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A psicosofia de I.

Kant e a doutrina espírita


Palestra realizada no IV encontro ecumênico de educação e cultura para a paz, em 2004, na
cidade de São Carlos/SP.

Uma versão resumida foi também publicada na Revista Universo Espírita, em sua edição n° 12.

(revisado em agosto de 2009)

Palestrante: Adilson Marques


“Chegara Kant, por fim, ao termo de sua
pesquisa filosófica. Procurando Deus,
encontrara o Homem. ‘O Homem’,
conta-nos uma lenda oriental, ‘levantou
o véu da deusa de Sais e viu a si
mesmo”.

Henry Thomas

Este artigo traz à luz um neologismo: Psicosofia. Esta palavra foi cunhada
com o objetivo de delimitar um campo de reflexão pouco comum no meio
filosófico: o campo da sabedoria espiritual (psique = espírito / Sofia = sabedoria).
O termo espírito no meio filosófico quase sempre foi pensado como sinônimo de
mente ou como o seu produto e, com raras exceções, como um Ser incorpóreo
autônomo e invisível para a maioria das pessoas. Assim, o termo psicosofia
valorizará essa outra dimensão e será utilizado para caracterizar as teorias
formuladas por diferentes filósofos ou pensadores encarnados, independente da
época, sobre o mundo dos Espíritos.

Após esse primeiro esclarecimento, podemos dizer que o objeto desta


pesquisa é compreender a psicosofia kantiana e seus pontos de contato com a
Doutrina Espírita, filosofia que surgiu no século XIX, na França, com a obra do
pedagogo Hyppólite Leon D. Rivail, mais conhecido pelo pseudônimo Allan
Kardec. O espiritismo produziu um amplo estudo sobre o mundo dos espíritos,
tendo como heurística a manifestação mediúnica, prática que hoje se encontra
popularizada em quase todos os pontos da Terra, enquanto Kant elaborou sua
teoria a partir da leitura de um livro escrito por Swedenborg, conhecido no século
XVIII como o “vidente de espíritos”.

Algumas pessoas acreditam que as informações transmitidas pelos


espíritos são verdades inquestionáveis. Porém, analisando algumas mensagens,
mesmo as psicografadas por médiuns famosos como Chico Xavier ou Divaldo
Franco, vamos encontrar informações contraditórias. Para um cético, seria a prova
de que tudo não passaria de ilusão ou produções da mente ou do subconsciente
do próprio médium. Mas, para quem aprecia o saber e o sabor do mundo
espiritual, tais contradições são a garantia de que este mundo também é uma
incógnita e que deve ser estudado sem fanatismo.

É importante esclarecer também que a psicosofia, como aqui propomos,


transcende a preocupação em constituir dogmas ou doutrinas religiosas, abrindo-
se para todas as interpretações que possam enriquecer nossa compreensão sobre
tão fascinante assunto. É assim que podemos compreender a existência de uma
psicosofia na obra de Lao-Tsé, Buda, Jesus, Sócrates e em muitos outros filósofos
e pensadores ocidentais e orientais.

Poucos estudiosos se debruçaram sobre a psicosofia de Emmanuel Kant


(1724-1804), pensador prussiano cuja obra foi uma das mais representativas do
século XVIII. Kant ficou famoso mundialmente no meio filosófico por suas
“críticas”, as suas obras “maduras”. Porém, a teoria sobre os espíritos que chegou
a formular com muito carinho e dedicação, apesar de, posteriormente, tê-la
abandonada, é mais conhecida como fruto de uma fase “imatura” e, portanto, sem
muita importância.

Esta teoria, em linhas gerais, antecipou em quase cem anos algumas das
revelações que compõem o quadro doutrinário do espiritismo. Possivelmente, se
Kant não tivesse abandonado suas pesquisas sobre os espíritos, poderia ter
criado um clima mais amistoso, pelo menos no meio filosófico, para a difusão da
Doutrina Espírita. É provável que nem ele se encontrava preparado para
compreender a importância dessa sua reflexão, uma vez que costumava
apresentá-la com uma certa dose de ironia, como se estivesse disfarçando o fato
de estar se dedicando a um tema de “menor” valor.

