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Projeto

PERGUNTE
E
RESPONDEREMOS
ON-LINE

Apostolado Veritatis Spiendor


com autorizagáo de
Dom Estéváo Tavares Bettencourt, osb
(in memoriam)
APRESENTAQÁO
DA EDIpÁO ON-LINE
Diz Sao Pedro que devemos
estar preparados para dar a razáo da
nossa esperanga a todo aquele que no-la
pedir (1 Pedro 3,15).

Esta necessidade de darmos


conta da nossa esperanga e da nossa fé
hoje é mais premente do que outrora,
visto que somos bombardeados por
numerosas correntes filosóficas e
religiosas contrarias á fé católica. Somos
assim incitados a procurar consolidar
nossa crenga católica mediante um
aprofundamento do nosso estudo.
Eis o que neste site Pergunte e
Responderemos propóe aos seus leitores:
aborda questoes da atualidade
controvertidas, elucidando-as do ponto de
vista cristáo a fim de que as dúvidas se
dissipem e a vivencia católica se fortalega
no Brasil e no mundo. Queira Deus
abengoar este trabalho assim como a
equipe de Veritatis Splendor que se
encarrega do respectivo site.
Rio de Janeiro, 30 de julho de 2003.
Pe. Esteváo Bettencourt, OSB

NOTA DO APOSTOLADO VERITATIS SPLENDOR


Celebramos convenio com d. Esteváo Bettencourt e
passamos a disponibilizar nesta área, o excelente e sempre atual
conteudo da revista teológico - filosófica "Pergunte e
Responderemos", que conta com mais de 40 anos de publicagáo.
A d. Esteváo Bettencourt agradecemos a confiaca
depositada em nosso trabalho, bem como pela generosidade e
zelo pastoral assim demonstrados.
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MORAL

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índiice

Pág.

"O SANTO É UM PECADOR..." 49

CIENCIA TEM RESPOSTA PARA TODOS OS PROBLEMAS


DO HOMEM ?

Entrevista do Prof. Alfredo Kastler, Premio Nobel 1966 51

CRISTIANISMO... QUE TEM DE NOVO E PRÓPRIO NA HISTORIA


DAS RELIGIÓES?

Cinco notas parecem caracterizar o Cristianismo no conjunto das


Religiees do mundo 63

"CRISTO, O HIPNOTIZADOR", QUE TAL?

Um livro que tenciona impressionar ou "hipnotizar, sugestionar" ... 75

JOANA D'ARC: IGREJA CONDENA E IGREJA REABILITA ?

O caso voltou á baila receníemente 82

RESENHA DE LIVROS 92

COM APROVACAO ECLESIÁSTICA


"O SANTO É UM PECADOR..."
Entre os escritos do famoso Mahatma Gandhi, encontra-
-se eloqüenta relato, que tem sua mensagem nao sómente
para os indianos, mas para todo e qualquer homem:

"Eu tinha quinze anos. Cometí um furto. Tratava-se de


um pequeño fragmento de ouro tirado do bracelete de meu
¡rmáo... Isto se tornou para mim pesado demais para que
eu o pudesse suportar.

Tomei a resolucao de nao mais roubar. Mas nao ousava


falar do que tinha feito. Nao por médo de ser esbofeteado por
meu pai. Ele nunca nos espancava. Mas eu tinha receio de
penal izá-lo. Todavía eu sentía que tinha de arriscar, e que
nao podía purificar-me sem urna confissáo completa.

/ Decidi-me, por fim, a redigir a confissáo, a apresentá-la a


meu pai e a pedir-lhe perdáo. Escrevi-a sobre estreita faixa de
papel, e apresentei-a a meu pai. Nessa nota, nao sómente eu
admitía a minha culpa, mas pedia um justo castigo e terminava
suplicando a meu pai que nao se punisse ele mesmo por causa
de mim. Prometia já nao roubar no futuro.
Todo trémulo, entreguei-lhe essa confissáo. Meu pai entáo
sofría de urna fístula e achava-se de cama, urna cama que
nao era senáo urna simples prancha de madeira. Sentei-me do
outro lado da prancha. Ele se pos a ler, e as lágrimas correram-
-Ihe ao longo da face, molhando o papel... Essas parolas de
amor purificaram-me o coracáo e apagaram o meu pecado...
Essa especie de sublime perdáo nSo estava nos hábitos
de meu pai. Eu julgara que ele se Irritaría, diria palavras duras
e bateria na testa. Mas ele permanecía estranhamente calmo ;
creio que Isto era devido á minha confissáo completa.
Urna confissáo acompanhada do desejo de nao mals pecar,
quando ela é feita diante de alguém que tem o direito de a
receber, é a mais pura especie de arrependimento. Sel que a
minha confissáo tirou a meu pai tdda inquietacáo a meu res-
peito e aumentou desmedidamente a sua afelgáo para comigo .
Como é rica em sugestóes esta narracáo! Através de
Gandhi é o homem como homem que fala, o homem dotado
de brío te honradez.

_ 49 —
Na verdade, há certas atitudes de vida que emanam
espontáneamente da alma humana, obedecendo a urna exigen
cia <Je saúde mental, sim, mas tambán de autenticidade e
dignidade. Tal é, entré outras, a acusacáo ou a confissáo das
próprias faltas.

Por muito estranho que isto pareca, quem sinceramente


reconhece o mal que fez, liberta-se dessa nódoa, preparando
para si mesmo um clima de alegría e ressurreigáo. Ao con»
trário, guardar ocultamente a falta parece mais cómodo, mais
preservativo da «grandeza» de fachada de quem falhou, mas,
na verdade, equivale a conservar um verme que corrói a paz
e pode chegar a turvar a fachada ido respectivo sujeito. Hu-
milhar-se, reconhecer-se faltoso diante dos irmáos ofendidos
ou da autoridade competente, sempre que isto tenha razáo de
ser, é sinal de dignidade humana. — E quem ouve a acusagáo
leal de seu semelhante faltoso, é, muitas vézes, levado a usar
de clemencia, ou mesmo admirar ésse seu irmáo e agradecer-
-lhe a ligáo recebida.

Diz o sabio na Escritura Sagrada: «O justo é o primeiro


acusador de si mesmo» (Prov 18,17). Em linguagem de An-
tigo Testamento, a palavra «justo» vem a ser sinónima de
«santo». — O salmista, por sua vez, escreve: «Enquanto me
conservei calado, os meus ossos definharam entre continuos
gemidos... Eu Vos confessei o meu pecado... Feliz o homem
em cujo espirito nao há engaño» (SI 31, 3.5.2).

Estas idéias parecem vir a propósito em fevereiro, quando


o inicio da Quaresma (assinalado pela quarta-feira de cinzas)
convida os crístáos e, mediante estes, todos os homens a urna
revisa© de vida e ao reconhecimento de que sao pó da térra.
Observava magistralmente o escritor inglés Chesterton:

«O santo é um pecador que reconhece ser pecador».

Sim. O santo comega pelo comégo de todos os homens:


é um pecador. Mas... um pecador um pouco diferente de
outros, porque sincero, leal. É essa sinceridade arrependida e
humilde que o Senhor espera encontrar em todo homem, para
néle realizar a sua obra de santificagáo.

«Senhor, dá-nos um caraca» de pecador inconformado


com o pecado!»

E B

— 50 —
«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»
Ano XII — N» 134 — Fevereiro de 1971

ciencia fem resposta para todos


os problemas do homem?
Em sintese: A pergunta ácima e outras semelhantes foram propostas
ao Prof. Alfredo Kastler, Premio Nobel de Física em 1966.
O dentista respondeu que a ciencia (entendida no sentido das ciencias
naturals) nSo é, nem se pode jamáis considerar, auto-suficiente. Ela tem
trazldo mediante as suas descobertas e conquistas, grandes beneficios ao
gfinero humano. Mas, ao mesmo tempo, ela vem revelando ao homem a
sua pequenez e as suas llmltacoes; obrlga-o asslm a procurar na reflexfio
filosófica as respostas ás questSes que a ciencia val sugerindo. É a filosofía
que enslna ao homem a escala dos valores, Indlcando-Ihe o lugar que com
pete á máquina e a técnica, de um lado, e ao homem, do outro lado; a
filosofía assim mostra ao homem o reto uso que ele deve fazer da materia
e da energía que ele val dominando; ajuda-o a se engrandecer, em vez
de se delxar embrutecer pela máquina.

Kastler preconiza o estudo da Filosofía em todas as Faculdades, mesmo


ñas de tecnología. Ciencia e Filosofía se complementam. Por último, o
dentista elogia também o bom humor como fator poderoso de progresso
e fellcldade.

Resposta: A ciencia pode, ou poderá um dia, responder


a todas as indagagóes do ser humano ? Poderá ela elucidar
questóes que tradicionalmente eram iluminadas pela filosofía
e a Religiáo ? A ciencia seria oomparável a urna Religiáo orga
nizada? Os dentistas precisam de filosofía? Tém culpa dos
males que a humanidade vai padecendo (pois descobriram a
bomba atómica, fabricam drogas e inventaram máquinas que
atordoam o homem, tomando-o doente)?

Eis perguntas atuais que foram propostas por um repórter


do periódico «Impact» (vol. XX n' 2, junho 1970) ao professor
Alfredo Kastler. Éste é uní físico francés, nascido em Guebwil-

— 51 —
4 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

ler no ano de 1902; em 1966 recebeu o Premio Nobel por suas


importantes descobertas no setor da ótica (especialmente no
dos raios láser e maser).

Dado o valor das declaragóes do Prof. Kastler, julgamos


que poderiam interessar ao público brasileiro, atendendo a
indagagóes que também no Brasil sao freqüentemente formu
ladas, máxime no setor escolar (onde ss estuda a reforma de
currículos e sa concebem programas para cursos de nivel medio
e superior, para ciclo básico de FacuMade, etc.). Tal é o mo
tivo por que abaixo publicamos a entrevista concedida pelo
Prof. Alfredo Kastler. Pensamos, de modo especial, nos pro-
fessóres, educadores -e estudantes que no próximo mes de
margo voltario as atividades escolares.

Maleficios da ciencia e da técnica ?

Jomalista: "Professor, gostaríamos de que no decorrer


desta entrevista nos dissesse as reacdes que experimenta diante
de críticas formuladas pelo grande público contra a ciencia.

Prof. Kastler: Atualmente fala-se muito dos maleficios da


ciencia e da técnica. Há, por certo, maleficios devidos ao
desenvolvimento científico e técnico. Mas é preciso nao es-
quecer que o estado pré-científico, o estado que se sitúa antes
do desenvolvimento científico e técnico, nao era em absoluto
um estado Ideal para o género humano.

Consideremos, por exemplo, o bom tempo antigo, o tempo


do romantismo no século XIX, o tempo em que as ciencias
exerciam influencia muito menos importante do que hoje. Na-
quela época (que, apesar de tudo, nao está longe), a huma-
nidade padecia numerosos flagelos que ela hoje nao mais
experimenta : tenham-se em vista, por exemplo, as grandes epi
demias (na Europa houve forte epidemia de cólera ainda em
1832). Foi o desenvolvimento da ciencia e, em particular, da
ciencia médica, que permitiu dominar essas calamidades.

Ora bem, quando se fala dos maleficios da ciencia — isto


é, dos impactos negativos causados pela ciencia —, é mister
nao se perderem de vista os aspectos positivos, ou seja, a
contribuicáo benéfica da ciencia para a vida dos homens.

— 52 —
CIENCIA RESPONDE A TUDO?

Jomalista: Ai está certamente um ponto importante que


nao devenios esquecer.

Mas justamente as realizacóes gigantescas das ciencias


e o alcance aparentemente ilimitado das melhorias que elas
podem acarretar para a sorte material dos homens, induziram
certos pensadores — principalmente os jovens — a admitir
sem reservas que a ciencia possa responder a todas as per-
guntas referentes á nossa existencia na térra. Em contraparte,
ouvem-se criticas de pessoas que dizem que a ciencia está
sendo colocada sobre um pedestal e que os cientistas sao
glorificados e mesmo divinizados.

Prof. Kastler (com sorriso):... E que éles (os cientistas)


formam urna casta á parte como no Egito antigo; em suma,
sao magos.

Ciencia é religiao organizada ?

Jomalista: Em última análise, dizem que a ciencia é


de certo modo urna religiao organizada.

Prof. Kastler: A propósito creio que as opinioes diferem


segundo se considere a ciencia como um Ieigo a considera ou
como um dentista.

Gragas á ciencia, os homens viram seu poderio desenvol-


ver-se considerávelmente. Podem-se citar dois exemplos entre
muitos outros: de um lado, a multiplicacáo da energía, de
que os homens podem dispor; de outro lado, as grandes má
quinas de calcular com as quais se fazem coisas e resolvem
problemas que outrora eram inviáveis. O que mais ¡mpressiona
o observador que vé a ciencia por tora, é realmente ésse
enorme aumento do poder humano. Para ésse observador, tai-
vez a ciencia se ensoberbeca de tudo que ela realizou e pode
realizar.

Todavía, quando alguém olha para o desenvolvimento da


ciencia a partir dos bastidores da ciencia mesma, nao é um
sentimento de orgulho que o domina, mas, antes, a humildade,
porque cada nova aquisicáo da ciencia, cada novo principio
de que nos tornamos conscientes, é quase, diría, um principio
de renuncia ou, em todo caso, a verificacáo de urna deficiencia.

Jomalista : Em que sentido ?

— 53 —
6 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

Prof. Kastler: Passo a dar exemplos. Durante secutas,


os homens procuraram inventar a máquina que criasse ener
gía, ou seja, o motor perpetuo ; fizeram-no até o momento em
que tomaram consciéncia de que é impossíve! criar energía.
Assim o principio da conservacao da energíaJ pode ser con
siderado como principio que enuncia urna impossibilidade;
por conseguinte,... como principio que impóe ao homem urna
renuncia.

Da mesma forma, o principio de Carnot, que é um dos


grandes principios da termodinámica estabelecidos no sé-
culo XIX, comega pelas palavras 'É impossível': 'É impossí-
vel produzir trabalho a partir da energia térmica, se nao se
dispóe de duas fontes de calor com temperaturas diferentes".
Nao é isto a verificacáo de urna limitacáo ?

