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Resenha: CARDINALE, Paulo. Representações Cotidianas: Para além do senso comum e das representações sociais.

www.psicossocial.com.br - publicado em 25 de outubro de 2008

Representações Cotidianas:
Para além do senso comum e das representações sociais
Paulo Cardinale

O livro de Nildo Viana, Senso comum, representações sociais e representações


cotidianas**, recém-lançado, é uma obra que merece uma atenção especial de
psicólogos (especialmente os psicólogos sociais), sociólogos, epistemólogos,
historiadores e outros profissionais da área de ciências humanas. A razão disso está no
caráter amplo da obra, que abarca a temática do “saber cotidiano” de forma
simultaneamente psicológica, histórica, sociológica, epistemológica. Torna-se, assim,
referência obrigatória para todos os estudiosos da ciência e do saber cotidiano.

O livro pode ser dividido em duas partes, uma de análise crítica e outra propositiva. Na
primeira parte, o autor realiza uma crítica da idéia de senso comum e representações
sociais; na segunda parte, apresenta a teoria das representações cotidianas. A crítica da
idéia de senso comum é realizada tendo por base em uma análise histórica do
surgimento e desenvolvimento deste termo, cuja origem se encontra na luta da
burguesia contra a nobreza e tendo um sentido positivo. O senso comum era o bom
senso. Porém, com a emergência do proletariado e da cultura socialista o termo passa a
ter um sentido negativo, tal como nas obras do sociólogo Durkheim e do psicólogo
Gustave Le Bon. Le Bon buscou mostrar a irracionalidade do senso comum e Durkheim
buscou separar senso comum e ciência, mais exatamente propor a ruptura entre estas
duas formas de saber. A ruptura epistemológica proposta por Durkheim vai ser
defendida por Bachelard e outros. Novas mudanças históricas promovem uma revisão
na análise do senso comum, que com a estabilidade capitalista passa a ser visto como
“verdadeiro” ao invés de “falso”, como anteriormente. Isto se esboça com a
fenomenologia e se concretiza também na obra de Durkheim e também de Jung, ambos
abordando a religião numa época de estabilização relativa do capitalismo. Além de
mostrar as raízes históricas e sociais da noção de senso comum e mostrar os interesses
de classe por detrás de sua emergência e mutação, o autor também critica as concepções
sobre senso comum, mostrando que este é geralmente visto como um bloco monolítico,
verdadeiro ou falso, de acordo com o contexto histórico. Viana afirma que as
representações cotidianas, ou “senso comum”, não é um bloco monolítico, possuindo
um conteúdo verdadeiro ou falso. Ele possui uma multiplicidade de manifestações,
algumas verdadeiras, outras falsas. A justificativa de Durkheim e Jung, ao afirmaram
que uma idéia é verdadeira por existir, é criticada por Viana magistralmente. Ele
demonstra que uma coisa é a idéia existir, outra é se seu conteúdo é verdadeiro ou falso.
Partindo de um exemplo de Jung, ele demonstra isso. Para Jung, o elefante é verdadeiro
porque existe. Viana diz que o elefante existe e não é nem verdadeiro nem falso, pois
estes termos são categorias da consciência e não da realidade. Da mesma forma, uma
determinada idéia existe, mas seu conteúdo pode ser verdadeiro ou falso, tal como a
idéia de que o ser humano pode voar, que, se alguém manifestar, existe, mas nem por
isso será verdadeira.

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A abordagem das representações sociais, inaugurada por Moscovici, também recebe


