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ROTEIRO

CENA 01 – A SAUDADE DA MEMÓRIA


INTERNA / NOITE – atualmente
Imagem com caráter documental. Camarim do circo. O camarim está
vazio e a câmera passeia por ele mostrando alguns adereços do palhaço.
Nota-se três perucas penduradas em um cabideiro, juntas a um casaco
colorido. O chão tem almofadas perdidas no meio de tecidos amarrotados.
Ouve-se muitos aplausos e alguns gritos de uma multidão – estes são
contínuos quase até o final da cena, porém seu volume vai se tornando
cada vez mais baixo. Na porta, ao fundo, entra um homem já idoso,
caracterizado de palhaço. Ele caminha até a câmera lentamente, sem nunca
olhar pra ela e pára ao lado do cabideiro. Mexe em uma das perucas e deixa
os cabelos dela passar por entre seus dedos ao fechar os olhos num respirar
profundo. Emociona-se. Anda mais um pouco e reza diante de uma bênção
papal, escrita para ele e para sua família. Reza como se agradecesse a mais
um dia de espetáculo, numa espécie de ritual contínuo, não sem sentido,
mas habitual. Mostra-se religioso. Respira fundo, não como lamento, mas
apresentando a dificuldade de dominar o corpo com o passar dos anos e
senta em sua cadeira, que encontra-se em frente a um enorme espelho
rodeado de luzes típicas de camarim. Algumas delas estão queimadas.
Outras, muito fracas. Elas possuem tonalidades diferentes de amarelo. Olha
para a câmera através do espelho e percebe, pela primeira vez, que está
sendo observado. Constrange-se num primeiro momento, sem saber ao
certo para onde direcionar a visão. Logo esquece o observador e se olha no
espelho. Aproxima-se dos olhos. Ajeita a peruca do cabelo, desconsiderando
o suor no seu rosto que, nesse momento, desfalece a maquiagem. Abaixa o
rosto para enxugar um pouco a testa e encara sua coleção de narizes de
palhaço. Observa-a como se a visse pela primeira vez. Numa maneira
infantil, exibe-a para si, orgulhando-se do tempo que demorou para reuní-la
e sorri, saudosista. Mexe em alguns narizes, passando pelas etapas que eles
o acompanharam. Pega um algodão dentro de uma caixinha de metal
enferrujada, ornamentada e velha, molha-o com uma loção qualquer e faz
menção de passar no rosto. Ao se olhar no espelho, pára. Acaricia a
maquiagem que o acompanhara por tanto tempo, numa espécie de
despedida. Os aplausos, agora quase inaudíveis, cessam. Uma lágrima cai
de seu rosto, desenhando-se nitidamente em cima da maquiagem. Ao se
dar conta do fato, o palhaço pega o algodão e passa por cima de onde antes
caminhara a lágrima, pela primeira vez.

CENA 02 – ERA UMA VEZ...


EXTERNA / DIA – passado indefinido
Em uma rua típica de cidadezinha do interior, bem tranqüila, há uns
cinco garotos jogando bola enquanto três ou quatro meninas brincam com
bonecas. Ao fundo, duas mulheres conversam. No canto, ainda próximo ao
jogo de futebol, há um menino que aparenta entre oito e nove anos a
observar os outros garotos à medida que, tímido, observa também a
aproximação da bola.
- Joaquim, chuta a bola! Anda! – diz um dos garotos.
Ele, com as mãos no bolso, abaixa a cabeça como se aguardasse um
segundo pedido no momento em que a bola se afasta dos seus pés. Um
pouco chateado pelo acontecido, Joaquim olha para os lados e decide correr
para o jogo já recomeçado, antes que não pudesse mais jogar.

CENA 03 – AMIZADE DIFÍCIL


EXTERNA / DIA – passado indefinido
O jogo de futebol está acontecendo. Joaquim fica meio de lado,
mesmo fazendo parte do time. Algumas jogadas acontecem e, em nenhuma
delas, ele recebe a bola. A verdade é que o garoto não gosta de futebol,
mas gosta de crianças. Joaquim nem corre atrás da bola. Quando começa a
desistir do jogo, a bola vêm em sua direção. Empolgado, Joaquim chuta a
bola que vai direto no pé do time adversário, que marca um gol.
- Esse moleque num serve pra nada. Não quero mais ele no time. –
reclama uma das crianças.
- Joaquim não sabe jogar! Joaquim não sabe jogar! – cantam algumas
meninas que brincavam com bonecas.
O menino, chateado, corre para longe da partida.

