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Jovens e adultos como sujeitos

de conhecimento e aprendizagem

Marta Kohl de Oliveira


Faculdade de Educação, Universidade de São Paulo

Trabalho apresentado na XXII Reunião Anual da ANPEd, Caxambu, setembro de 1999.

O tema “educação de pessoas jovens e adul- do em ocupações urbanas não qualificadas, após
tas” não nos remete apenas a uma questão de es- experiência no trabalho rural na infância e na ado-
pecificidade etária mas, primordialmente, a uma lescência, que busca a escola tardiamente para al-
questão de especificidade cultural. Assim, apesar do fabetizar-se ou cursar algumas séries do ensino su-
recorte por idade (jovens e adultos são, basicamente, pletivo. E o jovem, incorporado ao território da
“não crianças”), esse território da educação não diz antiga educação de adultos relativamente há pou-
respeito a reflexões e ações educativas dirigidas a co tempo, não é aquele com uma história de esco-
qualquer jovem ou adulto, mas delimita um deter- laridade regular, o vestibulando ou o aluno de cur-
minado grupo de pessoas relativamente homogêneo sos extracurriculares em busca de enriquecimento
no interior da diversidade de grupos culturais da pessoal.1 Não é também o adolescente no sentido
sociedade contemporânea. O adulto, no âmbito da naturalizado de pertinência a uma etapa bio-psico-
educação de jovens e adultos, não é o estudante
universitário, o profissional qualificado que fre-
qüenta cursos de formação continuada ou de espe-
cialização, ou a pessoa adulta interessada em aper- 1 Seria importante um aprofundamento a respeito da
feiçoar seus conhecimentos em áreas como artes, população de jovens incorporados aos programas de edu-
línguas estrangeiras ou música, por exemplo. Ele é cação de jovens e adultos já que, quando se fala dessa mo-
geralmente o migrante que chega às grandes me- dalidade de educação, o título abrangente não evita que a
trópoles proveniente de áreas rurais empobrecidas, referência principal seja aos adultos, geralmente alunos das
classes de alfabetização e das séries iniciais do ensino fun-
filho de trabalhadores rurais não qualificados e com
damental. Neste ensaio isto também acontece, em razão es-
baixo nível de instrução escolar (muito freqüen- pecialmente da linha de pesquisa da autora: quando não há
temente analfabetos), ele próprio com uma passa- menção explícita aos jovens, o sujeito de que se fala aqui é
gem curta e não sistemática pela escola e trabalhan- mais especificamente o adulto.

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lógica da vida.2 Como o adulto anteriormente des- são identificadas como papéis, atividades e relações da
crito, ele é também um excluído da escola, porém maior importância a partir do final da adolescência.
geralmente incorporado aos cursos supletivos em [A forma como esses dois fenômenos ocorrem] e as
fases mais adiantadas da escolaridade, com maio- expectativas sociais em torno deles são claramente
res chances, portanto, de concluir o ensino funda- dependentes em relação a fatores históricos, culturais
mental ou mesmo o ensino médio. É bem mais li- e sociais. (Palacios, 1995, p. 315)
gado ao mundo urbano, envolvido em atividades de
trabalho e lazer mais relacionadas com a socieda- No que diz respeito ao funcionamento inte-
de letrada, escolarizada e urbana. Refletir sobre co- lectual do adulto, o mesmo autor afirma que
mo esses jovens e adultos pensam e aprendem en-
as pessoas humanas mantêm um bom nível de com-
volve, portanto, transitar pelo menos por três cam-
petência cognitiva até uma idade avançada (desde lo-
pos que contribuem para a definição de seu lugar
go, acima dos 75 anos). Os psicólogos evolutivos es-
social: a condição de “não-crianças”, a condição de
tão, por outro lado, cada vez mais convencidos de que
excluídos da escola e a condição de membros de
o que determina o nível de competência cognitiva das
determinados grupos culturais.
pessoas mais velhas não é tanto a idade em si mesma,
Com relação à condição de “não-crianças”,
quanto uma série de fatores de natureza diversa. En-
esbarramos aqui em uma limitação considerável da
tre esses fatores podem-se destacar, como muito im-
área da psicologia: as teorias do desenvolvimento
portantes, o nível de saúde, o nível educativo e cultu-
referem-se, historicamente, de modo predominan-
ral, a experiência profissional e o tônus vital da pes-
te à criança e ao adolescente, não tendo estabeleci-
soa (sua motivação, seu bem-estar psicológico...). É
do, na verdade, uma boa psicologia do adulto. Os
esse conjunto de fatores e não a idade cronológica per
processos de construção de conhecimento e de apren-
se, o que determina boa parte das probabilidades de
dizagem dos adultos são, assim, muito menos ex-
êxito que as pessoas apresentam, ao enfrentar as diver-
plorados na literatura psicológica do que aqueles
sas demandas de natureza cognitiva. (Palacios, 1995,
referentes às crianças e adolescentes. Palacios, em
p. 312)
um artigo que sintetiza a produção em psicologia
a respeito do desenvolvimento humano após a ado- Embora nos falte uma boa psicologia do adul-
lescência, comenta como a idade adulta tem sido to e a construção de tal psicologia esteja, necessa-
tradicionalmente encarada como um período de es- riamente, fortemente atrelada a fatores culturais,
tabilidade e ausência de mudanças, e enfatiza a im- podemos arrolar algumas características dessa etapa
portância de considerar a vida adulta como etapa da vida que distinguiriam, de maneira geral, o adul-
substantiva do desenvolvimento. Enfatiza também to da criança e do adolescente. O adulto está inse-
a importância dos fatores culturais na definição das rido no mundo do trabalho e das relações inter-
características da vida adulta: pessoais de um modo diferente daquele da criança
e do adolescente. Traz consigo uma história mais
Se cada período da vida é suscetível de se iden-
longa (e provavelmente mais complexa) de expe-
tificar com uma série de papéis, atividades e relações,
riências, conhecimentos acumulados e reflexões so-
não cabe dúvida de que a entrada no mundo do tra-
bre o mundo externo, sobre si mesmo e sobre as
balho e a formação de uma unidade familiar própria
outras pessoas. Com relação a inserção em situa-
ções de aprendizagem, essas peculiaridades da eta-
pa de vida em que se encontra o adulto fazem com
2
Para uma discussão aprofundada da constituição da que ele traga consigo diferentes habilidades e difi-
juventude como conceito nas ciências sociais contemporâ- culdades (em comparação com a criança) e, pro-
neas, ver Peralva e Sposito, 1997. vavelmente, maior capacidade de reflexão sobre o

