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Grupo de Professores. Os Filósofos Através dos Textos.

São Paulo, SP:


Paullus, 1997. P. 260 – 262 – Assim Falou Zaratustra – A Morte de Deus

Texto Digitalizado por Gilberto Miranda Jr. – gil-


jr@uol.com.br

NIETZSCHE
(1844-1900)

73. A MORTE DE DEUS

É milito fácil distinguir entre as pessoas honestas e os


patifes, os que conhecem a verdade e os que se enganam.
Porque se deve indagar ainda como se chegou a estabelecer
estas diferenças e a perguntar quem as estabelece. Ora, os
que se chamam de bons, bem-pensantes, os que têm religião,
que rezam a Deus e o veneram são os que têm necessidade de
serem reafirmados, porque têm medo, necessidade de
consolação e compaixão, porque sofrem e não podem suportar
sozinhos seu sofrimento; os bons, os crentes, que, porque são
bons e crentes, condenam os maus e os ateus, são os fracos
cuja vida restrita, retraída e extenuada povoa o céu de
verdades consoladoras. O bem e o mal, e Deus que garante
sua diferença, o amor de Deus por suas criaturas não
exprimem nada senão que os fracos são fracos e se vingam de
sua fraqueza inventando o pecado, eles que têm medo de de-
sagradar a Deus, por impotência de ofendê-lo. A crença em
Deus e seu amor é tecido por ressentimento, porque vem dos
fracos e dos cordeiros, de quem só se pode esperar o ódio: o
ódio é a mesma coisa que a impotência. Nietzsche reencontra
aí Spinoza.
Para apreciar a fé religiosa e o ateísmo, é preciso pois
interrogarmos a gênese de uma e do outro. A fé religiosa não
tem valor em si; é vulgar, porque vem da vulgaridade do
rebanho de cordeiros. Mas não se deve concluir que o ateísmo
é em si superior à fé; pode bem existir um ateísmo vulgar,
como a fé é vulgar. Há ateus por fraqueza, por conforto, pela
comodidade que há em recusar as questões que a morte de
Deus põe; há um ateísmo que deixa Deus morrer
tranqüilamente e que quer viver tranqüilamente, sem
energia e sem angústia, na licença, desta morte tranqüila.
Mas há também um ateísmo que não deixa Deus morrer,
mas que o mata, não para evitar a angústia da interrogação,
mas para dar-lhe peso; não para fugir do
sofrimento, mas por ódio da compaixão. É deste ateísmo que
o mais hediondo dos homens, o assassino de Deus, é aqui a
figura. E porque ao menos este tipo de ateu procede pelo
assassínio de Deus, em vez de esperar sua morte, atinge uma
nobreza que o outro não tem, o que lhe dá o direito de lançar
sobre o outro um olhar de desprezo.
Contudo, e embora a hediondez porte mais nobreza que a
aparente beleza das pessoas honestas, quer sejam bem-pen-
santes por fragilidade ou livres-pensadores por fraqueza, o
assassino de Deus é o mais hediondo dos homens;
precisamente porque representa o ateísmo que não é vulgar,
está no cúmulo da feiúra, é o pior dos assassinos. Porque não
se mata Deus impunemente. Se se mata Deus, deve-se saber
que doravante o céu está vazio de valores seguros e
consoladores. A perda do Ideal reconduz o homem à sua
disformidade. O assassínio de Deus é o crime inexpiável,
posto que mata o redentor dos pecados. O assassino de Deus
só pode ser o mais hediondo dos homens, porque o assassínio
de Deus deixa o homem perante seus crimes, porque
acrescenta à sua feiúra a consciência dela. Não nos
desembaraçamos facilmente do Deus inventado pela má
consciência, pela tristeza do pecado, pelo ressentimento que
engendra a fragilidade; o assassino de Deus cumpre seu
assassínio na tristeza ainda, posto que o mata por
ressentimento. O assassino de Deus o mata por ódio, ainda
fosse este o ódio à compaixão indiscreta e impudica; o coração
do mais hediondo dos homens ainda está carregado do
mesmo fel que fez surgir do coração dos impotentes Deus e
seu céu.
Nietzsche dá a entender que, para além deste ateísmo
revestido contudo de certa nobreza, há talvez outro, que não
teria sua fonte no ódio, isto é, na impotência e na tristeza,
mas na alegria. Mas este ateísmo seria ainda humano? A
única altura à qual os homens podem subir é o ódio à piedade
e o desprezo pela baixeza?