CENA 04 – CONHECENDO O DIFERENTE


EXTERNA / DIA – passado indefinido
De um lado da rua há as crianças brincando enquanto do outro há um
velho embriagado que caminha resmungando. Esse homem possui uma
barba comprida e vestes sujas e rasgadas. As crianças o vêem e logo
começam a cantarolar maldades, como sempre faziam. Um dos meninos, o
mais valentão da turma, se aproxima do velho como num ato de coragem,
mas este não diz nada. Logo sai correndo. As duas mulheres ao fundo nem
tomam conhecimento do homem e continuam a conversar. Joaquim, por sua
vez, choca-se com a figura do homem trava, sem mover-se, quando o
homem o encara. Logo o menino pisca e “acorda” desse transe. Assustado,
corre para sua casa, sem sequer notar as piadas maldosas feitas pelas
outras crianças perante seu medo.

CENA 04 – PORTO SEGURO


INTERNA / DIA – passado indefinido
Joaquim abre a porta de sua casa e entra correndo, sem falar com
ninguém. Sua mãe está na cozinha, preparando o almoço. A câmera passeia
pela casa, correndo atrás do garoto. No entanto, nesse percurso, ela desvia
a atenção em objetos e móveis espalhados pela casa, que caracterizam o
lugar. Primeiro vemos um piano velho e desgastado, com algumas fotos
dentro de porta-retratos em cima. Vemos também uma pequena mesinha
de centro, com uma toalha bordada em cima, com sua cor já desbotada. Ao
voltar para o menino, vemos somente seus pés terminando de subir as
escadas e, num chicote, sua mãe aparece em quadro, chamando por ele.
- Filho, você está aqui?
Sem resposta, sua mãe volta para a cozinha.

CENA 05 – FORTALEZA
INTERNA / DIA – passado indefinido
Quarto de Joaquim. No mesmo movimento da cena inicial, a câmera
mostra detalhes desse ambiente. No entanto, esse quarto é escuro e tem
uma tonalidade só, entre beges e marrons. Não traz consigo a alegria
infantil. Ele está repleto de brinquedos antigos, em sua maioria artesanais,
sem cor. Há um palhaço antigo ali, careca, de cara branca e vermelho velho
já, grande e assustador. Este fica virado de frente para a parede, tombado
de lado, cheio de pó.
Joaquim está deitado na cama, de bruço, sem soluçar ou esboçar
qualquer outra reação. Está aparentemente dormindo. Quando vemos seu
rosto, ele está muito sério, com um olhar fundo, virado de frente para a
janela, de costas para a porta.
Sua mãe entra em seu quarto.
- Filho?
Joaquim não reage ao chamado, como se não pudesse ouvi-lo.
Sem resposta, sua mãe o observa docemente. Logo fecha a porta do
quarto e sai. Joaquim pisca.

