticas domésticas (Susskind 1994: 74-5).
Os governos individualmente dependem da especialização técnica construída pelas organizações de
movimentos ambientais, tais como os Friends of the Earth, o Greenpeace, e a Investigação da Poluição. Nos
últimos anos, estes grupos devotaram consideráveis fontes edificação das suas próprias capacidades de
investigação, contratação de grande número de jovens doutorados idealistas e talentosos acabados de sair das
faculdades. Além disso, as organizações de ambientais e de conservação têm tipicamente comitês de
aconselhamento científico e apelam ao apoio voluntário de cientistas universitários e de funcionários
públicos que sejam cientistas (Yearley 1992: 126). Como consequência, existe uma sinergia entre
organizações e formuladores oficiais de políticas que consideram o conhecimento e informação produzidos
pelo Greenpeace e outros grupos, de valor estratégico considerável para estabelecer as fronteiras da sua
posição nos debates na arena pública sobre as questões ambientais (Eyerman e [amison 1989; Lowe e
Coyder 1983).
Enquanto as comunidades epistêmicas internacionais poder-se-ão considerar internacionais no
alcance, o centro da gravidade para a formulação de exigência científicas sobre questões específicas tende a
residir numa nação específica. Por exemplo, foi a liderança científica dos EUA que levou à proeminência
global do problema da destruição da camada de ozono, enquanto a investigação sueca (e norueguesa) sobre
as chuvas ácidas foi vital para elevar essa questão no estatuto de problema. No primeiro caso, existia
claramente uma infra-estrutura do programa espacial e a proeminência que deu aos Estados Unidos na
investigação das ciências atmosféricas. Isto foi particularmente localizado em duas agências governamentais
- NASA (Administração Nacional Aeronáutica e Espacial) e a AOAN (Administração Oceânica e
Atmosférica Nacional) - assim como nas grandes universidades americanas (California, Harvard, Michigan).
Quando os investigadores nestas instituições expressaram a sua preocupação sobre os acontecimentos na
estratosfera, o local do problema do ozono, os meios de comunicação social e o público em geral, assim
como os

117

líderes políticos tiveram tendência para prestar atenção (Benedick 1991). No caso das chuvas ácidas, as
florestas e os lagos eram vistos como um componente vital da economia sueca e da recriação da vida e,
portanto, estavam de acordo com a prioridade da investigação. Quando as origens transnacionais da
precipitação ácida se tornaram óbvias nos dados da investigação relatados por Oden e outros, o governo
sueco não hesitou em apresentar agressivamente estas descobertas na Conferência de Estocolmo de 1972.

«Janelas de política»

Outro modelo de ciência política que poderá ser utilizado para ligar a ciência e a formulação de
políticas ambientaís domésticas é o modelo de «balde do lixo» de Kingdon. Adaptado de um modelo de
escolha organizacional desenvolvido por James March e os seus colegas, este propõe a operação de três
correntes de processos principais no estabelecimento da agenda govemamental:

1) Reconhecimento do problema;
2) A formação e redefinição das propostas de políticas; e
3) Políticas.

Estas três correntes geralmente desenvolvem-se e operam largamente de forma independente umas das
outras. Contudo, em alturas de crise, as três correntes podem juntar-se ou «combinar-se». Kingdon descreve
isto como uma abertura de uma «janela política» e atribui a principal responsabilidade por esta ação aos
«empresários da política» no âmbito do sistema político. Os empresários individuais não «abrem a janela»,
mas tiram vantagem da oportunidade logo que esta se dê. Nos momentos fundamentais de crise as soluções
juntam-se, então, aos problemas e ambos são juntos para as forças políticas favoráveis.
Hart e Victor (1993) empregaram recentemente o modelo de Kingdon para explorar o papel das elites
científicas na influência sobre a mudança climática para os anos entre 1954-74. Na sua interpretação, a
ciência, a política e os políticos evoluíram em correntes separadas criando soluções na investigação de
problemas na procura de investigações. As elites científicas, que assumem o papel empresarial, têm um lugar
central na identificação das «janelas políticas» e tiram vantagem para eles.
Isto foi o que aconteceu nos Estados Unidos, nos anos 1970. Na maior parte dos vinte anos, dois
discursos científicos interessantes

118

relacionados com o clima tinham corrido de forma irregular, atraindo algum apoio, mas sendo incapazes de
andar, na verdade, para a frente em termos de fundos e reconhecimento público. Estes não eram o «discurso
do ciclo do carbono que esboçou a questão se as concentrações de dióxido de carbono» (CO2) atmosférico
estavam a aumentar e porquê, e o discurso da «modelagem atmosférica» que se interrogava sobre o que
aconteceria ao clima se se alcançassem concentrações superiores de CO2. Primeiro discurso foi coordenado
por um oceanógrafo, Roger Revelle, ao passo que o último foi promovido por John Von Neumann, o pai da
computação científica.
No início dos anos 1970, a ascensão do movimento ambiental americano criou uma janela de política
que estes cientistas de elite exploraram com êxito, por forma a mobilizar apoio político e financeiro e
aumentar a consciência pública. Hart e Vitor (1993: 661) descreveram isto como uma relação sinérgica em
que as descobertas científicas, como as que se relacionam com o efeito de estufa «catalisaram o
renascimento do ambientalismo», ao passo que o ambientalismo atuava como uma parteira para as novas
agendas científicas - legitimando-as e fornecendo um eleitorado para os seus resultados». Especialmente
influenciadora na ligação das duas correntes de investigação foi Carroll Wilson, uma professora de gestão no
MIT (Instituto de Tecnologia do Massachusetts), que foi o espírito guia por detrás da publicação, em 1970,
do relatório intitulado Study of Critical Environmental Problems (Estudo critico de problemas ambientais), o
qual foi explicitamente interdisciplínar e ambientalista no tom.
Hart e Vitar (1993: 668) realçam que muito pouca informação científica nova sobre as previsões do
aquecimento global foi produzida entre o final dos anos 1960 e o princípio dos anos 1970. Em vez disso, o
que foi diferente foi o fato de as duas linhas de investigação se unirem numa agenda científica redefinida e
nova que foi, depois, vendida com êxito aos formuladores de decisões políticas e aos meios de comunicação
como um problema de «poluição» global ambiental.

Papéis científicos na resolução dos problemas ambieniais

Susskind (1994) propôs cinco «papéis» primários que são desempenhados pelos conselheiros
científicos no processo de formulação de políticas ambientais: observadores de tendências, formuladores de

119

teorias, pessoas para testar as teorias, comunicadores científicos e analistas políticos aplicados. Estes papéis
sobrepõem-se freqüentemente, mas cada um tem as suas próprias tarefas e agendas.
Os observadores de tendências são cientistas, os primeiros a detectar mudanças nos padrões
ecológicos e a compreender correctamente o seu significado. Ocasionalmente, o observador de tendências
poderá ser um cientista isolado que observa algum padrão importante na microecologia da lagoa ou pântano,
e é capaz de extrapolar isto para quadros ambientais mais amplos. Mais comum, contudo, são os
observadores de tendências que fazem parte da equipe científica que está-envolvida na reunião e análise de
dados longitudinais, tais como os montados pelo satélite LANSAT, ou da Rede Europeia de Química
Atmosférica.
Os formuladores de teorias tentam explicar as causas para as mudanças que os observadores de
tendências observam. Eles têm tendência para se envolverem na construção do modelo, para encaixar as
explicações para as circunstâncias passadas e para prever os efeitos futuros.
As pessoas que testam as teorias fazem o escrutínio dos modelos sugeridos pelos formuladores de
teorias utilizando testes piloto ou experiências controladas, eles tentam determinar se as hipóteses e
proposições geradas pelo modelo podem ser empiricamente provadas.
Os comunicadores científicos tentam traduzir os dados difíceis-de-decifrar em termos que o público
entenda. Têm um papel fundamental no processo de «aparecimento» que foi discutido na seção anterior
deste capítulo. Alguns comunicadores, tais como Edward Wilson são cientistas eminentes que sentem uma
forte responsabilidade moral em trazer os frutos da sua investigação até ao público. Outro, por exemplo, o
genetista canadiano e locutor de rádio David Suzuki, são investigadores que tomaram uma decisão
conscienciosa de passar a sua vida a popularizar a ciência e transmitir a mensagem ambiental junto de um
público maior.
Os analistas políticos aplicados atuam como consultores dos formuladores de decisões políticas,
convertendo as descobertas científicas em recomendações políticas. Eles desempenham um papel
proeminente na formulação dos tratados ambientais, visto que eles pegam no que é, muitas vezes,
informação científica abstrata e redistribuem-na em termos que são agradáveis para a legislação ou tratados
internacionais.
Cada um dos cinco tipos de cientistas pode contribuir ao longo do processo de resolução de
problemas, mas existe um grau de especialização considerável; isto é, os observadores de tendências e as
pessoas que testam as teorias são geralmente mais proeminentes durante as

120

fases de encontrar os fatos, ao passo que os comunicadores da ciência e os analistas políticos desempenham
papéis fundamentais durante o período de negociações chegar a um acordo (Susskind 1994: 77). Em termos
das três tarefas chave na construção dos problemas ambientais discutidos no capítulo 2, poder-se-a afirmar
que os observadores de tendências e as pessoas que testam as teorias caracterizam o processo de
«montagem», de comunicadores na «apresentação» de uma questão e analistas políticos aplicados na
«contestação» de uma exigência ambiental (ver quadro 1, página 59).

A ciência reguladora e o ambiente

Uma área importante em que a ciência interage com a política é o processo regulador. A «ciência
reguladora» que se encontra aqui difere da ciência de investigação ambiental de diversas formas (jasanoff
1990). Em primeiro lugar, é muito mais feita à margem do conhecimento existente onde as linhas de
orientação podem, muitas vezes, estar indisponíveis. Em segundo lugar, envolve geralmente um grau
superior de «síntese de conhecimento» do que a ciência de investigação que incide muito mais sobre a
originalidade das descobertas. Em terceiro lugar, a regulação baseada na ciência requer um elemento de
«previsão» de peso, especialmente no que diz respeito à criação do risco.
Jasanoff (1990: 230) argumenta que um modelo negociado e construído do conhecimento científico
«capta de perto as realidades da ciência reguladora». Em vez de encorajar um processo adverso, as agências
reguladoras procuram o input científico nas suas decisões como meio de legitimação. Isto toma, muitas
vezes, a forma de comitê de aconselhamento científico. Jasanoff comenta um número de casos em que juntas
de aconselhamento desempenharam um papel fundamental nas decisões da Agência de Proteção Ambiental
(EPA) nos Estados Unidos. No caso da poluição atmosférica, a relação entre a EPA e o Comitê Científico de
Aconselhamento Atmosfera Limpa (CASAC) foi inicialmente instável, mas depois de uma extensa
negociação foi transformada numa orientação fundamentalmente harmoniosa. De forma semelhante, e apesar
dos problemas durante a era Reagan, a ampla Junta de Aconselhamento Científico (SAB) da EPA foi capaz
de manter uma posição respeitável e autônoma, em larga medida porque incidia sobre questões pertencentes
à avaliação científica, enquanto que deixava as atividades de formulação de regras à agência adequada.

