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www.revistasamizdat.com
23
dezembro
2009
ano II
ficina
Unamuno
Melodrama e Metalinguagem
SAMIZDAT 23
dezembro de 2009
Edição de Imagens:
Mais um final de ano se aproxima e a Revista SAMIZDAT
Volmar Camargo Junior
está prestes a completar seu segundo ano de existência.
Henry Alfred Bugalho
Geralmente, este é um período de reflexão e balanço: o
Revisão Geral
que queremos para nosso futuro? Quais serão nossos próxi-
Léo Borges mos projetos? O que gostaríamos de fazer que não consegui-
mos no ano que passou?
Assessoria de Imprensa A própria SAMIZDAT foi resultado de uma reflexão se-
Mariana Valle melhante, e a cada ano que se passa, ela se torna mais diver-
sificada. Posso dizer até que esta é uma das nossas metas:
Autores ser o espelho da boa literatura que poucos conhecem, reunir
Barbara Duffles num único espaço os grandes talentos dispersos pelos vários
Caio Rudá países falantes de português. Sinto que, no limite das nossas
Carlos Davissara possibilidades, estamos cumprindo esta missão.
Dênis Moura Nós, da Revista SAMIZDAT, desejamos a todos nossos
Giselle Natsu Sato leitores um Feliz Natal e um Ano-Novo repleto de conquistas
Guilherme Rodrigues e sucesso.
Henry Alfred Bugalho
Joaquim Bispo Henry Alfred Bugalho
José Guilherme Vereza
Jú Blasina
Léo Borges
Mariana Valle
Maristela Scheuer Deves
Volmar Camargo Junior
Wellington Souza
ENTREVISTA
Danilo Corci fala sobre a Mojo Books 8
As Devotas 14
Cruz e Souza
CONTOS
Um Táxi da Chuva 16
Caio Rudá
Um muro de intransigência 18
Joaquim Bispo
Marca a página 21
Wellington Souza
Morte & Espelhos 24
Ju Blasina
Noite de Chuva 40
Mariana Valle
TRADUÇÃO
E faz de conta... 50
Miguel de Unamuno
TEORIA LITERÁRIA
Física como matéria-prima para o suspense 56
Maristela Scheuer Deves
RECOMENDAÇÃO DE LEITURA
Morte e a Morte de Quincas Berro DÁGUA 58
Carlos Davissara
Crepúsculo 60
Giselle Sato
CRÔNICA
Um vestido rosa, tabu e um fenômeno de
intolerância coletiva 64
Henry Alfred Bugalho
Eu também quero o meu Septilhão 68
Volmar Camargo Junior
POESIA
Iminente (poema blavino) 70
Carlos Davissara
Desejo e castidade 71
Wellington Souza
Laboratório Poético: indrisos 72
Volmar Camargo Junior
Poesia: Contra o Muro 74
Ju Blasina
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Por que Samizdat?
“Eu mesmo crio, edito, censuro, publico,
distribuo e posso ser preso por causa disto”
Vladimir Bukovsky
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E por que Samizdat? revistas, jornais - onde ele des tiragens que substituam
possa divulgar seu trabalho. o prazer de ouvir o respal-
O único aspecto que conta é do de leitores sinceros, que
A indústria cultural - e o
o prazer que a obra causa no não estão atrás de grandes
mercado literário faz parte
leitor. autores populares, que não
dela - também realiza um
perseguem ansiosos os 10
processo de exclusão, base- Enquanto que este é um mais vendidos.
ado no que se julga não ter trabalho difícil, por outro
valor mercadológico. Inex- lado, concede ao criador uma Os autores que compõem
plicavelmente, estabeleceu-se liberdade e uma autonomia este projeto não fazem parte
que contos, poemas, autores total: ele é dono de sua pala- de nenhum movimento
desconhecidos não podem vra, é o responsável pelo que literário organizado, não
ser comercializados, que não diz, o culpado por seus erros, são modernistas, pós-
vale a pena investir neles, é quem recebe os louros por modernistas, vanguardistas
pois os gastos seriam maio- seus acertos. ou q ualquer outra definição
res do que o lucro. que vise rotular e definir a
E, com a internet, os au- orientação dum grupo. São
A indústria deseja o pro- tores possuem acesso direto apenas escritores interessados
duto pronto e com consumi- e imediato a seus leitores. A em trocar experiências e
dores. Não basta qualidade, repercussão do que escreve sofisticarem suas escritas. A
não basta competência; se (quando há) surge em ques- qualidade deles não é uma
houver quem compre, mes- tão de minutos. orientação de estilo, mas sim
mo o lixo possui prioridades
a heterogeneidade.
na hora de ser absorvido A serem obrigados a
pelo mercado. burlar a indústria cultural, Enfim, “Samizdat” porque a
os autores conquistaram algo internet é um meio de auto-
E a autopublicação, como que jamais conseguiriam de publicação, mas “Samizdat”
em qualquer regime exclu- outro modo, o contato qua- porque também é um modo
dente, torna-se a via para se pessoal com os leitores, de contornar um processo
produtores culturais atingi- od iálogo capaz de tornar a de exclusão e de atingir o
rem o público. obra melhor, a rede de conta- objetivo fundamental da
tos que, se não é tão influen- escrita: ser lido por alguém.
Este é um processo soli-
te quanto a da grande mídia,
tário e gradativo. O autor
faz do leitor um colaborador,
precisa conquistar leitor a
um co-autor da obra que lê.
leitor. Não há grandes apa-
Não há sucesso, não há gran-
ratos midiáticos - como TV,
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Entrevista
Mojo Books
Danilo Corci
É jornalista e começou sua carreira
no Jornal de Jundiaí, rumando de-
pois para a Folha de S.Paulo. Criou
a revista cultural Speculum ao lado
de Renato Roschel. Também criou e
dirigiu a redação do portal BrTurbo,
da Brasil Telecom. Em 2007 fez sua
primeira incursão literária com a
http://farm1.static.flickr.com/135/402660235_e0b6baa65c.jpg
novela Black celebration, publicada
pela editora Mojo Books. Em março
de 2008 lançou sua segunda aven-
tura literária, agora um microconto,
Sympathy for the devil, também lan-
çado pela Mojo Books. Atualmente
é redator da agência publicitária
JWT. Um dos fundadores da Mojo
Books, ao lado de Ricardo Giassetti.
Mojo Books
A MOJO é uma editora 100%
digital. Sua proposta é simples: Se
SAMIZDAT - Comecemos uma editora. Como estáva-
música fosse literatura, que história
pela pergunta que não mos muito ligado ao mun-
contaria?
pode deixar de ser feita: do digital, a escolha de uma
www.mojobooks.com.br de onde surgiu a ideia de editora digital foi natural.
preparar livros inspirados E, entre tantas conversas,
em álbuns musicais? acabou surgindo a ideia de
Danilo Corci - A ideia vem fazer uma coleção de livros
de uma inspiração anti- inspirados em música e dai
ga. Na década de 90, eu e surgiu a MOJO.
o Ricardo tínhamos uma
banda que fazia justamente SAMIZDAT - Imagino que
o contrário: pegava livros e vocês devam receber inú-
musicava. O tempo passou, meros textos de autores
a banda acabou e nós con- estreantes que gostariam
versávamos sobre montar de publicar com vocês.
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DC - De verdade, não ro pagaria
temos planos de ir para o por algo que
impresso não. Obviamente pode ter de
somos uma editora tentan- graça?
do sobreviver no mercado, DC - O Brasil
então se houver alguma é bem um
oportunidade isso pode ser caso a parte
possível. Mas para a gente neste universo. música, mais quadrinhos,
ir pro impresso só se for Não só pelo poder aquisiti- terminar a migração para
em um esquema bem feito vo menor, mas pela cultura celular e começar a inva-
de print on demand ou de não pagar. O modelo dir outras mídias, como
parceria com alguma outra brasileiro pode comportar o audiovisual. Mas como
editora. algo assim, mas as chances temos um modelo de negó-
dos resultados serem pe- cio novo, vamos com calma
quenos é muito alto. Pelo fazendo as coisas com a
que vejo e tenho aprendido consistência que devem ter.
em quase 3 anos de MOJO
é que o modelo publicitário
A equipe da Revista SAMI-
dende a trazer melhores
ZDAT agradece ao Danilo
resultados.
Corci.
SAMIZDAT - O livro
digital é um formato que
veio para ficar? Podemos
prever o fim do livro im-
presso?
