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Os Diários de Clióphoros
Lithokhthônio
Prefácio do Editor VI
I
Provérbios de Kyô XLVI
Costumes dos povos de Lithos LI
Ode a Lady Lana LI
Encômio a Náukles LII
Canto Primeiro LVIII
II
Projeto Trinômia
III
De volta à escrita, continuei os diários de Clióphoros, e,
junto a este trabalho, fui compondo os poemas, as histórias, os textos
proverbiais, e todos os outros que o bardo juntara durante suas
peregrinações pelo mundo. O intuito era o de, além de criar um
mundo apenas com textos que nele existiam, enriquecer Trinômia
com lendas e canções tradicionais, as quais, por um lado, dão-lhe a
cor e a vida que tem, e, por outro, fazem da experiência de jogo mais
do que diversão. Esta, com efeito, é uma das propostas que tenho
com este trabalho: a de fazer das sessões de RPG uma experiência
enriquecedora para mestres e jogadores.
IV
fim de esclarecer as partes mais obscuras do livro. Além de
evidenciar e colaborar na elucidação dos fatos, as contribuições do
mago também criam uma nova dimensão no livro a partir de sua
leitura e interpretação daquilo que ocorreu, enriquecendo, desta
forma, a experiência do leitor.
Leonardo Antunes
14 de novembro de 2004
V
Prefácio do Editor
VI
Livro Primeiro - Sênnyl Oeste
“É olhando através dos olhos do outro que
adquirimos o conhecimento mais profundo.”
VII
I Confesso que a saudade de nossa terra pátria já me vinha
prolongando as noites de insônia muito antes de que a notícia da
enfermidade de teu pai me alcançasse os ouvidos de ancião. Por isto
agora, jovem príncipe, eu sinto que é o momento de organizar os
pensamentos e lembranças dos tempos em que errei pelas terras de
nossa vasta Trinômia, para que, quiçá, estes lhe nutram o espírito
com a luz e a profundidade necessárias ao peito incólume do grande
rei que em breve tu serás. Quanto a mim, talvez desta maneira eu
encontre a desejada paz, fazendo com que a culpa que me sobrepuja
os ombros neste triste fardo se apequeneça, nem que o seja em muito
pouco... Perdoa-me, ainda, se te disser, por vezes, aquilo que de cor já
sabes, mas também te escrevendo estas memórias eu revivo os dias
felizes que passei junto dos nossos.
VIII
II. A origem deste nome
me é desconhecida. Ao que me
IV O início de minha viagem, no entanto, remonta ainda a
parece, esta linhagem de reis, uma época bastante feliz, durante o reinado de Äschnor IIIIIsobre o
há três gerações, deve ter
adotado um nome fictício,
burgo de Fláurin, em nossa Sênnyl Oeste, ao final do tempo em que,
fugindo da tradição de seus a pedido deste rei, eu me hospedara em sua corte, a fim de que a todos
antepassados. Certamente, isto
se deu por intermédio de entretivesse com minhas canções e historietas. Terminado o
Wildegan, ele que mudou seu banquete daquele auspicioso primeiro de Arkhé,III lá estava eu no
nome para outro sem
significado algum. É preciso centro do salão de festas, entoando o Hino de Agradecimento à
que o jovem Iniciando se lembre Vida, típico àquela data especial.
da força por trás do nome de
cada um de nós. Com efeito, o
nome verdadeiro, aquele que
pode ser proferido somente no
plano etéreo e que traz a chave Hino de Agradecimento à Vida
para o íntimo dos seres, este tem
ainda maior poder. Todavia,
não se deve menosprezar o Tantas dádivas brotam do seio da terra!
poder interpretativo que os
nomes trazem consigo, pois são Ó mãe Gaia, por ti gratidão todos temos,
parte intrínseca da Pois é tu quem confere este pão que comemos,
personalidade de todos nós,
moldando-a de forma Embebido no vinho que o cálice encerra!
definitiva. Desta forma, ao
não se dar seu nome de
nascença, alguém consegue Solta um grito de júbilo e amor!
prevenir que se descubra sua Salve o inefável senhor deste mundo!
verdadeira personalidade logo
ao conhecê-lo. Ápeiron, dá-nos viver em teu reino!
III. É extremamente
curioso o fato de que todas as
culturas de Trinômia façam uso Aos pequenos e grandes amigos da terra,
de um mesmo calendário, ainda
que tenham surgido por
Protetores fiéis, a vós agradecemos!
intervenção de forças Sempiterna é a graça brilhante que vemos
primordiais diferentes. Pelo
que soubemos de Clióphoros, os
Incrustada nos montes grisalhos da serra!
orientais já se utilizavam do
calendário desde sua origem.
Como é de conhecimento Solta um grito de júbilo e amor!
popular, eles são os habitantes
mais antigos ainda vivos em Salve o inefável senhor deste mundo!
nosso mundo. Disto, só se pode Ápeiron, dá-nos viver em teu reino!
concluir que o calendário teve
origem em Kyô, o pai dos
orientais, ou em Gaia, a mãe-
terra.
IX
E talvez ainda hoje eu estivesse naquele amplo paço, com
suas arcadas de pedra e os nobres altivos dançando, não houvesse
Wildegan,IV o mago real, irrompido do arco leste, esvoaçando seu
manto aureopurpúreo. Silenciou-se meu alaúde e a corte por inteiro.
Äschnor III ajeitou-se no trono. Em seu cenho majestoso, apesar dos
traços agrestes de um homem-de-armas, olhos glaucos fitaram um
IV. Vide nota 2 Wildegan ofegante, que, não tardando, proferiu-lhe o resultado de
Wildegan era conhecido, em suas últimas incursões hipnógenas:V “Senhor rei, foi-me mostrada
Sênnyl Norte, antes de ser
banido por alta traição, como em sonho uma cena de difícil interpretação, embora eu próprio não
“Canis Infirmus”, pois que, tenha dúvidas quanto a seu verdadeiro significado. Conto-vos tal
apesar de ser ousado como um
cão, era dentre todos os jovens qual o vi: um grande urso, à sombra de uma árvore, alimentava-se do
de sua época, o mais fraco. mel aurífluo de três colméias de tamanhos progressivamente
V. Modo pelo qual
Clióphoros, em sua ínfima menores. Sem escrúpulos, o animal acabou por atacar a mais
erudição arcana, denomina as diminuta destas com a mesma intensidade investida contra a de
viagens etéreas tão comuns aos
praticantes de nossa “ars maior tamanho. Não lhe suportando a demanda, tombou por terra
magica”. Wildegan, assim esta pequena colméia, cujas abelhas não tardaram a molestá-lo com
como todos os magos de Sênnyl
Norte, tinha domínio sobre a ímpeto destrutivo, causando-lhe morte com o veneno acumulado
VI
arte de projetar seu eu- pelas muitas picadas.”
verdadeiro, conscientemente,
no plano etéreo, e lá aprender e
plasmar o mundo conforme sua
vontade. Infelizmente, ele
jamais soube ser comedido em V Respondeu-lhe o rei, meneando a cabeça, que concluísse
seus intentos. o que tinha a dizer: “Nosso terceiro sol está morrendo. Já desde
VI. Wildegan faz uso de
uma alegoria bastante algum tempo atrás venho percebendo mudanças em sua irradiação,
engenhosa para dar início a embora jamais houvesse esperado que fossem oriundas de um
seus planos. É de suma
importância que o Iniciando problema tão grave, pois, como sabeis, o equilíbrio da irradiação dos
aprenda e domine também este três sóis é mister para a vida tal qual a conhecemos hoje.”VII
método de persuasão.
