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Departamento de Matemática
Secção de Álgebra e Análise
Prof. Gabriel Pires
Teorema da Divergência
***
Nota 1.1 Sejam A = (a1 , a2 , a3 ) e B = (b1 , b2 , b3 ) dois vectores em R3 e consideremos o produto
externo de A por B definido por
A × B = (a2 b3 − a3 b2 , a3 b1 − a1 b3 , a1 b2 − a2 b1 )
e1 × e2 = e3 ; e2 × e3 = e1 ; e3 × e1 = e2
• B × A = −A × B
• A × B é ortogonal a A e a B.
√
• ||A × B|| = det ∆t ∆ em que ∆ é a matriz cujas colunas são os vectores A e B.
e3
A×B
0
e2 y
e1 B
x
1
Portanto, se designarmos por D1 g(t) e D2 g(t) , respectivamente, a primeira e a segunda
colunas da matriz Dg(t) , então o produto externo
D1 g(t) × D2 g(t)
é um vector normal a M no ponto x = g(t) porque as colunas da matriz Dg(t) geram o espaço
tangente a M no ponto x = g(t).
Assim, temos
D1 g(t) × D2 g(t)
ν(g(t)) =
||D1 g(t) × D2 g(t)||
p
• det Dg(t)t Dg(t) = ||D1 g(t) × D2 g(t)||
e, portanto, p
ν(g(t)) det Dg(t)t Dg(t) = D1 g(t) × D2 g(t)
ou seja, o fluxo de F é dado por
Z Z
F ·ν = F (g(t)) · D1 g(t) × D2 g(t)dt
M T
***
Exemplo 1.1 Consideremos o campo vectorial F : R3 → R3 definido por
F (x, y, z) = (x, y, z)
S 2 = {(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y 2 + z 2 = 1}
cuja normal ν no ponto (0, 1, 0) tem segunda componente positiva, tal como se representa na
figura 2.
ν(x, y, z)
S2
(x, y, z)
ν(0, 1, 0)
(0, 1, 0)
y
x
2
e g : T → R3 a parametrização de S 2 \ N dada por
e, portanto,
***
Podemos calcular o fluxo de F de outra forma. Sendo S 2 dada pela equação
G(x, y, z) = x2 + y 2 + z 2 − 1 = 0
***
Exemplo 1.2 Seja F (x, y, z) = (x, y, z) e consideremos a superfı́cie cilı́ndrica M definida pela
equação
x2 + y 2 = 1
e tal que 0 < z < 2. Seja ν a normal unitária a M que no ponto (0, 1, 1) tem segunda componente
positiva tal como se representa na figura 3.
Da equação x2 + y 2 = 1, obtemos a normal
(2x, 2y, 0)
ν(x, y, z) = p = (x, y, 0)
2 x2 + y 2
3
z
2 M
(0, 1, 1)
1
x y
e, portanto,
F (x, y, z) · ν(x, y, z) = x2 + y 2 = 1
Assim, o fluxo de F através de M segundo a normal ν é dado por
Z
F · ν = vol2 (M ) = 4π
M
***
Exemplo 1.3 Consideremos o campo vectorial
F (x, y, z) = (−y, x, 0)
e o cone
M = {(x, y, z) ∈ R3 : z 2 = x2 + y 2 ; 0 < z < 1}
Seja ν a normal unitária que em cada ponto de M tem terceira componente negativa tal como
se representa na figura 4.
Em coordenadas cilı́ndricas (ρ, θ, z) o cone M é dado pela equação z = ρ. Então, consideremos
a função g : T → R3 definida por
em que
T =]0, 1[×]0, 2π[
Facilmente se verifica que g é uma parametrização de M \ N em que
N = {(x, y, z) ∈ M : y = 0 ; x ≥ 0}
e, portanto,
D2 g(ρ, θ) × D1 g(ρ, θ) = (ρ cos θ, ρ sen θ, −ρ)
4
z
M
1
(x, y, z)
x y
Figura 4: O cone M
***
Note-se que, da equação G(x, y, z) = x2 + y 2 − z 2 = 0 que define M , podemos calcular a normal
unitária
DG(x, y, z) (2x, 2y, −2z)
ν(x, y, z) = = p
||DG(x, y, z) 2 x2 + y 2 + z 2
Então
(2x, 2y, −2z)
F (x, y, z) · ν(x, y, z) = (−y, x, 0) · p =0
2 x2 + y 2 + z 2
e, portanto, o fluxo de F através de M segundo a normal ν é nulo.
