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A
ANO I
AVEIRO
1 9 8 1
j—rs.c.A.A.—
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ESTUDOS DO I. S. C. A. A.
PUBLICAÇÃO ANUAL
ANO 1—1981
■ I. S. C. A. A.
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Amílcar Amorim
3 — As dificuldades com que vamos deparando não param e por isso mesmo
mais apostados estamos em superá-las.
Este primeiro número sai com quatro artigos. Outros números sairão
por certo com mais trabalhos e de melhor qualidade.
Ao exortar todos os nossos colaboradores a um trabalho árduo e elabo-
rado, queremos significar que, acima de tudo, o que interessa é encarar
de maneira construtiva o futuro do I. S. C. A. Aveiro de modo a tor-
ná-lo um instrumento de desenvolvimento social no meio em que está
inserido, e, de imediato levar o progresso e formação a todos os alunos
que o procuram.
É que estes, acreditamos, ao serviço do saber e do desenvolvimento da
instituição, darão tanto da sua generosidade quanto contam receber.
Amílcar Amorim
1. NOTA PRÉVIA
9
2. BREVE NOTA GEOGRÁFICA
10
dos seus habitantes com idade inferior a 15 anos é igual ou superior a me-
tade da população adulta, poderemos concluir que não obstante a emigração,
o Distrito apresenta neste capítulo valores confortáveis (veja Quadros VI,
VII e VIII). Aveiro apresenta no grupo de idades dos 0 aos 19 anos
41,3 % da população quando estimativas recentes (1980) apontavam para
35 % como valor médio do País neste grupo. Assim, o Distrito de Aveiro
apresenta neste grupo de idades valores muito acima da média estimada
(veja Quadro IX).
Se atendermos ao modelo teórico de Pichat, dos 0-25, 520/1 000, dos
25-50, 325/1000, e de idades superiores aos 50 anos, 155/1000, chegare-
mos à mesma conclusão. Em números redondos, para uma população,
de 542 800 habitantes no Distrito, (segundo o Censo de 1970), teríamos em
obediência ao modelo, uma população jovem (0-25) de 270 900, o que nos
aproxima por defeito, no que respeita à juventude, do modelo de Pichat
(Quadro III). A diferença para menos, aliás insignificante, não deve ser
estranha, por um lado, a emigração e por outro, a geral quebra das taxas
de natalidade que se vêm verificando desde os anos 60.
Em termos globais, considerando já os resultados preliminares do
Censo de 1981 (ver Quadro IX), verifica-se um aumento da população pre-
sente, de 14,9 %, sendo Aveiro o Distrito que se situa em 5.° lugar entre
os de maior aumento demográfico : Setúbal 39,5 %, Lisboa 29,5 %, Faro
20,9 %, Porto 18,7 % e Aveiro 14,9 %.
No que respeita à densidade da população, Aveiro situa-se entre os
Distritos do continente com maior densidade populacional (230 hab./Km. 2 ),
só ultrapassado por Lisboa (746), Porto (679) e Braga (277).
Sendo a média de 105 hab./Km. 2 para o conjunto dos distritos do
continente, concluiremos que a densidade populacional do Distrito de Aveiro
é superior ao dobro da média nacional. Dos 19 Concelhos do Distrito só
Arouca (87 hab./Km. 2 ) e Ílhavo (42) apresentam valores inferiores à média
(Quadro II).
Apreciando a variação percentual da população recenseada em Março
de 81 quando comparada com o Censo de 70, verificamos que dos 19 con-
celhos do Distrito, oito têm crescimento demográfico superior à média na-
cional : Águeda (18 % ) , Anadia (15,4 %) Mealhada (18,3 % ) , Oliveira
do Bairro (15,7 % ) , Aveiro (17,3 % ) , Albergaria-a-Velha (21,2 % ) , Ílhavo
(32,2 %) e Feira (20,6 % ) . Ílhavo destaca-se de todos os outros concelhos,
com um crescimento superior a 32 %, relativamente ao Censo de 70, facto
que poderemos imputar à proximidade, em relação a Aveiro de algumas
das suas freguesias mais populosas (Gafanhas, Barra e Costa Nova) que
funcionam, hoje em dia, como autênticos «dormitórios» da capital do
Distrito.
Com um aumento inferior a 15 %, temos Vale de Cambra (13,3 % ) ,
Ovar (13 % ) , Sever do Vouga (12,4 % ) , Espinho (13,3 % ) , Murtosa
(8,2 % ) , Estarreja (7,8 % ) , Castelo de Paiva (5,5 %) e Arouca (1,2 %)•
O Concelho de Vagos é, no Distrito de Aveiro, o único que viu dimi-
!1
nuir o número de habitantes. Poderemos encontrar uma explicação para
o facto se pensarmos que em Vagos se continua a observar um volumoso
fluxo migratório. Daí um decréscimo de 1,5 % na sua população actual,
em referência à que tinha em 1970.
No que respeita à população infantil e juvenil considerada dos 0-25
anos, por concelhos e por ordem decrescente, temos os valores absolutos
que o Quadro III apresenta; o concelho da Feira, com cerca de 52 300, mais
populoso, e a Murtosa, com cerca de 4 000, o menos populoso (1).
12
QUADRO I
DISTRITO DE AVEIRO
População
Concelhos
total
Águeda 42 900
Albergaria-a-Velha 20 800
Anadia 29 700
Arouca 26 500
Aveiro 60 000
Espinho 34 700
Estarreja 27 800
Vagos 20 800
Vale de Cambra 24 000
QUADRO II
DISTRITO DE AVEIRO
Densidade
Concelhos População
Hab./km.
Águeda 127
Albergaria-a-Velha 143
Arouca 87
Anadia 141
Aveiro 288
Castelo de Paiva 166
Espinho 1 577
Estarreja ?22
Feira 526
Ílhavo 42
Mealhada 159
Murtosa 211
Oliveira de Azeméis 412
Oliveira do Bairro 198
Ovar 282
S. João da Madeira 2 833
Sever do Vouga 105
Vagos 121
Vale de Cambra 162
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QUADRO V
Distritos Inscrições
Aveiro 67,7
Beja 15,6
Braga 88,8
Bragança 20,0
C. Branco 19,8
Coimbra 36,4
Évora 13,3
Faro 22,8
Guarda 20,8
Leiria 39,2
Lisboa 134,4
Portalegre 10,5
Porto 164,4
Santarém 36,5
Setúbal 46,5
V. do Castelo 28,8
Vila Real 34,6
Viseu 48,4
A. Heroísmo 7,3
Horta 3,2
P. Delgada 17,8
Funchal 32,8
Total 913,6
Cidades :
Lisboa 49,6
Porto 26,1
FONTES : Estatísticas da Educação, 1971. Lisboa, 1972; Id. 1977, Id. 1978.
(a) Excluem-se os alunos do ensino individual e doméstico, que perfazem
7,9 em 1970-1971 e 4,5 em 1976-1977
17
QUADRO VI
18
QUADRO VII
20-59
D I S T R I T O S
%
Setúbal 57,6
Lisboa 56,0
Évora 54,7
Portalegre 52,1
Beja 51,9
Faro 51,7
Santarém 50,9
Coimbra 49,2
Leiria 49,1
Porto 45,7
Aveiro 45,4
Guarda 44,5
Viseu 43,5
Bragança 42,9
Braga 40,7
D I S T R I T O S 60 e + anos
%
Guarda 21,2
Castelo Branco 21,1
Faro 21,1
Portalegre 20,7
Coimbra 18,8
Santarém 18,6
Beja 18,2
Évora 17,7
Viseu 17,7
Viana do Castelo 17,7
Bragança 16,6
Leiria 15,4
Lisboa 15,2
Aveiro 13,3
Setúbal 12,5
Braga 11,9
Porto 11,9
20
QUADRO IX
(1980)
' 35,1 %
10 14 382 295 375 799 758 094
■ — —i
• 53,6 %
5064 634 684 777 580 1412 264
21
5. ASSOCIATIVISMO CULTURAL E RECREATIVO
22
por atenção e carinho de uma outra instituição ou mesmo de particular que
para o efeito cedem instalações aos grupos juvenis. É frequente depararem-se
situações destas, sobretudo nos ranchos folclóricos. Bandas de música há
também, que, embora centenárias nunca dispuseram de instalações próprias.
É fácil imaginar os transtornos que isto causa às suas actividades
associativas e por isso justo é salientar o grande espírito associativo, a ener-
gia espiritual, a vontade de convívio, em suma, o amor a estas actividades
culturais de que tal facto é evidente testemunho.
6. O TEATRO
23
8. A MÚSICA
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26
e mostrando atitudes e comportamentos; por último, e com o seu aspecto de
positivo, temos que salientar a astronomia, que embora com poucos aderen-
tes, contudo se vai incrementando em alguns jovens que dedicam as suas
horas ou tempos livres a prescrutar o universo, procurando descobrir e encon-
trar explicações e até mesmo estudar os fenómenos que se desencadeiam no
espaço astral, sendo aqui de mencionar a cidade de Espinho onde poderemos
encontrar um grupo de jovens que se dedica a esta actividade.
Outras actividades se poderiam ainda mencionar embora menores em
número de praticantes tais como: espeleologia, serigrafia, arqueologia, artes
plásticas, etc.