VII. Com efeito, o
equilíbrio entre os três sóis
sempre foi importante para a
vida em Trinômia. No entanto, VI Convocou-se o conselho, para o que não se perdeu
há muitos e muitos séculos, muito tempo, uma vez que todos os membros já se ali encontravam
desde o início das contendas
entre os primevos, os sóis já não por ocasião das festividades. Durante toda uma tarde discutiu-se a
se encontram alinhados em questão, fazendo-se ouvir as opiniões dos mais sábios de nosso reino.
harmonia.
X
Um deles, Jahnor, comerciante das excelentes vinhas de Cádvan e,
por conseguinte, homem de muitas viagens, deu fim às dúvidas
quando se levantou de seu assento, proclamando a todos ali
presentes: “Meus bons senhores de Fláurin, nobre rei Äschnor, ouvi-
VIII. É simplesmente
risível que se chame de sábio
me no que tenho a dizer. Todos sabeis que conto, além de tantos
alguém como Pantagnosko, anos, viagens por quase todos os reinos amigos. E, numa destas
ainda que seu nome signifique
“Sabe-tudo”. Sua força sempre
minhas andanças pelo mundo, vim a conhecer um homem de
VIII
adveio pura e simplesmente do sabedoria inigualável, o venerando Pantagnosko de Telogaia. Tal é
favorecimento que os primevos
lhe concediam. Ele próprio o homem que devemos consultar. Eu próprio o visitaria, não me
passou sua vida vivendo de quebrantasse tanto o peso dos anos. Assim, como me vejo
forma comedida e pseudo-
santa. Os Iniciandos devem ser impossibilitado de performar tão grande uma viagem, eu que
extremamente cuidadosos no conheço o guia para o retiro do ancião, penso que seja possível
que concerne os ensinamentos
deste homem. escolherdes, para empreendê-la, alguém talhado à empresa.”
IX. Como o jovem
Iniciando pode imaginar, um
mísero comando mental
proferido no reino etéreo faria VII E foi então que algo de prodigioso aconteceu, um
com que Clióphoros deixasse
cair por terra seu alaúde. O presságio, nas palavras de Wildegan, infalível. Por ação do destino,
bardo jamais se iniciara nos escapou-me às mãos o alaúde paterno, presente de longa data,
segredos arcanos, pois que só
aqui em Sênnyl Norte eles são estilhaçando-se no pavimento pedregoso.IX Argüiu o mago real que
divulgados abertamente, de este seria um novo marco em minha vida, pois, dali em diante, eu
modo que seu eu-verdadeiro
sempre esteve aberto a deveria abandonar o âmbito das cortes, expandindo minha vista
quaisquer influências externas. para além do cinturão de montanhas que circundam a amada
X. Certamente, por meio
de um ritual, Wildegan havia Fláurin.
preparado tal bastão para que
se lhe tornasse um terceiro olho,
de modo que pudesse
acompanhar os progressos de VIII Desta arte, ao amanhecer recebi toda a sorte de
Clióphoros e mesmo
manifestar-se, projetando um presentes caros a viajantes: belas capas, botas resistentes, uma
corpo ilusório, a partir deste. É mochila impermeabilizada com cera, e um bastão cujo extremo
triste a forma pela qual o bardo
é ludibriado, mas ela deve superior, feito de prata, fora esculpido no formato de uma pequena
servir ao Iniciando como águia.X Tendo sido magicamente imantado, tal adorno funcionava
exemplo do que há de ser seu
futuro, caso não apreenda como uma bússola de alta qualidade. Estes foram os dons que me
corretamente os ensinamentos acompanharam durante minhas viagens. Assim termino a
de sua Iniciação.
XI
XI. A mineração é o
processo por meio do qual os
explanação da razões pelas quais empreendi a maior jornada jamais
homens atrasados de Sênnyl feita.
Oeste extraem minérios para
construir suas casas e produzir
toda sorte de utensílios. Eles se
valem de ferramentas de metal,
com as quais golpeiam a
IX Sob o olhar votivo de Äschnor, do alto de seu castelo,
montanha a fim de que se tomei a Estrada de Lithos, a qual secciona em dois o reino de Fláurin.
soltem partes dela. É-me
incompreensível como isso pode
Este é o grão-protetor epônimo de Sênnyl Oeste, pois em nenhum
agradar Lithos, o rei da outro cantão abundam em tão grande magnitude as formações
montanha. De fato, os
ocidentais e seu titã nutrem rochosas e outros recursos minerais. Não é de se espantar, portanto,
costumes estranhíssimos. que sejam tão dados à mineração os seus habitantes.XI
Quando interrogado a esse
respeito, Clióphoros disse que
tudo se explicava através da
virtude do sacrifício.
XII. Os significados dos X Sênnyl Oeste é composta de sete burgos principais:
nomes destas cidades são, Lithokhthôn, Khrýsea, Khalca, Argýrea, Adámantos, Lykhnidos, e
respectivamente: “Chão-de-
pedra”, “Dourada”, Fláurin,XII sendo este último também conhecido por Sideréon devido
“Bronzeada”, “Prateada”, “De à ocupação de seus homens.XIII De fato, Fláurin é a cidade dos
aço”, “De pedras preciosas”,
“De ferro”. O apelido Fláurin ferreiros. Quando se caminha sobre os ladrilhos pétreos de suas
não tem qualquer valor veredas, dificilmente se encontra um ponto de onde não se consiga
semântico a meus olhos, apenas
Sideréon o tem, sendo seu avistar ao menos três ferrarias. Louvável é o talento daqueles
significado o último dos supra- homens e a maneira que encontraram para se manter em atividade
mencionados.