Jornalista: Por certo.

Prof. Kastler: E o principio que domina a física quántica


— a física do século XX —, ou seja, o principio da indetermi-
nacáo de Heisenberg, é também ele urna verificacáo de defi
ciencia, pois reza: 'Nao é possível medir simultáneamente,
com precisáo decisiva, as duas grandezas que determinam o
estado momentáneo de urna partícula, ou seja, a posicáo no
espago e a elocidade dessa partícula'. -

Jornalista: Isso equivale a dizer que os progressos da


ciencia apresentam dois aspectos que poderiam parecer quase
contraditórios ?

Prof. Kastler: Exato. De um lado, verifica-se que a cien


cia torna o homem cada vez mais senhor da natureza; de outro
lado, também se evidencia que cada progresso da ciencia

1 ou de náo-criacSo da energía.

- Heisenberg professa o Indeterminismo das lels da natureza, tendo


em vista as condeces subjetivas em que se acha todo estudioso: deficien
cias fisiológicas e psicológicas Impóem limites á percepcfio dos nossos
sentidos, mesmo qgando ajudados por Instrumentos perfeltísslmos. Os Ins
trumentos mesmos que utilizamos para nossas observacfies científicas, po-
dem provocar perturbacóes nos fenómenos (os fótons, sendo da mesma
grandeza que as partículas Infra-atómlcas, perturbam necessárlamente essas
partículas quando se encontram com elas).
Estes fatóres, dos quals depende necessárlamente a observacfio humana,
tornam Impossível a exatidSo absoluta na formulacSo das lels da natureza.
Isto, porém, nao quer dlzer que os fenómenos naturals, em si mesmos, nio
sejam regidos por leis exatas e determinadas.

— 54 —
CIENCIA RESPONDE A TUDO?

no plano material acarreta um ato de renuncia no plano inte


lectual. * E, se o homem se torna capaz de dominar melhor a
natureza, fsto acontece precisamente porque ele toma cons-
ciéncia de seus limites pessoais.

Jornalista: Disto entáo se segué que as conquistas in-


telectuais da ciencia levam antes á humildade do que ao
orgulho ?

A vida nao é fenómeno meramente físico-químico

Pro!. Kastler: Julgo que o estudo dos principios funda


mentáis da ciencia leva o cientista a certa humildade diante
dos fatos da natureza.

Pensó também que talvez o homem chegue um dia á con-


clusáo de que ele é insuficiente para explicar a natureza da
vida. Por ora, aínda há muita gente convicta de que todos os
fenómenos ocorrentes nos organismos vivos sao fenómenos
puramente físico-químicos. * Pois bem ; eu pergunto a mim
mesmo se um dia nao enfrentaremos também nesse setor urna
decepgáo e se nao deveremos renunciar á idéia de que a
vida é algo de meramente físico-químico.

Jornalista: O Sr. acha que nunca se poderá explicar a


vida apenas mediante fatóres físico-químicos ?

Prof. Kastler: Sim; pensó que é impossível recorrer


apenas a principios físico-químicos.

Jornalista: Desta forma o Sr. refuta urna outra crítica


formulada pelo grande público : conforme éste, os dentistas
estáo convictos de que todas as questdes do universo podem
ser resolvidas pela ciencia.

Prof. Kastler: Esta opiniáo mostra como o mundo dos


nao-cientistas é propenso a levar em conta principalmente as
conquistas da ciencia. O cientista, que conhece a ciencia por
dentro, nao ignora o enorme volume de incógnitas que subsis-

1 Kastler quer dizer: quanto mafs o homem penetra na materia, tanto


mais toma consciéncla das limitacdes de suas capacidades.
2 Todos os graus da vida (o vegetativo, o sensitivo e o intelectivo) se
reduziriam a reacSes da materia. Tal é a doutrina do materialismo.

— 55 —
8 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

tem nao sómente nos setores da biologia e da psicología, mas


também no da física (que é a ciencia básica e a mais exata
de todas).

Ciencia e moral

Jomalista: Professor, segundo os nossos interlocutores


leigos (em materia de ciencia), quando os cientistas se pro-
nunciam sobre um assunto qualquer, mesmo que nao seja do
dominio da ciencia (por exemplo, urna questáo de ordem mo
ral ou social), éles freqüentemente dáo a crer que estáo pro-
ferindo a resposta definitiva.

Prof. Kastler: Creio que os cientistas estáo conscientes


de que nao possuem competencia especial fora do seu próprio
setor de trabalho. Mas, como todo cidadáo, éles tém o direito
— e até a obrigacao — de se interessar pelas questoes sociais
que dizem respeito diretamente ao futuro da humanidade.

A contribuicáo que éles podem dar, é a maneira de abor


dar tais questSes: o cientista aborda todas as questoes sociais.
mesmo as mais importantes, sempre num espfrito de objetivi-
dade, abstraindo de elementos passionais.

Tal atitude é difícil quando se trata de questoes das quais


depende diretamente a vida humana: por exemplo, nos se
tores do desarmamento, da guerra e da paz ou no dominio
da sexualidade. Neste, urna das grandes contrlbuicSes de
Freud foi a de tratar dos problemas do sexo sem preconceitos,
com toda a objetividade, passando por cima de todos os tabus.

Jornalista: O Sr. mencionou a paz. Podem-se abordar as


questoes da paz com a mesma objetividade ?

Prof. Kastler: Com a mesma objetividade, sim, inclusive


a questáo do desarmamento. Alguns homens de ciencia ten-
taram mostrar que na situacáo atual seria possível iniciar o
desarmamento progressivo e controlado na medida em que
se aumentassem para cada nacáo as condigóes de seguranca.
Este é, sim, o cerne do problema: para as nagóes, as armas
sao sempre um fator de seguranca; as armas tém por fina-
lidade impedir a guerra... Pois bem ; estou certo de que
urna nacáo pode aumentar a sua seguranca, concluindo com
outras nagóes um acordó de desarmamento progressivo e
controlado. Creio que é possível demonstrar esta tese cien
tíficamente.

— 56 —
CIENCIA RESPONDE A TUDO?

Jomalista: Urna outra crítica formulada por nossos in


terlocutores é a seguínte: muitas vézes os dentistas ficam
na sua torre de marfim, ao passo que éles deveriam esforcar-se
por estar em contato com o grande público.

Pesquisa básica e torre de marfim

Prof. Kastler: É preciso definir o que é a torre de marfim.


Existe um setor da atividade científica que se chama "a pes
quisa básica". Creio que é preciso desenvolver a pesquisa
básica únicamente com a preocupacáo de aumentar os nossos
conhecimentos sem intuito de renda, exploracáo ou proveito.
Esta é a condicáo indispensávei, para que a pesquisa básica
progrida realmente e se estenda. Sob éste ponto de vista, o
cientista está obrigado a permanecer na sua torre de marfim.

Nao há dúvida, a pesquisa fundamental leva a aplicacdes,


e essas aplicagoes tém conseqüéncias na vida dos homens.
Ora duas objecóes antagonistas sao feitas ao cientista: de
um lado, acusam-no de permanecer na sua torre de marfim ;
e, de outro lado, atiram-lhe a responsabilidade pelos resulta
dos nefastos aos quais levam certas aplicacóes da ciencia.
Diante dessas censuras contraditórias, a atitude do cien
tista deve ser equilibrada: em primeino lugar, seu único obje
tivo deve ser a procura de conhecimentos; ele nao se deve
preocupar com ulteriores conseqüéncias. Mas, de outro lado,
como homem, ele deve guardar o direito e tem o dever, de
dlzer a sua palavra sobre os problemas humanos,... de se
interessar pelas aplicagSes que a sociedade faz das conquis
tas científicas, a fim de que tais aplicagoes sejam úteis, e nao
nocivas, á humanidade.

Ciencia e política

Jomalista: Julga o Sr. que, se os cientistas desempe-


nhassem um papel mais importante na vida política, isto permi
tiría, por exemplo, reduzir ao mínimo os efeitos nocivos das
aplicacdes da ciencia ?

Prof. Kastler: Em nossos dias todo Govérno de nacáo


desenvolvida deve apelar para conselheiros científicos. Éste
tipo de consulta está bem organizado nos Estados Unidos e
na Uniao Soviética.

— 57 —
10 -PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

Jomalista : Para melhor dar a conhecer ao grande público


a natureza e os objetivos da ciencia, assim como o significado
das novas descobertas científicas e as possibilidades que
abrem, o Sr. eré que seja necessário fomentar a vulgarizacao
da ciencia ? E, em caso positivo, que papel podem desem-
penhar os cientistas neste setor ?

Prof. Kastler: Pensó que os cientistas, principalmente a


partir de certa idade, desde que se sintam menos habilitados
para a pesquisa, deveriam consagrar-se á sadia vulgarizacao,
como acontece, por exemplo, nos Estados Unidos mediante
periódicos de alto nivel científico, como "Scientific American".

Jornalista: Mas nao julga que aos cientistas ainda cabe


outro papel importante na vulgarizacao da ciencia? Seria o de
contribuir para manter o público a par de seus trabalhos cien
tíficos. Neste ponto precisamente percebe-se ás vézes a ten
dencia a se fecharem numa torre de marfim. Em minha vida
de jornalista, nao raro aconteceu que, tendo pedido a um
dentista urna entrevista sobre seus trabalhos ou descobertas,
recebi urna recusa.

Ciencia e pública informase»

Prof. Kastler: Isso aconteceu provávelmente porque o


homem de ciencia considerava tal entrevista urna perda de
tempo, como realmente é muitas vézes. Pensó que certos se
tores da ciencia sao diffeeis de se explicar... De modo espe
cial, é difícil colocar ao nivel do leigo as ciencias que neces-
sitam de aparato matemático complexo.

Mas o que mais devemos dar a compreender ao público,


é que nao há divisáo-estanque entre a ciencia e outros setores
da cultura; há, ao contrario, osmose entre éles. O cientista
mesmo só conhece um estreito setor da ciencia e está na
situacáo de um leígo frente a todos os outros setores da ciencia.

Ciencia e cultura

Jornalista: Sem dúvida, o Sr. ouviu talar, há muito, da


teoria das duas culturas enunciada por C. P. Snow, segundo
a qual existiría um abismo — um antagonismo até — entre
a cultura científica e a cultura humanista. Que diz a respeito ?

— 58 —
CIENCIA RESPONDE A TUPO? 11

Prof. Kastler: Creio que se trata de um falso problema.


Recentemente essa questáo fot abordada por Pierre-Henri
Simón no seu livro "Questions aux savants"; o autor parece-me
atribuir aos cientistas intencóes que, na maioria dos casos,
éles nao tém: por exemplo, a intencáo de querer substituir
a cultura humanista pela cultura científica. Nao creio que éles
o queiram. Apenas julgo que é necessário que os homens de
estudo escolham a sua especializacáo.

Jornalista: Existem barreiras entre as ciencias e as dis


ciplinas humanistas. Isto se deve ao fato de que os especia
listas de urnas e os de outras véem as coisas de modo unila
teral. Muitos dos nossos interlocutores insistem na necessi-
dade de se superar o abismo que separa as ciencias e as dis
ciplinas humanistas.

As ciencias humanas

Prof. kastler: Tenho a impressáo de que assistimos


atualmente á grande desenvolvimento do que se chama as
ciencias humanas1; ai está provávelmente urna tentativa de
eliminar ésse abismo... Acontece, porém, que as ciencias
humanas estáo, sem dúvida, em estágio totalmente empírico ;
comparadas ás ciencias exatas e naturais, sao ciencias muito
jovens, em infcio de desenvolvimento.

Jornalista: De que ciencias fala o Sr. ?

Prof. Kastler: Da psicología e da sociologia, por exemplo.

Jornalista: Já se disse que o problema da nossa época


é o excessivo atraso das ciencias humanas em relacáo ás
ciencias exatas e naturais. é necessário desenvolver aquetas
de preferencia a estas.

Prof. Kastler: Creio que, por certo, é preciso promover


as ciencias humanas; mas isto só pode ser obra de pequeño
número de individuos selecionados e muito bem preparados.
Seria erróneo dizer aos jovens que estáo atualmente nos nossos
colégos: 'Encaminhem-se para as ciencias humanas antes
que para as carreiras científicas e técnicas'. Todas as nacSes

1 Psicología, parapsicología, psiquiatría, educacáo, sociología, etnología,


geografía humana, historia geral e particular.

— 59 —
12 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS? 13á/1971

experimentara atualmente a necessidade de formar muito maior


número de dentistas e técnicos. Por ora, as ciencias humanas
precisam principalmente de individuos de grande valor ca-
pazes de abrir brechas.

Segundo me parece, a filosofía deveria ser ensinada em


todas as Faculdades. Sim ; é lamentável que ñas Faculdades
de ciencias, medicina, direito, nao haja cursos de iniciacáo á
filocofia. Quando o estudante se aplica á ciencia, ao direito
ou á medicina, creio que está muito mais apto a receber o
ensino da filosofía; senté também a necessidade desta como
meio de esclarecer o que ele estuda.

Jomalista: Por que o Sr. é favorável ao ensino da filo


sofía ñas Universidades ?

Prof. Kastler: Se, por exemplo, Einstein pode criar a sua


teoría da relatividade e, mais tarde, Heisenberg desenvolveu o
principio da indeterminacáo, isto se deu porque eram nao ape
nas cientistas, mas também filósofos — pessoas que sabiam
analisar os conceitos cientfficos. Einstein analisou a origem
dos conceitos de espago e de tempo, e sondou a nogao de
simultaneidade. Heisenberg analisou o processo de medir urna
grandeza flsTca.

Jornalista: Ésse ensino da filosofía poderia abrir o es


pirito dos especialistas, permitindo-lhes tomar melhores ati-
tudes e ampliar suas deseo be rías ?

Prof. Kastler: Sim;... poderia levá-los a refletir um


pouco. Eu mesmo lamento nao ter recebido formagao filosófica.

Jomalista: Essas afirmacóes sao muito interessantes.


Pois, como o Sr. sabe, numerosos cientistas julgam que o
estudo da filosofía nao interessa, por ser um setor quase ultra-
passado, e que a filosofía e a metafísica nao tém relagáo al-
guma com a ciencia. Como se vé, o Sr. é de parecer contrario.