27
QUADRO XII
(1977)
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29
do Registo de Imprensa em 3 de Outubro de 1978 (ver relação abaixo), 74
pertenciam ao Distrito de Aveiro.
A importância relativa de cada um dos concelhos que integram o
Distrito pode ver-se no Quadro XIII. Aveiro, capital do Distrito, apresenta
9 títulos, seguindo-se Feira e Águeda com 6. Oliveira do Bairro, Sever do
Vouga, Murtosa e Castelo de Paiva situam-se entre os concelhos de menor
número de títulos.
Da grande imprensa, o Jornal de Notícias e o Comércio do Porto
têm delegações permanentes na capital do Distrito, bem assim o Diário
Popular, de Lisboa.
RELAÇÃO NUMÉRICA DOS PERIÓDICOS INSCRITOS NA
REPARTIÇÃO DOS REGISTOS DA IMPRENSA
Anual 176
Bianual 3
Bimensal 36
Bimestral 121
Bissemanal 12
Diário 41
Irregular 5
Mensal 861
Quadrimensal 1
Quadrimestral 51
Quinzenal 251
Sazonal 1
Semanal 500
Semestral 20
Trimensal 11
Trimestral 199
Trissemanal 8
Variável 2
Duas vezes por ano 1
Três vezes por ano 3
Três-quatro vezes por ano 1
Quatro vezes por ano 1
Quatro-seis vezes por ano 1
Cinco vezes por ano 1
Oito-dez vezes por ano 1
Dez vezes por ano 2
De vinte em vinte dias 1
De dois em dois meses 4
De três em três meses 1
De dezoito em dezoito meses 1
Dois por mês 1
Lisboa, 3 de Outubro de 1978.
30
Na análise dos índices de leitura da juventude é preciso não subestimar
o peso dos factores sócio-económicos ou culturais sobre os tempos livres
dedicados à cultura para além de certas motivações : criatividade intelectual,
ambição social ou aspiração a transformar o mundo, etc. : uma sociedade
sem esperança não tem necessidade de livros !
Talvez porque estas motivações se situam mais nas classes jovens,
assim se explicará o que as estatísticas documentam, que:
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Ensemble 55,1 16,6 42,8 28,4 30,3 74,4 15,7 76,9 35,2
Sexe
60,3 21,3 37,9 30,9 28,3 72,3 14,1 75,9 42,5
50,2 12,3 47,4 26,1 32,1 76,4 17,1 77,8 28,5
Situation de famille
58,6 18,2 45,7 22,8 25,6 78,7 16,3 76,6 39,1
43,4 16,0 38,4 45,1 11,3 62,9 12,4 80,2 24,6
Âge
37.1 9,2 30,9 45,3 10,8 77,6 13,2 74,8 14,2
35.2 16,4 42,5 38,2 13,7 53,6 13,5 86,1 35,5
74,9 20,8 4840 31,5 22,4 67,0 13,8 82,2 36,0
64,1 17,5 44,9 22,8 39,2 80,2 15,5 76,4 38,3
67,6 14,9 40,7 20,5 43,0 82,0 19,6 69,2 40,2
Niveau d'études
47,5 9,1 28,1 14,8 53,4 78,8 18,1 69,9 28,3
58.4 13,2 43,4 25,4 31,2 78,9 16,2 79,2 36,7
54,4 21,9 49,0 41,5 12,2 66,1 13,4 79,4 36,9
Baccalauréat et études supérieures . . . . 59.1 40,1 61,8 52,3 3,6 60,6 11,2 78,9 42,4
I. Tous les jours, 2. Un jour sur deux au moins. 3. Hebdomadaire. 4. Souvent ou de temps en temps.
5. Régulièrement. 6. Plus de dix fois. 7. Au moins une fois. 8. Au cours des douze derniers mois.
9. Au moins une ou deux fois par mois. 10. Concert de «grande musique- jouée par des professionnels.
I I . Revue d'actualité politique et sociale; magazine féminin et familial revue littéraire, artistique,
scientifique, d'histoire, etc. 12. Sur cent personnes disposant d'un téléviseur.
S o u r c e : secrétariat d'Etat à la Culture, Pratiques culturelles des Français, décembre 1974.
52
PSP e relativamente à população do Distrito, a criminalidade em 1981 não
evidenciou uma evolução significativa e muito menos alarmante. Uma acção
delituosa em cada quatro horas — é o balanço dos responsáveis (5).
É que não se verificam de modo muito acentuado entre a juventude
do Distrito as causas sociológicas e psicológicas justificativas do mal estar
juvenil que se encontram em outras áreas. Os tempos livres são ocupados
num associativismo intenso; o encontro de jovens num estado de crise idên-
tico não se verifica tão facilmente por não existência no Distrito de grandes
concentrações urbanas. Por outro lado, devido à extrema divisão da pro-
priedade e à vasta rede de pequenas unidades industriais, não existem os
bloqueamentos por quadros estreitos e regulamentos que abafam a sua
energia vital. Por outro lado ainda, o desemprego juvenil não é no Distrito
dos mais gravosos (6).
Segundo um inquérito recente, feito pelo Ayuntamiento de Madrid,
junto de 2 000 rapazes e raparigas madrilenas, entre os 14 e os 24 anos,
verifica-se ser o desemprego o responsável por 46,1 % dos casos de delin-
quência juvenil, seguindo-se a falta de dinheiro 15,5 %, a sociedade de
consumo 12 %, o consumo da droga 10,7 %, a libertinagem 6 %, proble-
mas familiares 6 %, a falta de instalações 2 %. O referido inquérito mostra
ainda que as consequências do desemprego juvenil são várias : consumo de
droga, alcoolismo, delinquência e violência 29,4 %, frustrações e inutilidade
16,8 %, desespero 12,9 %, vagabundagem 11,2 %, procura de evasões,
cansaço de lutar 10,7 %, visão péssima e derrotista de tudo 9,6 %, proble-
mas de tensões familiares 7,9 %. Continuando a citar o referido inquérito,
a juventude gasta em bares e discotecas 37,9 % do seu tempo livre, em
cinemas e espectáculos 22,5 %, em excursões e desportos 16,4 %, per-
manência em casa 12 % e estudo 8 %.
33
O já referido inquérito revela também que os jovens gastam em álcool,
tabaco e droga 28,7 % das suas economias, em discotecas e bares 21,1 %,
cinemas 13,1 %, livros e periódicos 13,1 %, motos e automóveis 7 %, roupa
6,8 %, discos e cassettes 6,6 %, jogos 2,6 % (7).
Em relação à juventude do Distrito faltam-nos estatísticas como as
alcançadas pelo inquérito atrás citado. De maneira quantificada pouco sabe-
mos sobre a ocupação dos seus tempos livres, bem assim quanto ao modo
como a juventude gasta as suas economias.
Os índices de religiosidade e de prática religiosa tem sido também,
como se sabe, uma das preocupações dos sociólogos. Ainda recentemente
em Portugal se procedeu a um recenseamento à prática religiosa, cujos resul-
tados começam a ser tornados públicos. Mas não só em Portugal, também
em Itália se acaba de realizar, pela 1." vez, uma sondagem completa, neste
caso mais especificamente sobre a religiosidade dos jovens, e já os primeiros
dados começam a aparecer e a despeitar grande interesse nos maiores órgãos
de comunicação social do País (8).
Este trabalho que durou 4 anos foi realizado por uma equipa de
investigadores pertencentes à Faculdade de Ciências da Educação da Uni-
versidade Salesiana de Roma. O estudo de investigação foi baseado sobre
5 000 entrevistas realizadas em 15 regiões italianas. Os jovens entrevistados
dos 18 aos 25 anos, pertenciam a 2 grupos diversos: os chamados associados,
isto é, pertencentes a algum tipo de associação cultural, política, social,
religiosa, desportiva, etc., e jovens desagregados, isto é, que nunca perten-
ceram a nenhum grupo associativo. Parece ter-se concluído, neste inquérito,
que somente 9 % dos jovens colocam a religião no centro das suas vidas.
Concluiu-se também, que os jovens associados mostram ou dão a
impressão de possuir um quadro de valores mais orgânico e primam pelos
valores que se referem à sociabilidade e às relações interpessoais, contra-
riamente aos jovens desagregados, dispersos ou solitários que sobrestimam
os valores da auto-realização, da auto-estima e da entidade pessoal.
Em Portugal não conhecemos inquéritos deste tipo. Conhecemos sim,
como já se referiu, um recenseamento à prática religiosa dos católicos por-
tugueses realizado em Fevereiro de 1977. Deste inquérito tiram-se alguns
números que revelam para todo o Distrito de Aveiro, índices de prática reli-
giosa e de comportamento religioso muito elevados.
Estudo recente (9) confirma também que todos os indicadores de
desintegração socio-cultural assumem na diocese de Aveiro valores infe-
riores à média nacional.
34
O Plano Oficial de Contabilidade e a
sua adequação à 4." Directiva da C. E.E.
Domingos José da Silva Cravo
1. ANTECEDENTES DO P. O. C.
São relativamente numerosos os projectos de Planos de Contas que
foram aparecendo em Portugal, antes dos técnicos portugueses verem insti-
tucionalizada a Normalização Contabilística.
