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DOMINGO, 30 DE AGOSTO DE 2009

O ESTADO DE S. PAULO
ALIÁS J3
ALIÁS J3

PONTO Demétrio Magnoli CONTRADIÇÃO


APONTO “Estatuto da
Igualdade Racial
Sociólogo e especialista é inviável. Ou
existe igualdade
em geografia humana ou existe raça”

Uma gota de discórdia


Crítico do sistema de cotas nas universidades brasileiras esquadrinha a história do racismo
NELSON KON/ACERVO AFRO BRASIL

Christian Carvalho Cruz


Cinco anos atrás, ao matricular
suafilhaemumcolégio paulista-
no,osociólogoecolunistado Es-
tadoDemétrioMagnolisedepa-
rou com uma “aberração”. Por QUARTA, 27 DE AGOSTO
orientação do Ministério da
Educação, o formulário trazia
umcampopedindoaraçadoalu- Quem vai ser
no. Magnoli tascou um “huma-
na” na ficha e voltou para casa a nova vítima?
decidido a escrever Uma Gota
de Sangue – História do Pensa- ●●● Espancado por seguranças
mentoRacial(EditoraContexto, de um supermercado porque “um
400 págs., R$ 49,90), que chega neguinho não pode ser dono de
às livrarias na quarta-feira, 2. um EcoSport”, o vigilante Januá-
Libelo contra o que o autor rio Santana, funcionário da USP,
chama de mito das raças – a ne- está 8 kg mais magro e com insô-
cessidade de diferenciar seres nia. Seus advogados querem que
humanos por sua ancestralida- a polícia apure crime de tortura.
de, por uma única gota de san-
gue –, o livro mergulha fundo
nas origens do racismo e seus
desdobramentos nos tempos DISCRIMINAÇÃO REVERSA
atuais. “Raças não existem. O “As cotas raciais não são um
que existe é o mito da raça, uma meio válido para corrigir dife-
invenção recente, nascida há renças socioeconômicas por-
150 anos junto com a expansão que nunca reduziram pobreza
daspotênciaseuropeias naÁfri- em lugar nenhum onde foram
ca e na Ásia e usada para con- implantadas. Elas beneficiam a
quistar poder político e econô- natadogrupoprivilegiado.Aco-
mico”, diz Magnoli. ta racial para ingresso em uni-
Uma Gota de Sangue mostra versidades públicas não está ti-
como essa invenção teria sido rando vaga dos ricos, dos filhos
desinventada no pós-guerra e de empresários. Esses, ou fize-
reinventada pelos movimentos ram colégios e cursinhos tão
multiculturalistas de 30 anos bons que conseguirão passar no
mais tarde, culminando em um vestibular mesmo com um nú-
tema caro a Magnoli: a crítica mero de vagas menor em dispu-
ao sistema de cotas raciais ado- ta ou cursarão universidade no
tadas em universidades públi- exterior.Oque a cotafazé insta-
casbrasileiras.Paraele,umapo- lar uma competição dentro da
lítica de Estado que “cria uma classemédia baixa,uma compe-
clientela eleitoral” e “instala o tição racial dentro de um grupo
ódioracialno meiodaclassemé- social que veio do ensino públi-
dia baixa trabalhadora”. co,entreosfilhosde trabalhado-
O autor sustenta ainda um res da classe média baixa. São
polêmico paradoxo: o de que os aqueles que terminam o ensino
defensores de leis raciais de ho- UMA IDEIA NA PAREDE – Detalhe da Exposição ‘Ex-Votos’, do Museu Afro Brasil, em São Paulo: ‘Raça serve para exercer controle político’ médio. Não sejamos demago-
je resgatam o discurso que on- gos: vamos tirar os miseráveis
tem ajudou a justificar a segre- mativas. Essas políticas volta- O BRASIL SE QUER MESTIÇO o racismo se manifesta aqui é dessa história, porque eles não
gação entre brancos e negros. “Defensores ram, agora sob a alegação de fa- “No Brasil, os racialistas pro- um escândalo, o que mostra o terminarão o ensino médio, eles
“Para os multiculturalistas, a zer o bem, às ideias raciais do põem que as estatísticas demo- caráter antirracista da nação. nãoserãobeneficiados pelasco-
igualdade é uma falsificação, de leis raciais século19. No momento em quea gráficas tomem pardos e pretos Issoé umavantagem,masosde- tas. Então, quem acaba benefi-
pois não existe no mundo real; genética decifra o DNA e afir- como negros. Eles precisam fensores de leis raciais acham o ciado é o jovem de classe média
no mundo verdadeiro as pes- querem ma que a raça não existe, que a transformar o quadro interme- contrário. Dizem que é melhor baixa da cor ‘certa’ em detri-
soas não são iguais, dizem. Por cor da pele é uma adaptação su- diário, cheio de tons indefini- um racismo explícito à la ameri- mento do jovem de classe média
