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Guache

Capitulo I

Diário das noites


Parte 1.

Oi, meu nome é Alexandre, e esse é


meu novo diário. Nunca tive um diário em
toda minha curta vida. Hoje tenho 30 anos e
não sou muito de escrever, principalmente
sobre eu mesmo. Mesmo porque nunca tive
muito o que escrever, não tenho uma vida
mágica ou cheia de mistérios como muitos
vivem por aí. Sou simplesmente um pintor, e
vivo da minha pobre arte, com cada quadro
vendido eu garanto minha janta e café da
manhã de muitos dias. Mas como todas as
pessoas, tenho falhas, como todo
profissional, tenho falhas, e como todo
homem...tenho falhas.

Tenho problemas para pintar homens


ou seres masculinos, não sei quando ou
como comecei com esse distúrbio, mas isso
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sempre está comigo, e estou incomodado a
muitos anos com tudo isso, perdi trabalhos e
contatos valiosos por conta desta falha
humana. Gostaria de ser como uma dessas
impressoras modernas que pintam tudo que
você manda com uma qualidade que encanta
os olhos. Eu tenho o que muitos artistas
chamam de “barreira artística” ou algo
parecido, porém mais que uma simples
síndrome eu carrego algo mais sério.

Como fuga para meu problema


comecei a pintar somente quadros de
mulheres com uma paixão cósmica pelas
silhuetas e rostos femininos, não me
considero machista ou algo do tipo, mas o
fato é que tenho paixão pelas mulheres como
uma simples obra de arte. Uma obra divina.

E por muitas noites eu tenho pintado


contratantes belíssimas em óleo ou pastel
sobre telas e até consegui com muitos
quadros uma exposição em um espaço
cultural na minha cidade, nada muito
popular, apenas uma exposição de arte
contemporânea promovendo um banco como
patrocínio, coisa de ricos, coisa que não
entendo ainda. Mas sinto que falta algo

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ainda, consegui usar técnicas maravilhosas
de iluminação e até estudos de cores como
meio de busca pelo que nem eu sei o que
busco. Talvez eu precise de vinho ou novas
referências.

Muitos repetem um velho ditado que


acredito ser de origem chinesa ou grega que
diz: “todo homem deve plantar uma árvore,
ter um filho e escrever um livro”. Não
concordo completamente com esse velho
provérbio, pois acho que todo homem teria
que pintar um quadro. Quadros são eternos e
por mais pobre que seja a arte sobre a tela,
alguém sempre se aproxima e se apaixona
por ele, a arte ama todos e todos podem ama-
la. E ela nunca vai procurar saber seu limite
bancário ou se você é analfabeto ou de
origem pobre. Ela simplesmente vive
eternamente de nossas paixões pela mesma.
Esse é o segredo da eternidade, a paixão, ou
o que muitos chamam de amor. E como o
sangue que os vampiros costumam beber em
litros para manter a juventude eterna, nós
artistas usamos a tinta para manter a
imortalidade de quem amamos. Amo meus
contratantes.

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Não sou um homem atraente e muito
menos tenho truques para conquistar quem
eu desejo, isso é claro mostrado nas minhas
frustrações quando pinto belas atrizes ou
paixões de infância. Nunca consigo pintar
uma mulher que amei um dia, eu interpreto
isso como uma outra espécie de barreira que
tenho em minha alma. Não se trata de
inspiração, é somente pela questão de todas
serem perfeitas e tal perfeição ser impossível
de se representar com fidelidade na tela.
Fidelidade, um sinônimo de perfeição no
meu vocabulário. E levo isso a sério em
todos meus trabalhos com sucesso, mas
nunca terminei um trabalho pessoal com
fidelidade. Estou longe de conseguir
perfeição para o que é meu. Mas já fui
aplaudido algumas vezes por contratantes e
modelos por fazer curvas perfeitas. Mas falta
algo ainda nos quadros que faço para minha
satisfação.

Em tempos antigos eu desenhava


somente por satisfação própria, e por muitas
vezes me saciei com meus desenhos e
pinturas. Me sentia completamente sucedido,
mas sempre soube que aquilo ainda não era
perfeição. E dividia meu tempo entre garotas

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que amava platônicamente e os desenhos que
fazia sobre elas. Mas isso foi a anos atrás, e
eu sinto tanta falta de tal satisfação. Eu ainda
desenho por meus sentimentos. Só não
consigo mais sentir a perfeição no que faço.