DC - Que veio pra ficar é
óbvio, custa menos, é possí-
vel lançar mais, etc. Se vai
SAMIZDAT - Em 2007, a ser o fim do impresso? Não
banda Radiohead lançou necessariamente. Hoje tem
o álbum “In Rainbows” MP3, CD, mas o vinil ainda
primeiro na internet, sen- existe. A diferença é que as
do que os fãs poderiam editoras provavelmente vão
pagar o quanto quisessem lançar impressos de ‘luxo’,
pelo download. Nos EUA, coisa mais elaborada, edi-
o autor Cory Doctorow ção de colecionador, mais
publica tanto em meio cara, com lucro maior. E o
digital quanto impresso, jogo segue.
sendo que seus livros
podem ser baixados gra- Coordenação da entrevista:
tuitamente na internet. SAMIZDAT - Quais são Henry Alfred Bugalho
Estes dois modelos, ligei- os planos para a MOJO
ramente diferentes, pode- Books no futuro?
riam ser reproduzidos no DC - Temos vários planos.
Brasil, seja na música ou Lançar livros inéditos que
na Literatura? O brasilei- não tenham nada a ver com
http://www.flickr.com/photos/erzs/1357413280/sizes/o/
estudante de música, náuseas dominaram-no, som de sua composição
chamado Wolfgang Ama- o que o fez libertar-se da servia de trilha sonora
deus Mozart. Quando paralisia, caindo de joe- para a fuga, enquanto
soube da maldição, não lhos a largos vômitos. Em ele pensava como, até o
se alarmou, disse apenas meio a engasgos, tosses e momento, aquela música
que gostaria de ouvir o ânsias, ouviu a frase mor- nunca havia lhe parecido
tal concerto fúnebre e de tal: “Termine a música”. tão viva e tão mórbida.
conhecer o seu autor. Foi Confuso, desnorte- Prometeu não mais tocá-
alertado de que a história ado, Mozart tentou se la.
era verdadeira, de que as levantar apoiando-se No dia seguinte, o
pessoas já não queriam no órgão, que sua mão jovem Mozart já não se
mais estudar música, e atravessou como se nada encontrava pela cidade.
ele poderia ser o próxi- ali estivesse. Caiu sobre “Mais um levado pelo
mo, e o dia fatal estava o vômito, começando a Canto da Sereia de Bach”,
se aproximando... Nada recobrar a razão e ten- diziam. Contudo, soube-
disso o espantou. tando afastar-se daquele se na hospedaria que ele
Dia vinte e oito, “Toca- prenúncio da morte. havia partido durante a
ta e Fuga em Ré Menor”, De bruços sobre a terra, madrugada, são e salvo,
tudo como haviam dito, sentiu algo prendendo-o após o sinistro concerto.
e lá estavaHenry
Mozart pelo pé. Não teve cora-
den-Bugalho No cemitério, ao invés do
Alfred
tro do cemitério. Com os gem de olhar para ver o http://www.lostseed.com/extras/free-graphics/images/jesus-pictures/jesus-crucified.jpg
esperado músico morto,
O Rei dos
olhos fechados, deixava-se que era. E novamente a foi encontrada apenas
extasiar com as compo- voz suave suplicou: “Ter- uma inscrição na terra,
sições de Johann Sebas- mine a música”. Fazendo parecida com o trecho de
Judeus
tian Bach, num estado uma desesperada oração alguma partitura. Desde
de euforia sobrenatural. mental, tateou o solo até então, não se noticiou
Subitamente, o som se encontrar uma pedra mais vítimas do “Canto
extinguiu. O jovem des- pontiaguda. Com ela, da Sereia de Bach”.
pertou do transe e dirigiu começou a desenhar no
do www.revistasamizdat.com 11
w
gr nl
át
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is d
Autor em Língua Portuguesa
Ahasverus e o Gênio
Castro Alves
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Autor em Língua Portuguesa
AS DEVOTAS
Cruz e Sousa
I
Enquanto o sino bimbalha,
Bimbalha, bimbalha e tine,
II
Lançai do olhar a migalha
Perto da Igreja a senzala,
— Enquanto o sino bimbalha —
O Cristo junto aos escravos
À raça que se amortalha
E, pois, deveis visitá-la,
No horror que não se define...
Perto da Igreja, a senzala
Enquanto o sino bimbalha
E procurar transformá-la
Bimbalha, bimbalha e tine.
Da luz às palmas, aos bravos!...
Perto da Igreja a senzala,
O Cristo junto aos escravos.
http://www.flickr.com/photos/ricardoinfante/3995685836/sizes/o/
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Contos
http://www.flickr.com/photos/thomashawk/3277337877/sizes/l/
O lugar onde
Quisera eu ter tempo para desaba, desliza, borra e não a boa Literatura
admirar a chuva que cai. E existe. São quase tantos tipos
não pense que eis uma redun- de chuva quanto as gotas
é fabricada
dância, pois há chuvas que que caem. Os motoristas nos
http://guisalla.files.wordpress.com/2008/09/machado1.jpg
desabam, há as que deslizam, carros, no entanto, não vêem
as que borram o céu, as que a chuva passar, presos que
não existem. A de hoje é um são no trânsito vagaroso. Até
pouco de todas elas. entendo sua ânsia por chegar
Segunda-feira, último logo em casa depois de um dia
dia do mês. Estou certo de cansativo. É sua opção enrai-
que toda essa água vem para varem-se. Cada um elege os
diluir e carregar para a terra sentimentos que lhe convêm.
e esgotos os infortúnios de Assim também é meu
agosto, época do desgosto. direito zombar deles, por não
Com os maus agouros vai a aproveitarem um tempo de
espera de uns graus a menos gozo pleno, em que nada é
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
nos termômetros. Não me mais forte que a força da chu-
acostumo à ideia de um meio va. De dentro de um veículo, a
de ano quente. No interior é intensidade da água no metal é
diferente. Lá a fina garoa é quase um pêndulo hipnotizan-
constante, seja ao amanhecer, te, intenso e pesado barulho
ao passar do dia ou à boca da psicodélico, não cabendo aqui
noite. Uma garoa que eu tanto melhor descrição ― não se
aguardei desde o São João dorme, vigília não pode ser,
e que só deixou-se aparecer tampouco sonho, é existir,
hoje. talvez, no pequeno pedaço
O dia precisou amanhecer de céu que escorre no vidro
nublado, abrir-se ― uma brin- embaçado.
cadeira de mal gosto especial- O mundo real não se quer
mente para mim ― e voltar ver, nem a chuva lhe permite
a acinzentar-se à tardinha. A se oferecer às retinas. Faz
despeito da psicótica rixa das um pouco de frio, mas não é
forças da natureza para comi- sentido. Não faz sentido, aliás.
go, a chuva veio. E, diferen- Rima para cidade é calami-
temente de outras vezes, já se dade, e o que é feio a água
vão algumas horas desde que limpa. O vidro molhado seca,
chegou nos céus daqui. já é noite e todos chegam às
Quisera eu ter tempo para
admirar a chuva, que cai,
suas residências molhadas. ficina
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17
Contos
Um muro de intransigência
Joaquim Bispo
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Contos
Marca
mitiva até à esplanada do Muro hebraico contra os opositores
das Lamentações, onde muitos à anexação de território pales-
judeus fanáticos cabeceavam tiniano – destruindo cidades,
a afirmação dos seus preceitos utilizando fósforo branco e
religiosos. Aí, talvez por não ter outras armas proibidas contra
tido a atenção que esperava, co- populações civis, exterminando
meçou a gritar palavras de ordem indiscriminadamente sem olhar
em aramaico, a plenos pulmões, a idades – a determinação dos
provocando os orantes, enquanto dirigentes israelitas em reconsti-
puxava as melenas a uns e des- tuir a grande terra de Canaã das
barretava outros, sempre numa escrituras tradicionais é inamo-
atitude de grande irreverência e vível, respaldada na posse das
insolência. únicas armas nucleares da zona,
O burburinho foi imediata- e no apoio incondicional do novo
mente detectado por uma patru- império romano, que parece dis-
lha militar que, com grande apa- posto a tudo para ter um aliado
rato bélico, o intimou a parar. O fiel junto ao oceano subterrâneo
homem não só não parou como de petróleo.
começou a apontar a mão esten- Isolado na região, este país
dida para os soldados, com dois asiático, sequela dos complexos
dedos unidos levantados. Não se de culpa europeus, patenteia,
sabe se os soldados entenderam ridiculamente, essa relação um-
esse gesto como agressivo, ou bilical integrando, por exemplo,
se simplesmente não toleraram a os torneios de futebol europeus
desobediência; certo é que alguns ou os festivais de canções euro-
disparos foram ouvidos e o na- peus, incapaz de uma identidade
zareno caiu com a túnica ensan- médio-oriental, que procura no
guentada. Morreu pouco depois território mas rejeita na cultura.
no hospital. Os companheiros Cultivando a segregação,
foram presos e estão acusados de prossegue a construção de uma
alteração da ordem pública, que linha de betão de oito metros de
poderá, eventualmente, evoluir altura e setecentos quilómetros
para traição. de comprimento, a marcar a fron-
Só então as agências noticio- teira, segundo a sua interpreta-
sas se movimentaram e conse- ção, anexando Jerusalém oriental
guiram comprar uma gravação e isolando 450.000 pessoas.
de telemóvel feita por um turista. O nazareno pacifista é a mais
Este episódio é bizarro, mas recente vítima anónima deste
estará esquecido em breve. enorme equívoco.
