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I - Introdução
O Brasil, como república federativa que é, constitui-se de três níveis governamentais, a saber:
a União ou Governo Federal, vinte e seis Estados e um Distrito Federal e cerca de 5.500
Municípios. O pacto federativo brasileiro encontra-se estabelecido na atual Constituição do
País, sendo considerado uma de suas cláusulas pétreas. Isto é, a forma federativa de Estado
não pode ser abolida mediante Emenda Constitucional, por ser considerada matéria de alta
relevância para a estabilidade da nação. A própria Constituição define a independência e
autonomia política, administrativa e financeira dos três níveis de governo.
No Brasil, cada nível de governo tem o direito de instituir os impostos que lhe são atribuídos e
que pertençam à sua competência privativa. A Constituição define claramente a atribuição das
competências tributárias a cada esfera de governo, não havendo possibilidade de sobreposição
de competências em relação aos impostos e à maioria das contribuições. No entanto, é comum
às três esferas de poder a competência para instituir taxas (pelo exercício do poder de polícia e
pela utilização de serviços públicos), contribuição de melhoria e contribuição para custeio da
previdência e assistência social de seus servidores.
Além dos impostos acima relacionados, a União tem competência exclusiva para instituir
contribuições sociais, de intervenção no domínio econômico e de interesse de categorias
profissionais ou econômicas. Os demais níveis de governos somente podem instituir uma única
contribuição, a relativa ao custeio da previdência social de seus funcionários.
As contribuições sociais podem ter três bases de cálculo, a saber: folha de pagamentos, lucro
ou faturamento. No Brasil, todas essas bases têm sido utilizadas de modo a financiar a
seguridade social. A arrecadação incidente sobre folha de pagamentos não tem sido suficiente
para cobrir as despesas da área da previdência social. Aliás, o Brasil, como tantos outros
países no mundo, também tem sofrido os efeitos do sistema de repartição simples da
previdência pública, levando a que o sistema opere praticamente sem nenhuma poupança.
Nesse sentido, a arrecadação das contribuições incidentes sobre lucro e faturamento foi
privilegiada nos últimos anos, passando de 2,71% para 4,05% do PIB entre 1991 e 1996. É
importante notar que as contribuições sociais são receitas vinculadas, isto é, toda a sua
arrecadação só pode ser direcionada às áreas de saúde, previdência e assistência social.
Os Estados e o Distrito Federal têm competência para instituir impostos sobre Circulação de
Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de
Comunicações (ICMS); Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) e Transmissão Causa
Mortis de bens imóveis e Doação (ITCD) de qualquer bem ou direito.
Por sua vez, competem aos Municípios os impostos incidentes sobre Propriedade Predial e
Territorial Urbana (IPTU); Serviços de Qualquer Natureza (ISS) e Transmissão Inter Vivos de
Bens Imóveis (ITBI).
A Tabela I sintetiza as competências tributárias por categoria de tributo e por nível de governo.
Tabela I
Competência Tributária
Um dos principais problemas existentes em qualquer federação diz respeito à distribuição das
bases tributárias entre os governos e a posterior repartição da receita tributária (tax assignment
problem). A teoria econômica nos sugere alguns critérios básicos que servem para orientar a
atribuição de receitas entre os diversos níveis governamentais. O objetivo primordial desses
critérios é o de se buscar os maiores níveis possíveis de eqüidade e de eficiência, entendidos,
respectivamente, como a adequação entre receitas e gastos e a minimização do custo de
arrecadação dos tributos.
De uma forma geral, sugere-se que impostos progressivos com finalidade redistributiva sejam
administrados centralizadamente, ou seja, pela União. Também são mais adequados ao
Governo Federal impostos com objetivos de estabilização ou de caráter regulatório da atividade
econômica, além daqueles que incidam sobre bases distribuídas bastante irregularmente pelo
território nacional ou sobre fatores extremamente móveis. Por outro lado, impostos incidentes
sobre fatores imóveis, sobre consumo geral ou sobre bens específicos (tipo excise tax) podem
ser administrados pelos demais níveis de governo (estados e municípios).
