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Nepstad
Adriana G. Moreira
Ane A. Alencar
vii
Nepstad, D. C., A. Moreira & A. A. Alencar. 1999. A Floresta em Chamas:
Origens, Impactos e Prevenção de Fogo na Amazônia. Programa Piloto
para a Proteção das Florestas Tropicais do Brasil, Brasília, Brasil.
HYOGEN KOMATSU
Coordenador de Cooperação Técnica do Japão no Brasil
5
Sumário
Sumário Executivo, xi
Prefácio, xxi
2. A inflamabilidade da Floresta, 41
2.1. Os três ingredientes de um incêndio florestal
2.2. O deserto verde: o paradoxo das florestas sempre verdes
do leste e sul da Amazônia, 42
As florestas de Paragominas, 42
As Florestas amazônicas no limiar da inflamabilidade, 48
Os Incêndios florestais pré-Colombianos, 49
2.3. Os efeitos da exploração de madeira sobre a inflamabilidade
da floresta, 51
2.4. Fogo gera fogo, 56
vii
3.3. Um estudo sobre o fogo nas propriedades rurais
da Amazônia, 76
Metodologia adotada, 78
Quanto está queimando?, 81
3.4. Os incêndios e as queimadas ao longo do arco
de desmatamento, 91
As queimadas para desmatamento, 93
Os incêndios florestais rasteiros, 97
As queimadas em áreas já desmatadas, 99
3.5. A quem pertence as áreas que estão queimando?, 100
3.6. Os impactos ecológicos do fogo, 103
As queimadas para desmatamento, 103
Os incêndios florestais rasteiros, 107
As queimadas e os incêndios em áreas desmatadas, 114
O fogo e a “savanização” da Amazônia: um ciclo vicioso ?, 117
3.7. Os impactos econômicos do fogo, 118
Os custos e os prejuízos para os proprietários rurais, 118
A prevenção de incêndios, 123
Os custos e os prejuízos para a sociedade, 128
viii
5. As soluções para o Problema do fogo na Amazônia, 142
5.1. Introdução, 142
5.2. Prevenção e supressão de incêndios e queimadas, 144
Técnicas de prevenção e supressão de incêndios usadas pelos
proprietários de terra, 144
Acordos entre vizinhos e comunidades locais, 147
O caso da comunidade Del Rey, 149
Como estimular investimentos na prevenção de incêndios?, 153
5.3. O fogo no contexto das fronteiras de ocupação da
Amazônia, 156
O fogo como ferramenta intrínseca nas fronteiras de ocupação, 156
Os custos e benefícios do uso do fogo e da prevenção de incêndios: um
referencial teórico, 158
5.4. Políticas Públicas, 162
Abordagens legislativas, 165
Instrumentos econômicos, 169
Sistemas de advertência de risco de fogo, 173
Programas de emergência, 175
6. Conclusão, 179
Bibliografia, 181
Apêndices, 191
ix
Sumário Executivo:
A cada ano, o fogo na Amazônia brasileira atinge uma área dez vezes o
tamanho da Costa Rica. Quando fazendeiros e agricultores utilizam o
fogo em suas terras para converter florestas em roças e pastagens, e/ou
para recuperar pastagens invadidas por ervas daninhas, inadvertidamente,
queimam florestas, pastagens e plantações. O risco anual de incêndio
acidental desencoraja os proprietários a investirem em suas propriedades,
o que perpetua o domínio da pecuária extensiva e da agricultura de corte e
queima em detrimento do estabelecimento de sistemas agroflorestais e do
manejo florestal sustentável. O fogo aumenta a inflamabilidade das paisagens
da Amazônia, e inicia um ciclo vicioso; as florestas são substituídas por
uma vegetação inflamável que perpetua a presença de incêndios na região.
xi
2. Os períodos de secas severas, normalmente associados aos eventos
“El Niño”, e a extração de madeira aumentam a inflamabilidade de grandes
áreas de floresta: é provável que mais de 10% das florestas da região
sejam inflamáveis em anos muito secos, tais como foram 1992 e 1998.
Padrões do fogo:
xii
3. Um estudo de campo realizado pelos autores e pesquisadores do
IPAM e do WHRC em 202 propriedades rurais (área total de 916.000
hectares), localizadas em cinco regiões ao longo do arco de
desmatamento da Amazônia, indicou que 77.600 hectares queimaram,
por ano, em 1994 e 1995, o que representou 8% da área total estudada.
As informações foram obtidas por meio de entrevistas com proprietários
rurais. A média da área queimada por propriedade foi de 19% da área
total. É importante salientar que 1994 e 1995 foram anos de seca
moderada.
xiii
Os impactos ecológicos do fogo
xiv
3. Os incêndios em áreas já desmatadas liberam grandes quantidades
de fumaça e partículas para a atmosfera, além de exportar nutrientes
dos ecossistemas agrícolas. Apesar de queimarem uma área duas vezes
maior que o total de queimadas de desmatamento e incêndios florestais
rasteiros, os incêndios e as queimadas em áreas já desmatadas não têm
um efeito tão grande sobre o fluxo líquido de carbono para a atmosfera.
xv
3. Os incêndios florestais rasteiros causam perda de madeira, caça,
cipós para construção, plantas medicinais, frutos da floresta e outros
produtos não-florestais. Esses prejuízos são potencialmente altos, mas
não documentados.
xvi
Esse mapa indicou que, em novembro de 1998, 5% das florestas
existentes na Amazônia brasileira (200.000 km2), estariam altamente
vulneráveis aos incêndios florestais rasteiros, uma vez que a água
disponível no solo para a absorção vegetal nestas florestas estava
totalmente esgotada até uma profundidade de cinco metros. Outros
200.000 km2 de floresta estavam com a água do solo no limite de
esgotamento no mesmo período.
xvii
como os diferentes usos da terra podem encorajar o controle e evitar os
prejuízos dos incêndios. Finalmente, tais estudos serviriam de base para
a formulação de mecanismos de integração das várias políticas públicas
que influenciam o rumo do desenvolvimento rural na Amazônia e,
assim, favorecer um caminho mais sustentável e menos propenso aos
incêndios.
xviii
5. Os incêndios na Amazônia apresentam um caráter “emergencial”
para a sociedade brasileira, somente em anos específicos, cada vez mais
freqüentes (tais como 1987, 1992, 1995, 1997 e 1998), quando uma
seca severa e/ou as atividades aceleradas de uso da terra aumentam de
maneira alarmante a sua ocorrência. A preocupação social com estes
incêndios, especialmente durante os anos de “emergência”, deve ser
direcionada para influenciar os processos políticos que alteram os
modelos de desenvolvimento da região a longo prazo. Somente no
contexto de uma abordagem coerente e não imediata será possível
reduzir, gradativamente, o uso do fogo pelos produtores rurais e
aumentar os investimentos para prevenir seus impactos negativos na
Amazônia.
xix
7. Muitas políticas atuais apóiam o modelo de desenvolvimento
extensivo da Amazônia. Projetos de infra-estrutura tornam áreas
remotas de floresta acessíveis à ocupação, e favorecem os tipos
extensivos de uso da terra que dependem de terra barata e do fogo
como principais ferramentas de manejo. Esses projetos, incluindo a
construção de estradas, hidrovias, redes de energia elétrica e a concessão
de áreas para mineração, devem ser avaliados por seus impactos na
demografia e nas práticas de uso da terra da região. De modo inverso,
os programas que protegem efetivamente grandes áreas de floresta nas
regiões das fronteiras de ocupação agrícola em expansão são
urgentemente necessários.
xx
Prefácio
xxi
Antes do ano de 1998, os incêndios na Amazônia eram particularmente
restritos às áreas utilizadas para agricultura ou pecuária. No início de 1980,
pesquisadores começaram a observar o risco do fogo alastrar-se para
florestas exploradas. No início da década de 90, essas florestas começaram
a queimar em larga escala. Porém, o fogo nunca se havia apresentado
como uma forte ameaça às florestas intactas. A seca de 1998 que seguiu
uma série de outras secas na década, sinalizou para uma penetração efetiva
de incêndios nos ecossistemas florestais intactos ao longo de grande parte
da região, e um possível início de um processo de perpetuação destes
tipos de incêndios, uma vez que florestas tropicais estão sendo substituídas
por vegetação mais propensa ao fogo.
Este livro traz uma análise pioneira e ampla dos incêndios na Amazônia
como agentes perturbadores da paisagem da região. As informações
contidas neste volume baseiam-se, em grande parte, em um estudo
contratado pelo Banco Mundial, em 1996, que examinou as causas do
aumento do desmatamento florestal e dos incêndios em cinco áreas ao
longo do arco de desmatamento da região amazônica. Escrito por um
grupo de cientistas do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
(IPAM) e do Centro de Pesquisa Woods Hole (WHRC), com a colaboração
de pesquisadores de diversas áreas e instituições, este livro investiga, em
detalhes, as origens e os impactos dos incêndios na Amazônia. Utilizado
pela população nativa durante milênios, o fogo é um componente antigo
da paisagem regional. Até recentemente, os seus impactos eram
geralmente localizados. Hoje, contudo, o fogo afeta os principais
ecossistemas na Amazônia e contribui com cerca de 4% a 5% do total de
carbono emitido para a atmosfera do planeta a cada ano.
xxii
que atingiram o estado de Roraima e chocaram o país. À primeira vista,
esses impactos parecem ser pequenos. O fogo rasteiro, ou de chão,
consome o material orgânico e o sub-bosque das florestas. Entretanto,
danifica a casca fina característica das árvores da floresta tropical, as
quais morrem lentamente durante o ano seguinte. O aumento da
mortalidade de árvores cria uma quantidade substancial de combustível
no chão da floresta e uma abertura gradual do dossel, reduzindo a
umidade no sub-bosque, a qual, normalmente, confere resistência das
florestas tropicais ao fogo. Como resultado, as florestas que são
ligeiramente queimadas por chamas rasteiras estão suscetíveis a
incêndios catastróficos durante a estação seca do ano seguinte. Essas
descobertas sugerem que os incêndios como o de Roraima podem vir a
ser mais devastadores no futuro.
xxiii
De acordo com os autores, o desafio-chave que confronta alternativas
políticas é que muitos dos benefícios da prevenção e do controle de
incêndios, tais como redução nas emissões de gases estufa, proteção da
biodiversidade, diminuição das enchentes e do processo de erosão do
solo e melhoria da qualidade do ar são contabilizados para a sociedade
como um todo, enquanto seus custos são arcados exclusivamente pelos
proprietários de terras. Mediante a aplicação de políticas sensatas e o uso
criterioso dos incentivos econômicos é possível que haja uma distribuição
mais equilibrada dos custos e dos benefícios. Finalmente, os autores
concluem que os incêndios Amazônicos não podem mais ser tratados
somente durante os anos de “emergência”, nem podem ser efetivamente
controlados unicamente por brigadas de combate a incêndios. Pelo
contrário, os incêndios devem ser vistos, hoje, como uma parte integral
das paisagens amazônicas, e as estratégias para combatê-los devem ser
iniciadas pelas comunidades locais da região, as quais já testam soluções
criativas para este problema.
Anthony Anderson
Banco Mundial
Brasília DF, Brasil
xviv
Lista de Siglas
xxv
INPA Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
INPE Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais
IPAM Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia
IPI Imposto sobre Produtos Industrializados
NAEA Núcleo de Altos Estudos Amazônicos
NASA Agência Nacional para o Espaço e Aviação
(Estados Unidos)
NOAA Administração Nacional Oceânica e
Atmosférica (Estados Unidos)
NSF Fundação Nacional de Ciência (Estados
Unidos)
PAGRI Programa de Apoio à Produção Agrícola em
Comunidades da Amazônia
PPG7 Programa Piloto para Conservação das
Florestas Tropicais Brasileiras
PROCERA Programa de Apoio à Reforma Agrária
PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da
Agricultura Familiar
PSU Pennsylvania State University
UFAC Universidade Federal do Acre
UFPa Universidade Federal do Pará
UnB Universidade de Brasília
USAID Agência dos Estados Unidos para o
Desenvolvimento Internacional
UW University of Washington
WHRC Woods Hole Research Center
xxvi
Lista de Colaboradores e Agradecimentos
Agradecimentos
xxvii
Davidson (WHRC), Robert Schneider (Banco Mundial), Carlos Nobre
(INPE/CPTEC), Alberto Setzer (INPE), Christopher Potter (NASA-
Ames), João Pereira (IBAMA), Oriana Almeida (IPAM), Thomas Stone
(WHRC), Bruce Nelson (INPA), Christopher Uhl (PSU/IMAZON),
George Woodwell (WHRC), Ricardo Tarifa (Banco Mundial), Renata
Alves (IPAM) Wendy Kingerlee (WHRC), Matthew Tobler (UC) e Erika
Pinto(IPAM).
xxviii
de previsão de risco de incêndio, RisQue98, foi feito com o auxílio da
NASA, do PPG7, da USAID, do NSF e do Pew Scholars Program in
Conservation and Environment. O trabalho que originou o regulamento de
queimadas da comunidade de Del Rey foi apoiado pela USAID, pelo
Fundo Moriah e CESE. Os estudos sobre os efeitos do fogo nas florestas
e mapeamento das cicatrizes do incêndio florestal baseado em satélites
foram apoiados pelo PPG7 e pelo USAID por meio do apoio financeiro
ao IMAZON e ao WHRC/IPAM, respectivamente.
xxix
1. O problema do fogo na Amazônia
31
Amazônia continuarem a depender do fogo para expandir as fronteiras
de ocupação e mantiverem os seus atuais sistemas agrícolas extensivos,
os remanescentes florestais serão continuamente empobrecidos pela
ação de incêndios que matam árvores e cipós e exterminam populações
de animais, além de tornar a floresta mais suscetível a futuros incêndios.