Prof. Kastler: Totalmente contrario.

A funjóo do bom humor

Jornalista: Desejo propor-lhe uma última pergunta, Pro-


fessor: o bom humor tem algum papel a desempenhar na
ciencia ?

— 60 —
CIENCIA RESPONDE A TUPO? 13

Prof. Kastler: Ah, sim 1 Acho que o .bom humor é algo


que, em todos os setores da atividade humana, dá mais valor
á vida. É também urna reacio indispensável para aliviar certa
tristeza da existencia, porque no fundo me parece que os
homens verdadeiramente felizes sao assaz raros.

Recentemente um dos meus amigos, eleito membro de


urna Academia, declarava durante urna cerimónia em que Ihe
era oferecida a espada de académico: 'Sempre fui um homem
feliz'. Isto me impressionou, porque é algo de raro em nossos
tempos, em que os homens tém tanta ocasiao de sofrer e cho
rar. E creio que o bom humor traz aos homens um pouco
mais de íelickJade, e, principalmente, permite comunicar feli-
cidade. Mas nao é dado a todos os homens ter bom humor;
é um dom, um dom dos deuses.

Jornalista: Para terminar, Professor, diga o que pensa


sobre as relacóes entre a ciencia e a sociedade.

Prof. Kastler: O Sr. me poe a pergunta á queima-roupa ;


mas tentarei responder-lhe. É com otimismo que vejo o de-
senvolvimento da sociedade, porque, apesar das censuras que
se possam fazer á ciencia e á técnica, creio que a marcha da
humanidade vai para a frente; nao é recuo nem degeneres
cencia. A maioria dos homens... nao tem consciéncia de que
em seus primordios o género humano era bem diferente da
imagem ideal concebida por Jean-Jacques Rousseau ou Ber-
nardino de Saint-Pierre: urna vida feliz em meio á natureza.
Ao contrario, o homem primitivo era um homem muito infeliz,
como mostra o estudo dos povos primitivos que ainda existem
na térra.

As tribos primitivas viviam no odio e no médo... O homem


progrediu. Se urna certa ordem social se estabeleceu entre
os homens, isto se deve, em parte, ao desenvolvimento das
ciencias. Creio, pois, que temos plena razáo para permanecer-
mos otimistas diante do problema da sobrevivencia dos
homens.

Nao é necessário comentar tongamente as lúcidas idéias


do Prof. Kastler. Apenas parece merecer realce especial a
afirmagáo de que a ciencia e a técnica nao podem dispensar
a filosofía, ou seja, urna tentativa de resposta aos grandes

— 61 —
14 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

«por qués?» do ser humano (por que viver? donde venho?


para, onde vou?...). Estes sao os problemas fundamentáis
que a ciencia nao resolve, mas, ao contrario, suscita cada vez
mais. Sómente a filosofía, que culmina na mensagem de Cristo
ou no Evangelho, é apta a esclarecer o homem angustiado pelo
próprio bem-estar oriundo da automacáo. A recente bibliografía
lembra os perigos que há em que os homens se deixem fas
cinar pelo gigantismo da civilizagáo da máquina; se nao sou-
berem estabelecer a escala dos valores mediante urna seria
neflexáo filosófico-religiosa, as próximas geragóes poderáo pre
parar a própria ruina, fazendo que a máquina destrua o seu
autor humano.

A propósito, podem-se consultar:

H. R. Rapp, "Cibernética e Teología. O homem. Deus e o número"


Vozes de Petrópolis 1970.

R. Macgowan e Fr. I. Ordway III, "Inteligencia no universo". Vozes de


Petrópolis 1970.

P. Overhage, "A caminho da pós-humanidade". Vozes de Petrópolis 1970.


A. C. Clarke, "Perfil do Futuro". Vozes de Petrópolis 1970.
J. Comblin, "A maior esperanza". Vozes de Petrópolis 1970.
W. C. de Freitas, "Dialética e dinamismo da esperance crista". Vozes
de Petrópolis 1968.

Leitor amigo!

Queira desculpar e compreender éste lembrete:


Já pagou sua assinatura de PR 1971 ? E a de 1970 ?
Lembre-se, por favor, de que a sua revista depende da
sua colaboracáo moral e também material. Nao nos deixe
muito tempo sem o seu valioso subsidio.
Aínda: quando nos enviar correspondencia ou cheque,
indique-nos a procedencia exata, pois temos recebido nao
poucos pagamentos cuja origem nos é difícil identificar. Se
possivel, pois, mencione o seu número de assinante ou o
enderdco preciso para o qual Ihe é enviada mensalmente a
revista.
E AJUDE-NOS A AJUDAR, ANGARIANDO NOVOS ASSI-
NANTES PARA PR!
Gratissimos.
PR

— 62 —
«istia
que tem de novo e próprio
na historia das religioes?
Em sfnteae : Pode-se dizer que cinco grandes tragos distinguem e auten-
ttcam decisivamente o Cristianismo frente as demais Rellgloes da térra:

1) Monoteísmo bíblico. O Cristianismo é o desabrochar normal da


religiao de Israel. Ora o monoteísmo dos judeus, oriundo no século XIX
a.C. com o patriarca AbraSo, é fenAmeno que os historiadores nao explicam
por tatures sociológicos, culturáis ou meramente naturais; so se entende
cabalmente desde que se admita a IntervencSo do verdadelro e único Deus.
Após Cristo, a historia de Israel continua a ser um fenómeno histórico sin
gular — o que também supde um designio de Deus. A persistencia de Israel
parece so poder ser compreendida se, como enslna SSo Paulo, se admite
que ésse povo é conservado pela Providencia para dar testemunho a Jesu9
Messlas no tlm dos tempos.

2} "Ele prlmelro nos amou" (1 Jo 4,19). Estas palavras do Apostólo


constituem algo de incrivel para a sfi razáo dos filósofos pré-crlstfios, que
jamáis puderam admitir amor de Oeus (aínda que nfio fósse senfio resposta)
ao homem. A Dlvlndade nfio precisa de amar o homem, segundo Platio;
ela o ignora, segundo Aristóteles.

3) A ressurrelc.a'o de Cristo ou é (ato histórico ou é expressSo de men


tira e alucinacSo mórbida. No prlmelro caso, tem-se um milagro, o qual
confirma decisivamente a Divlndade de Jesús. No segundo caso, verifica-se
que mentira e alucinacfio deram fundamento aos vlnte séculos de Cristianismo
que a historia aponta — o que também é portentoso. Ora, das duas créticas
em portento, a mais razoável aínda é a prlmelra.

4) Surpreendente expansfio. A extraordinaria dlfusfio do Cristianismo,


atestada por eloqüentes testemunhos, nfio se explica fácilmente, visto o teor
rigoroso da mensagem crista, a morte de seu fundador condenado á cruz,
a exigOldade de recursos humanos de onze pescadores e de seus sucessores
mortalmente perseguidos.

5) O Cristianismo causou profunda revoIupSo moral no tocante á dignl-


dade da pessoa humana, da familia e da socledade.

Resposta: Todas as religioes tem, sem dúvida, urna base


natural e comum, pois todas se derívam do senso religioso
inato no homem. Com eféito, todo ser humano, desde que
reflita, tem consciéncia de que existe algo de superior de que
dependem as criaturas contingentes e ao qual se devem pres
tar adoragáo e reverencia (o filme «2.001. Ooisséia no espaco»
ilustra muito bem o senso religioso da humanidade). Mas a

— 63 —
16 «PERGUNTJE E RESPONDEREMOS> 134/1971

consciéncia religiosa dos homens manifesta-se diversamente


ñas diversas crencas e práticas religiosas da historia. Daí a
pergunta muito justificada: nao seriam essas múltiplas mani-
festacóes equivalentes entre si? Ou haveria algo de típica
mente novo e transcendental na religiáo crista?
A estas perguntas responderemos apontando cinco caracte
rísticas do Cristianismo dignas de especial atengáo: monote
ísmo bíblico, amor antecipado («Ele primeiro nos amou>),
ressurreicáo de Cristo, surpneendente propagacáo, revolucSo
moral.

1. ' Monoteísmo bíblico

O Cristianismo se apresenta como a consumagáo da Reli


giáo de Israel ou como a realizacáo das promessas feitas por
Deus á linhagem de Abraáo. «Na plenitude dos tempos« (Gal
4,4; Ef 1,9), enviou Deus o Salvador ou Messias, que era a
nazáo ,de ser da historia religiosa do pavo judaico.

Ora o judaismo, que é a escola preparatoria do Cristia


nismo, constituí um fenómeno que desafia a razáo do homem
e as categorías ordinarias do desenrolar da historia.

Com efeito. O judaismo teve inicio por cérea de 1850,


quando o Patriarca Abraáo emigrou de Ur da Caldéia para
a térra de Canaá (Palestina). A estirpe de Abraáo veio a ser
o povo de Israel (Israel é um dos grandes descendentes de
Abraáo). Ora ésse povo professou, desde os seus inicios, urna
forma de religiáo muito pura, a única, alias, que possa resistir
a urna crítica da razáo: o monoteísmo. Urna das normas mais
solenes da espifitualidade de Israel soava precisamente: «Ouve,
Israel: teu Deus é um so» (Dt 6,4). Poi com o povo de Israel
que apareceu nos tempos históricas o monoteísmo.

Como se explica isto? Israel era um povo inferior aos


demais que o cercavam: egipcios, assírios, babilonios, fenicios,
sirios tinham mais poder militar, mais ciencia, mais cultura
e projegáo do que Israel. Nao obstante, Israel os superava pela
religiáo, pois éssas povos eram politeístas e idólatras. Por qué?
Quem ensinou a Israel a crenca num só Deus? Quem o pre-
parou para táo pura forma de Religiáo?

Antes de tentar responder, note-se tatnbém que o mono


teísmo de Israel nao é produto de evolucüo, nao é sucedáneo
do politeísmo. Na verdatle, a lingua hebraica nao possui se-
NOVIDADE DO CRISTIANISMO _J7

quer palavra própria para dizer «deusa»; esta carencia de


vocábulo persistiu por toda a historia da língua hebraica,
embora os israelitas se sentissem atraídos ao culto da deusa
feminina Astarte (cf. 1 Rs 14,23; 15,13; 2 Rs 18,4; Jer 2,27;
7,18; 44,17; Ez 8,5). Ao contrario, em todas as formas de
politeísmo há sempre deusas designadas por nomes próprios.
Éste fenómeno pode ser tido como comprovante de que o
politeísmo nao foi a religiáo primordial de Israel.

Considere-se também que o próprio povo de Israel nao


era propenso ao monoteísmo. Ao contrario, muitas vézes no
decorrer da sua historia, os israelitas cederam á idolatría,
adotando deusas e cultos dos povos yizinhos (cf. Ez 8,1-18;
14,1-11; 20,18-26); freqüentemente os' profetas de Israel ad-
moestaram sua gente a que nao abragassem crencas e práti-
cas dos pagaos; cf. Is 40,19s; 41,6s.21-24; Os 2,7-15; Jer 2,5-
-13.27s; 10,1-16; Bar 6.

Foi assim que o monoteísmo se pode conservar intato em


Israel até Jesús Cristo. O povo de Abraáo anterior a Cristo
era um povo unido e identificado principalmente pela sua reli-
tíiáo;. r?ra a fé que dava a Israel a fdrga para suhsistir através
das vicissitudes da sua historia.

Ao consideraren! o fenómeno religioso de Israel anterior


a Cristo, os historiadores e sociólogos se véem na dificuldade
de Ihe fornecer explicagáo meramente humana ou natural. É
o que sugere urna intervencáo de Deus na historia da huma-
nidade, intervencáo sem a qual nao se entendería o mono
teísmo de Israel. Pode-se, pois, dizer num exame sereno e
objetivo que Deus se deu a reconhecer auténticamente aos
homens através da religiáo de Israel.

Mas nao sómente antes de Cristo Israel é portento. A


historia do povo judaico após Cristo continua a ser um fenó
meno desafiador. Em 70 id. C. Jerusalém foi destruida e os
israelitas se viram expulsos da Térra Santa. Desde entáo
vivem dispersos pelo Oriente, pela Europa, a África setentrio-
n.'il c n América. Todavía, ao invés dos demais povos antigos
(mais pujantes do que Israel), os judeus nao se deixaram
absorver pelos seus dominadores e vizinhos, mas conservaram
até hoje, apesar de violentas perseguicóes, a sua identidade
étnica. Em nossos días, a consciéncia nacional de Israel é
mais viva ■ do que nunca após Cristo e o povo é mais nume
roso airada do que outrora. Desde 1947, os judeus vém-se re-
constituindo em Estado independente na Palestina; impóem-se

— 65 —
18 <PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

ao mundo por sua tenacidade, assim como por suas realiza


res agrícolas, industriáis, científicas, bélicas, etc.

Esta segunda fass da historia de Israel também é sin.


guiar e prodigiosa; difere das sortes de qualquer outro povó
antigo. Por qué? — Nao se podaría dizer que é o de
signio de Deus que preserva Israel de perecer, e sustenta ésse
povo, a fim de que Israel termine a sua missáo religiosa?
Se hoje em dia nao há mais assírios, babilonios, fenicios, mas
existem os israelitas, pode-se dizer que Deus os conserva para
serem um testemunho permanente dado ao Messias ou a
Jesús Cristo. Israel, antes de Cristo, preparava a vinda do
Salvador; depois de Cristo, Israel, por sua historia singular,
o aponta ao mundo até o dia em que (conforme Sao Paulo
em Rom 9-11) os judeus retomaráo seu lugar no povo de
Deus, reconhecendo o Senhor Jesús como o Messias prome
tido aos pais; a historia do mundo nao acabará sem que Israel
reconhega o Messias. — Lamentavelmente, a maioria dos
judeus hoje, embora subsista por um maravilhoso designio de
Deus, ignora a sua vocacáo e missáo religiosa, pois é liberal
ou mais ou menos indiferente em materia de fé.

Se, pois, procuramos julgar o Cristianismo e o valor de


sua mensagem, podemos considerar a misteriosa historia de
Israel: é toda marcada por urna missáo religiosa em favor do
Messias, Jesús de Nazaré.