A prática brasileira de atribuição de receitas não diverge muito em relação à teoria econômica.
O imposto sobre a renda, as contribuições e os impostos regulatórios (sistema financeiro - IOF
- e comércio exterior - II e IE) estão sob competência federal. Os estados arrecadam o imposto
geral sobre consumo e os municípios arrecadam impostos sobre serviços e sobre parte do
patrimônio - imóveis urbanos.
O Imposto sobre Propriedade Territorial Rural - ITR, incidente sobre um fator de natureza
imóvel, que tradicionalmente tem sido cobrado pelos governos locais, no Brasil é a União que
detém a competência para a sua instituição e cobrança. A razão pela qual esse imposto
encontra-se sob administração central é a de usá-lo como instrumento de incentivo à utilização
produtiva da terra e para fins de reforma agrária. Esse imposto tornou-se de competência
federal a partir da reforma tributária de 65.
Outra característica importante do Brasil que foge à tradição internacional é o fato de existirem
dois impostos sobre produção e circulação, do tipo Imposto sobre Valor Agregado (IVA), cada
um sendo administrado por um nível distinto de governo. O IPI e o ICMS encontram-se sob
competências federal e estadual, respectivamente. Em verdade, as bases desses dois
impostos são muito semelhantes, bem como seus métodos de apuração, o que permitiria uma
consolidação de modo a obter maior racionalidade econômica e menor custo administrativo,
tanto para os fiscos como para o contribuinte. Nesse sentido, é natural a dificuldade política
que surge em relação a qualquer proposta que vise a alterar a atual estrutura tributária da
federação, envolvendo o ICMS. De fato, a arrecadação desse imposto é hoje imprescindível
para o equilíbrio das finanças estaduais.
Enquanto o ICMS incide, em tese, sobre a venda de qualquer produto, o IPI incide sobre a
produção industrial, é unifásico. Na prática, o ICMS incide sobre uma base muito mais ampla
do que o IPI, sendo o imposto de maior importância da federação, em termos de valor de
arrecadação.
Transferências Intergovernamentais
O Brasil, em função de sua grande extensão territorial e diversidade regional, possui sérios
desequilíbrios verticais e horizontais. No entanto, o mecanismo de partilha tributária realiza as
transferências necessárias ao maior equilíbrio de receitas e despesas na federação. Há
basicamente dois tipos de transferências possíveis: as constitucionais (que são
automaticamente realizadas após a arrecadação dos recursos) e as não-constitucionais (que
dependem de convênios ou vontade política entre governos).
A crescente descentralização de receitas ocorrida nas últimas décadas pode ser verificada a
partir da evolução dos percentuais dos fundos de participação. Entre 1969 e 1975, esses
percentuais eram de 5% tanto para o FPE como para o FPM. Esses índices tiveram tendência
ascendente em todo o período subseqüente, atingindo 14% (FPE) e 17% (FPM) antes da
Constituição de 88, que os elevou para 21,5% e 22,5%, respectivamente.
Tabela II
Transferências Constitucionais Diretas
Tabela III
Transferências Constitucionais Indiretas (Fundos)
A análise da composição da carga tributária brasileira pode ser realizada mediante a utilização
da Tabela IV. Em 1996, a União arrecadou 19,66% do PIB ou US$ 148 bilhões, o que
correspondeu a 67% da carga tributária total. Deste volume, apenas cerca de 40% pertenceu
ao orçamento fiscal, sendo que os demais 60% corresponderam ao orçamento da seguridade.
Dentre as receitas da União, destacam-se a Contribuição sobre Folha de Pagamentos e o
Imposto de Renda (incidente sobre pessoas físicas e jurídicas), que representaram 30 % e 22%
da arrecadação federal, respectivamente. Em terceiro lugar encontra-se a Contribuição para o
Financiamento da Seguridade Social (COFINS), representando 12% das receitas da União.