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conhecimento e sobre seus próprios processos de to de valor na descrição do jovem e do adulto em


aprendizagem. questão: se ele não corresponde à abstração utili-
Para além dessas características gerais, entre- zada como referência, ele é contraposto a ela e com-
tanto, tratar o adulto de forma abstrata, universal, preendido a partir dela, sendo definido, portanto,
remete a um certo estereótipo de adulto, muito pro- pelo que ele não é. O primeiro traço cultural re-
vavelmente correspondente ao homem ocidental, levante para esses jovens e adultos, especialmente
urbano, branco, pertencente a camadas médias da porque nos movemos, aqui, no contexto da esco-
população, com um nível instrucional relativamente larização, é sua condição de excluídos da escola re-
elevado e com uma inserção no mundo do traba- gular. O tema da exclusão escolar é bastante proe-
lho em uma ocupação razoavelmente qualificada. minente na literatura sobre educação, especialmen-
Assim, compreensão da psicologia do adulto pouco te no que diz respeito a aspectos sociológicos — re-
escolarizado, objeto de interesse da área de educa- lações entre escola e sociedade, direito à educação,
ção de jovens e adultos, acaba por contrapor-se a educação e cidadania, escola, trabalho e classe so-
esse estereótipo. Essa questão foi explorada, com re- cial — e aspectos pedagógicos ou psico-pedagógi-
lação especificamente ao funcionamento cognitivo cos — fracasso escolar, evasão e repetência, práti-
do adulto pouco escolarizado, em trabalho anterior: cas de avaliação.3
Para a presente discussão, o aspecto específi-
Parece haver um acordo sobre a existência de
co dessa ampla questão que se destaca é como a
uma diferença entre formas letradas e não letradas de
situação de exclusão contribui para delinear a es-
pensamento; é importante reiterar, entretanto, que
pecificidade dos jovens e adultos como sujeitos de
essa diferença não está claramente definida na litera-
aprendizagem. Um primeiro ponto a ser menciona-
tura, não apenas pela falta de investigacões mais es-
do aqui é a adequação da escola para um grupo que
pecíficas a respeito do funcionamento cognitivo dos
não é o “alvo original” da instituição. Currículos,
grupos “pouco letrados”, mas também pela ausência
programas, métodos de ensino foram originalmente
de uma teoria consistente sobre os processos intelec-
concebidos para crianças e adolescentes que percor-
tuais dos adultos plenamente inseridos na sociedade
reriam o caminho da escolaridade de forma regu-
letrada. Nesse sentido, a modalidade de pensamento
lar. Assim, a organização da escola como institui-
à qual se opõe o pensamento denominado pouco le-
ção supõe que o desconhecimento de determinados
trado é, em grande medida, uma construção deriva-
conteúdos esteja atrelado a uma determinada eta-
da do senso comum. (Oliveira, 1995, p. 157)
pa de desenvolvimento (por exemplo, desconhecer
Do mesmo modo, falar de um jovem abstrato a diferença entre aves e mamíferos e ter sete anos
não localiza historicamente qual é esse jovem, que de idade seriam fatores correlacionados); supõe que
convive, pelo menos parcialmente, com pessoas de certos hábitos, valores e práticas culturais não es-
idade mais avançada em cursos escolares destinados tejam ainda plenamente enraizados nos aprendizes;
àqueles que não puderam seguir o caminho da esco- supõe que certos modos de transmissão de conhe-
laridade regular, e que constitui objeto da área de- cimentos e habilidades seriam os mais apropriados;
nominada “educação de pessoas jovens e adultas”. supõe que certos aspectos do jargão escolar seriam
Neste sentido é que se pode dizer, conforme dominados pelos alunos em cada momento do per-
afirmado anteriormente, que o problema da educa- curso escolar. Essas e outras suposições em que se
ção de jovens e adultos remete, primordialmente, baseia o trabalho escolar podem colocar os jovens
a uma questão de especificidade cultural. É neces-
sário historicizar o objeto da reflexão pois, do con-
trário, se falarmos de um personagem abstrato, po- 3 Ver, por exemplo, Aquino, 1997; Lahire, 1997; Pat-
deremos incluir, involuntariamente, um julgamen- to, 1990.

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e adultos em situações bastante inadequadas para maior obstáculo à aprendizagem do que o próprio
o desenvolvimento de processos de real aprendiza- conteúdo. Alunos que nunca haviam estado na esco-
gem. De certa forma, é como se a situação de ex- la tinham grande dificuldade de trabalhar com a lin-
clusão da escola regular fosse, em si mesma, poten- guagem escolar, enquanto que aqueles que já haviam
cialmente geradora de fracasso na situação de esco- tido certo treino escolar demonstraram dominar a me-
larização tardia. Na verdade, os altos índices de cânica geral da escola e considerar os diversos tipos
evasão e repetência nos programas de educação de de atividades como aceitáveis no interior do mundo
jovens e adultos indicam falta de sintonia entre essa escolar, mesmo quando desconhecidas como ativi-
escola e os alunos que dela se servem, embora não dades específicas. Entretanto, ainda que esses alunos
possamos desconsiderar, a esse respeito, fatores de mais treinados soubessem bastante a respeito da ve-
ordem socioeconômica que acabam por impedir que rossimilhança das atividades desenvolvidas em clas-
os alunos se dediquem plenamente a seu projeto se, a apresentação formal das tarefas escolares conti-
pessoal de envolvimento nesses programas. nuou sendo um obstáculo ao seu bom desempenho.
Um segundo ponto a ser mencionado no que Compreensão de instruções, particularmente quando
diz respeito à especificidade dos jovens e adultos por escrito, também constituía, ainda, grande parte do
como sujeitos de aprendizagem relacionada com o problema a ser resolvido. (Oliveira, 1987, p. 19-29)
processo de exclusão da escola regular é o fato de
que a escola funciona com base em regras específi- Ainda que o foco da presente discussão esteja
cas e com uma linguagem particular que deve ser nos aspectos referentes ao conhecimento e à apren-
conhecida por aqueles que nela estão envolvidos. dizagem, é importante mencionar ainda que a ex-
Conforme discutido em trabalho anterior a respei- clusão da escola coloca os alunos em situação de
to de alunos de um curso de pós-alfabetização para desconforto pessoal em razão de aspectos de natu-
adultos, reza mais afetiva, mas que podem também influen-
ciar a aprendizagem. Os alunos têm vergonha de
o desenvolvimento das atividades escolares está ba-
freqüentar a escola depois de adultos e muitas ve-
seado em símbolos e regras que não são parte do co-
zes pensam que serão os únicos adultos em classes
nhecimento de senso comum. Isto é, o modo de se fazer
de crianças, sentindo-se por isso humilhados e tor-
as coisas na escola é específico da própria escola e
nando-se inseguros quanto a sua própria capacidade
aprendido em seu interior. As mais óbvias dessa re-
para aprender (Oliveira, 1989).
gras, que configuram o “modelo escolar”, constituem
Além da referência ao lugar social ocupado
um estereótipo bastante generalizado em nossa socie-
pelos jovens e adultos definido por sua condição de
dade letrada, mesmo entre indivíduos que nunca es-
excluídos da escola regular, sua especificidade cul-
tiveram na escola (e mesmo quando esse estereótipo
tural deve ser examinada com relação a outros as-
não corresponde exatamente às escolas reais em fun-
pectos que os definem como um grupo relativamen-
cionamento) — praticamente todo mundo sabe que na
te homogêneo no interior da diversidade de grupos
escola há um professor que ensina e estabelece as re-
culturais da sociedade contemporânea. Na medida
gras para um grupo de alunos que deve aprender e
em que nos preocupamos, na presente discussão,
obedecer; há um quadro-negro e carteiras e as pessoas
com a questão do funcionamento intelectual, da
trabalham com cadernos, lápis e borrachas. Em nível
capacidade para aprender e dos modos de constru-
mais sutil, entretanto, dominar a mecânica da escola
ção de conhecimento, e como os adultos e os jovens
e manipular sua linguagem são capacidades aprendi-
que são objeto das práticas e reflexões sobre a edu-
das no interior da escola e, ao mesmo tempo, cruciais
cação de pessoas jovens e adultas não pertencem ao
para o desempenho do indivíduo nas várias tarefas es-
grupo social dominante ou caracteristicamente ob-
colares. Muitas vezes a linguagem escolar mostrou ser
jeto das práticas educativas de que se ocupa a área

