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Parte integrante da revista nº 47 - Ano XIII - Jun/Jul/Ago 2009

A elite do ensino superior


Eduardo Chaves
Ph.D. na área de Filosofia, da Universidade de Pittsburgh - Pensilvânia, EUA.
Consultor na área de educação.

As avaliações mais recentes sobre a qualidade da educação superior no Brasil situam muito
poucas universidades entre as melhores do mundo. Em relação à população universitária e à
população de um modo geral, nosso desempenho é inferior a países como Austrália, Taiwan e
até mesmo Coréia do Sul. As universidades de maior nomeada são federais ou estaduais,
especialmente as paulistas USP e UNICAMP. Temos muito poucas universidades classificadas
internacionalmente entre as melhores 200 instituições de ensino do mundo. Os custos das univer-
sidades públicas são proibitivos, e sua autonomia impede que se limitem salários e benefícios.
Há uma tendência nas universidades públicas a transformar todos os professores em pesquisado-
res, violentando suas reais vocações e baixando a qualidade média dessas pesquisas. O número
de pessoal administrativo, em relação ao número de alunos na universidade pública, é absurda-
mente elevado.
As universidades de caráter confessional, em especial as católicas, têm sido obrigadas a
aumentar os custos, o que as leva a competir com as universidades com fins lucrativos, e estas
últimas vão ganhando espaço. Outra tendência nas universidades públicas é a de terem hospi-
tais-escola atendendo as comunidades e dificultando o conhecimento real do custo por universi-
tário.
Com essa incursão na área hospitalar as universidades buscam aumentar seus recursos com
verbas destinadas à saúde pública. As reitorias saem hoje de listas tríplices controladas sindical-
mente pelos professores.
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Introdução e delimitação de não ser, stricto sensu, uma uma inevitável queda em sua
do problema universidade (mas também a qualidade.
UNIFESP há até bem pouco tempo Terceiro, algumas instituições
azer um diagnóstico da edu- não era). de educação superior particulares
F cação superior no Brasil É desnecessário frisar que, mes- lucrativas, que até aqui têm ficado
talvez sempre tenha sido temerário. mo dentro dessas instituições de fora do grupo de elite, vêm se
Hoje, é mais arriscado ainda. São elite, a qualidade existente nunca expandindo, consolidando, em
tantos os aspectos que merecem foi uniforme, havendo áreas, cursos alguns casos recebendo o apoio
análise, e tantas as possibilidades e programas em que outras insti- de capital estrangeiro e, assim,
dentro de cada aspecto, que é fácil tuições, não incluídas nesse grupo conquistando significativas fatias
se perder nos detalhes, deixando seleto, se destacavam mais. do mercado. Naturalmente, ape-
de ver o quadro mais amplo. Por O restante do sistema de edu- nas esses fatos não constituem
isso, vou focar apenas um sub- cação superior brasileira, até al- evidência de que sua qualidade
conjunto do fenômeno: a elite da gum tempo atrás, tinha qualidade tenha melhorado. No entanto, há
educação superior brasileira. sofrível – o pior nível de qualidade sinais e evidências adicionais que
Mesmo aqui, sei que vou me em geral estando com as insti- indicam que depois das crises de
arriscar bastante, porque lidarei tuições particulares lucrativas iso- crescimento e consolidação virá
com fenômenos complexos e, para ladas (i.e., faculdades não inte- um significativo salto de qualidade,
lidar com eles dentro dos limites gradas a universidades ou centros indispensável até mesmo para sua
deste artigo, terei de simplificá-los. universitários). sobrevivência em um mercado
Além disso, mexerei com interesses No entanto, esse quadro mostra competitivo em que uma parcela
poderosos. Mas se não fizesse um alguns sinais claros de mudança no significativa das instituições oferece
e outro, não teria como escrever momento. seus serviços de forma totalmente
algo que pudesse justificar o Primeiro, as universidades pú- gratuita.
investimento de tempo do leitor. blicas incluídas nessa categoria de Algumas das causas da grada-
Até algum tempo atrás era re- elite vêm sofrendo um processo de tiva perda de qualidade das
lativamente fácil identificar os gradativa mas inexorável perda de universidades do pelotão de elite
bolsões de qualidade na educação qualidade, tanto em termos abso- da educação superior brasileira
superior brasileira. Eles se situavam lutos como relativos. Embora nem serão discutidas a seguir. Não se
em umas poucas universidades todas as universidades incluídas pretende exaurir o assunto, mas
(sic) de elite: as três estaduais nesse grupo de elite sejam públicas, apenas chamar a atenção do leitor
paulistas (Universidade de São alguns autores têm comparado o para alguns elementos que talvez
Paulo – USP, Universidade Estadual que está acontecendo com elas tenham permanecido ocultos
de Campinas – UNICAMP, e Uni- com aquilo que aconteceu com as debaixo do marketing institucional
versidade Estadual Paulista “Júlio escolas públicas de educação dessas instituições de elite (que,
de Mesquita Filho” – UNESP); al- básica há algumas décadas. Nos em alguns casos, é extremamente
gumas poucas universidades do anos 50, por exemplo, as escolas forte).
sistema federal (as Universidades públicas de educação básica eram,
Federais do Rio Grande do Sul – em geral, de qualidade bastante A real qualidade das
UFRGS, do Paraná – UFPR, de São boa, e as escolas particulares de universidades de elite
Paulo – UNIFESP [a antiga Escola educação básica em geral peca- brasileiras
Paulista de Medicina], do Rio de vam pela má qualidade. Se alguém
Janeiro – UFRJ, de Minas Gerais – fosse escolher as escolas de elite na ntes de tudo, é preciso que
UFMG, e de Pernambuco – UFPE); educação básica do período pro-
A se diga que a qualidade das
e algumas universidades parti- vavelmente incluiria uma maioria universidades de elite brasileiras,
culares ditas comunitárias, a maio- de escolas públicas. Esse quadro mormente a das estaduais pau-
ria delas católica (as Pontifícias se modificou, até mesmo inverten- listas (tidas como as melhores
Universidades Católicas do Rio do-se, em pouquíssimo tempo. dentre as melhores), é principal-
Grande do Sul – PUCRGS, de São Segundo, as universidades par- mente qualidade aos seus próprios
Paulo – PUCSP, e do Rio – PUCRJ) ticulares comunitárias incluídas no olhos. Quando vistas com outros
e apenas uma protestante, a grupo de elite da educação su- olhos e comparadas com univer-
Universidade Presbiteriana Ma- perior brasileira, todas confes- sidades de elite de outros países as
ckenzie, de São Paulo). Dentre as sionais, pertencentes a igrejas (a universidades brasileiras, mesmo
instituições federais mais espe- maioria pertencendo à Igreja as de elite, ficam em posição muito
cializadas, o Instituto Tecnológico Católica), vêm enfrentando segui- pouco invejável.
da Aeronáutica – ITA, de São José das crises financeiras (e às vezes Há, hoje, basicamente, dois
dos Campos, também deve ser político-administrativas), algumas importantes rankings das universi-
incluído nesse seleto grupo, apesar delas gigantes, que têm produzido dades mundiais.

