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O Jogo dos Sete Erros

1. O que os pais pensam de errado sobre a influência da ficção na formação


das crianças

1. Toda a ficção que não ofenda diretamente o sexto mandamento é inofensiva para
crianças e jovens;

2. A ficção – sobretudo a infantil e juvenil – é feita apenas para divertir e não é


portadora de idéias;

3. As idéias de um texto estão apenas naquilo que ele afirma ou nega


explicitamente;

4. É aquilo que se ensina explicitamente que forma as mentalidades;

5. As más idéias que um texto possa ter não influenciam a mentalidade das
crianças;

6. Os heróis da ficção não se transformam em modelos de vida para crianças e


adolescente;

7. Portanto, o mau comportamento de meu filho e as suas más idéias não tem nada
a ver com aquilo que eu pemiti e incentivei (comprando, alugando...) que ele
lesse e assistisse.

2. Porque a ficção tem “autoridade”

1. A ficção se apresenta como uma espécie de “realidade”, à qual o leitor adere sem
crítica e contra “fatos” não há argumentos; é fácil, aceitando as premissas,
aceitar a conclusão;

2. A ficção não produz uma reação polêmica no leitor; não se sentindo atacado, ele
não está pronto a se defender; apenas a fruir.

3. A ficção utiliza símbolos e os símbolos são muito abrangentes e, ao mesmo


tempo, fluidos.

4. A ficção cria com facilidade personagens cuja simpatia (que é fácil criar) gera
uma identificação com o leitor, que passa a “torcer” pela personagem e a adotar
seus pontos de vista. Todos os leitores de O Conde de Monte Cristo, por exemplo,
torcem para que a vingança se concretize, ainda que sejam católicos e que
saibam que a vingança é um pecado grave.

5. A ficção facilmente define – sem definir explicitamente – padrões universais, pois


se aproxima do discurso epidítico1. Ao contrário do discurso jurídico – que
argumenta sobre o passado e do discurso legislativo, que argumenta sobre o
futuro, o discurso epidítico, que louva e critica, cria, sem gerar polêmica, padrões
de bem e de mal. A mesma coisa faz a ficção: cria padrões de bem e de mal, sem
gerar polêmica.

1
Para Aristóteles os discursos (palavra que não é necessário tomar em sentido estrito, mas
lato) são de três tipos: o jurídico, o legislativo e o epidítico. Este último seria o menos
argumentativo. Perelmann (A Nova Retórica) discorda e parece-me que ele tem razão.

1
3. Sete erros num exemplo: A Viagem ao Céu, de Monteiro Lobato

1. O mês de abril - Alteração de padrões morais, tudo contado com simpatia:


preguiça, gula, inveja, soberba e o resto que vem de “gozar o prazer de
viver”, sem pensar nada;

Texto:

“Era o mês de abril, o mês do dia de anos de Pedrinho e por todos considerado
o melhor mês do ano. Por quê? Porque não é frio nem quente e não é mês das
águas nem de seca – tudo na conta certa! E por causa disso inventaram lá no
Sítio do Pica-pau Amarelo uma grande novidade: as férias-de-lagarto”.

“Que história é essa? Uma história muito interessante, Já que o mês de abril é
o mais agradável de todos, escolheram-no para o grande “repouso anual” – o
mês inteiro sem fazer nada, parados, cochilando como um lagarto ao sol! Sem
fazer nada é um modo de dizer, pois que eles ficavam fazendo uma coisa
agradabilíssima: vivendo! Só isso. Gozando o prazer de viver...”

2. A fantasia alógica e irrefreada

Seres fantasiosos não apenas usados como símbolos ou dentro de um


esquema lógico (como acontece nas fábulas, por exemplo), mas na recriação
de um modelo de mundo em que as regras são alógicas e se alteram
continuamente. Não há regras lógicas nem morais.

O caso do Visconde de Sabugosa é típico. Feito de um sabugo de milho, mas


vivo, como é viva a boneca de pano, ele morre numa primeira aventura. A
boneca guarda o sabugo, sem a cabeça e os membros, embolorado por ter
caído na água, e pede à cozinheira que o refaça. Ela diz que aquele não
presta mais e faz um novo com um novo sabugo, o milho era vermelho e, por
ser ruivo, eles decidem que ele será o inglês Dr. Livingstone. Imediatamente
ele fica vivo e fala inglês. Quando vão para a Lua, dão-lhe pó de pirlimpimpim
para que ele vá ver “de fora” que lugar era aquele. Na hora de sair da lua,
decidem não salvá-lo e fazer outro.