CENA 06 – TERNURA AMARGURADA


INTERNA / DIA – passado indefinido
Vera, sua mãe, está na cozinha terminando de arrumar a mesa para o
almoço. Ela coloca o prato para Joaquim e se senta em seu lugar,
ternamente amargurada, como se lembrasse de uma época que não vive
mais. Olha para o piano, onde há uma foto de Joaquim bebe, brincando com
ela e com um homem que entende-se ser seu pai. Vera se mantém com o
olhar fixo ali, como que hipnotizada, por um longo tempo. Como se
acordasse de um transe, assusta-se e acorda com um barulho vindo da
cozinha. É uma panela, transbordando no fogão. Vendo isso, Vera corre para
limpar a bagunça.
CENA 07 –
INTERNA/NOITE – passado indefinido
Já é noite e a mesa continua exatamente igual à hora do almoço. Por
outro lado, a cozinha está limpa. Vemos Vera de costas, aparentemente
sentada no sofá. Um pequeno abajur ilumina o ambiente, deixando-o numa
penumbra amarelada. Conforme a câmera se aproxima, nota-se que ela
está dormindo sentada, ainda vestida com seu avental e com um pano de
prato nas mãos. Aparenta um ar triste, como se adormecesse ali ao acaso,
num pesar. Ouve-se um pequeno ruído, de um movimento e, aos poucos,
percebe-se que existe um movimento na escada. Surge Joaquim, com o
rosto um pouco inchado. Não se sabe ao certo se de dormir ou de chorar.
Ele desce e procura sua mãe. Ve que ela está dormindo e vai em sua
direção. Ameaça acordá-la, mas exita. No entanto, como se percebesse sua
presenca, ela acorda sozinha. Olha para trás, por cima dos ombros e o vê.
Sorri carinhosamente. Ele anda em sua direção, incerto de como agir. Ela
sorri, confortando-o. Acaba então por puxá-lo, para que ele subisse em seu
colo. Pega o pano de prato e coloca no ombro, como se este fosse uma
fralda arrumada para receber um bebê. Olha então o filho, novamente.
Porém seu olhar dessa vez é outro, com um misto de ternura e
preocupação. Abraça-o mais incisivamente. Antes de falar, passa a mão na
cabeça do menino:
- Oh meu filho, que é que foi, hein?
O menino, com os olhos inchados, abraça-a ainda mais forte.
- Nada mamãe, nada!
Ela passa a mão em sua cabeça e olha para trás. Vê a mesa posta da
mesma maneira que deixara pela tarde. Olha para a cozinha e, como se
tivesse uma idéia, diz:
- Vem jantar comigo! Vai lavar sua mão.
O menino não responde nada. Ela, carinhosamente, faz cócegas em
sua barriga e pisca, insistindo para que ele a acompanhe. O menino ri em
meio aos olhos marejados agora.
- Está bem. – diz Joaquim enxugando o rosto.
Ele desce de seu colo e caminha em direção à cozinha.

CENA 06 – INTERNA / DIA – década de 30/40


Joaquim está sozinho na sala de sua casa, brincando com um pião.
Ele enrola a linha e roda o pião uma vez até que surge sua mãe, na porta da
cozinha, enxugando um prato. Ela o observa brincar por um tempo e faz
menção de dizer qualquer coisa até que diz:
- Filho, você não vai brincar?
O garoto não responde com palavras, apenas a olha com ternura e
volta a enrolar o seu pião, como se dissesse que já estava brincando.
- Joaquim, vai brincar um pouco enquanto eu termino aqui, vai filho.
Olha lá os meninos correndo na rua. – insiste a mulher.
Joaquim compreende a insistência da mãe, pega seu pião, enrola a
linha nele e guarda em uma gaveta do armário da sala.
- Está bem, mamãe. – diz o menino.
Ele anda até ela, dá-lhe um beijo e pergunta:
- Mamãe, você vai ficar por aqui, não é?
Ela sorri e completa:
- Vou sim filho.
O garoto sai.

CENA 07 – EXTERNA / DIA – década de 30/40


A maioria das crianças que estava na rua no dia anterior está
brincando de esconde-esconde. Num banco há um senhor lendo o jornal e
fumando um cachimbo. Ele observa as crianças brincando um pouco e volta
para sua leitura. Quando Joaquim sai de casa, parte das crianças está perto
do pique esperando que a última seja encontrada. Esta sai correndo detrás
de uma árvore em direção ao pique, junto com o menino que deveria
encontrá-la. Nesse momento, todas as outras crianças gritam fervorosas
para saber quem irá chegar primeiro. Joaquim observa tudo ao longe. A
brincadeira está prestes a recomeçar quando Amélia, uma das meninas, vê
Joaquim e faz sinal para ele se juntar a eles. No mesmo momento, um
menino diz:
- Vamos! Tá com o Joaquim!
Enquanto Joaquim corre para a parede para começar a brincadeira,
todas as crianças começam a correr de um lado para o outro para se
esconder, esbarrando-se algumas vezes.
- Um, dois, três, quatro, cinco, seis, sete, oito, nove e dez. Lá vou
eu! – no momento em que Joaquim começa a contagem, a rua vai
se esvaziando gradativamente até que, no número dez, não há
mais ninguém na rua exceto Joaquim e o homem que estava lendo
o jornal, que agora olha Joaquim com cumplicidade.
Joaquim começa a procurar seus amigos.
- Lá vou eu! – diz.