Kant e o vidente de espíritos

Em 1804, ano em que Kant veio a falecer, nasceu, na França, Allan


Kardec, o codificador do espiritismo. Em 1766, porém, Kant publicou um livro
incomum no meio filosófico e até hoje pouco lido e discutido. Este texto rebelde de
Kant chamou-se: “Sonhos de um vidente de espíritos explicados pelos sonhos da
metafísica”.

Por anteceder seus principais livros, esta obra passou a ser tratada por
alguns historiadores da filosofia como uma produção inferior, como fruto do
período “pré-crítico” de Kant. Alguns estudiosos se debruçaram sobre esta obra
interessados em compreender a “loucura”, dando pouca atenção para a psicosofia
nela presente. Acredito que este nosso estudo seja o primeiro que procurou
correlacionar este livro de Kant com a doutrina dos espíritos nascida na França,
em meados do século XIX.

Poucos são os estudiosos da obra de Kant que aceitam o fascínio daquele


pelas “visões e alucinações auditivas” vividas pelo famoso ocultista Swedenborg.
E se o próprio Kant teve receio de assumir publicamente esse fascínio pelo
“vidente de espíritos”, escrevendo, meio sem jeito, que refletiu sobre o livro
Arcanos celestes de Swedenborg para compensar a grande despesa financeira
que teve para adquirir o livro, o que pensar de seus atuais estudiosos?

Ao ler Kant, a impressão que nos chega é a de estarmos diante de um ser


incomodado. O autor parece ambíguo, ora aceitando como real as “alucinações”
de Swedenborg (ou seja, que seria possível a comunicação com os mortos e que
eles poderiam nos transmitir pensamentos e até predizer o futuro), ora (como irá
concluir, infelizmente) que tudo não passaria de ilusão ou, em suas palavras, de
“sonhos das sensações” (expressão que criou para diferenciar as “alucinações” de
Swedenborg do que chamou de “sonhos da razão”, manifestos nos sistemas
abstratos dos metafísicos).

Porém, independente da conclusão de Kant, ele foi capaz de elaborar uma


reflexão filosófica sobre os espíritos, uma psicosofia que, de certa forma, poderia
ter facilitado a compreensão ou preparado melhor o terreno para a doutrina
espírita se ele não tivesse abandonado suas reflexões sobre o mundo dos
espíritos.

Por alguma razão subjetiva Kant não se cansava de dizer que talvez as
experiências ocultistas com os espíritos fossem falsas, mas não charlatanismo.
Para Kant o contato com o mundo dos espíritos era o resultado de uma
perturbação da inteligência, de alguma afecção patológica dos sentidos e da
imaginação. Esse processo resultaria em representações simbólicas de um além
impossível de ser atingido pelas mentes normais.

Kant, apesar de classificar as visões e audições descritas por Swedenberg


como algo “patológico” apresentará uma hipótese bem “complexa” para um
filósofo ocidental do século XVIII. Tais “patologias” poderiam, de fato, ter uma
causa espiritual. Ou seja, Kant chega a admitir que os espíritos (os mortos)
poderiam influenciar ou perturbar as faculdades normais dos “vivos”.

Dessa forma, o filósofo prussiano chegou a admitir a possibilidade de haver


uma relação entre o “mundo dos vivos” e o “mundo dos espíritos”, mesmo que isso
produzisse um efeito patológico sobre as faculdades mentais dos primeiros.

Kant reconheceu que essa sua hipótese transporia os limites da


racionalidade de sua época. Curiosamente, hoje em dia, após exaustivas
experiências mediúnicas, ao invés da aceitação natural da possibilidade de
comunicação entre encarnados e desencarnados (espíritos), ainda é possível
encontrar quem afirme que as pessoas (médiuns) que contatam o mundo dos
mortos adquirem enfermidades ou são levadas à loucura, algo já desmistificado
pelo mediunismo de uma forma geral.