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O primeiro e mais antigo deles
é o do Times Higher Education
Supplement (THES), de Londres –
que, além de antigo, é muito bem
conceituado. Vide o site do ran-
king, onde todas as estatísticas
podem ser encontradas, em http:/
/www.times higher education.
co.uk/. Vou pegar apenas os
dados dos últimos cinco anos e,
depois, me concentrar em 2008:
2004: nenhuma universidade
brasileira ficou entre as duzentas
melhores do mundo; da América
Latina, apenas a Universidad
Nacional Autónoma de México
(UNAM) entrou “raspando” nesse
seleto grupo, ficando em 195º
lugar;
2005: a USP apareceu no
ranking, em 196º lugar, e a UNAM
subiu para o 95º lugar; foram as
duas únicas universidades latino-
americanas a figurar no ranking Na América Latina, apenas a Universidad Nacional Autónoma de México (UNAM) ficou
desse ano; entre as 200 melhores do mundo.
2006: nenhuma universidade
brasileira ficou entre as duzentas 47 (todas entre as cinquenta me- colônias européias, como o Brasil,
melhores do mundo; da América lhores, portanto) a Austrália tem sete universidades
Latina, apenas a UNAM, em 74º Coréia do Sul: três universi- entre as duzentas melhores (lu-
lugar; dades, em 50º (empatada com a gares: 16, 43, 45, 47, 83, 106 e
2007: a USP voltou a figurar China), 95º e 188º lugares 182) e Nova Zelândia, três (lu-
no ranking, aparecendo em 175º Cingapura: duas universi- gares: 65, 124 e 186). Note-se
lugar, a UNICAMP também apa- dades, em 30º e 77º lugares que a Austrália emplaca nada
receu, em 177º lugar, e a UNAM Índia: duas universidades, em menos do que quatro univer-
caiu para o 192º lugar, atrás das 154º e 157º lugares sidades entre as cinquenta me-
duas brasileiras. Foram as únicas Taiwan: uma, em 124º lugar lhores do mundo! – um fato notável
universidades da América Latina a Tailândia: uma, em 166º lugar para um país relativamente pe-
figurar entre as duzentas melhores; África do Sul: uma, em 179º queno, em termos de população. Só
2008: a USP apareceu no ran- Rússia: uma, em 183º. a Austrália consegue colocar no
king, caindo para o 196º lugar; Ou seja: no total, os países seleto grupo das cinquenta melhores
da América Latina, apareceram emergentes colocaram 24 univer- universidades do mundo tantas
ainda a UNAM, em 150º lugar, e sidades entre as duzentas melhores universidades quanto o grupo inteiro
a Universidad de Buenos Aires do mundo no ranking THES de dos países emergentes.
(UBA) em 197º, logo depois da 2008 – mas, das brasileiras, É até injusto comparar a
USP. apenas a USP figurou, e, ainda situação com a dos Estados Uni-
Dos emergentes, os seguintes assim, “raspando”. Só a China dos. No entanto, trata-se de um
países, além de México, Brasil e Ar- (incluindo Hong Kong) colocou país do continente americano que
gentina, colocaram universidades dez. Além disso, alguns países também foi colônia européia, cuja
entre as duzentas melhores do emergentes, como China (sem colonização começou depois da
mundo em 2008, segundo o THES: Hong Kong), a região de Hong do Brasil e que tem dimensões
China: seis universidades, nos Kong, Coréia do Sul e Cingapura territoriais semelhantes. Os Esta-
lugares 50 (empatada com a Co- colocaram pelo menos uma dos Unidos possuem nada menos
réia do Sul), 56, 113, 141, 143, e universidade no seletíssimo grupo do que 57 universidades entre as
144 (mais, naturalmente, as uni- das cinquenta melhores univer- duzentas melhores do mundo
versidades de Hong Kong, perfa- sidades do mundo. (28,5%), sendo que 38 delas estão
zendo nada menos do que dez) Quanto a países que estão um entre as cem melhores (38% delas),
Hong Kong: quatro universi- pouco à frente dos emergentes, 21 entre as cinquenta melhores
dades, nos lugares 26, 39, 42 e embora também tenham sido (42%), 14 entre as vinte melhores

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(70%) e seis entre as dez melhores 10% (o valor numérico desse Vou, no que segue, mencionar
(60%). É impressionante. Apenas peso aumenta conforme o algumas, enfocando a questão, em
o Reino Unido lhe faz alguma con- período em que foi recebido o sequência, do ângulo das universi-
corrência. prêmio: os prêmios de alunos dades públicas, das universidades
Os critérios adotados pelo mais recentes valem mais; no particulares comunitárias (confes-
THES para inclusão de uma univer- caso do Prêmio Nobel, se ele foi sionais) e das universidades parti-
sidade no ranking, e seus respec- compartilhado, o critério adota culares privadas (lucrativas),
tivos pesos, são os seguintes: uma proporção) porque cada um desses grupos
• Número de professores atuais apresenta características próprias
• Avaliação pelos pares (Peer que ganharam Prêmios Nobel ou (embora essas características, em
Review): 40% outros prêmios importantes: muitos casos, se inter-relacionem).
• Razão professor/aluno: 20% 20% (o valor numérico desse É ocioso dizer que os desafios
• Número de citações dos pro- peso aumenta conforme o da educação superior brasileira de
fessores: 20% período em que foi recebido o elite são múltiplos e de natureza
• Avaliação por recrutadores: 10% prêmio: os prêmios mais recentes diversificada. Discutirei apenas os
• Número de professores interna- valem mais) que me parecem ser de maior
cionais: 5% • Número de citações dos pro- importância. Alguns desses desa-
• Número de estudantes interna- fessores/pesquisadores em pe- fios – talvez a maioria – evidente-
cionais: 5% riódicos com referees: 20% mente se inter-relacionam (como se
• Número de artigos publicados sugeriu no parágrafo anterior).
Registre-se que nenhum desses nas revistas Nature e Science nos Para efeito de análise e de didática,
critérios, exceto o número de cita- últimos cinco anos: 20% vou organizar os fatores que afe-
ções de professores, se relaciona • Número de artigos indexados no tam a qualidade da educação
especificamente com atividades de Science Citation Index-Expanded superior de nossas instituições de
pesquisa. e no Social Sciences Citation elite em dois grupos: fatores finan-
O segundo (e mais recente) Index no ano anterior: 20% ceiros e fatores não–financeiros.
ranking bem conhecido é o • Razão professor/aluno: 10%
Academic Ranking of World Uni- Fatores financeiros que
versities (ARWU), chinês (HTTP:// Registre-se que todos esses afetam a qualidade
www.arwu.org/). O ARWU aponta critérios, exceto a razão professor/
as quinhentas melhores universi- aluno, se relacionam diretamente ividirei minha discussão da
dades do mundo. a atividades de pesquisa. D questão focando as univer-
Em 2008 há seis universidades Por aí se vê que as universidades sidades de elite públicas, co-
brasileiras entre as quinhentas brasileiras têm um caminho longo munitárias e particulares lucra-
melhores: a percorrer, mesmo no caso da- tivas, nessa ordem.
quelas consideradas de elite. É
• A USP, em 147º lugar verdade que o ranking da ARWU Nas universidades de
• A UNICAMP, em 257º lugar de 2008 demonstra que, apesar elite públicas
• A UFMG, em 364º lugar dos pesares, algumas universi-
• A UFRJ, em 365º lugar dades brasileiras do grupo de elite A principal das causas da má
• A UNESP, em 465º lugar estão se firmando numa posição qualidade, no plano internacional,
• A UFRGS, em 466º lugar de liderança na América Latina. das universidades de elite públicas
Mas é uma vitória muito pequena brasileiras se relaciona com seu
Todas elas fazem parte do diante do que aspiram essas modelo de financiamento total-
grupo de elite mencionado no universidades – e da arrogância mente ultrapassado e com seus
início. com que alguns de seus profes- custos exageradamente altos, para
Da América Latina, a UBA, da sores, em especial da USP e da os padrões brasileiros. Destaco
Argentina, está em 170º lugar, e UNICAMP, se referem à qualidade aqui os seguintes elementos:
a UNAM, do México, está em 185º de suas instituições. Eles se sentem
lugar. Encerra-se aí a participação até meio envergonhados quando O modelo de financiamento
da América Latina. sua instituição é comparada com
Os critérios para inclusão no congêneres latino-americanas. As universidades públicas bra-
ranking adotados pelo ARWU, e os As causas dessa qualidade bem sileiras, aí incluídas as de elite, são
respectivos pesos, são: abaixo do desejável das universi- financiadas, pelo menos na área
dades de elite brasileiras, quando da formação de graduação, com
• Número de ex-alunos que comparadas com universidades de recursos oriundos exclusivamente
ganharam Prêmios Nobel ou elite estrangeiras, são muitas e dos cofres públicos, visto que elas
outros prêmios importantes: variadas – e tendem a se agravar. são, nessa área, totalmente gra-