Os Estados são responsáveis pela arrecadação de 28% da carga tributária total, principalmente
em decorrência de possuírem sob sua competência a administração do ICMS, o imposto de
maior arrecadação do País. O ICMS responde por cerca de 92% da arrecadação dos Estados e
26% das receitas totais dos três níveis de governo.
Os Municípios, por sua vez, arrecadam pouco mais de 5% da arrecadação total, embora tenha
havido uma tendência crescente nas suas receitas nos últimos anos. O principal imposto do
nível local de governo é o ISS, participando com 45% da arrecadação municipal.
Tabela IV
Carga Tributária Brasileira Bruta
em US$ milhões
Orçamento Fiscal 30,40 6,96 33,74 7,50 37,84 7,78 43,89 8,22 44,22 6,82 56,48 7,54
- Imposto de Renda 15,22 3,49 17,36 3,86 18,81 3,87 19,81 3,71 24,46 3,77 32,74 4,37
Pessoas Físicas 0,67 0,15 0,66 0,15 1,04 0,21 1,44 0,27 1,78 0,28 2,36 0,32
Pessoas Jurídicas 3,74 0,86 6,24 1,39 5,00 1,03 6,47 1,21 7,80 1,20 12,40 1,66
Retido na Fonte 10,82 2,48 10,46 2,32 12,77 2,63 11,91 2,23 14,88 2,30 17,98 2,40
- Imp.s/ Prod. 9,75 2,23 10,76 2,39 11,85 2,44 11,41 2,14 11,57 1,79 15,22 2,03
Industrializados
- Imp. s/ Oper. 2,71 0,62 2,87 0,64 3,92 0,81 3,60 0,67 2,76 0,43 2,82 0,38
Financeiras
- Imp. s/ Comércio 1,92 0,44 1,83 0,41 2,17 0,45 2,71 0,51 4,21 0,65 4,22 0,56
Exterior
- Outros Tributos* 0,80 0,18 0,91 0,20 1,09 0,22 6,36 1,19 1,22 0,19 1,48 0,20
Orçamento 34,13 7,82 36,71 8,16 42,43 8,73 53,13 9,95 55,16 8,51 77,07 10,29
Seguridade
- Contr. Folha de 20,27 4,64 21,32 4,74 25,34 5,21 27,99 5,24 30,26 4,67 43,49 5,81
Pagamentos
- 5,89 1,35 4,56 1,01 6,50 1,34 12,93 2,42 12,63 1,95 17,10 2,28
FINSOCIAL/COFINS
- Contr. s/ Lucro 1,26 0,29 3,31 0,73 3,74 0,77 4,89 0,92 4,84 0,75 6,18 0,82
Líquido
- PIS, PASEP 4,68 1,07 4,90 1,09 5,53 1,14 5,67 1,06 5,08 0,78 7,11 0,95
- Outras 2,05 0,47 2,61 0,58 1,33 0,27 1,66 0,31 2,35 0,36 3,19 0,43
Contribuições
Outros 5,86 1,34 5,94 1,32 6,10 1,25 9,22 1,38 10,47 1,30 13,73 1,83
- FGTS 5,86 1,34 5,94 1,32 6,10 1,25 7,38 1,38 8,42 1,30 11,62 1,55
- Salário Educação 0,00 0,00 0,00 1,85 0,35 2,05 0,32 2,11 0,28
ESTADOS 31,96 7,32 33,40 7,42 31,90 6,56 41,42 7,76 44,06 7,77 60,18 8,03
- ICMS 30,02 6,87 31,10 6,91 29,72 6,11 38,65 7,24 40,67 7,18 55,45 7,40
- IPVA 0,36 0,08 0,63 0,14 0,63 0,13 0,90 0,17 2,12 0,37 3,11 0,41
- Contr. p/ 1,26 0,29 1,15 0,26 1,31 0,27 1,76 0,33 1,11 0,20 1,41 0,19
Seguridade Social
- Outros Tributos 0,32 0,07 0,52 0,12 0,24 0,05 0,12 0,02 0,16 0,03 0,21 0,03
MUNICÍPIOS 5,15 1,18 4,42 0,98 5,77 1,19 8,10 1,52 8,65 1,53 10,94 1,46
- ISS 1,47 0,34 1,43 0,32 2,58 0,53 3,52 0,66 3,80 0,67 4,92 0,66
- IPTU 1,99 0,46 1,43 0,32 1,28 0,26 2,02 0,38 2,13 0,38 2,68 0,36