XIII. Segundo o que sem nunca terem de competir uns com os outros por clientela.
viemos a saber do bardo,
Khrýsea e Argýrea foram,
respectivamente, os lares da
geração dos homens de ouro e de XI O mais admirável, contudo, é que sequer houve um
prata, sendo aqueles os filhos
de Gaia e estes nossos irmãos, acordo explícito para tanto. A experiência, tão-somente, ensinou
nascidos de Ápeiron. Com aos habitantes de Fláurin a buscarem um ofício de especialização
efeito, os homens ocidentais e
os sulistas nasceram dos titãs diferente da de seu vizinho. Com efeito, todos manejam
Lithos e Pyros, enquanto nós proficientemente a calcurgia,XIV por serem desde pequenos
de Ápeiron e os orientais de
Kyô. Durante as grandes ensinados a trabalhar o mais copioso dos metais. Quando, porém,
guerras, essas duas cidades atingem a maioridade, procuram um mestre que lhes possa ensinar as
foram completamente
destruídas, e, com o tempo, seus técnicas avançadas que almejam.
tesouros foram pilhados, de
modo que hoje muito pouco
XII
resta delas.
XIV. A arte de forjar
XII Sendo a maior produtora de artigos metálicos do
armas, armaduras e outros mundo conhecido, Fláurin abriga os mais diversos tipos de ferreiros,
mais artigos metálicos feitos de
bronze.
desde os muitos produtores de armas e armaduras férreas, até
joalheiros, ornamentadores, e criadores de artigos mágicos.
XIII
igualmente de madeira, e em toda parede há sempre uma janela que
derrame a luz melíflua do sol para dentro do ambiente. A matéria-
prima para tais construções advém, mormente, dos bosques a leste
de Fláurin, num vale em meio aos montes de Báinon.XVII
XIV
Para que as graças de Lithos moldemos!
XV
família real dos anaxandrinos retém, com justeza, até hoje o mando
sobre este povo, tendo reinado por nove gerações.
XXII Yor, por sua vez, parece ter sido um homem de grande
visão empreendedora, pois foi ele quem fez construírem-se as
extensas estradas de pedra, as quais, saindo do coração de Fláurin,
no vale do Nyr,XXIV serpenteiam pelas montanhas de Báinon, o
explorador, espraiando-se por todos os reinos de Sênnyl Oeste. Com
tal advento, uniram-se em aliança os burgos destes cantões,
firmando-se, assim, as rotas de comércio interno de metais e os
câmbios de conhecimentos, dos quais Fláurin adquiriu, em nossa
Lithokhthôn, a arte de erguer estruturas de pedras.
XVI
XXIV Na esperança de resolver-se a agrura, a assembléia foi
convocada, costume recém-criado pelo regente, o qual também deu
aos flaurinos uma praça em que se reunirem para tais ocasiões, toda
feita em mármore e ouro, com uma fonte central e diversas bancadas
ao redor.
XVII
XXIX Segundo o que lhes contou, descobrira um novo
reino ao leste, cujas campinas verdejam oito meses ao ano e flores
nascem por todos os cantos.
XVIII
XXXIV Uma caminhada de uma semana me conduzira de
volta à terra pátria, pela qual meu coração ardorosamente chorara e
mais ainda hoje chora durante os três anos em que me ausentei de lá.
Suas ruas retilíneas me receberam com a mesma plácida austeridade
com que se me despediram três anos antes. Construída como o
templo supremo de seu protetor, Lithokhthôn jamais se fiou em
muralhas com que se proteger, embora nossos homens, feitos como
enormes torres de pedra, quase possam ser considerados como tais.
Suas armaduras negras refletem a severidade em seus olhos e cabelos
escuros, enquanto os emblemas rubros de suas vestimentas e as
longas capas de mesma tonalidade ressaltam o ímpeto jovial de seus
modos e o próprio tom avermelhado de sua tez.
XIX
à grande cidadela. Da união de suas águas, quase no cume
Lithokhthôn, e por conseguinte de toda Sênnyl Oeste, nasce o
magno Sôndir, o rio que cruza nosso país em direção ao Mar Pétreo.
XX
de-armas: “Mal nenhum alcançará aquele que, tendo o corpo firme
no solo, onde Lithos demora, se torne um com a terra; seja em vida,
seja em morte.”
Arkhônida - Mordakmakhia
II
XXI
E o porte, a majestade altiva de um colosso.
III
IV
VI
XXII
Pulsava com o sangue de nossos avós,
Quando em meio aos corpos pronunciou-se a voz
Do rei a quem as preces nossas hão de ir.
VII
VIII
IX
XXIII
Do senhor da montanha, o plenipoderoso
Lithos? Nos dias teus um fim há de ser dado.
Afasta teus guerreiros, prepara o machado.
Lutemos até a aurora se assim for forçoso.
XI
XII
XIII
XXIV
XIV
XV
XVI
XVII
XV
XVIII
XIX
XX
XXI
XXVI
XXII
XXIII
XXIV
XXV
XXVII
Faze das ações de teu antepassado tuas próprias, nobre
príncipe, e nada terás a temer.
XXVII
XLIII Aleena, filha do fogo e irmã de Ôlethros, senhor
da guerra de Sênnyl Sul e, de acordo com alguns, filho do próprio
Mórdax. Muitos dizem ter visto à noite o vulto de uma mulher ruiva,
cujos cabelos encaracolados lhe pendiam até a cintura fina, marcada
em seu vestido vermelho e negro. Suas aparições sempre são seguidas
de crimes hediondos, de forma que mesmo os mais bravos tremem
quando seu nome é pronunciado. A seu respeito escrevi um
XXVIII
encômio, dado que é necessário também que se louvem os
inimigos, pois é de acordo com a grandeza deles que a glória vindoura
será medida.
Encômio a Aleena
XXVII. “Destruição”.
XXVIII. Canção cujo O fogo fulge nos teus olhos, dama
intuito é o de fazer um elogio a Aleena, e com vigor sangüíneo inflama
alguém.
XXVIII
A fronte, que os cachos rubros te coroam,
Vertendo às costas livres, e esvoam,
XXIX
e apresentações formais. Outro costume notório é o de aplicarem
unções em sua pele avermelhada pelos sóis.
XXIX “Dor-dos- XLVIII Creio que a única pessoa que vi durar mais do que
homens”. poucos segundos quando se medindo com Algandros foi tua querida
XXX “Lei-do-corpo”.
XXX
tia, Lady Lana, filha de teu avô, Árkhon VIII e irmã de teu pai,
Árkhon IX, senhor de Lithokhthôn. Durante muitos anos sonhei
com tua imagem, nobre Lana, com tuas tranças negras e tua grácil
figura. Ah, como agradeci a Lithos quando a vi naquele dia, parada
em frente à estalagem a que me dirigia, e, como de costume,
envergando sua armadura de combate, toda ela negra e
ornamentada com as insígnias rubras de Lithos. Percebendo-me a
presença, volveu os olhos claros para presentear-me com um sorriso
pueril estampado em seu semblante egrégio. Pensei comigo que em
todo o mundo jamais veria um nariz tão belo como aquele, pequeno,
suave em suas curvas e ao mesmo tempo trazendo em si o orgulho de
sua gente na ligeira inclinação ascendente em que se terminava. E
estava certo.