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tuitas, não cobrando sequer um – termo que, para eles, é de concentrar seus recursos na edu-
centavo de nenhum aluno, mesmo opróbrio). cação básica pública, onde se
que este seja oriundo de família De igual forma, algumas uni- encontram os maiores problemas
milionária. dades internas de universidades de qualidade do sistema educa-
A cobrança de mensalidades públicas, em especial as unidades cional brasileiro, problemas esses
dos alunos pelas universidades da área de humanidades e ciên- que afetam diretamente a quali-
públicas brasileiras é assunto tabu, cias humanas, em geral as mais dade dos alunos que chegam até
que, ao ser mencionado, gera ideologizadas, se recusam, por a educação superior.
protestos de toda sorte, ameaças preconceitos ideológicos, a fazer Assim, o poder público tende,
de greve, acusações na mídia, etc. parcerias, até mesmo para projetos hoje em dia, e tudo indica que o
não só dos beneficiados, os específicos e isolados, junto a fará cada vez mais, a carrear para
alunos. É compreensível que os empresas privadas, parcerias que a área da educação básica
alunos queiram manter os pri- poderiam permitir que captassem, recursos que, historicamente, eram
vilégios historicamente adquiridos através de convênios, recursos dirigidos à educação superior.
nessas instituições. Mas sua extraorçamentários. A Faculdade (No Estado de São Paulo há
retórica não é a da manutenção de Educação da UNICAMP, por alguns empecilhos legais a isso,
de privilégios, mas sim a retórica exemplo, onde trabalhei por mais visto que há uma lei que determina
ideologizada da suposta necessi- de trinta anos, aprovou num que um certo percentual mínimo
dade de uma participação cada determinado momento, em sua da arrecadação do ICMS do
vez maior e mais significativa do Congregação, uma norma que Estado irá para as três universi-
poder público na área da edu- impedia a unidade de celebrar dades estaduais. Mas também há
cação, inclusive na educação convênios com instituições e formas de contornar os empe-
superior. Nessa retórica os privile- entidades privadas – exceto cilhos. As universidades e os sindi-
giados alunos são apoiados pelos aquelas ligadas a sindicatos ou a catos de professores exercem
professores e por seus sindicatos. partidos políticos... contínua pressão sobre os legisla-
Ou seja, a causa principal do As atitudes destacadas nos dores, no momento da elaboração
problema está numa tendência três últimos parágrafos con- do orçamento do estado, para
estatizante e antiliberal que é tribuem para o agravamento aumentar esse percentual mínimo,
predominante na comunidade do problema do financiamento mas essa pressão tem produzido
acadêmica, tanto entre alunos das universidades públicas minguados resultados até agora).
como entre professores. brasileiras, que fica dependente
Destaque-se que, diferente- exc lusi v am e n te de r e cur s o s O baixo número de alunos
mente do que acontece no exterior, públicos. por professor
as universidades públicas brasi-
leiras (e mesmo as universidades O uso dos recursos públicos Vindo agora para dentro das
particulares) não possuem ne- destinados à educação instituições, é forçoso reconhecer
nhuma tradição de buscar apoio que as universidades públicas,
financeiro para seus programas A filosofia do “direito do ci- dentre elas as de elite, enfrentam
educacionais junto a seus ex- dadão, dever do estado”, que problemas antigos de difícil solu-
alunos bem-sucedidos na vida. A assola o país, traz, para o poder ção. Um deles é o número exage-
maior parte delas nem sequer tem público, em seus diversos níveis, radamente elevado de professores
um escritório de ex-alunos bem uma série de reivindicações que (e, é bom que se diga, também de
organizado, atividades voltadas exigiriam recursos vultosos, fossem funcionários) dessas instituições,
para manter o vínculo dos ex- todas elas adequadamente aten- quando comparado com padrões
alunos com a instituição e, espe- didas. Basta uma leitura rápida da internacionais.
cialmente, mecanismos para Constituição Federal, na área dos Essa inflação no número de pro-
buscar o seu apoio financeiro. chamados “direitos sociais”, para fessores – que as próprias univer-
Ressalte-se que o assunto também constatar tudo aquilo que nossa sidades e os sindicatos de docentes
é meio tabu, porque parece generosa Constituição considera insistem em negar – em geral se
sugerir, para os ideólogos de direito coletivo dos cidadãos e dá pela multiplicação exagerada
nossas universidades públicas, que dever do estado. A educação é de disciplinas, numa mesma área,
se está tentando criar mecanismos apenas um desses direitos – e a com ementas muito semelhantes.
que, com o tempo, venham a Educação Superior não é nem Criadas as disciplinas, e os depar-
desobrigar o poder público de sequer o aspecto mais privilegiado tamentos têm autonomia para
investimentos significativos na desse direito... fazê-lo, daí se argumenta que há
educação superior, deixando-a Nesse quadro, o poder público falta de professores, porque há
dependente de recursos da inicia- está pressionado, em especial por disciplinas a descoberto, e se
tiva privada (i.e., privatizando-a organismos internacionais, a pressiona a administração da

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universidade (que inevitavelmente lista, no catálogo de pós-gra- que disciplinas oferecidas sejam
fica nas mãos de professores) a duação da universidade para canceladas, depois do período de
encontrar recursos para contratar 1990, nada menos do que no- matrícula, por não terem tido
novos professores. E os professores venta e quatro (sic!) disciplinas. nenhum aluno interessado nelas.
demandantes e os professores Entre elas, “Empresa Privada e Nesse caso, o professor em geral
administrantes dos recursos em Educação”, “Educação e Em- argumenta: “Eu ofereci a disciplina
geral conseguem encontrar os presa” [imagino que, neste caso, – não posso ser penalizado por
recursos necessários – não raro a empresa seja estatal, porque a não haver nenhum aluno
através de uma série de artifícios empresa privada já terá merecido interessado nela”. Na universidade
envolvendo remanejamento das devida atenção na disciplina pública brasileira ninguém é
verbas orçamentárias. (Por isso o anterior], “Educação Sindical”, penalizado por consistentemente
direito de fazer remanejamentos “Educação das Populações Ru- oferecer disciplinas nas quais
internos nas verbas orçamentárias rais”, “Educação e Organizações nenhum aluno está interessado.
é parte integrante e central da Partidárias”, “Aspectos Educacio- Algumas das causas da desis-
chamada “autonomia univer- nais dos Meios de Comunicação tência elevada em alguns cursos
sitária”. Em nome dela também se de Massa”, “Meios de Comuni- serão discutidas adiante.
tem procurado rechaçar tentativas, cação de Massa e Educação”,
por parte do poder público, de “Educação e Ciências da Lingua- Problemas específicos:
fixar tetos percentuais para o que gem”, “Teorias Narrativas e Edu- aposentados e hospitais
as instituições podem gastar com cação”, “Teorias do Discurso e de ensino
pessoal.) Educação”, “Formas do Discurso
Havendo mais professores nos e Educação”, “Educação, Comu- O fato de que, na maioria
departamentos do que é neces- nicação e Cultura”, “Discursos dessas instituições, o quadro de
sário, prolifera a oferta de disci- Políticos e Educação”, “Formas de aposentados onera o orçamento
plinas eletivas, não obrigatórias Comunicação e Educação I”, da instituição, visto que os profes-
para os alunos – disciplinas essas “Formas de Comunicação e sores (e boa parte dos funcio-
que, para justificar a continuidade Educação II”, etc. Dispensam-se nários) não são contratados pelas
do quadro de professores e mes- comentários adicionais. leis trabalhistas que regem o
mo a sua expansão, são oferecidas trabalho em instituições privadas,
quase todos os semestres e minis- Evasão de alunos e ociosidade torna a situação financeira de
tradas, às vezes, para um número de vagas nossas universidades públicas
extremamente reduzido de alunos, de elite ainda mais séria. O fato
mesmo nos cursos de graduação. Por incrível que pareça, nossas de que a aposentadoria dos do-
Por isso, a razão aluno/pro- universidades públicas de elite centes é integral e recebe reajustes
fessor dessas instituições é muito têm, em muitos de seus cursos, idênticos aos do pessoal da ativa,
baixa, quando comparada com a uma elevada ociosidade de vagas, embora seja justo para com os
de universidades estrangeiras de em geral pela desistência de aposentados (entre os quais, é bom
renome. Alega-se, para justificar o alunos ao longo do curso e pelo que se diga, eu me incluo), agrava
fato, que os professores brasileiros não-repreenchimento das vagas. a situação financeira das universi-
também são pesquisadores, e, por Parece incrível que tantos alu- dades públicas de elite.
isso, precisam de uma carga nos venham a desistir de seus Alguns desses problemas come-
didática reduzida. Mais detalhes cursos, depois de passarem pela çam apenas agora a ser equacio-
sobre isso adiante. verdadeira batalha que é o con- nados, de forma ainda tímida, em
A título de exemplo, refiro-me corrido vestibular dessas univer- algumas instituições, como, por
a um levantamento antigo que fiz sidades e depois de estarem numa exemplo, as universidades esta-
dentro da Faculdade de Educação universidade pública de elite, na duais de São Paulo.
da UNICAMP há alguns anos. O qual, além de não pagarem um Além disso, o fato de que a
Departamento de Ciências Sociais centavo, têm estacionamento de maioria dessas universidades
Aplicadas à Educação da univer- graça e comida subsidiada... A abriga enormes hospitais de ensino
sidade, que é um dos depar- desistência e a consequente ocio- cujo custeio, sempre elevado,
tamentos da Faculdade de Edu- sidade de vagas fazem com que onera, em regra, o orçamento das
cação e que “concorre” com o um número razoável de profes- instituições que os abrigam, é um
Departamento de Ciências Sociais sores, em alguns cursos, mesmo problema sério para as universi-
do Instituto de Filosofia e Ciências de graduação, ministre aulas para dades públicas de elite – problema
Humanas da Universidade e (pelo um número mais reduzido de que só agora, muito tardiamente,
que parece) e também com o alunos do que doutra forma seria e, aqui também, de forma tímida,
Departamento de Linguística do o caso, mesmo em cursos de começa a ser seriamente enfren-
Instituto de Estudos da Linguagem, graduação. Além disso, não é raro tado. O problema é naturalmente