121

Neste modelo negociado de ciência reguladora, Jasanoff defende, não poderá existir nenhuma
verdade «perfeita e objetivamente verificável», apenas uma «verdade aproveitável» que equilibra a aceitação
científica com o interesse público. Neste contexto, a realidade científica é claramente construída
socialmente, por forma a estar de acordo com o significado social. Contudo, nas circunstâncias em que
conflitos agudos de construções científicas caem num comité de aconselhamento científico, a reconciliação
pode, muitas vezes, ser muito difícil. Isto foi o que aconteceu em várias controvérsias reguladoras que
envolveram os pesticidas agrícolas, onde a prova científica foi particularmente difícil de estabelecer,
enquanto a preocupação pública tem sido grande. Nestas situações, o debate sobre o «princípio de
prevenção» que observamos anteriormente neste capítulo edifica a sua direção, com conselheiros científicos
que optam pela posição tradicional redutora, enquanto o pessoal da agência, mais sensível à pressão do
público para agir mais cedo, em vez de mais tarde. Nos casos em que isto acontece, o debate de risco pode
ser facilmente mudado para as áreas dos meios de comunicação social e políticos onde continuará sob um
conjunto de regras de base diferente das confrontadas no estabelecimento regulador (Jasanoff 1990: 151).

Capítulo 5

Formulação dos riscos ambientais


Os cachorros quentes sempre foram um símbolo da cultura americana, um suporte principal dos
inumeráveis acontecimentos sociais e comunitários que vão desde os encontros de basebol aos churrascos no
quintal e piqueniques da escola. Apesar do questionável valor nutricional, eles são especialmente populares
nas famílias, devido ao fato de serem baratos, fáceis de preparar e desejados pelas crianças.
Agora os cachorros quentes vieram juntar-se à lista cada vez maior de produtos alimentícios que
foram relacionados com um nível elevado de risco de cancro. Um recente estudo americano, relatado
amplamente nos meios de comunicação social, associa moderadamente o cachorro quente com o aumento do
risco de leucemia infantil. O tempo dirá se estas descobertas terão algum impacto a longo prazo, ou se elas
serão rapidamente esquecidas. No entanto, durante algum tempo, é natural que as vendas de cachorros
venham a cair nalguns lugares, à medida que os pais comecem a precaver-se nas suas escolhas alimentares.
Este episódio é, em grande parte, característico da forma como os indivíduos na sociedade
contemporânea se envolvem no processo da percepção e avaliação do risco. Tipicamente, ouve-se falar de
um item na rádio ou vemo-lo num jornal ou numa revista, que vem de uma fonte científica de renome e
insere-se numá preocupação existente relativa à saúde e ou segurança da nossa família. Isto aplica-se não só
às escolhas dos modos de vida e de alimentos, mas também aos riscos relacionados com a tecnologia e o
ambiente natural.
Até recentemente, os livros publicados sobre os riscos refletem quase todos, sem precedentes, a
crença de que os riscos poderiam ser

123

«objetivamente» determinados, isto é, a determinação era exclusivamente do domínio dos engenheiros,


cientistas e outros peritos, e de que qualquer fracasso por parte dos cidadãos comuns para aceitar totalmente
isto foi considerado irracional. A avaliação do risco foi, assim, concebida como atividade técnica nas
situações em que os resultados deveriam ser formulados em termos de «probabilidades». Existiu
inclusivamente uma categoria emergente de especialistas - o que Dietz e Rycroft (1987) denominaram de
«riscos profissionais» que faziam delas o seu modo vida para elaborarem novos métodos de análise de risco.

Risco e cultura

O primeiro desafio notável a esta posição veio da antropóloga social britânica Mary Douglas, e de
um cientista político americano, Aaron Wildavsky, que publicou um livro provocador em 1982, intitulado:
Risk and Culture: An Essay on The Selection of Technological and Environmental Dangers.
Risk and Culture faz duas perguntas simples, mas fundamentais. Por que razão as pessoas realçam
alguns riscos e ignoram outros? E, mais especificamente, porque razão muitas pessoas na nossa sociedade
escolheram a poluição como uma fonte de preocupação? As respostas insistem Douglas e Wildavsky, estão
enraizadas na cultura. Segundo o seu ponto de vista, as relações sociais são organizadas em três padrões
principais: o individualista, o hierárquico e o igualitário. As medidas dos indivíduos são personificadas pelas
burocracias dos governos. Os grupos igualitários estão alinhados numa «zona fronteiriça» nas margens do
poder no centro da economia política da sociedade onde estão geralmente localizados os outros dois modos
da organização social.
Os grupos igualitários têm uma cosmologia ou visão mundial que é mais ou menos o equivalente ao
«Novo Paradigma Ecológico» discutido por Catton e Dunlap, Cotgrove e outros. O crescimento económico
descontrolado é reprovado, a autoridade da ciência é questionada, e a nossa fé ilimitada na tecnologia é
declarada imponderada.
A tese central de Douglas e Wildavsky é de que a percepção do risco varia consideravelmente ao
longo destas três formas de organização social. Os individualistas do mercado estão preocupados em
primeiro lugar com a subida/descida do mercado de ações, os hierárquicos com as ameaças da lei e ordem
domésticas, ou com o equilíbrio

124

internacional do poder, e os igualitários como estado do meio ambiente. Isto leva-os a concluir que a seleção
dos riscos a que o público deverá dar atenção, é menos baseada na profundidade das provas científicas, ou na
forte possibilidade de perigo, do que na voz que predomina na avaliação e processamento da informação
sobre as questões de risco.
Nesta perspectiva, a percepção pública do risco e dos seus níveis de aceitação são «simulações
coletívas» (Douglas e Wildasvsky 1982: 186). Nenhuma definição de risco é intrinsecamente correta; todas
são parciais, visto que as exigências que competem, cada uma parte de culturas diferentes, «conferem
significados diferentes a situações, acontecimentos, objetos e especialmente relações» (Dake 1992: 27).
Infelizmente, nesta altura, a teoria cultural do risco de Douglas e Wildavsky descarrila no sentido de
uma área mais absorvente. Os igualitários ambientais, sugerem eles, são os equivalentes seculares das seitas
religiosas, tais como os Anabatistas, os Hutteristas e os Amish. Obcecados com a pureza doutrinal e com a
necessidade de lealdade interna inquestionada, os partidários são vistos como alguém que tem de criar uma
imagem de diabo ameaçador a uma escala côsmica. É, portanto, necessário e «funcional» para os partidários
do ambiente, como aqueles que se encontram nos Amigos da Terra, identificar constantemente novos riscos
resultantes do inverno nuclear para o aquecimento global. Cada crise nova é escolhida, alegam eles, «a partir
da necessidade de manter a coesão através da validação das desconfianças dos partidários do centro e das
suas expectativas apocalíticas» (Rubin 1994: 236). Isto explica a razão por que viraram as costas para as
causas locais favorecendo as questões globais, ao ponto de garantirem a invocação de um sentido de
condenação geral. A poluição e outros riscos ambientais são, portanto, utilizadas por estes partidários
provocadores como um meio de garantirem a coesão dos seus membros, e para atacar os grupos de
opositores que se estabeleceram (Covello e Jonhson 987: x).
Risk and Culture despertou muito interesse e uma torrente de críticas. Grande parte dos últimos
centrou-se na, exigência de que os ambientalistas se mobilizem em primeiro lugar por solidariedade, em vez
de por razões úteis. Isto é, em vez de verem os ambientalistas como parte de uma resposta moral para uma
crise social muito real, eles escolheram tratar os ambientalistas como meros diabos que servem o mesmo
objetivo que certas proibições alimentares entre os povos tribais. Os ambientalistas não são, portanto, vistos
como atores

125

racionais, mas como «verdadeiros crentes» abertos à manipulação por profetas ecológicos como Barry
Commoner, David Brower e Edward Abbey.
Karl Dake, um membro do círculo de investigação Douglas-Wildavsky 1, tem insistido que estas
críticas são exageradas, e que a escola cultural do risco nunca significou a implicação de que os perigos
observados são simplesmente manufaturados:

Na verdade as pessoas morrem: as espécies de fauna e flora são perdidas para sempre. Em vez disso, a questão é
que as visões mundiais fornecem lentes culturais poderosas, aumentando um perigo, obscurecendo uma outra ameaça,
seleccionam outros para lhes ser dado o mínimo de atenção ou mesmo ignorar.
(Dake 1992:33).

Contudo, Douglas e Wildavsky são menos comodistas, insistindo que o conhecimento do risco e o
ambiente não são «tanto como uma construção eventualmente por construir, mas mais como um aeroporto
sempre em construção» (1982: 192). É infrutífero, alegam, para um analista social tentar avaliar se o risco
que está em discussão é real ou n80; o que importa é que o debate se mantenha com «novas definições e
soluções». Rubin (1994: 238-9) rejeita totalmente este relativismo, argumentando que as considerações de
política pública requerem que o nosso conhecimento definitivo se os riscos, tais como os resultantes do
aquecimento global ou da destruição da camada de ozonio, são ou não ornamentos para as necessidades
apocalípticas das organizações partidárias, ou se são ameaças genuínas que deverão ser trabalhadas.
Enquanto o ponto de Rubin está bem levantado, a ambiguidade de muitos riscos contemporâneos torna
difícil obter a certeza que gostaria de ter. Contudo, mesmo que rejeitemos o relativismo absoluto de Douglas
e Wildavsky, a discussão, amplamente aceite até agora, que apresentam sobre a natureza subjetiva e
imprecisa das descobertas científicas, combate a infalibilidade da opinião de peritos. Como sociedade, ainda
temos de fazer julgamentos sociais sobre a magnitude do risco, embora as provas científicas possam ser uma
fonte útil na tomada destas decisões.