Assim, é compreensível que o filósofo prussiano, no século XVIII, não


aceitasse a manifestação medianímica como um fenômeno natural, tratando-a
como algo patológico, mas, atualmente, essa concepção é totalmente absurda, um
contra-senso.

Refletindo sobre as “alucinações” de Swedenborg, Kant elaborou sua teoria


sobre os espíritos que seria aproximadamente a seguinte:
• os espíritos seriam seres que ocupam o espaço físico sem o
preencherem (algo semelhante é dito para Kardec por um espírito no
livro O céu e o inferno).
• Eles habitariam um mundo supra-sensível e formariam uma
comunidade de seres racionais. Para se conhecer tal comunidade,
no domínio da experiência, só haveria um caminho: através do
“mundo moral”.

Para Kant, na medida em que nos sentimos descontentes em viver presos


aos nossos desejos sensoriais e reconhecemos que somos dependentes de uma
Lei e de uma vontade que nos vem do exterior, somos atravessados por uma
exigência que funda uma comunidade interdependente, à maneira de uma atração
universal entre o mundo sensível dos homens e o supra-sensível dos espíritos, ou
seja, dos mortos.

Mas a fascinação de Kant pela “intuição alucinada” de Swedenborg, que


afirmava conversar cotidianamente com os mortos, fez com que ele antecipasse
algumas das premissas que o espiritismo revelaria no século seguinte. Kant se
apercebeu que os espíritos, apesar de não estarem efetivamente no espaço,
utilizam-se dos pensamentos humanos e suas idéias são revestidas pela
aparência do mundo sensível. Em suma, o mundo dos espíritos, segundo Kant,
continuaria sendo o mundo das representações humanas.

Essa leitura kantiana é corroborada pelo espiritismo. Para a doutrina


espírita, a pessoa que desencarna (morre), perde apenas o seu corpo físico. Ela
não se torna santa ou uma entidade angelical só porque morreu. Ela também não
encontrará, necessariamente, Deus. Ela manterá seus próprios valores
(poderíamos hoje dizer imaginário). Assim, se ela morreu sentindo ódio de
alguém, ela poderá continuar manifestando esse mesmo sentimento fora do corpo
físico, tentando se vingar do seu desafeto com uma arma a mais: a invisibilidade.
São os famosos casos de obsessão descritos amplamente pela fenomenologia
espirítica.

Em suma, se não fosse a preocupação excessiva de Kant em classificar


como patológica a comunicação com o mundo dos espíritos, possivelmente o
filósofo reconheceria a anterioridade do mundo dos espíritos e, quem sabe,
avançaria para o estudo da reencarnação. Mas o filósofo prussiano prosseguiu
em sua interpretação psicosófica classificando as construções subjetivas de
Swedenborg como sonhos, especificamente, como ilusões.

Para diferenciar as ilusões dos ocultistas das ilusões dos metafísicos, Kant
denominou as primeiras de sonhos dos sentidos e, as segundas, de sonhos da
razão. Porém, apenas as “ilusões” dos ocultistas foram classificadas como
patológicas.
Kant chegou também a escrever que Swedenborg seria um “oráculo dos
espíritos” e que teria o seu “ser interior” aberto. Ou seja, que podia ser “tomado”
pelos espíritos. Hoje, com o advento da doutrina espírita, poderíamos dizer que o
“vidente de espíritos” era, de fato, um médium e que, possivelmente, possuía a
mediunidade psicofônica, conhecida também como mediunidade de
“incorporação”, aquela que acontece quando um ser incorpóreo utiliza o veículo
físico de um encarnado para se comunicar, utilizando suas mãos, por exemplo,
para escrever ou segurar objetos; suas pernas para andar pelo ambiente e, como
diz o nome da mediunidade, falar (de forma audível para todos os presentes)
através da boca do médium que pode ficar totalmente inconsciente durante o
processo, em semi-consciência ou, até mesmo, plenamente consciente.