Note-se também que, fora do judeo-cristianismo, nao há


outra forma de monoteísmo a nao ser o Isla; o islamismo
monoteísta, porém, nao é independente da mensagem da Bi
blia; mas, ao contrario, déla se deriva; Maomé visava através
da religiáo constíentízar as populagóes (da Arabia para se
unirem e fortaiecerem. O monoteísmo em todo o seu vigor e
em toda a sua pureza so subsiste no Cristianismo; as religides
nativas da Asia, da África e da América sao ou panteístas
(bramanismo, budismo e outras...) ou politeístas.

2. Amor ontecipodo

Urna das notas mais típicas da mensagem que o Cristia


nismo dirige ao mundo, é formulado pelo Apostólo Sao Joáo:
«íile primeiro nos amou» (1 Jo 4,19). Éstas dizeres sao assim
explicitados pelo próprio autor sagrado:

— 66 —
NOVIDADE DO CRISTIANISMO 19

«Nisto consiste o seu amor: nao fornee nos que airamos


a Deus, mas foi Ele que nos amou e enviou o seu Filho como
propiciacáo pelos nossos pecados» (1 Jo 4,10).

Disto se segué que a Religiáo crista pretende ser um


intercambio de amor entre Deus e os homens, intercambio
no qual Deus tem a iniciativa e o homem é chamado a pro
ferir uma resposta generosa. Tudo mais que o Cristianismo
afirma a respeito de Deus e de seus designios sobre o homem,
c visto em funcáo do amor. Com efeito,

— Deus é Criador por amor, ou melhor, é o Amor que


cria, dando origem ao mundo e ao homem para levar o
homem ao consorcio de sua felicidade;
— Deus é o Amor que legisla, para favorecer a resposta
de amor do homem;
— Deus é o Amor que julga. ou que é juiz; é o amor
que inspira cada uma de suas sentencas (até as que os homens
menos compreendem);
— Deus é o Amor que constantemente atrai c aguarda
o homem durante a sua peregrinacáo terrestre;
— Deus é o Amor que consumará o homem e a historia.

O amor de Deus é incutido pela Biblia Sagrada em ter


mos muito vivos. Na verdade, a idéia de alianca, ilustrada pela
imagem das nupcias (ou da mais total doagáo de amor), é
dominante nos livros do Antigo Testamento ou na religiáo
judaica e, mais aínda, no Novo Testamento ou no Cristianismo.
Deus, que criou o homem e travou alianga com ele, o recriou
na plenitude dos tempos mediante a Encarnacáo e a Reden-
cao; travou entáo a nova e definitiva alianca com a humani-
dade. Em conseqüéncia, tem-se dito que o Cristianismo é a
religiáo do amor, ao passo que Zaratustra iniciou a «religiáo
da Juta* e o Antigo Testamento era a «religiáo da vontade e
da obediencia».

A fim de se avaliar todo o alcance da mensagem crista,


leve-se em conta o mundo anterior a Cristo. Para éste, a no
ticia do amor de Deus que se antecipa, seria (e foi realmente)
algo de surpreendente e incrível. Nao sem motivo Sao Paulo
afirmava que a pregacáo crista era tida como «loucura e es
cándalo» (1 Cor 1,23).

Mais precisamente, considere-se o mundo grego, onde a


filosofía atingiu o máximo de seu acume.

— 67 —
20 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS> 134/1971

Platáo (f 348 a.C.) admitía que pudesse haver amor do


homem á Divindade («o Bom e Beto»), pois o inferior tena
todo interésse em se aproximar áo Superior e Perfeito; mas
nao haveria nsciprocidade ou resposta da Divindade ao ho-
mem, pois o Superior nada tem a lucrar, oaso se volte para
o inferior. Como se vé, o amor apresentado por Platáo era
amor interesseiro ou cobicoso (eros); daí a concepgáo reli
giosa désse filósofo.

Aristóteles (t 322 a.C), discípulo de Platáo, nao ultra-


passou o mestre; apenas deu configuragáo própria á posicáo
anterior. Deus (Motor imóvel, Ato puro) nem sequer tem
conhecimento do mundo terrestre e dos homens, pois, se os
conhecesse, teria em si a nogáo de seres contingentes e limi
tados; o finito e o imperfeito entrariam em Deus. Em conse-
qüéncia, para salvaguardar a transcendencia de Deus, o filó
sofo Ihe atribuía ignorancia em relagáo aos homens. Deus (o
Ato Puro) seria sumamente atraente para os seres inferiores,
por apresentar-lhes o modelo da existencia perfeita (isenta de
contradigáo ou deficiencia), nao, porém, ... por conhecer e
amar os homens!

Após Aristóteles, a filosofía grega entrou em declinio,


desinteressando-se da metafísica para se ocupar mais e mais
com questóes de ética e felicidade terrestre.

Quanto a mitologia grega, ela admitía um abismo entre


o homem e os deuses. Estes eram tídos como extremamente
felizes, pois estavam isentos da morte, ao passo que os homens
lewani existencia triste e acabrunhada porque sao tributarios
da morte; os deuses nao se interessam pelos homens. Foi Pla
táo quem tentou vencer a distancia, admitindo que os homens
possam tender ao mundo divino mediante um amor interes
seiro; todavía nao viu resposta...
Embora vivamos hoje numa civilizagáo marcada pela
mensagem do Evangelho e, por isto, muitos e muitos cristáos
estejam familiarizados com a noticia de que «Deus primeiro
nos amou», nao podemos esquecer que esta mensagem cons
tituí algo de totalmente inédito ou mesmo desconcertante para
a razáo natural. Á sabadoria dos homens que, antes de Cristo,
nao vía como Deus podería responder ao amor dos seus cli
entes, é agora interpelada pelo surpreendente anuncio de que
Deus tomou a iniciativa de amar o homem, e amá-lo mesmo
depois que éste disse seu Nao ao Criador: «Quando aínda
éramos fracos é que Cristo morreu pelos impíos. Difícilmente
alguém morre por um justo; por um homem bom talvez al-

— 68 —
NOVIPADE DO CRISTIANISMO 21

guém se resolva a morrer; Deus,. porém, demonstra o seu


amor para conosco pelo fato de Cristo haver morrido por nos,
quando aínda éramos pecadores» (Rom 5,6-8).
O que acaba de ser exposto, é muito bem sintetizado pelas
palavras de Paúl Xardel, sacerdote de missáo operaría:
«Nos nao somos cristáos porque amamos a Deus. Nos
somos cristáos porque eremos que Deus nos ama» («La fíamme
qui devore le berger». París 1969, p. 78).
Nao há dúvida, o cristáo é alguém que ama a Deus com
todo o coracáo e todas as fórcas, conforme o Evangelho (cf. Le
10,27). Mas ésse amor é prevenido pelo surpreendente amor
de Deus ao homem; é porque eré nesse «incrível» amor e
procura corresponder-lhe com seu amor e sua vida que o
homem vem a ser cristáo.

Para ilustrar...

É multó Interessante a ficefio do escritor Louis de Wohl no seu ro


mance "Mars na veut pas la guerre" (París 1955, p. 272). Imagina um
encontró de marcianos e terrfgenos (ou habitantes de Marte e da Térra).
Comecarlam a discutir entre si comparando as suas facanhas respectivas.
O terrlgeno, ao colocar o pó em Marte, verificarla logo que todas as nossas
realizacOes técnicas sSo apenas bagatelas em confronto com as dos mar
cianos ; estes se apresentarlam multo mate adlantados do que nos. Mas
o homem da térra poderla replicar que, por multo decaldos e sanguinarios
que sejam os habitantes da Térra, eles superam os de Marte as menos
sob um aspecto: "...Am (pretenso nome marciano de Deus), ele próprio
se fez homem e habitou entre éles, de sorte que os que créem nelé nSo
sao apenas os servos de Am, mas seus fllhos. Els por que dlzemos arre-
pendidos e com alegría: ó feliz culpa, que nos valeu um tal Redentor i"
Diante desta noticia (continua o romancista), o marciano fica intei-
ramente perplexo: "Deve ser verdade, diz ele, pots nem o espirito dos
Barka-dus (terrlgenos) nem o dos Fanu-dus (marcianos) sSo bastante gran
des para inventar isto".
É com estas palavras que o escritor tenta ilustrar o que há de gran
dioso e inédito na mensagem crista: jamáis inteligencia alguma terla ousado
conceber que "Ele prlmelro nos amou" I

3. Ressurreisáo de Cristo

Jesús se apresentou aos homens como o Messias, Filho


do Deus vivo (cf. Mt 16,16 19) ou como Deus feito homem
(cf. Jo 11,30; Mt 11,27). Quando Lhe pediram um sinal que
comprovasse a sua afirmagáo, Jesús prometeu o sural de
Joñas, ou seja, a sua ressurreigáo corporal após a morte
(cf. Mt 12,38-40). É, pois, a ressuíreigáo dentre os mortos
que, segundo o Evangelho, deve autenticar Jesús e o diferen-

— 69 —
22 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

ciar de qualquer mestre da humanidade (Buda, Confúcio, Lao-


-tsé, Maomé...). Sao Paulo chega a dizer: «Se Cristo nao
ressuscitou, é vá a nossa pregagáo e va a vossa fé... Se
Cristo nao ressuscitou, é vá a vossa fé» (1 Cor 15,14-17).

Pergunta-se, porém: a ressurreigáo de Jesús será fato


real e histórico?
— Duas respostas a esta pergunta sao possiveis:

«Jesús ressuscitou real e históricamente» ou


«Jesús nao ressuscitou, mas os Apostólos apregoaram a
sua pretensa ressurreigáo, cedendo á mentira, á fraude ou á
alucinagáo doentía».

Examinemos urna e outra hipótese:

1) Jesús ressuscitotu realmente (afirmagáo clássica). En-


táo tem-se um milagre ou urna obra que só Deus pode fazer.
Ésse milagre confirma <a Divindade de Jesús e explica os vinte
séculos de Cristianismo que se lhe seguiram.

2) Jesús nao ressuBcitou históricamente, mas foram os


Apostólos que, alucinados e predispostos, inventaram a noticia
da ressurreigáo do Mestre; esta mensagem seria produto de
mentes, enfermas e simplonas. Entáo dever-se-á dizer: a alu-
cinacjáo de onze pescadores da Galiléia, ignorantes e doentes,
conseguiu prevalecer contra o controle dos israelitas infensos
a Jesús e contra a perseguicáo do Imperio greco-romano.
Durante quase tres séculos, ou seja, até 313, o Cristianismo
foi combatido veementemente por pregar a ressurreicáo de
Cristo, de tal sorte, porém, que ninguém pode desmascarar a
fraude e a mentira dos Apostólos e discípulos. Ao contrario,
essa mentira conseguiu a vitória de modo que, finalmente, no
sáculo IV o Imperio Romano se fez cristáo, reconhecendo a
superioridade do Evangelho. E — mais aínda —, após os tres
séculos de perseguicáo, o Cristianismo, baseado em alucinagáo
e fraude, construiu a civilizacáo ocidental, cujos feitos mere-
cem admiragáo e estima. Em suma, vinte séculos de Cristia
nismo teriam por base a mentira e a doenca mental de pobres
pescadores da Galiléia.
Ora também isto é prodigio ou milagre, pois foge aos
trámites donormal e ñas categorías da lógica. Sómente boa
vontade ou fé aceita urna explicagáo tal.
Por conseguinte, o Cristianismo, pregando a ressurreigáo
de Jesús, coloca necessáriamente seus ouvintes diante de um

— 70 —
NOVIDADE DO CRISTIANISMO 23

portento e déles pede fé: ou a fé na ressurreicáo real do


Senhor ou a fé no poder da mentira e da fraude, que prevale-
ceram contra todo o controle dos sabios e dos governantes do
judaismo e do Imperio greco-romano.

Ora désses dois tipos de fé ou dessas duas crencas, parece


que a menos exigente, a mais razoável, anida é a fé na res
surreicáo histórica de Jesús (fé que admite, tenha Deus inter-
vindo na historia dos hornera e Ihes haja falado por Jesús
Cristo). Seria muito mais brutal, muito menos lógico, admitir
que o Cristianismo esteja fundado sobre mentira e doenga
mental.

Note-se outrossim: o budismo (como alias, qualquer outra


religiáo do mundo) nao se baseia necessáriamente sobre fatos
históricos; pode alguém ser budista, confuciano, chintoLsta ou
maometano..., abstraindo dos tragos biográficos do fundador
de sua Religiáo; basta-lhe aceitar as crencas ou a filosofía do
Mestne. Ao contrario, o Cristianismo se coloca sobre a base
de fatos históricos, aceitando o desafio da critica. O Evangelho
sempre foi apregoado juntamente com a mensagem de que
Jesús ressuscitou corporalmente, aceitando, com seguranca
inabalável, os riscos decorrentes da hipótese de que Cristo
nao 'houvesse ressuscitado.

Eis outra nota típica do Cristianismo:

4. Surpreendente propagagao

Os inicios da historia do Cristianismo tém sido considera


dos, de modo especial, como auténtico portento de ordem
moral.
Com efeito. O Evangelho conheceu, nos seus inicios, rá
pida e extraordinaria expansáo, embora lutasse contra ingen
tes obstáculos e contasse com insuficiencia de meios.

1) Rápida expansáo.... Sejam mencionados alguns pou-


cos tragos do fenómeno:

Em 64, o Imperador Ñero deu inicio á perseguigáo dos


cristáos na cidade de Roma. O escritor romano Tácito refere
que foi entáo martirizada «imensa multidáo» de discípulos de
Cristo (cf. Anais 15,44) — o que sugere notável propagacáo
da fé crista trinta e um anos após a morte do Senhor.

— 71 —
24 <PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

Em cérea de 197, o escritor cristáo Tertuliano assim se


dirigía aos perseguidores:

"Somos apenas de ontem, e já enchemos o mundo. Encontramo-nos


hoje em tudo que é vosso: ñas cldades, ñas lirias, ñas fortalezas, nos muni
cipios, nos pequeños burgos e mesmo nos campos, ñas trlbos, ñas curias,
no senado e no foro. Nao vos deixamos senSo os vossos templos vazíos.
Sem pegar em armas e sem mover urna rebellSo aberta, pederíamos com-
bater-vos, afastando-nos com o desdém de um recesso. Dada a grande
multldfio que somos, se nos separássemos de vos, retirando-nos para um
lugar distante, a perda de tantos crlstfios (nao importa quem sajamos nos)
solaparla o vosso orgulho de soberanos do mundo... Convosco flcarla
maior número de inimigos do que de súdltos. Els, porém, que agora ó
menor o número dos vossos inimigos por mérito desta multidfio de cristfios,
pois, na verdade, tendes súdltos cristios em quase todas as vossas cldades
e populacdes" ("Apologético").