32
são usualmente promovidas no final da estação seca, quando as lavouras
são mais fáceis de queimar e as florestas estão mais vulneráveis. Quatro
quintos do desmatamento que acontece na Amazônia brasileira ocorrem
em regiões onde a estação seca é longa e severa (Figura 1). Os
colonizadores têm ocupado as margens sul da Amazônia, áreas de seca
sazonal, pelo fato dessas regiões serem acessíveis por estradas, por
estarem mais próximas aos locais de origem desses colonizadores no
Nordeste e no Sudeste do Brasil, e porque seus solos são geralmente
mais férteis do que aqueles do centro e nordeste, regiões relativamente
úmidas da Amazônia (RICHTER e BABAAR, 1991; COCHRANE e
SANCHEZ, 1982). Os proprietários de terra fazem suas queimadas no
final da estação seca, quando obtêm alto grau de combustão da biomassa
e grande produção de cinzas. No entanto, é justamente nessa época
que os outros tipos de vegetação estão mais vulneráveis ao fogo.
33
Figura 1 - Área desmatada na Amazônia brasileira (em vermelho). Nota-se como
grande parte do desmatamento está concentrada nas regiões onde há secas
sazonais. Durante a estação seca, a média diária de chuva é inferior a 1,5mm
(áreas florestadas em verde claro definidas pela linha isobárica). As letras (A. a
G.) representam os sítios de estudo referidos neste livro e que estão localizados ao
longo do “arco de desmatamento”. A) Paragominas, Pará; B) Santana do
Araguaia, Pará; C) Alta Floresta, Mato Grosso; D) Ariquemes, Rondônia; E) Rio
Branco, Acre; F) Santarém (Belterra), Pará; G) Marabá, Pará. As savanas e as
florestas decíduas (em amarelo, representando 14% da área total) foram separadas
das florestas perenifólias (75%) com base nos padrões sazonais da intensidade
do verde das florestas (“greenness”) determinado em imagens de satélite e em um
mapa da vegetação (STONE et.al., 1994).
34
Figura 2 - Imagem de satélite da região ao redor da cidade de Paragominas, Estado do Pará, leste da
Amazônia. Como acontece em muitas paisagens amazônicas, o fogo que escapa das áreas de pastagens
(azul e laranja) pode incendiar centenas de hectares de floresta. Neste mosaico composto por grandes
pastagens e áreas com florestas que sofreram extração seletiva de madeira, há poucas barreiras
naturais (florestas nativas) à propagação do fogo. Nessa imagem, obtida pelo satélite Landsat
Thematic Mapper (bandas coloridas 4, 5 e 7) em junho de 1993, nota-se que metade das florestas já
foi queimada (verde claro, com contorno em preto).
35
Figura 3 - Imagem do satélite Landsat TM (1995) da região de Ariquemes, Rondônia, destacando
100 hectares que foram divididos em lotes retangulares e dispostos ao longo das estradas vicinais. Com
a ocupação da terra feita por colonos ao longo das estradas, grandes áreas de lavoura e pastagem
contíguas são geralmente estabelecidas, de modo a facilitar a propagação do fogo através da propriedade
quando há um incêndio acidental. As florestas aparecem em verde escuro, enquanto áreas com
vegetação secundária estão em verde claro. As áreas com solo exposto e as áreas urbanas aparecem em
rosa e roxo, respectivamente.
36
Felizmente, a floresta alta e densa que entremeia as áreas abertas para
agricultura age como um aceiro ao longo da propriedade e impede que
a maioria dos incêndios agrícolas descontrolados se espalhe por grandes
áreas. Mesmo no auge da estação seca, essas florestas altamente
resistentes à seca bloqueiam o fogo, uma vez que o seu interior sombreado
mantém a umidade das folhas e dos galhos mortos depositados no chão
(HOLDSWORTH e UHL, 1997; NEPSTAD et al., 1994, 1995; UHL et
al., 1988a; UHL e KAUFFMAN, 1990). Mas essa função benéfica das
florestas é prejudicada quando operações de exploração de madeira abrem
clareiras no dossel que permitem que a luz solar penetre através da
copa e chegue ao chão, levando à secagem das folhas e dos galhos e
gerando, dessa forma, condições propícias à propagação do fogo. Mesmo
as florestas não-exploradas tornam-se inflamáveis em anos em que as
secas são particularmente severas. O esgotamento da água no solo induz
à queda de folhas e a aberturas no dossel, aumentado o material
combustível no chão e a penetração de raios solares (NEPSTAD et al.,
1995, 1998).
37
sentido economicamente se os benefícios gerados pela proteção
conferida às lavouras, aos pastos, às cercas ou à madeira forem maiores
que os custos de sua execução, ou se o usuário da terra tiver a certeza
de que irá enfrentar multas pesadas por danificar as propriedades
vizinhas ou causar impactos ambientais mais extensos. Os benefícios
econômicos da prevenção de incêndios podem ser muito poucos,
principalmente nos estágios iniciais de desenvolvimento das fronteiras
de ocupação, quando a terra (e a floresta) é abundante e a produtividade
é baixa. Se a madeira já foi extraída da floresta, ou se uma pastagem
está excessivamente degradada e improdutiva ou, ainda, se a produção
é baseada principalmente nas culturas de subsistência, pela prática da
agricultura, então os prejuízos diretos associados aos incêndios podem
ser relativamente baixos do ponto de vista econômico. Nesse contexto,
os prejuízos para a sociedade resultantes da queima da floresta não são
levados em conta. Na perspectiva do produtor agrícola, o investimento
na prevenção de incêndios faz mais sentido quando acompanha outros
investimentos na terra, tais como: cercas, plantação de árvores, manejo
florestal e reforma de pastagens. A prevenção e o controle dos incêndios
também são levados mais a sério quando existe uma probabilidade real
do responsável sofrer multas pesadas, o que não é o caso na Amazônia.
38
isoladas, o que torna difícil identificar como se iniciaram, quais prejuízos
causados e quem são os responsáveis por eventuais danos às
propriedades e aos ecossistemas.
39
40
2. A inflamabilidade da floresta
41
As florestas também são menos inflamáveis devido ao microclima úmido
e sombreado do seu interior. Até 98% da luz solar que intercepta o
dossel da floresta tropical úmida, por exemplo, não chega a alcançar a
camada de combustível fino no chão (CHAZDON et al., 1996;
FETCHER et al., 1985; NEPSTAD et al., 1996 b). A maior parte da
luz solar é absorvida ou refletida pelo dossel. Se o ar é úmido, como
usualmente o é nas regiões de floresta tropical, a camada de combustível
fino somente perderá umidade e se tornará inflamável quando a
temperatura for alta o suficiente para reduzir a umidade relativa do ar.
Como veremos na próxima seção, o determinante crítico de
inflamabilidade das florestas na Amazônia é a interação entre o
sombreamento produzido pelo dossel da floresta e o teor de umidade
da camada de combustível fino.
As florestas de Paragominas
42
Como ensinam os textos clássicos (JORDAN, 1985, RICHARDS,
1952), as raízes das florestas tropicais são superficiais e extensas. Se
isso fosse verdade para as florestas de Paragominas, a água estocada no
metro superior do solo já teria se esgotado há várias semanas, antes do
final do período de estiagem. As folhas cairiam, formando uma camada
grossa sobre o solo, e secariam rapidamente pela ação da luz solar que
atravessaria as copas nuas das árvores. Após um período de seca, essa
floresta assemelharia-se a um barril de pólvora!
43
Figura 4 - Água armazenada no solo e disponível para as plantas, por intervalo de profundidade, em
áreas de florestas intactas ( ), floresta secundária de 15 anos de idade, crescendo onde anteriormente
havia pastagens abandonadas ( ), e pastagem degradada ( ) da Fazenda Vitória, Paragominas,
Pará. O volume de chuva diário é exibido no quadro inferior. Este gráfico ilustra como o esgotamento
da água do solo abaixo de 4 metros da profundidade nas florestas intacta e secundária ocorrido
durante a estação seca (maio - novembro) de 1991 persistiu até a estação chuvosa de 1994. Neste
período, o volume médio de chuvas ficou abaixo daquele registrado em 1992 e 1993. Essa seca
interanual levou a floresta primária próximo ao limiar de inflamabilidade, abaixo do qual há um
esgotamento da umidade do solo suficiente para provocar o desprendimento das folhas, criando assim
condições para que o fogo se propague, caso ocorra um incêndio. Adaptado de Jipp et al., 1998.
44
Figura 5 - Taxa de redução da umidade contida na liteira durante um intervalo de 14 dias sem chuvas
em áreas de floresta primária ( ), secundária ( ), explorada ( )e pastagem ( ) da Fazenda
Vitória, Paragominas, Pará. Note que a perda de umidade da liteira na floresta primária acontece a
uma taxa bem menor que aquela registrada na pastagem e essa perda é intermediária nas florestas
explorada e secundária. A camada de folhas mortas que cobre o chão pode pegar fogo somente quando
o seu teor de umidade ultrapassa o limite de 15% (linha horizontal). A pastagem pode, portanto,
pegar fogo após um dia sem chuva, enquanto a floresta requer semanas de estiagem para se tornar
inflamável. Já para a floresta explorada, este tempo é de uma a duas semanas. Fonte: Uhl e Kauffman,
1990.
45
Por outro lado, durante períodos de seca severa, a floresta pode bombear
e exaurir toda a água disponível no solo até profundidades superiores a
5 metros, provocando um estresse hídrico nas árvores, a ponto de induzir
o murchamento das folhas que, seguida, caem aumentando a
suscetibilidade ao fogo. No El Niño de 1992, realizamos um estudo na
floresta de Paragominas que demonstrou um esgotamento da água do
solo disponível para as plantas até a profundidade de 8 metros (Figura
4). Algumas das espécies de árvores estudadas apresentaram um súbito
aumento no estresse hídrico. Houve um desequilíbrio no balanço hídrico
dessas espécies e a absorção de água pelas raízes foi inferior à quantidade
perdida pela transpiração das folhas (Figura 6). A área foliar baixou em
85% do valor máximo obtido no período chuvoso (Figura 6). No final
do período seco (novembro), essa floresta estava no limite de
inflamabilidade.
46
Figura 6 - As florestas primárias da região de Paragominas, Estado do Pará, podem pegar fogo se uma
estiagem severa provocar o desprendimento das folhas e a secagem da liteira. Por exemplo, durante a
estação seca de 1992 (e), a qual foi agravada pela ocorrência de El Niño, o esgotamento da água
disponível para as plantas no solo da floresta primária só provocou o desprendimento das folhas das
árvores quando atingiu uma profundidade de 8 metros (outubro) (a e b). Já as florestas secundárias e
as pastagens perderam suas folhas mais cedo (abril) (c). Ao longo da estação seca, a floresta
foirapidamente desenvolvendo um severo estresse hídrico, como indicado pela queda acentuada do
potencial da água das folhas (d). Adaptado de Nepstad et al., 1994, 1995.
47
em treze anos de observações de campo, essa floresta tornou-se
inflamável. Durante um período de sete meses, iniciado em 6 de maio,
a precipitação não ultrapassou os 90 mm. Durante esse mesmo período,
aproximadamente 800 mm de água foram removidos do solo e lançados
na atmosfera pelas folhas por meio do processo de evapotranspiração,
caracterizando um desequilíbrio hídrico enorme. Além disso, durante
um período de oitenta dias, começando em 12 de agosto, não choveu
uma única vez em Paragominas. Mesmo antes do auge da estação seca,
a floresta já estava inflamável. Por meio de fogos experimentais
realizados no interior da floresta, foi possível verificar que o fogo podia
espalhar-se rapidamente. Nessa seca de 1997, a área foliar da floresta,
que tinha chegado a cerca de 85% do seu valor máximo durante o evento
do El Niño de 1992 (Figura 6), atingiu o valor de 75%. O déficit entre
a absorção de água pelas raízes e sua perda pelas folhas, gerou altíssimas
tensões no interior dos tecidos condutores nos troncos de árvores e
cipós e teve como conseqüência, a rápida perda de folhas.
48
julho de 1997 e maio de 1998 e as médias que caíram em outros anos
(Figura 7). Em abril de 1998, a ocorrência de chuvas em três localidades
geograficamente distantes (> 1.000 km) foi de 500 a 1.200 mm abaixo
das médias destas áreas.
49
Figura 7 - Os eventos de El Nino estão usualmente associados às reduções de chuva em grande parte
da região Amazônica. Durante o El Nino de 1997/1998, a chuva acumulada (faixa escura) ficou
muito abaixo da média registrada em anos de chuvas normais (faixa cinza) em cidades como Belterra,
Belém e Marabá. Em Belterra, o volume de chuva ficou 1.000 mm abaixo da média para o período de
nove meses, a partir de julho de 1997. Fonte: Centro de Previsão Climática/NOAA.
50
Meggers (1994) verificou que as idades do carvão de San Carlos
correspondem a descontinuidades no padrão da cerâmica produzida
pelas populações indígenas da Amazônia e a inundações ao longo da
costa peruana (onde as oscilações do El Niño provocam chuvas mais
intensas). Esta autora defende a hipótese de que eventos de “Mega-
Niño” ocorreram há aproximadamente 400, 700, 1.000 e 1.500 anos e
que esses eventos provocaram períodos de estiagem na Amazônia
severos o bastante para causar grandes incêndios, esgotamento da água
e uma consequente dispersão das populações indígenas. Ela argumenta,
ainda, que essas transformações sofridas pelas sociedades pré-
colombianas provocaram a diversificação dos padrões de cerâmica e
linguagem. Essa evidência de incêndios catastróficos em séculos recentes
é um alerta para os atuais habitantes da Amazônia: o fogo ainda tem o
potencial de transformar profundamente as sociedades humanas na
região.
51
Embora os métodos usados para extrair a madeira das florestas sejam
“seletivos” isto é, somente um reduzido número de árvores é aproveitado
em cada local, eles aumentam de modo significativo a suscetibilidade
dessas florestas ao fogo. A forma mais comum de extração de madeira
é iniciada por mateiros que fazem a marcação das árvores adultas, das
espécies comerciais desejadas. Em seguida, uma outra equipe de
serradores corta somente as árvores previamente marcadas. Os tratores
de esteiras, então, entram na floresta e arrastam as árvores derrubadas
para um pátio de estocagem construído no interior da floresta. Este
pátio é conectado a rodovias estaduais ou federais por uma rede de
estradas de terra, e é grande o suficiente para que caminhões sejam
carregados com as toras (Figura 8). A palavra de ordem nessas operações
de exploração é “velocidade”. As serrarias precisam garantir madeira
suficiente para que continuem funcionando, mesmo durante a estação
chuvosa, quando os solos argilosos tornam-se escorregadios e impedem
que os caminhões cheguem até os pátios. Uma vez que, geralmente, a
área onde se dá a exploração não pertence ao proprietário da serraria e/
ou a perspectiva de uma segunda ou terceira extração no mesmo local
é remota, há pouca preocupação em evitar desperdícios durante a
operação de extração (JOHNS et al., 1996). Há, por exemplo, pouco
cuidado com o dano causado às árvores vizinhas quando uma árvore é
extraída. Pelo fato das árvores na floresta estarem amarradas umas às
outras por cipós, várias são arrancadas quando apenas uma é derrubada.