isso eles querem abolir a igual- eliminar perficial a diferentes níveis de dos, em algo mais simples, com cana do que o racismo envergo- baixa da cor ‘errada’. É a discri-
dade, preferem a diferença. É insolação, e que é controlada duas cores, para sustentar o mi- nhado à la brasileira. O racismo minação reversa.
um pensamento do século 19”, o mestiço. por 10 dos 25 mil genes do ser toda raça.Só que42%dos brasi- explícito ajuda a definir interes-
afirma. “Mas raça e igualdade humano, a raça reaparece pelo leiros se dizem pardos, ou seja, ses de raças – necessários aos À CAÇA DE VOTOS E PODER
são palavras de mundos distin- Eles dizem viés cultural, como algo essen- não se classificam em raças. que se dizem líderes raciais. “Os racialistas dizem estar fa-
tos.Igualdadeédemocracia.Ra- cial e imutável de um povo, co- Vão dizer que se declarar pardo zendo justiça social por meio do
çaédiferença.Ouexisteigualda- que a ideia de mo gene novamente. A Bolívia, é uma proteção contra a discri- A ETERNA QUESTÃO REGIONAL sistema de cotas. É falso. O que
de, ou existe raça.” A seguir, os porexemplo,estásereinventan- minação racial, que é pior com “No Brasil a desigualdade é es- as leis raciais visam é criar zo-
principais trechos da entrevis- igualdade é do com base num conceito ra- os negros. Mas comparando os sencialmente socioeconômica – nasdeinfluênciapolíticaeeleito-
ta de Magnoli ao Aliás. cial, está se tornando um país censos de 1940 e 2000 vemos eéterrível. Nãoéracial.Amaio- ral.IssoacontecenoBrasil,cada
falsa porque polarizado entre ameríndios e que a proporção de brasileiros ria dos pretos e pardos do País vez mais na Bolívia e em outros
A INVENÇÃO DA RAÇA brancos. No Brasil essa propos- que se declaram pretos se re- está no Norte e no Nordeste, as lugares onde falar em nome de
“O conceito contemporâneo de no mundo ta está codificada como Estatu- duz e a dos que se declaram regiões mais pobres, enquanto uma etnia ou raça é desenvolver
raçacomo famílias humanas se- todaIgualdadeRacial–umafra- brancos também. Dizer que o a maioria dos que se declaram umaclientelapolítica,édizer‘vo-
paradas pela ancestralidade real as se inviável. Raça e igualdade númerodepardosaumentapor- brancos está no Sul e no Sudes- tem em mim porque eu defende-
quemantêmrelaçõeshierárqui- sãopalavrasdeuniversosdistin- queaspessoasquerem‘embran- te, as regiões mais ricas. A par- rei os interesses desse grupo
cas entre si surgiu e se consoli- pessoas não tos.Igualdadeédemocracia.Ra- quecer’parafugirdo preconcei- tir disso algum perturbado po- que eu acabei de definir’. A fun-
dou no quadro do evolucionis- çaédiferença.Ouexisteigualda- to é um argumento de quem lê deria sugerir a criação de cotas ção é produzir lideranças políti-
modarwinistadasegundameta- são iguais. de ou existe raça. O perigo do as estatísticas só até a metade. para nordestinos. Os filhos de cas, carreiras política, poder po-
de do século 19. A ciência oficial multiculturalismo é que ele O Brasil caminha para um mo- Tasso Jereissati, Ciro Gomes e lítico. Você não precisa falar pa-
criou a raça. Esse período coin- Assim, quereliminaromestiço. Osmul- mento em que 90% da popula- José Sarney adorariam, porque raasociedadecomoumtodo,ex-
cidiu, e não por acaso, com o im- ticulturalistas dizem que ‘esse ção vai se dizer parda. E esse é o ascotassemprefavorecemana- plicando que vai defender os in-
perialismo europeu na África e pretendem negóciodeigualdadeéumafalsi- grande problema para lideran- ta do grupo privilegiado por teressesgeraisdoscidadãoseas-
na Ásia. ficação, pois não existe no mun- çasdomovimento negroquede- elas. Eu não estou dizendo que sim competir com um monte de
Muitos imaginam que o con- abolir a do real; no mundo verdadeiro fendem as leis raciais. Não se não haja maior incidência depo- gente que diz a mesma coisa.
ceitode raçasurgiucomaescra- as pessoas não são iguais’. Eles faz lei racial num país em que as breza entre pretos e pardos. Há,
vidão moderna. É falso. A ideia igualdade. querem abolir a igualdade, pre- pessoas não definem sua raça. mas em função do que ocorreu FRONTEIRA NO ÔNIBUS
de raça não veio para explicar ferem a diferença. Um pensa- no fim da escravidão – quando “Ações afirmativas socioeconô-