CENA 08 – EXTERNA / DIA – década de 30/40


Amélia está escondida atrás de uma árvore. Aos poucos, Joaquim se
aproxima dela, em silêncio. A menina percebe a presença do amigo e fica à
espreita, esperando ele se aproximar. Joaquim começa a contornara árvore
quando se depara com ela.
- Bú! – exclama a menina.
- Ai! Que susto Amélia! – rebate o garoto.
Amélia sai correndo em direção ao pique antes do garoto que, quando
dá por si, corre atrás dela.
- Cheguei primeiro! – zomba a menina - Ainda é você Joaquim! – Diz
ela.

CENA 09 – EXTERNA / DIA – década de 30/40


Seis crianças aguardam Joaquim encontrar o último menino que falta.
Uma dela diz:
- Joaquim, se você não encontrar o Mário, tá com você de novo!
- Ele sabe Osvaldo, ele sabe! – diz Amélia defendendo o amigo.
- Na casa da bruxa, ele tá lá Joaquim, vai! – comenta um menino.
- Não pode cagüetar! Não vale! – exclama outra menina.
Nesse momento a maioria das crianças encontra-se em frente à casa
abandonada. A casa não possui janelas e portas inteiras, e sua pintura está
bastante descascada. Sua aparência é realmente sombria.
- Duvido você entrar! – Diz Osvaldo confrontando Joaquim.
- Ele não vai entrar não! (risos). Duvido!
Joaquim olha para a casa bem nervoso e dá um primeiro passo.
- Cuidado com os fantasmas, Joaquim!
O garoto fecha os olhos e respira fundo, sem olhar para trás. Ao dar o
segundo passo, Amélia coloca a mão em seu ombro e diz antes de um
sorriso:
- Calma Joaquim, não vai acontecer nada não. Vai lá.
Joaquim continua seus passos com lentidão até entrar na casa. Ao
abrir a porta da casa, a porta range um som altíssimo, deixando todas as
crianças concentradas com o barulho.

CENA 10 – INTERNA / DIA – década de 30/40


Joaquim entra dentro da casa e observa a porta ranger lentamente
para fechar. A casa está escura por dentro salvo alguns raios de luz que
entram pelas frestas e buracos na parede. Ele corre os olhos por toda a sala,
intimidado com o que está vendo. Observa uma teia sem aranha e abaixa
os olhos até ver uma cadeira repleta de pó e folhas secas. O ambiente é
muito assustador. Ele olha atentamente as paredes sem se mover. Nela há
uma pintura muito escura, não é possível compreender com clareza que o
que está pintado é uma natureza morta. Joaquim decide andar atrás de
Mário. Uma nuvem de poeira levanta conforme o garoto anda. Joaquim olha
para o chão e vê muita sujeita e pára. Ouve um barulho bem baixo e treme
de medo. Ao perceber que é um gato se alivia, respira fundo e continua
andando.
Ao se aproximar de uma porta, um barulho forte de uma janela
batendo assusta Joaquim de tal maneira que ele sai correndo da casa muito
depressa, fugindo.

CENA 11 – EXTERNA / DIA – década de 30/40


Joaquim passa correndo pela rua sem conversar com as crianças, que
o olham como quem perguntasse o que aconteceu lá dentro. Logo depois
corre pelo senhor do jornal, que levanta a cabeça quando o menino passa e
vai direto para sua casa.

CENA 12 – INTERNA / DIA – década de 30/40


Joaquim entra correndo em casa e dirige-se a seu quarto. Sua mãe,
que bordava sentada quando seu filho chegou, disse:
- Oi, filho! Como estava a brincadeira?
Joaquim não a ouve e entra direto em seu quarto.