Além disso, outras são esmagadas ou danificadas durante a queda.
Estima-se que mais de vinte árvores sofrem sérios danos para cada
árvore comercial que é extraída (UHL e VIEIRA, 1989). O desperdício
é resultado também da falta de planejamento antes da extração. As
árvores selecionadas para corte são raramente mapeadas. Os tratores
partem numa “busca cega” pelas árvores derrubadas e abrem o dossel
da floresta muito mais do que o necessário.
52
Figura 8 - Floresta recém-explorada por madeireiros
na Fazenda Vitória, próximo à cidade de
Paragominas, Pará. Esta floresta queimou um
mês após a fotografia ser tirada. Durante a
exploração da madeira, o dossel foi reduzido pela
abertura de clareiras, geralmente utilizadas para a
estocagem de madeira a ser transportada por
caminhões até as serrarias. Uma vez explorada,
grande quantidade de material combustível fica
depositada no chão e passa a receber a luz do sol
que entra pelo dossel rarefeito (Foto: D. Nepstad).
53
Tabela 1 - Quantidade (T / ha) de material combustível (liteira e madeira) de diferentes
ambientes na Fazenda Vitória, Paragominas, Pará. Os valores representam a média (±
EP*) para cada ambiente. Fonte Uhl and Kauffman, 1990.
54
abaixo do limiar de inflamabilidade (aproximadamente 15%, UHL e
KAUFFMAN, 1990) após cinco a seis dias sem registros de chuva,
enquanto na floresta primária manteve-se acima do limiar , mesmo após
quatorze dias sem chover (Figura 5).
55
O exemplo mais extremo de extração de baixa intensidade e com efeitos
reduzidos sobre a inflamabilidade é a extração do mogno. A extração
desta espécie atinge somente 5 m3 de madeira por hectare versus 30 m3
a 40 m3 por hectare nos métodos de extração intensivos (VERÍSSIMO
et al., 1995). Dado que as árvores de mogno são agrupadas, os efeitos
da extração na inflamabilidade da floresta são muito localizados, e a
maior parte da floresta fica inalterada em sua vulnerabilidade ao fogo.
O problema com a extração do mogno reside, contudo, na ameaça que
representa à sobrevivência da espécie. O mogno torna-se cada vez mais
raro na Amazônia.
56
Figura 9 - Incêndio florestal rasteiro queimando a
camada de liteira no interior de uma floresta explorada
próxima à cidade de Tailândia, Pará, Brasil. Os teores
de umidade do combustível depositado sobre o chão são
elevados no interior da floresta, e, por essa razão, a
altura das chamas é baixa. Os incêndios que queimam
as copas são raros nas florestas Amazônicas (Foto:
M. Cochrane).
57
Figura 10 - Incêndios florestais rasteiros percorrem o chão da floresta de forma irregular e deixam
ilhas de vegetação não-queimada. Isso ocorre particularmente onde o dossel é alto e fechado. Nesse
desenho é possível visualizar o efeito de um incêndio ocorrido em 1992 em uma área de 50 X 200m de
floresta da Fazenda Vitória em Paragominas, Pará. As classes de cobertura incluem floresta alta (15-
30 metros), floresta baixa (6-15 metros, altamente coberta com cipó), clareira (áreas onde árvores
foram extraídas) e áreas queimadas (onde o fogo queimou a camada de liteira). Fonte: Holdsworth e
Uhl, 1997.
58
sucessivo na inflamabilidade de florestas exploradas da região central
do Estado do Pará (próximo a Tailândia) em função de incêndios
recorrentes. Ao contrário de uma floresta nunca antes incendiada, que
requer semanas sem chuva para tornar-se inflamável, aproximadamente
metade da área de uma floresta que já sofreu incêndio rasteiro fica
inflamável apenas com nove a dezesseis dias de estiagem. Com a
reincidência do fogo, virtualmente toda a área da floresta pode incendiar-
se após nove dias sem chuva (Figura 11). Portanto, um dos mais
importantes efeitos do incêndio florestal de larga escala é o aumento
da suscetibilidade dessas florestas aos incêndios subsequentes (Seção
3.7).
59
Figura 11 - A cada queima sucessiva, o dossel da floresta torna-se mais aberto e permite a penetração
de uma quantidade maior de luz solar que promove uma rápida secagem da camada de combustível fino
depositado sobre o chão. Somente uma floresta não-queimada pode suportar mais de dezesseis dias sem
chuva antes de estar seca o suficiente para pegar fogo. Contudo, somente 4% de uma área de floresta
queimada intensamente pode resistir ao fogo durante igual período de estiagem. Mais de 90% da
floresta queimada intensamente pode pegar fogo com menos de nove dias após o último evento de chuva.
Dados obtidos em florestas próximas a Tailândia, Estado do Pará. Fonte: Cochrane e Schulze,
1999.
60
3. A Amazônia está queimando
A superfície da terra é fotografada duas vezes por dia pelos dois satélites
meteorológicos NOAA,1 ambos orbitando a 850 quilômetros de altitude.
Embora esses satélites tenham sido desenhados para fornecer
informações sobre padrões climáticos, vêm sendo usados como uma
ferramenta importante para monitorar ocorrência de fogo em grandes
regiões como a Amazônia. Os recursos desses satélites são capazes de
registrar a energia que está sendo emitida e/ou refletida pela superfície
1
Estes satélites meteorológicos são operados pela Agência Americana para Oceanos
e Atmosfera (NOAA) e carregam um sensor chamado AVHRR (Advanced Very
High Resolution Radiometer).
61
da terra, em vários comprimentos de ondas, inclusive o infravermelho
(3,55 - 3,93 micrômetros), que pode ser usado para estimar a
temperatura da superfície da terra. Dado que a fonte mais comum de
altas temperaturas na superfície da terra é o fogo, os dados dos satélites
NOAA podem ser usados para criar mapas diários de focos de calor
ativos, por meio de um programa de computador que identifica as áreas
na superfície terrestre onde a temperatura excede um determinado nível
(SETZER e PEREIRA, 1991; MALINGREAU e TUCKER, 1988;
MATSON et al., 1984; e MATSON e DOZIER, 1981).
Os mapas que podem ser produzidos a partir dos dados colhidos pelos
satélites proporcionam uma ilustração dramática da magnitude do fogo
na Amazônia (Figura 12) e são a base do programa do governo brasileiro
que monitora as queimadas (SETZER et al., 1988). Ao avaliarmos o
número total de focos registrados pelos satélites durante a estação de
queimadas de 1997 (de junho a novembro), uma zona de alta freqüência
de focos pode ser vista no leste e no sul da Amazônica, onde a maioria
dos desmatamentos tem ocorrido (Figura 1). Em algumas células (pixels)
deste mapa,2 foram registrados 790 focos de incêndio em 1997, em
uma área de aproximadamente 256 km2 (16 x16 km). Isto representa
mais de três focos por quilômetro quadrado e foram particularmente
comuns nas áreas próximas a Marabá, no leste do Pará, e Cuiabá, no
norte de Mato Grosso.
62
Figura 12 - Focos de incêndio detectados pelos satélites NOAA e registrados em mapas diários. A
sobreposição destes mapas permite a visualização da concentração anual de focos na Amazônia ao
longo das porções leste e sudeste da região. Tais mapas proporcionam registros importantes sobre a
localização de incêndios ativos, mas fornecem pouca informação sobre o que está queimando, a quem
pertence a terra que está sofrendo a queimada e quais os seus efeitos. O tamanho das células de
registros é de 256 km2 (15 X 15 km). Fonte: INPE.
63
direta do número de focos de fogo da área queimada. Uma vez que os
dados são registrados como células ou pixels de 1,1 x 1,1 km, não é
possível saber o tipo de vegetação que se está queimando, a menos que
o incêndio seja registrado em uma região onde haja grandes extensões
de floresta homogênea ou pastagens que cubram várias células. Estes
dados subestimam a área queimada e o número de incêndios por várias
razões. É improvável que incêndios florestais rasteiros sejam detectados
por essa técnica de mapeamento, já que ocorrem sob o dossel da floresta
e, portanto, permanecem invisíveis aos “olhos” dos satélites. Múltiplos
focos, que ocorrem na mesma célula de 1,1 x 1,1 km, são registrados
como um só. A fumaça ou as nuvens podem, também, esconder focos
ativos, o que evita que os satélites os registrem. Por outro lado, existem
maneiras pelas quais esses mesmos dados superestimam a área queimada.
Os focos associados com desmatamento recente ou queima de pastagem
podem deixar cinzas incandescentes, as quais são registradas como um
incêndio ativo, mesmo depois de extinto. Pequenos focos também podem
exceder o limiar da temperatura estabelecido pelo programa de
computador que faz o mapeamento. Essas limitações dos dados obtidos
pelos satélites NOAA são resumidas por SETZER e PEREIRA (1991)
e ROBINSON (1989, 1991), que apontam para a necessidade de mais
fontes de informação.
64
espectrais. Dado que esses satélites requerem de quatorze a dezesseis
dias para dar a volta em torno da terra, as imagens por eles produzidas
não úteis são para monitorar focos ativos. No entanto, são adequados
para mapear as cicatrizes deixadas na vegetação pelos incêndios. As
florestas que sofreram incêndios rasteiros, por exemplo, são facilmente
distinguidas das florestas que nunca foram queimadas devido à perda
de folhas e das cinzas depositadas sobre o solo (Figura 13). Essas
cicatrizes são mais facilmente visualizadas nos primeiros meses após o
incêndio, antes das espécies pioneiras se restabelecerem, podendo ser
detectadas por, no mínimo, um ano após a ocorrência do fogo (seção
3.4).
65
Figura 13 - Durante o primeiro ano após um incêndio florestal rasteiro, é possível visualizar as
“cicratizes de fogo” a partir de imagens do satélite Landsat TM, por meio de uma técnica especial de
intensificação de contrastes. As quatro imagens nesta figura (20 x 20km), obtidas de uma área
próxima a Paragominas, Pará, mostram a degradação cumulativa da floresta devido ao incêndio
rasteiro durante um período de onze anos. As imagens de 1984 e 1993 mostram “cicatrizes” extensas
(roxa e rosa) de incêndios provocados pela estiagem relacionada a episódios de El Nino nos anos
anteriores. As áreas de pastagens e outras não-florestadas estão em preto.
66
campo, definimos uma terminologia que enquadra os tipos de fogo em
três categorias principais (Tabela 3): “Queimadas ou incêndios para
desmatamento” são aqueles estabelecidos geralmente de forma
intencional e associados ao corte e à queima de florestas para plantio
agrícola e/ou formação de pastagens. “Incêndios florestais rasteiros”
são aqueles fogos que queimam a camada de combustível depositada
no chão de florestas primárias ou exploradas. “Queimadas e/ou
incêndios em áreas já desmatadas” são resultantes do fogo intencional
(queimadas) ou acidental (incêndios) em pastagens, lavouras e capoeiras.
67
Tabela 3 - Os principais tipos de incêndios da Bacia Amazônica
68
Figura 14 - Agricultores da Amazônia praticando a agricultura tradicional de corte e queima. Após
a derrubada, a floresta é queimada e a área é preparada para o plantio. a) Família preparando a terra
para o plantio de arroz na comunidade de Del Rey, próxima à cidade de Paragominas, Pará; b)
agricultor mostrando alguns de seus produtos. Fotos: a) M. M. Mattos e b) D. Nepstad.
Figura 15 - As fases iniciais do ciclo da agricultura de corte e queima. a) A área florestada é cortada
e deixada para secar. Algumas árvores não são derrubadas por serem úteis ao agricultor (por exemplo,
árvores frutíferas) ou por abrigarem ninhos de vespa. Outras permanecem em pé por apresentarem risco
do agricultor ser atingido por galhos durante a derrubada. b) Próximo do final da estação seca, a área
é queimada. As árvores mortas que permanecem em pé durante a queima podem pegar fogo e emitir
faíscas a longas distâncias ou ainda servirem como “pontes” para o fogo sobre os aceiros. Dessa forma,
a permanência destas árvores aumenta o risco do fogo alcançar os ecossistemas vizinhos (Comunidade
de Del Rey, próximo a Paragominas, Pará). Foto: a) Kátia Carvalheiro e b) Daniel Nepstad.
69
floresta é derrubada e queimada pelas famílias de agricultores carentes
da Amazônia para que haja garantia de continuidade na produção de
subsistência.
70
A agricultura de corte e queima em uma área de floresta primária,
explorada ou secundária (capoeira em campos agrícolas abandonados),
varia em função da disponibilidade dos diferentes tipos de floresta, da
distância até as serrarias, da disponibilidade de mão-de-obra e do cultivo
desejado. As florestas primárias e exploradas requerem mais mão-de-
obra para serem derrubadas se comparadas às florestas secundárias.
Contudo, necessitam menos mão-de-obra para capina durante o período
de crescimento das culturas. O arroz cresce melhor em solos preparados
a partir de floresta primária, enquanto o milho cresce melhor em solos
preparados a partir de capoeira (TONIOLO et al., dados não
publicados).
71
Figura 16 - No leste da Amazônia, as pastagens de gado são reformadas raspando-se a superfície do
solo e removendo-se a vegetação (geralmente infestada por ervas daninhas) com auxílio de tratores de
esteira. Todo o material removido é depositado nas leiras. O solo em seguida é arado e fertilizado, antes
que o plantio seja feito. Atualmente, a grande maioria dos fazendeiros planta Brachiaria brizantha
como gramínea de pasto. O acesso a maquinário pesado permite que estes fazendeiros evitem o uso do
fogo no controle de ervas daninhas (Fazenda Vitória, Paragominas). Foto: D. Nepstad.