Apesar do clamor internacio-
nal que tem denunciado a força
excessiva utilizada pelo estado
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mesa/ cesta de piquenique/ to da droga. Tenta levantar- Olha o espelho e encara
um botijão de gás peque- se. Apóia na escrivaninha, uns outros olhos fúnebres.
no./ Atônito,/ele olha para mas seus braços logo cedem Com o pulso bate no
o desenhista!”. Sente uma ao peso do corpo. O direito espelho, mas sua estrutura
tontura, de onde sai o título: se flexiona batendo o coto- está fraca como seu espírito
“Morte animada”. velo e desliza, deixando o sempre foi. Concentra-se.
Deixa de lado o rascu- rascunho, canetas e lapiseira Inclina o corpo para trás e
nho. Abre o livro, mas não caírem no chão. Bate a testa bate com mais força. Que-
consegue focar as palavras na madeira, mas o impacto bra. O machucado no pulso
com clareza. Mesmo assim é leve. Volta a sentar, já sem é superficial. Ao arrancar
segue lendo. forças no corpo, inerte. Ten- um caco do espelho quebra-
tar respirar, mas encontra do fere o dedo. Pega a lasca
“— Digam à minha mu- dificuldades. Abre a boca e
lher — respondeu com voz de espelho e corta um pul-
um filete de baba mancha so, troca a lasca de mão e
bem timbrada — que po- o livro. Está ofegante, como
nha na menina o nome de faz um corte mais profundo
que se afogando no ar. no outro. Perfura novamen-
Úrsula. — Fez uma pausa e
confirmou: — Úrsula, como Pensa em tomar a última te o primeiro. O sangue já
a avó. E digam-lhe tam- dose para remediar o fim tinge parte do banheiro.
bém que se o outro nascer da tortura. Levanta abrup- Caminha cambaleando
homem, que lhe ponham o tamente e cambaleia até a até a janela da sala, onde
nome de José Arcadio, mas cama, onde o tronco e os ajoelha e se apóia, deixando
não pelo tio, e sim pelo avô. membros superiores conse- os braços para fora. Repou-
guem chegar, mas os infe- sa a cabeça no parapeito. O
Antes que o levassem ao riores não. Desmaia, então,
paredão, o Padre Nicanor sangue escorre pelas mãos,
com metade do corpo na pinga lá em baixo onde for-
tentou assisti-lo. “Não tenho cama e um braço, o outro
nada de que me arrepen- mará uma pequena poça.
está suspenso.
der”, disse Arcadio, e se pôs Queria olhar o sol da
às ordens do pelotão depois Inanimado, passará nessa tarde quente, mas ele está
de tomar uma xícara de posição quase dois dias. sobre as nuvens.
café preto. (...) “Ah, cara- _________________ Inspira. Enfim, não sente
lho!”, chegou a pensar, “me Acorda numa tarde que mais medo da vida.
esqueci de dizer que se não reconhece, com dúvidas
nascesse mulher pusessem sobre sua identidade e seu
Remedios.”Então, numa só meio. Forte dor de cabeça e *Trechos do livro: Cem
pontada dilacerante, voltou de barriga. Deita na cama e Anos de Solidão/ Gabriel
a sentir todo o terror que o olha para o teto. Nada lhe García Márquez; tradução
atormentara na vida. O ca- vem à cabeça. Calcula se de Eliane Zagury – 49° Ed.
pitão deu a ordem de fogo. conseguirá andar, mexendo – Rio de Janeiro: Record
Arcadio mal teve tempo de a perna. Senta e vê uma 2001.
estufar o peito e levantar mancha de saliva na cama.
a cabeça, sem entender de Levanta escorando nas pa-
onde fluía o líquido ardente redes e escorado chega até
que lhe queimava as coxas. a cozinha. Prepara um copo
— Cornos! — gritou. — de água com sal e segue,
Viva o Partido Liberal!*” assim, até o banheiro. Bebe
Suas pestanas estão pe- a água e vomita uma bile
sadas. Não agüenta mais o amarela, seguido de muitas
sono, para não dizer o efei- tentativas que só fazem ba-
rulho, mas nada evacuam.
a boa Literatura
– Kane.
é fabricada
ficina
www.oficinaeditora.com
http://www.flickr.com/photos/27235917@N02/2788169879/sizes/l/
A Oficina Editora é uma utopia, um não-
lugar. Apenas no século XXI uma vintena
de autores, que jamais se encontraram
fisicamente, poderia conceber um projeto
semelhante.
O livro, sempre tido em conta como uma
das principais fontes de cultura, tornou-se
apenas um bem de consumo, tornou-se um
elemento de exclusão cultural.
A proposta da Oficina Editora é resgatar o
valor natural e primeiro da Literatura: de bem
cultural. Disponibilizando gratuitamente
e-books e com o custo mínimo para livros
impressos, nossos autores apresentam
a demonstração máxima de respeito à
Literatura e aos leitores.
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Contos
Ilustração: Jairo Tx
www.revistasamizdat.com 25
rancudo, cara de poucos qual entrou. desgosta... e como boa e
amigos, ombros tensos, servil secretária, logo re-
olhar ameaçador — “um conhece o ato como algo
americano típico”, pensa Dr. Shoji dá por encer- “imprescindível para o
a Srta. Menial e sem ousa rado o expediente. Algu- bom relacionamento pro-
dirigir-lhe a palavra, ape- mas pessoas orgulham-se fissional, que já durara...
nas sorri e mais do que de ter um relógio biológi- Quantos anos mesmo?”
rapidamente o conduz co apurado – ele poderia
se gabar por sua agenda Após esta pequena re-
ao consultório principal, creação, Dr. Shoji alinha
onde o doutor já o aguar- de consultas mental; ape-
sar de não trabalhar com o paletó, pega a valise,
da. Alguns berros, ba- despede-se cordialmente
rulhos e minutos depois hora marcada, inexpli-
cavelmente sempre sabe da tão gentil secretária
(40, lógico), o homem sai e segue, tranqüilo e se-
do consultório. Sorri e quantos, quando e quais
pacientes atenderá por reno, até sua residência,
agradece, apresentando- onde é esperado para o
se e beijando a mão da dia. O que torna a secre-
tária tão obsoleta quanto almoço familiar. Entra na
secretária que, perplexa, impecável casa, beija a
jura ter ouvido o, agora um porta guarda-chuvas
no verão, porém, além de impecável esposa — res-
gentil cavalheiro, Sr. Har- peitosamente, na testa —
dman cantarolar alguma imprescindíveis em um
consultório respeitável, e passa a mão na cabeça
coisa enquanto seguia de seus dois impecáveis
pelo corredor, escada ambos são belos objetos
decorativos – sobretudo a filhos, já sentados à mesa.
abaixo.
Srta. Menial! A refeição cheira mui-
— Oh, como eu nun- to bem e tem uma apa-
Pontualmente, às 13 ca havia reparado em rência espetacular, porém
horas chega ela: mulher tamanha formosura... a não lhe apetece; nada ali
bonita, cabelos e olhos palavra gostosa lhe é bem lhe apetece, e ao contrá-
extremamente negros. apropriada! - São tantos rio da comida, o cheiro e
Apesar do ar suave e os adjetivos que lhe vêm a aparência de sua esposa
sorridente, há algo mui- a mente, tantos os atra- lhe são repugnantes. E
to assustador naquela tivos que lhe pulam aos mais uma vez ele é to-
mulher e não é apenas a olhos, hormônios circu- mado por um impulso
grande borboleta tatuada lando em abundância febril, incontrolável e
em preto cobrindo-lhe e respostas fisiológicas violentamente esmurra a
o rosto. “Coisas assim previsíveis, que o Dou- esposa na cara. A força é
são comuns por aqui. tor nem mesmo percebe tamanha que a arremessa
Deve ser maquiagem, só a atitude gerada. Se vê ao chão.
pode!”, pensa a secretá- surpreendido... Ainda Abatido o primeiro
ria, enquanto a paciente mais surpresa fica a Srta. obstáculo, ele olha em
caminha serelepe e entra Menial: volta, ansioso à procura
direto no consultório, da próxima vítima. O
sem bater à porta e nem Ela se assusta com a
brutalidade com a qual filho corre para o quar-
mesmo esperar ser anun- to enquanto a pequena
ciada! ele a toma, grita confor-
me seu cabelo é puxado esconde-se debaixo da
Consulta muito breve, e geme quando seu corpo mesa. O que lhe traz um
menos de 15 minutos é jogado violentamente grande alívio:
e ela sai, com a mesma sobre a mesa. Teme, reage — Ah, nada como
graça assustadora com a brevemente, mas não filhos bem treinados!