Mas a relutância de Kant em colocar do mesmo lado o idealismo dos


metafísicos e o “delírio” dos ocultistas, particularmente, de Swedenborg, levou-o a
tentar definir os limites entre a razão dos metafísicos e a loucura dos ocultistas. O
combate interior do filósofo parece intenso, pois Kant reconhecia ser pretensioso
não acreditar em nada do que Swedenborg escrevia e, ao mesmo tempo, acreditar
em tudo sem um exame mais rigoroso da razão.

Os momentos de ironia ou as afirmações de que teria sido ingênuo ao


investigar se os relatos de Swedenborg poderiam ser verídicos, não parecem
desmentir que Kant não estivesse, de fato, mantendo um real interesse pelo tema.
Aliás, em carta dirigida a Mendelssohn, Kant afirmou que a “desordem coerente
dos sentidos” (a causa das alucinações nos ocultistas, em sua opinião) seria um
fenômeno muito mais notável do que os sofismas racionais dos metafísicos. Para
Kant, os relatos de Swedenborg, no que concerne aos princípios racionais, seriam
exatos, apesar de “extravagantes”. Ela confessa que seria capaz de sustentar os
devaneios do ocultista se alguém contestasse sua possibilidade. Talvez seja por
essa razão que, como já afirmei anteriormente, Kant nem chegou a discutir um
possível charlatanismo na obra de Swedenborg.

Hoje sabemos que a doutrina espírita defende a idéia da existência de


“classes” diferentes de espíritos, variando conforme o seu padrão vibratório, ou
seja, o “grau de evolução” atingido em diferentes encarnações, apesar de todos
terem sido criados “simples e ignorantes”. Assim, os espíritos alcançariam os
diferentes estágios evolutivos de acordo com suas semeaduras. A doutrina
espírita relata também os casos de licantropia, ou seja, quando o espírito adquire
formas monstruosas em função de sua queda moral.

Essa diversidade de formas espirituais também está presente nas visões de


Swedenborg. Este descreve como vê as entidades “angelicais” e as
“monstruosas”, confirmando a pluralidade das formas espirituais. E Kant, como
uma espécie de censor, recomenda que as mulheres, sobretudo, as grávidas, não
entrem em contato com as informações referentes ao estado dos espíritos após a
morte (desencarnação).
Segundo a doutrina espírita, com a desintegração do corpo físico, resta
apenas a forma perispiritual. E esta não pode ser maquiada por plásticas ou
silicones. A forma perispiritual seria fruto do caráter moral de cada ser. Com base
nessa informação é possível dizer que as formas que Kant desejava preservar as
mulheres de ver, ou melhor, de ler, não eram das mais belas e harmoniosas.

Mas, como já salientamos, ao teorizar que há uma causa fisiológica e


patológica para as “alucinações” do vidente de espíritos, Kant teria que, para
permanecer coerente com sua teoria, aceitar que nada poderíamos aprender com
os videntes e ignorá-los. Mas não é essa sua posição. Kant se manteve dividido.
De um lado, demonstrou receio das críticas e censuras dos filósofos e de seus
leitores. De outro, parecia motivado em aprofundar suas teoria sobre os espíritos,
mesmo reconhecendo que tal ato o levaria, necessariamente, ao abandono da
“linguagem prudente da razão”.

A alternativa que encontrou foi a de compreender como “sonhos” tanto os


sistemas metafísicos como os sistemas ocultistas. A diferença entre eles, como já
afirmamos, é que os primeiros seriam sonhos da razão e, os segundos, sonhos da
sensação. Essa concepção teórica permitiu ao filósofo relacionar a fantasia ao
seu complexo e contraditório quadro interpretativo. No caso da metafísica, as
quimeras seriam limitadas pela percepção efetiva dos objetos e dos sentidos. No
caso dos ocultistas não haveria nada capaz de entravar os desdobramentos
imaginários.