72
Os incêndios florestais rasteiros
73
As queimadas em áreas desmatadas: o manejo de pastagens
74
adjacentes. Após a queimada do capim, é necessário aguardar três ou
quatro meses durante a estação chuvosa, para que cresçam o suficiente
sustentar o gado. Este período de “descanso” pode ser particularmente
importante para a Brachiaria brizantha (braquiarão), a espécie de gramínea
que atualmente forma a maioria dos pastos na Amazônia. As pastagens
não-queimadas podem ser pastoreadas durante todo o ano. A longo
prazo, o uso do fogo pode diminuir bastante a produtividade das
pastagens devido a redução do nível de nutrientes no solo. Quando
essas áreas são queimadas, grandes quantidades de nitrogênio, fósforo
e outros nutrientes são volatilizadas e liberadas para a atmosfera
(BUSCHBACHER et al., 1988; DIAS FILHO et al., no prelo;
KAUFFMAN et al., 1995, 1998).
75
partículas incandescentes, que são lançadas a grandes distâncias. Tais
pastagens têm geralmente poucas árvores mortas em pé, e os incêndios
podem ser contidos usando aceiros. A queimada nessas pastagens
também pode ser contida pela técnica do contrafogo, que consiste em
atear fogo a favor do vento no lado oposto da frente do fogo, já
estabelecida (ver Apêndice II).
76
Figura 17 - Plantação de teca (Tectona grandis) com um ano de idade, estabelecida em uma pastagem
degradada próxima à cidade de Redenção, Estado do Pará. Todo o plantio foi perdido devido a um
incêndio florestal. A ameaça anual das queimadas desencoraja o investimento dos proprietários de
terra em culturas perenes rentáveis, tal como espécies madeireiras, por serem estas geralmente sensíveis
ao fogo. Foto: D. Nepstad.
77
Metodologia
78
Tabela 4 - Resumo das características básicas das propriedades estudadas para determinação
das áreas atingidas pelos diferentes tipos de fogo.
79
Figura 18 - Chuva mensal para os anos de 1994 e 1995 registrada em cinco áreas selecionadas na
pesquisa, coordenada pelo IPAM (veja texto para detalhes) Cada uma das áreas tem uma estação seca
pronunciada, como é típico das porções leste e sudeste da Amazônia, onde o uso da terra é concentrado.
As chuvas da estação seca foram menores em 1995 que em 1994 para Paragominas, Alta Floresta e
Rondônia.
80
Os mapas com localização e limites das propriedades foram obtidos
para cada sub-região3 e sobrepostos a imagens de satélites (por exemplo,
Figura 3). As propriedades foram selecionadas ao acaso e estratificadas
em quatro classes de tamanho, em uma distribuição aproximada dos
tamanhos para cada um dos municípios estudados, seguindo informações
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (IBGE 1985). Um
total de 202 propriedades foram selecionadas, correspondendo a uma
área de 916.257 hectares (Tabela 4).
3
Os mapas dos limites das propriedades foram obtidos nos órgãos do governo
local ou nos escritórios de programas de colonização.
81
Tabela 5 - Área total queimada (%) por diferentes tipos de incêndio nos anos de 1994 e
1995 em 202 propriedades rurais (veja detalhes no texto) na Amazônia Brasileira. Os
valores em ha representam a área total amostrada no estudo.
Tabela 6 - Porcentagem média de cada propriedade (veja detalhes no texto) que queimou
durante os anos de 1994 e 1995, em cinco regiões da Amazônia Brasileira. Os valores são
médias e erro padrão (± EP).
82
base na média das taxas relatadas por cada proprietário, a porcentagem
sobe para valores entre 8% e 20%, dependendo da região e do ano
(Tabela 6). Esse aumento pode ser explicado pelo fato de que a
porcentagem da área queimada anualmente em cada propriedade
diminui com o aumento do tamanho da propriedade.
83
Tabela 7 - Porcentagem de proprietários entrevistados (veja detalhes no texto) que
informaram a ocorrência de fogo em suas terras durante os anos de 1994 e 1995, na
Amazônia Brasileira.
Tabela 9 - Porcentagem média (± Erro Padrão) da área de cada propriedade que foi
queimada e da área total em cinco regiões da Amazônia Brasileira, durante os anos de
1994 e 1995. Os valores foram ordenados por tipos diferentes de incêndio. Veja texto
para detalhes.
84
propriedades. Em cada ano, entre um terço e um quarto dos proprietários
reportaram queimadas de desmatamento (Tabela 10).
85
Tabela 10 - Porcentagem de proprietários de terra que informaram a ocorrência de incêndios
em suas propriedades durante os anos de 1994 e 1995. Os valores foram ordenados por
tamanho de propriedade e por tipo de incêndio.
ser estudado para determinar, com maior exatidão, a real extensão das
áreas atingidas por esse tipo de fogo.
86
Landsat TM. Ambos os fatores podem ser relevantes, mas é nítido que
os incêndios florestais rasteiros estão em franca ascensão.
A taxa média de área queimada por propriedade foi mais alta para fogo
intencional em áreas já desmatadas (6,8%) do que para fogo acidental
(4,2%) (Tabela 9), devido à maior freqüência de incêndios acidentais nas
propriedades grandes. A cada ano, uma média de 35% das propriedades
estudadas sofreram pelo menos um fogo acidental em área já desmatada,
enquanto uma média de 29% dos proprietários colocaram fogo
intencionalmente em áreas já abertas (Tabela 10). Não é surpresa que
87
95% da área já desmatada que queimou por ano foi representada por
pastagens. As pastagens são o tipo mais comum de vegetação nas
paisagens ocupadas, e durante a estação seca ficam vulneráveis ao fogo
com apenas um ou dois dias sem chuva (UHL e KAUFFMAN, 1990).
88
a)
b)
Figura 19 - Extensão da área atingida por quatro tipos de incêndio em 202 propriedades distribuídas
em cinco regiões ao longo da fronteira de ocupação amazônica. As informações foram obtidas a partir
de questionários aplicados aos proprietários de terra. Os resultados são apresentados por classes de
tamanho das propriedades: pequena (<100 hectares), média (101 a 1.000 hectares), grande (101 a
5000 hectares) e muito grande (>5000 hectares). a) Quando a área queimada é expressa como a
porcentagem do tamanho da propriedade, as pequenas (<100 hectares) sofreram mais incêndios se
comparadas às grandes propriedades. b) Em termos absolutos (hectares por propriedade), contudo, os
grandes proprietários queimam uma área bem maior que os pequenos.
89
Tabela 11 - Porcentagem média (± Erro Padrão) de cada propriedade que queimou
anualmente por diferentes tipos de incêndios em cinco regiões da Amazônia Brasileira
(1994 a 1995).
pequenas (3,3% por ano) que nas propriedades grandes (1,3% a 2,3%
por ano, Tabela 11).
90
grandes, onde afetou menos de 2% (Tabela 11). Os proprietários
entrevistados informaram que a maioria das queimadas acidentais
tiveram origem em terras vizinhas, independente da classe de tamanho
da propriedade. Nas propriedades muito grandes, somente 3% da área
já desmatada queimada acidentalmente foi devido ao fogo proveniente
do interior da própria propriedade; esta porcentagem eleva-se para 28%
nas pequenas propriedades (Figura 20). O fogo que atingiu as
propriedades foi proveniente de queimadas em pastagens, queimadas
de desmatamento em áreas vizinhas e fogo nas margens das estradas
(Figura 20). É importante salientar que os proprietários entrevistados
tinham fortes razões para não identificar os culpados pelo fogo, devido
ao receio de possíveis penalidades. Não se pode assim, imaginar nenhum
motivo para que os proprietários admitissem a responsabilidade pelo
fogo acidental, a não ser o desejo de serem honestos.
91
Figura 20 - As diferentes origens dos incêndios acidentais, como informado por 202 proprietários de
terra distribuídos entre cinco municípios ao longo da fronteira de ocupação da Amazônia. A ampla
maioria da área queimada acidentalmente foi atribuída a fontes externas, incluindo incêndios nas
margens das estradas, queimadas para o desmatamento e em pastagens vizinhas.
92
As queimadas para desmatamento
93
Quadro 1. O empobrecimento crítico das florestas Amazônicas por meio de
incêndios rasteiros e exploração madeireira: o caso de Paragominas.
Como medir o impacto das atividades humanas nas florestas da Amazônia? As taxas de
desmatamento, obtidas a partir de imagens de satélites, têm sido amplamente aceitas
para monitorar a influência antrópica sobre a floresta. Contudo, essas taxas não revelam
alguns dos efeitos ligados às atividades humanas. As equipes de exploração de madeira
que operam sob a floresta, por exemplo, derrubam e danificam árvores, aumentando a
vulnerabilidade da floresta a incêndios rasteiros, que resultam na morte de um grande
número de árvores e animais, além de tornar a floresta mais susceptível a novos incêndios
no futuro (Seção 2.4 e 3.7). No entanto, a exploração de madeira e o incêndio rasteiro
estão excluídos do programa brasileiro para monitoramento do desmatamento, descrito
na Seção 3.4. A magnitude do problema revela-se, combinando informações sobre a
exploração madeireira e os incêndios rasteiros, adquiridas por meio do estudo nas
propriedades rurais e da análise de imagens de satélite para a região de Paragominas, na
Amazônia Oriental. Nessa fronteira de mais de trinta anos de ocupação, as técnicas de
monitoramento do desmatamento utilizadas pelo INPE indicam que um terço da
floresta foi desmatada (Figura 21 a). Porém, quando a mapeamos, com base em entrevistas
e em trabalho de campo, as áreas de floresta que foram exploradas ou queimadas por
incêndios rasteiros, verificamos que 94% das florestas dessa região foram severamente
afetadas pela atividade humana e estão altamente vulneráveis a futuros incêndios (Figura
21 b, NEPSTAD et al., 1999).
94
Figura 21 - As estimativas de desmatamento feitas pelo governo brasileiro (INPE 1997) proporcionam
boas informações sobre o tipo de queimada florestal mais prejudicial: aquela associada ao corte e à
queima da floresta. A exploração madeireira e o fogo de chão também afetaram profundamente as
florestas da Amazônia, mas não estão incluídos nos mapeamentos do desmatamento. Na imagem (a)
superior do satélite Landsat, a região de Paragominas foi mapeada como desmatada (amarelo) e
florestada (verde), por meio das técnicas que são usualmente empregadas pelo INPE (INPE 1997).
Por esta análise, estima-se que 66% da região de Paragominas ainda mantém florestas intactas.
Contudo, quando adicionamos aos dados do INPE a área afetada por fogo, estimada mediante
entrevistas realizadas pelo IPAM com os proprietários de terra da região (veja texto para detalhes) e
aquela que sofreu exploração madeireira (identificadas pelas cicatrizes da exploração nas imagens de
satélites), a área coberta por floresta intacta fica reduzida a, aproximadamente, 6% (NEPSTAD
et al., 1999).
95
o INPE utiliza imagens do satélite Landsat Thematic Mapper4 para
medir a área dos desmatamentos na Amazônia brasileira. Os
desmatamentos são identificados pela inspeção visual das imagens e
são manualmente traçados em papel. Para estimar a taxa anual de
desmatamento, os traçados dos anos anteriores são sobrepostos às
imagens mais recentes do Landsat, e as áreas novas identificadas são
adicionadas ao desenho. Os contornos dos desmatamentos são
digitalizado e a área é estimada por meio de um Sistema de Informação
Geográfica. Um outro sistema, o Prodes digital, está agora disponível
para o cálculo da área desmatada.
4
As imagens são processadas em uma escala de 1:250.000, sendo que um quilômetro
equivale a quatro milímetros na imagem.
96
Figura 22. Área desmatada na Amazônia brasileira registrada pelo INPE desde 1978. A estes
dados foi adicionada a estimativa da área de floresta submetida à exploração madeireira, para se ter
uma idéia da área de floresta que realmente é afetada pela atividade humana a cada ano. Fonte:
PRODES 1997, Nepstad et al. (1999) e IMAZON (dados não publicados).
97
e o incêndio florestal, pouca informação está disponível sobre a extensão
da alteração sofrida pela floresta Amazônica. As nossas análises da
área da floresta que estava vulnerável a incêndio rasteiro em 1998
ilustram a magnitude do potencial desse tipo de incêndio (Capítulo 4).
Nós estimamos que aproximadamente 200.000 km2 de floresta estavam
sob risco muito alto de queimar no final da estação seca de 1998 – ou
seja, não havia mais água disponível para as plantas nos primeiros cinco
metros de profundidade –, o que representa de dez a quinze vezes o
total da área desmatada a cada ano. Em um cenário de crescente
freqüência de eventos El Niño, a Amazônia está sujeita a sofrer
incêndios florestais rasteiros catastróficos que podem tornar pequenos,
em escala, os incêndios de Roraima registrados no início de 1998, e a
atividade de desmatamento.
98
Paragominas. Essa técnica separa as informações da imagem do Landsat
TM em elementos fisicamente significativos e é capaz de detectar um
aumento de frações de vegetação morta e de solos expostos nas florestas
queimadas. Essa técnica não foi aplicada para grandes regiões da
Amazônia, mas seria um acréscimo muito útil para o atual sistema de
monitoramento do desmatamento na Amazônia realizado pelo INPE.
As nossas análises dos incêndios nas propriedades proporcionam uma
outra forma para estimar a extensão dos incêndios florestais. Na área de
9.160 km2 amostrada no estudo realizado pelo IPAM/WHRC, e que
representa aproximadamente 0,25% da Amazônia brasileira, foi
registrado um total de 150 km2 atingidos por incêndios florestais
rasteiros, resultando em uma média de 1,5 quilômetro de floresta
queimada, em 1994 e 1995, para cada quilômetro de floresta que foi
desmatado (Tabela 5). Se essa proporção é aplicada considerando as
estimativas de desmatamento do INPE para 1994 e 1995, chega-se a
30.000 km2 de floresta queimadas durante cada um desses anos. Essa
estimativa é preliminar, dado que a variabilidade de incêndios rasteiros
é muito alta entre as propriedades. Aproximadamente metade da área
total de incêndios florestais rasteiros registrada em nosso estudo foi
representada por uma única queimada em uma grande fazenda no
município de Santana do Araguaia. Mesmo se removermos de nossa
analise os dados obtidos neste município, a nossa estimativa da área
atingida por incêndio rasteiro é de 13.000 km2 por ano. Um estudo
mais amplo da ocorrência de grandes incêndios florestais é necessário
para que se estabeleça uma estimativa segura da área total sob efeito
do fogo.
