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Nº 65 • Janeiro de 2008

Av. Brasil, 4.036/515, Manguinhos


Rio de Janeiro, RJ • 21040-361
w w w. e n s p . f i o c r u z . b r / r a d i s

13ª Conferência Nacional de Saúde

Evento se destaca
pelo que rejeitou, não
pelo que aprovou
Da voz dos delegados à ação

inconclusa” de atividades já fundamen- saúde nos conselhos estaduais e muni-


Adriano De Lavor tadas, propostas e deliberadas em 15 cipais, com o objetivo de subsidiá-los
anos de SUS, mas que não se tornaram na divulgação de suas atividades, pelo

Q uando as bocas amordaçadas de


roxo protestaram contra a não-
discussão das propostas inéditas, na
“práxis de transformação social”.
Em agosto de 2007, na reunião
ampliada de sua comissão interseto-
fortalecimento do controle social e
estimulando “a criação de uma rede
de comunicação”, como diz a proposta
plenária final da 13ª Conferência Na- rial de comunicação e informação em 12. Os delegados também aprovaram
cional de Saúde, transparecia — entre saúde, o Conselho Nacional de Saúde a convocação da conferência temáti-
gestos inconformados e palavras de reafirmou o compromisso com a de- ca e recomendaram maior acesso às
ordem — a necessidade de se estabe- mocratização das informações sobre informações de saúde, com política
lecer uma relação mais concreta entre saúde da população e a ampliação da específica para populações vulneráveis
as ações comunicativas e informativas participação social na definição da ou o uso de meios alternativos — rádios
e as ações no âmbito da saúde. A dis- Política Nacional de Comunicação, comunitárias e materiais em Braille.
cussão, porém, não é recente. Informação e Informática em Saúde, Ainda foram aprovadas propostas
O relatório final da 8ª CNS já reco- recomendando aos conselhos a criação de divulgação de um SUS positivo na
mendava a “proibição da propaganda de comissões específicas de comunica- mídia, disseminação e distribuição de
comercial de medicamentos e produ- ção e a parceria com comunicadores. produtos informacionais em saúde com
tos nocivos à saúde” e considerava Os ecos da reunião preparatória eqüidade de acesso — com investimento
“indispensável” o acesso da população reverberaram nas propostas apresenta- em tecnologia e software —, a retomada
às informações necessárias ao controle das na 13ª: 18 propostas aprovadas do da Rede Nacional de Informações em
social dos serviços, a partir de um Eixo 1 tratavam de questões diretamen- Saúde, a regulamentação da propaganda
sistema nacional de informações que te relacionadas a ações de comunicação de alimentos direcionada ao público
viabilizasse maior transparência às e informação, como a regulamentação infantil e campanhas de valorização dos
atividades do setor. da propaganda de bebidas alcoólicas, agentes comunitários de saúde.
A mesma preocupação esteve pre- a criação de campanhas publicitárias Nenhuma proposição apresentada
sente na preparação para a 12ª, quando sobre saúde mental ou a instalação sobre comunicação ou informação foi re-
Abrasco e Cebes propuseram a Rede de serviço telefônico de denúncias de jeitada pelos delegados, o que demonstra
Pública Nacional de Comunicação em agressão ambiental. a latente carência de ações concretas em
Saúde. No documento “Em defesa da No Eixo 2, a preocupação era mais todo o país. Apesar disso, a construção
saúde dos brasileiros”, as instituições específica com a informação em 12 de uma rede comunicativa que garanta a
defendiam o campo da comunicação e propostas aprovadas, que tratavam do multiplicidade de significados, a eqüida-
saúde, a partir do qual se fortaleceria cartão SUS, do melhor fluxo de dados na de de acesso e a integralidade de ações
a consciência sanitária da po- notificação de acidentes de trabalho e de permanece um desafio.
pulação e se estabeleceria “um ações educativas promotoras da saúde A pesquisadora Janine Cardoso, do
diálogo com o imaginário social, do homem e do planejamento familiar. Icict/Fiocruz, arriscou um diagnóstico:
suas expressões, interesses e in- A comunicação foi requisitada na forma “Talvez a nossa capacidade de identificar
quietações no âmbito da saúde”. de campanhas publicitárias — como o es- lacunas ainda seja maior do que a capa-
A carta propugnava uma tímulo à doação de órgãos e a divulgação cidade de preenchê-las”. A saída parece
política de comunicação para o controle do Pacto em Defesa do SUS. estar na substituição de uma comuni-
social ”que viabilizasse maior interlo- Foram as discussões do Eixo 3, cação persuasiva e governamental por
cução entre as suas diversas esferas e a no entanto, que trataram com maior um agir comunicativo mais próximo da
sociedade em geral, incluindo atividades proximidade as duas temáticas, garan- democracia participativa e do controle
desenvolvidas pelos conselhos de saúde” tindo a criação das comissões de comu- social. Transformar a voz dos delegados
e chamava a atenção para uma “agenda nicação, informação e informática em em ação pode ser o primeiro passo.
editorial
Nº 65 • Janeiro de 2008