Eu me recordo de toda a minha


infância ter desenhado nos lugares mais
inesperados, de mesas de colégios a lugares
exóticos como banheiros de mercadinhos.
Hoje não consigo viver sem pintar ou
desenhar meus desejos e sentimentos. Claro,
todos trabalhos pessoais eu guardo em um
armário improvisado no meu quarto bem
próximo a minha cama que eu realmente
tento expulsar tais desejos. Todos os quadros
e desenhos pessoais que guardo são retratos
de mulheres que acredito ser as mais belas
obras primas esculpidas pela natureza com
maestria, todas apaixonantes. Mais ainda
falta algo .

Já passaram das duas da manhã, e


minhas mãos ainda estão sujas de tinta óleo.
Preciso descansar, e só percebo isso por estar
quase dormindo sobre este caderno, e por
um instante pensei ter derrubado o pote de
tinta para a pena que uso. Mas é somente

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café já frio de tantas horas. Por essa noite
basta. Novamente terei uma noite
acompanhado pelo cheiro de tinta que ronda
meu quarto que batizei de ateliê. E mesmo
assim ainda não me sinto tão sozinho como
realmente estou...

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Guache

Capitulo I

Diário das noites


parte 2.

São seis horas da manhã e ainda não


consegui dormir, assim que me deitei fui
acordado de uma maneira brusca
completamente suado e com o travesseiro
distante, no chão sobre algumas telas
minhas. Imaginei ter ficado louco, pois
estava acordando de um sonho muito
estranho e um tanto real. Havia muito tempo
em que não sonhava algo tão real como
aquilo, e eu não acredito ser sonho, apesar de
ser super cético e não ter uma gota de
misticismo como cultura, mas acho que foi
um tipo de aviso ou presságio. Como um
futuro possível. Era tão real que doeu ter
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acordado, como se tivesse acordando para
um pesadelo, o pesadelo da realidade, eu
começo a sentir um frio atravessando minha
carne, passando por todos os meus músculos
e chegando ao meu coração. Senti algo
parecido aos treze anos ao me apaixonar pela
Íris, uma colega de classe da sexta série do
ginásio. Ela realmente me fazia tremer, todos
os dias eu sentia esse frio atravessando meu
corpo e parecia que ia alcançar minha alma a
qualquer momento. Mas ela se foi e me
deixou aqui sem ao menos me presentear
com uma lembrança de um toque, um
abraço ou um beijo. Ela levou todo meu
romantismo.

Já tem algumas horas que estou


acordado, e ainda não consegui tirar a
sensação do ambiente daquele sonho. Não
sai da minha cabeça. Estou de frente a um
quadro que reflete o tal sonho. E eu sinto
agora o que a anos não sentia. Estou de
frente a perfeição! Mas perfeição tamanha
que estou em torpor! Não consigo parar de
olhar para esse quadro, tanto que estou
escrevendo sem olhar o que escrevo. Ela é
perfeita!

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Me levantei pela madrugada sentindo
uma vontade de pintar o meu sonho, mas no
sonho não havia nada mais que um simples
rosto em um local ensolarado, como um
close eu via o rosto dela bem próximo, e
podia tocar, e ela também me tocava
retribuindo minha curiosidade e talvez
matando a dela. Sinto que ela está me
esperando ainda lá, no meu sonho, e minha
vontade era de voltar e entregar o retrato
dela como presente, mas sei que isso seria
algo impossível trazer algo da realidade para
um sonho, ou algo de um pesadelo para uma
realidade perfeita.

O rosto dela é perfeito. Não se compara


a nenhuma atriz internacional ou modelo de
capa de revista. Nem mesmo com toda a
computação que usam nos retoques das
fotografias se comparam com a natureza
daquela pele. A luz refletia na pele como se
fosse própria e tivesse sendo emanada ao
redor da própria, e quanto mais eu me
aproximava dela mais leve eu me sentia. Eu
não sei o nome dela, não perguntei pois
estava em alfa. Uma deusa real. Parece que
ela está me esperando em algum lugar. Eu
sinto na carne, e é bom!