- ITBI 0,59 0,13 0,42 0,09 0,42 0,09 0,67 0,12 0,66 0,12 0,82 0,11
- Taxas 0,84 0,19 0,83 0,18 0,99 0,20 1,44 0,27 1,52 0,27 1,95 0,26
- Outros Tributos 0,26 0,06 0,31 0,07 0,50 0,10 0,45 0,09 0,55 0,10 0,56 0,07
TOTAL 107,49 24,61 114,21 25,38 124,03 25,51 155,77 29,18 162,55 28,68 218,40 29,15
Tabela V
Transferências Intergovernamentais da Carga Tributária Líquida
em % relativa
Receitas Governamentais 1991 1992 1993 1994 1995 1996
UNIÃO - REC. DISPONÍVEL 52,55 53,87 56,42 58,55 55,12 54,55
ARRECADAÇÃO PRÓPRIA TOTAL 63,69 64,79 67,87 66,87 65,42 64,96
(-) Transferência para Regiões 0,69 0,66 0,67 0,52 0,61 0,60
(-) Transferência para Estados 5,54 5,40 5,74 4,49 5,12 5,30
(-) Transferência para Municípios 4,92 4,86 5,04 3,30 4,57 4,52
ESTADOS - REC. DISPONÍVEL 29,98 29,63 27,01 25,96 27,27 27,95
ARRECADAÇÃO PRÓPRIA TOTAL 31,27 31,09 27,20 27,71 28,91 29,65
(-) Transferência para Municípios 7,52 7,53 6,61 6,76 7,37 7,60
(+) Transferência da União 6,22 6,06 6,41 5,02 5,73 5,90
MUNICÍPIOS - REC. DISPONÍVEL 17,48 16,51 16,57 15,49 17,61 17,51
ARRECADAÇÃO PRÓPRIA TOTAL 5,04 4,12 4,92 5,42 5,67 5,39
(+) Transferência da União 4,92 4,86 5,04 3,30 4,57 4,52
(+) Transferência dos Estados 7,52 7,53 6,61 6,76 7,37 7,60
TOTAL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
Tabela VI
Composição Final da Carga Tributária Líquida
em % relativa
1991 1992 1993 1994 1995 1996
UNIÃO - REC. DISPONÍVEL 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0
ARRECADAÇÃO PRÓPRIA 100,0 100,0 100, 0 100,0 100,0 100,0
Transferência dos Estados 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Transferência dos Municípios 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00 0,00
Por último, vale registrar que, além das transferências constitucionais (que devem ser
automaticamente repassadas), existem os repasses não constitucionais, realizados mediante
leis ordinárias ou de forma direta entre os diferentes níveis de governo. Caso típico são os
convênios, que representam uma transferência federal de recursos a Estados ou Municípios
para que esses possam atuar em nome da União em atividades de responsabilidade federal.
Como exemplo, cita-se o caso da saúde, onde, mediante o Sistema Unificado de Saúde - SUS,
os três níveis de governo concorrem para a realização da despesa. Em 1996, o valor das
transferências constitucionais atingiu R$ 21,2 bilhões, enquanto que as transferências
voluntárias representaram R$ 5,6 bilhões.
III - Despesas
Por último, a Constituição ainda permite a existência de competência concorrente entre União e
Estados, envolvendo atividades de legislação sobre direitos tributário, financeiro e econômico,
orçamento, polícia civil e defensoria pública, dentre outras.