Quer seja a piedade de um Deus ou a piedade dos homens: a piedade


é uma ofensa ao pudor. E a vontade de não ajudar talvez mais nobre que
certa virtude muito apressada em socorrer.
Ora, é esta virtude que os pequenos têm hoje como a virtude por
excelência, a compaixão: não têm o respeito pelo grande infortúnio, pela
grande feiúra, pela grande disformidade.
Meu olhar passa por cima de todos esses, como o cão domina com o
olhar o dorso dos buliçosos rebanhos de cordeiros. São pequenos seres,
cinzentos, dóceis e cordeirinhos.
Do mesmo modo que um herói que, com a cabeça lançada para trás,
desvia com desprezo seu olhar das planas lagoas, do mesmo modo eu
lanço um olhar desdenhoso acima do formigamento das pequenas vagas
cinzentas das pequenas vontades e das pequenas almas.
262 NIETZSCHE

Muito tempo foi-lhes dado razão, a essa gentinha: e foi assim que
acabamos por lhes dar o poder — agora eles ensinam: "Nada é bom, senão
o que a gentinha chama de bom".
E o que se chama hoje de "verdade" é o que ensinava esse pregador
que saía, ele próprio, de seu nível, esse santo extravagante, este advogado
dos pequenos que dizia de si mesmo: "Eu sou a verdade".
Foi esse presunçoso que há muito tempo infla a crista dos pequenos,
ele que, ensinando: "eu sou a verdade", nunca ensinou um magro erro.
Deu-se alguma vez resposta mais cortês a semelhante presunçoso?
Contudo, ó Zaratustra, tu passas diante dele, dizendo: "Não! Não! Três
vezes não!"
Puseste os homens em guarda contra teu erro, foste o primeiro a pô-
los em guarda contra a piedade, falando não por todos, nem por ninguém,
mas por ti e por teus semelhantes.
Tens vergonha da vergonha daquele que suporta grandes sofri-
mentos; e, na verdade, quando dizes: "E da piedade que se eleva uma
grande nuvem, tomem cuidado, ó humanos!"
Quando ensinas: "Todas as criaturas são duras, todo grande amor é
superior à sua piedade": ó Zaratustra, como me pareces ter compreendido
bem os sinais dos tempos!
Mas tu mesmo, guarda-te de tua própria piedade! Porque há muito
que estão a caminho, em direção a ti, muitos desses que sofrem, que
duvidam, que se desesperam, que se afogam e que gelam.
Eu o ponho em guarda também contra mim mesmo. Adivinhaste
meu melhor e meu pior enigma — eu e o que fiz. Conheço o machado que
te pode abater.
Contudo — seria preciso que ele morresse: ele via com olhos que
viam tudo — ele via as profundezas e os abismos do homem, todas as
suas vergonhas e sua feiúra escondidas.
Sua piedade não conhecia pudor: ele se insinuava nas minhas
sinuosidades mais imundas. Seria preciso que morresse esse curioso,
dentre todos os curiosos, esse indiscreto, esse misericordioso.
Ele me viu sem cessar; eu quis me vingar de tal testemunha — ou
cessar eu mesmo de viver.
O Deus que via tudo, mesmo o homem: esse Deus devia morrer! O
homem não suporta que tal testemunha viva.

Nietzsche, Ainsi parlait Zarathoustra (Assim falava


Zaratustra), 4S parte, Livre de poche, pp. 303-304.

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