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Meu rosto está sujo de tinta. Meu olho
direito ardia, acabei de lavar pois havia
resíduos de tinta seca nele. E ela parece me
olhar na tela fresca como se sentisse falta do
meu toque. Vejo isso nos olhos dela. Ela está
viva, e trouxe de volta o meu romantismo.
Trouxe algo novo. Não consigo parar de
olhar para ela, e até sendo tão estática ela
parece retribuir. Como você é meu diário eu
admito, estou apaixonado. Obviamente não
diria isso para ninguém, estou um tanto
envergonhado pelo que ocorreu essa noite.
Não pelo fato de ter encontrado algo novo e
excitante, mas por estar simplesmente
alucinado por alguém que eu nunca vi,
apesar de saber que ela existe em algum
lugar.

Minha janela permanece aberta,


precisava de um pouco de ar, mas já passa
das sete da manhã e a luz do sol entrando e
tentando penetrar nos meus olhos não me
incomoda mais. Na verdade me sinto
aliviado e leve, bastante leve. Eu até perdi a
sensação dos meus membros. Isso é um
ótimo sinal, qualquer coisa que me deixe
fora dessa realidade é um bom sinal. Estou

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fora. Fora daqui. Agora eu conseguirei
descansar em paz. Por uma noite.

Guache

Capitulo II

Felicidade, fidelidade e
perfeição.

Não consigo saber que lugar é esse


onde eu encontro você todas as vezes que
durmo. Me parece familiar e a sensação é
ótima, como aqueles lugares que nos lembra
a nossa infância. Um suspiro de saudade
subitamente toma conta da minha respiração
a cada dez segundos. Algo maravilhoso de se
sentir na vida. Um suspiro de vida.

E por mais que eu tente apreciar todo


esse sentimento pelo lugar onde me encontro
eu percebo que ainda não é todo o meu que
tenho a receber. Eu encontro você me
espreitando atrás de uma rocha em formato
de tartaruga com algumas flores em volta. O

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sol ainda reflete na sua pele de uma maneira
mágica todas as vezes sem perder a força,
uma força infinita sobre você. Uma força
que me faz sentir vida.

Já se passaram um mês desde a


primeira vez que nos vimos. E tudo que
tenho de você é o cheiro do seu perfume na
minha mente e muitos sorrisos seus. Todos
em tinta guache sobre tela. O que para um
artista deveria valer mais que um colar de
pérolas ou uma porção de diamantes, pois
quadros não tem preço. Seu sorriso não
deveria ser pouco para mim, mas estou
insatisfeito com tanto. Eu quero mais de
você, quero seu beijo, quero mais que um
abraço, quero você todos os segundos
sorrindo para provar o quanto te faço feliz
com meus toques, e quanto você pode ser
contente com nossas carícias. Mas agora
estou acordado, e terei de aguardar o
anoitecer para que nós venhamos a nos
encontrar novamente, e isso é questão de
horas, questão de tempo, nada mais que
paciência. Por enquanto eu continuo a encher
meu ateliê de sorrisos seus com cores em
guache. Sorrisos como presentes que você
parece fazer questão de me dar a cada vez

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que nos encontramos, e eu ainda não sei seu
nome.
Hoje ao acordar me encontrei chorando
diante ao espelho como uma criança que
perde um animal de estimação pela primeira
vez, eu me senti fraco demais para parar de
chorar. A fraqueza poderia ser por
ultimamente eu não estar comendo como
deveria, porém meus tremores está além da
carne e atravessa todo meu corpo chegando
até a minha mente, fazendo um turbilhão de
pensamentos na minha cabeça. O que me
deixa confuso no inicio, assim eu levanto
questões e em seguida encontro respostas
para tais dúvidas. O que me faz sofrer. O que
me faz chorar como uma criança.

Por quê você não pode estar comigo


durante o dia ? Por quê você não é minha
modelo durante as manhãs ensolaradas desse
verão infinito de onde vivo ? E por quê eu
não me sinto feliz todas as horas que lembro
de você ?

As vezes acredito que estou louco por


estar pensando tanto em você. A felicidade é
como achocolatado, instantânea. Em um
momento você mistura açúcar com o

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chocolate e uma porção de leite e você tem
algo delicioso para beber, e assim é a minha
solução de tintas também. O tom da Íris dos
seus olhos é uma mistura de açúcar,
chocolate e uma porção de leite, tudo em
guache bem misturado. E hoje pela manhã
eu descobri um segredo que mudou todas as
futuras pinturas que eu vou fazer de você, e
eu devo tudo isso a uma gota de lágrima
sobre a tela. Essa dor que sinto de saudades
de você me fez encontrar em uma técnica
aguada o tom e a textura exata para sua íris.
Essa é a parte do açúcar que eu procurava
pra fazer esse excelente chocolate dos seus
olhos, a lágrima que eu perdi por tristeza me
mostrou a fidelidade do seus olhos.