Outra característica em relação à política de gastos brasileira é sua enorme rigidez, dado o
grande volume existente de receitas vinculadas. A própria Constituição determina, além das
transferências intergovernamentais, a vinculação completa da arrecadação das contribuições à
Seguridade Social. Há ainda percentuais constitucionais mínimos de investimento na educação
(18% da receita de impostos para a União e 25% para a receita de impostos dos Estados e
Municípios). Ademais, existem inúmeros fundos que visam somente a financiar despesas
específicas de determinados órgãos ou setores e que também são formados a partir de
receitas vinculadas. Em síntese, há pouca receita livre para efeito de se realizar políticas
econômica e de investimento. A grande rigidez orçamentária impede, inclusive, que a
sociedade possa, a cada exercício financeiro, determinar as prioridades de gasto, pois esses já
foram pré-determinados.
Em conseqüência dessa rigidez, uma das primeiras medidas tomadas pelo atual governo para
superar os desequilíbrios financeiros da União foi a criação do Fundo Social de Emegência
(FSE). Esse fundo, em vigor desde o exercício de 1994, atualmente denominado Fundo de
Estabilização Fiscal (FEF), tem por objetivo a geração adicional de recursos livres para a União
(especialmente mediante a desvinculação de receitas antes direcionadas a setores específicos
ou governos subnacionais), de modo a financiar projetos da área social. Desse modo, o FEF
alterou a repartição das receitas entre os governos, gerando recursos da ordem de R$ 24,6
bilhões em 1996 para a União, ainda que sob a forma de um ajuste fiscal de caráter temporário.
O FEF nada maisé do que uma desvinculação constitucional, apesar da aparente
complexidade da emenda que o instituiu, onde recursos são desvinculados de determinadas
áreas na forma de receitas e voltam a ser aplicados, quase integralmente, nas mesmas áreas
na forma de despesa orçamentária (recursos da seguridade social, recursos do salário
educação, Pin/Proterra, etc.). A composição de receitas do FEF tem dois momentos:
Por fim, as mais de 5.000 administrações municipais são responsáveis pela arrecadação de 5%
da arrecadação brasileira. Muitas delas, por encontrarem-se localizadas em Municípios de
baixo potencial econômico, nem mesmo instituíram os impostos de sua competência. No
entanto, vale mencionar que os governos locais, até mesmo por estarem mais próximos do
cidadão, são os que mais arrecadam taxas, em função de prestação de serviços públicos.
Tabela V
Arrecadação por Administração Tributária
Em % relativa
Uma das principais críticas feitas sobre a estrutura federativa brasileira diz respeito à baixa
coordenação entre as esferas de governo. De um modo em geral, todos os órgãos
arrecadadores atuam sobre a mesma capacidade contributiva do cidadão. Esse último,
geralmente deve prestar informações, recolher tributos e acompanhar modificações de
legislação dos três níveis governamentais. No entanto, tradicionalmente o Brasil não
desenvolveu um sistema padronizado de livros e documentos fiscais, datas de pagamento ou
cadastro. A complexidade da legislação e a multiplicidade de fiscos tornou-se fator que onera
substancialmente o custo dos contribuintes, especialmente dos pequenos, transformando-se
em um motivo indutor de evasão fiscal. A falta de uma base de dados integrada entre os fiscos
tem significado multiplicidade de esforço por parte dos governos e, muitas vezes, privilegia os
contribuintes mal intencionados. De modo em geral, não há fiscalização conjunta e nem a
existência da "prova emprestada", onde um auto de infração devidamente lançado por um
governo possa automaticamente servir em prol de outro governo.
O Brasil possui a característica única de possuir dois impostos sobre o consumo e a circulação
(IPI e ICMS), do tipo valor agregado, com bases que às vezes se sobrepõem, e administrados
por níveis diferentes de governo. Esse argumento, em parte, também pode ser estendido ao
ISS, que muitas vezes se confunde com o ICMS. A situação torna-se mais delicada pelo fato de
que o ICMS, que representa cerca de 28% da carga tributária, tem adquirido objetivos extra-
fiscais de extrema relevância, especialmente no que tange à atração de investimentos.
A alternativa teórica mais cogitada para essa questão diz respeito à consolidação dos três
impostos em uma única base, possivelmente administrada pelo governo federal, mas cuja
arrecadação deveria ser transferida para os demais governos na mesma proporção das suas
receitas atuais com esses impostos.
