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Série Açougue: Bunda
20/05/2013 | Filed under: Corpo and tagged with: estética, formolatria 
Texto de Marília Coutinho.
 Depois de anos sentindo esse desconcerto ao ouvir o lamento de mulheres sobre suas  bundas, acho que cheguei a alguns pontos que me ajudam a administrá-lo. Não sei até que  ponto podem efetivamente ajudar as mulheres em desacordo com suas bundas. Sem  pretensão, vamos a eles.
Comecemos pelo começo: a natureza do lamento
 
“Não suporto mais essa minha bunda, detesto essa bunda”
 
“Por que? É linda!”
 
“Porque ela é grande demais.”
 
“Não é.”
 
“É”
 
“Não é”
 
“É e eu sei que todo mundo olha.”
 
“Quem é todo mundo?”
 
“Os homens em geral. Os homens na rua falam coisas nojentas, no ônibus, no metrô…  ficam olhando…”
 
“Mas isso é lixo humano.”
 
“Mas outros homens fazem isso. Todo ho
mem faz isso. Já é difícil falar e expor minhas idéias. Sabendo que eles olham apenas minha bunda, nem ligam para o que penso ou falo,
é insuportável.”
 
 
 
―Nude Buttocks‖ desenho em carvão de
O diálogo acima é fictício. É minha síntese de centenas de diálogos nessa linha. É a partir desse diálogo que abordamos o problema. A primeira tarefa é entendê-lo, dar um nome a ele, ainda que provisório, e separar o afeto do entendimento. Por exemplo: só agora percebo que minha resposta automática é mais que inadequada. É errada! Confrontar alguém com essa queixa é invalidar sua experiência subjetiva. Isso não pode. Tirar nosso próprio afeto e emoção da cena facilita a coisa. Fica claro que estamos diante de uma manifestação de insatisfação com o próprio corpo. Essa insatisfação em específico tem
nuances paradoxais. Ela penaliza estas mulheres pelo avesso. Explico: se no item ―bunda‖
o ideal formolátrico  prescreve quadris largos e bundas grandes, caricaturadas pela indústria  pornográfica, para as mulheres reflexivas a bunda é uma maldição. Aquilo que é entendido como uma conformidade exagerada a este estereótipo é sentido por elas como uma erosão de sua identidade, e, pior, uma negação de sua integralidade. A mulher que sofre com a  bunda supostamente grande se mutilada e fragmentada. Ela se transforma numa bunda ambulante, sem fala, sem pensamento, sem subjetividade.
Muitas mulheres insatisfeitas com bundas que consideram ―grandes demais‖ (em relação a?…) sofreram violências sexistas variadas. Foram olhadas ou abordadas com hostilidade,
 
foram vítimas de agressão verbal e até física ou foram assediadas em ambientes coletivos. Parece fácil situar nestes episódios traumáticos a origem de sua insatisfação corporal, um triste caso de auto-rejeição. Mas será que é mesmo? Será que estas mesmas mulheres, se isoladas de olhares e falas hostis, estariam plenamente satisfeitas com suas bundas? Eu acho que não. Embora alguns estudos (metodologicamente suspeitos) questionem o papel decisivo das mídias  publicitárias na inculcação de valores estéticos e na gênese de comportamentos e atitudes a  partir deles, acredito que a insatisfação das auto-representadas bundudas está aí. Elas construíram uma representação de desacordo a partir de uma bunda ideal da qual desviam. Estas mulheres que arduamente lutam para construir identidades mais integradas são
vítimas paradoxais: ao rejeitar a versão caricata do ideal formolátrico e buscar uma ―bunda discreta‖ de modo a se dar um imaginado espaço para impor outras qualidades
 como dominantes em sua identidade pública, elas embarcam na rota da auto-mutilação e, portanto, submissão (mesmo que às avessas) àquele ideal. Por que mutilatória, se não há cirurgia ou remoção traumática de uma parte do corpo? Mutilação é o dano ou lesão a uma parte do corpo que degrada sua aparência ou função. O ataque à própria bunda que a rejeição ocasiona é mutilatório porque objetiva extirpar tecido saudável. É emocionalmente mais mutilatório ainda, pois enquanto tal tecido não é fisicamente extirpado (com cirurgia ou dieta), ele é representado pela vítima como um
―não
-
eu‖.
 O resultado é um comportamento de dietas irracionais que, se bem sucedidas, provocarão modificações gerais no corpo das supostas bundudas quase sempre produzindo perdas indesejadas. Como as dietas são irracionais, a tendência é um padrão sanfona, onde dietas se sucedem umas às outras gerando períodos mais magros e outros mais gordos, com  potenciais danos substanciais ao humor das vítimas. Dieta como um regime alimentar voltado para produzir benefícios à saúde, gerar bem estar,  prover o corpo da energia e blocos construtivos adequados, modular o funcionamento orgânico e o humor é sempre um elemento importante da vida. Dietas, ou programas alimentares, criados para modificar UMA parte do corpo e assim satisfazer um ideal estético fragmentador é um desastre pedindo para acontecer.

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