1 Outros membros notáveis deste círculo incluem Steve Rayner e Michael Thompson.
126

Perspectivas sociológicas sobre o risco

Os sociólogos do risco adoptam geralmente uma posição mais moderada que a de Douglas e
Wildavsky, insistindo que, apesar de o risco ser certamente uma criação, não se pode apenas limitar às
percepções e formulações sociais. Em vez disso; as análises do risco técnico constituem uma parte integral
do processamento social do risco (Renn 1992). Dietz et al. observaram que as correntes principais na
sociologia do risco seguiram três direções separadas, mas complementares que são reunidas através de uma
incidência subjacente sobre o contexto social em que as decisões individuais e institucionais sobre os riscos
são tomadas.
Em primeiro lugar, os sociólogos têm-se preocupado com a questão relativa à forma como as
percepções do risco diferem ao longo de populações que se deparam com diferentes oportunidades de vida, e
se a estruturação das oportunidades surge, em primeiro lugar, a partir das diferenças de poder entre os atores
sociais. Assim, Heimer (1988) salienta que os residentes do Love Canal viram os riscos de deposição de
resíduos químicos de forma diferente dos executivos da Hooker Chemical Company, e dos burocratas no
governo estatal e várias agências estatais que lidavam com a saúde pública e o meio ambiente. De forma
semelhante, os trabalhadores e os patrões vêem os riscos da saúde ambiental no local de trabalho sob
perspectivas diferentes. Até certo ponto, esta questão sobrepõe a distribuição social do risco, embora a
ênfase recaia sobre a forma como a localização social afeta a percepção do risco, em vez de incidir sobre a
forma como este altera a probabilidade de se estar exposto a condições perigosas.
Em segundo lugar, os sociólogos do risco propuseram um modelo que volta a concetualizar o
problema da percepção do risco tendo em consideração o contexto social em que as preocupações humanas
são formadas; isto é, a percepção individual é fortemente afetada por uma panóplia de influências primárias
(amigos, família, colaboradores) e secundárias (figuras públicas, meios de comunicação social) que
funcionam como filtros na difusão da informação na comunidade. Isto é apreendido no conceito de
«influência pessoal», o qual constituiu ponto crucial na investigação da comunicação dos meios de
comunicação social dos anos 1950 e 1960 (ver Katz e LazarsfeI1955).
Em terceiro lugar, foram especialmente conceitualizados aqueles componentes de sistemas
organizacionais complexos de origem tecnológica. Isto é exemplificado na análise, amplamente conhecida,

127

de Perrow (1984) sobre os «acidentes normais» em que uma estimativa das probabilidades de fracasso é
construída no âmbito da concepção das tecnologias com um potencial catastrófico. Contudo, uma vez
implementados, tais sistemas limitam seriamente qualquer capacidade humana de manipular o risco, uma
vez que a sua fonte se localiza agora na própria organização (Clarke e Short 1993).
Renn (1992) classificou posteriormente as abordagens sociológicas juntamente com duas dimensões:

1. Individualista vereus estrutural; e


2. Objetiva versus construcionista.

A primeira dimensão interroga-se se a abordagem em questão reafirma ou não que o risco pode ser
explicado pelas intenções individuais ou pelos processos organizacionais. Os conceitos objetivistas implicam
que os riscos e as suas manifestações sejam reais e acontecimentos observáveis, enquanto os conceitos
construcionistas defendem que eles são artefatos sociais fabricados pelos grupos sociais ou instituições.
Segundo esta taxinomia, a primeira das duas correntes de investigação do risco identifica das por Dietz e os
seus colegas tende a ser individualistas/construcionista, enquanto que a terceira é estruturalmente objetiva.
Notável pela sua ausência, é uma perspectiva «construcionista social» que Renn descreve como uma
abordagem que «trata o risco como formulações sociais que são determinadas pelas forças estruturais sobre a
sociedade» (1992: 71).

Definição social do risco


Hilgartner (1992) argumentou que a perspectiva construcionista deve começar por examinar a
estrutura conceitual das definições sociais de risco. Tais definições, reafirma ele, incluem três elementos
conceituais principais: um objeto considerado como colocando riscos; um prejuízo reconhecido; um sistema
articulado formando supostamente alguma relação causal entre o objeto e o dano.
Presumir que os objetos estão simplesmente à espera de serem percepcionados ou definidos como
perigosos é «fundamentalmente insocíológico» (Higartner 1992: 41). Em vez disso, uma fase inicial de
construção do risco consiste no isolamento e estabelecimento do(s) objeto(s) alvo que constitui (em) a fonte
primária de um risco.
No final dos anos 1980, as zonas resídenciais urbanas junto ao lago onde eu e a minha família
vivemos atualmente foi designada pelo

128

departamento de serviços públicos municipais para receber um par de «tanques de retenção de esgotos», um
para ser instalado em Kew Gardens, um parque comunitário de utilizações múltiplas, os outros residentes na
praia adjacente ao passeio. O problema, foi-nos informado, teve como origem o sistema de esgotos durante
as tempestades que correu para o lago Ontário e o tornou demasiado poluído, com bactérias coliformes
fecais, para se poder nadar. Segundo estudos conduzidos por uma firma de engenharia contratada pela
cidade, existiam duas fontes primárias de onde emanavam igualmente duas fontes primárias de poluição
colifórmica fecal: fezes humanas contidas na inundação dos esgostos e o excremento animal que foi
arrastado para os esgotos pelas tempestades juntamente com a água da chuva.
A nossa associação de residentes tornou conhecimento do projeto pela primeira vez quando um
membro soube da publicação de um aviso «escondído» nas páginas de um jornal diário local, e expressou
preocupação, pela primeira vez, devido à perturbação que a construção traria para o parque e para a praia,
sendo ambas amplamente utilizadas. Contudo, ao longo da investigação da proposta e encontro com os
outros residentes, começámos a apercebermo-nos de que, na verdade, a fonte de risco não residia
provavelmente, e originalmente, na água pluvial, mas no desaguamento que estava a ser feito no lago de uma
importante indústria de tratamento de esgotos localizada na parte ocidental do nosso bairro. Tomámos
conhecimento de que, devido a uma insuficiente capacidade, os operadores desta indústria abriam
regularmente as comportas que davam para o mar exatamente antes de começar a chover, e libertavam os
esgotos não tratados ou parcialmente tratados no lago a níveis 10000 vezes maiores do que aqueles que
levaram as praias a ser encerradas por serem consideradas perigosas para se tomar banho. Um dia em cada
três, as correntes do lago mudavam de direção, enviando os seus afluentes para as nossas praias. Uma noite
imediatamente após um encontro, um operador reformado de uma fábrica de filtração de água potável,
localizada na margem oriental do nosso bairro, disse-me que costumavam receber regularmente uma
chamada do seu colega na indústria de tratamentos avisando-o antecipadamente da chuva, e de que iriam
abrir os portões e aumentar os níveis de cloro - um aviso de que a poluição coliforme estava a deslocar-se, ao
longo da área costeira

2 Até recentemente, os esgotos humanos resultantes de muitos lares misturavam-se na mesma conduta com a água proveniente das
chuvas. Tem havido, desde então, um vigoroso programa de separação dos esgotos, mas alguns residentes ainda efetuam despejos
no sistema de esgotos de águas pluviais.

129

num padrão idêntico à espiral que se forma no ralo da banheira. Não o conhecíamos na altura, mas uma
situação algo semelhante ocorre regularmente em Sidney, na Austrália, onde o envelhecimento do sistema de
esgotos que despeja o esgoto para o mar, está desenhado para inundaros esgotos pluviais durante os períodos
de grandes chuvadas para que não entupa os tanques de tratamento que se encontrem já sobrecarregados
(Perry 1994: WS-4).
O que aconteceu aqui é que os residentes que se opuseram à retenção dos tanques de esgotos
desenvolveram uma definição alternativa de «objeto de risco». Nos encontros públicos, na Câmara
Municipal e numa audição especial perante um Comitê de Aconselhamento e Avaliação Ambiental
designado pelo ministro do Ambiente provincial para considerar a aceitação ou não do nosso pedido para um
«aumento» (isto é, passar de uma avaliação ambiental regular para uma avaliação mais formal e
individualmente rigorosa da avaliação ambiental), contestámos ativamente a designação oficial do objeto
considerado perigoso e apresentámos a nossa exigência (sem êxito) de que a indústria de tratamento do
esgoto principal era a vilã.
O segundo elemento que compõe a definição do risco envolve o processo de definição de prejuízo.
Mais uma vez, isto não é tão óbvio quanto parece. Por exemplo, normalmente pensa-se que os fogos
florestais deixam um rasto de destruição, mas os ecologistas contestam que na natureza os fogos têm uma
função útil na renovação da madeira da floresta. No alto mar presume-se que as plataformas de exploração
de petróleo poluem as águas à sua volta, mas os biólogos marinhos descobriram que elas também geram uma
microecologia completamente nova na sua base. Alguns ambientalistas nos Estados Unidos fizeram
recentemente uma campanha para reduzir os níveis aceitáveis de vestígios de selénio mineral que pode ser
adicionado às rações dos animais baseando-se no fato de deixar resíduos tóxicos, mas os representantes da
indústria alimentar reafirmam que os aditivos de selénio são um benefício para o meio ambiente na medida
em que reduzem a quantidade de alimentos consumidos poupando, assim, energia. Em cada um destes casos,
a própria definição do que o prejuízo origina num objeto ou ação particular é contestado, ativando uma
variedade de alegações e contra-alegações, apesar do fato de existir um consenso mútuo em relação ao
objeto de risco (fogos florestais, exploração de petróleo em alto mar, selénio como aditivo alimentar). As
afirmações em relação ao risco podem frequentemente entrar em conflito em áreas ideológicas. Assim, o
projeto de desvio de um rio que fornece água de irrigação para os agricultores locais

130

(um benefício humano) pode resultar na destruição de um frágil ecossistema de peixes, aves, insetos, etc.
(um prejuízo biológico). De forma semelhante, o sal na estrada que é considerado tão vital para enfrentar a
dureza do Inverno em partes do Canadá e Norte dos Estados Unidos foi declarado pelos cientistas constituir
um prejuízo para os lagos, rios e correntes onde é eventualmente depositado. Reciprocamente, as iniciativas
ambientais que são declaradas ecologicamente benéficas podem resultar em problemas para os humanos. Por
exemplo, a proteção dos lobos é defendida por alguns preservadores da vida selvagem, mas é profundamente
contestada pelos rancheiros que temem a perda dos animais domésticos cruciais para a sua sobrevivência
econômica. Sendo o consenso impossível, a base central da contestação passa a ser a presença ou ausência
de prejuízos que é gerada por um objeto de risco.
Um terceiro componente da formulação social do risco consiste nas ligações que dão origem a
alguma forma de causalidade entre o objeto de risco e o potencial prejuízo. Hilgartner (1992: 42) observa
que a formação destas ligações é sempre problemática devido ao fato de o risco poder ser atribuído a
múltiplos objetos. Na verdade, as «leis» da ecologia encorajam este fato, visto que todas as coisas são vistas
como interdependentes. Isto é, posteriormente, complicado pelo fato de a extensão completa do risco poder
eventualmente não ser reconhecida até muitos anos depois. Por exemplo, um relatório recente elaborado por
uma estação de rádio do Minesota sugere que o teste do Exército norte-americano em 1953, no qual as
nuvens de sulfato de cádmio de zinco, um suspeito carcinogéneo, que foram espalhadas pelo espaço aéreo de
Mineápolis dezenas de vezes, poderão ter causado um número invulgar de nados mortos e abortos; estes
problemas apareceram particularmente em antigos estudantes de uma escola primária pública que constituía
um dos locais onde foi espalhado o sulfato há quarenta anos (New York Times 1994). Os efeitos podem, por
vezes, ser mais imediatos, mas são precisos anos até que os formuladores de exigências os reunam sob uma
forma publicamente reconhecida. Foi este o caso relativamente à quantidade de doenças dos militares
veteranos da Guerra do Golfo. Embora os sintomas começassem a fazer-se sentir logo após a sua volta,
apenas agora os relatórios públicos de uma «síndrome da Guerra do Golfo» estão a começar a penetrar na
corrente principal dos meios de comunicação social e a serem estruturados em termos de agentes ambientais
nocivos na zona de guerra.