Na prática, o Governo Federal enviou para o Congresso Nacional a Proposta de Emenda
Constitucional 175 (PEC 175) que, dentre outras coisas, propõe a extinção do IPI e a criação
do ICMS federal em seu lugar. Assim, existiria uma única base de consumo (a do atual ICMS) e
sobre ela incidiriam duas alíquotas: uma de competência federal e, a outra, estadual. Essa
modificação visa apenas a um caráter qualitativo do sistema tributário nacional, buscando ser
neutra em termos de receitas arrecadadas. Além disso, a alíquota do imposto (ou seja, a soma
das alíquotas federal e estadual) deve ser uniforme por mercadoria ou serviço em todo o País,
o que visaria a diminuir a atual prática de competição tributária entre os Estados.
É sempre importante relembrar que uma estrutura mais racional de tributação sobre o consumo
seria bastante desejável para a facilitação da harmonização tributária entre o Brasil e seus
principais parceiros de comércio, especialmente os do Mercosul. Nesse sentido, vale a pena
mencionar outra iniciativa de relevante interesse para o País, que foi a realização do I Encontro
dos Administradores Tributários dos Países-membros do Mercosul e Associados, no mês de
junho passado. Esse seminário pode ser considerado o marco inicial do processo de
harmonização tributária na região.
Quanto à legislação, há uma inter-relação entre as bases de cálculo dos tributos, gerando a
possibilidade de tributação reflexa. Em especial, vale citar o caso do Imposto sobre Produtos
Industrializados - IPI vinculado à importação, incidente sobre a entrada no território nacional de
bens estrangeiros industrializados, de modo a colocá-los em situação de igualdade com os
similares nacionais. Desse modo, no ato do pagamento do Imposto sobre Importação,
automaticamente já é lançado o IPI. O mesmo argumento aplica-se à administração dos
tributos, que se torna extremamente facilitada devido a existência de um único cadastro, de um
mesmo documento fiscal e da própria fiscalização integrada.
Vale a pena mencionar que, com o substancial aumento das operações internacionais, em
decorrência tanto da abertura comercial brasileira como do próprio processo de globalização da
economia, tem sido fundamental a troca de informações entre as áreas aduaneira e de tributos
internos. O crescimento das operações que envolvem planejamento tributário internacional e
preços de transferência demandam dos fiscos nacionais maior agilidade de fiscalização e
intercâmbio de dados. Desse modo, a "globalização do contribuinte" tem implicado integração
das administrações tributárias e, nesse sentido, o modelo brasileiro (que apresenta
administração integrada de comércio exterior e tributos internos desde 1968) tem se mostrado
eficiente no enfrentamento dessas questões.
A crítica tradicional relativa às operações do comércio exterior brasileiro era a de que essa
multiplicidade de órgãos gerava burocracia e lentidão nos processos de importação e
exportação de mercadorias. Em decorrência, o Brasil desenvolveu um dos mais modernos
sistemas informatizados de controle do comércio exterior, o SISCOMEX, que integra a SRF, o
MICT, o Banco Central e os próprios importadores e exportadores. O SISCOMEX possibilitou
que os procedimentos de importação e exportação sejam realizados de forma automática,
gerando maior rapidez e confiança no fechamento dos dados do comércio exterior brasileiro.
Indubitavelmente, a cooperação entre os diversos órgãos licenciadores e anuentes mostrou ser
fator fundamental para o sucesso dessa experiência brasileira.
• A Administração Integrada das Contribuições Sociais
Dessa forma, o sistema brasileiro tem ganhos de escala substanciais na fiscalização e controle
de suas contribuições sociais, inclusive utilizando-se de autos de infração reflexos. A
especialização de cada administração tributária em bases de cálculos específicas tem
permitido um melhor desempenho da própria arrecadação de contribuições sociais nos últimos
anos. Atualmente, a arrecadação de contribuições sociais representa cerca de 40% das
receitas totais da SRF e 25% das receitas tributárias federais.
• Comentários Finais