XXXI
Stratos e Pyros e Lithos e Hydros, os quatro titãs,
Lordes de tudo que vemos no solo da ampla Trinômia.
5 Ápeiron magno em si concentrava a essência de tudo,
E alto no éter reinava supremo no Templo das Almas.
Cá em Trinômia viviam os homens chamados de ouro
Por conhecerem somente alegrias enquanto eram vivos.
Em suas casas jamais lhes faltavam saúde e alimentos,
10 Pois tudo aquilo de que careciam mãe Gaia lhes dava.
A Ápeiron magno, entanto, isso não agradava o imo peito.
Gaia, a seu ver, estragava os humanos, minando-os de modo
A nunca poderem lidar com as vicissitudes da vida,
Desconhecendo o equilíbrio preciso a tudo que é vivo.
15 Por isso então resolveu o titã, nosso lorde do éter,
Vir a Trinômia assolar os domínios de Gaia, mãe terra,
Mas para tanto lhe foi necessário assumir uma forma
Que adaptasse sua essência ao plano chamado matéria.
E assim fazendo plasmou para si quatro formas distintas,
20 Em que se fez dividir nos poderes primevos do mundo,
Ar, fogo, terra, e água, restando amorfo o éter.
E esses poderes, na luta que então dividiu os países,
Aniquilaram mãe Gaia e a raça dos homens de ouro.
Ápeiron, lorde do éter, das cinzas dos corpos defuntos,
25 Fez que nascesse a magna raça dos homens de prata,
Feitos aos moldes daquilo que ele firmou como belo,
Formas serenas e equilibradas em suas essências,
Às quais cabia um lote semelho de bens e de males,
Para que assim aprendessem na dor e também na alegria.
30 Mas o que Ápeiron, lorde do éter, jamais esperava
Foi que os titãs, conscientes da força que neles havia,
Sublevassem-se contra o mais velho e pai deles todos,
Eliminando a magna raça dos homens de prata,
E destronando o lorde do éter, de modo a restar-lhe
XXXII
35 Não mais que o plano do éter em que exercer seu domínio.
Stratos, o lorde dos ventos, do caos e das artes arcanas,
Fez que nascessem os dragos, os elfos, e os devonianos,
Para habitarem o gélido reino ao norte de Sênnyl.
Pyros, o lorde do fogo e flagelo de tudo que é vivo,
40 A seu modelo criou os ciclopes, os orcs, e os monstros
Que nos desertos de Sênnyl do Sul reverberam o caos.
Lithos, senhor da montanha, da ordem, da morte sem fuga,
Fez que da pedra surgissem gnomos, anões, e os homens
Que nos altíssimos montes de Sênnyl Oeste demoram.
45 E Hydros, senhora dos mares, beldade de grácil nadar,
Na orla do mar fez nascerem sereias, tritões, e os homens
Que pelos mares de Sênnyl do Leste navegam altivos.
Somos a última raça de homens, chamada de bronze.
E nesta vida sofremos os males da guerra e da morte,
50 Mas desfrutamos da ajuda de nossos titãs protetores,
E estes, no entanto, se ralam na lida dos planos supremos,
Ao elemento oposto à ruína buscando levar,
Sempre cuidando de oferecer ao amigo assistência.
E desta arte cruel alcançamos o grato equilíbrio,
55 Ápeiron, lorde do éter, titã protetor dos destinos.
XXXIII
Os valorosos anões, cujo ímpeto empreendedor
Não se compara a nenhum outro povo que existe em Trinômia.
E eles na glória de Lithos criaram a sua acrópole,
10 Sob a qual escavaram, em meio às pedras preciosas,
Sua cidade e túneis que ligam o subterrâneo,
Dando passagem a todos os cantos da terra de Lithos.
Por sua vez, os gnomos nasceram na brônzea Khalca,
Onde ergueram ingente de bronze o seu baluarte,
15 Para que lá eles dessem início ao estudo científico,
Causa que foi de inventarem engenhos de todos os tipos.
E, ainda que muitos pareçam a nós sem propósito algum,
Sempre lembremos que neles reside o engenho de Lithos.
Já coroada por todos os montes, os quais a protegem,
20 Surge a cidade afamada dos homens que em Fláurin nasceram,
Eles a quem o senhor da montanha confere a graça
De ostentarem o aspecto mais orgulhoso das rochas,
E altos, com suas madeixas douradas e olhos azuis
São do seu pai o motivo de glória e símbolo dela.
25 E, finalmente, criou-nos, a raça de Lithokhthôn,
Nós, que lutamos e sobre seus montes a terra guardamos,
Somos de Lithos o braço massivo, a força das pedras,
Feitos aos moldes da honra e de tudo que nela impera,
Deu-nos o pai proteger seus domínios no vale do Nyr,
30 E em sua honra lutamos até a terra um dia voltarmos.
Titanomakhia
XXXIV
Esta que fora criada por Ápeiron, Lorde do Éter,
Feita das cinzas deixadas dos corpos dos homens de ouro,
Os que de Gaia eram prole e habitaram Trinômia primeiro,
5 Eis que se viram os quatro titãs com um mundo a gerir.
De forma alguma chegavam os quatro a consenso qualquer,
E, cada qual se exilando num canto da vasta Trinômia,
Eles criaram as raças de homens que hoje ainda vivem,
Bem como toda a sorte de monstros que aos homens odeiam.
10 Mas a cobiça dos lordes dos quatro elementos primevos
Era maior que o quinhão que a cada um deles cabia,
Pois desejavam, ao signo oposto, inglório dar fim,
Dele usurpando as terras e os povos que lá habitavam.
Mas, sendo eles progênie de Ápeiron e partes do mesmo,
15 Arquitetaram semelho um plano a fim de dar cabo
De seus intentos terríveis: criaram os dragos titânicos;
Mors, a progênie das pedras e ícone puro da morte;
Pélagos, vindo de antros profundos, potência equórea;
Nêphelai, filho das brumas, draco de espírito diáfano;
20 Kháos, que do magma bruto plasmou-se qual ígneo demo.
Estes os dragos criados então pelos quatro titãs;
Cada um deles buscava dar morte ao imigo do pai.
E por mui pouco assim não se deu, pois dos dragos a força
Era sem dúvida muito maior que a dos pais que os criaram.
25 Mas, percebendo seu erro, em conselho, os titãs se encontraram,
Para que assim se firmassem as leis pelas quais viveriam,
E, na arcada ancestral onde todos se unem, convieram
Que nunca mais agiriam a fim de dar morte ao irmão,
E cada qual no mais fundo abismo enfurnou seu dragão,
30 Pois que estruí-los não era possível a quem os criara,
Sendo eles próprios parte ainda viva de seu criador,
E para que os guardassem um bom guardião nomeou
Cada um deles, ficando até hoje guardados da luz.