Citam-se, a título de exemplo, alguns deles que foram objecto de
estudo pela Comissão de Normalização Contabilística (C. N. C.) :
— «Plano Geral de Contabilidade-Projecto-Contribuição para o
Plano Contabilítico Português» — do Sindicato Nacional dos
Empregados de Escritório — Centro de Estudos (1965);
— «Plano de Contabilidade para a Empresa» — do Grupo de
Trabalho dos Técnicos de Contas do Sindicato dos Profis-
sionais de Escritório do Distrito de Lisboa (1970);
— «Anteprojecto do Plano Geral de Contabilidade» — da Di-
recção Geral das Contribuições e Impostos (1973);
— «Plano Português de Contabilidade» — da Sociedade Por-
tuguesa de Contabilidade (1974);
— «Normalização Contabilística—1." Fase»—da Comissão
de Normalização Contabilística (1975).
Neste capítulo ao procurar dar uma imagem dos antecedentes do
P. O. C, analisarei apenas o «Anteprojecto do Plano Geral de Contabili-
dade» — da Direcção Geral das Contribuições e Impostos, e a «Normali-
zação Contabilística—l.a fase»—da Comissão de Normalização Conta-
bilística (C. N.C.) que para além de terem sido os planos que maior divul-
gação tiveram entre os técnicos portugueses, representam, em termos gerais,
duas tendências distintas em Normalização Contabilística.
55
1.1. ANTEPROJECTO DO PLANO GERAL DE CONTABILIDADE
Da autoria de um grupo de trabalho do Centro de Estudos Fiscais
da D. G. C. I., nomeado sob a égide do Ministério das Finanças, surgiu em
1973, uma proposta de Plano de Contas que foi denominada por «Plano
Geral de Contabilidade—-Anteprojecto — l.a fase».
Este Anteprojecto, fortemente inspirado no Plano Francês, apresen-
tava-se com algumas características interessantes, nomeadamente o facto de
normalizar a terminologia da Contabilidade Analítica a um nível global, sem
todavia deixar de ser flexível de modo a deixar aberta aos utilizadores a
opção entre um qualquer esquema de relações entre a Contabilidade Geral
e Analítica — afastando-se neste ponto do Plano Francês, de características
vincadamente dualistas.
No entanto,e no que diz respeito ao «Relato Contabilístico-Financeiro»
este projecto nada de novo apresentou. Os mapas finais circunscreviam-se
ao «Balanço Analítico», a Contas de «Exploração» (sintética e analítica)
e a uma conta de «Ganhos e Perdas». Quanto à definição de princípios e
conceitos contabilísticos e a critérios e métodos de valometria nada foi apre-
sentado nesta fase de trabalhos.
A capacidade de resposta do Anteprojecto ficava limitada, fundamen-
talmente, a aspectos de natureza fiscal. Aliás o facto dos autores do Plano
serem, ao tempo, colaboradores da D. G. C. I. deveria ter influenciado a estru-
tura do projecto de tal modo que a componente fiscalista do seu trabalho
apresentava um peso assaz mais significativo que a componente económico-
-financeira e de apoio à gestão. A reforçar esta ideia está o que é dito na
«Justificação Prévia» daquele trabalho, donde citamos — com a normalização
«se julga favorecer o entendimento dos documentos contabilísticos evitando,
além do mais, distorções inconvenientes na determinação da matéria colectá-
vel das Empresas que pagam impostos sobre os lucros calculados através
da Contabilidade».
À parte este aspecto, entende-se que é um trabalho meritório, bas-
tante elaborado, que foi colocado à discussão dos técnicos portugueses para
que, a partir das críticas recebidas, fosse possível elaborar um Plano mais
completo e mais adaptado às necessidades das empresas.
Deve-se ainda referir que o «Anteprojecto do Plano Geral de Conta-
bilidade» teve uma aplicação bastante grande, mesmo sem se ter chegado
à sua institucionalização. Contribuiu para tal como factores principais :
36
1.2 NORMALIZAÇÃO CONTABILÍSTICA — 1." FASE
Verifica-se pois, numa análise breve que este trabalho nos trás algo
de novo em relação aos anteriores, nomeadamente a apresentação de um
«Anexo ao Balanço e à Demonstração dos Resultados» e o «Mapa de Ori-
gens e Aplicações de Fundos», elementos tão pouco da tradição (senão
mesmo à altura do desconhecimento) de uma grande parte dos técnicos por-
tugueses. Compunham ainda o trabalho algumas «Notas» de esclarecimento
(Específicas e Gerais) ao Balanço e à Demonstração de Resultados, «Indi-
cações ao Mapa de Origens e Aplicações de Fundos», um «Código de Con-
tas» e uma «Lista de Contas».
Estas últimas duas peças — «Código de Contas» e «Lista de Contas»
não foram todavia suficientemente desenvolvidas como a própria Comissão
o reconhece. Todavia, como é referido no relatório, «não se abandona a
37
ideia de se propor como obrigatório o plano de contas — apenas, agora não
se deu prioridade à sua formulação». O Código de Contas e a Lista conse-
quente resultavam da agregação sistematizada dos documentos que consti-
tuíam as peças finais.
No entanto, algo ficou para trás, como é admitido pela Comissão —
A Demonstração de Resultados por Funções; a valorimetria, princípios e
conceitos contabilísticos e normas explicativas ao conteúdo das Contas.
Em relação ao Anteprojecto do P. G. C. perdeu-se todavia a Norma-
lização da Contabilidade Analítica que constava naquele documento, uma
vez que embora criada a Classe 9 para a Contabilidade de Custos, ela foi
mantida livre. Quanto às «Contas de Ordem», também não previstas pelos
autores do trabalho, estou em crer que a informação que era retirada da sua
inclusão em Balanço é suprida, com vantagem, com a inclusão nas peças
finais do «Anexo ao Balanço e à Demonstração de Resultados».
No domínio das omissões já referidas, cremos que, pelo menos, a
divulgação dos princípios e conceitos contabilísticos e valorimetria deveriam
ter sido incluídas na primeira fase dos trabalhos, por forma a que os técnicos
portugueses tivessem um lapso maior de tempo para as estudar e então
aplicá-las sem margem de dúvidas. Tal não aconteceu e foi pena que assim
tivesse sido.
Achamos pois que com a «Normalização Contabilística— 1.' fase» se
deu um passo qualitativo em frente. Começou-se a pensar que a Contabili-
dade deverá estar fundamentalmente ao serviço da Empresa e que os Orga-
nismos de Direcção Estatal é que deverão aproximar-se do Direito Conta-
bilístico e não mais este a ser elaborado e posto ao serviço exclusivo daqueles
Organismos. Entendemos pois, haver, com este projecto de Normalização
divergências significativas em relação à linha Francesa de Normalização.
Deverá no entanto dizer-se que quanto a nós, houve uma pressa
grande em institucionalizar a Normalização e quer o tempo de discussão
quer as exigências de apresentação de elementos segundo o novo modelo
foram demasiadamente curtos, e não permitiriam a aplicação gradual, de
modo a tornar mais fácil a adaptação às Empresas. O salto foi grande e o
tempo de preparação foi curto.
— Balanço Analítico;
38
— Demonstração de Resultados Líquidos;
— Demonstração dos Resultados Extraordinários do Exercício;
— Demonstração dos Resultados Exercícios Anteriores;
— Movimento da Conta de Resultados Líquidos;
— Anexo ao Balanço e à Demonstração de Resultados;
— Demonstração dos Resultados por Funções e seus Desen-
volvimentos;
— Mapa de Origens e Aplicação de Fundos.
As restantes Empresas (do Grupo B da C. I.) ficariam obrigadas à
elaboração do
— Balanço Sintético e da
— Demonstração dos Resultados Líquidos
A aplicação do Plano tornou-se obrigatório logo no exercício de 1977
para as E. P. e a partir de 1978 para as restantes Empresas do Grupo A da
C. I.. As Empresas do Grupo B da C. 1. podem aplicar facultativamente
o P. O. C .
Simultaneamente foi criada a Comissão de Normalização Contabilística
dado que, como é dito no preâmbulo do Decreto-Lei «o funcionamento e
aperfeiçoamento do Plano exigem a institucionalização de uma Comissão
de Normalização Contabilística com a maior representatividade».
É ainda prevista a «publicação de Planos sectoriais de diversas activi-
dades de acordo com as respectivas especificidades».
2.2. Estrutura do P. O. C.
O Plano seguiu de perto a Normalização Contabilística—l. a fase.
É, necessariamente, mais completo visto que incluiu alguns elementos que
considerámos omissos no primeiro trabalho da C. N. C , e outros foram
revistos, embora se concorde que não é um trabalho perfeito.
Estruturalmente o P. O. C. compõem-se de :
— Introdução;
— Relatório da Comissão;
— Considerações Técnicas;
— Balanços (Analítico e Sintético);
— Demonstração de Resultados do Exercício, incluindo :
— Movimento da Conta de Resultados Líquidos;
— Demonstração de Resultados Líquidos por Natureza;
— Demonstração dos Resultados Extraordinários do
Exercício;
— Demonstração de Resultados de Exercícios Ante-
riores;
— Anexo ao Balanço e à Demonstração de Resultados;
39
— Demonstração de Resultados por funções e seus desenvol-
vimentos;
— Mapa de Origens e Aplicações de Fundos e incluindo o
Mapa da Variação dos Elementos dos Fundos Circulantes;
— Quadro de Contas;
— Código de Contas;
— Notas explicativas sobre o conteúdo e movimentação de algu-
mas contas;
— Valorimetria, incluindo os princípios e conceitos contabilís-
ticos adoptados e os critérios e métodos específicos de va-
loração.