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O lugar onde
a boa Literatura
é fabricada
ficina
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Contos
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a hábitos escusos, “Um doce!”, Os seus livros estão disponí- como diz o ditado balzaquia-
disse o tal Orlando. Também veis na internet, de graça. O no, a ficha caiu para o poli-
não fazia nada de extraordi- último tá aqui nesse site. cial. No teclado, pressionou
nário. Era uma pobre moça — Bah! Caso solucionado: simultaneamente as teclas
rica, que gostava de roman- quem mandou matá-la foi CTRL+L, e no campo locali-
ces de terror e que até se alguém grande do mercado zar escreveu
arriscava ela mesma a escre- editorial! “Eles querem me calar”
ver alguns.
— Acho que não é tão — Magal – gritou o Bar-
— Mas isso tem alguma simples assim, Barbosa. Dá bosa ao colega quando este
importância? – perguntou o uma lida nisso aqui. – disse, trazia as duas xícaras fume-
Barbosa. Magalhães, levantando-se de gantes – Você leu o último
— Ora, tem toda – respon- seu birô, apontando com a romance da dita cuja?
deu o Magalhães - Essa moça mão espalmada para o mo- — Qual? O do índio gua-
apareceu moribunda no nitor do PC. – Enquanto isso, rani que seqüestrou, torturou,
apartamento do amigo, e dis- vou fazer um café. Tá a fim? matou e esquartejou o José
se esta frase “Eles... querem... — Chá verde, para mim. de Alencar?
me... cal... argh!”. Alguém Café tem me dado uma azia...
queria calá-la. — Não, esse é o penúlti-
— Ok! Chá verde para o mo. Estou falando deste aqui,
— E como concluiu que Inspetor Barbie, que está de o do vampiro.
alguém queria calá-la? Ela dieta. Veadinho...
só disse “cal...”. Talvez fosse — Esse não estava aí. –
dessas piadinhas em inglês... — “Barbie” é a @#$%¨&;* disse Inspetor Magalhães,
“They want to me telefonar”. que te pariu! pulando curioso diante do
Sabe aquela: What is um Enquanto Magalhães foi monitor, com os olhos arre-
pontinho amarelo vendo até a cozinha da delegacia, galados. — Eu tenho certeza,
a esposa transando com o Barbosa acessou o link. Havia olhei a página na mesma
amante? Um Corn-o-manso! uma lista de quase trinta noite do crime... Eu até dei
romances de autoria da tal uma lida, e me admirei: a
— Puxa, Barbosinha... Às guria sabia escrever.
vezes eu tenho vontade de moça, o que o deixou em-
anotar o que você diz. basbacado. Escolheu o mais — Ah, é? E como ela dei-
recente, intitulado “A Dança xou passar isso aqui?
— Agora está sendo cíni- dos Imortais”. Conhecido
co... Então ela era escritora. O policial Barbosa selecio-
por suas técnicas de leitura nou o seguinte trecho:
E daí? dinâmica, quase sem piscar,
— Sim. Escrevia muito Barbosa leu ininterruptamen- (...) então, como uma tem-
bem, a propósito. te três capítulos do roman- pestade, os homens vestido
ce. Tinha um estilo notável, de preto começaram a ati-
— Conseguiu algum livro rarem contra a criatura, que
dela? muito claro e, ao mesmo
tempo, dotado de uma impe- ficou encurralado. Erguendo
— É lógico. Quer dizer, tal- cável correção gramatical. O o punho serrado em direção
vez não seja bem o que você romance de trezentas e treze ao holofote forte que quei-
está esperando. páginas digitalizadas tinha mava seu rosto com a luz
— Por quê? por enredo a vida de um intensa, o ser monstruoso
vampiro carioca, ambientada proferiu a plenos pulmões,
— Ela era defensora da pu- com um tom de voz gutural,
blicação on-line. Tinha uma no que hoje é o centro velho
do Rio de Janeiro, em finais demoníaco:
ONG e tudo, um lance muito
esquisito: “Biblioterrorismo”. do século XIX. Foi então que, — Eles querem me calar!
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Contos
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entanto, Joaquim Maria deveria ser comparti- gênio de nossa época.
não esboçava nenhum lhado e, num intervalo
Escrevo este relato
tipo de comportamento, de três meses, escreveu
para que a memória dele
apenas permanecia senta- um livro expondo tudo
não se apague, e cito o
do, olhando seu próprio isto. Mas Joaquim Maria,
primeiro parágrafo da
reflexo. Mas num dia, agora repersonificado, era
obra que tornou Joaquim
subitamente, ele pulou da um crítico inclemente da
Maria o inimigo público
cadeira e começou a aba- sociedade, talvez o mais
número um, após ter sido
nar os braços e a correr, satírico de todos os tem-
o maior expoente do país:
em ziguezague, pela sala. pos, um comediógrafo
Foi quando constataram arguto e cruel da vida
que uma mosca havia se real.
infiltrado no cômodo. Contar mentiras é peri-
Em seu livro, ele difa- goso,
Mas ninguém ima- mava desde o Imperador
ginou que um dom tão até a prostituta, do ge- Mas falar a verdade
extraordinário seria a neral ao bobo da corte. pode ser fatal.
causa da própria des- Contava tudo, sem censu-
graça de Joaquim Maria. ra, sem dó, nem piedade.
Sem nenhuma explica-
É óbvio que Joaquim
ção, inadvertidamente,
Maria criou inimigos
Joaquim Maria se tor-
poderosos e tudo que se
nou uma pessoa normal,
falava à boca pequena era
como outra qualquer.
que o queriam morto.
Quer dizer, mais ou
Então, ontem à noite,
menos...
encontraram-no enforca-
Durante todos os anos do em seu gabinete.
em que Joaquim Maria
O comissário da po-
não passou dum repli-
lícia afirmou que não
cante, de algum modo
investigará o crime, pois
inexplicável, ele também
Joaquim Maria havia
havia tido acesso a todos
contado no livro sobre o
os pensamentos mais
caso extraconjugal que
secretos das pessoas com
ele mantinha com um
as quais havia conversa-
estivador; o Imperador
do. Joaquim Maria sabia
se recusou a comentar o
de tudo, desde os detalhes
crime; não havia testemu-
mais sórdidos até as con-
nhas; ninguém, a não ser
jeturas mais intrincadas.
eu, velho amigo de Joa-
Joaquim Maria decidiu quim Maria, compareceu
que tanto conhecimento ao sepultamento deste
ficina
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Contos
Deus me perdoe,
era tudo o que eu queria
José Guilherme Vereza
http://www.flickr.com/photos/tay/4078728403/sizes/l/
O quarto tinha cheiro de só, tal a sofreguidão dos e domingo?
comida velha. A fumaça da beijos, apertos, passadas de - É a minha folga.
fritura vagabunda vinha do mão e entrelaços de pernas,
porão da espelunca, atraves- cambraias e linhos se rasgan- Ademar esfregou a testa,
sava o basculante e impreg- do, botões voando, gemidos, coçou a cabeça, vasculhou
nava tudo: as paredes, os len- muitos gemidos ecoando, o ambiente com os olhos.
çóis grossos, os travesseiros antes mesmo de a porta ser Estranhou tudo.
toscos, a cortina pesada de trancada pelas mãos hábeis - Margareth... é Margareth,
veludo que vedava a janela. da mulher. Não perderam não é? Me diga, minha filha,
Ao lado da cama, sobre o tempo. Uma vez trancafia- como foi que chegamos aqui?
criado-mudo, uma morin- dos, mergulharam um no
- De táxi, não lembra?
ga, dois copos e um abajur outro sobre a cama, num
empoeirado. No que se diz balé animal, aflito e ruidoso, - Não lembro. A bebida me
banheiro, o mínimo. Uma que não durou mais do que faz mal.
privada sem tampa, um cano o suficiente para Ademar se - Percebi. O senhor gozou
no lugar de um chuveiro e dar por satisfeito. rápido.
uma pia amarelada e torta - Como é mesmo o seu
no canto, um espelho redon- ***
nome?
do e duas toalhas aparente- Ademar estava zonzo.
mente limpas penduradas na - Margareth. Embora há tempos quisesse
maçaneta da porta. Ao longe, - Você vem sempre nesse viver um encontro arrisca-
vestígios de um rádio ligado lugar? do com sabe-Deus-quem,
sujavam o silêncio. Deveria não entendeu se deu conta
- Umas quatro vezes por
ser fim da tarde quando a do que fazia naquele lugar.
semana, tirando sábado e
porta se abriu e de lá surgi- O uísque ordinário tinha
domingo.
ram Ademar e uma moça, um efeito devastador e, aos
como se fossem um corpo - Você não trabalha sábado tropeços, tentou recolher as
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preenchidas por duas – ou às *** gozou?
vezes três – raparigas dispo- - Deus me perdoe… era - Fique com a dúvida. Essa
níveis. Ocupando uma boa tudo o que eu queria. dúvida é que faz com que
mesa, bem perto da entrada, meus clientes voltem sempre.
a moça queria logo ser vista - Ouvi bem o que o senhor
disse? Essa dúvida me excita. Essa
e desejada pelo primeiro dúvida é o fio que separa a
cavalheiro que da porta sur- - O que eu disse, minha paixão da hipocrisia.
gisse, desde que cumprisse filha?
seus caprichos e requisitos. - Você fala de um jeito que
- Algo como “Deus me não parece que é o que você
Foi abordada pelo garçom,
perdoe… era tudo o que é.
que estranhou sua presença
eu queria”.
ali, naquele momento tão - Não subestime o que
adiantado. Mas como bom - Digamos que o que você eu sou. Só porque sou uma
anfitrião, deixou-a completa- ouviu foi apenas um golpe mulher fácil e achada numa
mente à vontade, além de lhe de ar que partiu involun- mesa do Calypso não posso
acender um cigarro e servir tariamente do esôfago, pas- pensar na minha condição?
um drinque de boas-vindas. sando pelas cordas vocais, e, Não basta ser puta? Tem que
no encontro do palato e da ser puta e burra?