O leitor fará o descontó exigido pela énfase de um orador


inflamado do norte da África. Como quer que seja, Tertuliano
reproduziu com fidelidade as grandes linhas da situacáo da
Igreja no Imperio Romano: já no fím do século II os cristaos,
por seu número e sua projegáo social, eram um poder com
que os Imperadores deveriam contar.
No inicio do ano 300 encontra-se outro testemunho, espe
cialmente valioso, porque proveniente de um pagáo. O Impe
rador Maximino escrevia a Sabatino urna carta, onde se lia:

"Creio que sabéis, tu e todos os cidadáos, como os nossos chefes e


pais Diocleciano e Maximlano, vendo que quase todos os homens abando-
nam o culto dos deuses e se unem á selta dos crlstfios, com razSo estabe-
leceram... que f6ssem de n6vo chamados ao culto tradicional mediante
pública correcSo e suplicio".

2) Ingentes obstáculos. Os destinatarios aos quais se di


rigía a pregagáo crista, achavam-se em nivel moral extrema
mente baixo: os vicios eram nao sómente praticados, mas até
exaltados ñas figuras das divindades da mitología e do paga
nismo. A ésse mundo os arautos cristaos pregaram a moral
mais pura e exigente: «Bem-averiturados os que tém o coracáo
puro, ... os que tém o espirito de pobre, ... os que choram».
Apresentavam como troféu urna cruz, que, para os antigos,
devia ser o que urna fórca é para nos. Quem se convertesse,
devia contar com' a perseguicáo e o martirio. Nao obstante,
em um século milhóes de pessoas aceitaram tal mensagem dura
e acolheram o martirio como fiesta nupcial.
Outros obstáculos ainda merecem atencáo:
Jesús Cristo, o fundador do Cristianismo, era de origem
judaica ou de nacáo desprezada por todos os povos de sua

— 72 —
NOVIDADE DO CRISTIANISMO 25

época; morrera condenado ao suplicio mais degradante que se


conhecesse entáo.

O Cristianismo era exclusivista, apregoando monoteísmo


rígido sem tolerar o mínimo trago de sincretismo religioso. Por
isto os cristáos passavam por inimigos da patria e do género
humano.

Quem se convertesse ao Evangelho, corría o risco de se


incompatibilizar com os familiares, perder bens e funcóes pú
blicas, arriscándose mesmo a sofrer o martirio.

Em urna palavra, pode-se dizer que o Cristianismo encon-


trou, conjuradas contra si, todas as fdrcas de que a sociedade
pode dispon o poder governamental e a opinláo pública, a
ciencia dos intelectuais e os preconceitos do povo, a policía e
as leis... Sustentou a luta durante quase tres sáculos, e saiu
vencedor.

3) Insuficiencia de meios. Os arautos do Cristianismo


nao eram filósofos nem oradores, mas um grupo de homens
rudes que ignoravam os recursos da propaganda, e nao tinham
em si mesmos coragem nem poder de fascinagáo nem ssnso
de organízagáo... O mais poderoso Imperio da antíguidade
se defrontou com urna populacho de fiéis inermes, que se
deixaram degolar e queimar vivos...; finalmente a Vitoria
coube nao ao Imperio, mas á causa dos mártires ou ao Evan
gelho (em 313, foi promulgada a Paz de Miláo).
Pode-se, pois, concluir que a difusáo do Cristianismo nao
se deve a fatores e artificios humanos, mas únicamente ao
fulgor e poder de atracjio do próprio Évangelhoj em última
análise, ela se deve á agáo da Providencia Divina, que, me
diante recursos inadequados, quis produzir os mais estupendos
efeitos.
Outro traoo que muito caracteriza o Cristianismo, é o
fato de ter suscitado na historia da humanidade urna sadia
e profunda

5. Revolu(6o moral

A mulher, no mundo pagáo, era vítima de males como


a poligamia, o adulterio, o divorcio, a prepotencia do ma
rido ... Depois de casada, podía ser tratada pelo esposo como

— 73 —
26 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

um ser qualguer de propríedade déle. As leis civis toleravam


o aborto, o infanticidio, a venda dos filhos...

Ora o Cristianismo reconheceu na mulher a dignidade do


próprio homem, considerando-a destinada a compartifhar com
ele as responsabilidades do lar e a educagáo dos filhos. Enal-
teceu o valor da prole.

O Cristianismo também ajudou os povos a reconhecer a


dignidade da pessoa humana. Condenou a urania e o (despo
tismo; reconheceu a autoridade dentro dos justos limites. .En-
Binou ao homem que nao há nem fato nem destino, e que
cada um é livre para-viver segundo a sua consciéncia. For-
mulou e difundiu os principios de igualdade e fratemidade em
virtude idos quais seriam aos poucos repudiadas as discrimi-
nagóes de raga, sexo, prepotencia política e nacionalidade: «Já
nao há judeu, nem grego, nem escravo nem livre, nem homem
nem mulher; mas todos sois um só em Cristo», dizia o Apos
tólo (Gal 3,28).

O Cristianismo, portante, foi a grande revolugáo moral


da historia. Soube transformar os homens a partir de qual-
quer nivel moral, elevando-os ao heroico exercício da virtude
através dos sáculos. Se há cristáos pouco edificantes, éles o
sao nao em conseqüéncia do Cristianismo, mas por incoerén-
cia com o Cristianismo; nao por serem cristáos, mas por
serem pouco cristáos.

As cinco notas que acabam de ser apontadas póem em


relevo o que o Cristianismo tem de mais típico ou mesmo de
singular. Constituem fenómenos que dáo relevo inconfundivel
ao Cristianismo frente aos demais sistemas religiosos da hu-
manidade. Pode-se mesmo dizer: depóem eloqüentemente em
favor da origem divina do Evangelho; sao o sinal de que Deus
mesmo é o Autor e Sustentáculo da Religiáo Crista.

Neste artigo retomamos, em parte, o que foi dito em


«P.R.» 111/1969, pp. 131-137. A estranha expansáo do Cris
tianismo e sua revolugáo moral devem ser consideradas em
cadeia com as tres outras notas atrás delineadas; o seu valor
se torna entáo aínda mais significativo ou mesmo — sem
favor — decisivo.

— 74 —
"Cristo, o hipnotizador", que tal?
Em stnlese: O dentista Dr. Marcos Hochheim tenta explicar os mila
gres de Jesús no seu llvro "Cristo, o hipnotizador" : seriam produtos de
arte hipnótica. O autor dlspensa-se de provar a sua tese recorrendo a
métodos científicos de exegese e citando bibliografía adequada. Procede,
antes, pelo emprégo do sarcasmo e da caricatura (em palavra e deseónos)!
Na verdade, a sugestáo, incutida com ou sem hipnose, é incapaz de
curar graves lesees ou alteracSes de tecldos ou órgSos. Ela atua, no má
ximo, em casos de doencas funcionáis (de fundo nítidamente psíquico ou
nervoso). Ademáis é ineficaz sobre pacientes que Ihe oponham bloqueios
psicológicos; nem age á distancia ou sobre criaturas inanimadas. Ora Jesús
sanou graves molestias orgánicas, á distancia; ressuscltou mortos, multl-
plicou páes, etc. As curas de lesSes efetuadas por Cristo foram instantá
neas, ao contrario do que se darla em casos ordinarios.
A fe que Jesús exaltava ao fazer seus milagres, era a fé em sua
missao messlanica; era exigida, ás vfizes, das pessoas que apresentavam
o paciente, e nao sem pre do próprlo paciente. Donde se vé quáo pouco
razoável seria identificar os milagres de Cristo com os de um hipnotizador.

Resposta: O Dr. Marcos Hochheim, dentista de P6rto


Alegre, publicou em 1962 o livro «Cristo, o hipnotizador», que
impressionou (e aínda vem impressionando) os leitores. É em
vista disto que abaixo procuraremos analisá-lo sumariamente
para propor algumas reflexces a respeito.

1. «Cristo, o hipnotizador»

O autor comeca por oferecer em suas 58 primeiras pági


nas algumas explicacóes de parapsicología e hipnose, ensi-
nando ao leitor como hipnotizar e quais os efeitos do hipno
tismo. A seguir, em tom altamente sarcástico, tenta reduzir
os milagres de Jesús á categoría de fenómenos hipnóticos rea
lizados por Cristo no intuito de mistificar ou ludibriar o povo
e vir finalmente a ser aclamado rei de Israel. A religiáo e os
feitos religiosos seriam urna especie de escravizacáo do espi
rito. Nao sómente as curas sao explicadas por Hochheim me
diante o recurso á hipnose, mas também portentos de índole
física, como a tempestade acalmada (Le 8,22-25), a pesca
milagrosa (Le 5,1-11), a multiplicacáo dos páes (Le 9,11-17).
. Os desenhos que acompanham cada capitulo, caricaturam
o texto evangélico ou o tema apresentado. A linguagem é, por
vézes, de gíria ou de nivel popular um tanto grotesco. O mé
todo segundo o qual o autor procede, nao é científico, pois
Hochheim nao faz a análise (Huí níiLÉff^lTf L1"II ln. Uiu.uHi a e
28 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

teológica) dos textos do Evangelho, mas sumariamente incute


as teses previamente tragadas. Nao cita bibliografía nem fon-
tes de estudo; em conseqüéncia, o livro fíca em nivel infra-
-dentífico, nao podendo ser levado a serio por pssquisadores
conscienciosos. O Dr. Marcos Hochheim, na verdade, tenta
sugestionar seus leitores em favor de seus postulados pre
concebidos, como se depreende desde a primeira capa do livro,
onde se Ié: «As pessoas religiosas nao devem ler éste livro...
Faga vocé mesmo os milagres que Jesús fez». Ás págs. 97s,
refere como sugestionou urna paciente para que tomasse um
banho de mar, e termina a narrativa dizendo: «Lembre-se,
meu amigo, que o sensível 'cai na conversa', por mais absurda
que ela seja» (p. 98): O Dr. Hochheim parece crer que todo
leitor seja um «sensivel», pronto, por conseguinte, a «cair na
conversa»... mediante os artificios de seu estilo (imagens,
linguajar, ironía...). Alguns tópicos da obra deixam perceter
que o autor é francamente espirita e adepto da teoría da re-
encamacáo dos espíritos (cf. pp. 46s. 72s. 262s).
Dado que o livro pode impressionar ou sugestionar os lei
tores sensíveis, procederemos abaixo a um exame critico da
tese de Marcos Hochheim.

2. O poder da sugestáo

A respeito da sugestáo como explicagáo dos milagres de


Jesús, já foram publicadas algumas consideracóes em «P.R.»
110/1969, pp. 54-67; 111/1969, pp. 110-114. Aqui ampliaremos
a reflexáo.

1. A sugestáo pode ser tida como um apelo imperioso,


consciente ou nao, proveniente de dentro (auto-sugestáo) ou
de fora (hétero-sugestáo) do paciente, apelo que desperta e
orienta autoritativamente as facilidades de imaginar e agir.
Com outras palavras: a sugestáo faz que surja na mente do
individuo urna imagem ou idéia-mestra qué rápidamente passa
a ocupar todo o campo mental dessa pessoa; entáo as virtua
lidades adormecidas do paciente se erguem num ímpeto repen
tino; esta comocáo violenta é, por vézes, salutar; remove obstá
culos psíquicos inveterados e cura males tidos como incuráveis.
Fala-se entáo, técnicamente, da «sugestáo vitoriosa».
A sugestáo é tanto mais eficaz quanto mais o sujeito seja
dócil ás insinuagdes do sugestionados As pessoas emotivas,
imaginativas, debéis sao particularmente aptas a receber su-
gestóss. O poder destas é aumentado nos estados de sonó na-

— 76 —
«CRISTO, O HIPNOTIZADOR* 29

tural ou artificial (hipnose), quando as facilidades do individuo


sao subtraidas ao controle que habitualmente exercem a razáo,
o ambiente de vida, as leis e instituicóes, etc.
Desde épocas remotas, a sugestáo tem sido utilizada na
medicina e na magia, servindo de meio terapéutico (ou, por
vézes, concorrendo para maleficios). Pacientes que se julga-
vam incapazes de comer ou de ss mover ou de dispensar um
tranquilizante, tém passado assim a comer, andar ou abster-se,
seguindo o imperativo do médico de sua confianga.

2. Verifica-se, porém, que o poder da sugestáo na


obtencáo de curas é assaz delimitado, segundo os especialistas.
A sugestáo é capaz de curar males funcionáis (males inerentes
as fungóes nervosas ou psíquicas), nao, porém, males orgánicos
ou molestias caracterizadas por importantes alteracoes de te-
cidos, alteragóes devidas á perda ou á criagio de substancias.
Em conseqüéncia, dir-se-á: urna afonía (perda da voz),
urna amaurose (perda da visáo sem lesóes do ólho, das vias
óticas ou dos centros visuais) podem ser curadas subitánea
mente sob o efeito da sugestáo ou de um choque (é o que se
observa ñas pessoas histéricas).
Ao contrario, a destruigáo visivel (ao menos, em radio
grafía) de um parénquima pulmonar, como no caso de caver
nas tuberculosas, ou de um tecido ósseo, sob o efeito de urna
osteíte ou de fratura aberta, o cáncer indiscutívelmente
diagnosticado após biópsia e exame histológico do tecido
doente sao molestias orgánicas que a sugestáo nao cura K
A sugestáo vem a ser a auxiliar da medicagáo comum:
ela cura males puramente psíquicos, que muitas vézes ante-
cedem, acompanham e geralmente agravam as molestias físi
cas ou somáticas.

3. Os psicanalistas restringem o éxito (ou a duragáo


do éxito) da sugestáo. Ten'ham-se em vista os dizeres de Ernest
Jones, que interpreta a escola freudiana:
"Apesar das exageradas pretensfies dos hipnotizadores profissionals, ó
geralmente reconhecldo que os resultados obtidos pelo hipnotismo e a su-
gestSo multo delxam a desojar, do ponto de vista da duracfio. Nao há dúvlda.