99
NOAA para estimar que mais de 100.000 km2 de terra desmatada
pegaram fogo em 1987 na Amazônia brasileira; número cinco vezes
maior que a área média desmatada por ano (Figura 22). O estudo nas
propriedades também mostrou que, para cada hectare de floresta
cortada e queimada, aproximadamente cinco hectares de terra desmatada
incendeiam-se (Tabela 5, Apêndice I).
101
Figura 23 - Contribuição relativa do tamanho das propriedades à área atingida por quatro tipos de
incêndio (veja texto para detalhes). Para determinar esses níveis de contribuição, a porcentagem média
de quatro classes de tamanho de propriedade, obtida para cada tipo de incêndio, foi multiplicada pela
área total ocupada por aquela classe de tamanho, dentro do município da área de estudo.
102
3.6. Os impactos ecológicos do fogo
103
superfície do solo à ação erosiva da chuva e do vento. Devido aos seus
efeitos ecológicos extremos, o incêndio de desmatamento é
freqüentemente visto como o único tipo de incêndio ecologicamente
importante (Quadro 1). Por exemplo, as estimativas de carbono liberado
para a atmosfera pela atividade humana na Amazônia são baseadas
exclusivamente na área do desmatamento anual, multiplicada pela
quantidade de carbono liberado para a atmosfera pelo desmatamento
(por exemplo, FEARNSIDE, 1997; SCHROEDER e WINJUN 1995).
Esses estudos estimam que o efeito líquido da liberação de carbono
para a atmosfera a cada ano, que é resultado do balanço entre o
desmatamento e a absorção de carbono pela recuperação da floresta
em terra desmatada, é de aproximadamente 0,3 bilhão de toneladas, o
que representa 4 % do fluxo anual global de carbono para a atmosfera
proveniente das atividades humanas.
104
substituídas. A vegetação torna-se dominada por gramíneas (por
exemplo, Brachiaria brizantha), as quais sustentam uma espécie de gado
importado e facilitam o aumento e a invasão de espécies animais típicas
de áreas alteradas. Por exemplo, uma fauna de formigas passa a ser
dominada por espécies que são consumidoras vorazes de sementes
(Pheidole spp. e Solenopsis spp.) e de plantas (Atta spp.) e por espécies
generalistas de pássaros e mamíferos (MOUTINHO, 1995, 1998, 2003;
NEPSTAD et al., 1996a, b, 1991, 1995, 1997; SILVA et al. 1996;
VIEIRA et al., 1996). A redução da biomassa vegetal é extrema durante
a conversão. A floresta nativa, com 300 toneladas de biomassa por
hectare, dá lugar a um campo de gramíneas com apenas 10 toneladas.
A pastagem ainda reflete 50% mais radiação solar para o espaço e libera
10%-20% menos água para a atmosfera através da evapotranspiração,
se comparado a uma floresta primária (JIPP et al., 1998; NEPSTAD et
al., 1994, 1995; SALATI e NOBRE 1991; UHL et al., 1988 a; WRIGHT
et al., 1992). Pelo fato destes campos liberarem menos vapor de água
para a atmosfera do que a floresta, acabam promovendo um maior
escoamento superficial da água, o qual contribui para as enchentes dos
rios e para a erosão do solo. Isto acontece porque a evapotranspiração
do período de estiagem provoca a secagem do solo e aumenta a sua
capacidade de reter, como uma “esponja”, a água da chuva durante a
estação chuvosa subseqüente e, dessa forma, reduz as enxurradas em
direção aos rios que provocam a erosão. Os modelos climáticos prevêem
que, por causa dessas mudanças no balanço de energia e água, a
conversão de grandes áreas de florestas em pastagens pode levar a uma
redução de chuvas e a um aumento da temperatura na região (NOBRE
et al., 1991; SHUKLA et al., 1990).
As florestas secundárias são comuns na Amazônia porque muitas
pastagens e áreas agrícolas estão abandonadas (WALKER e HOMMA
1996; SERRÃO e TOLEDO, 1990; UHL et al., 1988 b). De fato, o
abandono de campos e o subseqüente recrescimento de florestas
105
secundárias são parte do sistema agrícola de corte e queima mantido
por pequenos agricultores por toda a Amazônia (MORAN et al., 1994;
SKOLE et al., 1994; UHL et al., 1988b). O abandono da terra inicia um
processo de recuperação da floresta que gradualmente restabelece
algumas das características funcionais e estruturais da floresta original.
A taxa desse restabelecimento depende do tipo de uso da terra praticado
antes do seu abandono. Pode ser rápido quando o uso da terra foi a
agricultura de corte e queima e mais lentamente se foi pastagem. Quando
pastagens são usadas de forma intensa para a pecuária e submetidas,
repetidas vezes, à queima e ao preparo da terra com o uso de trator de
esteiras ou herbicidas, o ressurgimento da floresta pode ser impedido
por vários anos após o abandono. A falta de sementes de árvores no
solo ou a predação destas por formigas e roedores, além da competição
da vegetação florestal com plantas invasoras e da ação da seca, acabam
por dificultar ainda mais o desenvolvimento da floresta secundária
(NEPSTAD et al., 1991, 1996 a, 1996 b; SILVA et al., 1996; UHL et al.,
1988 b; UHL et al., 1989; VIEIRA et al., 1996).
106
al., 1996), enquanto uma floresta secundária de quinze anos em
Paragominas abrigava menos de um terço das espécies nativas de
árvores da floresta primária, menos da metade das espécies de formigas,
e somente um quinto das espécies de pássaros (MOUTINHO, 1998;
NEPSTAD et al., 1996 a).
107
de fumaça são levadas para o dossel da floresta e proporcionam a única
evidência para os viajantes dos aviões de que a floresta está sofrendo
danos.
108
chão da floresta e do microclima no seu interior (temperatura do ar,
umidade e velocidade do vento), no momento em que o incêndio ocorre.
Os incêndios iniciados em florestas que apresentam uma camada de
combustível fino no chão, ou que têm combustível com alto teor de
umidade devido a chuvas recentes, queimarão de forma lenta e irregular,
deixando grandes porções de floresta não-queimada. Os incêndios
rasteiros em florestas com combustível seco e abundante são maiores e
mais rápidos e afetam uma área maior da floresta, assim, matam um
número elevado de árvores. Nesse contexto, as florestas da Amazônia
mais inflamáveis são aquelas que já pegaram fogo. A maior quantidade
de combustível no chão e um dossel mais aberto pelas clareiras, criadas
pela morte das árvores durante o incêndio anterior, permitem que uma
grande quantidade de radiação solar chegue ao chão e seque a camada
de combustível (COCHRANE e SCHULZE, 1999). Por exemplo, os
incêndios em florestas próximas à região de fronteira de Tailândia no
leste do Estado do Pará, as quais foram exploradas de forma moderada
(cerca de 30 m3/ha), mas que não tinham sido queimadas, mataram
aproximadamente 40% das árvores adultas (árvores com DAP > 10
cm), as quais representaram 10% da biomassa viva acima do solo. Na
mesma região, os incêndios em florestas exploradas e anteriormente
queimadas, mataram 40% das árvores adultas que resistiram ao fogo
passado, o que representou 40% da biomassa sobrevivente acima do
solo (COCHRANE e SCHULZE, 1999). Um nível de mortalidade
similarmente alto (44% de árvores adultas) foi observado em uma
floresta explorada próxima a Paragominas, após um primeiro incêndio
ocorrido durante o ano de 1992, quando a seca foi severa devido ao
fenômeno El Niño (HOLDSWORTH e UHL, 1997). Em 1983, os
incêndios nas florestas tropicais de Borneo e Indonésia causaram a
mortalidade de 94% das árvores adultas (WOODS, 1989) (Tabela 12).
109
Tabela 12 - Efeitos do incêndio rasteiro sobre a estrutura e a composição da floresta
tropical
110
considerando as medidas feitas no Pará), e se ainda assumirmos que o
teor médio de carbono dessas florestas é de 200 toneladas por hectare
(valor após exploração, derivado por FEARNSIDE, 1997), os incêndios
rasteiros seriam responsáveis pela liberação anual de aproximadamente
50 milhões de toneladas de carbono para a atmosfera. Isto representa um
aumento de 20% sobre as estimativas atuais nas emissões de carbono da
Amazônia brasileira (FEARNSIDE, 1997). Se uma seca severa produzida
pelo El Niño induzisse à queimada de 100.000 km2, o que é a metade da
área prevista de floresta que estaria altamente suscetível a incêndio em
1998 (Capítulo 4), o fluxo de carbono associado ao incêndio florestal
rasteiro seria de 500 milhões de toneladas, aproximadamente triplicando
as estimativas atuais de emissão de carbono da região e impulsionando
para aproximadamente 14% a contribuição da Amazônia para a liberação
global de carbono para a atmosfera proveniente da combustão de
combustível fóssil e do desmatamento a cada ano (FEARNSIDE, 1997;
HOUGHTON, 1997). Um incêndio de tal grandeza na Amazônia também
aumentaria a emissão de carbono durante os anos subseqüentes, uma vez
que as florestas já queimadas tornam-se altamente inflamáveis e passam a
sofrer incêndios periódicos. Estudos recentes mostram que a quantidade
de carbono emitido durante anos sob efeito do El Niño pode chegar a
400 milhões de toneladas. Em anos normais esse valor não ultrapassa
os 30 milhões. (MENDONÇA, et al. 2004).
111
Figura 24. Aspecto de uma floresta
localizada na comunidade agrícola de
Del Rey, Paragominas, Pará, três anos
após sofrer um incêndio rateiro. O
incêndio matou as árvores de casca fina
e abriu o dossel, permitindo o
estabelecimento de árvores pioneiras,
tais como a Cecropia spp. e a
Solanum spp. Foto: D. Nepstad.
112
após o incêndio rasteiro (M. MATTOS, K. CARVALHEIRO, D.
NEPSTAD, dados não publicados).
113
– a diminuição da evapotranspiração e o aumento da precipitação direta
de chuva para o solo – causa um aumento na umidade do solo e,
portanto, aumento na quantidade de água que penetra no lençol freático.
Como o lençol alimenta os igarapés e os rios da região, os incêndios
florestais rasteiros acabam aumentando o fluxo desses cursos d’água
resultando num impacto desconhecido sobre as comunidades de peixes
e outros animais aquáticos. Esses efeitos sobre o ciclo hidrológico são
anulados, todavia, quando a área foliar é restabelecida na floresta pelo
crescimento de novas árvores e cipós, ou pela ramificação daquelas
que sobreviveram a ação do fogo. A taxa de recuperação da área foliar
da floresta após incêndios florestais não foi, ainda bem estudada.
114
certa quantidade de cinzas é levada pelo vento ou pela água da chuva
e, por isso, é perdida do ecossistema da pastagem. Um dos mais
importantes efeitos do fogo em pastagens é a perda de nutrientes
minerais para a atmosfera e para os rios. Tal perda poderia significar a
redução da produtividade futura se a carência de nutrientes limitasse o
crescimento da espécie cultivada (DIAS FILHO et al., 2000).
5
Paulo Artaxo Neto, comunicação pessoal.
115
de novas árvores, pois atraem agentes dispersores de sementes e
proporcionam condições microclimáticas e edáficas que são mais
propícias ao crescimento vegetal (NEPSTAD et al., 1991, 1996 a;
VIEIRA et al., 1996). Ao contrário dos incêndios florestais, a queimada
diminui a inflamabilidade da pastagem ao consumir, praticamente, todo
o combustível fino. As folhas das gramíneas acumulam-se de um ano
para o outro até alcançarem equilíbrio, no qual a taxa de produção de
novas gramíneas seja igual à taxa da decomposição da matéria orgânica
morta. O efeito do fogo na inflamabilidade é muito menos pronunciado
em pastagens onde o gado reduz a quantidade de gramínea e de outro
combustível fino.
116
espécies das florestas secundárias são capazes de rebrotar após a
queimada; aproximadamente dois terços das espécies de árvore de uma
floresta secundária próxima de Paragominas rebrotaram após um
incêndio (KAUFFMAN, 1991).
Os incêndios em florestas secundárias liberam mais carbono para a
atmosfera que os incêndios em pastagens. Quando as florestas voltam
a crescer em áreas abandonadas, são capazes de acumular na biomassa
acima do solo de 1 a 5 toneladas de carbono por ano. Por esta razão, os
incêndios em florestas secundárias jovens (cinco anos de idade) chegam
a liberar aproximadamente de 5 a 25 toneladas de carbono para a
atmosfera (SALOMÃO et al., 1996), pois praticamente eliminam todos
os tecidos vegetais acima do solo. Os incêndios em florestas secundárias
também impedem a recuperação dos processos hidrológicos, tal como
a evapotranspiração (JIPP et al., 1998).
117
de árvores. Assim, a floresta perenifólia densa e totalmente sombreada
por dentro torna-se uma floresta empobrecida, povoada por algumas
espécies de árvores resistentes ao fogo e com o chão coberto por
gramíneas, plantas invasoras e arbustos herbáceos e lenhosos
(COCHRANE e SCHULTZE, 1999; NEPSTAD et al., 1995). O
processo de “savanização” poderia ser reforçado, ou acelerado, se a
substituição da floresta densa por uma vegetação empobrecida propensa
ao fogo diminuísse a evapotranspiração e a absorção de energia o
suficiente para provocar a redução regional de chuva, como é previsto
pelos modelos climáticos atuais (LEAN e WARRILOW, 1989; NOBRE
et al., 1991; SCHUKLA et al., 1989) (Figura 25). A “savanização” em
larga escala na Amazônia é o mais inquietante efeito ecológico advindo
dos padrões atuais de uso do fogo na região, pois representa uma
substituição semipermanente de floresta rica em espécies, por uma
vegetação empobrecida, a qual é debilitada em espécies de plantas e
animais nativos, de reduzida biomassa e menos capaz, que a floresta
nativa, de manter os padrões de precipitação regional por
evapotranspiração.