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da educação em geral, o problema que aqui se co- ria das ciências humanas em geral e da antropologia
loca é o da homogeneidade e da heterogeneidade em particular, no discurso evolucionista sobre o ho-
cultural, do confronto entre diferentes culturas e da mem “primitivo”, cujo desenvolvimento não teria al-
relação entre diferenças culturais e diferenças nas cançado, ainda, o nível de civilização de nossas socie-
capacidades e no desempenho intelectual dos sujei- dades complexas. Esse discurso penetra a área da psi-
tos. A pergunta básica que pode ser formulada a cologia quando essa se interessa pela investigação das
esse respeito é a seguinte: há ou não diferenças no possíveis diferenças nos processos psicológicos das
funcionamento psicológico em geral, e no funcio- pessoas de diferentes grupos culturais. Particularmente
namento cognitivo em particular, de sujeitos per- no que se refere ao funcionamento cognitivo, mem-
tencentes a diferentes grupos culturais? No caso bros de sociedades ou grupos culturais que não são
específico aqui examinado, os jovens e adultos de urbanos, escolarizados, burocratizados e marcados
que nos ocupamos, enquanto sujeitos de conheci- pelo desenvolvimento científico e tecnológico, são
mento e aprendizagem, operam de uma forma que compreendidos como menos desenvolvidos que “nós”
é universal ou que é marcada por uma pertinência e classificados como primitivos, pré-lógicos, míticos
cultural específica? ou mágicos (e não científicos), sem capacidade para
Podemos identificar, na literatura, três gran- o pensamento abstrato, mais baseados na imagina-
des linhas de pensamento sobre as possíveis relações ção e na intuição do que na racionalidade (Cole &
entre a cultura e a produção de diferentes modos Scribner, 1974, Goody, 1977). (Oliveira, 1997, p. 47)
de funcionamento intelectual: aquela que afirma a
existência da diferença entre membros de diferen- No âmbito dessa abordagem também tem sido
tes grupos culturais, aquela que busca negar a im- produzido um discurso sobre as possibilidades de
portância da diferença, e uma terceira, que recupera desenvolvimento e aprendizagem dos jovens e adul-
a idéia da diferença em outro plano.4 A primeira tos. Eles teriam peculiaridades em seu modo de fun-
abordagem, que postula os grupos humanos como cionamento intelectual, em grande medida atribuí-
diferentes entre si, veis a sua falta de escolaridade anterior, mas tam-
bém a características do modo de vida de seu grupo
tem sua origem na descoberta, no século XVI, de po-
de origem.5 Assim, se esses adultos não pensam de
vos diferentes do humano “civilizado” conhecido até
forma apropriada ou não são capazes de aprender
então no Ocidente. Conforme explicita Laplantine
adequadamente, isso se deve a sua pertinência a um
(1988), a imagem que o ocidental fez dos “selvagens”
grupo cultural específico. Subjacente a essa aborda-
descobertos no Novo Mundo oscilou entre a idolatria
gem está uma postulação bastante determinista, que
do homem natural, belo, virtuoso, que vivia uma vida
correlaciona, de forma estática, traços do psiquismo
coletiva harmônica e integrada na natureza, e o jul-
com fatores culturais que os determinariam.
gamento desses povos como pouco mais que animais,
A segunda abordagem busca a compreensão
preguiçosos, feios, impulsivos, atrasados. De qualquer
dos mecanismos psicológicos que fundamentam o
forma, o outro, o desconhecido, tendeu a ser olhado
desempenho de diferentes sujeitos em diferentes ta-
a partir do referencial do observador e de sua cultura,
refas, dirigindo-se à investigação daquilo que é co-
e não compreendido de seu próprio ponto de vista.
O discurso etnocêntrico sobre o desconhecido
e exótico “selvagem” se reproduz, ao longo da histó-
5 Para uma cuidadosa revisão bibliográfica a respeito
dessa questão, especialmente para a postulação do letra-
mento como um “divisor de águas” entre duas formas di-
4Ver Oliveira, 1997, para uma discussão dessa ques- ferentes de funcionamento psicológico, ver Ribeiro, 1999;
tão em outro contexto. ver também Kleiman, 1995; e Oliveira, 1995.