No piano, um tipo quase
língua em ligeiro movimento,
imberbe, cabelo de glos- - Puta, não! Aqui dentro
produziu um efeito asseme-
tora e colarinho troncho, você não é puta! Está no
lhado a um som indecifrável,
mal dedilhava um bolero, nosso contrato viver um ro-
que poderia sugerir algumas
enquanto fumava um mata- mance de duas ou três horas.
palavras. Nada que a cons-
rato impertinente, tão denso, Ainda faltam alguns minutos.
ciência tenha comandado.
mas tão denso, que pouco se E, por enquanto, nós somos
Portanto, se disse, não disse o
enxergava o balcão às suas dois amantes sem pudores,
que você supõe que eu tenha
costas, de onde a moça viu que se escondem da vida
dito…
surgir um vulto cambalean- num quartinho de um ho-
te em sua direção, que, sem - Para. O senhor, você, seja tel. E por isso se desejam, se
cerimônia – ou sem conheci- lá como quer ser chamado, lambuzam, se querem bem.
mento dos estatutos do local me enrola. Diz que não diz Isso é o que vale. O aqui e o
–, sentou-se ao seu lado e foi o que diz. Diz que não diz neste momento.
logo colocando a mão direi- o que pensa e o que sente.
Mas não pode dizer o que - Pára de falar…, - a
ta na sua coxa. Sem dúvida,
sente senão estraga tudo. Até moça afrouxou a voz. - Estou
uma intimidade de provocar
entendo. Estamos aqui num com vontade de fazer tudo
arrepios.
teatro, aqui está o palco, ali de novo…
A conversa durou pouco.
está a platéia naquele espe- Ademar baixou a guarda.
Mal se apresentaram, mal se
lho, formada por nós mes- - Diz “estou com vontade
enxergaram. Não chegaram a
mos. Aqui, o cenário: uma de fazer tudo de novo”, diz. É
trocar nomes, mas acertaram
cama suficiente, onde você vontade mesmo ou é fingi-
uma saída urgente, já que
deposita seu carinho animal mento?
um lugar mais aconchegante
dentro de mim e eu o recebo
e discreto poderia ser mais A moça põe, entre os den-
com braços e pernas aber-
apropriado para escoar toda tes e a pontinha da língua,
tas, como se fossemos dois
a excitação. No táxi, beija- a orelha do parceiro. E diz,
amantes em pleno gozo do
ram-se com sofreguidão e só rouquíssima:
amor, da paixão, do compa-
pararam quando o motorista
nheirismo, da cumplicidade, - Pois fique com a dúvida...,
estacionou na porta de um
como manda o figurino dos a-do-ro a dú-vi-da.
prédio chinfrim na Mem de
grandes amores. E tem mais:
Sá. Ao analisar o hotel do ***
duvido que você não duvide
telhado ao meio-fio, o cava- As duas horas combinadas
da minha sinceridade. “Será
lheiro balbuciou para si, com passaram voando. Ademar
que ela goza? Sera que ela
bafo de uísque ordinário: excedeu o tempo e nem quis
finge?” Quer apostar como
“Deus me perdoe… era saber o quanto pagaria a
isso não sai da sua cabeça?
tudo o que eu queria.” mais. Os instantes tinham
- Mas você gozou, não
sido tão generosos, que, fosse
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Contos
Noite de chuva
Mariana Valle
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Contos
Léo Borges
http://www.flickr.com/photos/scatterkeir/2436938431/sizes/l/
deixam vocês soltos numa Rádio CBS. invasão marciana e idiotas
noite como esta? Não estão O militar estava transtor- vestidos de diabos e bruxas
ouvindo as notícias? nado. Participara da guer- aí fora desfilando!
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de Mark no meio militar. A do? Não é possível! – balbu- aquela aparição, Rose acei-
convicção de que somente ciou Rose para si mesma. tou a ajuda e, lentamente,
amor não mantém relacio- – Aquele alemão que está ergueu-se.
namentos (muito embora concorrendo ao Nobel da – Doce? Travessura? Meu
não admitisse ser taxada Paz deveria se pronunciar. senhor, ainda brincas de
como uma pessoa materia- Vir a público para dar al- Halloween? Que calma é
lista) sempre a acompanhou guma esperança às pessoas. essa?
e, por isso, acreditava que Falar sobre algum projeto
estar perto dos vencedores para eliminar essa praga – Desconfie do que ouve
era um meio legítimo de sideral que assolou o mun- e tenha cuidado com os
proteção e, por conseguinte, do... verdadeiros invasores – dis-
de sobrevivência. se, com paciência, o miste-
Desanimada e sem fô- rioso sujeito, afastando-se,
Mas o desvario, revesti- lego, Rose caiu ajoelhada, logo após, num calmo
do por uma grotesca carga olhando para o firmamento vagar. Antes, porém, deixou
libidinosa, a fez corar de e clamando por Deus; o céu um livro sobre a abóbora
vergonha e entender que estava limpo, mas a luz das com os dizeres: A Guerra
aquilo era pecado não ape- estrelas parecia ocultar o dos Mundos – H. G. Wells.
nas macabro como também brilho dos discos voadores.
digno de severo castigo. O Em sua frente, repousan- A simples presença
remorso obrigou-a, então, do no asfalto, apenas uma daquele exemplar ilumi-
a correr ainda mais rápi- sarcástica e oca abóbora, nou a mente de Rose de
do, como se, agora, lutasse vazada com seu indefectível tal modo que a escuridão
para escapar dos insidiosos sorriso demoníaco. Os inva- de desconfianças dissipou-
flashes que açoitavam sua sores esperaram o Hallowe- se de imediato, permitindo
mente. Enquanto corria, en para poder concretizar o que o silêncio noturno
viu restos de capas, más- plano. Nada mais perfeito: rapidamente invadisse seus
caras mortuárias e cruzes bruxas e marcianos. Era ouvidos. Não havia nenhum
de madeira esquecidas nas isso! Eram seres realmen- ruído de armas estelares
calçadas. Ninguém nas ruas te evoluídos. Estudaram o ou de monitoramento do
além dela e de sua sombra comportamento e as tradi- espaço terrestre; não havia
criada pelos antigos pos- ções dos humanos por anos! naves; não havia marcianos;
tes de ferro do subúrbio Uma noite como aquela, não havia invasão. Mas ain-
de Nova Jersey. Durante a onde todos festejavam o da assim a mulher sentiu
sôfrega correria, a mulher Mal, era perfeita para a as pernas tremerem, pois
passou perto de uma casa conquista da Terra. a calmaria, de tão mórbi-
que também ouvia, em alto da, gerou-lhe um súbito e
Rose, já sem esperanças intenso calafrio. Quem era
som, o noticiário que vinha em uma vitória da Humani-
tirando sua paz: aquela pessoa?
dade, chorava copiosamente
Pierson, eles estão che- quando um soturno homem – Qual o seu nome, cida-
gando à Manhattan. São de terno surgiu em sua dão? –
indagou com algum
muitos e são hostis. Nossa frente, oferecendo o braço receio.
correspondente em Detroit para ajudá-la a se levantar. De longe, sem se virar, o
foi atacada e virou um – Q-quem é você? homem respondeu:
zumbi. Vou suspender a – Kane.
transmissão. Nick Rogers – Pegue esse pão embe-
diretamente de Nova York. bido em groselha. Um doce
Que Deus nos proteja... aliviará seu pânico pela
travessura.
– Como? Como é que
isso pode estar acontecen- Mesmo estranhando
http://www.flickr.com/photos/27235917@N02/2788169879/sizes/l/
A Oficina Editora é uma utopia, um não-
lugar. Apenas no século XXI uma vintena
de autores, que jamais se encontraram
fisicamente, poderia conceber um projeto
semelhante.
O livro, sempre tido em conta como uma
das principais fontes de cultura, tornou-se
apenas um bem de consumo, tornou-se um
elemento de exclusão cultural.