Perfeição e fidelidade ainda são


sinônimos. Agora mais que nunca eu provei
a felicidade em encontrar a perfeição em
você. E basta uma gota de lágrima para cada
olho seu e eu chego a perfeição dos seus
olhos. Parece curioso o fato de eu ter que
perder uma lágrima a cada íris sua, isso
parece dizer que você rouba minhas lágrimas
para servir de suas. Mas você não chora em
meus quadros, somente sorri. E diante a tanta
perfeição eu me sinto feliz! E já no seu

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terceiro quadro de hoje eu compreendo que
as lágrimas que você me rouba são para me
trazer felicidade.

E eu ainda sinto sua falta. Minhas tintas


estão acabando. Só me resta uma caixa com
algumas cores, ainda suficientes para mais
um pouco de você. Mas sinto que em breve
terei de perder tempo ao comprar mais tintas
fora de casa, e agora tenho medo de sair,
porque ao sair eu fico longe de você e seus
cinqüenta e dois sorrisos que tenho
estampados até o teto em telas imortais.

Mas por enquanto que está quente terei


de parar e esperar a noite para fazer mais um
quadro seu, o que me polpa bastante
material.

Física, matéria sólida, me sinto um


mago ao trazer pra vida algo de um sonho, e
pela primeira vez na minha vida adulta eu
sinto total orgulho de um quadro meu, por
ser perfeito e fiel. Mas ainda me sinto fraco
por te tirar de um sonho e te manter presa em
uma tela. Você ainda não é minha.

E isso é questão de tempo. Mas não

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questão de horas, e nem sei se é questão de
dias ou meses, talvez anos. Mas sei que um
dia eu vou te ter para minha satisfação e sua
felicidade. Eu sou bastante confiante em
saber o quanto eu poderia te fazer feliz. É
tudo ou nada para meus sentimentos, ou eu
faço você feliz ou eu morro de insatisfação.
Simples como a palavra amor, e tão simples
quanto o próprio sentimento foi a minha vida
inteira.

Estou feliz. Não como queria estar,


porém mais do que deveria. Como sei que é
questão de tempo até te encontrar, eu me
pergunto se a felicidade que me promove
seus sorrisos será sempre instantânea ou
eterna como gostaria que fosse. Eu também
me pergunto se você sente o mesmo, e se
você teme que eu nunca mais sonhe com
você, ou se teme a minha desistência de te
encontrar. Talvez eu deva te procurar, mas
isso já não seria tão simples. O que eu diria
para você? O que eu diria que não possa
dizer em um sonho? Eu começo a lembrar o
quanto sou tímido. Ou realmente este caso
parece mais complicado, talvez caso de
loucura como sei que muitos acharão, terei
de ser cauteloso com essa ambição minha, e

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silencioso com todos os meus passos.
Paranóia.

Parece mais forte que a felicidade, a


paranóia, a cisma de todos estarem
esperando me apedrejar pelos meus desejos
e sonhos, como se eu fosse um pecador dos
mais imundos. E eu sei que isso tudo
parece loucura. Mas sinto amor, e logo isso
deixa de ser loucura. Ou o amor é uma
loucura? Sim! Além de felizes os poetas
apaixonados eram loucos por tanto saberem
a verdade que os tolos insistem não
enxergar, por saberem o que realmente está
sobre seus olhos, por saberem que a
felicidade existe e não é utópico ter alguém
ao seu lado proporcionando felicidade
eternamente. Uma felicidade que deixa de
ser instantânea e vem para a realidade que
ainda vejo como um pesadelo. Tenho que te
encontrar. Venha para a realidade. E me tire
deste pesadelo chamado vida real.

Se eu acredito é por que existe. E talvez


eu somente exista por ela acreditar em mim,
quem sabe? Algo assim me parece
fidelidade, soa como perfeição. Você ter uma
conexão com alguém sem ter o que temer ou

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o que pode acontecer de errado, com certeza
isso se chama fidelidade. E como eu sempre
digo. Felicidade, fidelidade e perfeição,
sinônimos completamente anexados um com
o outro. Se completam e se explicam.