forte crítica. Ele mostra as raízes históricas e sociais desta nova “escola”, cuja origem
ele mostra estar na competição da esfera científica, ou do “campo científico”,
retomando expressão do sociólogo Pierre Bourdieu. Ele mostra que a inovação e
competição no campo científico promovem a formação de escolas e teses, incluindo a
das representações sociais. Ele retoma a obra de Moscovici e afirma que a maior parte
de suas idéias são provenientes de Durkheim e Marx. Moscovici, inclusive, apresenta
diferenças entre suas teses e de Durkheim atribuindo elementos a este autor que Viana
contesta, mostrando que as “representações coletivas”, para Durkheim, não são estáticas
e nem são da coletividade como um todo. Moscovici, conhecedor do marxismo, também
desconsidera várias teses de Marx que ele retoma e não apresenta o criador. Nildo Viana
denomina isso “escotoma”, que é uma forma de esquecimento, bastante comum na
história da ciência, tal como ele mostra no caso de Darwin, que escotomizou a base de
sua teoria da evolução já presente em Lamarck, e daí suas críticas a este, para que ele
caísse no esquecimento. Foi o que Moscovici fez com Durkheim e, no caso de Marx,
simplesmente não fez nenhuma referência. Isto está ligado ao contexto histórico da
estabilidade do capitalismo nos anos 1960, quando emerge as concepções de Moscovici,
e se ampliam a partir dos anos 1980, época do pensamento único neoliberal, cuja
dissidência se enfraqueceu, principalmente após a queda do muro de Berlim.

Mas Viana não se limita a demonstrar as bases sociais e históricas da abordagem das
representações sociais, pois ele também mostra suas limitações próprias, enquanto
ideologia. Ele apresenta o caráter descritivo e não explicativo da abordagem das
representações sociais, inclusive criticando aqueles que tentaram mostrar o papel
explicativo desta abordagem. Viana também critica a idéia de que as representações
sociais são verdadeiras e a ideologia da neutralidade que se esconde por detrás da
abordagem das representações sociais, bem como vários outros detalhes, tal como a
base em grupos taxionômicos ao invés de grupos sociais concretos.

Por fim, temos a parte propositiva. Após criticar as demais concepções, Viana busca
esboçar uma teoria das representações cotidianas. Para isso usa a contribuição de Marx,
Korsch, Gramsci, Bloch, Sorel, Bertrand e mais alguns. Ele inicia apresentando a
contribuição marxista para a elaboração de uma teoria das representações cotidianas.
Marx e sua teoria das concepções cotidianas, expressão das relações sociais e não
produtos fantasmagóricos existentes por si mesmos é o ponto de partida. Viana mostra,
a partir de Marx, Reich e Gramsci, entre outros, que as representações cotidianas podem
ser verdadeiras ou falsas, e que as representações cotidianas do proletariado e classes
exploradas em geral tendem a ser contraditórias, possuindo elementos verdadeiros e
falsos simultaneamente.

Ele retoma alguns pensadores marxistas para resgatar suas contribuições. O caráter ativo
das representações e idéias presentes em Karl Korsch, Ernst Bloch, Antônio Gramsci.
Em Sorel, o caráter mobilizador das idéias se expressa na concepção de mito enquanto
que em Bloch é a idéia de utopia que revela isso. Korsch já critica e supera o
economicismo do pseudomarxismo e mostra que as idéias fazem parte da totalidade

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histórica e agem sobre ela. Michele Bertrand contribui com a análise sobre as diversas
formas pelas quais as representações cotidianas atuam sobre a sociedade.

Após este apanhado sobre a contribuição do marxismo para a elaboração de uma teoria
das representações cotidianas, Viana passa a discutir as bases sociais das representações
cotidianas de forma mais aprofundada. Para tanto, ele trabalha com os conceitos de
modo de produção, modo de vida e cotidianidade. O modo de produção é a base
material e constituinte das classes sociais e da divisão social do trabalho, que faz
emergir um determinado modo de vida e cotidianidade. O modo de vida é mais amplo
do que o conceito de modo de produção. O modo de produção é uma parte da
sociedade, a parte que revela a forma de produção e reprodução dos bens materiais
necessários para a sobrevivência da humanidade. O modo de produção é um modo de
vida, mas o modo de vida não é um modo de produção, pois vai além dele, sendo
também forma de vida nas formas de regularização, ou superestrutura social,
instaurando uma cotidianidade que é a base das representações dos indivíduos.

Viana discute o que é o cotidiano e a cotidianidade a partir das contribuições de Agnes


Heller, Georg Lukács, Karel Kosik e outros, para delimitar o cotidiano e mostrar suas
características. As características da cotidianidade são a naturalização, a simplificação e
a regularidade. Estes processos são apenas os seus aspectos formais e isto significa que
possuem um conteúdo concreto, expresso no conceito de sociabilidade. Este conteúdo
concreto manifesto na sociabilidade revela a base da produção de valores, sentimentos,
representações, interesses, costumes. A vida cotidiana é a base real das representações
cotidianas e estas, por sua vez, reproduzem as características formais da cotidianidade, a
saber: a naturalização, a simplificação e a regularidade.