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sério, porque esses hospitais não Nas universidades de fato que reduz os impostos que pa-
servem apenas como hospitais de elite particulares gam).
ensino. Eles se inserem na rede de comunitárias Esse fato, em si, já indica que
atendimento de saúde como as universidades comunitárias de
hospitais (indispensáveis) de refe- Registre-se que as universidades elite católicas em geral são
rência (terciários ou mesmo particulares comunitárias, embora deficitárias, fato que exige que a
quaternários). Dada, entretanto, a não tenham fins lucrativos, cobram igreja que as criou e apóia também
qualidade precária do sistema mensalidades – e, em alguns as banque financeiramente, pelo
público de saúde, gratuito e casos, essas mensalidades nada menos em parte.
universal, a demanda sobre esses ficam a dever às mensalidades das Na verdade, quase todas as
hospitais é elevadíssima, fazendo universidades particulares lucra- universidades comunitárias de elite,
com que se dediquem ao aten- tivas. Assim, elas enfrentam a mas especialmente as PUCs, têm
dimento secundário ou mesmo concorrência das universidades um compromisso com a manu-
primário (este perfeitamente dis- públicas, gratuitas, e das universi- tenção de cursos bastante defi-
pensável, porque nada acrescenta dades particulares que, por escala citários, como é, em regra, o caso
à sua função de ensino) – fato que ou eficiência administrativa, con- dos cursos de teologia, ciências da
faz com que seu custo também seguem cobrar mensalidades me- religião, às vezes filosofia, e afins.
necessariamente aumente, pres- nores. Esse fato as obriga ou a lançar
sionando ainda mais o orçamento Registre-se, em segundo lugar, mão de recursos da própria igreja
das universidades que os abrigam. que as universidades comunitárias que, como se viu, são cada vez
A solução que vem sendo encon- em geral têm uma séria preocu- mais escassos, ou, então, a cobrar
trada é criar convênios entre o pação com a qualidade da educa- mais caro pelos outros cursos,
hospital de clínicas universitário e ção que oferecem ao público – não-deficitários, para que estes
o sistema de saúde (SUS, INSS, fato que levou algumas delas a deem sua cota de contribuição
etc.,), que pagaria os atendimen- ficar entre as melhores universi- para manter os cursos deficitários
tos feitos fora da vocação do hos- dades brasileiras. No entanto, essa – fato que, naturalmente, aumenta
pital de clínicas, isto é, atendimentos preocupação com a qualidade de modo artificial o preço desses
que não são de interesse didático tem um elevado custo – e esse cursos, o que evidentemente
para um hospital de clínicas. custo fica cada vez mais proble- afasta alunos que poderiam de
mático, em especial no caso das outra forma estar interessados em
A pressão por mais verbas universidades católicas, diante de cursá-los.
fatores como os que serão a seguir Quando não havia alternativa
Em vez de pressionar pela listados. séria a elas, as universidades de
equação de alguns dos problemas No caso das PUCs, não há elite comunitárias conseguiam
indicados nos itens anteriores, o como negar o fato de que o cobrar preços mais elevados sem
caminho encontrado pelas univer- número de católicos que frequen- perder alunos. Sua clientela em
sidades públicas de elite, tanto tam a igreja e contribuem para ela geral estava disposta a pagar um
através de seus sindicatos (com- vem se reduzindo de forma gra- diferencial pela qualidade e, no
preensível) como através de seus dativa mas inexorável no Brasil, em caso de pessoas para quem a
reitores (menos compreensível, até especial diante da concorrência religião é extremamente impor-
que se lembre do fato de que os das modalidades mais novas de tante, pela possibilidade de ter seus
reitores são todos professores e igrejas protestantes (igrejas pente- filhos estudando em uma universi-
membros dos respectivos sindi- costais, ou assemelhadas, ou dade da própria igreja, nas quais
catos), é o de pressionar o poder igrejas protestantes históricas, disciplinas de cunho religioso são
público por mais verbas, tanto de mas ditas “avivadas” ou “reno- obrigatórias em todos os currí-
investimento (para expansão, por vadas”). Assim, a receita da igreja culos. Hoje, porém, existem alter-
exemplo), como de custeio (espe- que mantém as universidades cai nativas sérias, para essa clientela,
cialmente para pessoal), verbas e fica mais difícil manter a qua- na forma de universidades priva-
essas que seriam necessárias para lidade de suas instituições educa- das lucrativas que, em virtude de
evitar a queda de sua qualidade cionais de elite – porque, apesar consolidação e boa gestão, conse-
(seu “sucateamento”, é o termo de cobrarem mensalidades razoa- guem oferecer bons cursos a
que os sindicatos de docentes velmente altas, elas não sobrevivem preços inferiores aos praticados
preferem utilizar), em especial apenas das mensalidades que pelas universidades de elite comu-
diante da concorrência da inicia- cobram (sendo, também, obriga- nitárias – mesmo que sejam total-
tiva privada, beneficiada por das a dar um certo percentual de mente seculares.
programas sociais do governo bolsas de estudo para estudantes Por conseguinte, no caso de
federal, como, por exemplo, o carentes em troca de serem todas as universidades de elite
PROUNI. consideradas de utilidade pública, comunitárias a concorrência das

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instituições de educação superior nitárias têm enfrentado, simulta- de serem instituições com diversos
particulares lucrativas, que conse- neamente, como vimos, não só a campi localizados em cidades
guiram economias de escala pela queda de qualidade como também muitas vezes distantes uma da
consolidação e estão procurando a necessidade de aumentar os outra também obriga essas insti-
melhorar sua qualidade, começa preços. Com isso, as instituições tuições a investir pesado em
a ficar bastante séria. Com a de ensino superior lucrativas Educação a Distância, algo que as
queda de qualidade das universi- acabaram ganhando acesso a um instituições de educação superior
dades de elite comunitárias e a mercado atraente de alunos relati- públicas têm vergonhosamente
melhora (ainda que incipiente, no vamente bons que não podiam negligenciado (até debaixo da
momento) da qualidade das mais pagar as mensalidades das alegação – bisonha – de que não
instituições de educação superior universidades de elite comunitárias seria possível manter seu nível de
particulares lucrativas, as duas e não conseguiam passar nos qualidade nos cursos a distância.
categorias em muitos locais e vestibulares competitivos das Até há pouco tempo alegavam a
muitas áreas se equivalem, no universidades públicas de elite. mesma coisa em relação aos
tocante à qualidade. As particu- Oferecendo-lhes preços mais cursos noturnos, deixando esse
lares lucrativas ainda são capazes, atraentes e prometendo-lhes uma mercado quase que totalmente
muitas vezes, de se beneficiar com melhoria significativa de qualidade, nas mãos das universidades comu-
maior flexibilidade e agilidade de nitárias e lucrativas).
programas sociais do governo
federal, como o PROUNI. Fatores não-financeiros
Nessa concorrência tem ficado
“Registre-se que que prejudicam a
evidente, muitas vezes, no caso das as universidades qualidade
universidades comunitárias, a particulares
gestão pouco profissional dessas comunitárias, A qui discutirei dez causas de
instituições, não raro deixada nas embora não tenham natureza não-financeira que
mãos de padres, religiosos e afetam negativamente a qualidade
fins lucrativos, das universidades brasileiras
pastores de fé inquestionável, mas
capacidade de gestão duvidosa. cobram públicas, particulares comunitárias
mensalidades – e, ou particulares lucrativas, tanto as
Nas universidades em alguns casos, de elite como as demais.
particulares lucrativas essas mensalidades
nada ficam a dever A especialização precoce
As universidades particulares e excessiva
às mensalidades
lucrativas também sofrem a
concorrência das universidades das universidades É sabido e notório que a uni-
publicas, gratuitas, além, natural- particulares versidade brasileira oferece cursos
mente, da concorrência das lucrativas.” que são especializados desde o
universidades particulares comuni- primeiro momento. Apesar de
tárias, que, tradicionalmente, têm inúmeras tentativas de obrigá-las
tido maior tradição de qualidade melhoria essa confirmada, muitas a criar um “Ciclo Básico” comum
e, por isso, melhor reputação. vezes, por laboratórios de infor- a todos os cursos e programas,
Conforme dito antes, os maiores mática e bibliotecas razoavelmente que deveria durar no mínimo dois
desafios das instituições de edu- sofisticados, as instituições de edu- anos, as universidades detonaram
cação superior particulares lucra- cação superior particulares lucra- todas essas tentativas. Na
tivas são a qualidade do serviço tivas vêm ganhando participação UNICAMP, embora tenha sido
que prestam e a concorrência – que no mercado e, assim, obtendo criado até um prédio meio redondo
presta serviços muitas vezes de condições para melhorar ainda chamado de “Ciclo Básico”, a
melhor qualidade por preço menor mais, no médio prazo, a qualidade iniciativa não vingou.
– ou até mesmo gratuitamente, no da educação que oferecem a seus Quando muito criaram-se,
caso das universidades públicas. alunos. dentro das universidades, alguns
Assim, as universidades particu- É provável que o fato de que “Ciclos Minibásicos”...
lares lucrativas enfrentam, pelo essas instituições em geral têm
lado de cima, a concorrência das campi em múltiplas cidades as • Um “Minibásico das Exatas”,
universidades de elite comunitárias, tornará, rapidamente, instituições com disciplinas de Matemática,
que, tradicionalmente, têm tido de âmbito nacional – obrigando os Física e Química que todos os
melhor qualidade e preços com- órgãos competentes a fazer ajustes alunos das Engenharias, bem
petitivos. Mais recentemente, na legislação para que isso se como dos cursos de bacharelado
porém, essas universidades comu- torne claramente possível. O fato de Matemática, Estatística,