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mum a todos os seres humanos. Se não nega expli- demandas situacionais enfrentadas por membros de
citamente a existência de diferenças entre os indi- diferentes culturas. (idem, p. 51-52)
víduos e grupos culturais, essa abordagem de certa Como analisa Tulviste (1991), essa maneira de
forma nega a relevância das diferenças para a com- enfrentar a questão acaba por considerar todas as cul-
preensão do funcionamento psicológico. turas e todos os modos de funcionamento como sen-
do aparentemente diferentes mas, na verdade, iguais
Em contraposição às posturas etnocêntricas e ao
ou equivalentes. Todos somos inteligentes, todos pen-
evolucionismo presentes na primeira abordagem, que
samos de forma adequada, já que os mecanismos do
buscava diferenciar grupos “primitivos” de grupos
psiquismo são universais. Paradoxalmente, o contexto,
“civilizados”, distinguindo processos psicológicos
a cultura, a história, que parecem ser tão proeminen-
mais e menos adequados, avançados ou sofisticados,
tes nessa abordagem que busca romper com o etno-
as pesquisas na área da chamada psicologia antro-
centrismo, seriam componentes quase que acessórios,
pológica passaram a enfatizar a necessidade de com-
que apenas permitem, favorecem, promovem a emer-
preender processos psicológicos básicos, que estariam
gência daquilo que está posto como possibilidade psi-
subjacentes à enorme variedade de modos de vida,
cológica de todos os seres humanos. (Oliveira, 1997,
crenças, teorias sobre o mundo, artefatos culturais e
p. 52)
criações artísticas presentes nos diferentes grupos hu-
manos. Essa contraposição teórica foi, muitas vezes,
Permanece, aqui, o problema da origem dos
motivada por uma reação ideológica à idéia de que há
mecanismos universais, já que, por um lado, a cul-
seres humanos “melhores” e “piores”, ao posiciona-
tura não explica o que é universal, mas apenas o que
mento da ciência como a forma mais adequada de
é contingente, e, por outro lado, a postulação de
produção de conhecimento e à conseqüente situação
uma fonte endógena não é endossada por todos os
do próprio cientista como representante do tipo mais
que buscam compreender as relações entre cultura
avançado de sujeito na sua relação com os objetos de
e funcionamento psicológico.
conhecimento.
Se a primeira abordagem apóia-se numa pos-
Michael Cole e Sylvia Scribner (1974), dois dos
tulação determinista, que relaciona traços do psi-
principais investigadores contemporâneos das relações
quismo com fatores culturais, essa segunda aborda-
entre cultura e pensamento, colocam explicitamente
gem poderia conduzir a um relativismo radical e a
a questão que dirige as pesquisas e reflexões dessa
uma postura espontaneísta, que não admitiria ne-
segunda abordagem: as indiscutíveis diferenças obser-
nhuma intervenção nos modos de funcionamento
vadas no funcionamento psicológico dos vários gru-
peculiares a cada grupo cultural, já que todo conhe-
pos culturais seriam “resultado de diferenças em pro-
cimento é igualmente valioso, toda visão de mun-
cessos cognitivos básicos ou apenas expressões dos
do é legítima, todo conteúdo é importante. No caso
muitos produtos que a mente humana universal pode
dos jovens e adultos, seu desenvolvimento psicoló-
produzir, dadas as grandes variações nas condições de
gico e suas modalidades de aprendizagem (e seus
vida e de atividades culturalmente valorizadas?” (p.
valores, hábitos, atitudes, formas de organização do
172). Eles próprios procuram responder à questão,
conhecimento) teriam que ser respeitados, restan-
demonstrando que não há evidências de que algum
do pouco espaço para a intervenção educativa.
grupo cultural tenha deficiências nos componentes
A terceira abordagem está claramente asso-
básicos dos processos cognitivos. Isto é, todo ser hu-
ciada à teoria histórico-cultural em psicologia6 e
mano é capaz de abstrair, categorizar, fazer inferên-
cias, utilizar formas de representação verbal etc. Es-
ses processos básicos, disponíveis a todos, seriam mo-
6 Ver Wertsch, 1988; Vygotsky e Luria, 1996; Rieber
bilizados em diferentes combinações, dependendo das
e Carton, 1987.

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Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem

poderia ser considerada a mais fecunda para a com- Emerge aqui a questão da recuperação da im-
preensão das relações entre cultura e modalidades portância das diferenças como cerne da própria abor-
de pensamento. Postula o psiquismo como sendo dagem genética. Conforme discutido acima, essa é uma
construído ao longo de sua própria história, numa abordagem que considera que o psiquismo é totalmen-
complexa interação entre quatro planos genéticos: te construído na inter-relação entre os planos da filo-
a filogênese, a sociogênese, a ontogênese e a micro- gênese, ontogênese, sociogênese e microgênese, não
gênese. Nascido com as características de sua espé- havendo nenhuma espécie de realidade psicológica
cie, cada indivíduo humano percorre o caminho da preexistente a esse complexo processo histórico, mas
ontogênese informado e alimentado pelos artefatos sim uma necessária geração de singularidades. Postular
concretos e simbólicos, pelas formas de significação, diferenças é, portanto, uma conseqüência necessária
pelas visões de mundo fornecidas pelo grupo cul- dessa abordagem genética “forte”: se o psiquismo é
tural em que se encontra inserido. construído, a diferença é resultado necessário dessa
construção, e a compreensão das configurações par-
A imensa multiplicidade de conquistas psicoló-
ticulares é o objeto mesmo da investigação em psico-
gicas que ocorrem ao longo da vida de cada indivíduo
logia. (Oliveira, 1997, p. 56-57)
geram uma complexa configuração de processos de
desenvolvimento que será absolutamente singular para Além disso, toda psicologia seria cultural, na
cada sujeito. [...] Os processo microgenéticos consti- medida em que, caso seja eliminada a dimensão cul-
tuem, assim, o quarto plano genético, que interage tural na compreensão do psiquismo humano, res-
com os outros três, caracterizando a emergência do taria apenas aquilo que é orgânico. Nesse sentido,
psiquismo individual no entrecruzamento do biológi-
diferenças individuais e diferenças culturais fundem-
co, do histórico, do cultural.
se em um mesmo fenômeno de geração de heteroge-
A dinâmica de relação entre esses domínios ge-
neidade, a partir do envolvimento de indivíduos em
néticos define, para essa abordagem, uma posição cla-
diferentes atividades ao longo de seu desenvolvimen-
ramente não determinista. O curso de desenvolvimen-
to psicológico. Conforme explicita Tulviste (1991),
to suposto na pertinência à espécie e na maturação
pessoas diferentes, membros do mesmo grupo cultu-
individual só será realizado por meio da inserção do
ral ou não, pensarão sobre partes idênticas do am-
ser humano no mundo da cultura, o que elimina qual-
biente de formas diversas; e a mesma pessoa pode pen-
quer possibilidade de consideração de alguma moda-
sar de maneiras diferentes, usando diferentes métodos,
lidade de dotação prévia ou herança genética como
estratégias e instrumentos conforme a atividade em
fonte primordial de formação do psiquismo. Isto é,
que esteja envolvida. (Oliveira, 1997, p. 58)
sejam os seres humanos diferentes ou não na origem,
Não haveria, portanto, um único caminho de
o que importa para a compreensão de seu psiquismo
desenvolvimento ou uma única forma de “bom fun-
é o processo de geração de singularidade ao longo de
cionamento” psicológico para o ser humano. Ao mes-
sua história. Ao postular a cultura como constitutiva
mo tempo, entretanto, o desenvolvimento psicológi-
do psiquismo, por outro lado, essa abordagem não a
co não está postulado como sendo totalmente em aber-
toma como uma força que se impõe a um sujeito pas-
to, já que há limites e possibilidades definidos em ca-
sivo, moldando-o de acordo com padrões preestabe-
da plano genético. Quando se considera uma deter-
lecidos. Ao contrário, a ação individual, com base na
minada instituição social no contexto de uma certa so-
singularidade dos processos de desenvolvimento de
ciedade, como a escola na complexa sociedade con-
cada sujeito, consiste em constante recriação da cul-
temporânea, a reflexão tem que se referir tanto à pos-
tura e negociação interpessoal. Se assim não fosse, te-
sibilidade de múltiplas trajetórias para diferentes in-
ríamos culturas sem história e geração de sujeitos idên-
divíduos e grupos como às especificidades culturais em
ticos em cada grupo cultural.
jogo, que definem a finalidade de tal instituição. A