1. Meios Monetários
CONTAS DE 2. Terceiros e Antecipações
BALANÇO 3. Existências
4. Imobilizações
5. Capitais, Reservas e Resultados Transitados
CONTAS DE 6. Custos por Natureza
RESULTADOS 7. Proveitos por Natureza
Resultados
OUTRAS / 9. Contabilidade de Custos
CONTAS \ 0. (Livre)
40
namento por disponibilidades decrescentes; o Passivo foi ordenado segundo
prazos decrescentes de exigibilidade; e na Situação Líquida atendeu-se à
formação histórica dos capitais próprios. Nos países citados o critério de
seriação foi exactamente o inverso.
Quanto à Demonstração de Resultados por Natureza, a sua seriação
foi efectuada de modo a possibilitar a fácil obtenção do valor acrescentado
(aproximado) a custo dos factores, numa óptica de produção e numa óptica
de repartição.
A Demonstração de Resultados por Funções foi uma das inovações
do P. O. C . Procurou-se dar com este documento um relevo aos Resultados
de acordo com os fluxos desde os consumos até à saída da Empresa. No
dizer da C. N. C. os mapas sugeridos suportam quer o sistema de custeio
directo quer o da absorção total. Estamos em crer ter sido esta uma das
inovações mais proveitosas do P. O. C .
Outra das inovações do Plano, aliás já ensaiada na «Normalização
Contabilística—1." fase», foi a apresentação do «Anexo ao Balanço e à
Demonstração de Resultados». Embora ainda algo longe do Anexo pela 4. a
Directiva da C. E. E. no alcance da informação, parece-nos no entanto uma
medida acertada da C. N. C. a implantação do mesmo junto dos técnicos
Portugueses e das próprias Empresas pelo melhoramento que ele trará consigo
do domínio da informação a prestar aos destinatários das contas anuais.
41
e já é tarde, fazer campanhas que divulguem os benefícios da Normalização
e os melhores meios de os obter. A aplicação de um «código de contas» é
por si só insuficiente. É preciso divulgar princípios e conceitos contabilís-
ticos; é necessário explicar o que se pretende com o P. O. C. e como se
obtém. Em suma é preciso modificar na tradição o que está caduco.
4?
If." Dvrectiva Piorno Oficial de Contabilidade
1, Obrigatoriedade (na generalidade 1. O briga toriedade
dos países) . Empresas Soe. Anónimas
. Sociedades Anónimas Públicas Soe. por quotas
. Sociedades em comandita por , Empresas do Soe. em comandita
por acções Grupo A da Soe. em nome co-
. Sociedades por quotas C. I. lectivo
Cooperativas
Comerciantes em
nome individual
43
3.2. DISPOSIÇÕES GERAIS
44
Uma medida de largo alcance, e que deverá vir a merecer a atenção
da C. N. C. é a inovação que constitui a disposição que obriga as empresas
a integrar nas contas, elaboradas de acordo com a 4. a D, uma coluna onde
sejam evidenciados os valores do exercício precedente, permitindo-se obter
uma imagem mais adequada da evolução da Empresa.
Permite ainda a 4.a D que os Estados membros possam adequar ou
pedir a adaptação do Balanço e da Demonstração dos Resultados Líquidos
a fim de incluir a distribuição dos lucros ou tratamento das perdas. O mapa
de «Movimento da Conta de Resultados Líquidos» do P. O. C. permite a
análise daquelas situações respeitantes aos resultados do exercício antece-
dente, bem como a análise da formação do Resultado Líquido do período.
3.3.1. BALANÇOS
45
b) A possibilidade de autonomização de Despesas de Estabelecimento,
e quando tal não acontece, a obrigatoriedade de as incluir como
primeira alínea das Imobilizações Incorpóreas. Note-se que em
Portugal se optou pela não autonomização das Despesas de Esta-
belecimento e que elas figuram em terceiro lugar no desenvolvi-
mento das Imobilizações Incorpóreas.
c) A rubrica de Imobilizações Corpóreas incluída no Balanço Analí-
tico do P. O. C. encontra-se bastante mais desenvolvida do que
a constante nos modelos de Balanço previstos na 4.a D.
d) Prevê-se na rubrica de «Imobilizações Financeiras» da 4.a D a
inclusão de empréstimos sobre empresas afiliadas, sobre empresas
com as quais a Empresa está ligada por via de participações privi-
legiadas e outros empréstimos, enquanto que no P. O. C. tais
rubricas estão incluídas nos «Créditos».
e) Anota-se ainda que a percentagem em que se fixa o valor mínimo
para uma empresa se considere associada é de 25 % no caso do
P. O.C. enquanto a 4.a D fixa o valor mínimo em 20 %.
f) No que respeita aos Activos correntes verifica-se que a 4.a D
prevê uma rubrica para Investimentos em Títulos (próprios, de
associados ou outros) enquanto que o P. O. C. não contempla tal
situação (admite-se que tal se deva aos termos em que se tem
processado o mercado de títulos em Portugal desde 1974).
g) No Passivo do Balanço da 4.a D nota-se a autonomização do
«Prémio de Emissão» que o POC, mesmo ao nível de Balanço
Analítico inclui na rubrica de «Outras Reservas Especiais».
— Dispositivo Vertical
— Dispositivo Horizontal
46
para o Balanço também a Demonstração de Resultados do P. O. C. embora
não apresente uma aderência formal em relação ao modelo da 4. a D, os
elementos da Lista de Contas permitem a obtenção dos mapas da Norma
Comunitária. O P. O. C. consigna já ambos os modelos de Demonstração
de Resultados: por Natureza e por Funções.
47
c) O Imobilizado Corpóreo, bem como os Activos correntes, devem
ser mensurados ao custo de compra ou ao custo de produção. Esta
convenção é comum às duas normas.
48
b) A única referência a métodos de mensurações no anexo do P. O. C.
diz respeito a critérios valorimétricos das existências e de alguns
tipos de Imobilizações Financeiras.
c) Em relação às Associadas, salvo o nome das mesmas, mais
nenhum dos pedidos do anexo da 4.a D é consagrado no P. O. C .
d) O número e a importância nominal ou o preço ao par das acções
subscritas durante o exercício, dentro dos limites do capital auto-
rizado, é uma das notas da 4.a D que tem uma correspondência
relativa com a nota 18 — sobre formas como se realizou o capital
no exercício em que teve lugar.
— Etc.
4!)
zação. E note-se que esta, poderá vir a ser efectuada apenas através do alar-
gamento das notas do Anexo Português, mesmo sem se suprimir qualquer
item actualmente constante daquele documento uma vez que o art.° 43.°
define apenas as informações mínimas a prestar no anexo.
— Balanço Analítico;
50
Relatório da Administração;
51
Pelo nosso lado não nos encontramos junto daqueles que defendem
que o P. O. C. e a 4.a D são incompatíveis, mas também não caímos no
extremo oposto. As duas normas são conciliáveis, mas para isso haverá que
trabalhar o Direito Contabilístico Português em geral, e o P. O. C. em par-
ticular para se obter a harmonização, sem que todavia se descure a reali-
dade Portuguesa.
Os Portugueses devem estar atentos à aplicação da Directiva nos
países da Comunidade (que será obrigatória a partir das contas aprovadas
em 31 de Dezembro de 1982, a publicar em 1983) e com os pés assentes
na terra, bebendo na experiência alheia, adaptarem a legislação do Relato
Contabilístico-Financeiro às normas da C. E. E.. Portugal terá quatro anos
após a sua adesão à Comunidade para harmonizar a legislação. Não será
muito tempo, mas talvez seja o suficiente para se produzir uma integração
gradual e sem sobressaltos.
52
Concorrência de Convenções
Colectivas de Trabalho
55
da categoria (2). Efectivamente, os componentes de uma colectividade ou
de uma categoria, a par de interesses estritamente individuais e de interesses
próprios conexos com a qualidade de membro da categoria, que, quando
confrontados entre si, podem ser diversos ou mesmo contrários, são porta-
dores de um interesse comum (o interesse colectivo), que também pode ser
diverso e mesmo contrário dos primeiros, quando com eles comparado (3).