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Ciência da Computação, Física Curso Básico digno do nome, se profissionalizar a educação
e Química, deveriam fazer. amplo, flexível... superior, que mantém o seu caráter
• Um “Minibásico das Ciências da Assim, o aluno brasileiro já entra de educação geral que forma a
Saúde”, destinado a alunos de na universidade comprometido pessoa para a vida e não para o
Medicina, Odontologia, Enfer- com um determinado curso, por ele exercício de uma profissão espe-
magem, etc. Ali se incluem escolhido na inscrição no Vesti- cífica. O máximo de especiali-
disciplinas básicas de Anatomia, bular, e, a menos que alguma coisa zação que lá se permite na
Fisiologia, Genética, Desen- drástica aconteça, vai ficar na área educação superior de graduação
volvimento Humano, etc. correspondente àquele curso, com é a opção entre um programa
• Um “Minibásico de Humani- pequenas exceções. Escolhe, voltado para as Humanidades e
dades e Ciências Humanas”, portanto, a especialização à qual Ciências Humanas (Bachelor of
com disciplinas de Filosofia, vai dedicar a vida antes de fazer Arts) e um programa voltado para
Sociologia, Antropologia, Ciên- vinte anos – e, muitas vezes, sem as ciências (Bachelor of Sciences)
cia Política, História, Geografia, conhecer bem as diferentes áreas – as chamadas “duas culturas” (C.
Literatura, Linguística, etc., que de especialização abertas a ele. P. Snow). A profissionalização
todos os alunos da área deveriam Quando percebe que o curso ficou, nos Estados Unidos, para um
conhecer bem. no qual ingressou não era bem nível posterior ao da graduação:
aquilo que ele queria, e descobre é nele que se situam os cursos de
Mas cada um desses “Mini- que é muito difícil, dentro da buro- Direito, Medicina, Engenharia,
básicos” – de Ciências Exatas, de cracia universitária, simplesmente Administração de Empresas, etc.
Ciências da Saúde e de Ciências mudar de curso, ele desiste – Até mesmo os cursos de Teologia
Humanas – já é um início de sendo esta uma das causas da ficam nesse nível nos Estados Uni-
especialização na área! desistência a que se fez referência dos. Parece-me que essa tendência
No Brasil não se incentiva o nos parágrafos anteriores. é muito superior à brasileira – e
aluno de Ciências Exatas a co- Parte da razão para essa espe- talvez explique a excelência não só
nhecer e explorar outras áreas, a cialização precoce e excessiva se das grandes universidades ameri-
fazer um curso de literatura deve ao fato de que a educação canas, que figuram em lugares
brasileira, outro de filosofia, outro superior brasileira começou com excelentes nos rankings mundiais,
de iniciação à estética, outro da cursos claramente voltados para a mas também dos pequenos Liberal
história do seu país, outro de formação de alunos para o exer- Arts Colleges, que, em muitos
ciências sociais... cício de uma profissão: Direito, casos, oferecem magnífica forma-
O aluno de Ciências da Saúde Medicina e Engenharia. Essas pro- ção geral, melhor, até mesmo, do
é incentivado a só cursar disciplinas fissões permaneceram, por muitos que a oferecida pelas grandes e
dentro da área da Saúde, per- anos, as de melhor reputação e as famosas universidades de elite. Por
dendo excelente oportunidade de mais procuradas entre a elite (e, serem pequenos, e, muitas vezes,
conhecer e explorar as áreas de naturalmente, entre aqueles que situados fora dos grandes centros
Ciências Exatas, de um lado, e a aspiravam chegar à elite), até que, (Grove City, Pensilvânia, por
de Humanidades e Ciências Hu- já em dias atuais, passaram a exemplo), oferecem um ambiente
manas (em especial Linguística, encontrar um mercado razoavel- mais personalizado em que todo
para quem faz pesquisa sobre o mente saturado em alguns centros mundo conhece todo mundo,
cérebro), do outro. urbanos e vieram a sofrer forte ambiente esse que contribui para
Por outro lado, também não se concorrência de novos cursos, a formação extraclasse dos
incentiva o aluno de Humanidades como Computação/Informática, alunos.
e Ciências Humanas a conhecer e Propaganda e Marketing, etc. No Brasil, porém, instituiu-se,
explorar outras áreas, fazendo Mesmo assim mantêm, até hoje, dentro das grandes universidades,
cursos introdutórios de Introdução uma atração considerável, per- a distinção entre “Institutos” e
ao Método Científico, de Estatís- manecendo o núcleo de um “Faculdades” – os Institutos com
tica, de explicação de fenômenos conjunto de cursos superiores a formação geral (mas ainda
físicos e químicos envolvidos na profissionalizantes (que inclui os assim especializada), as Facul-
realidade do dia-a-dia, de Ge- voltados para a formação de dades lidando com a parte mais
nética, de funcionamento do professores) que, de certo modo, profissionalizante dos programas.
cérebro, etc. domina a educação superior Assim, um aluno que entra pelo
Mesmo no caso dos Ciclos brasileira e a impede de ter um vestibular no curso de Engenharia
Minibásicos já há pressão, dentro caráter de formação geral, como, Elétrica, por exemplo, faz nos
da universidade, para reduzir a sua por exemplo, acontece em outros Institutos de Matemática, Física e
duração e o seu alcance. Imagine- países. Nos Estados Unidos, por Química da universidade uma
se qual não seria a pressão se exemplo, reluta-se em especializar série de cursos (de natureza mais
fosse criado e implementado um precocemente e, mais ainda, em geral) que servem como base para