118
Figura 25 - Os incêndios florestais rasteiros podem provocar um ciclo vicioso que
resulta no empobrecimento da floresta. Uma vez que a queimada contribui para a
diminuição da chuva e para o aumento da suscetibilidade da floresta ao fogo, o
risco de queimadas adicionais também aumenta. A interação entre a seca e o fogo
poderia levar à substituição, em grande escala, da floresta de dossel fechado por
aquelas dominadas por gramíneas e vegetação arbórea propensas a incêndio,
promovendo, dessa forma, a expansão na Amazônia de uma vegetação similar a
do cerrado brasileiro. Adaptado de Nepstad et al., 1995 e Cochrane e Schulze,
1999.
119
queimadas para desmatar ou preparar suas terras, eles aparentemente
não levam em conta o risco do fogo ficar fora de controle e espalhar-se
para as terras de seus vizinhos. Isso se deve a uma fiscalização ineficaz
das leis que requerem compensação dos prejuízos impostos a outros.
Nesta seção, são discutidos os custos diretos do fogo para os
proprietários de terra da Amazônia, incluindo os danos para os seus
sistemas de produção e os seus investimentos na prevenção do incêndio
acidental. Na pesquisa executada pelo IPAM/WHRC e anteriormente
descrita (seção 3) nas propriedades rurais da Amazônia, foi possível
obter dados somente sobre dois tipos de prejuízos causados pelo fogo,
ambos envolvendo pastagem: danos em cercas e perda de forragem.
Também dados sobre os custos de prevenção do incêndio acidental, a
preparação de aceiros, foram levantados. Esses dados foram
apresentados para as quatro classes de tamanho de propriedades citadas
anteriormente.
120
quatro meses durante a estação chuvosa subseqüente para que seja
restabelecida a cobertura de folhas. Um dos maiores custos econômicos
do incêndio na Amazônia é a perda de pasto durante a estação seca.
Quando uma pastagem queima, o proprietário de terra deve encontrar
uma outra substituta para manter o seu rebanho de gado, o que, muitas
vezes, significa alugar pastagens de terceiros.
121
122
dependendo do tamanho de sua propriedade, os agricultores e os
fazendeiros perdem, somente em arame, de US$ 30, US$110, US$210
a US$3.390 devido ao incêndio acidental (Tabela 13).
A prevenção de incêndios
123
atinjam campos e florestas em propriedades vizinhas (ver Seção 5.2).
Os aceiros são faixas de terra de 2 a 5 metros de largura, produzidas
pela remoção de grande parte do material inflamável. A remoção pode
ser feita manualmente, com o auxílio de facões, ou mecanicamente,
com tratores de esteira. Essas faixas podem ser muito mais estreitas na
floresta, onde 0,5 metro é suficiente, muitas vezes, para impedir a
passagem dos incêndios rasteiros que percorrem lentamente o sub-
bosque da floresta (Figura 9).
Os aceiros podem ser feitos a um custo muito mais baixo com tratores de
esteiras (US$ 20 por km) que com facões (US$ 60 por km), e por isso
são mais caros para os donos de pequenas propriedades, os quais têm
pouco acesso a maquinário pesado. Quase todos (90%) os donos de
pequenas propriedades estabeleceram aceiros manualmente, enquanto 61%
e 22% dos médios e grandes proprietários usaram essa técnica manual.
Essa tendência foi revertida para o uso de tratores de esteiras: 2%, 30% e
50% dos donos de pequena, média e grande propriedade usaram tratores
de esteiras para fazer seus aceiros.
6
Essas quantidades foram calculadas assumindo que o comprimento do quebra-fogo,
que é preparado usando cada um dos dois métodos (manual vs trator de esteira), é
proporcional aos métodos que foram citados pelos donos de propriedade como os
principais para a preparação.
125
5 por hectare, e, por isso, o custo para o proprietário da terra foi de
aproximadamente US$ 500.7 Essa perda de madeira pode ser muito
mais alta quando incêndios queimam florestas que ainda não foram
exploradas. Para os proprietários das indústrias madeireiras, o valor da
madeira em pé em suas florestas não-exploradas pode ser alto, chegando
a US$ 200 por hectare. A perda total de madeira para os proprietários
de terra da Amazônia, como resultado do incêndio rasteiro,
provavelmente excede muitos milhões de dólares por ano e pode alcançar
dezenas de milhões de dólares se extensas áreas de florestas não-
exploradas pegarem fogo por causa do aumento da inflamabilidade
induzida pela seca (Capítulo 4).
7
A. Holdsworth, dados inéditos sobre o valor da perda de árvores mortas.
8
M. Matos, D. Nepstad, dados não publicados.
126
Tabela 14 - Área de pastagem, intervalo do lucro anual da pecuária, e estimativa da
percentagem destes lucros que são dirigidos a preparação de aceiros.
1. Valor obtido multiplicando-se a área de pastagem pelo lucro (US$ ha/ano) gerado
pelo sistema de produção da pecuária extensiva (mínimo) e semi-intensiva, de acordo
com Mattos e Uhl (1994).
2. Valor obtido multiplicando-se a média do comprimento dos aceiros construídos por
ano, pelo custo por quilômetro de sua construção (como informado por proprietários).
A fração de aceiros construídos usando terçados e tratores foi determinada, a partir de
entrevistas e usada como determinante do cálculo do custo dos aceiros. Um quilômetro
de aceiro aberto com terçados custa US$ 60,00 e US$ 20,00 com trator, segundo
informações de proprietários.
3. Valor obtido como custo dos aceiros (2) dividido pelo lucro líquido mínimo e máximo
(1).
Tabela 15 - Custo relativo dos aceiros para circundar uma pastagem de 100 hectares
(1 X 1 km), usando dois tipos diferentes de manejo de pastagem e duas técnicas de
construção de aceiros.
127
Os incêndios florestais rasteiros também trazem perigo para aqueles
produtores que praticam a agricultura de corte e queima. Quando uma
floresta que sofreu incêndio é derrubada para dar lugar a uma nova
área de plantio, os produtores correm sérios riscos de serem atingidos
por galhos que se desprendem das árvores mortas pelo fogo, que
apodrecem ainda quando estão em pé.9
9
M. Mattos, K. Carvalheiro, dados não publicados.
10
Programa Econômico de Desenvolvimento para o Sudeste da Ásia, 1998.
128
prejuízos podem variar de 100 a 5 bilhões de dólares por ano
(MENDONÇA et al., 2004). Muitos dos custos dos incêndios para a
sociedade são difíceis de quantificar em termos monetários, uma vez
que envolvem processos econômicos e serviços que não são negociados
no mercado, mas que sustentam a produção de alimentos, fibra e outros
produtos comerciais. Esses serviços ecológicos incluem a função das
florestas em manter o ciclo hídrico da Amazônia e o sistema climático
regional, como descrito na Seção 3.7. As florestas da Amazônia
protegem o solo da força erosiva da chuva e do vento e contribuem
com matéria orgânica, para que esses solos mantenham sua estrutura e
sua fertilidade. Representam um depósito para a maior biblioteca de
informação genética no mundo, que é a fonte de organismos e
substâncias necessários para combater doenças e proporcionar alimento
para uma população humana em expansão. As florestas da Amazônia
ainda atuam como grandes aceiros naturais ao longo da paisagem e
impedem a propagação dos incêndios que escapam de áreas agrícolas.
11
Paulo Artaxo Neto, comunicação pessoal.
129
de trânsito e causando o fechamento de aeroportos nas cidades da
Amazônia. Em 1996 e 1997, os aeroportos de Rio Branco (Acre), Porto
Velho (Rondônia), Imperatriz (Maranhão) e Conceição do Araguaia,
Carajás e Marabá (Pará) permaneceram fechados por um total de 420
horas, devido à fumaça.
12
Eletronorte - Registro interno.
130
4. O Fogo na Amazônia: cenário futuro
131
que incorpora uma vasta variedade de dados para prever regimes futuros
de fogo na região. O desenvolvimento desse modelo pode proporcionar
uma ferramenta poderosa para comunicar à sociedade brasileira os
impactos das tendências atuais de desenvolvimento rural na Amazônia
e ajudar os produtores da região a planejarem seus investimentos em
prevenção e em controle de fogo.
132
Figura 26 - Diagrama mostrando as camadas de dados que foram combinados
para gerar os mapas de risco de incêndio que compõem o RisQue. Informações
adicionais estão disponíveis nas páginas do IPAM (http://www.ipam.org.br) e
do WHRC (http://www.whrc.org), na Internet.
133
A inflamabilidade de florestas intactas: Para se prever o regime de chuvas
sob o qual as florestas maduras e intactas (que nunca foram exploradas)
tornam-se suscetíveis ao fogo, estudos de campo na Amazônia (Capítulo
2; NEPSTAD et al., 1994, 1995; UHL e KAUFFMAN et al., 1988)
foram realizados. Estes, demonstraram que as florestas de copa fechada
podem manter uma elevada densidade de folhas, que conduz a um
microclima úmido e sombreado no seu interior durante períodos de
seca normais que duram entre cinco e seis meses. Nos períodos de
estiagem, essas florestas são capazes de absorver a água estocada no
solo a profundidades superiores a 5 metros e, dessa forma, evitam a
perda de folhas induzida pela falta d’água. Devido a essa notável
adaptação à seca sazonal, as florestas da Amazônia tornam-se
vulneráveis ao fogo somente após períodos prolongados de seca. Assim,
durante a seca, a quantidade de chuva que cai na floresta é menor do
que aquela que é perdida via evapotranspiração. A previsão da
suscetibilidade da floresta ao fogo pode ser vista pela estimativa do
balanço hídrico entre as chuvas, que abastecem o solo com água, e a
evapotranspiração, que é extração de água pelas plantas e perda para a
atmosfera. Quando há um desequilíbrio entre as chuvas e a
evapotranspiração, que acontece durante o pico de seca, a vegetação
acaba por esgotar a água no solo e elevar a perda das folhas. É nesse
momento que o chão da floresta se torna vulnerável ao fogo.
134
(que chamamos de “limiar de inflamabilidade”), abaixo do qual a floresta
fica inflamável. Este nível tem sido determinado por meio de medidas
de campo em cinco tipos de floresta na Amazônia.
135
pegar fogo facilmente após curtos períodos de estiagem. O limiar de
inflamabilidade pode ser determinado para cada tipo específico de
floresta, pela realização de pequenos experimentos com fogo controlado
em florestas com diferentes quantidades de água armazenada no solo,
e é também definido quando o fogo experimental se espalha e consome
a camada de combustível fino depositada no chão da floresta.
Atualmente, estamos medindo o limiar de inflamabilidade em cinco
tipos florestais: 1) floresta ombrófila densa, em Paragominas e na
Floresta Nacional do Tapajós, no Pará; 2) floresta dominada por cipós,
nos mesmos locais anteriores; 3) floresta aberta e 4) floresta de bambu,
na mesma área e 5) floresta de transição, próximo a Santana do Araguaia,
no Pará (Figura 1).
136
a decidir quanto investir em prevenção e controle para proteger seus
sistemas de produção agrícola e a infra-estrutura estabelecida na
propriedades.
137
agropecuário e de outros levantamentos periódicos na estimativa do
grau de risco para os municípios da Amazônia. Esse risco seria ajustado
em função dos padrões recentes de precipitação.
138
Uma das respostas do governo foi solicitar assistência para identificar
as regiões na Amazônia onde o risco era mais elevado. Para atender a
essa necessidade urgente, várias instituições (IPAM, WHRC, IMAZON,
INPE e NASA-Ames) uniram-se para desenvolver uma versão
preliminar do modelo RisQue e identificar aquelas áreas de floresta
que estariam mais vulneráveis a incêndios durante a estação seca de
1998. O mapa chamado naquele período de “RisQue98” foi
desenvolvido por meio dos procedimentos descritos anteriormente
(Figura 26; NEPSTAD et al., 1998b). Foram utilizados dados de focos
de calor do satélite NOAA/AVHRR para 1997 e a precipitação
acumulada de 1997 até maio de 1998. O IMAZON forneceu
estimativas sobre áreas de floresta submetidas a exploração madeireira,
e a NASA-Ames os cálculos da capacidade de retenção de água dos
solos, por meio de novas equações desenvolvidas por TOMASELLA e
HODNETT (1998). Os resultados deste esforço foram recentemente
publicados (NEPSTAD et al., 2004).
139
Figura 27 - Mapa de risco de incêndio, RisQue, para o mês de novembro de 1998.
A susceptibilidade da floresta ao fogo é dividida em três categorias, de acordo com a estimativa da
quantidade de água armazenada no solo que está disponível para as plantas, até uma profundidade de
cinco metros. As florestas que, em novembro, já tinham esgotado toda a água do solo estavam sob
“risco muito alto” de pegarem fogo, enquanto aquelas com 0 a 15 mm de água foram classificadas sob
“risco alto”. As florestas sob risco “intermediário” foram aquelas estabelecidas sobre solos contendo
ainda de 151 a 300mm de água. Já os riscos de terras desmatadas sofrerem incêndios foram baseados
na freqüência da ocorrência de focos de incêndios (hot pixel) no ano de 1997. Para análises mais
atuais, veja (NEPSTAD et al., 2004).
140
O ano de 1998 foi, portanto, um primeiro alerta sobre os efeitos negativos
do fogo descontrolado na Amazônia. Naquele ano, as florestas no
Estado do Tocantins e no nordeste de Mato Grosso (ilha do Bananal),
na região de Redenção e em Marabá, 13 no sul do Estado do Pará
queimaram intensamente. Todas estas áreas foram classificadas como
de “risco muito alto”. No entanto, incêndios também ameaçaram as
florestas do leste do Acre, onde a previsão do mapa foi de um “baixo
risco”. Essa diferença aparece porque as previsões feitas pelo mapa
RisQue98 foram baseadas na premissa de que a previsão de chuvas de
maio a novembro fosse igual às médias históricas de precipitação.14 De
fato, a real ocorrência de chuvas durante esse período foi abaixo da
média no Acre e em partes do Mato Grosso e sudeste do Pará. Por essa
razão, o mapa certamente subestimou a área de floresta vulnerável a
incêndios na estação seca de 1998.