131

Muito do discurso no âmbito da formulação social do risco tem lugar neste domínio. A situação é
posteriormente complicada pela existência de múltiplos níveis de provas: científica jurídica e moral.
O fardo da prova legal é o mais oneroso, visto que não pode deixar lugar para «dúvidas razoáveis».
Os requerimentos que constituem o padrão nos estudos científicos (por exemplo: «os dados são sugestivos,
mas requerem mais investígação») não aparecem em tribunal. Não aparecem igualmente as provas
anedóticas ou clínicas 3 Tal como os ambientalistas descobriram, muitas vezes os juizes mostram-se
relutantes em abrir qualquer caminho novo, agindo para prevenir um problema antes que ocorra.
A prova científica mais fácil de obter, mas é, todavia, escrava dos níveis de significado estatísticos. É
igualmente algo inconstante, a sua autoridade permanece intacta apenas até surgir o próximo estudo que a
refute. Os efeitos danosos das chuvas ácidas sobre os lagos e as florestas, por exemplo, estão constantemente
a ser descobertos, e redescobertos (ver capítulo 7). O nível científico da prova pode ser subdividido em dois
padrões: um padrão retirado da ciência pura em que a ação não é recomendada até que as correlações atinjam
o nível de 95 por cento de confiança, e um padrão utilizado pelas disciplinas médicas e, que a ação pode ser
tomada antes da importância ser atingida, se a prova apontar para um problema grave de saúde.
Collingridge e Reeve (1986) demonstraram a conflitualidade entre estas duas versões da prova
científica, no debate dos efeitos do chumbo proveniente da exaustão dos veículos sobre a saúde das crianças.
Nos Estados Unidos, marcou os conflitos entre a EPA, que apoiava a remoção dos níveis de chumbo na
gasolina, com base nas amplas diferenças dos níveis de chumbo no sangue entre as populações urbanas e
suburbanas, e a Ethyl Corporation, uma grande fábrica produtora de aditivos de chumbo que argumentava
que a ligação entre o sangue e os níveis de ar permaneciam estatisticamente por provar. No Reino Unido, as
dificuldades surgiram no início dos anos 1980 entre o «Relatório Lawther» apoiado pelo governo, o qual
rejeitava todos os estudos de animais laboratoriais e bioquímicos considerando-os irrelevantes para a
compreensão dos efeitos médicos do chumbo sobre os seres humanos, e o relatório intitulado Lead ar Health
(Chumbo

3 Constitui uma excepção uma decisão de 1984 no caso de Ferebee V. Cheoron Chemical Co., nos Estados Unidos, e que permitiu
ao grupo de jurados confiar no testemunho individual de médicos na prova da ausência de prova epidemiológica de ferro relativa
aos danos causados pela exposição aos pesticidas (ver Cronor 1993).

132

ou Saúde) levado a cabo por um grupo ambiental, a Conservation Society, a qual argumentava o contrário:
«As provas morais são muito facilmente elaboradas, mas dependem fortemente da mobilização da opinião
pública por forma a causar um impacto»
A utilização de provas morais permite a formação de atitudes ou opiniões sobre a questão do risco,
mesmo se os níveis das provas científicas ou legais indicarem um nível de incerteza ou ambiguidade. Por
exemplo, os defensores dos direitos dos animais nunca foram capazes de provar, de forma cientificamente
conclusiva, que os animais «sofrem», assim, adotaram a estratégia alternativa de tentar demonstrar
eticamente que é isto que acontece, sobretudo a partir do trabalho do filósofo Peter Singer. De igual modo, o
processo contra a engenharia biológica de plantas e animais não é empiricamente poderoso (nenhuma-fruta
alterada geneticamente teve até agora um comportamento como o protagonista na história de Roald Dahl,
James and the Giant Peach), mas o caso moral contra a interferência na natureza é mais impressionante.
Contudo, uma tal moralização tende a polarizar posições sobre as políticas do risco, tornando os
compromissos mais difíceis (Renn 1992: 192).
Ao contrário das provas legais e científicas, as provas morais mais eficazes são, muitas vezes,
aquelas que seguem uma linha simples de raciocínio. Considerar, por exemplo, a natureza da argumentação
apresentada por «Kapox» - apelidado pela imprensa sulista americana como o «Tarzan da Amazônia».
Kapox, que costuma nadar longas distâncias na Amazónia para publicitar o estado da poluição do rio, e a
destruição da floresta circundante, não baseia o seu apelo num raciocínio sofisticado sobre a necessidade de
proteger a biodiversidade. Em vez disso, prega uma mensagem simples, óbvia e moral: como maior rio do
mundo que concentra um quinto da água potável do planeta, a Amazónia merece respeito (Suzuki 1994a).

Areas de construção de risco

Por muito poderoso que o apelo de Kapóx possa ser, é pouco provável que influencie diretamente
decisões ou políticas coletivas de risco. Em vez disso, as definições social de risco ambiental devem ser
seguidas por ações políticas designadas para mitigar ou controlar o risco que foi identificado. Baseado no
trabalho de Hilgartner e Bosk (1988), Renn (1992) argumenta que os debates políticos sobre

133

questões do risco são invariavelmente conduzidas no âmbito da estrutura das «arenas sociais»
O termo arena social constitui uma metáfora para descrever o estabelecimento político em que os
atores dirigem as suas exigências àqueles que estão encarregues das tomadas de decisão, na esperança de
influenciar o processo político. Renn concebe diversos «palcos» diferentes que partilham esta arena:
legislativo, administrativo, judicial, científico e os meios de comunicação social. Embora estas estratégias de
ação tradicional e ortodoxa sejam permitidas, estas arenas são, contudo, reguladas por um repertório
estabelecido de normas. Por exemplo, a ação ilegal direta tal como é defendida pelo Earth First, o grupo
ambiental americano rebelde, viola este protocolo. O código é, de fato, uma combinação de regras formais e
informais geralmente supervisionadas e coordenadas por algum tipo de coação ou agência reguladora, como
a EPA nos Estados Unidos, e o Departamento Ambiental (D.O.E) na Grã-Bretranha.
O conceito de arena social combina elementos na perspectiva da organização - meio ambiente no
campo das organizações complexas; o modelo dramatúrgico das relações sociais de Goffman e os modelos
simbólicos da política, tal como foram desenvolvidos por Murray Edelman (1964, 1977) cimentados por um
componente social construcionista. Tal como foi formulado, Renn acentua também a mobilização das fontes
sociais tal como foram discutidas pela escola de McCarthy-Zald, no âmbito da perspectiva de mobilízação
de recursos para os movimentos sociais. Renn parece não estar consciente dos paralelismos, mas os
conceitos da arena social que ele utiliza refletem também alguma investigação recente sobre a diplomacia
ambiental internacional, e nomeadamente a conceitualização de «comunidades epístêmícas» (ver capítulo 4)
de Haas (1990, 192).
Embora alguns elementos da construção do risco possam ter lugar no domínio público para além dos
seus parâmetros, a ação mais importante tem lugar em arenas que são povoadas por comunidades de
profissionais especializados: cientistas, engenheiros, advogados, médicos, funcionários governamentais,
gerentes associados, operadores políticos, etc. (Hilgartner 1992: 52). Tais peritos técnicos são os principais
construtores do risco, estabelecendo uma agenda que inclui, muitas vezes, o input direto do público apenas
durante as últimas fases de consideração. Hilgartner e Bosk (1988) observa que estas «comunidades de
operadores» funcionam, muitas vezes, de uma forma simbiótica, os operadores em cada arena alimentam as
atividades dos operadores nas outras. Os operadores ambientais (grupos

134

ambientais, forças de pressão da indústria, pessoal de relações públicas, defensores políticos, advogados
ambientais, jornalistas e burocratas) são exemplos notáveis disto; devido às suas atividades, geram trabalho
uns aos outros, e aumentam a importância do meio ambiente como fonte de problemas sociais.
No âmbito da arena social do risco, o processo de definição do que é aceitável está, muitas vezes,
enraizado nas negociações entre várias ou múltiplas organizações que proclamaram estruturar relações entre
elas. Clarke (1988) ilustra isto na sua análise de um fogo num edifício de escritórios em Binghanton, Nova
lorque, que deixou um legado de contaminação química tóxica. Neste caso, três agências governamentais - o
departamento de saúde do estado, o departamento de saúde do condado e a organização de manutenção do
estado lutaram coletivamente pelo protagonismo na determinação do perigo da situação. Clarke argumentou
que a avaliação institucional do risco é uma atividade de formulação de exigências em que as cooperações e
as agências do governo competem e negociam para estabelecer a definição de risco aceitável.
Do ponto de vista da vantagem teatral, as arenas sociais de risco estão povoadas por grupos mistos de
atores. Palmlund (1992) propõe a existência de seis «papéis genéricos» na avaliação social do risco,
transportando cada um a sua própria classificação dramática: portadores de risco, defensores dos portadores
de risco, geradores de risco, investigadores do risco, árbitros do risco e informadores do risco.
Os portadores do risco são vítimas que suportam os custos diretos de trabalhar e viver em ambientes
perigosos. No passado, aqueles que foram mais afetados raramente se pronunciaram e permaneceram,
portanto, à margem das arenas de risco. Mais recentemente, contudo, como pode ser visto pela ascensão do
movimento de justiça ambiental, os portadores de risco ficaram mais poderosos e devem ser cada vez mais
vistos como jogadores notáveis. Os defensores dos portadores de risco ascenderam ao palco público para
lutar pelos direitos das vítimas. Os exemplos incluem organizações de consumidores, tais como as dirigidas
por Ralph Nader e Jeremy Rifkin, organizações de saúde, uniões de trabalhadores e defensores congressistas
parlamentares. Eles são representados como protagonistas ou heróis. Os geradores de risco - As empresas de
serviços públicos importantes, as companhias florestais, as companhias multinacionais químicas e
farmacêuticas, etc. - são classificadas como protagonistas e vilãs, visto que os defensores afirmam serem
estas as fontes primárias de risco.