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a sua formação profissionalizante, O aluno ingressante, ao notar voraz. A experiência mostra que o
e na Faculdade de Engenharia os privilégios que um professor- campo de leituras desse tipo de
(Elétrica) faz os cursos diretamente pesquisador tem, quando compa- bom professor é amplo, não sendo
relevantes para a profissão que rado ao professor que meramente restringido artificialmente por
pretende exercer. Da mesma se ocupa da formação dos seus interesses especializados. Em ou-
forma, um aluno que entra pelo alunos, recebe clara mensagem de tras palavras, o bom professor lê
vestibular no curso de Medicina que o prestígio está na pesquisa bastante e lê amplamente, e usa
faz, no Instituto de Biologia, os especializada, não na formação suas leituras como objeto de refle-
cursos de Anatomia, Fisiologia, geral. Isso atrai os alunos mais xão para os processos formativos
Genética, etc. (cursos esses às ambiciosos para a pesquisa, pelos quais é responsável.
vezes denominados “pré-mé- levando-os a se especializar pre- Quanto a isso não há dúvida.
dicos”) e, na Faculdade de Medi- cocemente na área de pesquisa A obrigação, entretanto, de que
cina, os cursos médicos propria- que lhes parece mais interessante. todo professor em tempo integral
mente ditos. Esse mecanismo A legislação brasileira pre- em nossas universidades de elite se
pretende dar uma “formação coniza, para a educação superior, dedique “ao ensino e à pesquisa”
geral” ao aluno, mas ela já é uma um princípio que determina a (nas universidades estaduais
formação geral limitada e voltada “indissociabilidade do ensino e da paulistas o regime de tempo in-
para a especialização e a profis- pesquisa”. Aparentemente os legis- tegral é chamado de “Regime de
sionalização. Embora o mecanis- ladores, influenciados por educa- Dedicação Integral ao Ensino e à
mo de créditos eletivos permita, em dores, entenderam que ninguém Pesquisa” – RDIDP) faz com que
princípio, que um aluno de consegue ensinar nada bem se não todo professor vire, por passe de
Engenharia ou Medicina faça um for um pesquisador especializado mágica, um pesquisador, exigindo
curso sobre “A Poesia Romântica naquela área. A experiência mostra dele publicações regulares em
Brasileira do Século XIX”, isso é que esse princípio é falso. Não só periódicos com referees, não raro
extremamente raro – se é que um há professores excelentes que não estrangeiros, etc. Até notáveis mú-
dia já aconteceu. têm uma vocação para a pesquisa sicos, contratados pelos Institutos
(embora leiam e reflitam muito – de Artes dessas universidades,
A ênfase exagerada na mas isso é outra coisa, como se precisam “fazer pesquisa”. Dá dó,
pesquisa verá a seguir), como há muitos em muitos casos, ver o que passa
pesquisadores de elite que são pelo nome de pesquisa em circuns-
As universidades de elite brasi- péssimos professores, não tendo tâncias assim.
leiras se consideram mais “multi- nenhuma vocação para a sala de Esse fato, além de contribuir
versidades” voltadas para a pes- aula nem interesse nos processos para a desmoralização da noção
quisa do que “universidades” formativos. Vira e mexe tem sur- de pesquisa, faz com que profes-
voltadas para a formação. Mesmo gido, dentro de nossas universi- sores que não têm vocação pela
a formação que oferecem muitas dades de elite, tentativas de criar pesquisa nem interesse em realizá-
vezes tem um viés claro de pes- uma carreira de “pesquisador” la percam um enorme tempo
quisa – pretendendo formar o paralela à de “professor”, com o tentando produzir algo que possa
pesquisador, que um dia poderá vir mesmo nível de remuneração. O se parecer com uma pesquisa,
a fazer pós-graduação na área, pesquisador, no caso, seria “o assim atendendo as exigências
mais do que a pessoa. professor que não precisa dar externas da lei e internas da univer-
O prestígio dentro das universi- aula” – ideal de muita gente que sidade. Seu tempo seria muito mais
dades de elite está com o pesqui- trabalha em nossas melhores uni- bem aproveitado se eles o inves-
sador que obtém significativos versidades. “Trabalhar na universi- tissem na preparação de aulas
convênios e contratos e, assim, dade seria um dos melhores em- melhores.
carreia verbas para a universidade pregos do mundo – não fossem os
(que, em geral, fica com 10% a alunos, que só atrapalham...” é A distração da
35% dos recursos a título de uma frase que se houve comu- “extensão”
overhead). Esses recursos muitas mente nelas – embora em geral dita
vezes contemplam até mesmo a em tom chistoso, porque, em tese, Mas a pesquisa não é a única
construção de sofisticados labora- pelo menos, a função formativa da “distração” no caminho do pro-
tórios de pesquisa, a compra de universidade seria (como de fato é) fessor que gostaria de se dedicar
caros equipamentos importados, a prioritária. totalmente aos programas básicos
contratação de pessoal por fora Não há a menor dúvida de que de formação no nível da gra-
dos canais de contratação regu- o bom professor, o professor que duação. A mesma legislação que
lares da universidade, a criação de se interessa pela formação de seus estipula a indissociabilidade do
um sistema de mordomias e perks alunos e dela se ocupa, precisa ser ensino e da pesquisa também reza
extremamente invejado. um leitor sério e, até certo ponto, que a universidade tem uma

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terceira função: a chamada o computador já faz automa- viraram um bicho meio exótico,
“extensão de serviços à comuni- ticamente uma “checagem” do altamente valorizado, que em
dade”. histórico escolar de cada aluno, muitos casos pretende ser mais
Essa noção de “extensão” é comparando-o com todos os do que um curso de especia-
curiosa – e estaria a requerer uma currículos dos anos posteriores ao lização ou aperfeiçoamento,
análise cuidadosa de alguém com seu ingresso para ver se ele, por mas não chega a ser um mes-
tempo de sobra. Na prática, ela acaso, já não cumpriu todas as trado – e que em alguns casos é
abrange tudo o que, dentro da exigências estipuladas para sua mais valorizado do que um
universidade, não é “curso formatura... mestrado convencional.
regular” ou pesquisa. O “curso Como dito, a “extensão” é
regular” é o curso de graduação qualquer coisa que não faz parte Para que servem esses cursos
ou pós-graduação, devidamente de um “curso regular ” ou da de “distração”, e, assim, podem
autorizado pela universidade e pesquisa. O que isso cobre? prejudicar a qualidade, especial-
reconhecido pelos órgãos compe- A extensão cobre, na área mente dos cursos regulares de
tentes, que é oferecido regular- didática (cursos), em regra o graduação? Porque, segundo o
mente e consta dos catálogos seguinte: entendimento vigente, a universi-
usados quase como “contratos” dade pública pode cobrar por
entre a universidade e seus alunos • Os chamados “Cursos de Ex- esses cursos – e, assim, eles
“regulares”. tensão”, oferecidos pela univer- representam importante fonte de
Um parêntese sobre “cursos e sidade para a “comunidade”, renda para a universidade e,
alunos regulares” é necessário. O que não exigem, necessa- naturalmente, para aqueles que os
aluno regular é o aluno de gra- riamente, um certo nível de coordenam ou participam de sua
duação que entrou, por vestibular escolaridade mínimo para in- ministração. Há MBAs oferecidos
ou por transferência, em um gresso nem possuem outros pré- pelas universidades públicas
determinado curso de graduação requisitos fixos ou uma carga paulistas, diretamente ou através
da universidade ou o aluno de pós- horária mínima fixada em lei ou de suas muitas fundações (ou
graduação, devidamente apro- norma, e que fornecem aos que equivalentes), que são extre-
vado em processo seletivo regular os completam apenas um certi- mamente caros – e, mesmo assim,
de um determinado curso de pós- ficado de conclusão que, em concorridos. Que professor univer-
graduação da universidade, que regra, não tem grande valor sitário, podendo auferir desses
foi admitido nesse curso. O acadêmico; cursos uma renda extra que, em
catálogo da universidade contém • Cursos de pós-graduação lato alguns casos, chega a até 100%
seus cursos regulares de gra- sensu, como os de especia- de seu salário-base, vai se preo-
duação e pós-graduação. Como, cialização e aperfeiçoamento, cupar muito com a qualidade dos
entretanto, há mudanças razoavel- que, apesar de regulamentados cursos regulares que não lhe
mente frequentes nos currículos pelo Ministério da Educação não trazem renda extra alguma, ainda
desses cursos regulares, tanto os são regularmente oferecidos pela que sejam de qualidade excep-
catálogos de graduação como de universidade e exigem diploma cional?
pós-graduação são editados de graduação para ingresso, Fora da área didática, a
anualmente. O aluno em geral podem apresentar uma série de extensão cobre trabalhos feitos
tem o direito de fazer o seu curso outros pré-requisitos, têm carga para qualquer instituição interna,
segundo o currículo especificado horária mínima (fixada até envolvendo prestação de serviços
no catálogo do ano em que entrou mesmo em lei ou normas diversos – todos, naturalmente,
na universidade – podendo, po- federais) e fornecem aos que os devidamente remunerados, a
rém, optar por um currículo sub- completam certificados que são universidade ficando com seu
sequente, se concluir que esse importantes em muitas institui- overhead e quem realiza o tra-
currículo o beneficia. Como, em ções de educação superior para balho ficando com o grosso da
geral, as normas universitárias ingresso e promoção na carreira; remuneração.
permitem que o aluno opte pelo • Cursos que não se encaixam A extensão é ou não é uma
currículo de um catálogo sub- bem em nenhuma das duas distração?
sequente mas não permitem que categorias anteriores, como os
ele, tendo feito essa opção, volte chamados MBAs, que embora O sistema de ingresso e a
atrás, os alunos deixam para fazer originalmente, nos Estados busca dos privilégios
a opção apenas próximo do final Unidos, fossem cursos de mes-
do curso, ocasião em que po- trado (MBA sendo o acrônimo Desde que foram criados, os
derão escolher qualquer currículo de Masters of Business Adminis- chamados exames vestibulares têm
posterior àquele do ano de seu tration – vide http://www. sofrido inúmeras modificações.
ingresso. Há universidades em que unhmba. org/), aqui no Brasil Hoje, embora ainda existam, estão