Os indivíduos, apesar de portadores de interesses diversos ou contrá-
rios, ao ganharem consciência de que, num certo momento (4), uma fracção
de um seu próprio interesse é também comum a outros — e, portanto, tem,
íesse momento, existência como interesse típico e objectivo, que, sendo embora
próprio deles, não é mais deles do que de outros — e de que é conveniente
assegurar a sua tutela em comum, podem organizar-se para actuarem colectiva-
mente. Seleccionado pelos indivíduos, segundo as suas próprias valorações
subjectivas, o interesse colectivo é o factor que determina a sua associação para
a acção colectiva. Não é, pois, a colectividade, previamente constituída, que
gera o interesse colectivo, e, por isso, ele não deve ser definido como colectivo
por pertencer à colectividade. A definição como colectivo de um interesse
comum passa, pois, por juízos de valor subjectivos formulados pelos indi-
víduos. Ê certo que esses juízos assentam em dados objectivos — profissão,
matéria prima trabalhada e actividade, dimensão económica ou natureza
jurídica da empresa, por exemplo — mas, em última análise, o interesse
colectivo só se define como tal com base na valorização dos próprios inte-
ressados, no exercício da sua autonomia, ou seja, segundo os seus próprios
critérios livremente assumidos. Daí que uma pluralidade de indivíduos,
54
situados em condições objectivas idênticas, possa vir a definir interesses
colectivos diversos, cada um dos quais gerará uma colectividade ou categoria.
E, por ser o interesse colectivo seleccionado pelos membros da colecti-
vidade, pode sofrer modificações ao longo do tempo, em resultado de
alteração das valorações subjectivas dos seus portadores (5).
O interesse colectivo, assim concebido, é a matriz da categoria (6).
55
os seus portadores julgam possível adoptar uma posição comum e oportuno
constituir, por isso, uma frente externa (7).
Assim, o interesse que gera a categoria não é a simples soma dos inte-
resses individuais dos seus componentes : aquele e estes podem ser diversos
e contrários. Há, pois, uma realidade objectiva que nem se reduz às pessoas
coligadas nem aos seus interesses individuais.
E nem se diga que o interesse colectivo, sendo comum, é ainda um
interesse individual. Seria esquecer a sua natureza extraindividual, enquanto
interesse típico e objectivo, que, sendo próprio de cada um e por cada um
subjectivamente definido, não é mais de um do que dos outros membros da
categoria.
56
Por outro lado, a categoria tem significado jurídico não como realidade
ontológica em si própria, mas como efeito de uma norma que lhe dá e nos
termos em que lhe dá relevância. Ora, perante a actual Ordem Jurídica por-
tuguesa, a individualização e relevância da categoria não derivam de uma
norma legislativa — o que constituiria violação da liberdade sindical — mas
sim dos estatutos sindicais (8).
Aliás, a concepção ontológica anda inteiramente associada a teorias
que integram, como elemento necessário, a unicidade sindical. Na verdade,
quando apenas se permite a constituição de um único sindicato para repre-
sentar uma categoria, torna-se indispensável definir previamente, de forma
abstracta, o âmbito de cada uma. E, também por isso, a liberdade sindical
é, então, concebida como liberdade de categoria, onde as pessoas «entram
categorizadas, reduzidas a pertencer, a ser-membro, a não-poder-querer-
-fora do ente» (9). Deste modo, a concepção ontológica da categoria e a
liberdade sindical entendida como liberdade individual fundamental de asso-
ciação dos trabalhadores são antitéticas (10).
57
Como escreveu Danilo Guerrieri :
«O sindicato é a semente e a categoria é o fruto da semente; portanto,
a categoria não é mais que a projecção da «organização sindical no espaço
e no tempo». No espaço, porque também lá onde a organização sindical
não chega, aí, não obstante, está a categoria, automaticamente constituída
pelos portadores de interesses análogos àqueles que o sindicato tutela. No
tempo, porque a categoria não é constituída apenas pelos presentes mas
também pelos futuros, por aqueles que a ela pertencerão no futuro.
Deste modo, a categoria repete as carecterísticas do sindicato e não
é mais que a organização expandida.
O sindicato é a categoria (ou melhor, a parte da categoria) organizada;
os não associados são a parte da categoria não organizada; a categoria, enfim,
é a síntese dos interesses dos organizados e dos não organizados».
A categoria é, portanto, uma entidade necessariamente coexistente
com o sindicato (12).
58
Começam eles por ser disciplinados e tutelados directamente pelos seus
próprios portadores, que, para o efeito, elaboram os necessários meios
técnicos (14).
Efectivamente, a vida real da época do individualismo liberal revela-
-nos a existência de mercados de trabalho onde o trabalhador ocupa uma
posição de inferioridade económica, que o constrange a aceitar, ao negociar
individualmente, condições unilateralmente impostas pelo dador de trabalho.
Os trabalhadores sentiram, por isso, a necessidade de disciplinar o mercado
de trabalho, a fim de porem termo à desastrosa concorrência que recipro-
camente se faziam. Em resposta a essa necessidade e com esse objectivo, os
trabalhadores unem-se, criando associações de classe e, posteriormente,
passam, como grupo organizado, a desenvolver uma acção colectiva, que se
exprime, nomeadamente, pelo exercício da greve e da contratação
colectiva (15).
Assim, a associação sindical é um meio técnico que os indivíduos
adoptam para disciplinarem e tutelarem directamente os interesses colectivos
de que são portadores.
Numa primeira fase, a consciência do interesse colectivo, que implica
um fim comum, determina os seus portadores à organização da colectividade
de categoria. Ora, organização implica ordenação, isto é, a existência de
normas, que disciplinem a cooperação consciente, preceituando o compor-
tamento recíproco e perante terceiros, e a formação de uma autoridade, que
(14) Como, aliás acontece com quaisquer interesses humanos. Sucede até
que a. Ordem Jurídica estatal só reconhece ta incorpora os -meios técnicos que os
particulares espontaneamente elaboram, depois de desenvolvidos e experimen-
tados pela prática (cfr. BETTI — Teqria Geral do Negócio Jurídico, vol. I,
pgs. 87 e seg.).
(15) E profunda a relação entre as condições do mercado de trabalho e o
âmbito da associação sindical: no início da revolução industriai, à rigidez da
oferta da mão de obra — derivada da especialização exigida pelo baixo nível de
mecanização e da pouca mobilidade territorial resultante da carência dos medos
de comunicação — corresponde um sindicato de empresas ou, quando muito,
concelhio (bourses de travail); à medida que se alarga o mercado de trabalho,
com a dispensa da especialização, na sequência do desenvolvimento! tecnológico
e da mobilidade das massas, e com o fenómeno das multinacionais, o sindicato
tende a ganhar maior amplitude territorial (regional, nacional, internacional).
Não espanta que, no início do século XX, se tenham constituído os Secre-
tariados Profissionais Internacionais; depois, em 1913, a Federação Sindical
Internacional; em 1919, a Confederação Internacional dos Sindicatos Cristãos
(hoje, Confederação Mundial do Trabalho); em 1920, a Internacional Sindical
Vermelha; em 1945, a Federação Sindical Mundial; e em 1949, a Confederação
Internacional dos Sindicatos Lavres.
Por seu lado, as multinacionais contribuem especificamente para uma
organização supranacional no âmbito dos ramos da produção e das empresas,
como sucede com o Conselho Sindical Mundial das Empresas Michelin.
Cfr. SUPPIEJ — Funzione dei Contnatto Collettivo, In Nuovo Trattato
di Diritto dei Liavoro, da R. Sanseverino e G. Mazzoni, vol. I, pg. 211.
J. M. VERDIER — Syndicats, pgs. 83 e segs.
59
articule e garanta a observância das mesmas normas. Portanto, o interesse
colectivo, que constitui fundamento, pressuposto e princípio organizatório
do sindicato, condiciona e determina a sua organização normativa e a criação,
no seu seio, de um poder social claramente definido.
A organização normativa sindical, emergente da vontade colectiva,
traduz-se num sistema de normas diciplinadoras das relações entre os asso-
ciados e entre eles e a colectividade, definindo, particularmente, as acções
e os comportamentos que devem ser observados por todos e por cada um
com vista à prossecução do interesse colectivo. O ordenamento sindical
disciplina relações que surgem unicamente dentro da colectividade de cate-
goria. Ele dirige-se exclusivamente aos associados, se bem que contendo já
normas, particularmente cláusulas-tipo unilaterais, que regulam relações
entre associados e terceiros. O ordenamento estabelece a disciplina do cartel
interno de trabalho, pressuposto do papel de cartel externo de trabalho que
o sindicato irá assumir. A «tarif» será, então, obrigação solidária dos ope-
rários de não aceitarem condições de trabalho diversas daquelas que o pró-
prio grupo fixou. Trata-se ainda de um regulamento unilateral, que os ter-
ceiros, particularmente os dadores de trabalho, só reconhecem na medida
em que se subordinem, de facto, ao poder da colectividade, aceitando as
condições de trabalho preceituadas pelo respectivo regulamento.
Assim, pelo facto de o sindicato se constituir — e para isso se cons-
titui — os seus associados ficam sujeitos a uma regulamentação que reconhe-
cem como determinante, aceitando, por isso, a sua pretensão de vigência.
Também essa ordem de convivência humana propõe a cada sócio — como
qualquer Ordem Jurídica propõe aos seus sujeitos — «uma directiva para
com os outros, mas também o confirma na sua confiança no comportamento
dos outros; não o constitui apenas em obrigação, também o legitima e auto-
riza» (16) (17).
60
Depois, com a expansão do movimento associativo e o aparecimento
de associações de dadores de trabalho, como forma de contrabalançar o
poder sindical operário, cria-se uma autêntica comunidade intersindical
assente no recíproco reconhecimento ou, mais rigorosamente, no «reconhe-
cimento de poder» que as associações de classe mutuamente se fazem (18).