135

Os investigadores do risco, nomeadamente os cientistas na universidade, os laboratórios governamentais e as


agências patrocinadas publicamente, são relatados como «ajudantes» na tentativa de reunir provas sobre o
porquê e o como e sob que circunstâncias um objeto ou atividade são portadores de risco, quem está exposto
ao risco e quando é que o risco pode ser visto como «aceitável». Contudo, de vez em quando, os
investigadores do risco foram identificados como geradores de risco, particularmente se as suas descobertas
defendem a posição dos últimos. Os árbitros do risco (mediadores, tribunais, agências reguladoras,
Congresso/Parlamento) ficam fora do «palco» procurando determinar, de forma neutral, até que ponto o
risco deverá ser aceite, ou a forma como deverá ser limitado ou evitado, e que compensação deveria ser dada
àqueles que sofrem danos resultantes de uma situação julgada perigosa. Na realidade, os árbitros do risco
raramente são neutrais como deveriam ser; em vez disso, tendem frequentemente a colocar-se ao lado dos
geradores do risco. Finalmente, os informadores do risco, em primeiro lugar os meios de comunicação social
tornam o papel de um «coro» ou de mensageiros, colocando os assuntos na agenda pública ou escrutinando a
ação.
Renn (1992) sugere uma combinação destes papéis: os amplifícadores questões que observam as
ações no «palco» comunicam com os atores principais, interpretam as suas descobertas e relatam-nas ao
público. Os propagadores ambientais, como Paul Ehlich, Barry Commoner, Jeremy Rífkin e Jonathan Porrit
constituem exemplos principais.
Hilgartner e Bosk representam a interacção entre as diferentes arenas do discurso público, tal como
são caracterizadas por diversas características fundamentais. Em primeiro lugar, estas múltiplas arenas estão
ligadas por um conjunto complexo de ligações sociais e organizacionais. Em consequência disso, as
atividades em cada arena propagam-se de um modo geral pelas outras. Em segundo lugar, encontra-se um
grande número de «movimentos de feedback» que amplificam ou desencorajam a atenção dada aos
problemas nas arenas públicas. Consequentemente encontra-se um número relativamente pequeno de
problemas sociais bem sucedidos que ocupam a maior parte do espaço, na maior parte das arenas ao mesmo
tempo. Este padrão sinergético é típico da formulação de políticas sobre questões relacionadas com o risco e
o meio ambiente.
No seu estudo de 228 «profissionais de risco» com base em Washington, Dietz e Ricroft (1987)
descobriram uma política comunitária com uma densa rede de comunicação que se estendia até aos

136

grupos ambientais, grupo de peritos, universidades, firmas de advocacia e consultadoria, corporações e


associações de comércio, a EPA e outras agências executivas. As organizações ambientais estiveram
especialmente ativas em atividades de alcance que incluem contactos com empresas e associações de
comércio com as quais 85 por cento dos interrogados comunicaram num mês típico. De forma semelhante, o
pessoal transita ao longo das organizações, outro componente da rede de câmbios, foi substancial, embora
trabalhando para um grupo ambiental levou a uma fraca probabilidade de encontrar emprego num dos outros
grupos.
Dietz e Rycroft representam o sistema da política de risco como algo híbrido no sentido em que se
baseia fortemente na ciência, mas, ao mesmo tempo, é impulsionada pelo conflito ideológico entre
ambientalistas e os participantes associados e governamentais. Isto cria uma medida transitória de tal forma
que a ciência constitui o alicerce do sistema, contudo, muitas decisões políticas são resolúveis apenas em
termos políticos. Contudo, a representação que emerge deste inquérito é a de uma comunidade política
permeável, mas, intrinsecamente ligada e orientada no sentido de um discurso partilhado sobre questões
relacionadas com o risco ambiental.
Isto significa, entre outras coisas, que qualquer abordagem de risco que tente realçar os fatos
socioculturais em detrimento dos físicos, será provavelmente considerada fora de alcance e, portanto,
imprópria para inclusão na agenda partilhada dos profissionais de risco (Dietz e Rycroft 1987: 114).

Poder e formulação social do risco ambiental

Freudenburg e Pastor (1992) afirmaram que a abordagem de formulação social do risco sugere uma
atenção mais cuidada para com as variáveis que os sociólogos descobriram estar associadas ao exercício do
poder. De forma semelhante, Clarke e Short (1993) observam que as discussões dos construcionistas -
contrariamente à psicologia e à economia - tendem a incidir sobre a forma como o poder funciona, em
termos estruturais de debate sobre o risco.
Ambos os conjuntos de atores partilham a crença de que esta relação é especialmente importante
visto que os pontos de vista oficiais, como o seu acesso significativo aos meios de comunicação social,
sugere fortemente que os receios públicos respeitantes aos riscos técnicos são claramente irracionais, isto é,
as alegações relativas à

137

irracionalidade pública são, em si próprias, formas de estruturar as questões de risco. Correlativamente, as


formulações políticas originárias da comunidade de profissionais de risco, e que discutimos na seção
anterior, são apresentadas como racionais, avaliações objetivas daquilo que é ou não considerado seguro. Se
esta visão for aceite, então diz-se que o risco central educa o público no sentido de este se aperceber que está
a exagerar, e de que o risco ligado ao poder nuclear, herbicidas, organismos produzidos pela bioengenharia,
etc., não constituem, na realidade, o risco que parecem constituir. Por forma a tranquilizar os receios
públicos, os analistas do risco desenvolvem medidas quantitativas através das quais comparam os riscos
inerentes a diferentes escolhas políticas, e os seus custos e benefícios relativos (Nelkin 1989: 99).
Isto não implica que as pessoas estejam sempre certas, e o conhecimento dos peritos seja
invariavelmente «instável» (Wynne 1992: 276). Em vez disso, uma perspectiva construcionista social
argumentaria que cada um representa um estrutura competitiva, mas a racionalidade dominante que emana
do estabelecimento do risco sobrepõe-se à estrutura popular devido a um poder diferencial. Assim, Wynne
(1992: 286) demonstra que no caso de uma controvérsia pública sobre o herbicida 2,4,5-T no Reino Unido
em que o conhecimento empírico em primeira mão, dos trabalhadores agrícolas e florestais, foi diretamente
relevante para uma análise de risco objetiva; mas este conhecimento foi rejeitado pelos cientistas,
denegrindo e ameaçando a sua identidade social.
Não há local onde este diferencial seja mais evidente do que nos encontros de informação pública ou
audições que são regularmente supervisionadas pelos geradores do risco e pelos árbitros. Nos encontros
públicos relativos à construção dos tanques de retenção dos esgotos, descritos anteriormente neste capítulo
(ver páginas 128/129), os membros do departamento de obras públicas, políticos locais (que apoiavam
fortemente o projeto) e representantes da firma de engenharia privada que tinha recomendado a construção
de tanques sentaram-se todos num palco erguido no auditório cujas margens foram adornadas com tabelas,
fotografias ampliadas e outros «adereços». Nós, cidadãos, fomos limitados a uma única questão sem
seguimento. Aqueles que questionaram a adequação do projeto foram alternadamente incomodados e
tratados com condescendência. Nos assuntos contenciosos, os apresentadores não hesitavam em introduzir
resmas de provas estatísticas que ainda não haviam sido vistas, e que não tínhamos forma de confirmar ou
negar sem alguns dias ou

138

semanas de investigação posterior. Richardson et al. (1993) observaram muito dos mesmos elementos
estruturais na sequência de audições públicas ambientais em 1984 sobre proposta de construção de uma
fábrica de branqueamento de pasta de papel a norte de Alberta 4. Por exemplo, os membros da ElA da Junta
de Inspeção da Alpac que estavam a levar a cabo as audições sentaram-se à mesa e enfrentaram o público,
por vezes num palco. Numa ou várias mesas ao lado direito da Junta estavam os representantes da Alberta-
Pacific Forest Industries (Alpac), a companhia que procurava construir a fábrica, os seus peritos técnicos e o
seu advogado. Numerosos consultores da Alpac estavam dispersos pela sala. Os apresentadores tiveram de
falar por microfones através dos quais as suas palavras eram gravadas.
Kaminstein (1988) argumenta que na apresentação pública da informação científica, relativamente
aos aspectos de saúde e segurança dos depósitos de resíduos tóxicos, está incorporada uma retórica de
contenção que restringe a discussão, evita questões difíceis e segue sempre a sua própria ordem de trabalhos.
Com base em três anos de observação de encontros da EPA levados a cabo para informar os residentes de
Pitman, Nova Pérsia, sobre os passos que estavam a ser tomados para limpar os terrenos de Lipari, a zona de
um dos piores depósitos nos Estados Unidos, Kaminstein conclui que os residentes estavam mais
controlados e derrotados do que informados ou persuadidos. A ferramenta básica que os peritos científicos
associaram à EPA e os Centros de Controlo de Doenças usaram para reprimir as iniciativas dos cidadãos foi
a de exposições sobre tóxicos - exposições que reprimem a discussão e refreiam a preocupação pública. A
retórica da contenção tem múltiplos elementos.
Em primeiro lugar, como aconteceu com os encontros sobre os tanques de retenção, os residentes
foram bombardeados com informação técnica. Num encontro, os representantes EPA distribuíram
documentos que totalizaram quarenta e quatro páginas. As pessoas que frequentaram esses encontros eram
supostas assimilar uma diversidade de dados, tabelas, gráficos, quadros e uma exibição de dia-

4 O que aconteceu foi que a junta de inspecção recomendou que a fábrica não deveria ser construída, a menos que estudos
posteriores indicassem que não constituiria um perigo sério para a vida no rio e para os seus utilizadores a jusante ao longo do
sistema do rio Peace-Athabasca. Nove meses depois foi acordado aceitar estas descobertas, o governo de Alberta subverteu a sua
própria decisão e decidiu permitir que a ALPAC prosseguisse.

139

positivos numa rápida sucessão. Ao mesmo tempo, os fatos que os residentes queriam nunca estiveram
disponíveis e não foi dada nenhuma explicação ou interpretação como aconteceu com a informação
apresentada pelos cientistas consultores.
O espaço físico da sala de reuniões era igualmente muito semelhante ao que foi frequentado por
aqueles que foram às sessões sobre os tanques de retenção. Em frente na sala estava um grande estrado cerca
de 60 em acima do chão, uma extensa mesa com nove grandes cadeiras castanhas, altas, em que se sentavam
os cientistas, criando um distanciamento físico e psicológico do público. Vários adereços dramáticos, por
exemplo, uma fotografia aumentada de um veículo de monitorização da qualidade do ar que parecia uma
caravana de campismo, foram emtregues como dispositivos retóricas para apaziguar os residentes e
aumentar o poder dos responsáveis pelo encontro.
O estilo de apresentação factual utilizado pelos representantes da EPA e pelos cientistas foi abstrata,
impessoal e técnica, criando assim uma impressão de neutralidade profissional. Foram os residentes ativistas
que ficaram irritados e confrontadores, permitindo que os funcionários pedissem que abandonassem a sala
por serem demasiado «emocionais». As questões que tratavam da geologia e hidrologia de uma área, testes
futuros e planos para limpeza foram esboçados, mas aquelas ligadas a riscos de saúde foram evitadas ou
desviadas. Os representantes e os cientistas utilizaram uma linguagem técnica, ambígua e inteletual nas suas
apresentações, tornando impossível o desenvolvimento de qualquer diálogo significativo entre os peritos e os
residentes sobre a natureza e a magnitude dos riscos que a comunidade de Pitman enfrentava.
Técnicas de exposição sobre tóxicos, como estas, são estrategicamente bem sucedidas se eticamente
repreensíveis. Permitem aos peritos científicos e aos funcionários governamentais dirigirem a discussão,
estabelecer a agenda de riscos e desencorajar a futura participação dos cidadãos. As preocupações populares
e as estruturas do risco estão subordinadas às preferidas pelos poderosos na sociedade. Tal como Kaminsteirr
(1988: 10) observa, estes tipos de dispositivos de exclusão permitem às agências como a EPA cumprir
legalmente o seu mandato para levar a cabo encontros públicos, levando simultaneamente os residentes a
sentirem que estão a lutar por uma batalha perdida apenas para serem ouvidos.
Isto não quer dizer que os membros do público nunca tentem afirmar-se em locais oficiais como
estes. Por exemplo, no caso de
140