1 Quanto ás doencas mentáis relacionadas com lesSes, há dificuldade em


classlficá-las. Com efeito, basta urna perturbacño mínima em regifio Impor
tante do cerebro para provocar graves disturbios no dominio psíquico.
— Doutro lado, pode acontecer que vultosas perdas de substancia cerebral só
acarretem pertúrbaseos mentáis muito discretas.

— 77 —
30 cPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

atgumas psiconeuroses benignas podem melhorar em termos duradouros,


se bem que, mesmo nestes casos, o sucesso seja incerto e inconstante. Nos
casos, porém, mals ou menos graves, a critica fundada sobre a experiencia
nao hesita em recusar o otimismo desarrazoado que tantas vézes ouvlmos
apregoar" ("Traite théorique et pratique de psychanalyse". París 1925, p. 481).

Passemos agora á consideracáo direta do Evangelho.

3. Milagros de Cristo e sugestáo

A dificuldade (ou mesmo impossibilidade) de explicar os


milagres do Senhor por efeito de mera sugestáo procede de
tres títulos:
a) A maioria dos -milagres relatados pelo Evangelho con
siste em curas de doengas orgánicas, como a lepra, a hidro-
pisia, a cegueira de nascenga, a surdo-mudez... Em tais casos,
como foi dito, a sugestáo pode facilitar a cura, levantando o
ánimo do enfermo, mas nao a produz diretamente.
b) Aínda que, por hipótese, a sugestáo explicasse a cura
de molestias orgánicas, note-se que ela só seria eficaz em su-
jeitos que a quisessem aceitar. Diz o Dr. Berheim: «Toda su
gestáo tende a se realizar; mas nao se realiza sempre. O
paciente pode opor sua vontade á tendencia instintiva de acei
tar e realizar a idéia sugerida» («De la suggestíon», p. 24).
Se, por conseguirte, o pacienta se mostrar alheio ou infenso
ao sugestionador, exercendo as suas facilidades criticas, a su
gestáo nao poderá ocorrer. Ora certos milagres do Evangelho
foram realizados á distancia, como a cura do servo do cen-
turiáo (em Mt 8,1-13), a da füha da mulher sirio-fenicia (em
Mt 8,25-30); ou em favor de pessoas inconscientes, como o
demoniaco epilético (em Mt 9,16); Maleo, a quem Jesús res-
tituiu a oreHia amputada por Pedro, nao estava em condiedes
de ser sugestionado (cf. Le 22,51).
c) A sugestáo nao tem influencia sobre os mortos (dos
quais Jesús ressuscitou tres, conforme o Evangelho) e sobre
a natureza inanimada (tenham-se em vista a multiplicagáo dos
páes em Me 6,30-44, e a tsmpestade acalmada em Me 5>35-41).
d) As curas realizadas por Jesús se deram instantá
neamente, embora tenham ocorrido quase todas no setor da
biología. Consistiram, sim, na restauracáo e na reproducáo de
células. Ora «os fenómenos biológicos sempre exigem tempo
notável. Sao dependentes da natureza coloidal do plasma. Os
numerosos catalisadores que neste se encontram, facilitam e
aceleram os fenómenos da vida, mas nunca os tornam ex-

— 78 —
«CRISTO. O HIPNOTIZADOR» 31

cepcionalmente rápidos. Urna divisáo de células, ñas melhores


condigóes, requer cérea de meia-hora para se realizar. Mais
tempo ainda ss exige para que urna célula jovem atinja a sua
diferendagáo especifica. Além disto, considere-se o grande nú
mero de células que se encontram em um pedago de carne
humana. As células sao da grandeza de poucos milésimos de
milímetros; existem aos bilhóes. Mais ainda: a formacáo de
células nao pode ser simultánea, pois oada célula dá origem
a outra mediante a cisáo de si mesma; sabe-se, por exemplo,
que a cicatrizagáo procede dos labios para o centro da ferida»
(Marcozzi, «I miracoli di Gesu», em «H Símbolo» VTI-VIII.
Assis 1950, p. 107).
Mesmo ñas curas psíquicas realizadas por via de sugestáo
o fator «tempo» é, muitas vézes, importante ou mesmo indis-
pensável. Os psicólogos e médicos sabem como os pacientes
freqüentemente se defendem; para se deixar dominar (o que
nem sempre acontece), é, nao raro, necessário recorrer a tra-
tamentos longos, efetuados em condicóes de isolamento e de
regime. As curas psicoterápicas nao sao nem mais rápidas
nem mais facéis do que as de doengas orgánicas. Escreveu o
Dr. Ernest Jones, um dos principáis arautos da psicanálise
nos países de lingua inglesa: «O tratamento (psicoterapéutico)
exige grande sacrificio de tempo. Em certos casos (sem dú-
vida, raros), Freud viu-se mesmo obligado a consagrar aos
seus pacientes urna hora por día durante tres anos consecutivos.
O esfórco exigido do paciente nao é menos considerável»
(«Traite théorique et pratique de la Psychanalyse». París 1925,
p. 393).
Ora a instantaneidade foi sempre urna característica dos
auténticos milagres; aínda hoje a Igreja a exige sempre que
se trate de averiguar algum feito milagroso.
Levanta-se, porém, ainda outro aspecto do problema:

4. E a fé que salva ?

Ao realizar as suas curas, Jesús nao raro exigía a fé dos


pacientes ou ao menos a elogiava: «Se podes crer, tudo é pos-
sivel áquele que eré» (Me 9,23), diz Jesús ao pai do jovem
demoniaco. Ao cegó Bartimeu exclamou: «Vaí, tua fé te sal-
vou!» (Me 10,53); e á mulher hemorroíssa: «Minha filha, tua
fé te salvou!» (Me 5,34).
Ésse apelo á fé parece a muitos estudiosos nao ser senáo
urna faceta do sugestionamento. Alias, em linguagem técnica,

"79
32 tPERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

forjaram-se as expressóes sinónimas «sugestáo vitoriosa> e «fé


que cura».

«Faith-ttJealing* ou «La foi qui guérit», tal é o título do


estudo de Charcot, publicado primeiramente em inglés na «The
New Review» (dezembro 1892) e depois em «Archives de
Neurologie» 11893, 74ss. Éste estudo teve imensa repercussáo
tanto no mundo médico como no extra-médico, provocando
multidáo de artigos e trabalhos pro ou contra a tese da «fé
que cura».

Nao poucos críticos liberáis adotam a teoría. Só admitém


como fatos «portentosos» ,do Evangelho aqueles que pos3am
ser explicados pela fé sugestionante ou sugestionada. Tenham-
-se em vista Ernest Renán, Alfied Loisy, J. M. Guyau, Émile
Zola, Estlin Oarpenter, Edwin Abbot, von Harnack, Eduard
Mayer, J. Klausner...
Que dizer?
— Pódele responder com o Dr. Moxon: «Na medida em
que o mal é urna falta de fé, nessa mesma medida a cura do
mal é um caso de fé que cura» '. Sem dúvida, admítanse equi
valencia entre o poder criador e o poder curador da imagi-
nacáo (que em certos casos é chamada «fé»).
Note-se também que o procedimento de Jesús é bem dife
rente da terapéutica, dos psiquiatras e sugestionadores. A fé
que Cristo exige, «a fé que salva», é urna disposicáo religiosa
que tem por objeto geralmente a pessoa e a missáo do Senhor:
nao é conñanca cega no poder taumatúrgico do Mestre. Jesús
a pede ora ao paciente mesmo, ora aos parentes e amigos
diste (o que excluí influencia física sobre o enfermo). Essa
fé nao é sempre associada a efeitos materiais, mas nao raro
tem por conseqüéncia realidades espiritual, como a remissáo
dos pecados. Assim

em Me 2,5 é elogiada a fé nao só do paralítico, mas tam


bém a de seus companheiros; e o fruto dessa fé é o perdáo
dos pecados. «Ao ver a fé déles, disse Jesús ao paralítico: 'Meu
filho, os teus pecados té sao perdoados'».
Em Le 7,47-50 Jesús exprime algo de semslhante diri-
gindo-se ao fariseu a respeito da pecadora que o ungirá:
«Digo-te que Ihe sao perdoados os seus muitos pecados, por-

1 "In so far as the dlsease is a lack of faith, just so far ¡s cure of the
disease a case of falth-healing", citado por R. J. Ryle: "The neurotic theory
and the mlracle of Heallng", em "The Hibbert Journal" V 1907, p. 584.

— 80 —
«CRISTO, O HIPNOTIZADOR 33

que muito amou... Disss depois á mulher: 'Os teus pecados


estáo perdoados'... E Jesús disse & mulher: 'Salvou-te a tua
fé; vai em paz'».
Em Me 5,36.41s Jesús ressuscita a filha de Jairo em vista
da fé de gau pai.
Em Me 9,22s, o epilético é curado em atencáo á fé do seu
genitor.
Em Me 7,26-30 Jesús cura a filha da sirio-fenicia que tem
fé viva, á distancia da menina.
Em Mt 8,5-13 o servo do centuriáo (á distancia) é curado
em atencáo á fé do respectivo pai.
Em Me 10,46-52 é a fé em Jesús «Filho de Davi» que
salva o cegó de Jericó.
Em Mt 11,20-24 Jesús censura as cidades de Corozaím,
Betsaida e Cafarnaum porque nelas se efetuaram grandes mi-
lagres e, nao obstante, os seus habitantes se mantiveram incré
dulos. Éste texto dá a ver que a realizacáo de portentos da
parte de Jesús acarreta grave respon9abilidade moral para os
beneficiarios. O milagre tem valor e significado sobrenaturais,
segundo Jesús.
Por último, deve-se observar que Cristo efetuou seus por
tentos sem recorrer a tratamento anterior ou a preparacáo
plañejada; serviu-se dos mesmos procedimentos para obter os
efeitos mais diversos; agiu á distancia sobre pessoas que igno-
ravam a hora em que o Mestre seria interessado por elas...
As consideragóes déste artigo seráo completadas por
quanto será dito em outro artigo de «P.R.», em que se con-
frentaráo Jesús e os taumaturgos pagaos da antíguidade.

Bibliografía:

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L. Monden, "Le miracle, signe de salut". Desclée de Brouwer 1960.
L de Grandmaison, "Jésus Christ. Sa personne, son message, ses preu-
ves". 2 vols. Parte14 1931.
P. Cerruti, "O Cristianismo em sua origem histórica e divina". Rio de
Janeiro 1963.
X. Lóon-Dufour, "Etudes d'Évangile". París 1965.
K. Adam, "Jesús Cristo". Pelrópolis 1937.
Daniel-Rops, "Jesús no seu tempo". Porto 1950.
A. Assallly, "Sur les miracles: l'instantanéité des guérisons", em "Eccla-
sia" 256 (julho 1970), pp. 51-53.
H. Rondet, "L'Évangile sans mythes", em "Ecclesia" 258 (setembro 1970)
pp. 7-9.

— 81 —
Joana d'Arc:
Igreja condena e Igreja reabilita?
Em sintese: A figura de Joana d'Arc (1412-1431) se coloca no con
texto da Guerra dos Cem Anos (1337-1453) entre a Franca e a Inglaterra.
Em 1428, quando a causa da Franca parecía irrevogávelmente perdida, Joana
d'Arc, camponesa Iletrada dirigida por vozes celestes, conseguid o favor
das autoridades francesas. Estas Ihe concederam tropas, com as quals le-
vantou o céreo de Orleáes em 1429. A acSo de Joana era fatal para a Ingla
terra. Oal o Interésse do poder inglés em eliminar a jovem guerreira. Já que
a donzela se dizia movida por vozes celestes, o meio mals eficaz para con-
dená-la naquela época era a acusac&o de que estava sob o poder de Sata-
naz como bruxa, hereje e impostora. Os ingleses conseguiram mover em seu
favor o blspo de Beauvais, Pierre Cauchon, o qual constltuiu um tribunal
para julgar Joana d'Arc. Nem Cauchon nem os assessores que este chamou
a si, em conivéncia com os malorals da Inglaterra, possuiam autoridade le
gitima ou delegacáo para falar em nome da Igreja. Condenaram finalmente
Joana d'Arc, que apelava para o Papa e que certamente nüo terla sido con
denada se houvesse sido apresentada ás legitimas autoridades da Igreja. O
processo de Joana d'Arc foi, portento, aefio do poder político inglés dissi
mulado sob pretextos religiosos. NSo é, pols, para admirar que, urna vez
passada a onda de antlmedlevallsmo dos séculos XVI-XVIII, a Igreja haja
reabilitado a memoria de Joana d'Arc.

Certamente nao foram razóes de patriotismo francés que ¡nspiraram a


canonlzacfio da donzela, mas, sim, as eximias virtudes desla virgem, cuja
fé e pureza se revelaran) heroicas durante os seus vlnte anos de vida.

Resposta: Aínda recentemente — e mais urna vez — o


caso de Joana d'Arc veio á baila, ocupando a opiniáo pública
no Brasil, pois a Abril Cultural Ihe dedicou um álbum da serie
«Grandes Personagens da Historia».

A figura de Joana d'Arc atrávés dos séculos foi estudada


com interésse por vézes'apaixonado. Os enciclopedistas fran
ceses do sáculo XVm (Voltaire, Diderot, Montesquieu...)
atacaram-na sarcástocamente, encontrando fortes aplausos por
parte da sociedade frivola da época. A obra satírica «La
Pucelle» de Voltaire foi reeditada mais de 60 vézes entre 1760
e 1790. Ao contrario, o povo francés sempre se conservou grato
e fiel a sua heroína. No fim do sáculo passado (27/1/1894)
miciou-se o processo de glorificagáo de Joana d'Arc dentro da
Igreja; aos 18 de abril de 1909 Pió X declarou-a bem-aventu-

— 82 —
PROCESSO DE JOANA D'ARC 33

rada e, finalmente, Bento XV, aos 16 de maio de 1920, cano-


nizou a donzela. .

Ora a condenacáo de Joana d'Árc por parte de um tri


bunal dito «eclesiástico» e, posteriormente, a reabilitacjio da
mesma sao motivo de perplexidade por parte do público.