***
Exemplo 1.4 Seja F (x, y, z) = (−y, x, 1) e consideremos a superfı́cie M definida por
M = {(x, y, z) ∈ R3 : z = x2 + y 2 , z < 1
Seja ν a normal a M que no ponto (0, 0, 0) tem terceira componente negativa tal como se
representa na figura 5.
Em coordenadas cilı́ndricas (ρ, θ, z), a superfı́cie M é dada pela equação z = ρ2 . Então, seja
g :]0, 1[×]0, 2π[→ R3 dada por
g(ρ, θ) = (ρ cos θ, ρ sen θ, ρ2 )
Facilmente se verifica que g é uma parametrização de M \ N em que
N = {(x, y, z) : y = 0; x ≥ 0}
5
z
M
1
(x, y, z)
x ν(0, 0, 0) y
Figura 5: Parabolóide M
Assim,
D2 g(ρ, θ) × D1 g(ρ, θ) = (2ρ2 cos θ, 2ρ2 sen θ, −ρ)
Portanto, o fluxo de F através de M segundo a normal ν é dado por
Z Z 2π Z 1
F ·ν = F (g(ρ, θ)) · D2 g(ρ, θ) × D1 g(ρ, θ) dρ dθ
M 0 0
Z 2π Z 1
2 2
= (−ρ sen θ, ρ cos θ, 1) · (2ρ cos θ, 2ρ sen θ, −ρ) dρ dθ
0 0
Z 2π Z 1
= −ρ dρ dθ
0 0
= −π
***
Exemplo 1.5 Seja S a superfı́cie esférica centrada na origem de R3 e com raio R. Consideremos
o campo vectorial F : R3 \ {(0, 0, 0)} → R3 definido por
1
F (x, y, z) = (x, y, z)
(x2 + y 2 + z 2 )3/2
Em coordenadas esféricas S é descrita pela equação r = R e, portanto, consideremos a para-
metrização g :]0, 2π[×]0, π[→ R3 definida por
Então
6
e, portanto, o fluxo de F através de S segundo a normal que em cada ponto se dirige para a origem
é dado por
Z Z 2π Z π
F ·ν = F (g(θ, φ)) · D1 g(θ, φ) × D2 g(θ, φ) dφ dθ
S 0 0
Z 2π Z π
= − sen φ dφ dθ
0 0
= −4π
2 Teorema da Divergência
Seja D ⊂ R3 um conjunto aberto e limitado e seja (x, y, z) um ponto sobre a fronteira ∂D.
Suponhamos que existe uma vizinhança V de (x, y, z) tal que ∂D ∩ V é uma superfı́cie.
z
D
n(x, y, z)
−n(x, y, z) (x, y, z)
0
y
Seja n(x, y, z) a normal a ∂D ∩ V no ponto (x, y, z) e suponhamos que existe ǫ > 0 tal que
(x, y, z) + t n(x, y, z) ∈ R3 \ D ; 0 < t < ǫ
(x, y, z) − t n(x, y, z) ∈ D ; 0 < t < ǫ
Então, diz-se que a normal n(x, y, z) é exterior a D. Em cada ponto (x, y, z) ∈ ∂D a normal
n(x, y, z) drige-se do interior para o exterior de D, tal como se representa na figura 6.