Alberta, alguns participantes lutaram para forçar o controlo de reguladores sobre a extensão da inspeção,
jurisdição e sobre definições de legitimidade, assim como tentar subverter o discurso dominante que foi
imposto pelas forças pró-desenvolvimento (Richardson et ai. 1993: 47). Contudo, as limitações do processo
de audiência tornam normalmente difícil a participação dos cidadãos, especialmente devido ao fato de a
situação ser estruturada por forma a evitar a argumentação pública e reforçar o poder das instituições.
Os analistas do risco institucional exercem igualmente poder num plano mais abrangente.
Estruturalmente, controlam a agenda oficial de riscos, atuando como guardiães bem colocados para
determinar quais as questões do discurso público a serem incluídas ou excluídas. Por exemplo, nos anos
1980, imbuídos de um clima desregulador dentro da administração Reagan (apoiado pelos gestores seniores
da EPA), o Congresso cortou fatalmente o orçamento do Departamento para a redução e Controlo do Ruído
(ONAC), arruinando, através dele, a maior parte dos programas de redução do ruído (Shapiro 1993). Apesar
do risco sistemático da poluição sonora para a saúde humana e harmonia ambiental, a questão permaneceu
inalterada devido à falta de reação governamental que apenas recentemente mostrou alguns sinais de
reanimação. Em tais circunstâncias, o próprio risco não diminui (no caso da poluição sonora, aumentou),
mas o estabelecimento do risco é capaz de manipular o seu progresso na agenda de ação.
Freudenburg e Pastor (1992: 403) observam que a abordagem construcionista social dos riscos
tecnológicos faz bem em observar as outras variáveis que os sociólogos descobriram previamente estarem
associadas ao poder. Assim, o gênero pode ser aqui significativo, de tal forma que os peritos científicos e os
funcionários burocráticos que praticam a retórica da contenção são geralmente homens, ao passo que os
grupos de cidadãos locais são compostos de forma desproporcionada por mulheres, faltando a muitas delas
poder e autoridade na vida pública. De forma semelhante, os membros de minorias étnicas e raciais são
regularmente dispensados e desacreditados pelo estabelecimento de risco, uma experiência que conduziu ao
recente florescimento do movimento de justiça ambiental.
A relação entre poder, desigualdade e formulação social do risco é igualmente evidente nas
comunidades que foram marginalizadas por posições de isolamento económico, geográfico e social (Blowers
et aI. 1991).

141

Formulação do risco numa perspectiva transnacional

Finalmente, a formulação do risco varia em termos transnacionais segundo um número de diferentes


factores: a organização das estruturas políticas e administrativas, tradições históricas e crenças culturais.
Existem diversos bons exemplos que podem ser encontrados nos três casos de estudo que serão apresentados
posteriormente neste livro (ver capítulos 7-9). Considere, por exemplo, o destino diferente da BST a
hormona bovina de crescimento geneticamente gerada, nos Estados Unidos, onde foi aprovada para
utilização versus Europa Ocidental onde foi banida eficazmente. Ou repare-se nos padrões contrastantes de
ação/inação pela ciência e o governo na Suécia, Estados Unidos, Canadá, Crã-Bretanha e Alemanha em
relação às chuvas ácidas.
No âmbito da análise do risco, talvez o melhor estudo comparativo seja o relatório Jasanoff (1986)
intitulado Risk, Management and political Cure. Baseado em casos de estudo de programas nacionais para o
controlo dos carcinogéneos em vários países europeus, Canadá, Estados Unidos, ela conclui que os fatores
culturais influenciam - fortemente os objetivos e prioridades na gestão do risco. Na Alemanha (ocidental), a
abordagem preferida tem sido a delegação da resolução de todas as questões relacionadas com o risco nos
peritos técnicos. Jasanoff não discute isso, mas mesmo onde a questão do risco é fortemente contestada, a
racionalidade técnica é aplicada sob a forma de uma «avaliação tecnológica» que inclui representantes do
governo, da indústria e dos movimentos sociais (ver Bora e Dobert 1992). Na Grã-Bretanha e no Canadá, os
riscos são examinados através de uma mistura de um processo científico e administrativo, mas as incertezas
científicas não são sempre publicamente transmitidas. Contrariamente, nos Estados Unidos, a determinação
do risco tem uma aparência muito mais pública numa ampla variedade de fora científicos e administrativos.
Embora isto possa produzir um maior e mais democrático rigor analítico e participação pública esclarecida,
podem também conduzir a uma maior polarização e conflito e, assim, a um impasse político.
Utilizando o método comparativo sugerido por Jasanoff, Harrinson e Hoberg (1994) compararam a
regulação governamental no Canadá e nos Estados Unidos de sete substâncias controversas que se
suspeitava provocarem cancro nos seres humanos: os pesticidas Alar e Alachlor, o isolamento da espuma
ureia-formaldeído, gás radon,

142

dióxinas, sacarina e amianto. Cada abordagem de um país foi pesada segundo cinco critérios de eficácia:
severidade, e atemporalidade da decisão reguladora; o balanço dos riscos e benefícios por aqueles que
tomam as decisões; oportunidades de participação pública; e a interpretação da ciência na tomada de decisão
reguladora.
Tal como Jasanoff, os investigadores descobriram que existiam dois estilos reguladores contrastantes.
Em cada caso

existia um conflito mais aberto em relação aos riscos nos Estados Unidos do que no Canadá, com grupos de
interesse, meios de comunicação social, legisladores e os tribunais que tinham um papel muito mais importante a
sul da fronteira. O processo regulador no Canadá tinha tendência a ser fechado, informal e consensual,
comparativamente ao estilo aberto, legalizado e adverso dos EUA.
(Harrison e Hoberg 1994: 168).

Diz-se que ambos os estilos têm riscos e benefícios. O sistema canadiano conduz mais à precaução
científica e ao controlo democrático formal, mas falta-lhe a responsabilidade, tornando mais fácil às decisões
políticas serem inseridas nos argumentos científicos. O sistema americano é mais aberto, mas também mais
conflituoso e vulnerável às pessoas dos grupos de interesse e, em consequência disso, menos dependente dos
peritos científicos.
Esta investigação comparativa fornece mais provas de que a determinação do risco e a sua avaliação
são socialmente formuladas. As estruturas e os estilos podem ser vistos como tendo tanto a ver com a
decisão de quais as condições ambientais que serão julga das como perigosas e litigáveis, como a natureza
da própria alegação científica. Consequentemente, as alegações ambientais, fundamentalmente estáveis,
podem ser detidas na segunda ou terceira fases do modelo apresentado no capítulo 2, quer devido à
conspiração entre regulamentadores e cientistas, quer à pressão política dos grupos de interesse, quer dentro
ou em oposição à perspectiva ambientalista.

Capítulo 10

O construcionismo ambienial e a condição pós-moderna


Neste capítulo final abordarei a formulação social do risco e do conhecimento ambientais, no
contexto de um debate teórico mais amplo sobre modernidade versus pós-modernidade. Na sua maioria, os
sociólogos ambientais evitaram o envolvimento neste debate, preferindo lidar com problemas de
investigação empiricamente fundamentados. Contudo, como veremos, tem havido um aumento recente da
atividade neste domínio, nomeadamente o desenvolvimento por Beck do conceito de «modernidade
reflexiva» no contexto de uma «modernização ecológica» como teoria da mudança social.
A dicotomia da modernidade/pós-modernidade assemelha-se, até certo ponto, a uma pequena
armadilha: encorajadora inicialmente, mas cheia de perigos. Tal como Featherstone (1988: 195) observou,
são poucos os termos académicos recentes que tenham gozado de tanta popularidade como o pós-
modernismo e que ainda sejam vistos por muitos como uma «moda efêmera» ou como «um capricho
intelectual sem significado e bastante superficial».
Apesar da sua carreira atribulada no topo da teoria social, há um sério risco com a conceitualização
do pós-modernismo. Embora possa significar muitas coisas, desde um estilo de arquitetura, a um método de
abordagem literária, na sociologia tem sido tratado como «uma mudança de época, ou como uma ruptura
com a modernidade, envolvendo a emergência de uma nova totalidade social que tem o seu próprio princípio
distinto de organização» (Featherstone 1988: 178). Este princípio afirma que a certeza da era moderna,
formulada como se o fosse com base em noções amplamente partilhadas e aceites sobre o progresso
econômico, tem sido aniquilada, deixando um
231

mundo caótico e fragmentado que está intimamente desprovido de significado. Se a produção e o


capitalismo industrial constituíram os marcos da modernidade, a pós-modernidade é caracterizada pela
ordem social dominada por «estímulos»: representações artificiais ou cópias dos objetos ou acontecimentos
reais (Baudrillard 1983). Não surpreende o fato de o símbolo da era atual para muitos eruditos pós-
modernistas ser o parque temático da Florida, o «Disney World», o qual é suposto resumir a substituição de
uma história e experiência cultural controladas e adoça das, pela realidade.
Visto ser amplamente um tipo de acusação relativamente à natureza «plástica» da cultura
contemporânea, o pós-modernismo não diz nn realidade muito sobre as mudanças econômicas políticas que
estão implicadas na transição do moderno para o pós-moderno. Uma excepção para esta situação é o crítico
marxista Frederic Jameson (1984), que apresenta o pós-modernismo como uma nova fase sócio-econômica
do capitalismo em que as relações de trocas capitalistas penetram nas esferas da informação, conhecimento,
ínformatização e consciência, e a própria experiência até uma extensão sem paralelo. Contudo, como Kellner
(1988: 261) corretamente observou, o relato de James reduz deliberadamente o pós-modernismo a um
«momento no âmbito de uma nova fase do capitalismo» e poderá ser melhor caracterizada por qualquer
outro conceito, por exemplo, o de «capitalismo multinacional».
O que é que tudo isto tem a ver com a formulação social dos problemas ambientais? Em primeiro
lugar, a explicação dos discursos relativos ao crescimento econômico, desenvolvimento, risco e ciência,
podem ser vistos como consentâneos às explicações pós-modernistas. Tal como Brian Wynne (1992)
argumentou, o «paradigma modernista de uma racionalidade incondicional e singular da qual os discursos
predominantes do risco são um pilar» tem sido eliminado pelos acontecimentos dos últimos trinta anos. Este
processo destrutivo começou primeiro em 1962 com a publicação de Silent Spring, a acusação de Rachei
Carson do estabelecimento agro-químico e da sua utilização imprudente de pesticidas, seguido de imediato
pela crítica de Barry Commoner (1963, 1971) em relação às tecnologias industriais do período após a
Segunda Guerra Mundial e o seu efeito destrutivo. No seu despertar, uma pletora de comentadores
universitários e das organizações do movimento ambiental desmascararam sistematicamente a falta básica de
certeza que envolvia a condução da ciência e a introdução de novas tecnologias. O poder nuclear, os
plásticos, herbicidas e incineradoras de resíduos tóxicos: cada uma dessas tecnologias, foi subsequentemente
demonstrado, tinham graves defeitos