XV
Desta arte aos homens restou o combate em nome dos quatro,
35 Dando-se início às guerras e a toda a sorte de males.
XXXVI
serviços a seu irmão e regente de Lithokhthôn, Árkhon IX. Segundo
ela, Phéron era também um exímio cartógrafo, e fora contratado por
Árkhon para que mapeasse o país de Lithos, seguindo as antigas
referências de Báinon, o explorador. Desta forma, não seria de forma
alguma difícil encontrá-lo. Pediu-me que a acompanhasse até o
castelo, para que tivesse com o rei e assim me informasse do atual
paradeiro de Phéron, o que fiz, tendo terminado minha tão apreciada
cerveja.
XXXVII
protetor.
XXXVIII
IX concordou após ouvir meu relato. De bom grado, apontou-me ao
lugar onde eu havia de encontrar Phéron: além de Lithokhtôn, a
poucos quilômetros da divisa com Telogaia.
XXXIX
Livro Segundo - Sênnyl Leste
“A imagem do outro é o espelho
mais acurado de nós mesmos.”
XL
I Saindo do reino de Lithos, à minha frente o horizonte se
abriu com novidades alvissareiras no verde que inundava as
campinas. Um sorriso se me abriu no rosto enquanto pisava surpreso
a estrada de terra que dividia o gramado sobre esta nova plaga.
Quanta alegria não havia em meu íntimo enquanto caminhava por
aqueles pastos! Meu olhar, incerto acerca do que mirar primeiro
tamanha era a beleza à minha volta e meus pés, famintos por trilhar
cada novo espaço daqueles reinos!
XLI
sentado um senhor de meia idade e barba mal-aparada, que
desenhava, movendo o olhar de seu pergaminho à cadeia de
montanhas às minhas costas. A ele me apresentei e minhas suspeitas
então se confirmaram no que Phéron desceu do rochedo para
saudar-me com um forte aperto de mão.
XLII
aos poucos iluminando as terras que se erguiam levemente no
horizonte com seus lagos e florestas, ao que era respondido pelo
despertar dos animais que ali viviam. Pássaros cruzavam os céus em
arcos, coroando as matas e cantando vividamente; coelhos, corsas,
flamingos e toda a sorte de animais a mim desconhecidos se dirigiam
ao riacho perto de nós ou a algum dos lagos, ignorando nossa
presença, ou talvez até felizes com ela. Sem dúvida, foi este um dos
momentos mais gratificantes de minha viagem.
XLIII
que uma vez, e, tendo passado o tempo em que podíamos arrebatá-
las, só nos resta indicar aos que depois de nós vieram para que não
incorram no mesmo erro.
XLIV
XIII Consumido em seu impulso primordial, Kyô deitou-se
na orla do Mar Glauco e, em sua placidez titânica, ele cantou a
criação dos homens. Da mistura de seu sangue com a luz dos três Sóis
de Trinômia, nasceram os primeiros seres humanos de Sênnyl, pois,
com efeito, todos os outros reinos dos homens teriam sido criados
V
tardiamente.
XLV
histórias de seus antepassados às crianças.
Provérbios de Kyô
XLVI
lago, na senilidade.
XLVII
XX Quanto aos monges, apenas os encontrei em
Keimélion, e são eles detentores de toda a sabedoria de seu povo,
sendo responsáveis pelo ensinamento dos ideais de Hydros à família
real, trabalhando como tutores dos jovens príncipes e princesas. Dão
grande valor ao que vem do corpo e do espírito, cuidando de igual
modo de ambos. Com efeito, são exímios lutadores, precisando de
pouco mais que seus próprios punhos para se medir com qualquer
adversário. Costumam tonsurar seus cabelos, deixando deles apenas
um rabo de cavalo que lhes pende, à beirada anterior do topo de suas
cabeças, em uma grande trança negra. Vestem-se com simplicidade,
trajando mantos compridos e de tonalidades claras, mas que lhes
conferem graça em todos os movimentos.
XLVII
concedidas por sua titã, possuem o dom de curar ferimentos, sejam
eles psíquicos ou somáticos. Seu maior templo, como vim a aprender,
se situa no centro do terceiro grande lago, conhecido como de
Hydros. Dele apenas pude ver a silhueta veneranda num pôr-do-sol
XIII
enquanto caminhávamos em direção a Parathálassa, para que lá
conseguíssemos uma embarcação que nos pudesse levar até a Ilha
dos Mortos, lugar onde, segundo meu guia, encontraríamos
Pantagnosko de Telogaia. Como era de conhecimento comum em
Sênnyl Oeste, para tal ilha havia Phéron guiado o ancião alguns anos
antes, quando este decidiu que chegara a hora de isolar-se da
companhia dos homens mortais, consagrando o restante de seus dias
à proteção do mais puro solo de Lithos, a Montanha do Anoitecer.
XIII. “Junto-ao-mar”.
XLIX
XXV Mais do que nós, é preciso saber que os de Sênnyl
Leste tem respeito pelo titã do éter, dirigindo a ele orações de
agradecimento antes de deitarem-se à noite. Tendo-se em mente a
ligação intrínseca entre sono e morte, poder-se-ia dizer que, ao
dormir, estariam também adentrando o reino do éter. Mais tarde,
esta minha teoria veio a se confirmar, quando estive entre os magos
de Sênnyl Norte e com eles aprendi sobre as formas de magia e a
constituição do reino do éter.
L
Costumes dos povos de Lithos
LI
Quantos as tranças escuras, e quantos as curvas opimas
Sob a negra armadura de guerra mui bem protegidas?
Muitos, por certo, mas posso afirmar com certeza que foram
15 Menos do que os que amam o teu coração majestoso.
Encômio a Náukles
LII
Leste pediu que nos acompanhasse Yanon, seu guarda-costas,
monge e campeão do reino, um jovem esbelto e de longos cabelos
negros, em cujas costas havia uma larga marca de nascença na forma
de um dragão alçando vôo. Não vestia nada que lhe cobrisse o
tronco, apenas calças escuras e sandálias de madeira. Era um homem
sábio e extremamente taciturno, de forma que sua presença era
quase que olvidada conforme caminhávamos.
LIII
XXXIII Lá treinando, conhecemos o príncipe Bao, um
sorridente e agradável jovem, sem sombra de dúvida.
Cumprimentou-nos com respeito e ofereceu-nos um almoço de
frutos do mar e peixes, ao que me pareceu, um prato típico local, e
contou-nos a Lenda de Yuritsu, o primeiro dos monges.
LIV
XXXVII Matsen, por sua vez, só foi visto três anos depois
daquele dia, quando pôde, por fim, deixar a caverna de Kyô. Não
parecia, nem de longe, o mesmo homem que entrara naquele lugar.