Nota 2.1 Suponhamos que ∂D ∩ V é um conjunto de nı́vel de uma função H : V → R tal que
D∩V = {(x, y, z) : H(x, y, z) < 0}
3
(R \ D) ∩ V = {(x, y, z) : H(x, y, z) > 0}
Então, a normal n(x, y, z) = DH(x, y, z) é exterior a D. De facto, se considerarmos a função
ψ(t) = H((x, y, z) + t n(x, y, z)), então
ψ(0) = (x, y, z) ; ψ ′ (0) = DH(x, y, z) · DH(x, y, z) = ||DH(x, y, z)||2 > 0
donde se conclui que existe ǫ > 0 tal que
H((x, y, z) + t n(x, y, z)) > 0 ; 0 < t < ǫ
H((x, y, z) − t n(x, y, z)) < 0 ; 0 < t < ǫ
7
***
Seja S ⊂ R3 um aberto. Dado um campo vectorial F : S → R3 de classe C 1 , a Divergência de
F é o campo escalar divF : S → R, definido por
∂F1 ∂F2 ∂F3
divF = + +
∂x ∂y ∂z
Seja D ⊂ R3 um aberto e limitado. Diz-se que D é um domı́nio elementar (ver [3, 1]) se for
definido, simultaneamente, das três formas seguintes:
a) D = {(x, y, z) ∈ R3 : φ1 (x, y) < z < φ2 (x, y) ; (x, y) ∈ T1 } em que φ1 , φ2 : T1 → R são fun-
ções de classe C 1 e definidas num aberto limitado T1 ⊂ R2 cuja fronteira é uma linha regular
Γ1 . Portanto, na direcção z , o conjunto D encontra-se entre dois gráficos de classe C 1
(variedades-2).
b) D = {(x, y, z) ∈ R3 : ψ1 (y, z) < x < ψ2 (y, z) ; (y, z) ∈ T2 } em que ψ1 , ψ2 : T2 → R são fun-
ções de classe C 1 e definidas num aberto limitado T2 ⊂ R2 cuja fronteira é uma linha regular
Γ2 . Portanto, na direcção x , o conjunto D encontra-se entre dois gráficos de classe C 1
(variedades-2).
c) D = {(x, y, z) ∈ R3 : η1 (x, z) < y < η2 (x, z) ; (x, z) ∈ T3 } em que η1 , η2 : T3 → R são funções
de classe C 1 e definidas num aberto limitado T3 ⊂ R2 cuja fronteira é uma linha regular
Γ3 . Portanto, na direcção y , o conjunto D encontra-se entre dois gráficos de classe C 1
(variedades-2).
z = φ2 (x, y)
M2
M3
T1
M1 y
x Γ1
z = φ1 (x, y) = 0
8
em que Γ1 designa a linha regular que limita T1 .
Na figura 7 considera-se o caso em que φ1 (x, y) = 0.
Note-se que M3 é uma superfı́cie vertical e, portanto, em cada um dos seus pontos, a normal ν
tem terceira componente nula. Assim, o fluxo de F = (0, 0, F3 ) através de M3 segundo a normal
ν é nulo.
Seja g1 : T1 → R3 a parametrização de M1 definida por
g1 (x, y) = (x, y, φ1 (x, y))
Então,
∂φ1
D1 g1 (x, y) = (1, 0, )
∂x
∂φ1
D2 g1 (x, y) = (0, 1, )
∂y
e o vector
∂φ1 ∂φ1
D2 g1 (x, y) × D1 g1 (x, y) = ( , , −1)
∂x ∂y
é a normal exterior a D no ponto g1 (x, y) ∈ M1 .
O fluxo de F através de M1 segundo a normal unitária exterior é dado por
Z Z
F ·ν = F (g1 (x, y)) · D2 g1 (x, y) × D1 g1 (x, y)dxdy
M1 T1
Z
= − F3 (x, y, φ1 (x, y))dxdy
T1
Portanto, o fluxo de F através da fronteira de D segundo a normal exterior é a soma dos fluxos
sobre M1 , M2 , M3 :
Z Z Z
F ·ν = F3 (x, y, φ2 (x, y))dxdy − F3 (x, y, φ1 (x, y))dxdy
∂D T1 T1
9
Teorema 2.1 Sejam
• D ⊂ R3 um domı́nio regular,
• F : D → R3 um campo vectorial de classe C 1 .
Então, Z Z
divF = F ·ν
D ∂D
em que ν é a normal unitária exterior à fronteira de D.