Alguém ensinou a dar as duas partes do


rosto a tapa, e na teoria é algo simples de se
fazer. Porém tente se perguntar se estaria
disposto sempre a tal nobre atitude, como
seria dar as duas faces a tapa sem ao menos
dar um tapa como troco. Tudo bem que a lei
da troca equivalente não pode ser levada
sempre em conta, mas se no amor ela
funciona com tamanha excelência, porque não
pode funcionar quando o sentimento não é o
amor? Para mim o ódio e o amor são
semelhantes, ambos com o limite de
intensidade muito próximos. São sentimentos
irmãos cheios de sensações semelhantes,
como o frio que passa na nossa barriga.
Sentimos esse frio pela primeira vez na
infância, tanto com a primeira briga ou
quando você recebe seu primeiro beijo.

Logo, tanto o ódio quanto o amor são


sentimentos naturais. Eu carrego ambos
comigo toda a vida com muita intensidade,

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algumas vezes me deixaram mais vivo, e
outras vezes ambos sentimentos me mataram
pouco a pouco, como um veneno com um
sabor adocicado. O homem ama odiar, e diz
odiar amar. Eu amo ambos, pois servem de
ótimo combustível para a vida. Mas tive em
momentos onde tal motivações magníficas
desapareceram ou se esgotaram por pequenos
instantes. O amor havia fugido com alguém
que perdi a muito tempo, e o ódio foi
substituído por uns instantes por minha
própria ocupação da profissão, um amor
diferente. Com isso aprendi que o ódio nunca
pode ser substituído por nenhum outro
sentimento, nem mesmo amor e menos ainda
por um amor diferente, como foi comigo. Eu
realmente morri.

Mas ressuscitei, e além de vivo estou


grato por ter passado por tanto e ter aprendido
tanto em uma posição tão passiva como tenho
vivido. Agora preciso pagar meu débito, tenho
quadros seus para terminar e minhas tintas
acabarão em breve, já sei que preciso de
dinheiro. Tudo nos leva a necessidade de
dinheiro. Dinheiro para odiar. Dinheiro para
amar. Amar você. Amor capitalista.

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Tentando escrever sobre você eu caio em
contradição algumas vezes, por conta dos
turbilhões de pensamentos e sentimentos
inerentes. A sensibilidade aflora como em um
adolescente e passa para esse papel, nesse
tempo de tanta paixão encontramos mais um
fato para a imortalidade, a eterna
adolescência. Os tremores e o súbito frio na
barriga são exemplos de paixão sem
maturidade.

Dizem que os homens maduros em


festas ou noites em boates não sentem esses
efeitos da paixão ao abordarem uma mulher
em um primeiro contato, o que prova que eles
são mortais. A noite acaba, e ao acabar o
menor dos sentimentos de felicidade se torna
tão momentâneo que se transmuta em alegria,
e enfim ao amanhecer acaba com os primeiros
raios de sol e o fim de um sorriso. Já o amor
verdadeiro não acaba nunca, por mais que
você não consiga uma união com quem você
ame, isso não significa que enfim acabou
tudo, pois sempre haverá uma lembrança e
sempre existirá amor. Sempre existir é ser
imortal.

E como tal amor pode ser encontrado

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com tanta facilidade nas artes finas, na música
e até na dramaturgia, todo meu foco para meu
quadro deveria ter as melhores referencias
para uma perfeita execução. A minha história
história é um pouco diferente de tudo que
acontece na ficção lírica. Nunca foi visto tanta
beleza pelos melhores escritores ou músicos
mais inspirados. Nunca existiu tanto amor,
nem nos contos mais belos com
encerramentos mais mágicos e fantasiosos. E
isso que vivo mesmo que em um sonho, é
real.

E agora minha janela já aberta a dias,


mostra o caminho dos últimos raios de sol
para meu rosto, estou com um sabor estranho
sobre minha língua, algo amargo, que
ultrapassa o limite do meu sentido do paladar
e chega a amargurar minha alma. Tantas
palavras existem para descrever o que estou
passando nesses últimos tempos, porém a
única coisa que mais faço é pintar. Logo será
noite e a iluminação será menor, dependerei
de luzes artificiais para continuar meu árduo
trabalho.

E já não tenho espaço para guardar


quadros seus. Já não tenho espaço aqui para

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você.