Porém, com base nos estudos de Projeciologia, sobretudo de autores que


gozam de certa confiabilidade, como é o caso de Waldo Vieira, antigo
companheiro de psicografia de Chico Xavier, o mundo material, tal qual o
conhecemos através de nossos sentidos, de fato não é obstáculo para os seres
incorpóreos que são capazes de atravessar o fogo, a água, paredes etc. Assim,
talvez a imaginação de Swedenborg não fosse a criadora de um universo de
revelações alucinadas, como pensou Kant, mas uma realidade transcendental não
captada através dos sentidos físicos. Assim, talvez os desdobramentos
imaginários sejam realidade no mundo dos espíritos, como a capacidade de voar,
sentir o aroma e ver as cores do som etc.

A ambigüidade de Kant não o impediu de afirmar que, em seu exame


filosófico dos seres espirituais, a natureza espiritual não poderia ser conhecida,
mas conjecturada. Para se pensar algo tão diferente de todo o sensível, não
temos como nos repousar na experiência, mas apenas em uma “razão
desamparada”. Curiosamente, essa conclusão de Kant nos parece muito atual,
pois, com o aumento considerável de mensagens psicografadas, ou seja, escritas
por seres incorpóreos através de inúmeros médiuns, não é fácil admitir o que é
verdade e o que não é nas informações transmitidas pelos espíritos, tanto que as
federações espíritas costumam definir quais livros psicografados são “espíritas” e
quais não são, apesar de todos serem escritos, em Tese, por espíritos.
Kant, como salientamos, parece ter antecipado tal complexidade e adiantou
que diante das informações que os seres incorpóreos nos trazem, nossa razão se
encontra desamparada. Assim, e aqui é minha opinião, alguém definir o que é
verdade e o que não é em tais comunicações parece ser, apenas, mais uma
demonstração de dogmatismo, no sentido usual do termo, e não de sabedoria,
pois como podemos comprovar que escolhemos um gênero de provas antes de
encarnar, se a vida na Terra é inferior ou superior que a vida em Marte, se Deus
julga a intenção e não os fatos etc.

Outra questão interessante em sua reflexão sobre os espíritos, e que


também se mostra atual, é a preocupação para que o sujeito das representações
(o médium) não se torne prisioneiro da fantasmagoria dos espíritos. De certa
forma, essa também é uma preocupação dos doutrinadores espíritas em relação
aos médiuns em formação. Os espíritas classificam os médiuns que se tornam
“prisioneiros” dos espíritos de “fascinados”.

E Kant parece muito preocupado em estabelecer limites entre o “interior” e


o “exterior”, entre o “cognoscível” e o “incognoscível”, entre os “objetos
percebidos” e as “errâncias imaginárias” nesse complexo fenômeno.
Possivelmente, sua teoria sobre a correlação entre o “conflito real” e o “conflito
dialético”, discutido em sua obra capital, “Crítica da razão pura”, foi efeito do
encontro com a obra de Swedenborg. Assim, o mundo espiritual, conforme
aparece na obra do “oráculo de espíritos”, só seria possível de ser compreendida
através de um novo método: a “dialética transcendental”.

Talvez seja por isso que Kant, ao definir a razão como a arte de arquitetar
problemas sem solução, parece ainda preocupado em encontrar uma solução
para a questão dos espíritos. Será através da noção de númeno que Kant atribuiu
um lugar para aquilo que se encontra além do fenomenal. Assim, a positividade do
mundo fenomenal passa a adquirir sentido em oposição à negatividade do
númeno. O filósofo não afirma que tal negatividade seja absoluta, pois o fenômeno
também não é tudo, fixando, assim, o estatuto de transcendente, abrindo a
possibilidade de se compreender o complexo mundo dos espíritos, o mundo que,
possivelmente, nós viveremos ao deixar o corpo físico.