Éste desconcertó, porém, pode ser saneado sem dificul-


dade desde que se conheca exatamente o tramite da vida e do
processo de Joana d'Arc. Tal será o objeto da exposigáo a ser
feita ñas páginas que se seguem.

1. A figura histórica de Joana tPArc

1.1. Os precedentes

O cenário histórico em que aparece Joana d'Arc, é o da


guerra dita «dos Cem Anos» (1337-1453) entre a Franca e a
Inglaterra. »

Em 1415 Henrique V da Inglaterra invadiu a Franca com


o intuito de derrabar o rei Carlos VI. Os invasores encontra-
ram apoio da parta da Borgonha, cujo duque Filipe o Bom
reoonheceu Henrique V da Inglaterra como legítimo soberano
da Franga; ao mesmo tempo, Carlos VI, cuja saúde mental
estava abalada, deserdou seu fílho e nomeou o monarca ingles
herdeiro e regente do país. Em 1422, morreram Henrique V
e Carlos VI. O fílho déste, Carlos VII, féz-se coroar em
Poitiers, e estabeleceu sua corte em Bourges, enquanto os
ingleses caminhavam em territorio francés e assediavam a
cidade de Orleáes. Carlos VII era figura fraca, que nada fazia
para deter os invasores, mas, ao contrario, permitía que
homens ineptos e gozadores dirigissem o seu povo.
Foi entáo que entrou em atjáo uma jovem de 17 anos, que
prometía salvar a Franca.

1.2. tnterven$£o de Joana

Joana nasceu em Domrémy, de familia camponesa, aos


6 de Janeiro de 1412. Nao aprendeu a ler e escrever, mas
possuia profundo senso religioso. Aos 13 anos de idade, co-
mecou a ouvir certas vozes, que ela identificou com as de
S. Miguel Arcanjo, S. Catarina de Alexandria e S. Margarida;
exortavam-na a ir socorrer a Franca.

— 83 —
36 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

A éste propósito já se póe urna questáo debatida: as reve-


Iacóes que Joana anunciava e que se repetiram até a sua
morte, nao teráo sido mero fenómeno de ahicinagáo? — Note-
-se que a alucinagáo significa um estado patológico, fonte de
falsos juizos e de comportamento moral descontrolado. Ora
em toda a conduta de Joana d'Arc náa há vestigios de pros-
tragáo física nem de aberragáo intelectual ou de incoeréncia
de dizeres e atitudes; ao contrario clarividencia e firmeza no-
táveis se manifestam. Torna-se, por conseguinte, difícil, se nao
ilógico, sustentar a tese das «alucinagóes».

Sómente tres anos mais tarde, em 1428, a jovem resolveu


atender aos apelos celestes. Um tío levou-a entáo á presenca
do capitáo Robert de •Baudricourt, delegado do rei em Van-
couleurs. Vendo-a, o oficial desprezou-a, devolvendo-a a seu
pai; éste ameagou afogá-la. Joana voltou a procurar o capitáo,
impressionando-o por sua energía. Roberto mandou-a ter com
o rei Carlos VII, acompanhada por urna escolta de seis homens,
que deviam defendé-la na caminhada por estradas perigosas.
A donzela pediu e obteve também um cávalo e trajes masculinos
(mais adaptados a missáo militar que ela empreendia). Che-
gando em Chinon aos 6 de margo de 1429, Joana idientiñcou
o rei dissimulado entra os seus cortesáos. Logo lhe pediu solda
dos para ir levantar o céreo de Orleáes. Todavía aquela jovem
de 16 anos, vestida de trajes masculinos, nao inspirava confi-
anga. Tendo insistido, Joana foi submetida a interrogatorios
e exames sobre a fé e a moral pelo espago de tres semanas;
já que o laudo resultou favorável, Carlos VII reconbsceu o
possível valor do empreendimento de Joana.

A situagáo para a Franga era táo grave que sómente urna


intervengáo ¡do céu poderia salvar a nagáo. O rei concedeu-lhe
entáo um pequeño batalháo destinado a ir .socorrer a sitiada
cidade do Orleáes, que estava para cair. Joana nao combateria,
mas estimularía os guerreiros, empunhando um estandarte
brancb, sobre o qual estava a figura de Cristo entre dois anjos.
Finalmente, aos 8 de máio de 1429 os ingleses muito imprevis
tamente- levantaram o céreo de Orleáes, dando entrada na
cidade a Joana d'Arc e sua tropa.

Assim vitoriosa, a jovem quis levar Carlos VII a Reims


para que recebesse a devida sagragáo regia — o que se deu a
17 de julho de 1429. Ao lado do monarca, a benemérita heroína
lhe disse entáo: «Gentil roi, maintenant est faict le plaisir
de Dieu».

— 84 —
PROCESSO DE JOANA D'ARC 37

Joana dava por finda a sua missáo, quando o rei lhe


pediu continuasse a guerra. A donzela, dócil, muito se empe-
nhou pela reconquista de París, mas aos 23 de maio de 1430,
perto de Compiégne, foi presa pelos burgúndios, aliados dos
ingleses. Estes a compraram palo prego de 10.000 francos-ouro,
e a levaram para Ruáo, onde Joana deveria ser julgada. Aos
ingleses interessava nao apenas manter a donzela encarcerada,
mas também destruir o seu pnastígio aos olhos do público.
— Éste plano haveria de ser executado mediante pretextos
religiosos que, para os homens da época, eram os mais per
suasivos.

1.3. Mentalidade do século XV

Nao se 'poderiam entender adequadamente o processo e


as maquinagóes empreendidos contra Joana d'Arc se nao se
levasse em conta a mentalidade de ingleses e franceses da
época :

a) Joana dera á sua missáo militar um caráter religioso,


dizendo que Deus queria por seu intermedio libertar a Franca.
— Por consegunte, os inimigos, para desprestigiá-la, tentariam
demonstrar que Joana de modo nenhum podía ser enviada de
Deus, por estar sob a influencia do' demonio, como hereje,
bruxa, impostora» etc. — Caso isto ficasse comprovado, tam
bém o rei Carlos VII perdería a sua autoridade; seria evidente
que se aliara a urna filha de Satanás, por obra da qual havia
sido sagrado. Os franceses poderiam entáo perder a esperanza
de obter a vitória final.

Estas circunstancias manifestam que os ingleses tinham


o máximo interésse em servir-se da Religiáo contra Joana d'Arc,
a fim de promover os seus interésses nacionais.

b) A mentalidade popular da época era levada a crer


que vitória obtida em guerra era sinal de que Deas apoiava
o vencedor. Ora os ingleses haviam conseguido um triunfo re
tumbante em Azincourt (1415), onde cinco mil guerreiros
tinham prostrado toda a cavalaria francesa, lutando um soldado
contra seis cavaleiros. Táo fulgurante vitória, pensava-se, só
tena sido alcanzada com a colaboragáo do céu; donde podiam
muitos concluir que Joana contradizia ao curso dos aconteci-
mentos sobre o qual Deus já proferirá o seu juizo.

c) A própria oanduta de Joana se prestava á deturpa-


gáo... As calamidades que assolavam a Franga havia cérea

— 85 —
38 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS? 134/1971

de 75 anos, excitavam a imaginagáo popular, provocando o


surto sucessivo de falsos taumaturgos e visionarios. Como
nagüela hora se distinguiría Joana de urna Catarina de la
RocheUe ou do pastor Guilherme de Gévaudan, comprovadas
vitimas da ilusáo? — Além disto, o espirito medieval podía fácil
mente escandalizar-se com a figura de urna jovem vestida de
cavaleiro a cavalgar junto com urna tropa de soldados; ora
tal era o caso de Joana. Ninguém concebía que urna virgem
crista se pudesse apresentar nesses termos. Compreende-se
entáo que muitos dos contemporáneos da heroína se tenham
podido iludir a seu respeito.

c) Será preciso levar em conta também a colaboracáo


da Universidade de París, setor de grande autoridade, que os
ingleses ganharam para a sua causa, O espirito que entáo
animava os professóres dessa entidade, nao era muito sadio.
Tendiam a considerar-se os luzeiros da S. Igreja; os mais
moderados entre éles ficavam céticos ao ouvir falar de
Joana; muitos, porém, Ihe eram enérgicamente contrarios. A
pobre camponesa, com seus poucos anos de idade, deixava~se
guiar por pretensas visóes mais do que pelas idéias dos profes
sóres; quería passar por mais perita do que os capitáes do
exército, sem pedir venia nem autorizagáo aos doutos lentes!

Á luz destas características da mentalidade da época, ana-


lisemos agora

1.4. O desfecho da historia de Joana

Os ingleses, tendo que apelar para motivos religiosos na


sua acáo contra a jovem guerreira, encontraran! apoio valioso
na pessoa do bispo de Beauvais, Pierre Cauchon, todo devotado
á causa dos invasores e, por isto, refugiado em Ruáo, territorio
possuído pelos ingleses.
Nao foi difícil encontrar pretexto para se iniciar um pro-
cesso contra Joana: as suas apregoadas mensagens celestiais
forneciam fundamento a acusagóes de bruxaria e heresia!
Cauchon foi constituido presidente do respectivo tribunal. Para
dar ao júri o aspecto e a autoridade de tribunal da Inquisioao
(tribunal oficial da S. Igreja!), chamaram a participar da
mesa o Vice-Inquisidor de Ruáo, Jean Lemaitre. Cauchon con-
vidou aínda grande número de assessóres e jurados, aos quais
o govérno inglés fez saber que tinha meios para os coagir, caso
rejeitassem participar do processo; 113 juristas aceitaram a
intimacáo, dos quais 80 pertenciam á Universidade de París.

— 86 —
PROCESSO DE JOANA D'ARC 39

O júri eya de todo ilegitimo, pois Cauchon nao tinha sobre


Joana nem a autoridade de bispo diocesano nem a de legado
pontificio. A Santa Sé nao fóra era absoluto informada da
constituicáo de tal tribunal.

Contudo o processo foi encaminhado. A jovem sofreu maus


tratos físicos e moráis; submetida a interrogatorios capciosos,
que visavam a arrancar-lhe a confissáo de heresia e supers-
tigao, respondeu sempre com simplicidade e nobreza; chegou
a apelar para o Santo Padre: «Pego que me levéis iá presenga
do SenhOr nosso, o Papa: diante déle rasponderei tudo que tiver
de responder». «Tudo que eu disse, seja levado a Roma e
entregue ao Sumo Pontifica, para o qual dirijo o meu apelo !»
Em váo, porém, apelou.

Finalmente, após peripecias diversas, Joana foi fraudu


lentamente condenada qual hereje, relapsa, apóstata, idólatra.
Entregue ao brago secular, sofreu a morte pelas chamas aos
30 de maio de 1431, enquanto olhava para o Crucifixo e orava.
Na última manhá de sua vida, ainda dizia Joana a Cauchon:
«Eu morro por causa de V. S.; se me tivésseis colocado nos
cárceres da Igreja,... isto nao teria acontecido».

1.5. Após a execujáo

A opiniáo pública viu-se profundamente abalada pelo


ocorrido. Apesar de todas a.s acusagóes, -a massa do povo ainda
tinha Joana na conta de vitima da injustiga de seus inimigos.
Conseqüentemente, pouco depois de entrar solenemente em
Ruáo (dezembro de 1449), o rei Carlos VII deu inicio a urna
revisáo do processo condenatorio, revisáo que terminou favo-
rável á jovem. Seguiu-se em 1445 o inquérito pontificio, já que
Joana fóra abusivamente sentenciada em nome da Inquisigáo:
após numerosos interrogatorios, o arcebispo de Reims, aos 7 de
julho de 1456, perante numerosa assembléia de clérigos e leigos
em Ruáo, publicou a conclusáo do «processo do processo», reabi-
litando a memoria da donzela.

De modo oficial e solene, a Igreja reabilitou a memoria de


Joana d'Arc, reconhecendo-lhe os méritos e a santidade em 1920.

Por que tanto se fez esperar easa completa reabilitagáo ?

Os tempos que se seguiram ao ano de 1456, foram de reagáo


contra o espirito e a vida da Idade Media : na época da Renas-
cenga o adjetivo «gótico» vinha a ser sinónimo de «bárbaro»;

— 87 —
40 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

quebravam-se os vitreas das catedrais para substitui-los por


vidragas brancas; o famoso poeta Pierre de Ronsard (fl585),
imitador dos clássicos gregos e latinos, qualificava o período
medieval de «sáculos grosseiros»; mais tarde, Voltaire"(fl778)
e aínda Anatole France (tl924) mostravam-se diretamente in-
fensos á jovem guerreira de Domrémy. Foi preciso que a opiniáo
pública em geral proferisse um juízo mais objetivo sobre a Idade
Media para se pensar em exaltar a figura táo característica
mente medieval de Joana d'Arc.

2. Como julgar os fotos ?

Quem considera o processo de Joana d'Arc fica geralmente


surpréso pelo papel que a Igreja néle desempenhou: fiará con
denado á morte a inocente criatura para, bem mais tarde, como
que cedendo a um complexo de culpa, reabilitá-la? Nao haverá
nisso tudo urna demonstragáo de fraqueza e contradigáo da
Igreja ?

— A resposta procederá por partes.

2.1. O fenómeno «Inquisijoo»

Foi a Inquisigáo que condenou Joana d'Arc. Ora, dizem-


-nos, a Inquisigáu era um tribunal eclesiástico.

Sobre a origem e as modalidades da Inquisicáo já foram


publicados artigos em «P.R.» 8/1957, pp. 23-33; 38/1961, pp. 78-
-87. O que interessa realgar neste contexto, é que, a partir do
século XIV, fbram-se afirmando tendencias nacionalistas e abso
lutistas entre os reis cristáos; neste movimento a dianteira
coube ao rei Filipe IV o Belo da Franga (1285-1314). As autori
dades e os juristas civis comegaram entáo a ver com maus olhos
o tribunal da Inquisigáo, que até aqueta, época funcionava no
reino por autoridade do Sumo Pontífice, aplicando sua legislagáo
própria. Na mente de nao poucos magistrados surgiu a questáo:
será que, em vez de auxiliar a Inquisigáo eclesiástica, a auto
ridade civil nao poderia inverter as papéis e servir-se dala como
de um instrumento do reino ?