Durante três anos ele fora obrigado a aprender as virtudes de Kyô,
principalmente a da humildade. Foi Matsen quem grafou para os
orientais os provérbios do dragão, por este criados para evitar que
jamais se criasse outro ego como o daquele. Quando saiu da caverna,
carregava nas costas as sete pedras proverbiais, as quais assentou,
como estabelecido por Kyô, numa meia-lua ao redor das cidades
orientais. Durante seis anos, então, ele trabalhou de mal grado na
ornamentação dos bosques sagrados, construindo seus altares e
lâmpadas de incenso com suas próprias mãos. Ao encontro dele,
quando de volta à luz, veio Yuritsu, que o ajudou tão fraternalmente
como o mais devoto dos irmãos o ajudaria, e juntos executaram a
tarefa com a qual o antigo dragão titânico havia incumbido
XVI
Matsen.
LV
terra dos orientais, amaldiçoado por Gaia devido a suas tantas faltas
e à inveja que passou a nutrir por seu irmão, Yuritsu, agora prodígio.
LVI
XLIII A terra tremeu, os oceanos sublevaram-se, e o
magma do seio do mundo pulsou em gêiseres funéreos, ribombando
os céus em cores sangüíneas. Matsen ergueu-se como Senhor da
Discórdia, nutrido por todos os vícios que ajuntou no plano astral.
De fato, a história também me pareceu absurda e neste ponto
confesso ter perdido até o fio da meada, mas, segundo meu anfitrião,
ele havia, assim como seu irmão, aprendido a utilizar-se das formas e
energias do plano do éter, e, com os pensamentos e vícios que
despertou em seus seguidores, ele ergueu-se como potência
destrutiva.
LVII
de Matsen. Não me pareceu agradável terminá-lo em completa
tragédia assim como o vi, uma vez que a história do mundo continua,
e por isto mesmo eu o deixarei para sempre incompleto, para que
desta forma alguma geração posterior possa grafar algo de bom na
alvura frígida das páginas restantes.
I - Lembranças do Fim
LVIII
II - Uma Invocação na Noite
LIX
Aos poucos, sem que os olhos se possam dar conta.
IV - Tempos Passados
LX
Sobre a terra, que lhe há de negar um indulto.
LXI
primeiras moradias de pescadores, assentadas ao redor da muralha.
Disse-me Yanon que aquela se tratava da parte pobre da cidade,
oposta à parte rica, localizada face às muralhas oeste e sul. O interior,
restrito apenas à família real e à casta de monges e samurais,
continha alguns palacetes e templos sagrados. Infelizmente, não me
houve tempo de conhecer tais lugares, uma vez que o tempo de
XVI
minha busca urgia. Desta arte, dirigimo-nos sem mais demora para
o porto de Parathálassa, erguido face à muralha oeste.
XVI. É triste pensar que LIII Passamos a noite em uma estalagem do porto, pois já
exista um povo no qual, se era tarde e também por termos sido, pouco depois de nossa chegada,
alguém se mostra corajoso e
apto a governar, acaba sendo informados de que Kato e a Serpente Marinha só chegariam na
humilhado pela autoridade manhã seguinte.
máxima, punido de múltiplas
formas e, por fim, exilado. Às
vezes, custo a entender como os
orientais veneram a titã
patrona do bem.
XVII. É célebre o
episódio em que Clióphoros,
passeando pela terra dos elfos
azuis, encontrou-se
boquiaberto perante suas
jangadas, confessando que
mesmo a mais simples dela era
superior à Serpente Marinha.
No entanto, o orgulho
certamente o impediu de narrar
tal episódio em seus diários.
LXII
Livro Terceiro - Telogaia
“É preciso viver o saber.”
LXIII
I Kato era um homem único, daqueles que, uma vez
conhecidos, deixam para sempre sua presença marcada nos campos
de nossa memória. Trajava-se com roupas leves e de cores claras,
tendo à cabeça um chapéu que lhe protegia da irradiação dos três
sóis. Não era, de forma alguma, como os outros orientais que conheci
em Sênnyl Leste, mas, sim, fazia-me lembrar dos tempos em que
Kragûn Kreionkheir, capitão da guarda de Adámantos e melhor
anão que já conheci, passou entre nós em Fláurin, tendo trazido
notícias dos reinos subterrâneos. Certamente, a semelhança entre os
dois não era na estatura, mas em serem ambos extremamente
bonachões. Durante o mês que navegamos as águas límpidas do Mar
Glauco, meu rosto chegava a doer de tanto que Kato me levava a rir
com suas anedotas e peças juvenis.
LXIV
Parathálassa. Passava seus dias na orla do Mar Glauco, mesmo
quando não estava trabalhando, e mais do que ninguém gostava ele
de contemplar as águas no silêncio do isolamento.
LXV
noite até onde a ninfa o levou.
LXVI
Mors, o dragão símile da morte. Um calafrio desceu-nos a espinha
conforme caminhávamos sobre aquela ilha sacra em busca do único
homem capaz de impedir a calamidade próxima, Pantagnosko, o
ancião.
LXVII
mando do glorioso rei Äschnor III, por conta de um terrível
presságio: viu, em sonhos, que sobre nós um dos sóis se apagaria,
nosso mago real, Wildegan.”
LXVIII
inscientes do ocorrido. Forcei-lhes um sorriso e disse que estava tudo
acabado. Alegraram-se em seu íntimo, crendo o oposto do que
tentava lhes informar, e, no intuito de voltar ao lar, se puseram a
preparar a embarcação. Com um suspiro de desesperança, segui-os
em silêncio.
LXIX
Livro Quarto - Sennyl Sul
“Navega consciente neste mar.
Faz do íntimo o teu leme e
das paixões a tua vela.”
LXX
I Meus olhos se abriram lentamente; as pálpebras, pesadas
com a areia que senti cobrir-me a face. Com dificuldade, pus-me de
pé, incrédulo de haver sobrevivido. Ajeitei minhas vestes, as quais
agora se encontravam em farrapos. Todas, à exceção de uma: a longa
capa de seda azul com que me agraciara o benevolente rei Náukles,
desejoso de que o presente me concedesse a proteção de Hydros. E
eu a tive. Sem dúvida que a tive... Mas não meus companheiros,
capitão Kato, seus marujos, e Phéron, pois que a tempestade da
terceira noite da viagem de volta os lançara a uma morte insepulta
no fundo do oceano, onde jamais encontrariam a paz no reino dos
mortos.
LXXI
consumir-me as energias de forma assombrosa. Por meus lábios
ressacados, a respiração arfante deixava-me o encerro da boca em
frágeis suspiros. Cada vez mais fracos, e meus olhos já não viam e os
ouvidos se taparam...