ou justificar a escravidão e sim Preferem a mento do século 19. NÃO SOMOS RACISTAS os descendentes de escravos, micas, como cotas sociais e polí-
paraexplicare justificaroimpe- “Há racismo no Brasil. O que por falta de ensino público ticas de melhoria rápida e dra-
rialismo europeu, que vinha na diferença, A REVIRAVOLTA OBAMA não há é um conceito popular de abrangente e por falta de refor- mática das escolas públicas nas
esteira do iluminismo e da ideia “Nos anos 60, o que Martin Lu- que estamos separados por ra- ma agrária, não foram incluídos periferias, ajudariam mais os
deigualdadenaturalentreosse- como no ther King fez o tempo todo foi ças, como nos EUA. Assim, não na sociedade que se moderniza- pobresa ingressar no ensino su-
res humanos. Isso tinha conse- pedir que os Estados Unidos somos racistas no sentido de a va – e não em função do racismo perior. Fazer isso por meio de
quências explosivas. Como do- século 19” respeitassem o princípio da maioria dos brasileiros não in- atual. ações afirmativas raciais leva o
minar uma nação se todos são igualdadeprevistona Constitui- terpretar o Brasil pelo prisma DIVULGAÇÃO aluno branco a olhar para o lado
iguais?Nãopodehaverdomina- ção americana, ou seja, ele pre- da raça; e também no sentido de e pensar: ‘Este é quem não tinha
ção. Então precisaram de algo tendia abolir o conceito de raça o Estado brasileiro não ter feito o direito de estar aqui, mas está
que relativizasse a igualdade, DESINVENÇÃO E REINVENÇÃO da política. Barack Obama foi leis raciais ao longo da história. porque tem a cor que agora vi-
que, afinal, ‘é um bom princípio, “Oconceitoderaçafoidesinven- mais longe ao se definir como Não somos racistas, embora rou “certa”; e eu estou separado
mas a ciência nos mostra que tado no final da 2ª Guerra como mestiço. Foi uma afirmação re- existam racistas no Brasil. O ra- dele não só pela cor da pele, mas
ele é falso, pois na verdade não reaçãoaonazismo,aoHolocaus- volucionária, porque a mestiça- cismo aparece na operação ile- pelas leis deste país, que o colo-
existem pessoas iguais’. to, aos campos de extermínio. O gem não existe no censo e nas gal de certas instituições, clara- cam num grupo com certos pri-
Curioso notar que só nas so- mundo olhou para trás e disse: leis americanas. Lá, ou você é mentea partedapolícia queain- vilégios; ele está aqui porque al-
ciedades fundadas sobre a ideia ‘Essa ideia de que a humanida- branco ou é negro, pois para se da prefere parar o jovem negro guém da minha cor de pele, mas
de igualdade se torna necessá- de está dividida em raças pro- fazer leis raciais elimina-se a a parar um jovem branco. Mas o com a mesma renda dele, não
rio invocar o mito da raça. As duz sangue em grande escala, mestiçagem, definindo clara- fato é que o racismo no Brasil está’. Esse é um grande risco:
sociedadesfundadasobreadife- não aceitamos mais isso’. A ra- mente a raça de cada um. E a estásempreligadoà questãoso- cotas raciais traçam uma fron-
rença, como todas até o ilumi- çaentãofoidesconstruída,com- mestiçagem é a indefinição, a cioeconômica. A violência poli- teira dentro dos ônibus, dentro
nismo, não precisam dele. O ‘ra- batida nas grandes declarações não-raça. Então, quando Oba- cial baseada no preconceito ra- dos bairros periféricos, no meio
cismo científico’ se fez necessá- sobre direitos humanos, algo a ma diz que é mestiço, filho de cial é muito clara nas periferias dopovo,porquevizinhosdebair-
rio para justificar um dos gran- ser abolido das sociedades de- mãe branca e pai negro, ele dá e favelas. Pessoas que não têm ro e colegas de trabalho com a
des processos do mundo con- mocráticas. Mas 20 ou 30 anos um passo além de Luther King. pelebranca,mas vivemembair- mesma renda vão se olhar e en-
temporâneo, o da expansão do depois ela foi reiventada pelo Não se trata só de eliminar a ra- ros de classe média, estão me- tender que estão separados pe-
poder econômico das grandes multiculturalismo e suas políti- ça da política, mas também da nos sujeitas a uma abordagem la cor da pele. Isso é instalar no
nações europeias. cas descritas como ações afir- consciência das pessoas. racista da polícia. Cada vez que O LIVRO – Raça, só a humana meio do povo o ódio racial.” ●

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