Mas apesar de tanta controvérsia com


minhas palavras. E tantos sentimentos
misturados, eu posso dizer que no fundo do
meu coração encontro o mais raro dos
sentimentos. E não se confunde com alegria
ou euforia. Estou sentindo algo parecido com
a falta de lucidez, e também garanto nãos er
por conta das noites perdidas.

Sentimento genuíno, sentimento mais


raro que diamante negro. Irmão da tristeza,
consequência do amor.

Felicidade...

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Guache

Capitulo III

Atravessando a vida
Parte 1.

É manhã, e algo invade meu quarto. Um


animal voa sobre minhas telas, e parece
apreciar quadro a quadro. Calmamente ele
pausa seu vôo sobre cada quadro dela e inicia
uma meticulosa análise, e parece gostar de
tudo que vê.

Ele tem uma capacidade que invejo, eu


gostaria de desfrutar como ele a liberdade de
apreciar quem eu quero. E ele é um simples
beija-flor. Provavelmente procurando por
néctar ele encontrou algo divino, ambrosia é o
néctar divino. Curiosamente eu acredito que
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ele deve estar se sentindo um deus grego neste
instante.

Suas cores também são lindas. Ele


parece ter algo em suas pequenas penas que
brilha como metal, algo esverdeado e que
chega ao tom de uma esmeralda. Como uma
armadura leve romana lustrada com um brilho
encantador. Uma criatura divina, parece que o
fizeram a óleo!

E entre todo o seu vôo sobre meu quarto


ele não parece se importar com a minha
presença, sua soberania é mostrada com essa
atitude, reforçando a idéia da sua própria
divindade que talvez foi concebida por ela.
Minha imortal.

E aos poucos ele se satisfaz e voa em


direção a janela. Procurando a saída, ou talvez
em busca dela. Eu queria ser livre como ele.

Quase não a encontrei esta noite em


meus sonhos, amedrontado, meu sonho quase
se transformou em pesadelo. Mas quando
tudo começou a escurecer ela apareceu como
uma heroína abrindo frestas nas trevas e
iluminando tudo ao redor com sua magnífica

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luz. Como uma santa. Ela também é minha
heroína, e não canso de agradecer seus
cuidados comigo.

Eu consegui ver todo seu corpo esta


noite, e ela vestia seda branca, sem bordados.
Era um vestido, e como estávamos em uma
praia, ele moldava todas as suas curvas com
uma facilidade e maestria, e que por tanto
tempo pintei com dificuldade e cuidado.

E esta noite nos abraçamos, e agora eu


posso confirmar depois de todos esses dias.
Ela me retribui paixão com seus atos. Está
claro como seus sorrisos espalhados em meu
ateliê, e como eu imaginava, acordei cedo
com muita inspiração para mais um quadro
seu. Mas fui surpreendido com um detalhe.
Eu não tenho mais tinta para te trazer hoje.

Guardado em meus estojos consigo


encontrar pastel seco, carvão, acrílica e até
aquarela de ótima qualidade. Mas nenhuma
dessas tintas conseguem reproduzir tamanha
magia que seus sorrisos e olhares passam.
Preciso de guache.

Em meio ao desespero, eu procurei por

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trocados em todo meu ateliê, e como eu não
tenho trabalhado para contratantes eu
encontrei nada mais que uns miseros centavos
em minha carteira. Eu continuei minha busca,
e recordei que havia algo guardado sob meu
colchão, mania que trago desde minha
infância. Tão válido este costume, que graças
a ele comprei meu primeiro estojo de lápis de
cor aquarelável aos meus 12 anos. Eu lembro
como se fosse hoje.

Eu morava na metrópole, e meus pais


não tinham condições de sustentar 3 filhos e
seus sonhos ao mesmo tempo. Logo percebi
que com meu esforço, eu teria um caminho
escolhido por mim concretizado com sucesso.
Mas ainda tão novo, como eu poderia saber
tanto o que eu queria para mim? Já disseram
que a experiência de uma pessoa não é dada
por seus aniversários celebrados. E toda essa
força de vontade surgiu aos meus 9 anos,
quando meu primeiro amor me inspirou a um
desenho em uma folha de caderno.