ENCARTE ESPECIAL - REVISTA Nº 47 12


sob fogo cerrado, até do próprio fessor de educação superior) é a Ensino Superior” no currículo,
Ministério da Educação, que quer única profissão, exceto, talvez, pela mas, em geral, é apenas simbólica
vê-los substituídos pelo Exame mais antiga do mundo, para a qual pela superficialidade com que trata
Nacional do Ensino Médio – nenhuma formação é oferecida ou as questões que um professor vai
ENEM. Com isso, as instituições exigida. enfrentar em sala de aula e no
de educação superior teriam Isso é verdade no Brasil tam- trato com os alunos.
maior flexibilidade porque, apesar bém. Dada, porém, a qualidade do
de precisarem levar em conta a De professores de educação processo de formação de profes-
nota do aluno no ENEM na ava- básica exige-se diploma em cursos sores de educação básica nas
liação de suas credenciais para de formação, que hoje são minis- Faculdades de Educação, respon-
entrar na universidade, esta nota trados obrigatoriamente em nível sáveis pelo curso de Pedagogia e
não seria o único fator a ser levado superior (exceto em condições pelos cursos de Licenciatura dentro
em consideração. excepcionais), no curso de Peda- das universidades, é um alívio saber
Embora esse desenvolvimento gogia (para a educação infantil e que elas não têm nenhuma res-
seja positivo, ele é mais do que para as primeiras cinco séries da ponsabilidade na formação de
contrabalançado pela verdadeira educação fundamental) e nos cur- professores da educação superior.
guerra que se trava nos bastidores sos de Licenciatura (para os demais
e na mídia pela obtenção de casos). A questão do
privilégios no processo de seleção De professores de educação corporativismo
para as universidades – em superior não se exige diploma de
especial para as mais prestigiadas, Licenciatura. Exige-se apenas que Todas as profissões talvez se
entre as quais estão as de elite. A tenham formação superior, e, mais protejam com um certo espírito
busca de cotas, primeiro para os e mais, que tenham Mestrado e corporativo. Isso é claramente
negros, depois para os índios, Doutorado. A maior parte dos verdadeiro no caso de professores
depois para os pobres em geral, cursos de pós-graduação, entre- universitários. Poucas coisas unem
depois para os alunos egressos da tanto, não contempla nem de tanto professores universitários de
escola pública (ou que tenham longe a formação para o exercício diferentes especializações e de
cursado um certo número de anos do magistério superior. Algumas matizes políticos diversos como
na escola pública), tende a minar poucas instituições incluem uma críticas feitas à corporação e aos
o peso do resultado, seja do exame disciplina chamada “Magistério do que a administram e controlam, ou
vestibular, seja do ENEM – amea-
çando ainda mais a qualidade das
universidades de elite.
As pressões políticas para que
os sistemas de seleção para a
universidade sejam devidamente
ideologizados, dando preferências
aos oriundos de determinados
grupos étnicos ou sociais, fazem
com que se possa prever que o
problema da qualidade dos
ingressantes nas universidades
tenderá a se agravar, no futuro
próximo, com os sistemas de cotas
em implantação – e, a se julgar a
tendência, em plena expansão.

A formação de
professores

Jacques Barzun, eminente in-


telectual americano (de origem
francesa), por vários anos dean e
provost da conceituada Universi-
dade Colúmbia, de Nova York,
uma vez disse, em seu livro Tea-
cher in America, que a profissão De professores de educação superior exige-se apenas que tenham formação superior ou
de professor universitário (pro- Mestrado e Doutorado.

ENCARTE ESPECIAL - REVISTA Nº 47 13


seja, os próprios professores. Du- Hospitais de Clínica ou Hospitais comunidade, pois dela se tornam
rante momentos de conflito Universitários, a direção em geral meros representantes, incumbidos
interno, ou de eleições para cargos fica nas mãos de um professor- de executar a sua vontade.
diretivos, eles se digladiam. Mas médico, escolhido pela comuni-
basta que alguém de fora faça dade dos docentes médicos, não A interferência da política
alguma crítica para que se unam nas mãos de um administrador
em defesa da instituição e dos hospitalar especializado. A postura política dos pro-
próprios privilégios. Com a implantação de um fessores universitários brasileiros é
Um desses privilégios é a certo nível de autonomia adminis- conhecida e notória. O Partido dos
reserva de mercado na direção de trativo-financeira para as univer- Trabalhadores e o Presidente Lula
uma instituição que tem orçamento sidades, como acontece nas se beneficiaram do apoio de bom
que muitas vezes é maior do que universidades estaduais paulistas, número de intelectuais da comuni-
o orçamento de cidades de bom o Reitor, com seus assistentes, dade acadêmica. Estes só aban-
tamanho. Os cargos diretivos controla orçamentos que chegam donaram o presidente, em parte,
dentro da universidade são re- a ser bilionários. No caso das quando Lula se tornou, para eles,
servados exclusivamente para universidades estaduais paulistas, um direitista...
professores. Hoje, na maior parte o Conselho de Reitores tem auto- Enquanto essa era política era
dos casos, esses cargos são nomia até para fixar os salários algo de foro íntimo, não causava
virtualmente eletivos dentro das de professores e funcionários – maiores problemas. Quando se
universidades públicas. Ainda se tornou engajamento e militância,
exige, na maioria dos casos, que entretanto, trouxe a política par-
a universidade submeta à tidária para dentro da universi-
autoridade competente (Presidente
“O Partido dos dade, politizando toda a vida
da República, através do Ministro Trabalhadores e o acadêmica.
da Educação, Governador do Presidente Lula se Com a diminuição da força
Estado, através do Secretário beneficiaram do dos sindicatos de trabalhadores
competente, que pode ser Se- apoio de bom industriais, o peso dos sindicatos
cretário da Educação ou Secretário do serviço público cresceu –
número de especialmente no caso de pro-
do Ensino Superior, ou Prefeito)
uma lista tríplice de nomes (que foi intelectuais da fessores que, no caso das universi-
sêxtupla no período da ditadura) comunidade dades, são membros das associa-
para que dentre eles se escolha o acadêmica. Estes só ções de docentes, que, por sua
do Reitor. Há, entretanto, um abandonaram o vez, são afiliadas a associações
acordo de cavalheiros entre a presidente, em regionais e nacionais que atuam
autoridade formalmente incum- em defesa do corporativismo a
parte, quando Lula que já se fez menção.
bida de nomear os dirigentes e as
instituições universitárias no se tornou, para eles, No caso das universidades
sentido de que a decisão da um direitista...” públicas, essas associações são
comunidade universitária será inevitavelmente associadas ou
respeitada com a escolha do vinculadas a partidos políticos.
primeiro nome da lista. Com isso, obedecidos certos limites para o Assim, qualquer que seja a
a comunidade universitária (com percentual de seus recursos orça- questão dentro da universidade os
peso maior dos professores) mentários que cada universidade partidos políticos são ouvidos e o
escolhe seus dirigentes máximos. pode comprometer com pessoal. posicionamento das associações
O mesmo processo se repete Isso traz um benefício político: a de docentes se alinha e conforma
dentro da universidade, para a redução das greves. No Estado de com a orientação superior, num
escolha de diretores de unidades, São Paulo, a comunidade uni- verdadeiro “centralismo demo-
coordenadores de curso, chefes de versitária das universidades esta- crático”.
departamento, dirigentes de duais entrava muito mais facil-
centros de serviço privativos de mente (e, convenhamos, irrespon- A escolha dos dirigentes e o
professores (Centro de Compu- savelmente) em greve por salários problema do mérito
tação, por exemplo), etc. A ex- quando estes eram fixados pelo
ceção é a Biblioteca Universitária, Governador do que hoje, quando O fato ressaltado na seção
que, no caso de universidades que são fixados pelo Conselho de anterior não seria tão grave se a
não possuem cursos de Biblio- Reitores, vale dizer, por três re- escolha dos dirigentes universi-
teconomia, geralmente é dirigida presentantes da comunidade. tários não fosse feita, na prática,
por um bibliotecário, não por um Mas, por outro lado, os Reitores pelo voto da comunidade universi-
professor. Mesmo no caso dos perdem autoridade diante da tária, na qual o voto dos pro-