É esta a tendencia que, de fato, domina a historia da Inqui


sigáo nos sáculos XIV/XV: o poder dos reis procurava, mediante
as sentengas ida Inquisigáo, atingir os inimigos da monarquía
como se fóssem os inimigos de Deus; nao poucos abusos fo-
ram-se cometendo sem o conhecimento ou até á revelia dos Pon*

— 88 —
PROCESSO DE JOANA D'ARC 41

tífices Romanos (haja vista ao famoso processo dos Templarios


logo no inicio do séc. XIV; cf. «P.R.» 16/1959, pp. 169-174).

Pois bem. O processo de Joana d'Arc no comégo do séc. XV


é mais um prooasso désse tipo. Parece que urna análise serena
dos acontecimentos permite concluir que a condenagáo da he
roína foi obra de um govérno civil desejoso de promover os inte-
résses temporais de sua nagáo, ou seja, da Inglaterra. Ao pro
cesso civil foi, sim, dada urna capa religiosa, acentuada pelo fato
de que alguns eclesiásticos, cedendo a fraqueza humana, se pres-
taram ao papel de juízes de Joana d'Arc.
Na verdade, a S. Sé nao teve parte nem nos preliminares
nem no andamento do processo. Assaz significativo é o fato de
que, um mes antes da condenagáo de Joana, ou seja, em fins de
abril de 1431, o Papa Eugenio IV escrevia a seu legado na
Franga, o Cardeal de Santa Cruz, intimando-o a procurar a re-
conciliagáo dos reís da Franga e da Inglaterra; ñas instrugóes
que deu, nao se encontra urna só mengáo do processo de Joana
d'Arc, que certamenta figuraría na ordem do dia, se o Papa
tivesse conhecimento da causa. Eugenio IV só soube do- que se
dera, depois que Joana fóra quebrada viva.

Mas entáo que dizer das figuras eclesiásticas que colabora-


ram para a condenagáo da heroína ? N30 sao responsáveis e
culpadas ?

Tenha-se por certo que nao representavam a Igreja como


tal. O bispo Cauchon nem era o prelado diocesano de Joana nem
recebera delegagáo canónica para agir como tal; sua autoridade
lhe vinha toda do rei da Inglaterra. Por conseguinte, perante o
Direito eclesiástico inválidos eram os poderes que ele pretendeu
exercer e comunicar aos seus assessóres, inclusive ao Vice-Inqui-
sidor, que agia sob a sua dependencia. Sem querar penetrar ñas
consciéncias (que só Deus pode perscrutar), naconhecer-se-á que
o comportamento externo de Cauchon e de quantos oom ele
colaboraram, foi expressáo de fraqueza de ánimo.

2.2. Joana d'Arc : por que santa ?

Urna nova questáo, porém, se coloca: por que quis a Igreja


catalogar Joana d'Arc entre as santas virgens, quando a figura
dessa jovem é principalmente a de urna heroína militar e na
cional ?
Certamente nao foram títulos meramente naturais que leva-
ram a canonizar Jcana d'Arc; para tanto, só se ponderam crité-

— 89 —
42 «PERGUNTE E RESPONDEREMOS» 134/1971

ríos sobrenaturais, dos quais o primeiro é a heroicidade das


virtudes. Eis, porém, que, independentemente da bravura e de
faganhas bélicas, a figuna de Joana d'Arc aparece ornada de
notáveis idons do Espirito Santo.

A sua conduta de vida foi nao sómente irrepreensível até o


fim, mas constitum eloqüente testemunho de urna fé fora do
comum, fé que, realmente, como afirmava a jovem vítima, devia
ser robustecida por gragas especiáis da Providencia. Joana teve
ssmpre a clarividencia sobrenatural para distinguir entre os seus
juizes e a Igreja; embora aqueles se mostrassem injustos, a santa
nao perdia a fé na Igreja, para cuja autoridade suprema ela
apelava. Táo firme atitude sobrenatural é certo tsstemunho de
ánimo profundamente unido a Deus, poderosamente movido pelo
Espirito Santo.

Talvez, porém, reste ainda urna dúvida: por que terá a Pro
videncia associado táo intimamente em Joana gragas sobrena
turais e missáo patriótica ? O Senhor nutre partidos nacionais,
privilegiando um povo com detrimento para outro ?

Nao. A tarefa de Joana d'Arc, embora parega meramente


nacional, tinha significado religioso; visava, sim, a soerguer mo-
ralmente um povo cristáo, libertando-o de urna situagáo política
que, segundo se pode crer, privaría a gente de Franga do seu
papel de nagáo sempre católica desde a conversa© do rei Clóvis
no séc. V (ainda no século XVII foi a Franga a patria de santos
e de grandes figuras católicas). Sucumbindo ao dominio inglés
ñas vésperas do grande cisma anglicano, ter-se-ia a Franja pre
servado do mal da ruptura religiosa ? Nao há dúvida, será sem
pre difícil discernir com precisáo os designios do Altissimo na
historia dos povos e assinalar os motivos de cada urna de suas
disposigóes; nao pode restar dúvida, porém, de que a missáo de
Joana d'Arc, inspirada e sustentada como foi pela fórga do Alto,
teve caráter digno da justiga e da sabedoria de Deus.
Em conclusa».: a cóndenagáo de Joana d'Arc é fato histó
rico profundamente doloroso. Jamáis, porém, poderá ser con
siderado! fora do contexto do séc. XV, que bem o marca e
ilumina.
Trata-se de um processo inspirado por interésses políticos
e nacionais e justificado perante a opiniáo pública do séc. XV
mediante pretextos religiosos (pretextos que podiam impressio-
nar naquela época). Lamentavelmente houve prelados e clérigos
que se prestaram ao papel de juizes de Joana d'Arc. Nao pro-

— 90 —
PROCESSO DE JOANA D'ARC 43

cederam, poréin, em nome da autoridade suprema da Igreja,


mas, sim, por autoridade a éles conferida pelo reí da Inglaterra.

Entende-se, pois, que a S. Igreja, de maneira oficial e so-


lene, tenha procedido á nsabilitagáo e canonizagáo de Joana
d'Arc; nisto nao houve incoeréncia ou contradicáo.

Em suma, a recordacáo do caso de Joana d'Arc é mais urna


ocasiáo para distinguirmos (como Joana mesma fez) entre a
Igreja como tal, «Esposa sem mancha nem ruga», e os membros
da Igreja, homens sujeitos a falhar. Quando estes sucumbem a
miseria humana, nao agem por obra do Espirito Santo, mas por
sua própria índole; nao desvirtuam o poder santificador da Igreja,
pois nao sao os homens, mas é Cristo que através dos homens
nos santifica na Igreja.

Bibliografía:

J. Quicherat, «Procés de condamnation et de réhabilitation de


Jeanne d'Arc», 5 vols. París 1841-1849.

J. Calmette, «Jeanne d'Arc». Paris 1946.

J. Cordier, «Jeanne d'Arc». Paris 1947.

P. Doncoour, «Qui a brulé Jeanne d'Arc ?». Paris 1931.

ídem, «Paroles et lettres de Jeanne la Pucelle». Paris 1960.

Jean Guitton, «Probléme et mystére de Jeanne d'Arc», Paris 1961.

Delaruelle, Jacquemet, Marsot, Gazeau..., «Jeanne d'Arc», em


«Catholicisme», t. VI. Paris 1967, cois. 655-668.

Ph. Dunand, «Jeanne d'Arc», em «Dictionnaire Apologétique de


la Foi Catholique» II. Paris 1911, cois. 1212-1253.

F. Cognasse, «Giovanna d'Arc», em «Enciclopedia Cattolica», vol.


VI. Citta del Vaticano, cois. 486489.

Estéváo Bettencourt O.S.B.

— 91 —
resentía de livros
Conselhos evangélicos e maturldade humana, por J. - G. Ranquet;
tradugao do francés por Gino Arol. Colecáo «Vida Religiosa» n* 1.
— Edigoes Paulinas, Sao Paulo 1970, 110x190 mm, 179 pp.

Vida religiosa e diversidade das almas, por O. Melancon; traducá o


do francés pelas monjas beneditinas de Belo Horizonte. Colecáo «Vida
Religiosa» n' 2. — Edicoes Paulinas, Sao Paulo 1970, 110x190 mm,
216 pp.

Missao carlsmátlca dos Religiosos na Igreja, por L. De Reyes;


tradugáo do francés por Francisco José Sobreiro. — Edig6es Paulinas,
Sao Paulo 1970, 110x190 mm, 150 pp.

A esperanga inspiradora da vida religiosa, por J. Allard; traducao


do francés por Francisco José Sobreiro. Colecáo «Vida Religiosa» n' 4.
— Edicñes Paulinas, Sao Paulo 1970, 110 x 190 mm, 117 pp.

Estes livros, lancados simultáneamente para iniciar urna colecáo


assaz oportuna, explanam os grandes valores da vida consagrada a
Deus pela profissáo religiosa; estudam os fundamentos bíblicos e tra-
dicionais da mcsma, assim como os documentos do Concilio do Vati
cano II que lhe intorcssam. Além disto, os autores tiveram o cuidado
de considerar também a psicología humana, ciencia hoje em dia mais
e mais explorada.

Ranquet, no volume 1°, desenvolve o sentido dos tres votos reli


giosos (pobreza, castidade e obediencia), evidenciando a repercussáo
que tém sobre a formacao da personalidade humana. Particularmente
notável é o capitulo final («O Humano justificado»), cujos subtítulos
sao: «Religioso, cristáo, humano», «Da pobreza á verdadeira segu-
ranca», «Da castidade perfeita ao verdadeiro encontró humano», «Da
obediencia á criatividade». O autor escreve com erudicáo e equilibrio,
em termos construtivos.

Melangon, no volume 2', expSe clara e suficientemente os diversos


tipos psicológicos e caracteres de personalidade: a constituicáo ciclo-
timica, a~hiperemotiva, a mitomaniaca, ... o caráter nervoso, o sen
timental, o apaixonado, o sanguíneo, o fleumático, o amorfo, o apá
tico... Propostos estes dados, mostea como a graca divina pode tra-
balhar sobre tal «material» humano, levando cada pessoa á santifi-
cacao dentro do seu respectivo quadro. Cada tipo humano dá urna
fisionomía de Santo bcm caracterizada; o autor tenta classificar tam-
bém os tipos de Santos, mostrando quais as manifestares próprias
que a natureza e a graca dáo de si ñas diversas personalidades
humanas.

Os volumes de L. De Réyés (n' 3) e J. Allard (n« 4) desenvolvem


mais a teología da vida religiosa, recorrendo á Escritura e ás fontes
da fé. Particularmente digno de nota é o livro de Allard, cujas
perspectivas de otimismo sadio, esperanga crista e confianga sao bem

— 92 —
fundamentadas e altamente fecundas para o leitor contemporáneo:
«A vida religiosa se inscreve na grande aventura da esperanza teo
logal auténtica, da qual ela deve dar testemunho no mundo contem
poráneo táo fácilmente deprimido, angustiado, desencorajado e pessi-
mista» (p. 12).

Embora interessem principalmente aos Religiosos, os quatro livros


aqui referidos podem servir ao público estudioso em geral, pois de-
senvolvem temas profundamente religiosos sobre bases científicas e
humanas, respeitando sempre o misterio do dom de Deus. Contri-
buiráo para valorizar a vida religiosa em termos que atendem aos
interésses e ás questdes do homem moderno.

País e filhos felizes, por Mati Robert; traducáo do original ale-


máo por Maddalena Leite de Castro. Colegáo «Familia» n° 20. — Edi
tora Agir, Rio de Janeiro, 1970, 115x180 mm, 235 pp.

A colecáo «Familia» da Agir reúne uma serie de livros referentes


ao casamento, á educado e á psicología, inspirados por sadios prin
cipios cristáos. Éste novo lancamento trata do mutuo relacionamento
de pais e filhos, visando a esclarecer os genitores sobre o comporta-
mentó que devem assumir perante as sucessivas afirmac5es da cri
anza em idade de crescimento: é preciso que os pais conservem sem
pre o amor e a confianca que os filhos naturalmente lhes dedicam,
e saibam aproveitar do que se manifesta de bom ñas reacóes dos
pcqueninos para o desenvolver e educar sem as escorias das paixóes
e tendencias desregradas. Nao falta sequer, no Índice do livro, um
capitulo intitulado «Da cegonha, do menino Jesús e de outras tradí-
cóes»; outros tratam dos lilhos do vizinho, do «bicho papáo», da tei-
mosia, dos castigos, das leituras, da utlllzacáo de lazeres e recreios,
da idade do namóro e das suas dificuldades especiáis... A autora é
máe de familia, experimentada e estudiosa.

Parabens aos responsáveis do livro por esta oportuna publicacáo


numa época em que nao se pode empreender empíricamente a dificil
arte de educar!

E.B.

— X

Estamos preparando o índice de PR 1970, que será for-


necido pela nossa Administracáo em marco pf.
NO PRÓXIMO NÚMERO :

Revelando e inspiracSo : mesma coisa ?

, Taumaturgos pagaos e Jesús Cristo

«Jesús Cristo» de Roberto Carlos

Confuto das geracoes : que é ser ¡ovem ?

As novicas indianas : esclarecimentos

«PERGUNTE E RESPONDEREMOS»

, i porte comum Cr$ 25,00


Assinatura anual I l
1971 \ porte aéreo Cr$ 30,00
Número avulso de qualqúer mes e ano • Cr$ 3,00
Número especial de abril de 1968 Cr$ 3,00
Volumes encadernados: 1957 a 1969 (prego unitario) .. Cr$ 20,00

Índice Geral de 1957 a 1964 Cr$ 10,00

índice de qualqúer ano " Cr$ 2,00


Encíclica «Populorum Progressios Cr$ 1,00
Encíclica «Humanae Vitae» (Regulacáo da Natalidade). Cr$ 1,00

EDITORA BETTENCOÜET LTDA.

BEDAQAO ADMINISTBACAO
Calxa postal 2.668 Búa Senador Dantas, 117, sala 1134
ZOl» Tel.: 2219178
Rio de Janeiro (GB) Rio de Janeiro (GB) - ZC-06

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