A proposta da Oficina Editora é resgatar o
valor natural e primeiro da Literatura: de bem
cultural. Disponibilizando gratuitamente
e-books e com o custo mínimo para livros
impressos, nossos autores apresentam
a demonstração máxima de respeito à
Literatura e aos leitores.
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Contos
Alô, Waldirene?
Barbara Duffles
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Contos
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Tradução
E faz de conta...
Miguel de Unamuno
trad.: Henry Alfred Bugalho
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daquelas, é o que dizia o que ele escrevia. Haja visto
famoso melodramaturgo pretensão semelhante!
Para o herói do meu
d’Ennery: “Em um drama
conto, o conto não é senão Permita-me o leitor que
(e quem diz drama, diz
um pretexto para obser- interrompa um momento
conto), o importante são
vações mais ou menos o fio da narração de meu
as situações; componha
engenhosas, fragmentos de conto, faltando ao preceito
você uma situação patéti-
fantasia, paradoxos, etc., literário da impessoalidade
ca e emocionante, e pouco
etc. E isto, francamente, é do contista (veja a Cor-
importa o que nela digam
rebaixar a dignidade do respondance de Flaubert,
os personagens, porque o
conto, que tem um valor em qualquer de seus cinco
público, quando chora, não
substantivo — creio que se volumes Oeuvres comple-
ouve”. Que profunda obser-
diz assim — em si mesmo e tes, Paris, Louis Conard,
vação esta de que o público,
por si mesmo. Miguel não libraire-éditeur, MDCC-
quando chora, não ouve!
cria que o importante era o CXX), para contestar essa
Um sujeito que havia sido
interesse da narração e que pretensão ridícula do herói
apontador do grande ator
o leitor fosse dizendo para de meu conto de que seu
Antonio Vico me dizia que,
si mesmo a cada momento: público se interesse pelo
representando este uma vez
“E agora o que virá?”, ou: “E que ele escreve. É que não
A morte civil, quando entre
como isto acabará?” Sabia, sabia que a maioria das
dois assentos fazia que mor-
ademais, que há quem co- pessoas lê para não se in-
ria, e as senhoras o olhavam
meça um destes romances teirar? Fartos estão cada um
com binóculos para cobrir
enormemente interessantes, com suas próprias penas,
com eles as lágrimas e os
vai ver nas últimas páginas seus próprios pesares e
cavalheiros fingiam que
o desfecho e já não o lê cavilações para que venham
assoavam para enxugá-las, o
mais. lhes enfiar outras! Quando
grande Vico, entre soluços
eu, de manhã, à hora do
Por isto, acreditava que estertóricos e frases entre-
chocolate, pego o jornal do
um bom romance não cortadas de agonia, estava
dia, é para me distrair, para
deve ter desfecho, como dando a ele, ao apontador,
passar o tempo. E conhe-
não tem, ordinariamente, umas tarefas para a conta-
cido é o aforismo daquele
a vida. Ou devia ter dois doria. O que precisa é saber
sábio granadino: “A questão
ou mais, expostos em duas fazer chorar!
é passar o tempo”; ao que
ou mais colunas, e que o
Sim; aquele que num outro sábio, bilbaíno este, e
leitor escolha entre aquele
conto, como num drama, que sou eu, acrescento: “Mas
que mais o agrade. O que é
sabe fazer chorar ou rir, sem adquirir compromis-
soberanamente arbitrário. E
pode nele dizer o que lhe sos sérios”. E não há meio
este Miguel meu era o mais
apetecer. O público, quando menos comprometedor de
arbitrário que dar-se possa.
chora ou quando ri, não se passar o tempo do que ler o
Em um bom conto, o inteira. E o herói de meu jornal. E se apanho um ro-
mais importante são as conto tinha a perniciosa mance ou um conto não é
situações e as transições. e petulante mania de que para que, por reação, suscite
Sobretudo, estas últimas. Ó, o público — seu público, minhas profundas preo-
as transições! E a respeito é claro! — se inteirasse do cupações e minhas penas,
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http://www.garcianieto.com/Fotos/Fotos%20de%20Personalidades/Miguel%20de%20%20Unamuno.jpg
54
SAMIZDAT dezembro de 2009
Miguel de Unamuno y Jugo (29
de Setembro de 1864 – 31 de
Dezembro de 1936) foi um poeta
e filósofo espanhol.
Estudou na universidade de
Madrid onde tirou o curso de
Filosofia e Letras e mais tarde
obteve a cátedra de grego na
Universidade de Salamanca. Dez
anos depois foi nomeado reitor
da universidade salmantina.
Fonte: http://pt.wikipedia.org/
wiki/Miguel_de_Unamuno
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Teoria Literária
http://guisalla.files.wordpress.com/2008/09/machado1.jpg
explicava lá na frente e que teoria do tudo, um conjun-
por vezes parecia impos- to de equações explicando
sível de entender poderia todas as forças da natureza
servir de base para um que Albert Einstein teria
romance de suspense? A descoberto - mas não teria
resposta, muito provavel- revelado por medo de que
mente, é não. ela fosse usada para criar
Eu, tampouco, cheguei armas ainda mais poderosas
a cogitar tal coisa. Assim, do que a bomba atômica.
quando vi a capa do livro Apenas três cientis-
A última teoria de Eins- tas que trabalharam com
tein numa banca da Feira Einstein sabem dessa teoria,
do Livro de Caxias do Sul, e agora eles estão sendo
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
onde moro, ele não atraiu mortos, um a um. O último,
minha atenção. O título e antes de morrer, revela a
as fórmulas matemáticas na existência da teoria a seu
capa deram-me a impressão ex-pupilo David Swift, um
de que se tratava de um professor universitário que,
livro teórico. a partir de então, passa a
Mas quando o livreiro, ser perseguido pelo FBI e
meu conhecido, indicou- por um matador implacá-
me sua leitura, resolvi dar vel.
à obra o ônus da dúvida Com estilo semelhante
e folheá-lo. Foi o bastante a O Código Da Vinci, A
para mudar minha opinião: última teoria de Einstein é
http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/1/14/Albert_Einstein_1947.jpg
ficina
A trama de A última
teoria de Einstein, do escri-
tor Mark Alpert (editado no
www.oficinaeditora.org
57
Recomendação de Leitura
Carlos Davissara
A MORTE E
A MORTE DE QUINCAS BERRO DÁGUA
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60
SAMIZDAT dezembro de 2009
Recomendação de Leitura
Crepúsculo
Giselle Sato
http://twilightsingapore.files.wordpress.com/2009/01/twilight_natl_2disc_2dskew.jpg
Crepúsculo atordoantes e irresistíveis. Romeu e Julieta do
Depois ela descobre que século 21, cenários lindos
(Twilight -2008)
ele é um vampiro, e se e a realização dos sonhos
O filme começa com desenrola um romance, o de qualquer mortal: Viver
um clima normal, uma grande mote da historia. a emoção de um imortal,
adolescente como qual- escalando arvores altís-
Eis a sinopse do filme,
quer outra, Isabella Swan simas, vendo o mundo
com pitadas de situações
(Kristen Stewart) se muda sob um ângulo completa-
onde a jovem é salva
para Forks, uma cidade mente diferente. E é claro,
pelo amado e todas as
pequena, nublada e chu- não podemos esquecer:
informações aprendidas
vosa, perto do estado de A dor do amor frustrado,
nos antigos filmes sobre
Washington. A razão da proibido, entre uma hu-
vampiros. Quem assistiu
mudança, é o novo casa- mana e um vampiro.
Entrevista com vampiro,
mento da mãe, com um
Harry Potter, Van Hen- Ele representa o pe-
jogador de baseball da se-
sing e outros, sabe muito rigo, ela é uma garota
gunda linha. E a vontade
bem do que estou falan- diferente, que não teme o
da mesma, de viajar com
do. Sobreviver com san- desconhecido. Estão tão
o marido, o que não po-
gue humano ou animal? envolvidos, que precisam
deria fazer, morando com
Resistir à sede e lutar lutar contra as inquie-
Bella. A reaproximação
contra os maus da espé- tações desconcertantes,
com o pai, a escola onde
cie ou dar vazão a todo tão comum aos jovens e
é o centro da atenções e
poder e ferocidade? Um aprender a controlar seus
o reencontro com o ami-
bom fã de vampiros, co- impulsos.
go índio, dão um enfoque
nhece de cor e salteado.
inicial bem tranqüilo. Bella, aos dezessete
Então, o que tornou uma
anos, é a mistura perfeita
O que Bella não con- série, escrita em 2005 por
de pureza e libido.
tava, era com o fascínio uma escritora novata, um
que uma estranha famí- fenômeno? Vamos entrar Edward tem sede, não
lia, causa em seu mundo neste universo sobrenatu- de sexo, mas do sangue
tímido e triste. Os Cullen, ral... da amada. Querem situ-
são um grupo de jovens ação mais erótica e pro-
Se tratando de um
pálidos, lindos e arredios. vocante? Muitas cenas,
primeiro episódio de
Razão por si só, motivo insinuam um beijo que
uma série, esse é um
de muita curiosidade. nunca acontece... E envol-
filme mais completo, com
Em especial, o mais jo- vem o publico em uma
um início, meio e fim. A
vem dos irmãos, Edward torcida apaixonada.