Seu nome era Carolina. Um cantor


completaria a frase com “uma doçura de
menina”. E realmente ele teria razão, todo o
encantamento que ela trazia como um rastro

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de perfume encantava todos os garotos da rua,
e eu via tudo da minha janela. Como sempre
fui criado com rédeas curtas, nunca sai do
quarto para jogar bola na chuva como sempre
via os garotos pela janela. E nunca tive a
oportunidade de empinar uma pipa como
sempre via todos os garotos . Mas sei que
tanto o futebol na chuva quanto o empinar a
pipa não me trariam a satisfação de receber o
sorriso da Carolina ao ver meu primeiro
desenho dela. Na época eu não tinha noções
de anatomia como tenho hoje, é claro, mas já
amava com tanta intensidade como nesses
dias atuais.

Pena que ela nunca viu seu retrato.


Talvez ela teria amado, se eu talvez fosse
mais maduro.

Eu hoje vivo longe da cidade grande,


moro no interior, zona rural. Me mudei tem
dois anos, até então vivia com minha irmã
mais velha chamada Mariana. Uma celebrada
advogada criminal do centro. Nós nunca nos
damos bem, eu sempre era chamado de
vagabundo em nossas discussões. E um dia eu
cansei de discutir e fui em busca dos meus
sonhos. Aprendi isso com os filmes da T.V.

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Sempre tem final feliz pro mocinho que age
com convicção sobre seus sonhos.

O cheiro de terra molhada das tardes


com chuva de verão daqui não tem preço. O
amanhecer é revigorante e o anoitecer muito
mais bonito. Temos estrelas aqui, acredite ou
não!

E todas as ruas são batizadas com nome


curiosos, rua do poço, rua das mangueiras,
travessia da ponte. Cada nome que encontro
mais curioso que o outro.

Nossa... Apesar da minha realidade me


sufocar. Este lugar ainda foi uma das minhas
melhores escolhas.

Eu irei recolher minhas economias,


calcularei o suficiente para uma semana de
tinta guache e vou voltar ao meu trabalho em
breve. Preciso manter meus sonhos. Preciso
da minha felicidade.

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Guache

Capitulo III

Atravessando a vida
Parte 2.

É comum as pessoas escreverem em


seus diários apenas a noite, mas eu estou
escrevendo pelo menos três vezes por dia.
Estou com as tintas guardadas. Comprei elas
em uma rua muito próxima daqui onde vivo.
Na mesma loja onde compro todo meu
material, uma loja especializada material
para artes plásticas e afins. Mas no caminho
eu vi algo que não tenho palavras para dizer.

Eu desmaiei com o que aconteceu, em


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um momento de ultimato, eu perdi todos os
sentidos e caí no chão ao retornar com a
caixa de tintas entre os braços.

Eu me lembro de ter saído da loja, e ao


atravessar a rua da vida, uma pequena
travessia por onde termina em uma ponte
sobre um rio, eu vi algo que teria tomado
meu oxigênio e me fez parar de raciocinar.
avistei de longe alguém que eu poderia jurar
conhecer a anos, um sentimento estranho de
primeira, mas que me fazia acreditar nele
com muita confiança.

Ela estava de costas e andando em


direção a ponte, mas como eu não conseguia
ver o rosto dela eu não poderia gritar seu
nome. Não tinha certeza de quem fosse.

Então percebi que ela carregava algo,


parecia uma bolsa entre aberta com uma
alça sobre seu ombro direito. E de dentro da
bolsa algo parecia estar caindo. Mas parecia
um caderno. Infelizmente eu estava
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distante, bastante distante, e não teria como
gritá-la, minha timidez não ajudou em
nenhum momento.

Então eu fique paralisado ao vê-la


saindo dos meu sonhos quando seu caderno
caiu ao chão. Sim era ela...

Ela virou para pegar seu caderno que


mais se assemelhava a um diário. E como eu
não consegui ao menos respirar, não pude
chamar pelo seu nome, mesmo por que eu
nem sabia o nome dela. Nunca havia
perguntado em meus sonhos. Ela não me
viu, tenho certeza que se estivesse, teria me
chamado. E eu fiquei anestesiado por muito
tempo, paralisado com aquilo que mais
parecia ilusão ou miragem do que a própria
realidade em si. Mas, ainda assim eu me
segurava para não surtar e tentava controlar
minha respiração, mas o ar fugiu dos meus
pulmões e eu enfim desmaiei. Sem ao menos
perguntar o nome dela.

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Acordei instantes depois na minha
casa, e supostamente minha vizinha me
trouxe até aqui em casa.

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