232

que não eram evidentes quando foram publicitados como ferramentas para um futuro mais promissor. Além
disso, o próprio processo de criação de ciência revelou-se intrinsecamente sociológico, uma «teia de
convenções, práticas, compreensões e indecisões "negociadas"» (Grove-White 1993: 22).
Ao nível popular, a erosão da fé na ciência foi desencadeada por uma progressão de desastres
nucleares e químicos ficcionais (O Sindrome da China) e reais (Bhopal. Chernobyl, Love Ca nal, Three Mile
Island), nos quais aqueles que têm o controlo das tecnologias pareciam não saber o que estavam a fazer,
optando, pelo contrário, por esconder a verdade. Esta percepção foi ainda mais impulsionada por uma
corrente contínua de «pseudo-acontecimentos» (Boorstin 1964) encenados pelo Creenpeace e outros
formuladores de exigências ambientais, representando os caçadores de baleias, operadores nucleares,
companhias florestais e outros, como personificações do mal. O resultado final foi o enfraquecimento da
confiança na ciência e indústria, da mesma norma como o caso Watergate, nos Estados Unidos, destruiu a fé
das pessoas na conduta dos políticos e do governo. Isto não significa que o crescimento econômico. O
emprego total e o progresso tecnológico tenham enfraquecido uniformemente como aspiração, mas estavam
agora cobertos por um sentimento pendente de que aqueles que estavam no poder nem sempre eram leais
para com os seus concidadãos. Lash e Wynne (1992:7) referem-se à emergência de uma «reflexão privada»
em que as pessoas começaram a exprimir esta desconfiança subjacente nos limites dos seus próprios mundos
semi-privados e no seu próprio vernáculo.
Consequentemente, o que os pós-modernistas chamam «grandes narrativas» ou «metanarrativas»
(Lyotard 1984) do passado começaram a tornar-se cada vez menos legitimadas. Apesar de ter sido necessária
a participação de muitas pessoas (por força das dependências do emprego), na simulação de confiança em
organizações ou complexos institucionais, esta confiança e credibilidade foi, de facto, apenas superficial,
ocultando um nível mais profundo de ambivalência que pode ser reconhecido como uma «condição essencial
do pós-modernismo» (Wynne 1992: 296). Se, como Lash e Urry (1994: 257) observaram, a pós-
modernidade «proclama intrinsecamente fim da certeza»; então desconstrução e reconstruçao dos riscos
ambientais e do conhecimento destinam-se a tornar-se característicos da sociedade de amanhã
Um outro eco do pós-modernismo é sugerido por Harries Jones (1993: 5) o qual, inspirado pelo êxito
do Greenpeace, realça que as

233

organizações de movimentos ambientais têm, cada vez mais, estruturado os seus «interesses de
conhecimento» em primeiro lugar, através das imagens dos meios de comunicação social. Harries Ienes
chama-lhe «práxis icónica», e observa que as imagens têm-se tornado artificialmente construídas.
Argumenta particularmente que os «ecodramas», exibidos pelo Greenpeace passaram de reais para
simulações, por forma a conservar recursos organizacionais e'para proteger a segurança dos membros
ativistas. Assim, e segundo Baudrillard (1983: 2), diz-se que a defesa ambientaI entrou em regiões do
«hiper-real» onde nada é o que parece e os pseudo-acontecimentos, como iniciativa da Campanha para a
Alimentação Pura «Adopte um McDonald's» (ver capítulo 9) reinam como superiores. Valerá a pena
observar que a apresentação de pseudo-acontecimentos e a utilização de táticas simuladoras não são
inteiramente únicas para as organizações de movimentos ambientais da era actual. De facto, nos anos 1920,
uma intensa controvérsia provocou furor durante algum tempo no movimento de conservação americano, em
relação às táticas de «falsificadores da natureza» - autores que escreveram sobre a natureza, como Ernest
Thompson Seton e Charles G. D. Roberts que atribuíram característicàs da personalidade e capacidades
humanas aos animais selvagens (Lutts 1990; Schmitt 1990). Contudo, a mais sofisticada e penetrante
manipulação que pode hoje ser criada através do uso de tecnologias digitais computadorizadas, leva a uma
disseminação de uma forma de «escapismo digital» caracterizados pela emergência de uma «consciência
virtual»; se nos conseguirmos projetar a nós próprios num mundo perfeito apenas com algumas batidas num
teclado, por que razão teremos de nos preocupar com o estado do ambiente que deixámos no mundo real
(Cornier 1994)?
Outro comentador que faz a ligação do pós-modernismo à construção dos problemas ambientais
através do processo de construção de ícones é Andrew Szasz (1994), Szasz começa a sua discussão com
praticamente a mesma observação que Harries Jones; de que os defensores ambientais se tornaram mestres
na bela arte da formação de ícones e têm-na utilizado para criar histórias de questões ambientais que
representam «figuras repetitivas, altamente estereotipadas e ameaçadoras», Os consumidores de notícias
formam as suas atitudes em relação aos resíduos tóxicos, energia nuclear, o efeito de estufa e outros tópicos
ambientais, quase totalmente com base nestas imagens superficiais, ao invés de numa avaliação cognitiva
mais sustentável de informação não-visual. Embora se pudesse pensar que a atenção episódica típica de uma
sociedade pós-modernista conduziria automaticamente

234

a um rápido declínio do interesse quando as notícias passavam para outras histórias, isto não é
necessariamente assim. Sazasz propõe contrariamente um modelo em que a questão da criação pós-
modernista é transformada em formas mais tradicionais de ação social, nomeadamente a formação de grupos
de cidadãos. Isto não terá muitas probabilidades de acontecer quando as imagens dos meios de comunicação
social se ligam à experiência pessoal, «tornando o ícone a base perceptiva para uma política mais tradicional
do movimento social» (19?4: 83). Isto, argumenta Szasz, foi o que aconteceu no início dos anos 1980, no
caso dos resíduos perigosos, quando um grande grupo de imagens mediáticas de televisão sobre os resíduos
tóxicos a derramar de barris de 200 litros, as equipas de limpeza encerradas em equipamento de protecção e
casas feitas de pedaços de madeira encaixados, com sentimentos da vida real de medo e raiva nos domicílios
atingidos pelas instalações tóxicas.
Apesar destas correntes de pós-modernismo, a maior parte dos investigadores ambientais que
refletiram sobre o assunto evitaram adaptar uma perspectiva pós-modernista. Tal como Wynne (1992: 296)
explica, a teoria pós-modernista nas suas formas mais fortes (e.g. Lyotard) projeta uma imagem de uma nova
sociedade incoerente, uma babel de múltiplas identidades sociais. Eles escolheram. pelo contrário, seguir a
liderança de Giddens (1990, 191) e optar por uma forma de modernismo revista e atualizada.
Talvez o exemplo mais conhecido deste meio termo seja a teoria da «sociedade de risco» de Ulrich
Beck. A tese de Beck começa com a premissa de que as nações ocidentais passaram de uma sociedade
«industrial» ou de «classes», em que a questão central é a forma como a riqueza socialmente produzida pode
ser distribuída de forma igualitária, enquanto simultaneamente reduz os efeitos do lado negativo (pobreza,
fome), a um paradigma de uma «sociedade de risco» em que os riscos e os perigos produzidos como parte da
modernização, nomeadamente a poluição, devem ser evitados, minimizados. dramatizados ou canalizados. A
antiga «sociedade de distribuição de riqueza» e a emergente «sociedade de distribuição de risco» contêm
desigualdades, que abrangem áreas como os centros industriais do Terceiro Mundo.
Uma característica importante da sociedade de risco é a forma como o monopólio passado das
ciências sobre a racionalidade foi quebrado. Paradoxalmente, a ciência torna-se «cada vez mais necessária,
mas, ao mesmo tempo, cada vez menos suficiente para a definição socialmente intrínseca da verdade» (Beck
1992: 156). Beck contrasta

235

com a rigidez da «racionalida de científica» que está enraizada numa crítica do progresso. Sob a pressão de
um público cada vez mais impaciente, novas formas de ciência «alternativa» e «defendida» tomam corpo e
forçam uma crítica interna. Esta «cientificação do protesto contra a ciência» produz uma nova variedade de
peritos científicos orientados pelo público, que se tornam pioneiros em novos campos de atividade e
aplicação (por exemplo na biologia da conservação). De forma semelhante; é dito que os monopólios da
ação política estão a desmoronar-se, abrindo assim a formulação de decisões políticas ao processo de ação
coletiva. Um exemplo disto é a entrada dos «Verdes» no parlamento alemão nos anos 1980.
Finalmente, a dinâmica da modernização reflexiva conduz a uma maior individualização. Libertada
das limitações das sociedades tradicionais pré-modernas. Os novos cidadãos urbanos da revolução industrial
deveriam supostamente alcançar novos níveis de criatividade e auto-atualização. Contudo, isto não
aconteceu, em larga medida devido a uma nova limitação - a «cultura do cientismo» - invadiu todos os
aspectos da nossa vida, desde a construção do risco, ao comportamento sexual. Agora, há uma oportunidade
de o indivíduo se libertar mais uma vez, e escolher as suas próprias formas de vida, subculturas, laços sociais
e identidades (p. 173). Contudo, ironicamente, à medida que a existência individualizada privada se torna
finalmente possível, somos confrontados com conflitos de riscos que, pela sua origem e estrutura, resistem a
qualquer tratamento individual. Beck não utiliza a frase, mas é explícito em relação aos «problemas
ambientais globais», tais como o efeito de estufa e a diminuição da camada de ozono que são grandes
exemplos de tudo isto. Assim, a «cientificação reflexiva» em que as tomadas de decisão científicas,
especialmente as relacionadas com o risco, são abertas à racionalidade social como algo vital para a
reclamação da autonomia individual.
Uma segunda teoria ambiental da última fase da modernidade é a teoria da «modernização
ecológica», desenvolvida pelos sociólogos holandeses Gert Spaargaren e Arthur MoI. Saargaren e MoI
reconhecem diversas contribuições da escola da «modernização reflexiva» (Beck, Giddens, Wynne): o seu
reconhecimento de que os riscos globais contemporâneos perderam os seus limites no tempo e no espaço, a
sua ênfase nas mudanças das relações dos atores leigos e sistemas de peritos, e sua percepção de que os
cientistas na era da última modernidade já não conseguem assegurar quaisquer certezas relativamente aos
riscos ambientais, mas deverão antes partilhar as suas dúvidas com o público (Spaargaren e Mol. 1992b.)
Criticam simultaneamente

236

a abordagem da modernização reflexiva com base no facto de esta ser excessivamente pessimista. Alega-se
que Beck cai no erro de escolher. exclusivamente os riscos de «grande consequência» (por exemplo, a
energia nuclear) e tornar estes abrangentes a uma série de questõés ambientais. Pelo contrário, a sua própria
conceitualização da modernização ecológica como teoria da mudança social é de optimismo qualificado.
Spaargaren e Mol entendem por modernização ecológica uma mudança ecológica do processo de
industrialização num sentido que tem em consideração a manutenção da base de subsistência existente
(1992a: 334). Esboçado com o espírito do Relatório Brundtland, a modernização ecológica, tal como o
desenvolvimento sustentável, «indica a possibilidade de ultrapassagem da crise ambiental sem deixar marcas
de modernização». O seu modelo baseia-se no trabalho do escritor alemão Huber (1982, 1985), que analisa a
modernização ecológica como uma fase histórica da sociedade moderna. No esquema de Huber, a sociedade
industrial desenvolve-se em três fases:

1) O surgimento da industrialização;
2) A construção da sociedade industrial; e
3) A mudança do sistema industrial através do processo de «superindustrialização».