Os sujeitos da comunidade intersindical, reconhecendo-se reciproca-
mente, concedem ao acordo comum natureza de fonte do regulamento
colectivo, que se propõem substituir ao esquema individualista das relações
de trabalho. Por esta forma os interessados supriam as deficiências do orde-
namento estatal, dominado pela ideia de igualdade e de perfeita homoge-
neidade das partes do contrato de trabalho, preocupado com o átomo e
ignorando a molécula, e desconhecendo a conflitualidade permanente, a
situação de conflito de interesses sistemático e institucional, que passou a
caracterizar o mundo das relações de trabalho.
A organização normativa da comunidade intersindical passa a ter a
sua fonte no contrato colectivo, «pequena lei internacional» ou lei do fede-
ralismo económico (doppelstándige Bundesrepublik), que as associações
contrapostas constituem (19).
61
4. Os ordenamentos sindicais, primeiro, e intersindical, depois,
surgiram como ordenamentos originários e autógenos.
Com efeito, trata-se de ordenamentos que se formaram espontanea-
mente e eram independentes, pois não procuravam o título da sua existência
noutro ordenamento e nomeadamente no ordenamento estatal. Tanto assim
que os ordenamentos sindicais e intersindicais começam por ser ilícitos
perante o ordenamento estatal.
A organização normativa das comunidades sindicais e intersindicais
assentava em poderes sociais, que, então, os poderes soberanos da socie-
dade geral não reconheciam. Existindo e funcionando os regulamentos sin-
dicais e os contratos colectivos antes de o direito estatal os reconhecer como
lícitos, eles impunham-se como factos objectivamente normativos, sendo
certo, aliás, que desempenhavam, na prática, relativamente aos membros
da respectiva comunidade, o papel que a legislação tem no seio do Estado.
62
Regulamentos sindicais e contratos colectivos eram, assim, fontes de normas
já vigentes, só que ainda não vigentes para o (e no) ordenamento estatal.
No âmbito dos ordenamentos particulares intersindicais, como dizia
Giugni, contrato e obrigação requalificam-se sob a luz peculiar de instru-
mentos organizatórios do poder social paritário das associações sindicais (20).
E, sendo fortes e obstinadas as associações de classe para se subme-
terem real e efectivamente à lei do Estado (21), este por um lado, reconhe-
63
cendo a função dos ordenamentos sindicais e intersindicais (22), e, por outro
lado, para assegurar a unidade e prevalência do seu próprio ordenamento
e para adequar a realidde jurídica à realidade social (já jurídica, mas não
para o ordenamento estatal), atribui aos sindicatos poderes de autonomia (23).
Assim se assegura o equilíbrio dos diversos ordenamentos : cada orde-
namento autónomo, criado no exercício do poder autonómico, torna-se fenó-
meno derivado do ordenamento estatal (24).
Mas a salvaguarda da unidade e da prevalência do ordenamento estatal
impõe a definição dos limites e dos efeitos dos ordenamentos sindicais e
intersindicais e da competência dos respectivos órgãos. E, por isso, a obser-
vância dos limites e da competência constitui condição de eficácia constitu-
tiva das normas sindicais e intersindicais perante o ordenamento estatal (25).
64
5. Ora, a definição dos limites e dos efeitos dos ordenamentos inter-
sindicais suscita ao ordenamento estatal nomeadamente os problemas dos
limites das convenções colectivas e da colisão entre convenções colectivas,
sendo aquele o problema principal e este o problema subordinado (26).
Do mesmo modo que para as normas e as relações jurídicas, também
a propósito das convenções colectivas e das relações de trabalho se podem
formular as interrogações de Savigny : A respeito das convenções colectivas,
pergunta-se : sobre que relações de trabalho devem elas imperar ? A respeito
das relações de trabalho : a que convenções colectivas estão elas submetidas,
ou de que convenções colectivas dependem? As questões relativas aos
limites do império das convenções colectivas ou da dependência das relações
tivo; mas da necessidade da existência do sujeito não deriva que um ente dotado
de personalidade jurídica possa exercer as funções atribuídas pelo ordenamento
autónomo.
Finalmente...: para a promoção da autonomia normativa como descen-
tralização da função legislativa, o Estado deve individualizar os sujeitos aos quais
atribui o poder de se autoregulamientarem com eficácia constitutiva do orde-
namento geral».
Cfr. BRUNO BALLETTI — Op. Cit. pgs. 47 e 48.
(26) O problema ganha maior acuidade por nem todas as associações
sindicais se encontrarem unidas por vínculos orgânicos e hierárquicos, (inte-
grando uma só organização unitária. Por isso, surgem vários ordenamentos par-
ciais, situados ao mesmo nível, que se torna necessário delimitar e coordenar,
formando um sistema unitário.
Com efeito, «dois complexos de normas também podem, porém, formar
um sitema de normas unitárias tal que os dois ordenamentos surjam como situa-
dos ao mesmo nível, quer dizer, delimitados, nos respectivos domínios de vali-
dade, um em face do outro.
Isso pressupõe, porém, um terceiro ordenamento, de grau superior, que
determine a criação dos outros dois, os delimite reciprocamente nas respectivas
esfieras de validade e, assim, os coordene.
A determinação do domínio de validade é — como resulta do anteriormente
dito — a determinação de um elemento de conteúdo do ordenamento inferior
pelo ordenamento superior. A determinação do processo de produção pode f azer-se
directa ou indirectamente, conforme a norma superior determina o próprio pro-
cesso no qual a inferior é produzida, ou se limite a instituir uma instância que,
desta forma, é autorizada a produzir, como bem entenda, norlmas com validade
para um determinado domínio. Em tal caso fala-se de delegação, e a unidade
em que o ordenamento superior está ligado com o ordenamento inferior tem o
carácter de uma conexão delegatória. Daí mesmo já resulta que a relação do
ordenamento superior com os vários ordenamentos inferiores em que aquele
delega tem de ser, simultaneamente, a relação de um ordenamento total com
os ordenamentos parciais por1 ele abrangidos. Com efeito, como a norma que é
fundamento de validade do ordenamento inferior forma parte integrante do
ordenamento superior, pode aquele, enquanto ordenamento parcial, ser pensado
como contido neste, enquanto ordenamento total. A norma fundamental do orde-
namento superior — como escalão máximo do ordenamento global — representa
o último fundamento de validade de todas as normas — mesmo das dos ordena-
mentos inferiores». (Cfr. KELSEN — Teoria Pura do Direito, pgs. 442 e 443).
65
de trabalho e aos conflitos de fronteira ou colisões, que aí, a propósito
desses limites, se levantam, são pela sua própria natureza, questões derivadas
e subordinadas (27).
Há, assim, que distinguir entre o problema do âmbito de aplicação
das convenções colectivas consideradas isoladamente e o problema dos con-
flitos de convenções colectivas de trabalho. O princípio que fixa o âmbito
de aplicação de cada convenção colectiva constitui a regra de conflitos
primária ou básica. Por seu lado, o problema da colisão ou concorrência
de convenções colectivas pressupõe que o âmbito de aplicação de cada
convenção colectiva pode abranger relações de trabalho que simultaneamente
se integrem no âmbito de aplicação de outra ou outras convenções colectivas
e que estas devem aplicar-se dentro de certos limites, estes de segunda
ordem (28).
Ora, o âmbito de aplicação das convenções colectivas é fixado pelas
próprias partes, dentro dos limites do círculo de sujeição à convenção
colectiva — definido por lei — , o qual elas podem reduzir, mas nunca
ampliar. O legislador português limitou o círculo de sujeição à convenção
colectiva aos seus outorgantes e aos associados das associações signatárias.
O âmbito de aplicação da convenção colectiva é definido pela demarcação
prévia das entidades patronais abrangidas. Por seu lado, os trabalhadores
abrangidos pela convenção colectiva de trabalho são os que, trabalhando
para entidades patronais sujeitas à convenção colectiva, exerçam actividade
correspondente a categoria profissional nela prevista e estejam inscritos na
associação sindical outorgante (29.)
Podemos definir a regra básica em matéria de aplicação de convenções
colectivas pela forma seguinte :
1.°—Qualquer convenção colectiva é inaplicável às relações de tra-
balho que com ela não tenham a devida conexão, por não se incluírem ambas
as suas partes no círculo de sujeição e no âmbito de aplicação respectivos;
2. — Qualquer convenção colectiva é aplicável a todas e quaisquer
relações de trabalho cujos sujeitos apenas estejam integrados no círculo
de sujeição e no âmbito de aplicação respectivos;
3.° — Qualquer convenção colectiva é potencialmente aplicável a
todas e quaisquer relações de trabalho cujos sujeitos se integrem nos seus
círculo de sujeição e âmbito de aplicação.
66
6. Os princípios que integram a regra de conflitos primária ou básica
em matéria de aplicação de convenções colectivas permitem distinguir hipó-
teses de concorrência de outras realidades.
De facto, não haverá concorrência sempre que uma das partes de
uma relação de trabalho se integrar apenas no círculo de sujeição e no
âmbito de aplicação de uma das convenções em presença: faltará, então, o
pressuposto da pluralidade de convenções colectivas aplicáveis.