LXXII
restava de meus pertences e minha coragem para deixar o único
recinto da casa em que me encontrava. Do lado de fora,
surpreendeu-me uma cena em muito parecida com as que vi em
minha terra natal: as pessoas do lugar se reuniam numa espécie de
praça, sentados ao redor de um pequeno palanque, de onde aquele
que me parecia ser seu líder tentava pô-los em ordem.
LXXIII
pôs-nos a par da situação em que se encontrava seu povo. Segundo
soube então, as tribos de goblinóides e orcs que com eles dividiam o
deserto viviam em constante guerra, de acordo com o resultado da
qual eles decidiriam a supremacia sobre o território. E tal guerra
entre os clãs goblins e orcs era o que até aquele dia salvara do ocaso
aquela tribo de homens que vivia às margens do oásis de Nara, um
límpido espelho d'água cuja nascente se encontra nas cordilheiras
que limitam o reino do Sul e principiam o cantão do Oeste.
VI. “Terra-do-calor”.
VII. “Serpente-de-fogo”.
VIII. Espécie de XIV Num coro infernal, os homens da tribo se
sacerdote tribal incumbido de manifestaram, juntamente a seu líder, para que se preparassem os
trazer alguma espécie de
iluminação espiritual e mesmo machados e os demais instrumentos de guerra, mas silenciou-os
VII VIII
proteção mística aos homens Drakópyros, o venerando xamã que, sendo um dos poucos
mais simples.
LXXIV
letrados presentes, acabara de ler-lhes em voz alta a carta que acima
reproduzi-vos, leitores.IX
LXXV
até sua cidade para que lá me recuperasse. Agradeci-lhe
brevemente, pois que a ocasião não me permitia expressar toda a
gratidão que por ele tinha. Seu nome, como mais tarde vim a saber,
era Dikaiólykos,X e era responsável pela patrulha das redondezas da
cidade.
LXXVI
reunião que tivemos naquele dia não durou mais do que meia hora,
tempo suficiente para que Drakópyros me expusesse seu plano e
diretrizes básicas.
LXXVII
XXVI Dando-me um tapinha encorajador às costas,
Deinôs demandou-me se era conhecedor das artes da guerra, ao que
lhe respondi não serem elas a mim, de forma alguma, estranhas.
Porém, expliquei-lhe que minha participação no combate não se
dava no brandir de armas, mas no insuflar de ânimo e coragem no
coração dos homens!... Riu-se de mim, Deinôs, dizendo-me que, de
todos os povos de Trinômia, o dele, certamente, não era o que
necessitava de tal tipo de encorajamento quando na guerra.
LXXVIII
pelo ritmo fúnebre de tambores de guerra que faziam os próprios
céus, prenunciadores da matança em seu vermelho vivo, tremessem
em medo e horror.
LXXIX
XXX Nosso esforço combinado logo surtiu efeito e os
valorosos homens de Termôkhora tornaram ínfimos os tambores dos
anões vermelhos conforme vibravam seus machados contra os
escudos, o alto alarido aos céus subindo.
LXXX
anões vermelhos, os legionários de Ôlethros e protetores de sua
torre. Ele, por sua vez, o soberano do deserto, descia em trote sereno
e inabalável, dirigindo-se ao lugar em que lutava Ktêinon.
XIII. “Noite”.
XIV. “Que traz a morte”.
O machado de Ôlethros foi XXXVII Ktêinon rasgou os ares na fúria com que se lançou
forjado a partir de uma costela sobre o Senhor da Destruição. Seu machado, num meio arco que
de Mórdax. É-me, no entanto,
desconhecida a maneira pela traçou de baixo acima, partiu a chama vazia de Ôlethros em dois,
qual ele foi capaz de remover a incutindo-lhe um corte profundo na carne e lançando-o uma dezena
costela de uma estátua.
LXXXI
de metros para longe.
LXXXII
mesmo que todo seu batalhão de anões vermelhos tivesse sido
aniquilado pelos valorosos homens de Termôkhora, ainda assim, a
tristeza reinava suprema sobre os bárbaros do oásis de Nara.
Oração Fúnebre
LXXXIII
XLV Durante os dois dias de luto, pude assimilar alguns dos
costumes daqueles homens. Soube que, ao atingirem a maioridade,
devem deixar a cidade e desafiar para um duelo, no qual se podem
valer apenas de seus punhos, algum dos trolls que vivem, além do
oásis, a noroeste de Termôkhora. Se sobreviverem, devem trazer de
volta as garras da criatura, e estas lhe adornarão o machado que
receberá de seus pais para brandi-lo na glória de Pyros.
LXXXIV
Drakópyros que me contasse alguma das histórias de seu povo. Em
resposta, narrou-me diversas lendas, das quais uma pareceu-me
fenomenal. Por isto mesmo, passei-a em verso, a fim de que não se
perdesse, a história que conta a Origem de Ôlethros.XV
Origem de Ôlethros
LXXXV
E eles se amaram de forma jamais vista antes no mundo,
Pois que era um misto de irrefreável paixão e calor
E o mais puro enlace de almas no amor comedidas.
30 Força era que isto jamais agradasse ao lorde das chamas,
O qual, ao ver em sua filha o rebento de um homem do Oriente,
Muito se enfureceu em seu íntimo avassalador.
Manifestando-se, então, aos amantes lhes disse em cólera:
"Amaldiçôo-te, Kháris, por tu te unires com cães,
35 E as crianças que trazes no ventre eu tomo de ti.
Só lhe as devolverei quando o cão que tu chamas de esposo
Instituir as virtudes de Pyros no povo de Hydros,
Desta maneira, fazendo-se digno para meus olhos."
E, assim, Matsen retornou ao país em que ele nascera,
40 Para trazer-lhes a guerra e a discórdia que a todos aparta.
E, então, teria a todos do Oriente Matsen corrompido,
Não lhes houvesse ocultado no ventre materno mãe Gaia,
Que aguardava, cuidosa, o ataque dos filhos de Ápeiron.
Volta Matsen à cidade sagrada no solo de Nara,
45 Entristecido com sua derrota e a falha com Pyros,
Que lhe surgiu logo em meio às chamas dizendo em cólera:
"Tu me falhaste, Matsen, e por isso mesmo devolvo-te os filhos,
Para que vivam inglórios no mundo que tu me criaste.
São teus os filhos, mas levam no íntimo a cólera minha
50 E dar-te-ão mais vergonha do que já as tem em teu peito."
LXXXVI
companhia já começara a me habituar, para dirigir-me a norte e além
do Deserto de Nara. A fim de guiar-me, por sugestão de Deinôs,
Dikaiólykos viajou comigo em meio as dunas que separam o Oásis de
Nara do final do deserto.
LXXXVII
LV Mais tarde, quando já nos encontrávamos longe do
lugar, contou-me Dikaiólykos a Lenda de Klauma e Guélos,XVI a qual
me espantou de tal modo que soube que deveria transformá-la em
verso.