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intervenção educativa teria que atuar sobre indivíduos produção de textos narrativos. No que se refere à
necessariamente diversos, no sentido de lhes dar acesso produção de autobiografias orais e escritas, nem o
àquela modalidade particular de relação entre sujei- domínio da linguagem escrita, nem o nível de es-
to e objeto de conhecimento que é própria da escola, colaridade mostraram-se como elementos suficien-
promovendo transformações específicas no seu per- tes para explicar os desempenhos dos sujeitos” (p.
curso de desenvolvimento. (Oliveira, 1997, p. 60-61) 201). Constata ainda que

não se podem generalizar os efeitos da aquisição da


Alguns trabalhos de pesquisa contemporâneos
linguagem escrita sobre a linguagem oral e sobre o uso
dirigem-se exatamente a essa questão da constitui-
que as pessoas fazem delas. Sujeitos não ou pouco
ção da heterogeneidade entre indivíduos e entre gru-
escolarizados que participam de situações comunica-
pos, focalizando sua atenção nas práticas culturais
tivas que demandam o planejamento do discurso, di-
que dirigem os processos de construção de diferen-
rigidas a interlocutores desconhecidos que participam
tes aspectos do psiquismo. Sem a pretensão de uma
indiretamente dessas situações (situações monológi-
revisão exaustiva da bibliografia pertinente, fora das
cas), estão lidando com problemas cognitivos especí-
possibilidades de um trabalho como este, é interes-
ficos. Estes exigem que os sujeitos regulem e reflitam
sante mencionar alguns desses trabalhos, que têm
sobre seus discursos à medida que os constróem, ex-
particular relevância para o tema do conhecimen-
plicitando informações e referências, selecionando o
to e da aprendizagem entre jovens e adultos. Ribeiro
vocabulário, o estilo e as construções sintáticas, fazen-
(1999) explora a natureza complexa do letramento
do previsões sobre o próprio discurso e sobre o modo
como fenômeno cultural e das relações entre alfa-
como seus interlocutores o estão recebendo. O meio
betismo e características psicológicas, enfatizando
pelo qual se produz o discurso também impõe condi-
a “impropriedade da postulação de que a dissemi-
ções para sua produção, mas não pode ser tomado
nação da linguagem escrita em si constitui o divisor
como central no que diz respeito à utilização de ha-
de águas entre culturas tradicionais e modernas, ou
bilidades cognitivas e conhecimentos lingüísticos usa-
ainda, no plano psicológico, que a aprendizagem da
dos por falantes e escritores. É preciso, portanto, con-
leitura e da escrita por si só possa produzir mudan-
siderar como central as circunstâncias em que a co-
ças psicológicas tais como desenvolvimento do pen-
municação ocorre e o modo como as interações se
samento categorial ou ainda atitudes modernizan-
conformam nessas circunstâncias, especialmente as
tes” (p. 50). Afirma que em “sociedades complexas
estratégias e habilidades acionadas pelo locutor para
o fenômeno do alfabetismo é necessariamente he-
alcançar seu propósito comunicativo e a de sua au-
terogêneo, comportando práticas em que se utiliza
diência de ressignificar o discurso que a ela se dirige.
a linguagem escrita com intensidade e orientação
(p. 207)
diversas. A variedade das práticas de alfabetismo
possíveis e suas relações com outras peculiaridades Num trabalho realizado com crianças, Lahire
culturais de subgrupos são constitutivas da plura- (1997) dirige-se a problemas teórico-metodológi-
lidade da cultura e, nessa medida, devem ser com- cos extremamente pertinentes à presente discussão.
preendidas e valorizadas” (p. 245). Estudando casos de sucesso e de fracasso escolar,
Vóvio (1999), num estudo recente sobre nar- o autor busca compreender as “diferenças ‘secun-
rativas autobiográficas realizadas por alunos de cur- dárias’ entre famílias populares cujo nível de ren-
sos para jovens e adultos, constata que “não há uma da e nível escolar são bastante próximos. Semelhan-
correlação positiva entre o nível de escolaridade tes por suas condições econômicas e culturais —
dos sujeitos que participaram dessa pesquisa e a in- consideradas de forma grosseira a partir da pro-
corporação crescente, por eles, de conhecimentos fissão do chefe de família —, como é possível que
apreendidos na escola sobre a linguagem escrita na configurações familiares engendrem, socialmente,

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Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem

crianças com nível de adaptação escolar tão dife- à segunda abordagem, ao buscar demonstrar que
rentes? Quais são as diferenças internas nos meios todos os modos de funcionamento cognitivo são
populares suscetíveis de justificar variações, às ve- equivalentes, isto é, que todos os seres humanos são
zes consideráveis, na escolaridade das crianças?” (p. inteligentes e pensam de forma adequada. Um tre-
12). Afirma que “a personalidade da criança, seus cho do próprio trabalho explicita com clareza essa
‘raciocínios’ e seus comportamentos, suas ações e posição:
reações são incompreensíveis fora das relações so-
Essas três características intimamente relacio-
ciais que se tecem, inicialmente, entre ela e os ou-
nadas [os indivíduos não pertencem, originalmente, ao
tros membros da constelação familiar, em um uni-
ambiente onde vivem atualmente; a vida na comunida-
verso de objetos ligados às formas de relações so-
de é orientada para atividades conjuntas e interações
ciais intrafamiliares” (p. 17). Mas “a presença ob-
sociais e não para buscas individuais; os arranjos vi-
jetiva de um capital cultural familiar só tem senti-
gentes nas diferentes esferas de vida são instáveis e
do se esse capital cultural for colocado em condi-
sujeitos a constantes mudanças], que demonstraram
ções que tornem possível sua ‘transmissão’. [...] É
permear o modo dos indivíduos organizarem sua vi-
por essa razão que, com capital cultural equivalente,
da, estão fortemente ligadas às definições normalmen-
dois contextos familiares podem produzir situações
te aplicadas aos favelados, migrantes e indivíduos de
escolares muito diferentes na medida em que o ren-
baixa renda em geral. Eles são vistos como carentes,
dimento escolar desses capitais culturais depende
incompetentes e incapazes de lidar com as demandas
muito das configurações familiares de conjunto.
da vida moderna. Uma simples listagem das caracte-
Podemos dizer, lembrando uma frase célebre, que
rísticas que podem ser observadas como significativas
a herança cultural nem sempre chega a encontrar
em suas vidas pode, realmente, levar a esse tipo de
as condições adequadas para que o herdeiro her-
interpretação. Eles são migrantes da zona rural nor-
de” (p. 338).
destina, muito ligados ao seu local de origem e inte-
Para aprofundar a reflexão sobre as relações
ragindo, em São Paulo, basicamente com indivíduos
entre pertinência cultural e cognição e sobre o pro-
provenientes do mesmo local; têm relações sociais ex-
blema da heterogeneidade, é interessante ainda re-
tremamente intensas, cruciais para sua sobrevivência;
tomar, aqui, um trabalho de pesquisa da própria
socializam a informação sobre os membros da comu-
autora sobre competências cognitivas exibidas em
nidade e até mesmo as competências necessárias para
situações de vida cotidiana por alunos de cursos
lidar com as solicitações da vida diária; são muito de-
noturnos para jovens e adultos, residentes em uma
pendentes de alguns indivíduos centrais na comunida-
favela na cidade de São Paulo (Oliveira, 1982). Sub-
de; têm, no nível do discurso, um conjunto rígido de
jacente ao desenvolvimento desse estudo estava a
padrões morais; são extremamente tendentes à violên-
concepção de que as pessoas aprendem a atuar cog-
cia e parecem inclinados a se tornarem delinqüentes;
nitivamente nos ambientes específicos onde vivem
seus arranjos são sempre confusos e sujeitos a mudan-
e é nesses ambientes que elas desempenham, repe-
ças radicais; não planejam as coisas com antecedên-
tidamente, tarefas significativas que envolvem ca-
cia e tendem a ser fatalistas. No entanto, quando é
pacidades cognitivas. Em contraponto à primeira
possível perceber o que significa “vida moderna” para
abordagem discutida acima sobre as possíveis re-
esses indivíduos e quais são, de fato, as demandas des-
lações entre cultura e funcionamento psicológico,
sa vida, essas características negativas devem ser en-
que afirma a existência da diferença entre membros
tendidas como formas eficientes de se lidar com essas
de diferentes grupos culturais, correlacionando, de
demandas. Elas são apenas comportamentos funcio-
forma estática, traços do psiquismo com fatores
nais adaptativos a uma situação de recursos materiais
culturais que os determinariam, esse trabalho de
escassos, falta de apoio de qualquer tipo de institui-
pesquisa poderia ser considerado como pertinente