Assim, se dois sindicatos diversos representarem a mesma categoria
profissional e ambos celebrarem convenções colectivas com a mesma asso-
ciação patronal, não estaremos perante uma hipótese de concorrência: cada
convenção será aplicável apenas aos respectivos associados do sindicato
que a celebrou, sendo indiferente que seja comum a associação patronal
signatária de ambas as convenções (30).
Também não estaremos perante hipótese de concorrência se um dador
de trabalho, exercendo diversas actividades económicas independentes e
encontrando-se inscrito nas associações patronais representativas dessas
actividades, tiver afectado a cada ramo de actividade o seu quadro de tra-
balhadores exclusivo : aqui, é indiferente que, eventualmente, seja comum
a associação sindical signatária das diversas convenções, pois cada uma será
aplicável apenas aos trabalhdores sindicalizados afectos exclusivamente à
actividade económica representada pela respectiva associação patronal
outorgante (31) (32).
67
7. Sempre que a uma mesma relação de trabalho forem potencial-
mente aplicáveis várias convenções colectivas, estaremos perante uma hipó-
tese de concorrência de convenções colectivas. Estando a mesma relação de
trabalho submetida potencialmente a várias convenções colectivas, há que
definir a respectiva disciplina.
Sobre o problema existem duas correntes fundamentais: o sistema da
unidade e o sistema do cúmulo.
Para o sistema da unidade aplicar-se-á apenas uma das convenções
colectivas de trabalho em presença (33); para o sistema do cúmulo admite-se
a aplicação das várias convenções em presença, combinando-se, em cada
caso concreto, as cláusulas de uma e da outra ou outras (34).
Contra o sistema do cúmulo tem-se invocado a incindibilidade da
convenção, atenta a sua origem pactícia, a eventual impossibilidade de
harmonização de cláusulas contrastantes integradas nas convenções concor-
rentes e a incerteza da disciplina da relação de trabalho.
A convenção tem origem pactícia. Através da negociação colectiva,
as associações de classe pretendem chegar a um acordo, desejando cada um
dos lados que este lhes seja o mais favorável possível. Assim, o conteúdo
de cada convenção exprime o equilíbrio que, no momento da celebração,
resulta da tensão de forças existente entre as associações de classe outor-
gantes. Trata-se do equilíbrio que emerge das pressões exercidas por cada
associação de classe em grau de intensidade doseado, por forma a alcançar
as vantagens possíveis no âmbito do diálogo (35). Por outra forma, «uma
convenção colectiva é um acordo global sobre condições de trabalho que
traduz um equilíbrio temporário entre o que se dá e o que se pede» (36).
Ora, a aplicação cumulativa de várias convenções colectivas a uma
trabalho cair, por ambos os sujeitos, no círculo de sujeição e no âmbito die apli-
cação de várias convenções colectivas, é evidente não existir essa hipótese entre
convenções que se sucedem no tempo (Cfr. Hueck-Nipperdey — Op. Cit. pg\ 368).
Por outro lado, nos casos de contratação articulada ou integrada — nos
quais o contrato colectivo nacional, a nível de federação1 ou confederação, regula
aspectos gerais, sujeitos a disciplina ulterior mais pormenorizada e descentra-
lizada, através de contratos a nível local e de empresas, que terão por conteúdo
matérias deixadas em branco pelos contratos de nível superior — também não
existirá concorrência de convenções. Trata-se de convenções coligadas tieleologi-
oamente e de aplicação cumulativa (Cfr. Huieck-Niperdey— Op. e loc. citados;
GHIDINI— Diritto dei Davoro, pgs. 97 e segs.).
(33) E: este o sistema da doutrina germânica (Cfr. Hueck-Nipperdey —
Op. Cit. pg. 368).
(34) Ê este o sistema francês. (Cfr. Despax — Op. Cit. pgs. 304 e segs.).
(35) JOSÉ MARIA M AR A VALL — La Ambigiiedad de los Convénios
Colectivos, in Trabajo y Conflicto Social, pg.148.
(36) JOÃO CAUPERS e PEDRO MAGALHÃES — Relações Colectivas
de Trabalho, pg. 61.
No mesmo sentido, A. L. MONTEIRO FERNANDES — Op. Cit., vol. 2,
pg. 132.
68
única relação de trabalho viria quebrar o equilíbrio atingido pela negociação
e que se cristalizou na convenção colectiva. A soma das disposições efecti-
vamente aplicadas na sequência do cúmulo das várias convenções colectivas
concorrentes não obteve o acordo — e ignora-se se teria obtido — das asso-
ciações de classe outorgantes, traindo-se, por isso, a confiança de um dos
lados signatários (37).
Por outro lado — invoca-se ainda — , seria difícil ou impossível
harmonizar cláusulas sobre a mesma matéria quando todas ou qualquer delas
tivessem efeito imperativo absoluto e entre elas existisse contradição
absoluta (38).
Finalmente, o sistema do cúmulo é de aplicação mais complexa e con-
duz a uma incerteza permanente quanto à disciplina jurídica da relação de
trabalho, particularmente quando, como em França, a opção por uma das
convenções, a aplicar a um litígio concreto, não é irrevogável e permite que,
em futuro litígio sobre matéria diferente, se pretenda ver aplicada a conven-
ção colectiva anteriormente afastada (39).
Semelhantes críticas levam a doutrina portuguesa e alemã ocidental
a aderir à teoria da unidade (40), que, aliás, o legislador português também
consagra.
69
número de trabalhadores, ora a que correspondesse ao mais elevado chiffre
d'affaires, ora a que utilizasse mais bens de equipamento ou de matéria
prima, ora a que resultasse da combinação de alguns ou de todos esses
factores. Esta controvérsia traduzia-se em incerteza quanto à disciplina das
relações de trabalho, particularmente em casos de fronteira (41).
Presentemente, o direito positivo português acolhe critério complexo
para determinação da convenção colectiva aplicável em caso de concorrência.
A solução do problema resulta dos seguintes princípios :
a) Segundo o princípio da especialidade, sempre que uma das con-
venções concorrentes seja um acordo colectivo ou um acordo de empresa,
será este o aplicável (ai. a) do n.° 2 do art.° 14.° do Decreto-lei 519-C1/79,
de 29 de Dezembro);
b) Segundo o princípio da maior favorabilidade, será aplicável a con-
venção que se considerar, no seu conjunto, mais favorável aos trabalhadores
relativamente aos quais se verificar a concorrência (ai. b) do n.° 2 do art.° 14.°
citado);
c) Segundo o princípio da posterioridade — a aplicar supletivamente,
na falta de determinação da convenção mais favorável — , será aplicável
a convenção de publicação mais recente (n.° 4 do citado art.0 14.°).
E como se determina qual das convenções concorrentes deve consi-
derar-se mais favorável?
A determinação é confiada, em primeiro lugar, ao sindicato repre-
sentativo do maior número de trabalhadores em relação aos quais se verifica
a concorrência e, em segundo lugar e na falta de escolha sindical, directa-
mente aos trabalhadores da empresa interessados (ai. b) do n.° 2 e n.° 4 do
citado art.° 14.°). De notar que a opção é feita relativamente a cada empresa
abrangida pelas convenções concorrentes, pertencendo essa faculdade, no
âmbito de cada empresa, ao sindicato que, aí, representar maior número
de trabalhadores abrangidos. Assim, a faculdade de opção da convenção
aplicável não pertence a um único sindicato — aquele que, no âmbito de
aplicação global da convenção colectiva, representar o maior número de
trabalhadores em relação aos quais se verifica a concorrência — , mas a
tantos sindicatos quantos os que, em cada empresa a que as convenções
concorrentes forem potencialmente aplicáveis — um por empresa — , repre-
sentarem o maior número de trabalhadores sujeitos às convenções concor-
rentes. Isto resulta da previsão da hipótese de concorrência (n.° 2 do art.° 14.°:
«sempre que numa empresa se verifique concorrência de instrumentos de
regulamentação colectiva aplicáveis a alguns trabalhadores / . . . / » ) e é refor-
çado quando a faculdade de opção, em caso de não uso pelo sindicato, é
(41) Podemos imaginar uma empresa com uma tríplice actividade, das
quais uma ocupasse o maior número de trabalhadores, outra utilizasse maior
volume de bens de equipamento e de matéria prima e a outra correspondesse
o mais elevado chiffre d'affaires.
70
deferida «aos trabalhadores da empresa em relação aos quais se verifique
concorrência» (n.° 4 do art.0 14.°). Assim, o problema da concorrência de
convenções colectivas e a sua solução devem ser analisados e resolvidos pelos
sindicatos e pelos trabalhadores interessados sempre ao nível de cada em-
presa abrangida e não ao nível de todas as empresas onde a concorrência
possa surgir, ou seja, ao nível de âmbito de aplicação das convenções con-
correntes.
Importa ter presente que a faculdade de escolha da convenção mais
favorável está subordinada a prazos e formalidades. Assim, o Decreto-lei
519-C1/79 prevê dois prazos sucessivos, de trinta dias cada um, durante
os quais deve ser comunicada à entidade patronal e à Inspecção do Trabalho
a escolha da convenção considerada mais favorável. Durante o primeiro
prazo de trinta dias pertence ao sindicato a faculdade de escolha. Na falta
de escolha pelo sindicato, os trabalhadores directamente interessados dis-
porão de novo prazo de trinta dias para escolherem, por maioria, a conven-
ção mais favoável.