Contudo, Viana vai além disso e discute a relação entre representações cotidianas e
consciência de classe. Ele distingue entre representações cotidianas e pensamento
complexo (ciência, teologia, filosofia), demonstrando que com a divisão entre trabalho
manual e intelectual, há também uma divisão entre os que produzem idéias sistemáticas
e os que produzem idéias simples, não sistemáticas. Esse pensamento complexo assume
várias formas e pode ser resumido ao conceito de ideologia. As representações
cotidianas ilusórias são produtos das relações sociais limitadas dos indivíduos, da
divisão social do trabalho e da especialização que geram uma percepção limitada da
realidade (que não é totalizante) e devido aos interesses, valores, concepções,
sentimentos, produzidos devido a posição social do indivíduo, sua situação de classe, irá
ser um estímulo para a elaboração da falsa consciência, das representações ilusórias. O
cotidiano das classes sociais é diferente e por isso as suas representações também são
diferentes. A consciência do proletariado tende a ser uma consciência contraditória, mas
que, com o desenvolvimento de suas lutas, supera sua contradição se tornando
consciência correta da realidade, consciência revolucionária. Já a consciência burguesa
possui limites intransponíveis e não pode ascender a uma consciência correta da
realidade, é falsa consciência. As representações cotidianas são formas de consciência
de classe, mas nem toda consciência de classe é representação cotidiana, pois também
pode se manifestar como pensamento complexo. As representações cotidianas podem
assimilar o pensamento complexo com sua popularização, mas ela é a base do

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pensamento complexo, pois vem antes dele. O pensamento complexo sistematiza as


representações cotidianas, produzindo uma falsa consciência sistemática ou uma
consciência correta da realidade, ou seja, se tornando ideologia ou teoria. As
representações reais geram teorias e as representações ilusórias proporcionam
ideologias. Assim, a assimilação do pensamento complexo pelas representações
cotidianas significa sua simplificação, e a assimilação das representações cotidianas
pelo pensamento complexo significa sua complexificação.

Por fim, Viana aborda outras características formais das representações cotidianas,
discutindo os conceitos de mentalidade e sociabilidade, entre outros. Para tanto, ele
retoma a teoria de Festinger sobre a dissonância cognitiva e a tendência para sua
redução para explicar as contradições e incoerências geralmente atribuídas às
representações cotidianas. Ele demonstra que o núcleo das representações cotidianas é
não-contraditório apesar de em sua totalidade ela possuir contradições e incoerências.
Ele usa a distinção apresentada por Erich Fromm e Michael Maccoby entre convicção e
opinião para explicar este processo. A determinação das convicções reside na
mentalidade dos indivíduos, ou “caráter social”, conceito semelhante proposto por
Fromm. A mentalidade expressa valores, desejos, sentimentos, e é a fonte de
representações, idéias. Ela se manifesta sob a forma de tradição, valores, crenças, que
fazem os indivíduos agir. Nesta esfera, não existe contradição. No reino das opiniões, ao
contrário, pode haver as mais variadas contradições e elas inclusive podem contradizer
as convicções do indivíduo.

Enfim, qual é a importância desta obra? Podemos dizer que é uma obra indispensável
para quem trabalha com psicologia social ou sociologia da cultura, entre outras áreas do
saber. A análise crítica do termo senso comum e da abordagem das representações
sociais é muito boa e ajuda a refletir sobre os usos acríticos de determinados termos e
concepções. A parte propositiva é excelente, pois abre um espaço para novas pesquisas,
superando o caráter descritivo dos estudos sobre representações sociais e dando um
passo adiante no sentido de fornecer uma explicação e um instrumento de análise para o
pesquisador. Trata-se, portanto, de uma importante contribuição para pensar a produção
das representações cotidianas e que permite sua compreensão e explicação.

* Paulo Cardinale é psicólogo e professor no ensino médio.

** VIANA, Nildo. Senso comum, representações sociais e representações


cotidianas. Bauru: São Paulo: Edusc, 2008.

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