Texto p. 52:

“O pó de pirlimpimpim que o visconde cheirou – prosseguiu Pedrino – era


muito pouco, não dava nem para levá-lo até a Terra. E como ele não caiu de
novo sobre a Lua e não podia ter chagado à Terra, o certo é estar parado na
zona em que a força de atração da Terra empata com a força de atração da
Lua – e nesse caso não sobe nem desce, fica toda a vida girando em redor da
Lua como um satélite. Acho que foi o que sucedeu – concluiu Pedrinho com a
maior gravidade.

__ Também acho – disse Emília.

Pedrinho riu-se com ar desdenhoso.

2
__ A boba! “Também acho!”... eu acho com base, mas que base tem você para
achar?

__ Eu acho com base no meu desejo de achar __ respondeu Emília.

__ Deseja, então, pestinha, que o visconde fique toda a vida como satélite da
Lua?

__ Desejo, sim. Ando me implicando com esse Dr. Libingstone. É sério demais.
Não brinca. Não faz o que eu mando. Está mesmo bom para satélite da Lua.
Quando voltarmos à Terra, vou pedir a Tia Nastácia para fazer um Visconde
igualzinho ao antigo. Aquele é que era o “legímaco”.

[...]

Pedrinho e Narizinho também andavam a implicar-se com o Dr. Livingstone,


de modo que deram razão à boneca e resolveram deixá-lo como satélite da
Lua. Mas burro falante era preciso ser salvo.”

3. Os pastores – a Igreja quer manter o povo ignorante para explorá-lo

Texto p. 20-21:

“__ Os sábios, menina, são os puxa-filas da humanidade. A humanidade é um


rebanho imenso de carneiros tangidos pelos pastores, os quais metem a
chibata nos que não andam como eles, pastores, querem, e tosam-lhes a lã e
tiram-lhes o leite, e os vão tocando para onde convém a eles, pastores. E isso
é assim por causa da extrema ignorância ou estupidez dos carneiros. Mas
entre os carneiros às vezes aparecem alguns de mais inteligência, os quis
aprendem mil coisas, adivinham outras, e depois ensinam à carneirada o que
aprenderam e desse modo vão botando um pouco de luz dentro da escuridão
daquelas cabeças. São os sábios.

__ E os pastores deixam, vovó, que esses sábios desencarneirem a carneirada


estúpida? – Perguntou Pedrinho.

__ Antigamente os pastores tudo faziam para manter a carneirada na doce paz


da ignorância, e para isso perseguiam os sábios, matavam-nos, queimavam-
nos em fogueiras – um horror, meu filho! Um dos maiores sábios do mundo foi
Galileu, o inventor da luneta astronômica, graças à qual afirmou que a Terra
girava em redor do Sol. Pois os pastores da época obrigaram esse carneiro
sábio a engolir a sua ciência.

[...] E Giordano Bruno? Ah, este foi queimado vivo numa fogueira, no ano de
1600. Sabem por quê? Porque era um verdadeiro sábio e estava iluminando
demais a escuridão dos carneiros.

__ Queimado vivo! – repetiu Narizinho com cara de horror. – Eu nem consigo


imaginar o que isso possa ser. Outro dia queimei o dedo na chapa do fogão e
doeu tanto, tanto... Imagine-se agora uma fogueira queimando a gente inteira
– a pele, os olhos, o nariz, as orelhas, as mãos, tudo, tudo... – e amenina tapou
a cara como para não ver a cena.

Dona Benta deu um suspiro.

3
__ Pois, minha filha, contam-se por centenas de milhares os mártires da
fogueira, e quase sempre por isso: enxergar mais que os outros e ensinar os
ignorantes. Por felicidade minha, eu vivo neste nosso abençoado século; se eu
vivesse na Idade Média, já estava assada numa boa fogueira e também vocês,
pelo crime de terem aprendido comigo muita coisa.”

4. O pó de pirlimpimpim – existência de várias realidades paralelas e


possibilidade de mover-se entre elas; o tédio da realidade como ela é.