ENCARTE ESPECIAL - REVISTA Nº 47 14


fessores tem peso em geral de quando a tecnologia evoluiu para recendo como tecnologias secun-
cerca de 66,6% a 70%. Da forma máquinas de escrever elétricas dárias de apoio ao professor (en-
como as coisas hoje acontecem, convencionais (isto é, ainda com sinante), e o caderno e o lápis como
os dirigentes universitários são tecnologia de hastes). A tecnologia tecnologias secundárias de apoio
escolhidos em pleito no qual cada que ganhou a liderança nesse ao aluno (aprendente).
principal partido político tem o seu mercado perdeu-a quando a O mundo mudou drastica-
candidato, a quem dá apoio e tecnologia evoluiu para máquinas mente ao longo dos últimos ses-
recursos financeiros para a de escrever elétricas com “es- senta anos – mais intensamente
campanha. feras”, em vez de hastes. A tec- nos últimos 30 e mais intensamente
Pior de tudo, quando eleito o nologia que ganhou a liderança ainda nos últimos 15. Faz, grosso
candidato tem de honrar seus nesse mercado perdeu-a quando modo, sessenta anos que surgiu o
compromissos. Para isso carreia a tecnologia evoluiu para má- primeiro computador eletrônico e
para sua assessoria pessoas do quinas de escrever eletrônicas com trinta anos que apareceu o pri-
mesmo partido, fazendo com que, “margaridas”. A tecnologia que meiro computador pessoal. E faz
na realidade, o partido político a ganhou a liderança nesse mer- apenas cerca de quinze anos que
que está filiado, ou com cujo apoio cado perdeu-a quando a tecno- a Internet deixou de ser um “brin-
contou, controle a vida univer- logia evoluiu para computadores quedo acadêmico” e foi aberta ao
sitária durante os quatro anos do com processadores de texto... A uso comercial e generalizado –
mandato. É a politização total da instituição líder num estágio da tornando-se, inegavelmente, uma
vida acadêmica. evolução do mercado parece das mais explosivas tecnologias
Num contexto assim, as deci- investir tanto na tecnologia que jamais inventadas pelo homem,
sões deixam de atender ao mérito representa que não consegue com um crescimento rápido e
das questões para satisfazer aos manter a liderança no estágio vertiginoso.
interesses políticos. seguinte. Essas mudanças tecnológicas
A mesma coisa pode acontecer produziram o que Alvin Toffler
A globalização e a com nossas universidades de elite chamou, em 1970, de “Choque
“invasão” estrangeira (em especial com as universidades do Futuro”. O futuro, que antes
de elite brasileiras. Alcançaram a existia apenas nos livros de ficção
É interessante imaginar o que liderança num momento em que científica, invadiu nossa (relativa-
vai acontecer quando o capital a educação face-a-face, “presen- mente) cômoda realidade e mudou
estrangeiro assumir o controle de cial”, era a tecnologia predo- a forma com que nos comuni-
nossas principais instituições de minante. Dificilmente conseguirão camos uns com os outros, ace-
educação superior particulares mantê-la quando a Educação a demos à (ou, para quem preferir,
lucrativas. O processo já teve início Distância se tornar o modelo acessamos a) informação, traba-
e ninguém conseguirá controlá-lo, dominante. lhamos, realizamos operações
nem mesmo os instintos mais As universidades de elite de hoje cotidianas, como fazer compras e
xenofóbicos que dominam a representam o que pode ser transações bancárias, nos relacio-
comunidade acadêmica. chamado, grosso modo, de a pri- namos com o governo (por exem-
Quando isso acontecer, o meira grande fase do desenvol- plo, pagando impostos e rece-
mapa da educação superior vimento da educação superior bendo serviços), estabelecemos e
brasileira de elite será fatalmente brasileira. utilizamos redes de relacionamento
redesenhado. O ambiente de ensino e apren- pessoal e profissional, mantemos
dizagem nessa primeira fase tem relacionamentos afetivos, nos
A Educação a Distância sido tipicamente a sala de aula, divertimos (o rádio e a televisão em
atuando em papel subsidiário o futuro próximo devendo migrar, ou
Por fim, como disse antes, as laboratório e a biblioteca. Em convergir, para a Internet).
universidades de elite estão ficando todos esses ambientes exige-se a Não há como supor que a
para trás na área da Educação a presença física do aluno – o maneira com que aprendemos
Distância. Dizem os entendidos na aprendente – dentro do campus, passe por essa ampla e profunda
história do papel da tecnologia nas em geral junto do professor (a onda de mudanças incólume.
instituições que nenhuma insti- exceção sendo a biblioteca, onde O modelo de ensino tradicional,
tuição cuja tecnologia foi líder de o aluno pode trabalhar sozinho). em que um professor transmite
mercado em uma geração con- As tecnologias usadas nessa informações a cerca de trinta ou
seguiu manter a liderança quando primeira fase têm sido principal- quarenta alunos e esses procuram
a tecnologia mudou de geração. mente a fala, a escrita e o livro absorvê-las, guardando-as na
A empresa que era líder no impresso – o quadro-negro, o memória ou transcrevendo-as
mercado de máquinas de escrever retroprojetor, o projetor de slides num caderno dentro de uma sala
manuais perdeu a liderança e ocasionalmente o vídeo apa- de aula de cerca de cinquenta

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são meios de comunicação um-a-
um excelentes; programas de
mensagens instantâneas que facil-
mente permitem discussões em
grupo (os chats) quando se usa a
comunicação escrita; sistemas de
audioconferência e videocon-
ferência, etc. Até mesmo os video-
games já embutem, em suas ge-
rações mais recentes, acesso à
Internet, para que os usuários pos-
sam jogar com pessoas que estão
distantes.
A tecnologia de comunicação
se digitaliza, se espalha com in-
crível rapidez, incorpora a escrita,
a voz e o som (músicas e efeitos
especiais) e a imagem (estática ou
em movimento), e se torna cada
vez mais interativa, favorecendo a
interação um-a-um e muitos-com-
muitos, em detrimento da comuni-
Desde o videogame até o ensino, a tecnologia nos dá uma maior velocidade de informação. cação um-para-muitos que carac-
terizou o período da comunicação
metros quadrados, é, todo ele, quadrados, acomodando cerca de massa.
condicionado por um determi- de trinta ou quarenta alunos? Isso posto – e a discussão
nado ambiente tecnológico. Porque esse é o ambiente em que poderia se estender, mas não há
Até a bem pouco tempo a a voz de uma pessoa pode ser necessidade –, fica evidente que
informação era escassa e o acesso confortavelmente ouvida sem estamos entrando, neste início do
a ela difícil. A escola – aí incluída necessidade de ampliação através século XXI, numa nova fase na
a de nível superior, ou seja, a da tecnologia... Por que aulas de educação – inclusive na educação
faculdade – precisava assumir cerca de cinquenta minutos? superior: uma fase em que a
uma função de agente transmissor Porque esse é o tempo máximo que educação, em geral, e o ensino, em
e disponibilizador de informações. uma pessoa consegue prestar particular, vão ser em grande parte
Numa universidade, ou num atenção à fala de uma outra sem mediados pela tecnologia porque
centro universitário, ou numa necessidade de se levantar, esticar as pessoas vão precisar aprender
faculdade, a biblioteca era o as pernas, ir ao banheiro... a qualquer momento – na verdade
centro nevrálgico – razão pela O ambiente tecnológico mu- o tempo todo – e em qualquer
qual, não raro, ficava no centro do dou drasticamente. lugar, e a aprendizagem relevante
campus. A sala de aula foi a Hoje podemos ter acesso a vai envolver recursos que vão estar
solução tecnológica encontrada informações – escritas (textos), disponíveis na forma de texto, som
para permitir o ensino de massa: sonoras e visuais – a qualquer e imagem, o processo de apren-
um professor, em alguns casos em momento (anytime), de qualquer dizagem vai se dar na forma de
cima de um tablado, na frente de lugar (anywhere), não importa projetos e ser cada vez mais ativo,
trinta ou quarenta alunos, falando, onde estejamos. Mesmo em Kuala interativo, colaborativo, ocorrendo
escrevendo com o giz no quadro- Lumpur, na Malásia, já podemos, em múltiplas dimensões (não só
negro, fazendo indicações bi- hoje, ler os jornais e revistas bra- verticais, do professor para o aluno,
bliográficas para posterior con- sileiros e ouvir as rádios de São mas também horizontais ou late-
sulta, e os alunos, sentados or- Paulo. Em pouco tempo vamos rais, entre alunos ou entre alunos
denadamente, em fila, ouvindo, poder ver, de lá, os jornais da e pessoas que, na escola tradi-
anotando, de vez em quando televisão brasileira e os jogos de cional, estariam fora do processo).
fazendo uma ou outra pergunta – nossos times favoritos. Quando essa nova fase chegar,
para a qual o professor, em geral, Hoje nos comunicamos uns a liderança certamente mudará de
tinha a resposta pronta. com os outros de qualquer lugar mãos e teremos um novo quadro
Por que uma sala de aula de do mundo usando telefones (que na educação superior de elite no
mais ou menos cinquenta metros mais e mais são celulares), que Brasil.

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