13
Veja, 11 de setembro de 1998.
14
O RisQue98 foi desenvolvido em maio de 1998, usando os dados de chuva
coletados em 11 de maio.
141
5. Soluções para o problema do fogo na Amazônia
5.1. Introdução
142
problema apresenta-se como uma “emergência” para a sociedade
brasileira somente quando uma seca severa e/ou a intensificação de
uso de fogo na agricultura acabam por aumentar, de maneira alarmante,
a ocorrência de incêndios durante um período específico. No entanto,
essas situações “emergenciais” têm acontecido regularmente a cada
dois ou cinco anos (1988, 1992, 1995, 1997, 1998 e 2001), o que
amplifica o conceito de “emergência”. A busca de soluções para o
problema do fogo deve-se aproveitar da preocupação da sociedade que
surge durante os anos de emergência, e redirecionar os processos políticos
que alterem os caminhos futuros do desenvolvimento da região. Somente
no contexto de uma abordagem coerente e de longo prazo é que podemos
esperar uma redução gradual no uso do fogo pelos produtores rurais e
um aumento gradativo de investimentos na prevenção e no controle de
incêndios acidentais. Os programas emergenciais contra os incêndios,
definidos nos anos de risco particularmente alto, só começarão a fazer
sentido quando forem derivados, ou estiverem conectados, de uma
abordagem estratégica e de longo prazo.
143
uma total ausência de mecanismos efetivos para que se faça cumprir a
legislação vigente. Em vez disso, tais estratégias devem estabelecer
restrições nas formas como os proprietários usam suas terras, e devem
proporcionar incentivos econômicos que encorajem mais investimentos
preventivos ou reduzam o uso do fogo como uma prática de manejo da
terra. As oportunidades legislativas e financeiras para encorajar essas
mudanças no comportamento dos proprietários de terra são analisadas
nesse contexto. A função potencial do planejamento de emergência
também é discutida.
144
discute algumas das técnicas identificadas por meio de centenas de
entrevistas conduzidas por pesquisadores do IPAM com proprietários
de terra. Uma descrição mais detalhada pode ser encontrada no
Apêndice II.
A vegetação pode ser protegida por faixas de terra nua, das quais todo
o combustível seja removido, isto é, os aceiros. Os aceiros representam
a mais importante técnica para defender a vegetação contra o fogo. No
entanto, é a de implementação mais cara. Como ilustrado no Capítulo
3, um pequeno fazendeiro gastaria, antecipadamente, a metade de seus
lucros com a produção pecuária na preparação manual de aceiros ao
145
redor de uma pastagem de 100 hectares. Por essa razão, programas
educativos que encorajam agricultores e fazendeiros a investir na
preparação de aceiros correm o risco de estarem encorajando práticas
que não são economicamente viáveis (Tabela 15), e, conseqüentemente,
não são levados a sério pelos proprietários.
146
Acordos entre vizinhos e comunidades locais
Acordos entre vizinhos: O acordo mais fácil de ser feito é aquele entre
dois proprietários de terra vizinhos que têm um interesse comum em reduzir
a ocorrência de incêndios nas suas propriedades. Com uma simples
conversa, eles podem concordar em informar um ao outro as datas previstas
para as queimadas e combinar um sistema de alerta caso ocorra riscos
do fogo fugir ao controle. Desse modo, é possível que ambos se ajudem
quando for necessário conter as queimadas e até dividam custos
envolvidos na preparação de aceiros ao longo dos limites entre as duas
propriedades. Tais acordos acontecem informalmente entre os
proprietários de terra em toda Amazônia, mas a sua eficácia na redução
da incidência de incêndios ainda tem de ser estudada. Em nossas
entrevistas, detectamos que esse é geralmente o único tipo de acordo
feito por grandes proprietários, uma vez que, raramente estão
organizados em comunidades coesas, como acontece com a maioria
das comunidades de pequenos agricultores.
147
Os acordos entre vizinhos mais elaborados podem incluir o
planejamento espacial dos diferentes sistemas agrícolas para reduzir
risco de incêndio. Os vizinhos podem concordar em deixar grandes
blocos de floresta contínua ao longo das porções adjacentes de suas
terras para impedir a propagação do fogo. Podem ainda, concordar em
posicionar seus lotes de desmatamento em áreas contíguas e, assim,
reduzir a quantidade de aceiros necessários para conter os incêndios.
148
a formação de brigadas de incêndio e a adoção de técnicas de controle
de fogo. Acordos mais complexos podem regular os tipos de queimada
que são permitidos aos membros da comunidade, as medidas que devem
ser tomadas para controlar o fogo e as providências a serem tomadas
pela comunidade em casos de emergência. Um exemplo de acordo mais
elaborado é descrito a seguir. Trata-se do Regulamento de Queimadas
da comunidade agrícola de Del Rey.
149
foram usadas para iniciar os procedimentos legais de titulação da terra
junto ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA).
150
Figura 28 - Capa e duas páginas da brochura que contém o Regulamento de Queimadas da Colônia
de Del Rey. O regulamento terceiro recomenda que as árvores mortas que prmanecem em pé e próximas
a aceiros sejam derrubadas antes da queimada. O de número quatro recomenda que queimadas agrícolas
e em pastagem sejam feitas em outubro ou novembro. Outros regulamentos são obrigatórios, incluindo
a preparação de aceiros ao longo das bordas da área a ser queimada e que estes estejam posicionados a
favor do vento.
151
Esse regulamento requer que cada agricultor avise seus vizinhos, com
oito dias de antecedência, a data em que fará uma queimada e que
prepare aceiros nas florestas e nas pastagens adjacentes às novas
aberturas planejadas. O regulamento também recomenda que se deve
observar a direção prevalecente dos ventos na colocação de novos
roçados e que seja evitada a proximidade dos mesmos com ecossistemas
altamente inflamáveis, tais como pastagens. Ainda estabelece que
vizinhos programem a queimada de seus lotes no mesmo período, e
que árvores mortas em pé, com probabilidade de cair fora da área a ser
queimada, sejam derrubadas antes de iniciar a queimada. Se um fogo
descontrolado danificar a propriedade de um vizinho, o regulamento
prevê compensações pelos danos, após um procedimento comunitário
que identifique o responsável e averigue a extensão dos danos. Na
estação seca de 1997, a Comissão de Queimadas de Del Rey, um comitê
estabelecido pelo regulamento de queimadas formado por cinco pessoas
da comunidade, supervisionou oito queimadas em lotes de agricultores
e mediou as disputas envolvendo acidentes que por descuido tenham
ocorrido. Em um dos casos, a comissão decidiu que um agricultor
deveria pagar mil estacas de cerca a um vizinho como forma de ressarci-
lo pelos prejuízos causados pela falta de controle na queimada.
152
Regulamento depende também de melhorias na produtividade dos
sistemas agrícolas usados pela comunidade, encorajando os agricultores
a investirem mais na prevenção de incêndios.
153
controle do incêndios. As técnicas de prevenção e supressão de incêndio
descritas anteriormente estão sendo usadas na Amazônia, mas sua real
eficácia não foi estudada, nem foram analisados os custos e os benefícios
produzidos. Não temos conhecimento das circunstâncias sob as quais
fica economicamente vantajoso para os proprietários de terra investir
em vigilância do fogo e em planos de emergência. Esta informação é
essencial para capacitar as autoridades públicas a alocarem os escassos
recursos orçamentários destinados à prevenção de incêndios de forma
realmente efetiva.
154
além de sua área acadêmica, e nenhum desses jovens profissionais é
treinado no manejo do fogo nos sistemas de produção agrícola ou
florestal. É necessária uma nova geração de agentes e pesquisadores de
extensão que seja capaz de integrar uma variedade de disciplinas e que
esteja interessada em trabalhar diretamente com comunidades de
agricultores e, assim, enfrentar o desafio do desenvolvimento rural.
Em particular, as comunidades precisam de ajuda para desenvolver a
capacidade de se autogovernar não somente em relação ao uso do fogo,
mas por toda gama de decisões a serem tomadas coletivamente.
155
5.3. O fogo no contexto das fronteiras de ocupação da
Amazônia
156
Figura 29 a e b - a) Como em qualquer fronteira de ocupação, a Amazônia é pontuada de zonas
comerciais, ao redor das quais se desenvolvem sistemas agrícolas intensivos e orientados para o mercado.
b)Com o aumento da distância dos mercados ou com o aumento da dificuldade de acesso, os sistemas
tornam-se menos intensivos e tendem a focalizar-se sobre atividades de subsistência e sistemas de
pecuária extensiva, ambos dependentes do fogo como instrumento de manejo. Com o passar do tempo,
os sistemas rodoviários vão melhorando, as linhas de energia elétrica são estendidas para a zona rural.
Assim, a zona de produção, orientada para o mercado expande-se. É possível que o uso do fogo decline
com este processo de evolução agrícola, o qual deve estimular, por sua vez, a prevenção de incêndios.
157
fogo é muito pequeno, pois os recursos ameaçados (terra e floresta)
têm pouco valor.
158
linhas de transmissão de energia elétrica, fechamento de aeroportos e,
em escala global, liberação de carbono para a atmosfera, que acontece
quando a biomassa é queimada. Esses custos podem ter pouca influência
no comportamento individual dos proprietários rurais. Assumindo que
os proprietários de terra da Amazônia usam o fogo de forma racional,
teoricamente só irão utilizá-lo quando os benefícios particulares
excederem os custos, também particulares, da queimada. Portanto, a
tendência de usar o fogo como técnica de manejo, provavelmente
diminuirá quando o valor produtivo da terra e as perdas potenciais
associadas com os incêndios aumentarem (Figura 30a). Por exemplo,
fazendeiros que plantam pastagens com espécies de capim sensíveis ao
fogo (por exemplo, Brachiaria brizantha) tipicamente abandonam o seu
uso como técnica de manejo da pastagem1
159
O entendimento da lógica econômica de uso e controle do fogo na
Amazônia deve levar em conta outra variável muito importante: os
vizinhos. Quando um proprietário (A) faz grandes investimentos em
aceiros para prevenir que suas queimadas escapem, ou para evitar que
seus campos e florestas peguem fogo, parte do benefício desse
investimento é conferida gratuitamente ao vizinho (B). Se o proprietário
B não fizer nenhum investimento na prevenção de fogo, os investimentos
do proprietário A trarão benefícios privados mais baixos, pois seus
campos e suas florestas correm o risco de queimar com o fogo originado
na propriedade de B. Os benefícios derivados dos investimentos na
prevenção serão maiores quando ambos os proprietários investirem
igualmente em técnicas de prevenção, tais como aceiros ao longo dos
limites entre as duas propriedades.
160
Figura 30 - a) Modelo qualitativo sobre os custos e os benefícios da prevenção de incêndios. É provável
que os agricultores e os fazendeiros façam um uso menor do fogo e invistam em prevenção quando a
intensidade e o valor da produção aumentam, pois os prejuízos econômicos associados ao eventual
incêndio acidental são mais altos no sistema mais produtivo. b) O nível ótimo de investimentos na
prevenção é igual ao benefício marginal gerado para o proprietário de terra. Porém, esses proprietários
geralmente escolhem um nível mais baixo de investimento na prevenção, pois não consideram certos
benefícios a longo prazo e socialmente mais favoráveis, tais como os riscos reduzidos de incêndio na
terra do vizinho, a proteção da biodiversidade e os valores futuros da madeira.
161
de investimentos teoricamente considerados “ótimos”, do ponto de
vista da sociedade.
162
desmatadas e desestimulem o uso predatório dos recursos florestais.
Alguns dos elementos-chave dessa integração de políticas podem ser
identificados na literatura sobre o desenvolvimento da Amazônia
(MAHAR 1989; HECHT, 1985; SCHNEIDER 1993; SCHIMINK e
WOOD 1992). Esses elementos incluem o direito à posse da terra, o
planejamento da infra-estrutura, o estabelecimento de áreas protegidas
e a adoção de programas de crédito.
163
mineração, leva pessoas para regiões florestais remotas, expandindo a
fronteira de ocupação e incorporação de novas áreas no mercado de
terras. Essa expansão da fronteira diminui ainda mais o valor da terra,
favorecendo formas extensivas de agricultura que geram retornos altos
em vista do pequeno capital investido(e mão-de-obra). Esse tipo de
estratégia requer oferta contínua de novas áreas para serem viáveis
economicamente, pois dependem do baixo preço da terra
(SCHNEIDER, 1993). Os investimentos governamentais em infra-
estrutura na Amazônia deveriam concentrar-se em regiões já
colonizadas, o que favorece a intensificação do uso da terra. Por exemplo,
o melhoramento da rede de estradas locais nessas regiões pode reduzir
custos de transporte, aumentando a lucratividade dos sistemas de
produção agrícola orientados para o mercado.
164
Finalmente, os programas de crédito agrícola poderiam encorajar a
intensificação dos sistemas de uso da terra suportados pela assistência
técnica, pelas facilidades de comercialização, pelos sistemas de
transporte melhorados e por outras medidas desenhadas para capacitar
e engajar as instituições locais em iniciativas comerciais. Esses
programas devem ser implementados em estreita conexão com
programas que favoreçam a proteção das florestas. Caso contrário,
aumentos na lucratividade dos sistemas de produção agrícola podem
servir para estimular a conversão de florestas. Esse tópico é discutido
com maior profundidade a seguir.
Abordagens legislativas
165
1965,17 que caracteriza o ato como um contravenção penal, forma
jurídica mais branda que o crime. Em outras palavras, do ponto de
vista legal, o uso descuidado do fogo, que acarreta os incêndios em
florestas, é uma ofensa menor do que danificar plantas ornamentais em
áreas públicas ou privadas, um crime que tem pena de prisão estipulada
em três a doze meses.
De certa forma, essa deficiência poderia ser superada com base no princípio
da “responsabilidade objetiva” estabelecido na Lei da Política Nacional
do Meio Ambiente,18 que prevê que aquele que causar algum dano ao
meio ambiente terá o dever de repará-lo. Um proprietário que coloca fogo
em sua pastagem, com ou sem autorização legal, e este fogo danifica a
propriedade do vizinho ou áreas públicas, é legalmente responsável pelos
prejuízos e deve compensar o vizinho ou o governo pelos danos sofridos.