Texto p. 31:

“Quero experimentar, sim – disse a negra. – O coronel chupa esse rapé com
tanto gosto, que sempre tive desejo de ver se a marca é boa – e assim
falando tomou o pó que o menino lhe apresentava [notem que o menino tinha
mentido, para enganar a cozinheira, dizendo que o pó era rapé; nem por isso,
ser mentiroso, deixa de ser o herói da história; no texto é simpático enganar
os outros para obter vantagem] e sem desconfiança nenhuma aspirou-o.
Assim que a negra fez isso, os outros fizeram o mesmo, inclusive o burro e...
mais nada! Veio aquele fiunnn no ouvido, e depois a tonteira própria do pó de
pirlimpimpim, e todos perderam a consciência. Estavam voando pelo espaço
com a velocidade quase da luz.”

Texto p. 53:

“__Para nós não há impossíveis – afirmou Pedrinho com orgulho. – Quem tem
no bolso este pó mágico, zomba das leis da natureza.”

5. A chegada à lua – subjetivismo radical: o voto da maioria determina o lugar


em que se está.

Texto p. 33:

“__ Achei um jeito de resolver o caso de saber que astro é este. Basta
fazermos uma votação. Se a maioria votar que isto é a Lua, fica sendo a Lua.
É assim que os homens lá na Terra decidem a escolha dos presidentes: pela
contagem dos narizes.

Não havendo outro meio de saírem daquela incerteza, fizeram a votação.


Pedrinho foi tomando os votos.

__ Você, Narizinho?

__ Lua!

__ E você, Emília?

__ Luíssima!

4
__ Eu, Pedrinho, também Lua. E você, Tia Nastácia?2

A negra, ainda tonta, olhou para o menino com expressão idiotizada e


respondeu:

__ Para mim, nós estamos na Terra mesmo; e tudo o que está acontecendo
não passa de um sonho de fadas.

__ Três narizes a favor da Lua e um a favor da Terra! – gritou Pedrinho. – A Lua


ganhou! Estamos na Lua. Viva a Lua!...

A negra sentiu um calafrio. Se a maioria tinha decidido que estavam na Lua,


então estavam mesmo na Lua.”

6. Dona Benta, o modelo principal, não tem religião.

A irreligião dela nunca é afirmada, pois certamente isso seria chocante em


1932. Mas ela nunca reza, nunca vai à Missa, nunca invoca Deus ou os santos.

Não é possível citar um texto típico. Praticamente todas as vezes que ela
aparece é elogiada. Jamais merece nenhuma crítica do narrador. Dou apenas
um exemplo:

Texto p. 96

“Certa vez, lá no sítio, Dona Benta explicou aos meninos o que era “sistema
planetário”. Parecia um bicho-de-sete-cabeças, mas a boa velha costumava
explicar as coisas mais difíceis de um modo que até um gato entendia.”

7. A única pessoa que tem religião é Tia Nastácia, sempre apresentada como
ignorantíssima e facílima de enganar. O problema dos textos é como acima.
Todos ressaltam que ela é ignorantíssima mas boa. Além de católica, tem
outra característica que o justifica para o racista Lobato: é negra. Sempre é
chamada assim: “a negra”.

Texto p. 47:

“__ São Jorge, me perdoe – disse ela com voz atrapalhada. – Sou uma pobre
negra que nunca fez outra coisa na vida senão trabalhar na cozinha para
Dona Benta [...]. Por isso rogo a São Jorge que me perdoe se as minha
humildes respostas não forem da competência e da fisolustria dum santo da
corte celeste de tanta prepotência...”

Bibliografia:

2
Só de passagem, notem que na década de 1930, quando o livro foi escrito, todos os “mais
velhos” eram “senhor” e “senhora”; Tia Nastácia é “você”.

5
BÉNICHOU, Paul. Le sacre de l’écrivain. Paris: NFR/ Gallimard, 1996.
HALSALL, Albert W. L’art de convaincre. Toronto: Editions Paratexte, 1988.
LOBATO, Monteiro. Viagem ao céu. São Paulo: Editora Globo, 2007. 1ª. edição: 1932
SULEIMAN, Susan. L’autorité fictive. Paris: PUF, 1983

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