Algumas conclusões

É interessante assinalar a desconfiança da filosofia contemporânea com o


mundo espiritual. Na Antiguidade, Sócrates já afirmava ver e conversar com o seu
daimon, o que hoje a doutrina espírita chama de “mentor” ou “guia espiritual”.
Pitágoras, Platão, São Francisco, entre outros pensadores ocidentais, foram
reencarnacionistas.

Para o senso comum, aceitar a idéia de que a vida continua para além da
morte física e que seria possível contatar os espíritos seria um dogma criado pelo
espiritismo, uma religião irracionalista, segundo alguns acadêmicos. Mas não é no
campo da filosofia que iremos encontrar as provas mais evidentes da continuidade
da vida. O século XX conheceu, graças à mediunidade de Chico Xavier, um
avanço nos meios de comunicação entre espíritos encarnados e seres
incorpóreos. A Academia ainda não se deu conta, mas a literatura mediúnica
possui a força da literatura dos viajantes que, no século XVI, descrevia o mundo
novo ainda desconhecido para os europeus.

Em minha opinião, todos têm o direito de não acreditar no espiritismo ou em


qualquer outra filosofia espiritualista, mas não aceitar o fenômeno mediúnico como
real é o que poderíamos chamar de uma enorme demonstração de irracionalismo.
No século XIX, o filosofo alemão Schopenhauer afirmou: “hoje em dia não
acreditar no magnetismo não é ceticismo, é ignorância”. Poderíamos trocar a
palavra magnetismo por mediunismo e a frase do filósofo seria adequada para
esse limiar de século XXI.

Atualmente, a literatura mediúnica é uma realidade mundial e as centenas


de livros psicografados por Chico Xavier, por exemplo,envolvendo mais de 2000
escritores incorpóreos, não pode ser menosprezada pelo nosso preconceito
religioso ou materialista.

Mas não precisamos ser adepto de nenhuma religião para acreditarmos que
a vida continua após a morte do corpo físico. As contribuições da Psicologia
Transpessoal e da Projeciologia, ciências que não possuem vínculos doutrinários,
demonstram também que a comunicação entre os dois planos da vida é mais
comum do que possamos imaginar. Assim, é um falso enigma, o shakesperiano
texto que afirma ser a morte uma região misteriosa de onde nenhum viajante
jamais voltou.

Emmanuel Kant, o pequeno sábio aleijado prussiano, viveu intensamente o


paradoxo encontro entre o romantismo alemão inspirado por Goethe e o
Iluminismo que procurava varrer o irracionalismo da Europa.

Apesar da infância humilde e pobre, Kant e seus dez irmãos foram


educados em um meio religioso rico de alimento mental e inspiração moral. Sua
família era Pietista, uma seita puritana conhecida como “soldados da paz”. Desde
pequeno apreciou os valores éticos do Pietismo, mas teve verdadeira aversão
pelas intermináveis formalidades cerimoniosas.

Ao preferir se dedicar à Filosofia e não a Teologia, desiludindo seus pais,


Kant mergulhou profundamente sobre todo o mundo conhecido do século XVIII,
indo desde as abstrações da metafísica até as realidades da física, da psicologia,
da astronomia e das demais ciências de sua época. Notou, porém, que tudo o que
a ciência estudava parecia se constituir em uma propriedade infinita com um amo
ausente: Deus.

A partir desse momento, Kant decidiu consagrar sua vida ao exame da


propriedade e à procura do amo, afirmando: “nada desviar-me-á desse curso”. O
contato com a fascinante obra do vidente Swedenborg quase o fez mergulhar no
profundo e também pantanoso mundo dos espíritos. Mas não teve a coragem ou o
apoio suficiente para continuar nesse caminho, classificando, infelizmente, como
ilusão o mundo que atualmente a literatura mediúnica vem a cada dia revelar
como natural.

A comunicação entre encarnados e espíritos além de não ser patológica,


não possui nada de sobrenatural e fantasioso, apenas regras que devem ser
observadas.

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