Na prática, essa legislação é muito difícil de ser aplicada. Não há nenhum
precedente legal estabelecendo valores para os serviços ambientais
prestados pela floresta (manutenção dos ciclos hidrológicos, prevenção
de erosão de solos, etc.), e a maioria das pessoas afetadas pelo fogo não
tem fundos para contratar especialistas para documentar os prejuízos
relacionados ao mesmo. Também é extremamente difícil provar como os
incêndios começaram e, conseqüentemente, apontar responsabilidades.
Essa importante legislação pode ser reforçada pela atribuição de
responsabilidades coletivas. Por exemplo, o governo federal poderia manter
uma autoridade local, tal como uma comunidade ou um município,
responsável por perdas sofridas pela sociedade advindas de um incêndio
florestal, o que forçaria essa autoridade a determinar um mecanismo
prático para penalizar os proprietários particulares de terra que cometem
tal incêndio.
16
Lei 9.605/98.
17
Lei 4.771/65.
18
Lei 6.938/81.
166
O decreto presidencial de julho de 199819 estabeleceu regulamentos
para o uso do incêndio em todo o país e incorporou alguns conceitos
inovadores tais como o reconhecimento da queimada coletiva
comunitária (“queima solidária”) e a suspensão temporária da permissão
de uso de fogo em caso de emergência. No caso da permissão do uso
do fogo, o decreto estabelecia que os produtores deveriam obter
autorização prévia dos órgãos ambientais antes da realização de qualquer
tipo de queimada. Por exemplo, se um pequeno produtor desejasse
queimar 2 hectares de sua propriedade para plantio de mandioca e milho,
deveria se dirigir ao órgão ambiental mais próximo (IBAMA, Secretaria
Estadual ou Municipal de Meio Ambiente) com trinta dias de
antecedência da data prevista para a queimada, preencher um formulário
com informações sobre a natureza da queimada e comprovar a
propriedade da área onde a queimada vai ser realizada, além de indicar
ter capacidade para fazer aceiros de 3 metros ao redor da área e dispor
de pessoal treinado e de equipamentos para evitar a propagação do
fogo fora dos limites estabelecidos. Dentro da realidade amazônica as
exigências desse decreto foram elevadas demais. A maioria dos
produtores provavelmente desconhecia a necessidade de obter
autorização para queimar, uma vez que reside distante da sede do órgão
ambiental, não tem como comprovar a posse da terra e só conta com a
mão-de-obra familiar para preparar aceiros e controlar o fogo. O decreto
previa ainda que os órgãos ambientais deveriam expedir as autorizações
no prazo máximo de quinze dias após a solicitação, fazendo vistoria
prévia em áreas que contiverem restos florestais e/ou limítrofes a áreas
de proteção, além de enviar técnicos para acompanhar as queimadas
autorizadas. Um pequeno exemplo pode dar a dimensão dessa tarefa:
na Amazônia, todas as queimadas feitas pelos pequenos produtores
após a derrubada da mata contêm restos florestais e, portanto, teriam
19
Decreto 2.661/98.
167
de ser vistoriadas previamente, ou seja, para cumprir esse ponto do
decreto, os órgãos ambientais teriam de ter capacidade de vistoriar,
previamente, centenas de milhares de propriedades a cada ano em toda
a região. Um dos maiores problemas na implementação da legislação
ambiental no Brasil é a falta de capacidade institucional instalada. No
caso da Amazônia, essa situação é ainda mais deficitária, sendo que,
geralmente, as instituições locais não têm estrutura para dar orientações
técnicas aos produtores e/ou para realizar vistorias.
20
A maioria das organizações não-governamentais participantes trabalha com pequenos
produtores rurais.
168
Instrumentos econômicos
21
Eduardo Martins, presidente do IBAMA.
169
e equipamentos básicos para o gerenciamento do fogo e do custeio de
comissões de fogo.
170
Tabela 16 - Resumo das sugestões de mudanças na atual política
econômica que poderiam reduzir o uso de fogo e os incêndios acidentais
em sistemas florestais e agrícolas.
171
Os instrumentos econômicos podem representar, a longo prazo, uma
ferramenta importante na substituição do atual uso do fogo por outras
formas de manejo, principalmente na intensificação da agricultura nas
áreas já transformadas. Combinados com uma política de
desenvolvimento que fortaleça a infra-estrutura de transporte, energia,
saúde e educação nestas áreas, em vez de priorizar a abertura de novas
fronteiras, estes instrumentos podem viabilizar economicamente muitas das
iniciativas de intensificação produtiva na região, tais como os sistemas
agroflorestais, a pecuária intensiva (MATTOS & UHL 1994) e o manejo
florestal sustentável (BARRETO et. al., 1998).
172
foi realizado um rápido levantamento sobre ações, programas e políticas
existentes para a região, mas a internalização dentro do próprio governo
da concepção de integração de políticas moldadas às peculiaridades
socioambientais da região, ainda é uma realidade distante. Novamente,
a questão do fogo é apontada como uma excelente oportunidade para
colocar em prática o discurso da conciliação entre desenvolvimento e
conservação.
173
Sistemas de advertência de riscos de fogo foram desenvolvidos em vários
países. O sistema norte-americano (National Fire Danger Rating System
– NFDRS) e o canadense (Fire Wether Index System – FWIS) combinam
dados sobre o clima, as características do combustível em vários tipos
de ecossistemas e o comportamento do fogo, para gerar índices de risco
que são revisados e atualizados diariamente (Veja PYNE et al., 1996).
Milhões de pessoas que visitam áreas públicas nos Estados Unidos,
por exemplo, encontram nas entradas destas áreas grandes sinais com a
avaliação de risco mais recente e codificada em cores distintas. Multas
são cobradas de quem usa o fogo quando ele não é permitido pelo nível
de risco indicado.
174
dados forem obtidos. Até que um programa nacional de pesquisa sobre
o fogo seja estabelecido no Brasil, a previsão dos incêndios na Amazônia
dependerá de modelos semelhantes ao RisQue.
Programas de emergência
175
Exército e a Aeronáutica, a Defesa Civil, as brigadas locais de combate
ao incêndio e várias outras instituições, o governo foi capaz de responder
à perspectiva de uma severa estação seca em 1998. Foi realizado
monitoramento do fogo através de satélite, e equipes de combate a
incêndios foram enviadas para áreas de floresta e queimadas em
municípios com alto risco de fogo.
No entanto, não se pode reduzir substancialmente o problema do fogo na
Amazônia por meio de planos de emergência com a ação de tropas nas
florestas, ou com água jogada de aviões tanque. Dezenas de milhares de
queimadas são feitas na Amazônia a cada estação seca, e milhares de
quilômetros quadrados de floresta queimam em centenas de incêndios
florestais invisíveis aos satélites. Simplesmente não existe contingente na
Defesa Civil e no Corpo de Bombeiros suficiente para extinguir os incêndios
que ardem por milhares de quilômetros abaixo das copas das florestas da
região. Considerando que esses incêndios florestais rasteiros podem arder
imperceptivelmente por semanas, o combate direto ao fogo torna-se
praticamente impossível.
176
o primeiro passo na preparação para períodos de emergência quando
vastas áreas de floresta provavelmente estarão mais vulneráveis a
incêndios destrutivos será alertar os produtores rurais do risco de
incêndio iminente. Tropas munidas de mangueiras proporcionam
excelente material para a televisão, mas pouco podem fazer para reduzir
os danos causados por incêndios na maior floresta tropical do mundo.
177
178
6. Conclusão
179
maioria desses produtores simplesmente não tem, ou não conhece, outra
maneira de preparar a terra para o cultivo. Se o “suprimento” de floresta
virgem fosse menor, provavelmente os agricultores e os fazendeiros
fariam maiores investimentos em suas áreas já desmatadas e investiriam
em cercas, culturas perenes, reforma de pastagem e, com isso, utilizariam
cada vez menos o fogo como ferramenta. A perspectiva de diminuir a
velocidade de expansão das fronteiras de ocupação ou de fechá-las
completamente é uma tarefa monumental, sem precedentes na história
da civilização humana. No momento, após três décadas de rápida
colonização, é pouco provável que a história de expansão da fronteira
amazônica represente essa exceção.
180
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Uhl, C. e I. C. Vieira. 1989. Ecological impacts of selective logging in
the Brazilian Amazon. Biotropica 21 (2): 98 - 106.
190
Apêndice I
191
192
Apêndice II - Técnicas de prevenção e controle de
incêndio
193
incêndio passe para a área que está sendo defendida. Um segundo aceiro
de trinta a cinqüenta metros a favor do vento reduz o risco dos incêndios
ultrapassarem o primeiro e, assim, atingirem a área que se quer proteger.
De forma similar, aceiros mais largos de vinte a trinta metros de largura
podem ser preparados em pastagens e, assim, queimar inteiramente a
vegetação entre dois aceiros paralelos. O risco desses incêndios intencionais
escaparem para o resto da pastagem pode ser reduzido com o uso de
contrafogos ao longo da borda da faixa de vegetação e a favor do vento.
A queimada, nesse caso, deve ser feita no final da tarde, quando a
temperatura declina e o aumento da umidade relativa do ar reduz a
intensidade do incêndio.
194
dessa técnica é que ela possibilita que uma faixa de vegetação inflamável
cresça, ao longo da qual o fogo é transmitido.
195
Os quebra-combustíveis devem ser extensos o bastante para manter uma
área central, que vai além da zona de secagem. Kapos et al. (1989) e
Kapos et al. (1993) mediram ar mais seco e quente acima de sessenta
metros na borda a favor do vento de uma floresta próxima a Manaus, e
Uhl e Buschbacher (1985) documentaram a penetração de incêndio nas
bordas da floresta por mais de duzentos metros. Uma segunda consideração
no uso de quebra-combustíveis florestais é a deterioração da borda da
floresta que ocorre ao longo do tempo. A mortalidade de árvores é alta ao
longo das bordas da floresta que faz fronteira com áreas sem vegetação
florestal (LAURENCE et al., 1997). Uma faixa de um quilômetro é
recomendada por Holdsworth e Uhl (1997), mas pode ser inviável, por
causa da grande quantidade de terra (e floresta) que é excluída do sistema
de produção.
196
Os contrafogos são mais efetivos se colocados rapidamente ao longo de
toda a borda que está a favor do vento pelo uso de tochas ensopadas com
querosene. Os contrafogos requerem mais mão-de-obra no dia da
queimada. Isso se deve ao fato de que uma pessoa deve fazer o contrafogo
e pelo menos uma outra pessoa deve observá-lo para assegurar-se de que
o fogo não retornará sobre o aceiro. Na ausência de um aceiro, contrafogos
podem ser colocados ao longo da borda que está a favor do vento, contanto
que um grupo de pessoas munidas de abafadores ou água siga logo atrás
de quem está ateando o fogo, para que seja extinguida a parte anterior do
incêndio, contra o vento.
197
aproximação do fogo com bastante antecedência. A comunicação com os
proprietários das terras vizinhas é a melhor forma de saber quando incêndios
intencionais serão feitos. Vizinhos podem também convidar um ao outro
para acompanhar as queimadas intencionais e avisar um ao outro no caso
de um incêndio acidental.
198
A quantidade de biomassa florestal derrubada recentemente, consumida
por um incêndio frio, pode ser aumentada se os agricultores inspecionarem
cuidadosamente cada árvore derrubada para se assegurar de que o caule
caído está completamente separado do toco. As lascas de casca ou madeira
que mantêm a comunicação do caule caído com as raízes podem conduzir
água, o que evita a secagem da madeira e reduz o consumo de combustível
durante a queimada22.
A temperatura dos incêndios pode também ser mantida baixa nas queimadas
realizadas durante as horas úmidas e frias do dia. As temperaturas do
incêndio são mais quentes no início da tarde, de 13h00 a 14h00, quando a
temperatura é alta e sua umidade relativa é baixa. As temperaturas do
incêndio caem rapidamente no final da tarde, quando o sol se põe e a
velocidade do vento diminui, e as chamas podem ser extintas quando o ar
continua a esfriar com o avanço da noite. Os proprietários de terra devem
retardar, o máximo possível, o início de suas queimadas, ao fazê-las no
final da tarde e sem limitar os efeitos desejados do incêndio.
22
C. Pereira, dados inéditos.
199
envolver o treinamento do pessoal do lote agrícola/fazenda em técnicas de
combate ao incêndio e na implementação do plano. Além disso, as áreas
sob risco de incêndio deveriam ser preparadas para implementar o plano.
Se um tanque de água ou um trator de esteira estiver disponível, há acesso
adequado para as áreas sob risco de incêndio? Existem passagens nas
cercas, toras bloqueando estradas ou trilhas? Existe uma fonte de água
para o enchimento do tanque? O plano também deve ser discutido com os
proprietários de terras vizinhas, e os acordos devem ser feitos de forma
que o equipamento e o pessoal sejam compartilhados no caso de um
incêndio acidental em uma ou outra propriedade.
200
Se tanques portáteis de água são disponíveis, o fogo nas pastagens pode,
algumas vezes, ser interrompido ou diminuído, pulverizando com água
a vegetação da pastagem que se encontra na mesma direção em que o
fogo está se propagando.
201
incêndio florestal provoca o rápido desprendimento das folhas das árvores
e dos cipós da floresta, sucessivos incêndios podem ocorrer na mesma
área, quando as chamas e as faíscas de troncos que ainda queimam
incendeiam a camada de folhas que se desprendeu recentemente23. Por
essa razão, incêndios florestais que foram extintos devem ser visitados
diariamente a fim de que se possa ver se novos estão surgindo. Os
agricultores pobres, ao longo da Amazônia, que dependem de uma
variedade de produtos florestais para a sua subsistência suprimem os
incêndios que queimam suas florestas, ao circundarem-nas com faixas
estreitas e cortarem os troncos que se encontram sobre essas faixas, e
permanecem vigilantes observando a floresta em busca de sinais de fumaça.
23
M. Cochrane, observação pessoal.
202
203