3 Exemplos
Exemplo 3.1 Consideremos o campo vectorial dado por F (x, y, z) = (x, y, z) e o domı́nio definido
por
D = {(x, y, z) ∈ R3 : x2 + y 2 + z 2 < 1}
Então divF = 3 e, portanto,
Z
divF = 3 vol3 (D) = 4π
D
***
Exemplo 3.2 Seja M a superfı́cie definida por
M = {(x, y, z) ∈ R3 : 0 < z = 1 − x2 − y 2 }
Para calcular o fluxo de F através de M segundo a normal que no ponto (0, 0, 1) tem terceira
componente positiva, consideremos o teorema da divergência aplicado ao domı́nio
Facilmente se constata que D é um domı́nio regular cuja fronteira é a união de duas superfı́cies,
M e B, em que
B = {(x, y, z) : z = 0 ; x2 + y 2 < 1}
10
z
νM
1
x y
B
νB = (0, 0, −1)
Figura 8:
Portanto, ! !
2π 1 1−ρ2
π
Z Z Z Z
F · νM = vol(D) = ρ dz dρ dθ =
M 0 0 0 2
***
Exemplo 3.3 Seja F (x, y, z) = (xy 2 , x2 y, y) e seja M a superfı́cie cilı́ndrica dada pela equação
x2 + y 2 = 1 e limitada pelos planos z = 1 e z = −1.
Vamos usar o teorema da divergência para calcular o fluxo de F através de M segundo a
normal que no ponto (0, 1, 0) tem segunda componente positiva.
Seja D o domı́nio elementar limitado por M e pelos planos z = 1 e z = −1
D = {(x, y, z) : x2 + y 2 < 1 ; −1 < z < 1}
O integral da divergência de F em D pode ser calculado usando coordenadas cilı́ndricas
Z Z Z 2π Z 1 Z 1
divF = (y 2 + x2 )dxdydz = ρ3 dρ dz dθ = π
D D 0 −1 0
11
z
νC
1
C
x y
νM
νB
Figura 9:
e, portanto,
D2 g(ρ, θ) × D1 g(ρ, θ) = (0, 0, −ρ)
Para C consideremos a parametrização h :]0, 2π[×]0, 1[→ R3 dada por
e, portanto,
D1 h(ρ, θ) × D2 h(ρ, θ) = (0, 0, ρ)
Assim, temos
Z Z 2π Z 1
2
F ·ν = − ρ sen θ dρ dθ = 0
B 0 0
Z Z 2π Z 1
F ·ν = ρ2 sen θ dρ dθ = 0
C 0 0
***
Exemplo 3.4 Seja D ⊂ R3 um domı́nio regular e consideremos o campo vectorial F : R3 \
{(0, 0, 0)} → R3 definido por
1
F (x, y, z) = (x, y, z)
(x2 + y 2 + z 2 )3/2
Suponhamos que o ponto de coordenadas (0, 0, 0) não se encontra sobre a fronteira de D.
Então, o fluxo do campo vectorial F através da fronteira do conjunto D segundo a normal
exterior é dado por Z
4π se (0, 0, 0) ∈ D
F ·ν =
∂D 0 se (0, 0, 0) ∈
/D
12
D
νD
B νB
S
0
Figura 10:
divF = 0
e, portanto, Z
F ·ν =0
∂D
Para o caso em que (0, 0, 0) ∈ D, o campo F não está definido em D e, portanto, não podemos
aplicar o teorema da divergência directamente.
Sendo D um conjunto aberto, existe uma bola B de raio ǫ > 0 e centrada na origem e contida
em D, tal como se representa na figura 10. Seja S = D \ B. Então, F é de classe C 1 em S e
podemos aplicar o teorema da divergência
Z Z Z Z
0= F · νD + F · νB
∂D ∂B
Referências
[1] F. R. Dias Agudo. Cálculo Integral em Rn . Escolar Editora, 1973.
[2] Luı́s T. Magalhães. Integrais em Variedades e Aplicações. Texto Editora, 1993.
[3] J. E. Marsden and A. J. Tromba. Vector Calculus. W. H. Freeman and Company, 1998.
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