Sublinhe-se que a escolha é irrevogável durante o período de vigência
da convenção escolhida (n.° 5 do art.° 14.°), assim se favorecendo a certeza
e a estabilidade da disciplina jurídica da relação de trabalho.
8.1 E será lícito, por meio de cláusulas específicas, preceituar-se a
autolimitação ou a prevalência da convenção colectiva relativamente a outras
com as quais pudesse concorrer para a definição da disciplina de concretas
relações de trabalho?
A admitirem-se semelhantes cláusulas, as partes deveriam ser estimu-
ladas a convencioná-las, pois assim se resolveria o problema da concorrência
de convenções colectivas, com a vantagem de a solução encontrada provir
de mais partes interessadas e de ser do respectivo conhecimento a convenção
aplicável antes mesmo da entrada em vigor da última convenção publicada.
Na Alemanha Ocidental admite-se que as partes autolimitem o âm-
bito de aplicação da convenção, excluindo dele as relações de trabalho su-
jeitas a outra convenção colectiva (cláusulas de autolimitação), mas já não
que se convencione a sua prevalência sobre outra ou outras, determinadas
ou não (42).
Em França é lícito às partes excluir a aplicação de uma das conven-
ções colectivas potencialmente aplicáveis (43).
Perante o direito vigente português, devem admitir-se como lícitas
tanto as cláusulas de autolimitação com as de prevalência, mas apenas
quanto a convenções correntes e no estrito âmbito do problema da concor-
71
rência (44). Isto porque, se é lícito apenas a um sindicato em cada empresa
— o que nela representar o maior número de trabalhadores em relação aos
quais se verifica a concorrência — escolher a convenção aplicável de entre
as concorrentes, por maioria de razão se deve ter por lícita a cláusula que
consagre a escolha feita por todos os sindicatos outorgantes e com o acordo
das associações patronais signatárias da convenção em que essa cláusula
se incluir.
9. Assim,
EM CONCLUSÃO
72
e da colisão entre convenções é aspecto da definição dos limites e dos efeitos
dos ordenamentos intersindicais, como ordenamentos parciais, pelo orde
namento estatal, enquanto ordenamento geral;
10. São distintos, embora conexos, o problema do âmbito de aplica
ção das convenções colectivas consideradas isoladamente e o problema da
colisão ou concorrência de convenções : aquele é o problema principal, este
é a questão derivada e subordinada;
11. A regra de conflitos primária ou básica quanto à aplicação de
convenções colectivas de trabalho comporta os seguintes princípios:
a) Qualquer convenção colectiva é inaplicável às relações de tra
balho que com ela não tenham a devida conexão, por não se incluírem
ambas as suas partes no círculo de sujeição e no âmbito de aplicação
respectivos;
b) Qualquer convenção colectiva é aplicável a todas as relações de
trabalho cujos sujeitos apenas se integrem no círculo de sujeição e no âmbito
de aplicação respectivos;
c) Qualquer convenção colectiva é potencialmente aplicável a todas
e quaisquer relações de trabalho cujos sujeitos se integrem nos seus círculo
de sujeição e âmbito de aplicação;
12. Não há concorrência de convenções colectivas se um dos sujeitos
de uma relação de trabalho se integrar apenas no círculo de sujeição e no
âmbito de aplicação de uma das convenções em presença: faltará, então, o
pressuposto da pluralidade de convenções colectivas aplicáveis;
13. Em caso de concorrência, a relação de trabalho deverá ser disci
plinada apenas por uma das convenções colectivas potencialmente aplicáveis;
14. O direito positivo português determina a convenção colectiva
aplicável, nos termos dos seguintes princípios :
a) Segundo o princípio da especialidade, um acordo colectivo ou um
acordo de empresa, como lei especial, prevalece sobre qualquer outra con
venção colectiva, como lei geral;
b) Segundo o princípio da maior favorabilidade, deve aplicarse a
convenção que, no seu conjunto, se considere mais favorável aos trabalha
dores relativamente aos quais se verifica a concorrência;
c) Segundo o princípio da posterioridade — a aplicar supletivamente,
na falta de determinação da convenção mais favorável —■ será aplicável a
convenção de publicação mais recente;
15. Em cada empresa, a escolha da convenção colectiva mais favo
rável pertence ao sindicato que, nela, represente maior número de traba
lhadores em relação aos quais se verifica a concorrência;
16. O sindicato a quem pertencer a escolha deverá comunicála à
entidade patronal e à Inspecção do Trabalho, no prazo de trinta dias a
contar da entrada em vigor da última das convenções concorrentes;
75
17. Se a escolha não for efectuada pelo respectivo sindicato, poderá
ela ainda ser feita, no prazo de trinta dias, pela maioria dos trabalhadores
da empresa em relação aos quais se verifica a concorrência;
18. Só na falta de escolha se torna aplicável a convenção de publi-
cação mais recente;
19. Devem admitir-se como lícitas cláusulas de autolimitação ou de
prevalência, insertas em convenções colectivas, mas apenas com efeitos
relativamente a convenções concorrentes e no estrito âmbito do problema
da concorrência.
74
A Gestão e os Processos Markovianos
Exemplo de um Problema
Markoviano Estacionário
Joaquim José da Cunha
1 _ CONSIDERAÇÕES GERAIS
Em administração de empresas quer públicas, quer privadas, estamos
longe dum conhecimento que nos permita, face a um caso, tomar uma reso-
lução previamente determinada ou compendiada.
Assim sendo, e porque a grande maioria dos problemas são do domí-
nio dos fenómenos aleatórios, a função administrativa torna-se assaz delicada.
As grandes empresas poderão ter contabilistas, economistas, gestores empre-
sariais, em convergência de esforços.
As pequenas empresas, verdadeiras fontes de emprego, terão no seu
contabilista um pouco de tudo isto; razão pela qual, o contabilista, hoje mais
que nunca, deve além da contabilidade possuir igualmente conhecimentos
nos domínios do Direito, Ciências Sociais, Estatística.
A contabilidade fornece hoje exaustivamente e com precisão a situação
líquida da empresa, bem como a evolução no passado. Classificar e fazer
a síntese destes fenómenos, eis o que se exige ao gestor de hoje. Se à conta-
bilidade compete a árdua missão de fornecer dados que por indução permitam
o estabelecimento de leis que explicando um passado recente, ajudem a
formular uma continuidade que assegure um futuro sem grandes degraus,
compete igualmente ao gestor contabilista estar munido de conhecimentos
profundos dos assuntos estatísticos, para poder desempenhar cabalmente a
missão que empresa dele vai exigir.
O objectivo deste trabalho, embora modesto, é sensibilizar o conta-
bilista ou gestor, para a necessidade de este ter em arquivo determinados
estudos que amanhã lhe hão-de permitir a tomada em consciência, de posi-
ções com uma margem mínima de risco.
75
CADEIAS DE MARKOV — CONSIDERAÇÕES GENÉRICAS A
USAR NA RESOLUÇÃO ANALÍTICA DE UM PROBLEMA
ESTACIONÁRIO DA CADEIA DE MARKOV.
/ café, cinema
\
O acontecimento de cada dia fica dependente do que aconteceu no
dia anterior.
P [ X ( o ) < x] = P(o,x)
76
Pelas distribuições condicionadas
A um processo em que :
• Cada resultado pertence sempre ao conjunto espaço dos estados.
• Um acontecimento é sempre e apenas dependente do acontecimento
imediatamente anterior e nunca de outros acontecimentos, chamamos
cadeia de Markov.
P
1 1 12 "Pln
P _ P
21 22 ■ - 2 n
P =
nl
P
n2 " P nn
77
• A matriz P diz-se regular, se e apenas se, sao positivos todos os ele-
mentos de alguma potência P.
TEOREMA :
3.1. — Problema
Uma empresa de pesca, para descarga dos seus barcos tem em perma-
nência um camião. Este camião assegura três viagens por dia. A descarga
devidamente observada conduziu à seguinte lei de probabilidade :
• Estado Ao
78
viagens de atraso, sendo A, A 2 A 3 respectivamente os estados com 1, 2, 3
viagens em atraso, o camião no dia seguinte assegura 3 viagens e o esquema
de probabilidade é o seguinte :
• Estado AT
• Estado A2
79
• Estado A3
_Ao A! A2 A3_
1 i I l1
0,5 0,4 0,1 0 - A0
80
produto que nos leva ao sistema de equações :
0,5 to + 0,5 t2 = t„
t0 = 0,25
t, = 0,45
t2 = 0,25
= 0,05
Esta solução, nos termos atrás expostos, permite concluir que a polí-
tica seguida, se traduzirá ao fim de um dia em :
81
Balanço da política encetada
U 1,1
0,10 X 5 + 0,40 X 4 + 0,50 X 3 3,6
= 30 %
3.2.2. Estudo de uma nova política
82
solução que leva a concluir :
_ 31 + 14
X =
100
= 0,45
E daqui :
0,45
= 12,5 %
3,6
4 — CONCLUSÕES
BIBLIOGRAFIA
83
INDICE :