história, para muitas ado-
Cullen (Robert Pattin-
lescentes, é linda, maravi- Enquanto isso, sensu-
son), um garoto de uma
lhosa e romântica. alidade, paisagens belís-
beleza e magnetismo,
www.revistasamizdat.com 61
simas, efeitos especiais, as razões acima citadas admirei a capacidade
romance e fantasia in- e principalmente porque de alguns escritores de
teragem. Não foi à toa foi feito para entreter. criar situações de fanta-
que o filme virou febre sia impossíveis e depois
Por alguns minutos,
e conquistou altíssimas acrescentar personagens
deixe a realidade lá fora,
bilheterias. Devo admitir que são tão profunda-
e no escurinho do cine-
que o filme é delicioso mente humanos que suas
ma... Liberte o jovem den-
e por alguns minutos, perspectivas tornam a
tro de si e deixe-se levar
senti vontade de ter todos situação real. Espero que
pela magia.
aqueles poderes. Quem Crepúsculo proporcione
não sentiria? Impossível a mesma experiência a
resistir... seus leitores”. A escritora
“Quando a vida lhe ofe-
mora com o marido e
E é claro, encontrar um rece um sonho muito além
três filhos em Glendale,
vampiro tão encantador de todas as suas expectati-
no Arizona.
quanto Edward, persona- vas, é irracional se lamen-
gem que Stephenie Meyer, tar quando isso chega ao
a autora, construiu em fim”
Descrição da Saga:
uma trama de extraor-
(trecho do livro)
dinário suspense e que Crepúsculo: O início
marcou sua estréia lite- da saga de Isabella Swan
rária. desde sua chegada a cida-
Diretor: Catherine Har-
dela de Forks e a desco-
Vale citar que seus dwicke
berta de sua paixão pelo
livros já venderam mais
Roteiro: Melissa Ro- vampiro Edward Cullen
de 25 milhões de copias
senberg no best-seller mais cultu-
e foram traduzidos em
ado da atualidade. - 416
37 idiomas. A saga é Com: Kristen Stewart,
páginas
contada em quatro livros, Robert Pattinson, Billy
e o segundo volume, Lua Burke, Ashley Greene,
Nova, já estreou nos cine- Nikki Reed, Kellan Lutz e
Lua Nova: Para Bella
mas. Posso adiantar que Taylor Lautner.
Swan, há uma coisa mais
neste filme, Jacob Black ,
importante do que a pró-
o amigo índio de Bella e
pria vida: Edward Cullen.
que já deixou indícios, de Autora: Stephenie
Mas estar apaixonada
ser um lobisomem, tem Meyer formou-se em lite-
por um vampiro é ainda
grande destaque na tra- ratura inglesa na Brigham
mais perigoso do que ela
ma. Young University. Sobre
poderia ter imaginado.
Crepúsculo vale a pena este romance (Crepús-
Edward já resgatara Bella
ser assistido, por todas culo), ela diz: “Sempre
das garras de um mostro
http://guisalla.files.wordpress.com/2008/09/machado1.jpg
querido, eles percebem da escolha fatal entre
que seus problemas po- fazer parte do obscuro,
dem estar apenas come- mas sedutor, mundo dos
çando... Em Lua Nova, imortais ou seguir uma
Stephenie Meyer nos dá vida totalmente humana.
outra combinação ir- Escolha essa, que poderá
resistível de romance e significar a transforma-
suspense com um toque ção do destino dos dois
sobrenatural. - 480 pági- clãs: vampiros e lobiso-
nas mens. Assombroso e de
tirar o fôlego, Amanhecer
esclarece os mistérios e
http://www.flickr.com/photos/ooocha/2630360492/sizes/l/
Eclipse: Enquanto Se- os segredos desse fasci-
attle é assolada por uma nante épico romântico
sequência de assassinatos que tem arrebatado mi-
misteriosos e uma vampi- lhões de leitores. - 576
ra maligna continua em páginas
sua busca por vingança,
Bella está cercada de ou-
tros perigos. Em meio a
isso, ela é forçada a esco-
lher entre seu amor por
Edward e sua amizade
com Jacob - uma op-
ção que tem o potencial
para reacender o conflito
perene entre vampiros e
lobisomens. Com a pro-
ximidade da formatura,
Bella vive mais um dile-
ma: vida ou morte. Mas
o que representará cada
uma dessas escolhas?-
464 páginas
ficina
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63
Crônica
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uma lema puramente retó- concurso “Menina da Laje”, uma criatura social, tende a
rico, para justificar invasões na protagonista da novela reproduzir os atos dos seus
ao Iraque ou Afeganistão, posando para a “Playboy”, na pares como estratégia de
mas em outros, é de fato o imagem do corpo vendida e sobrevivência: se a maioria
ideal pelo qual os americanos veiculada em todos os outdo- faz, então deve ser o melhor
vivem: liberdade acima de ors, nas revistas, na TV, nos a ser feito. Enquanto que este
tudo. jornais de quinta. comportamento se justifica
em várias ocasiões e nos aju-
Para um americano, pouco Consumimos a todo o
da coletivamente, em muitas
importa como você se veste, momento o culto ao corpo,
situações apenas reforça uma
o que você faz, com quem ao sexo, à beleza a qualquer
injustiça.
você anda, o que você come. custo e, ao mesmo tempo, pa-
Cada um é responsável por radoxalmente, repudiamo-lo No livro “A Sabedoria das
seus próprios atos, livre para quando se apresenta fora dos Multidões”, há um exemplo
fazer suas próprias escolhas meios onde ele é convencio- esclarecedor - uma mulher
e ninguém tem nada a ver nalmente aceito. que deseja se suicidar jogan-
com isto. Ninguém. do-se de uma ponte causa
Talvez sejam os tabus,
um enorme congestionamen-
Isto não significa que estas normais sociais que
to. Algumas pessoas, para se
não haja preconceitos, mas regulam o permitido e proi-
livrarem logo deste incômo-
externá-los chega a ser quase bido, que estejam no cerne
do, começam a gritar, “Pula!
antiético. desta questão, que expliquem
Pula!”. Em pouco tempo, cen-
porque aceitaríamos a Geyse
Como os americanos re- tenas de motoristas nervosos
e seu vestido rosa em certas
agiriam a uma universitária reforçam o coro e a mulher
circunstâncias, mas a repu-
desfilando com um vestido se joga para a morte.
diariamos em outras.
rosa curtíssimo?
Duvido que qualquer uma
Mas nada é tão simples,
Difícil dar uma resposta daquelas pessoas, individual-
e tabus não explicariam
categórica, mas talvez com a mente, desejasse a morte da
porque milhares de alunos,
mesma indiferença com que mulher, mas coletivamente,
supostamente esclarecidos,
tratam os passageiros sem de modo errôneo, os moto-
posto que estão numa Uni-
calças no metrô, ou o louco ristas julgaram que, se ela se
versidade, se reuniriam para
trajado de mulher na Astor jogasse logo no rio, o tráfego
insultar uma colega, apenas
Place, com indiferença, com seria normalizado.
por causa do que ela veste.
naturalidade.
Se tabu, ou machismo, pode Às vezes, precisamos nos
E é neste momento em estar na origem do ocorri- esconder sob a máscara da
que revelamos toda nossa do, as proporções do evento coletividade para expormos
hipocrisia, nosso atraso, nossa sugerem outro fator. nossa intolerância. Somente
moralidade retrógrada. assim, sentimo-nos seguros
“Eu comecei a gritar, mas
para demonstrar a nossa
Estamos tão habituados à nem sabia o que estava acon-
profunda ignorância.
exposição do corpo, à reifi- tecendo. Foi engraçado”, disse
cação da mulher e do sexo, um estudante da UniBan,
no baile funk, no carnaval, numa das reportagens que
no fio dental na praia, no assisti. O ser humano, como
ficina
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Crônica
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Volmar Camargo Junior
Eu também quero
meu Septilhão!
68 SAMIZDAT dezembro de 2009
Dia desses, um certo 3º - pagá-lo com relíquias
cidadão americano chamado católicas medievais. Dizem Henry Alfred Bugalho
A
GUI
Nova York
Dalton Chiscolm entrou com que com a quantidade de
uma ação na justiça, pedindo ossos de Jesus Cristo surgidos
uma indenização ao banco nas igrejas da idade média -
para Mãos-de-VAca
onde é correntista, o Bank que cobravam “uma pequena
of America, alegando que foi quantia” para que os pere-
mal atendido. O valor pedido grinos os vissem, tocassem
por ele por conta da cara feia ou mesmo, levassem uma
O Guia do Viajante Inteligente
(e, talvez, por causa das deze- lasquinha para casa - dava
nas de tarifas cobradas pelo para dar uma volta inteira ao www.maosdevaca.com
banco, ou porque o cafezinho redor de Roma.
tinha gosto de meia suja) é o 4º - entregar a ele o baú
número mais absurdo que já do mago Paulo Coelho, de
se ouviu falar onde saíram todas as verda-
US$ 1.784.000.000.000.000. des e provas de seus contatos
000.000.000,00 (ou, um septi- extraplanares e extraterres-
lhão e pouco de dólares)(¹) tres.