O que torna esta última fase possível é uma nova tecnologia: a invenção e difusão da tecnologia do
microchip. A modernização ecológica rejeita a ideologia inspirada de Schumacher (1974) «small is
beautiful», a favor de uma reestruturação, em larga escala, dos ciclos de produção-consumo acompanhados
da utilização de tecnologias novas, sofisticadas e limpas (Spaargaren e MoI 1992a: 340). Ao contrário do
desenvolvimento sustentável, não há tentativas de abordar os problemas dos países menos desenvolvidos do
Terceiro Mundo. A teoria incide antes sobre as economias das nações da Europa ocidental que será
«ecologizada» através da substituição da microelectrónica, temologia dos genes e outros processos de
produção «limpos» pelas tecnologías mais velhas do «fim da linha» associadas às indústrias químicas e de
manufatura. Contrastando com a perspectiva da «roda de produção», as relações capitalistas da produção,
operando como uma roda no processo de crescimento econômico em curso, são tratados como amplamente
irrelevantes (Spaargaren e MoI 1992a: 340-1).
Segundo Udo Simonis (1989), um analista de política ambiental alemão, a modernização ecológica da
sociedade industrial contém três elementos estratégicos: uma conversão de longo alcance da economia

237

para harmonizá-Ia com os princípios ecológicos, uma reorientação da política ambiental segundo o
«princípio da prevenção» (procurando um melhor equilíbrio entre deter a poluição antes que aconteça e
tenha de se limpar mais tarde) e uma reorientação ecológica da política ambientaI, especialmente através da
substituição das probabilidades estatísticas para a causalidade da «prova-sem-quaisquer-dúvidas» nas ações
legais contra os poluidores. Infelizmente, é dito pouco sobre as barreiras sociais e políticas que se poderão
enfrentar ao tentar implementar estas estratégias, especialmente noutros países para além da Alemanha e
Holanda, onde o meio ambiente é já uma prioridade.
Embora estas tentativas teóricas de voltar a desenhar as fronteiras da modernidade recente sejam
louváveis por tentarem corajosamente relacionar a «crise ambiental» com o carácter da sociedade moderna,
ficam no entanto aquém em diversas descrições.
Tal como Lidskog (1993) salientou na sua crítica da Risk Society, Beck contradiz-se quando
argumenta que o planeta está cada vez mais em perigo devido a uma escalada de riscos globais e
objetivamente certificáveis, insistindo, simultaneamente, que os riscos são totalmente formulados
socialmente e não existem, portanto, para além da nossa percepção deles. Isto reflete uma tensão de longa
data na sociologia ambiental como um todo, entre o papel do analista sociológico e o do ativista ambiental.
A dicotomia HEP/NEP de Catton e Dunlap é um epítome disto, muito embora ocorra igualmente em grande
parte da literatura, emergindo, mais recentemente, na abordagem «realista» de Benton, Dickens, Martell e
outros pensadores sociológicos britânicos que procuram colocar a natureza novamente na relação natureza-
sociedade.
A teoria da modernização ecológica, pelo contrário, anda a passos lentos devido a um sentido de
imperturbável optimismo tecnológico. Tudo o que é necessário, sugerem, é andar para a frente com a nova e
superindustrializada era do futuro, deixando para trás a sociedade industrial poluidora. Contudo, a revolução
do chip de silicone, base desta superindustrialização, não é, de forma alguma, neutra em termos ambientais
como a teoria da modernização econômica sugere (ver Mahon 1985). Além disso, vale a pena lembrar que a
energia nuclear foi igualmente elogiada como tecnologia «limpa» até que as suas características mais
indesejáveis se tornaram conhecidas.
Como explicação sociológica, a teoria da modernização ecológica é tão normativa quanto analítica.
Spaargarcn e Mal dizem de fato pouco sobre as relações de poder que caracterizam os processos
238

ambientais, presumindo, de alguma forma, que a sensatez triunfará automaticamente. Contudo, e tal como
Gould et al. (1993: 231) argumentaram, a sustentabilidade, o conceito líder que está por detrás da
modernização ecológica, é tanto uma dimensão econônico-político, como ecológica: o que pode ser
sustentado é apenas o que as forças políticas e sociais, num determinado alinhamento histórico, definem
como aceitável. O reconhecimento disto é muito mais evidente no conceito da sociedade de distribuição - do
risco de Beck, do que na modernização ecológica que Spaargaren e MoI vêem como algo que se aproxima
rapidamente. Para ser justo, dever-se-à salientar que Spaargaren e MoI não estão totalmente esquecidos desta
fraqueza. Na verdade, eles qualificam a sua teoria da modernização ecológica através da observação de que é
«limitada à medida que lida apenas com a dimensão industrial da modernidade, rejeitando as dimensões do
capitalismo e vigilância, e devido ao fato de esta limitar o conceito de natureza à base que a sustenta»
(Spaargaren e Mal 1992a: 341).
A abordagem da formulação social que adaptei neste livro segue caracterização do ambiente como
«local de definições e interesses sociais e culturais em competição que se interceptam» de Ian Welsh (1992).
São contestadas a natureza e a gravidade das ameaças ambientais, a sua dinâmica subjacente, a prioridade de
uma questão contra a outra, e os meios ideais de mitigar ou melhorar as condições que vieram a ser definidas
como problemáticas. As partes envolvidas nas contestações incluem a indústria privada, reguladores,
cientistas, grupos ambientais, organizações comunitárias, grupos de comércio e profissionais e, cada vez
mais, as «vítimas» - a sociedade. O que em última análise é aqui mais significativo é o processo através do
qual os formuladores de exigências ambientaís influenciam aqueles que têm o poder para que estes
reconheçam as definições dos problemas ambientais, para os implementarem e aceitarem a responsabilidade
pela sua solução.
Esta conceitualização do ambiente e da sociedade encaixa-se facilmente na imagem pós-modernista
do mundo, como «incerto, perigoso e errático» (Bauman 1994: 143). Contrastando com outras abordagens
científicas sociais do ambientalismo e do ambiente, não contém, e, nem implícita nem explicitamente,
qualquer tipo de componente evolucionária. Por exemplo, aqueles comentadores que utilizam como ponto de
partida o contraste entre os paradigmas dominantes e os novos paradigmas ecológicos, sugerem que poderá
levar muito tempo, mas o último triunfará justamente. O livro de Lester Milbrath (1989) sobre aprendizagem
social e ambiente é disto um exemplo cimeiro. De forma semelhante, embora a base deste optimismo seja
bastante

239

diferente, a teoria da modernização ecológica tem igualmente um sabor evolucionário na sua previsão de
uma «passagem ecológica» para uma nova sociedade superindustrial e sustentável. Uma perspectiva de
formulação social não impede a chegada de uma sociedade ecologicamente mais complacente e afável,
talvez mesmo através do processo de modernização reflexiva de Beck, mas adverte que as questões e os
problemas ambientais aumentam e decaem, tal como as nossas definições e compreensão da natureza, da
ecologia, do risco e outros elementos do nexo ambiente-sociedade.
Há uma última forma em que a formulação ambiental e a forma pós-moderna se entrecruzam que não
foi explicitamente reconhecida pelos comentadores sociológicos do passado.
Ao discutir a natureza das áreas urbanas pós-modernas, Sharon Zukin (1988: 229-30) identifica um
processo de «apropriação cultural», através do qual os restos de novos «nobres» da classe-média dos bairros
de transição defendem uma reivindicação de oposição a este espaço, uma reivindicação que não é baseada na
posse ou titularidade, mas na apreciação do espaço (ou a sua forma quando construido) como produto de um
consumo cultural. Zukin utiliza o exemplo de Clerkenwell, perto do mercado de Smithfield, em Londres, o
qual passou de uma zona residencial e comercial pouco conhecida da classe operária, com locais de interesse
histórico dispersas, numa área com cada vez maiores passeios turísticos a pé, escritórios de arquitetos e
designers e outros elementos de uma nova, reorganizada e pós-moderna paisagem cultural.
Parece-me que este processo de apropriação cultural foi igualmente característico dos formuladores
de exigências ambientais durante muito tempo. Como parte deste movimento de regresso à natureza da
viragem do século na América, os habitantes das cidades redefiniram a natureza básica do campo em termos
estéticos e não econômicos, indo até ao ponto de denegrir os agricultores locais como simplórios que são
incapazes de captar o verdadeiro significado da natureza. De forma semelhante, hoje em dia os ativistas
ambientais registam as reivindicações morais de uma variedade de espaços naturais em: lotes vazios nos
bairros urbanos, até às florestas tropicais nas nações-tropicais. Tal como os «nobres» fascinados com os
locais históricos, estes formuladores de exigências justificam as suas ações com base numa análise
intelectual superior; por exemplo, a que deriva do conhecimento dos ecossistemas. Tais exigências
encontram frequentemente opositores, não só em poluidores empresariais e burocratas intransigentes, mas
nos populares locais que estruturam os seus es paços

240

em termos contraditórios. Assim, os habitantes das cidades com preocupações ecológicas que permitem que
à frente das suas casas se torne um jardim selvagem desfigurado, acabam por chocar com os vizinhos que
preferem uma relva limpa e temem uma desvalorização imobiliária. Burgess e Harrinson (1993) descrevem a
forma como os residentes de Rainham, Essex, não conseguiam relacionar as exigências dos ambientalistas
com um pântano local que foi posto em perigo devido à proposta de ali instalar um parque de diversões,
devido ao fato de eles sempre terem considerado o pântano como algo inútil. Numa escala mais importante,
os povos indígenas nas florestas tropicais do Sul não partilham, muitas vezes, as percepções dos
ambientalistas profissionais de que grandes partes da floresta deverão ser reclamadas e protegidas, tornando-
as reservas de vida selvagem. Em tais casos, a apropriação dos ambientes naturais implica o choque entre as
construções culturais oponentes, uma enraizada numa sensibilidade vernacular, outra numa nova
sensibilidade ecológica.

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