CENA 13 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Já é final de tarde e Joaquim e sua mãe estão se preparando pra
jantar. Ele está colocando os pratos na mesa enquanto ela termina de
cozinhar uma sopa.
- Filho, não esquece as colheres. Estão na segunda gaveta.
- Pode deixar! – diz o garoto se dirigindo para pegá-las.
Marta caminha com a sopeira em direção à mesa e cheira a comida.
- Hum! Vamos? – diz ela ao filho.
Os dois se sentam à mesa quando ouvem uma voz em um megafone
que diz:
- “Não percam amanhã o maior espetáculo de todos os tempos! O
circo Icário está de volta. Não percam, amanhã à noite na praça
central!”.
Marta descansa a colher no prato, olha para o filho e sorri, sugerindo
o passeio. O garoto toma a sopa e concorda com a cabeça, respondendo a
sua mãe com um sorriso.

CENA 14 – EXTERNA / NOITE – década de 30/40


A rua inteira está iluminada pelas luzes do circo. Primeiro há um
malabarista jogando quatro bolinhas coloridas para o ar com uma roupa
listrada. Ao lado dele há dois homens jogando claves acesas com fogo,
próximos a entrada do circo e nela, nota-se uma bailarina dançando como
que em uma caixinha de música. Ao fundo há um pequeno carrinho com o
letreiro “Bilheteria” em cima. Marta vê o letreiro e o aponta para Joaquim.
Ambos andam em direção a ele. Ao chegar, Marta diz:
- Duas entradas, por favor. – Marta pega os bilhetes - Obrigada.
Joaquim e sua mãe caminham em direção à entrada do circo. Ao
passar pelos homens com o fogo, Joaquim fica tão maravilhado com as
acrobacias que pára para observá-las, hipnotizado. Sua mãe o chama e ele,
acordando do encantamento, vai com ela para a entrada, onde entregam os
bilhetes e entram.

CENA 15 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Picadeiro do circo. No centro há um casal de trapezistas fazendo seu
número. A música é lenta, e a luz no ambiente, baixa. O casal está
encenando uma cena romântica, agradando a todos na platéia. A mulher
está presa em um tecido, e o homem, no chão. A cada movimento novo
realizado, a platéia aplaude incessantemente. Joaquim observa admirado as
acrobacias dos artistas. E um movimento, o garoto olha para sua mãe como
quem anseia compartilhar o sentimento momentâneo. Ela sorri para o filho
e aplaude os artistas, que finalizam seu espetáculo.
O casal agradece ao público e sai do picadeiro, deixando-a livre para
a entrada do número seguindo, o dos palhaços.

CENA 16 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


A picadeiro agora está com três homens completamente maquiados e
atrapalhados. A música deixou de ser lenta e cedeu lugar a trompetes,
pratos, buzinas e risos. Os palhaços começam seu espetáculo. Entre claque,
mímicas e risadas, a platéia é conquistada pelo trio que se entrega a altas
gargalhadas. Um dos palhaços aproxima-se de Joaquim com uma
enorme flor em seu peito. Suas risadas são um tanto intensas, o que
intimida Joaquim. O palhaço estende a mão para cumprimentá-lo, mas o
menino, apavorado, começa a chorar e abraça sua mãe com mais força.
Vendo isso, o palhaço pede desculpas à Marta e vai brincar de volta no
picadeiro.
- Filho, que isso?
Joaquim chora.
- Filho?
- Mamãe... – choraminga o menino.
- Vem Joaquim, vamos embora.
Marta se levanta, pega Joaquim e sai do circo com ele aos prantos.

CENA 17 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Quarto de Joaquim. O garoto está deitado em sua cama, pronto para
dormir olhando fixamente a janela. O quarto está escuro, há apenas uma
pequena luz vindo do corredor e outra vindo da janela, pela noite. Joaquim
mal se mexe na cama. Ele está coberto por uma manta antiga. Ao lado de
sua cama há um criado mudo com uma vela apagada e um livro. Ele
estende o braço e mexe no livro, mas não o lê. Então, respira fundo com os
olhos rasos d’água e deixa uma lágrima molhar seu rosto. Pisca duas vezes
com sono e adormece.