Sumário comentado
Comunicação e Saúde

N um primeiro olhar, o pouco debate à autonomia em relação ao seu corpo. • Da voz dos delegados à ação 2
e a articulação entre grupos reli- Os argumentos contrários e favoráveis
giosos, indígenas e sindicais marcaram às fundações estatais estão, respecti- Editorial
a 13ª Conferência. Perderam o aborto, vamente, nas páginas 11 e 35. As falas • Sumário comentado 3
como “questão de saúde pública”, e as do presidente Lula e dos integrantes da
fundações estatais de direito privado, mesa de abertura integram a matéria da
como alternativa de “superar a gestão página 9, assim como a conferência mag- Cartum 3
burocratizada”. Mas é evidente que na do ministro Temporão, que exaltou o
outros recados emergiram da voz e do SUS, mas, principalmente, diagnosticou Cartas 4
voto dos mais de três mil delegados que os seus problemas mais críticos hoje.
movimentaram o Pavilhão de Exposições A vitalidade crítica dos veteranos
Súmula 5
de Brasília, em novembro. Garimpando o sanitaristas e demais convidados nas
conjunto de propostas, sobressaem a op- mesas-redondas, que abordaram os três
ção por mudanças no Sistema Único de eixos temáticos da Conferência, foi um
Saúde que priorizem ações de prevenção sopro de reflexão e convocação à ação
e promoção da saúde, notadamente as política, em contraste com o tom plebis-
intersetoriais, a valorização da gestão citário e avesso a destaques e discussões Toques da Redação 7
do trabalho e de equipes multiprofissio- que tomou conta especialmente da
nais, além da regulação da relação entre Plenária Final. Entre as páginas 16 e 24,
o público e o privado. O relatório final o leitor vai reencontrar sólidos discursos
com a íntegra das propostas deverá estar que analisam as relações do capital, da
no site do Conselho Nacional de Saúde a ideologia, da política, do meio ambiente 13ª Conferência Nacional de Saúde
partir deste janeiro. e da participação popular com a saúde, • Encontro de paradoxos 9
Não foi trivial sintetizar toda a que discutem as fontes de financiamento • Entrevista: Francisco Batista Júnior
riqueza da Conferência. Para facilitar a do sistema, que resgatam o conceito “A 13ª percebeu que o SUS está
privatizado” 14
localização dos temas, aqui vai um pe- da Seguridade Social e defendem ações
queno roteiro, um sumário comentado. intersetoriais para além da assistência • Sob tensão, plenária aprova regimento 15
Caso o leitor queira saber como foram os e da previdência, que contrapõem cres- • Três dias de (boa) reflexão 16
debates, as teses em disputa, as opiniões cimento a desenvolvimento sustentável • Mesa-redonda • Eixo 1: A ideologia
dos delegados e o clima das discussões, e desafiam a população a reivindicar a bem viva 16
deve ir direto para a página 25. Para democracia participativa dos conselhos • Mesa-redonda • Eixo 2: Beabá da
seguridade 19
conferir os argumentos sobre o aborto, e conferências também para a definição
encontra na página 28 um relato de das políticas econômicas que tanto de- • Radis adverte 21
como católicos, evangélicos e indígenas terminam a saúde. • Mesa-redonda • Eixo 3: Que herança
deixaremos? 22
se organizaram para ganhar a votação
e, na página 32, a crítica ao conserva- Rogério Lannes Rocha • Plenárias temáticas: Da bagunça
ao método 25
dorismo e a defesa do direito da mulher Coordenador do Programa RADIS
• Entrevista: Clóvis Boufleur
“A 37 não era um texto inocente” 28
• Plenária final: Os sem-debate 29
• Entrevista: Armando Raggio
Cartum “Fomos fiéis aos textos” 30
Mas • Entrevista: Telia Negrão
eu discuti Mas A 12ª e a 13ª conferências “A conferência adiou o debate,
tudo, você eu votei disputam qual foi A melhor... mas ele voltará” 32
não! tudo, você
não!
Serviço 34