Quem pode com um tro- 5º - pagá-lo com a hi-
ço desses? poteca das usinas de bene-
É óbvio que não existe di- ficiamento de urânio e as
nheiro o suficiente no mun- indústrias de armamento de
do pra pagar o cara. Ainda destruição em massa que os
que algum juiz fosse levar o americanos encontraram no
cara a sério (é só uma supo- Iraque.
sição, ok?), como seria pos-
sível indenizá-lo? Eu tenho Com uma dessas alterna-
aqui minhas sugestões: tivas, seria bem provável que
1º - entregar a ele uma o cara ficasse bem satisfei-
escritura pública do plane- to. Só não ia conseguir que
ta Saturno, incluindo o anel os bancos melhorassem o
recém-descoberto, já que atentimento. Afinal, o que
dizem que ele poderia cir- lhes interessa são números.
cundar bilhões de planetas Grandes números.
iguais à Terra;
2° - entregar uma escri-
tura pública do ex-planeta
Plutão, já que agora ele caiu
para a segunda divisão do
sistema solar, estaria livre
de pagar o IPTU. Mas seria
preciso fazer isso antes que
o MST tomasse conta do pla-
netóide, alegando que se trata
de propriedade improdutiva.
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Poesia
Peça
Eu sei, amor,
que queres mais
Peça!
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e
castidade Wellington Souza
Há a demanda insatisfeita.
Há a oferta insatisfatória.
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Poesia
www.revistasamizdat.com 73
Poesia
E a realidade (?)
Seria nova
Seria nossa (?)
Seria nada
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http://www.flickr.com/photos/ashleyrosex/3101042573/sizes/l/
-e nada se ver-
é que acende a luz da cabeça
brilham os olhos, como faróis,
aí posso voar para qualquer estrela
pois além da minha cabeça
só elas estão acesas, e o meu coração,
e voo cada vez mais alto
sou tragado pela leveza e calmaria do vento e oceano
e quando a luz torna a acender
apaga-se a luz da cabeça
e tudo volta ao normal
Assim, sem nada para ver.
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Poesia
Lascívias viáveis
Léo Borges
http://www.flickr.com/photos/togga/2630251674/sizes/l/
Só a semente
Maristela Scheuer Deves
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SOBRE OS AUTORES DA
SAMIZDAT
Edição, diagramação e capa
Edição de imagens
78
78 SAMIZDAT dezembro de 2009
Revisão
Léo Borges
Nasceu em setembro de 1974, é carioca, servidor
público e amante da literatura. Formado em Comu-
nicação Social pela FACHA - Faculdades Integradas
Hélio Alonso, participou da antologia de crônicas
“Retratos Urbanos” em 2008 pela Editora Andross.
Assessoria de imprensa
Mariana Valle
Por um amor não correspondido, a carioca de
Copacabana começou a poetar aos 12 anos. Veio o
beijo e o príncipe virou sapo. Mas a poesia virou sua
amante. Fez oficina literária e deu pra encharcar o
papel com erotismo. E também com seu choro. Em
reação à hipocrisia e ao machismo da sociedade.
Atuou como jornalista em várias empresas, mas foi
na TV Globo onde aprimorou as técnicas de reda-
ção e ficção. E hoje as usa para contar suas próprias
histórias. Algumas publicadas em seu primeiro livro
e outras divulgadas nos links listados em seu blog
pessoal: www.marianavalle.com
www.revistasamizdat.com 79
Colaboração
Dênis Moura
Paulistano de pia, cearence de mar e poeta de
amar. Viaja tanto o céu estrelado quanto o ciberes-
paço, mais com bits de imaginação que com telescó-
pios. Pensa que tudo se recria a cada Big Bang, seja
ele micro, macro ou social. Luta pela justiça, a paz e
a igualdade, com um giz na mão e uma pistola na
outra. É Tecnólogo a sonhar com Telemática social,
com a democracia participativa eletrônica, onde o
povo eleja menos e decida mais. Publica estes dias
sua primeira obra, um Romance de Ficção Científi-
ca, e deixa engavetadas suas apunhaladas poesias. É
feito de bits, links e teia pra que não desmaterialize,
o clique, o blogue e o leia!
Giselle Sato
Autora de Meninas Malvadas, A Pequena Baila-
rina e Contos de Terror Selecionados. Se autodefine
apenas como uma contadora de histórias carioca.
Estudou Belas Artes, Psicologia e foi comissária de
bordo. Gosta de retratar a realidade, dedicando-se
a textos fortes que chegam a chocar pelos detalhes,
funcionando como um eficiente panorama da socie-
dade em que vivemos.
Wellington Souza
Paulistano, mas morou também em Ribeirão Preto,
onde cursou economia na Universidade de São Pau-
lo. Hoje, reside novamente no bairro em que nasceu.
Participou das antologias do concurso Nacional de
Contos da Cidade de Porto Seguro e do Poetas de Ga-
veta/USP. Escreve poemas, contos, crônicas e ensaios
literários em um blog (Hiper-link), na revista digital
SAMIZDAT e no portal Sociedade Literária. “Escrever
é um modo de ser outro ser”.
80
80 SAMIZDAT dezembro de 2009
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
Carlos Davissara
Paulistano, filho de nordestinos, desenhista desde
sempre, artista plástico formado, escritor. Começou
sua vida profissional como educador e, desde então,
já deixou seu rastro por ONG’s, Escolas e Centros
Culturais, através de trabalhos artísticos e pedagó-
gicos – experiências que têm forte influência sobre
seus escritos. Atualmente, organiza oficinas de ilus-
tração para crianças, estuda pós-graduação em Histó-
ria da Arte e escreve para publicações na internet.
carloseducador@hotmail.com
http://desnome.blogspot.com
Jú Blasina
Gaúcha de Porto Alegre. Não gosta de mensurar
a vida em números (idade, peso, altura, salário). Não
se julga muito sã e coleciona papéis - alguns afir-
mam que é bióloga, mestre em fisiologia animal e
etc, mas ela os nega dizendo-se escritora e ponto fi-
nal. Disso não resta dúvida, mas como nem sempre
uma palavra sincera basta, voltou à faculdade como
estudante de letras, de onde obterá mais papéis para
aumentar a sua pilha. É cronista do Caderno Mulher
(Jornal Agora - Rio Grande - RS), mantém atualiza-
do seu blog “P+ 2 T” e participa de fóruns e oficinas
virtuais, além de projetos secretos sustentados à base
de chocolate e vinho, nas madrugadas da vida.
Maristela Deves
Gaúcha nascida na pequena cidade de Pirapó, co-
meçou a sonhar em ser escritora tão logo aprendeu
a ler. Escreve principalmente contos nos gêneros mis-
tério, suspense e terror, além de crônicas. Mantém
ainda o blog Palavra Escrita, sobre livros e literatura
(www.pioneiro.com/palavraescrita).
www.revistasamizdat.com 81
Joaquim Bispo
Ex-técnico de televisão, xadrezista e pintor ama-
dor, licenciado recente em História da Arte, experi-
menta agora o prazer da escrita, em Lisboa.
episcopum@hotmail.com
Guilherme Rodrigues
Estudante de Letras na Universidade do Sagrado
Coração, em Bauru, onde sempre morou. Procura
reinventar o mundo a seu modo, seja belo ou grotes-
co, e assim mostrar um novo caminho. Admirador
das coisas mais simples e belas do mundo e da vida,
busca expressar essas sublimes minúcias em suas
poesias. Não dispensa o café da tarde com pãezinhos.
Apaixonado por Línguas, Literatura e Linguística.
Caio Rudá
Bahiano do interior, hoje mora na capital. Estuda
Psicologia na Universidade Federal da Bahia e espera
um dia entender o ser humano. Enquanto isso não
acontece, vai escrevendo a vida, decodificando o enig-
ma da existência. Não tem livro publicado, prêmio,
reconhecimento e sequer duas décadas de vida. Mas
como consolo, um potencial asseverado pela mãe.
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82 SAMIZDAT dezembro de 2009
http://www.photoshoptalent.com/images/contests/spider%20web/fullsize/sourceimage.jpg
Barbara Duffles
Jornalista, escritora e roteirista, é autora do livro
“Não Abra” e do blog “Não Clique”. Apesar das nega-
tivas, esta carioca quer, sim, ser lida - como todo es-
critor. Tem dias de conto, de crônica e de pílulas sem
sentido. Suas paixões: cinema e livros com cheiro de
novo - se bem que adora se perder nos sebos da vida.
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Também nesta edição, textos de