CENA 18 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Joaquim está em sua cama dormindo. Ouve-se uma voz:
- Ei, psiu! Ei, garoto!
Joaquim se mexe na cama, sem acordar.
- Ei menino, acorda!
Joaquim esfrega os olhos e olha ao redor de seu quarto com muito
sono quando se depara com uma figura em frente à sua cama, sentada no
parepeito da janela, iluminada num contra luz. Ainda não é possível
distinguir quem é. Parece um homem adulto, com algum acessórios.
Joaquim semi-cerra os olhos para ver melhor. A lua brilha bastante e, com a
iluminação da rua, fica realmente difícil do garoto distinguir qualquer coisa.
O homem da janela, agora sentado bem de perfil, solta uma bolha de sabão,
e fica olhando-a. Seus pés, que antes estavam dentro do quarto agora estão
no parapeito. A câmera acompanha o movimento da bolha ainda num forte
contra-luz, até ela estourar. Joaquim pisca com seu estouro. O homem faz
menção de fazezr outra quando, no meio do processo, oferece à Joaquim o
canudo. Podemos agora ver um pouco de seu rosto. Sua cara é branca, com
alguns desenhos característicos de uma maquiagem de um palhaço Bianco.
O Palhaço oferece novamente o canudo a Joaquim, e levanta uma
sobrancelha.
- Quem é você? – indaga o garoto numa curiosidade absurda, ainda
sem sair da cama
O Palhaço sorri com um ar de sapiência, como se já esperasse isso.
Joaquim fica atônito, sem sequer insistir na pergunta. O Palhaço mergulha
calmamente seu canudo num líquido e faz outra bolha. Agora, a câmera
mostra Joaquim de costas, o Palhaço e a bolha. Ela voa pela janela. O
Palhaço então o convida a sair, apontando para fora com a cabeça. O
menino insiste, com muita calma:
- Vc me ouve?
- Sou alguém que está aqui porque você chamou. – responde o
Palhaço.
O garoto não responde nada, como se essa resposta fosse muito
confusa para sua compreensão. Pela primeira vez cai em si e fica com
medo. Demostra esse medo e fecha os olhos para espantar o homem de sua
janela. Abre primeiro um olho e depois o outro, mas ele ainda está lá. Fecha
os olhos novamente. Dessa vez, permanece alguns instantes com eles
fechados. Decide, então, abri-los num tom de brincadeira. Abre primeiro
um, fazendo uma grande careta. Depois o outro. Agora o quarto está vazio.
Ele corre com os olhos pelo quarto. Agarra o lençol e, num segundo, checa
embaixo de sua cama, e longo sobe, sem sucesso. Olha mais uma vez para
os lados, até que diz:
- Tem alguém aí?
Joaquim permanece sentado em sua cama por alguns momentos
pensando sobre o acontecido. Olhou para a janela e para a porta várias
vezes seguidas, certo de que poderia encontrar o Palhaço ali ou pelo menos
um resquício de seu aparecimento. Vendo que não teria sucesso, Joaquim se
deitou para ver se conseguia esquecer o ocorrido.

CENA 19 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Joaquim e sua mãe estão em seu quarto. O menino está deitado em
sua cama, prestando atenção em Marta. Ela está com o livro da cabeceira
do menino nas mãos e, com a ajuda da luz da vela que está acesa, lê uma
história para ele dormir.
- Boa noite, meu filho! Dorme com Deus.
- Boa noite mamãe.
Marta faz menção de apagar a vela, mas Joaquim diz:
- Deixa acesa mamãe, já apago.
- Ta bem filho. Dorme com Deus então.
Joaquim assiste sua mãe sair de seu quarto. Ao perceber que ela não
poderia mais vê-lo, o menino indaga para o nada:
- Tem alguém aí?
Sem sucesso, Joaquim olha para as estrelas. Diferentemente da noite
anterior, ele não parece mais tão assustado com a imagem daquele
Palhaço. Na verdade, ele quer reencontrá-lo. Joaquim olha para o lado
procurando o Palhaço e se recrimina, rindo de sua própria bronca. Logo,
checa se alguém o observa e pára. Sorri pela lembrança da noite anterior e
fica olhando para a janela, até adormecer.

