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Uma pena de prisão para defesa do ordenamento jurídico

Por Francisco Teixeira da Mota

Público, 27-2-2010

As mortes na estrada raramente são punidas com pena de prisão efectiva mas a Relação do
Porto não esteve pelos ajustes

No dia 15 de Abril de 2006, o Joaquim decidiu tomar uns copos com uma amiga em diversos
bares. Quando decidiu parar, já estava com uma taxa de alcoolemia de 1,47 g/l, o que,
naturalmente, não o impediu de conduzir o automóvel. E, assim, conduzia "calmamente" a sua
viatura a uma velocidade superior a 100 km/hora, numa estrada onde a velocidade máxima era
de 50 km/hora, quando, ao entrar numa curva, dada a velocidade a que ia e o ângulo daquela,
deixou de ter controlo sobre o automóvel, que perdeu a trajectória anterior e invadiu a faixa de
rodagem da sua esquerda, destinada ao trânsito de sentido oposto (norte-sul), onde, nessa
altura, seguiam dois veículos, um imediatamente atrás do outro.

Como consequência daquela invasão da faixa esquerda da estrada, a algumas dezenas de metros
depois do final da curva, o Joaquim embateu a mais de 100 km/hora, de frente, na parte frontal
da viatura que vinha na outra faixa, não só anulando a velocidade que esta, na altura, trazia, de
cerca de 50 ou 60 km/hora, como fazendo com que este fosse projectado em sentido inverso,
contra o veículo que seguia imediatamente à sua retaguarda, embatendo-lhe com a traseira no
lado esquerdo da sua parte frontal.

Sublinhe-se que o choque frontal não foi suficiente para anular a força cinética de que a viatura
do Joaquim se encontrava animada, pelo que continuou a dita trajectória, só se tendo
imobilizado, por si, dezenas de metros após o primeiro embate, numa ravina, com cerca de
quatro metros de declive.

Esclareça-se, ainda, que na altura do acidente a estrada se encontrava em bom estado de


conservação, com piso betuminoso regular, não chovia, e não se apresentavam obstruções
visuais ambientais de qualquer natureza.

Segundo foi apurado pelos peritos, o Joaquim, ao imprimir a referida velocidade, mesmo na
descrição de uma curva e ao mantê-la até ao momento do embate, causou um impacto cerca de
quatro vezes mais violento do que aquele que existiria caso o veículo transitasse ao máximo de
velocidade permitida, aumentando assim, entre oito e 16 vezes, a gravidade dos ferimentos e a
possibilidade de serem fatais. Por último, acrescente-se que, em consequência do embate e por
causa das lesões sofridas com a colisão, vieram a falecer, imediatamente, três pessoas, ficando
feridas mais duas.

Julgado, o Joaquim foi condenado pela prática de um crime de homicídio por negligência
grosseira, um crime de condução em estado de embriaguez, na pena principal de três anos e três
meses de prisão e na sanção acessória de um ano de inibição de conduzir.

Joaquim, ciente da razão que lhe assistia, recorreu invocando argumentos tão fortes como o

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facto "mais do que evidente" de que um dos falecidos "não fazia uso do cinto de segurança" (no
fundo, a sua morte teria sido mais um suicídio do que um homicídio...) ou, ainda, a "inexistência
de medidas paliativas, da responsabilidade da entidade que tem jurisdição na conservação da
referida via, as quais serviriam para minimizar ou mesmo impedir que acontecessem acidentes
rodoviários da natureza" do que lhe acontecera ...

Basicamente, o que pretendia o Joaquim com o seu recurso era que lhe fosse suspensa na sua
execução a pena de prisão. Não queria, compreensivelmente, "ir dentro".

E, na verdade, no nosso país, as mortes na estrada raramente são punidas com pena de prisão
efectiva, apesar dos comportamentos, por vezes, verdadeiramente sinistros que lhes estão na
origem, nomeadamente a irresponsável ingestão de bebidas alcoólicas.

Mas, desta vez, o Tribunal da Relação do Porto não esteve pelos ajustes e confirmou, no passado
dia 10, a condenação do Joaquim a prisão efectiva, lembrando que "a suspensão generalizada e
tida como "normal" ou "corrente" das penas de prisão de amplitude elevada, prejudica
grandemente (...) a eficácia preventiva do direito penal". Isto é, já ninguém "leva a sério" as
condenações pelos acidentes de viação e "toda a gente" acha que "não há azar" em conduzir com
excesso de velocidade e "com uns copos" porque "ninguém vai dentro". Mesmo que se matem
pessoas...

Ora, a suspensão da pena é uma medida de conteúdo pedagógico e reeducativo que "pressupõe
uma relação de confiança entre o tribunal e o arguido", estando aquele convencido de que a
suspensão beneficiará o arguido na sua ressocialização, mas sempre procurando evitar a criação
de um sentimento de impunidade generalizado que frustra os fins dissuasórios da lei criminal.

A reacção penal a aplicar "deve, tanto quanto possível, neutralizar o efeito do delito, passando
este a surgir, sem sombra de dúvidas, como um exemplo negativo para a comunidade e
contribuindo, ao mesmo tempo, para fortalecer a consciência jurídica da mesma", procurando-
se, assim, "dar satisfação ao sentimento de justiça do mundo circundante que rodeia o arguido,
através do mínimo de prevenção geral de defesa da ordem jurídica" .

E, por isso mesmo, muitas vezes, mais importante do que a ressocialização, refere o acórdão,
torna-se "necessária a execução de uma pena de prisão para defesa do ordenamento jurídico,
designadamente quando o comportamento desviante for revelador de uma atitude generalizada
e consequente de não se tomar a sério o desvalor de certas condutas relevantemente ofensivas
da vida comunitária, de acordo com os princípios constitucionais relevantes de um Estado de
Direito Democrático".

Os juízes desembargadores Joaquim Arménio Correia Gomes, Paula Cristina Passos Barradas
Guerreiro (que votou vencida) e José Manuel Baião Papão ordenaram, assim, que o Joaquim
recolhesse à prisão. Advogado (ftmota@netcabo.pt)

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