Revista Brasileira de Educação 67


Marta Kohl de Oliveira

ção pública, constante insegurança em todas as esfe- cia que não é generalizado e que caracteriza alguns
ras de vida e total falta de recompensas por compor- indivíduos como mais capazes que outros. Esses
tamento “apropriado”. (Oliveira, 1982, p. 86-87) indivíduos são cruciais para a vida da comunidade
e podem ter algumas vantagens no decorrer de suas
O interesse em retomar aqui esse trabalho de vidas por serem capazes de lidar melhor com os
pesquisa reside no fato de que, embora tendo sido recursos disponíveis no ambiente. Domínio do sis-
estruturado para explorar a idéia de que processos tema burocrático, bom conhecimento da cidade,
cognitivos comuns a todos os seres humanos são capacidade de realizar boas trocas de produtos usa-
mobilizados em diferentes combinações, dependen- dos são exemplos dessas habilidades.
do das demandas situacionais enfrentadas por mem- No extremo desse nível mais elevado de com-
bros de diferentes grupos culturais, os dados obti- petência encontram-se alguns indivíduos-chave na
dos muitas vezes apontaram para a heterogeneidade comunidade, que foram denominados “focos de
no interior do grupo e para diferentes fontes que competência”, por concentrarem a maior parte das
contribuiriam para a constituição do funcionamen- habilidades necessárias à solução dos problemas
to intelectual. A organização da produção em psi- enfrentados pelos membros da comunidade em ge-
cologia sobre diferenças culturais e sua relação com ral. Três pessoas, moradoras da favela, foram iden-
o desenvolvimento psicológico em três grandes li- tificadas como “focos de competência” ao longo da
nhas de pensamento, realizada em 1997 (Oliveira, realização da pesquisa. Uma delas era uma das pro-
1997), explicita uma opção atual da autora por uma fessoras do curso de educação de adultos existente
abordagem teórica. Essa abordagem pode ser uti- no interior da favela e também educadora de crian-
lizada, retrospectivamente, para uma reinterpre- ças no Centro Comunitário do mesmo local, que
tação de dados coletados e analisados de um outro sustentava, com seu trabalho, mãe e cinco irmãos.
prisma teórico. É como se o próprio material em- Ela dominava grande quantidade de “informações
pírico mostrasse certa autonomia, não se deixando úteis” (como encontrar um advogado ou um mé-
restringir às possibilidades interpretativas do mo- dico, onde é o hospital mais próximo, como fazer
delo utilizado. Assim, criada originalmente como para adotar uma criança, por exemplo), conhecia
uma pesquisa pertinente à segunda abordagem, po- a cidade muito bem e dominava o sistema burocrá-
dem ser encontrados nela elementos que subsidiam tico (como tirar documentos, preencher formulários
a reflexão na linha proposta pela terceira aborda- etc.). Tinha, também, uma rede de relações com
gem, aquela que se apresenta como a que melhor pessoas de nível socioeconômico mais elevado, par-
explica a emergência da complexidade do funcio- ticularmente por meio dos assistentes sociais e reli-
namento cognitivo. giosos ligados ao Centro Comunitário. Seus familia-
O primeiro dado relevante que merece ser men- res e amigos não faziam nada sem seu apoio e aju-
cionado é o fato de que, com relação ao modo de da, e ela era solicitada a realizar diversas tarefas
os indivíduos lidarem com as demandas da vida para outras pessoas. O próprio Centro Comunitá-
cotidiana, foram identificados diferentes níveis de rio apoiava-se muito em sua competência, disponi-
competência distribuídos pelos diversos membros bilidade e autoridade junto às crianças para desen-
da comunidade. Em primeiro lugar haveria um ní- volver rotinas diárias e atividades extraordinárias.
vel básico de competência, altamente condiciona- Outro “foco de competência” era um parti-
do pelas características do ambiente e disseminado cipante do curso de adultos. Era um excelente alu-
entre os membros da comunidade: qualquer pessoa no e liderava o grupo na maior parte das ativida-
sabe como ir de casa ao trabalho, como preparar des desenvolvidas em sala de aula. Também toca-
algum tipo de alimento ou como lidar com dinhei- va violão, sabia coordenar jogos de salão, escreveu
ro, por exemplo. Há um outro nível de competên- peças de teatro, compôs músicas e criou roteiros de

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Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem

shows para os alunos apresentarem. Os demais alu- ra o indivíduo que as possui, fazendo dele uma pes-
nos contavam com ele para tudo, não organizan- soa bem-sucedida no ambiente da favela, sem ne-
do nenhuma atividade nem tomando nenhuma pro- cessariamente implicar possibilidades de melhorias
vidência sem sua iniciativa ou apoio. Ele também concretas em sua vida (tocar violão, coordenar jo-
conhecia a cidade muito bem e dominava o siste- gos de salão, cozinhar tipos especiais de comida são
ma burocrático. A terceira pessoa identificada como exemplos dessas habilidades “extras”). O que dis-
“foco de competência” era um rapaz que poderia tingue essas habilidades daquelas acima menciona-
ser considerado um personagem central na comu- das é sua relação com as demandas do ambiente:
nidade. Sabia dirigir, tinha carro próprio e traba- elas não são respostas às necessidades fundamen-
lhava como motorista particular de um importan- tais das pessoas nas esferas de vida capturadas no
te cantor popular. Sua ocupação dava-lhe não ape- estudo desenvolvido. É bastante provável, contudo,
nas um grande prestígio entre seus pares, mas tam- que habilidades que são supérfluas em um contex-
bém um conjunto de privilégios objetivos por estar to sejam essenciais em outros. A restrição do con-
em interação constante com “pessoas famosas” e ceito de “focos de competência” a atributos moder-
com membros de grupos de nível socioeconômico nos e positivos refere-se exatamente a essa questão.
mais elevado. Os moradores da favela contavam Isto é, dada a importância relativa de diferentes ha-
com ele quando necessitavam de transporte (prin- bilidades em diferentes contextos, as competências
cipalmente em situações de emergência) e para ob- identificadas como relevantes no ambiente estuda-
ter vários tipos de informação e ajuda. do são referentes apenas àquelas esferas de vida
É importante mencionar que, devido ao fato apreendidas pelo estudo realizado.
de que a interação da pesquisadora na favela foi Algumas das habilidades “extras” foram ob-
baseada em seu envolvimento com a escola, a maio- servadas nos mesmos indivíduos que demonstraram
ria de suas relações desenvolveu-se com membros possuir habilidades relevantes acima do nível de
de alguns dos subgrupos sociais existentes na fave- competência generalizado, mas outras foram obser-
la. A identificação de indivíduos como mais e me- vadas em pessoas que apenas funcionavam no ní-
nos competentes foi, portanto, referente à presen- vel básico de competência. Parece que, acima do
ça de certos tipos de habilidades e não de outros. nível generalizado de competências básicas, diferen-
Os tipos de habilidades que foram observados têm tes indivíduos apresentam diferentes combinações
duas características que os definem: são “moder- da habilidades mais e menos relevantes. Os “focos
nos” (isto é, relativos à sociedade urbana, comple- de competência” são as pessoas que concentram,
xa, burocratizada) e são “positivos” (isto é, referem- mais que outras, muitas das habilidades necessárias
se a atributos socialmente desejáveis). Pessoas com- para lidar com problemas cotidianos significativos.
petentes em outras esferas de vida não puderam ser Além desses indivíduos com habilidades acima do
identificadas no âmbito do estudo realizado. Entre- nível básico de competência, observou-se que alguns
tanto, é bastante provável que haja indivíduos que sujeitos eram considerados por outros membros da
concentram tipos mais “tradicionais” de competên- comunidade como indivíduos com menos do que as
cia (como parteiras, especialistas em cura com er- habilidades básicas necessárias na vida cotidiana e,
vas, artesãos), bem como pessoas extremamente conseqüentemente, como pessoas não confiáveis
capazes em áreas não-positivas (como assaltantes, para assumir responsabilidades no interior da vida
traficantes de drogas). Desse modo, o conceito de da comunidade.
“foco de competência” ora utilizado é significati- A identificação desses diferentes níveis de com-
vamente restrito. petência indica que não se pode postular que um
Foram também observadas certas habilidades grupo de adultos, por compartilharem condições de
“extras” que parecem constituir certa vantagem pa- vida como morar em favelas e possuir baixa esco-

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Marta Kohl de Oliveira

laridade, funcione psicologicamente de forma ho- junto de escores igualmente baixos, acumulados de
mogênea, oposta monoliticamente a uma outra mo- forma inexpressiva no extremo inferior de uma es-
dalidade de funcionamento cognitivo. No caso em cala. Ao contrário, seus escores nos dois testes fo-
questão, mostra-se evidente a grande heterogenei- ram altamente correlacionados e bem dispersos ao
dade dentro do grupo, o que torna bem mais com- longo da faixa de desempenho desse grupo especí-
plexa a tarefa de compreender o papel da cultura fico. Seus resultados também tiveram claras relações
na constituição do psiquismo. com educação, ocupação, salário mensal e compe-
Outro dado relevante obtido na pesquisa em tência na vida cotidiana. Os sujeitos que haviam
questão que aponta para o fenômeno da hetero- freqüentado escola por um período mais longo, que
geneidade intragrupo diz respeito aos resultados da estavam em séries escolares mais avançadas quan-
aplicação de testes de inteligência. Foram aplicados do responderam aos testes, que obtiveram notas
dois testes não-verbais de inteligência geral (Teste mais altas nos cursos de educação de adultos onde
de Matrizes Progressivas de Raven e Teste Eqüicul- foi realizada a pesquisa e que permaneceram na
tural de Inteligência de Cattell).7 Com relação ao escola e passaram de uma série para a seguinte ten-
resultado global dos sujeitos nos testes houve, por deram a obter escores mais altos nos testes de inte-
um lado, grande homogeneidade em seu desempe- ligência. Os sujeitos que trabalhavam em ocupações
nho: todos obtiveram escores abaixo da mediana de mais qualificadas e os que recebiam maiores salá-
quase todos os grupos nos quais as normas apre- rios, bem como aqueles identificados como “focos
sentadas nos manuais dos testes são baseadas. Além de competência” e aqueles que mostraram “compe-
disso, não houve relação entre o resultado nos testes tências relevantes” em situações da vida cotidiana,
e as seguintes características dos sujeitos: sexo, ida- também tenderam a obter escores mais altos nos tes-
de, população urbana do município de nascimento, tes. Esses resultados indicam que os testes mediram
tempo de vida em São Paulo, idade ao chegar em algum atributo relevante dos indivíduos estudados,
São Paulo, ocupação dos pais, instrução dos pais. captando diferenças individuais em habilidades que
Para além da mera comparação dos escores estão relacionadas com a história de passagem pela
brutos com as normas dos testes, entretanto, os da- escola, com o desempenho na escola e no trabalho
dos obtidos forneceram informações bastante sig- no momento de realização dos testes e com níveis
nificativas no que diz respeito à distribuição de es- de competência no interior da vida da comunidade.
cores no interior da amostra e às relações entre os O fato de os indivíduos identificados como
escores e outras variáveis. Os testes discriminaram “focos de competência” e aqueles que mostraram
os diferentes sujeitos estudados e relacionaram-se “competências relevantes” terem obtido escores mais
com variáveis relevantes de seu ambiente. Isto é, em- altos nos testes é compatível com as relações obser-
bora todos os sujeitos tenham tido um desempenho vadas entre escores nos testes e ocupação, salário e
correspondente aos níveis percentílicos mais baixos sucesso na escola. Isto é, os dois testes administra-
dos grupos incluídos nas normas dos testes, seus dos parecem ter medido habilidades relacionadas ao
próprios escores não foram simplesmente um con- desempenho dos indivíduos em esferas de vida que
são “modernas” e “positivas”. Uma vez que esfe-
ras de vida mais tradicionais e menos desejáveis so-
cialmente não foram observadas nesse estudo, não
7 Está fora do âmbito do presente artigo uma discussão
é possível discutir o significado das escores obtidos
a respeito do uso de testes em pesquisas sobre processos
nos testes com relação a elas. É bastante provável,
cognitivos, embora essa tenha sido uma das preocupações
centrais da investigação aqui focalizada. Para aprofunda- entretanto, que haja diferenças individuais em cer-
mento da questão, ver o relato completo da investigação em tas áreas de competência que não foram captadas
Oliveira, 1982. por esses testes de inteligência geral. Algumas indi-