CENA 20 – INTERNA / NOITE – década de 30/40


Joaquim está dormindo em sua cama.
- Ei, menino! – diz uma voz.
Joaquim abre os olhos e, ainda deitado, sorri ao perceber do que se
tratava.
- Ei, você acordou? – insiste o Palhaço.
- Sabia que você ia voltar. – diz o garoto com uma coragem
incentivadora, ao se levantar.
- Ah é, Joaquim? – retruca o homem em tom de brincadeira, fingindo
estar desconfiado.
- Como você sabe meu nome? – assusta-se o menino.
- Joaquim, eu estou aqui porque você quer. Já te disse isso. – Afirma
o Palhaço, completando para si mesmo – Ou não?
- Eu quero? Do que você está falando?
Em tom didático, o Palhaço continua:
- Pensa comigo, hein? Ontem você me fez ir embora e, no entanto,
me procurou para saber se eu poderia ter ficado. Estou errado?
O garoto não diz nada, mas faz uma cara de surpreso pela
informação.
- Pois bem – completa – foi você que me chamou e você não sabe o
porque? Não sei não...
- É claro que eu sei. Só estou querendo saber se você sabe o que eu
sei. – retruca Joaquim, dando uma de esperto.
- Hum, quer dizer que o jogo é duro hein? Você é muito esperto
Joaquim, eu tenho que tomar cuidado. – brinca o Palhaço. E
completa - Pelo visto, nós dois vamos precisar responder essa
pergunta. Como começar?
- Vou te dizer, vai... – diz o menino interrompendo-o – te chamei
pelas estrelas!
O Palhaço, que andava de um lado para o outro, pára.
- Hum... – imitando um detetive - interessante essa sua observação.
O menino sorri, satisfeito.
- Não. – diz o Palhaço com rapidez. - Você chegou perto, mas não
acertou.
Joaquim fica sério e depois volta a pensar.
- Então você pode me dizer? – retruca o menino.
- Na verdade não, não posso. – afirma o Palhaço.
- Como não? Se fui eu que te chamei, tenho o direito de saber.
- Crianças e seus direitos! – diz o Palhaço em tom de ironia.
Joaquim fica sério.
- Mas não foi isso que você me perguntou. - completa o Palhaço – e
por isso não posso te dizer!
- Não? – responde o menino.
- Não. – insiste o Palhaço – você queria saber como me chamou, e
não o porque me chamou.
- Mas agora eu quero saber o porque! E me mostra como eu te
chamei também.
- Como você me chamou é muito simples. Foi daqui ó – o Palhaço
coloca a mão em seu peito do lado esquerdo – Foi seu coração que
me chamou, dentro de você. É complicado mesmo Joaquim, não
precisa me olhar com essa cara não...
Joaquim coloca a mão em seu peito e olha para os lados, como se
prestasse atenção nos batimentos de seu coração.
- Mas você também quer saber o porque, certo? – Brinca o Palhaço.
- Tô confuso agora! - diz o menino – Mas quero sim!
- Então vem comigo que eu te explico. – afirmou o homem com
segurança.
Joaquim o olhou com um ar desconfiado.
- Não quer saber? – disse o Palhaço ao menino e piscou para ele.
- Pra onde a gente vai? – Exclamou Joaquim.
- Surpresa Joaquim, surpresa!
Joaquim pega seu travesseiro, os dois dão as mãos e andam em
direção a porta para sair do quarto. Joaquim puxa a mão do Palhaço e diz:
- Só uma coisa!
Corre para a vela que ainda está acesa, apaga-a e volta para o
Palhaço.