LXXXVIII
Se transmudou na donzela que antes
Fora forçada num hórrido rito
A dar seu corpo em troca humilhante.
LVIII Deste modo, após ter volvido o olhar para ver meu
XVII. Quando
interrogado a esse respeito, guia aguardando que eu partisse, respirei fundo e comecei a explorar
Clióphoros confessou que, na a Floresta de Gaia, como assim proponho chamá-la, já que seus
verdade, se esquecera de XVII
demandar o nome da floresta a habitantes apenas a chamam de “lar”.
seus habitantes. No entanto,
para não ter de fazer tal
confissão ao rei, ele mascara o
fato com mais uma de suas
histórias apelativas.
LXXXIX
Livro Quinto - Floresta de Gaia
“A voz de dentro é a voz primeva.”
XC
I Meus primeiros passos sobre aquele solo recoberto por
folhas secas e raízes foram tão incertos quanto minha própria
vontade de seguir adiante. Através da cúpula majestosa perfeita nas
copas das árvores, os raios de sol fluíam áureos e vibrantes,
produzindo feixes de luz cá e lá, revestindo de ouro as samambaias e
as hortaliças que se espraiavam ao longo da trilha num festival de
cores e tons.
XCI
sorriso, pois que a beleza do lugar aos poucos conferia-me uma paz
nunca antes alcançada.
XCII
bucólico.
Soneto de amor bucólico
XCIII
meio às raízes, e em tantos outros e fascinantes lugares que a floresta
lhes oferta.
III. A criatura
mencionada é o mitológico XIV A expressão do centauro logo transmudou-se num
centauro, cujas origens
remontariam a uma época sorriso de boas-vindas, e ele saudou-me com um gesto amigável, ao
anterior ainda a dos humanos que eu prontamente lhe retribuí de igual maneira.
criados por Gaia.
XCIV
XV Limpando o suor de meu semblante perturbado mas
ainda maravilhado com a beleza da floresta , sentei-me com Miro nos
grandes cogumelos que cercavam a árvore central. Uma vez mais,
meu amiguinho pediu-me que tocasse algo para eles. Aquiesci com
um sorriso e, tomando da lira, improvisei a canção De Gaia os filhos
mais venustos.
De Gaia os filhos mais venustos
XCV
voz de Gaia.
XCVI
dando a nós a impressão de que estava em chamas. E, assim,
ressurgiu Nédyme,V filha de Gaia, a fênix titânica. E, em seu dorso
flamejante, eu voei através dos céus de Trinômia e em meio às
nuvens, por sobre a terra e ao lado dos três sóis no último dos dias em
que se encontravam presentes no céu, mantendo o que restava da
ordem e da harmonia em sua tríplice lei.VI
V. “Agradável”, “Doce”. XXIV Mal sabia eu que as alegrias daquele dia precederiam
VI. Aqueles que se
encontravam dentro da torre tristezas jamais sentidas por meu íntimo sofredor. Portanto, lembra-
principal no dia de sua te sempre, jovem príncipe, de que a inconstância da sorte é comum a
chegada, dentre os quais eu me
incluo, viram o bardo alcançar todos os homens, e que cada alegria deve ser vivida como a última.
a terra de Stratos montado
sobre um grilo gigante.
XCVII
Livro Sexto - Sennyl Norte
“Olha a tua volta e aprende.
Deixa teus olhos verem o mundo
sempre como se pela primeira vez.”
XCVIII
I Em meio às nuvens gélidas que transladam, feito anéis de
treva vaporosa, os montes GnôramonI vi surgirem as torres magnas
em que habitam os nativos de Sênnyl Norte, ao longo do complexo
de pontes que as interligam num reforçado anel de metal e gelo. Com
efeito, por toda a extensão de suas construções, o acúmulo de neve
formara sólidas dentições, conferindo uma atmosfera ainda mais
imponente à compleição marfínea dos montes.
XCIX
erguia até o cume do mundo. A neve sobre as torres aos poucos
despencava e mesmo os montes se esfaziam à medida que o tremor se
intensificava, forçando-me a prostrar-me de joelhos para louvar o
poder titânico que naquele momento demonstrava toda sua força,
erguendo do solo de Trinômia um país inteiro e dando ao mundo a
última visão de Sênnyl Norte antes que ela desaparecesse por
completo em meio às brumas celestes mais distantes.
C
VIII Agradeci a Lithos pela ajuda enquanto retomava o
fôlego. Minhas preces foram interrompidas por uma voz calma e
dona de grande sabedoria que me saudava. Volvi o olhar para trás de
mim e lá encontrei uma criatura de que há muito tempo não ouvia
falar. Seu aspecto era sereno como a montanha onde Lithos demora.
Sua pele era plúmbea como a rocha e seus olhos claros como o céu.
Era um devoniano, a raça mais devota aos titãs e ao estudo dos
elementos. São, com efeito, os únicos seres a venerar todos as forças
primordiais de Trinômia.
CI
XIII Com muito esforço, atingi a primeira ponte e ao longo
de sua extensão caminhei rapidamente em rumo à maior das torres,
localizada no centro do anel e circundada por todas suas irmãs.
Vitrais de cores claras espelhavam os raios celestes em meio aos
símbolos de Stratos enquanto eu me punha em frente à gigantesca
porta dupla que dava acesso ao Lycaeum, a escola dos magos de
Sênnyl Norte.
CII
XVI Agradeci em silêncio aos ensinamentos do devoniano
acerca da filosofia de vida de seu povo no que eu via, com um suspiro
de alívio, as grandes portas abrirem-se à minha frente.
CIII
arquimago, a imagem ilusória de um homem de queixo pontiagudo e
volumoso nariz se mostrou, trajando um longo manto
aureopurpúreo que trazia as insígnias de Fláurin.
CIV
nem Wildegan encontrará paz quando a fúria de Hélios se abater
sobre o solo de Trinômia. Aqui estamos a salvo e nada nos impedirá
de assim continuar para o resto dos dias. No entanto, agora percebo
meu erro em subestimar Wildegan. Jamais imaginei que ele estivesse
por detrás de algo tão colossal quanto a morte de um Sol. Sem
dúvidas não está sozinho nisto.”
CV
novamente se alastram junto ao magma sangüíneo que nutre um
ódio mais furente que o de Pyros. Somente com o conhecimento dos
ensinamentos de todos os titãs, poderás trazer o equilíbrio
novamente a Trinômia e restabelecer a vida tal qual um dia a
conhecemos. Deves entender aqueles a tua volta, aqueles que
vieram antes de ti, pois são teus iguais e tua sina não há de diferir em
muito da deles. Estuda minhas palavras com cuidado e lembra
daquilo que te contei. Que minha história te tenha servido de aviso,
V
senhor, pois temo que seja tudo para que jamais servirá...
CVI