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Jovens e adultos como sujeitos de conhecimento e aprendizagem

cações desse fato residem nas relações entre os re- também, um componente de auto-estima na auto-
sultados nos testes e os outros níveis de competên- classificação desses indivíduos como tendo apren-
cia observados. Dos dois sujeitos que mostraram dido a ler e escrever fora da escola. Isto é, sujeitos
“capacidades extras”, um teve escores altos e o ou- com maior capacidade teriam mais confiança em
tro escores relativamente baixos nos testes. Os re- suas próprias habilidades, a ponto de perceberem
sultados obtidos pelos cinco sujeitos considerados algumas irregularidades em sua história de passa-
abaixo do nível básico de habilidades necessárias na gem pela escola como características de seu “auto-
vida cotidiana estão dispersos ao longo de toda a didatismo”. É possível que sujeitos com menor ca-
extensão da distribuição de escores. Um desses ca- pacidade e com o mesmo tipo de história de esco-
sos, para mencionar um exemplo, é o de uma moça larização não se tenham classificado como apren-
que sofria de epilepsia e não era considerada capaz dizes de fora da escola mas, contrariamente, tenham
de desempenhar tarefas que exigissem que ela ficas- atribuído seu processo de aprendizagem à sua pas-
se sozinha, ou de assumir responsabilidades que sagem curta e irregular pela escola. As diferenças
corressem o risco de não serem cumpridas por causa na autopercepção teriam, portanto, causado dife-
de seus imprevisíveis acessos epiléticos. Nos testes, renças nas afirmações dos sujeitos sobre o tipo de
entretanto, ela obteve um dos escores mais altos da alfabetização que tiveram.
amostra. Nesse caso, a alta capacidade identificada Ainda com relação ao desempenho nos testes,
pelos resultados nos testes não corresponde à com- foi possível observar que, além de diferenças em es-
petência em contextos da vida cotidiana. cores globais, os sujeitos apresentaram diferenças
Há ainda um outro resultado relevante no que em sua forma de operar para resolver os itens dos
se refere à relação entre os escores obtidos nos tes- testes. Isto é, os erros cometidos pelos sujeitos não
tes e outras características dos sujeitos, que também constituem um conjunto homogêneo de respostas
levanta um tema importante a respeito do tipo de simplesmente erradas. Eles são, ao contrário, resul-
habilidades captadas pelos testes e indica a impor- tado de diferentes operações incorretas desenvol-
tância de considerar a heterogeneidade entre os su- vidas no decorrer de um processo ativo de raciocí-
jeitos: os seis sujeitos que declararam ter aprendi- nio. A comparação entre os tipos de erros cometi-
do a ler e escrever fora da escola regular obtiveram dos pelos sujeitos que obtiveram os escores mais
escores mais altos do que aqueles que se alfabetiza- altos nos testes e aqueles dos sujeitos com escores
ram na escola regular quando crianças. Esse resul- mais baixos demonstrou que a diferença quantita-
tado é intrigante, pois as relações entre os resulta- tiva no número de itens corretos é o resultado de
dos nos testes e outras variáveis educacionais mos- diferenças qualitativas nos processos de raciocínio
traram que exposição à escola e desempenho esco- desenvolvidos. Os sujeitos com melhor desempenho
lar foram positivamente relacionadas ao desempe- são aqueles mais aptos a fazer abstrações e a foca-
nho nos testes. Não há nenhuma razão clara, por- lizar a atenção em dimensões relevantes dos elemen-
tanto, para que os sujeitos que aprenderam a ler e tos constantes dos diversos itens, a selecionar e uti-
escrever fora da escola tenham tido melhor desem- lizar operações diferentes conforme o tipo de pro-
penho nos testes se a educação formal for conside- blema a ser resolvido ao invés de repetir um único
rada como uma fonte de habilidades. No entanto, padrão de raciocínio e a operar com as figuras apre-
o desenvolvimento de tais habilidades pode ter pre- sentadas nos itens dos testes como um todo ao in-
cedido a instrução formal; as habilidades medidas vés de operar de forma unidimensional com ele-
pelos testes poderiam já estar presentes em maior mentos isolados.
grau nesses seis sujeitos e ter ao mesmo tempo fa- Os resultados obtidos parecem mostrar a ação
cilitado e ter sido desenvolvidas pelo processo de simultânea de dois aspectos complementares das
alfabetização fora da escola regular. Pode haver, capacidades cognitivas. Por um lado, membros de

Revista Brasileira de Educação 71


Marta Kohl de Oliveira

diferentes grupos culturais, nascidos e educados em mente associadas aos jovens e adultos de que trata-
determinados contextos socioculturais e capazes de mos, tais como pensamento referido ao contexto da
operar cognitivamente em resposta às demandas experiência pessoal imediata, dificuldade de opera-
particulares desses contextos e de acordo com o trei- ção com categorias abstratas, dificuldade de utili-
namento específico neles obtido, respondem de for- zação de estratégias de planejamento e controle da
ma diferente a diferentes tarefas cognitivas. Por ou- própria atividade cognitiva, bem como pouca uti-
tro lado, no interior de grupos culturais relativa- lização de procedimentos metacognitivos (Oliveira,
mente homogêneos, há diferenças individuais em ca- 1995). Por outro lado, sabemos que nesse mesmo
pacidades que distinguem diferentes pessoas em seu grupo há pessoas que não apresentam essas carac-
modo de responder às demandas de seu contexto terísticas, assim como em outros grupos culturais,
de vida cotidiana e de lidar com tarefas cognitivas com outra história de formação intelectual, há pes-
específicas. soas com essas mesmas características. A escola vol-
Iniciamos este ensaio apontando para a ques- tada à educação de jovens e adultos, portanto, é ao
tão da homogeneidade do grupo de sujeitos nor- mesmo tempo um local de confronto de culturas
malmente envolvidos nos programas de educação (cujo maior efeito é, muitas vezes, uma espécie de
de jovens e adultos e de sua diferença com relação “domesticação” dos membros dos grupos pouco ou
a outros grupos culturais. Embora freqüentemente não escolarizados, no sentido de conformá-los a um
constituindo dois subgrupos distintos (o de “jo- padrão dominante de funcionamento intelectual)
vens” e o de “adultos”), tal grupo se define como e, como qualquer situação de interação social, um
relativamente homogêneo ao agregar membros em local de encontro de singularidades.
condição de “não-crianças”, de excluídos da esco-
la, e de pertinentes a parcelas “populares” da po-
MARTA KOHL DE OLIVEIRA é pedagoga, douto-
pulação (em oposição às classes médias e aos gru-
ra em Psicologia Educacional pela Stanford University e
pos dominantes), pouco escolarizadas e inseridas no
professora na Faculdade de Educação da Universidade de
mundo do trabalho em ocupações de baixa quali- São Paulo. Tem pesquisado e escrito sobre a abordagem
ficação profissional e baixa remuneração. Essa no- histórico-cultural em psicologia e sobre as relações entre
ção de homogeneidade intra-grupo (e de hetero- escolarização e desenvolvimento cognitivo. É autora do li-
geneidade inter-grupos) levou à discussão de dife- vro Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento, um proces-
rentes abordagens em psicologia a respeito das re- so sócio-histórico (São Paulo: Scipione, 1993) e co-organiza-
dora das coletâneas Literacy in human development (Nor-
lações entre cultura e funcionamento psicológico,
wood, NJ: Ablex, 1998) e Investigações cognitivas: con-
o que conduziu, no bojo da terceira abordagem, a ceitos, linguagem e cultura (Porto Alegre: Artes Médicas,
um questionamento da própria idéia de homoge- 1999).
neidade. Embora a pertinência a determinado gru-
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