CENA 21 – EXTERNA / NOITE – década de 30/40


Praça da cidade. A praça está bastante escura com uma atmosfera
nebulosa. Vê-se os pés de Joaquim, seu travesseiro, e os pés do Palhaço
andando em direção ao centro dela. Como num estalo, uma luz se acende
no centro da praça, iniciando o espetáculo. Essa luz ilumina uma carroça de
mambembes e seus arredores. O chão até a carroça está coberto de
serragem colorida o conforme o menino vai se aproximando da carroça, ele
enxerga imagens de circenses fazendo truques. Primeiro são os homens
com o fogo e logo depois um malabarista. Ao olhar a carroça, ele vê uma
bailarina, como a do circo que fora com sua mãe. Numa cumplicidade com o
Palhaço, o menino puxa sua mão e sorri, admirado com tudo que está
vendo. O Palhaço sorri de volta e sobe na carroça para começar o
espetáculo ao som de uma quantidade ensurdecedora de ruídos e músicas
alegres:
- Senhoras e senhores! - arruma a garganta e sorri – Ou melhor,
meninos e meninas! Ops, Menino! Que rufem os tambores – ouve-
se o som de tambores sendo tocados por um outro palhaço – Com
vocês, o Palhaço!
Joaquim aplaude veemente o início do espetáculo. O Palhaço começa
a fazer truques de mágica com bolas e cartas. A cada truque realizado, o
menino aplaude com mais força o que está vendo. Alguns truques são
semelhantes aos que o garoto vira no circo com sua mãe.
O Palhaço faz um truque com uma pomba. Tirando-a debaixo de um
pano qualquer, ele a faz desaparecer e reaparecer, liberando-a para voar. A
pomba voa pela noite com um alto som de seus ruídos ao fundo.
O Palhaço então coloca uma flor em sua roupa e pede que Joaquim
aperte sua mão. O menino olha fixamente nos olhos do Palhaço e concorda
em apertá-la com a cabeça, agindo em seguida. Por um momento, as
músicas alegres que acompanham o espetáculo desde o início cedem lugar
a um silêncio pacífico, envolvente.
Com as mãos separadas, as cornetas recomeçam seu barulho e o
Palhaço volta para a carroça. A câmera vai se afastando lentamente da
ação, se distanciando.

CENA 22 – EXTERNA / DIA – década de 30/40


Ao som do um ruído de uma pomba, vê-se a praça da noite anterior,
vazia. Logo se nota Joaquim, dormindo deitado em seu travesseiro, com os
primeiros raios de sol chegando em seu rosto.
Há uma pomba próxima ao pé dele que o bica algumas vezes,
acordando-o. Ao abrir os olhos, Joaquim percebe que não está em sua casa
e se dá conta que está na rua. Nesse momento o garoto para e sorri,
pensando no que aconteceu. Então respira fundo. E sorri novamente.
Decidido, olha em volta para ver se há alguém na rua e vê que não há
ninguém. A rua está deserta, já que ainda é muito cedo. Joaquim olha para
sua casa e olha para a rua. Levanta e corre em direção onde acredita que a
carroça foi. Sem perder as esperanças, não pára de correr.

CENA 23 – EXTERNA / DIA – década de 50/60


A rua está correndo diante da câmera. Ouve-se algumas vozes de
homens e mulheres dizendo:
- Anda logo!
- Corre!
- Vai logo! Dá tempo!
- Vem!
Vê-se Joaquim com aproximadamente vinte e poucos anos correndo
atrás de uma carroça de mambembes com uma mala amarrada a um
travesseiro na mão. Depois de correr um pouco, ele alcança a carroça e
sobe. Cumprimenta as pessoas que estão em cima dela e olha para trás.
Levanta a mão e faz um sinal de adeus para sua casa, que se afasta cada
vez mais.

CENA 24 – INTERNA / NOITE – atualmente


Volta-se para a cena 01, no camarim do Palhaço no circo. Ele está
com o rosto quase inteiramente limpo, tirando o último risco de maquiagem.
Seus olhos estão umedecidos com lágrimas e seu rosto, cabisbaixo. Joaquim
respira fundo e olha diretamente para a câmera, relembrando o que
acabara de dizer. Seus olhos lacrimejam-se novamente e uma lágrima
escorre de seu rosto. A situação fica imóvel por alguns instantes. O homem
imóvel chacoalha a cabeça algumas vezes, como se voltasse a si. Olha para
seus objetos e sorri, deixando cair mais uma lágrima. Faz menção de dizer
algo mas não sente mais vontade de dizer nada. Olha para a câmera
novamente e sorri, agradecendo com um gesto na cabeça.
FIM

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