Pós-Tudo
• Um confronto anunciado 35

... enquanto a oitava segue


tranqüila na certeza de ser
inesquecível.
Capa e ilustrações Aristides Dutra (A.D.)
A.D.
Radis 65 • jan/2008
[ 4 ]

cartas

Legalização do aborto números do Ministério da Saúde assus- Na aula, no trabalho


tam; porém, os números sobre o cres-

C onheci a Radis em 2003 quando


fui contemplado com a assinatura
da revista. Na época era secretário
cimento da aids também: se todos se
lembram, sempre foram alarmantes,
mas nesse caso o combate se deu por
Q uero registrar a grande impor-
tância da Radis para mim, pois
me mantenho atualizada no que
de Saúde de Manoel Vitorino (BA). outro caminho, o acesso a métodos de está acontecendo na saúde. Como
Hoje ocupo o cargo de secretário de prevenção e conscientização. estudante de Serviço Social, a revis-
Assistência Social no mesmo municí- É inconcebível legalizar o sacrifí- ta vem me subsidiando nos estudos,
pio e é com imenso prazer que venho cio de vidas sob o pretexto de salvar porque também faço estágio nessa
agradecer e elogiar os coordenadores conveniências ou matar uns para área, num hospital público e num
deste excelente meio de informação salvar outros. Os embriões têm vida, programa social que opera com a
que de forma inteligente aborda não a vida é protegida na Constituição, Saúde da Família. Portanto, a Radis
só temas ligados à saúde, de grande pensada, elaborada e aprovada por está sendo essencial em tudo o que
valia para o meu trabalho. humanos. Se formos seres racionais se refere a promoção da saúde, ci-
Como todo brasileiro acompanho é preciso concluir de uma vez por dadania e bem-estar.
a discussão em torno da descrimina- todas: a discussão considerando todos • Valquiria Gomes Rocha, Salvador
lização do aborto. Li na Radis nº 58 os aspectos que envolvam a prática
matéria sobre o assunto. Assusta-me deste crime hediondo chamado aborto
muito o fato de homens e mulheres
preparados e inteligentes concluírem
que a legalização do aborto é o cami-
legal não terá no Brasil o desfecho que
alguns defendem. O aborto é permi-
tido só em casos especiais, quando
C omecei a receber a revista Radis e
estou muito satisfeita: apesar da
espera depois que fiz a inscrição pela
nho mais curto para conter ou reverter clinicamente for comprovado o risco internet, valeu a pena. E tenho certeza
o alto índice de mortalidade de mu- de vida da gestante. de que vai me ser muito útil, pois estou
lheres que, por um descuido, se vêem Não ao desprezo pela vida, sim a fazendo curso técnico de enfermagem.
obrigadas a este recurso para salvar a uma maior conscientização na busca E gosto de estar informada sobre todas
pele e outras conveniências. de homens e mulheres mais respon- as novidades ligadas à saúde.
Anualmente, mais de 200 mil sáveis. Gerar uma vida é um dom • Elisangela Matos Pimentel, Tucano, BA
curetagens como conseqüência de sagrado, legalizar o aborto significa
abortos malsucedidos evidenciam a legalizar o extermínio.
necessidade de outra postura. Esses • Tarcizio Martins, Manoel Vitorino, BA
P arabéns pela revista. Sou assinante
há mais de dois anos e fico feliz
toda vez que recebo a Radis com ma-
expediente térias extremamente atuais!
• Marcus Boaventura, administrador
de empresa, Salvador

Na ouvidoria

RADIS é uma publicação impressa e on-


line da Fundação Oswaldo Cruz, editada
pelo Programa RADIS (Reunião, Análise e
Reportagem Katia Machado (subeditora),
Adriano De Lavor, Bruno Camarinha
Dominguez e Karine Thames de Menezes
T rabalho na Secretaria Munici-
pal de Saúde como ouvidora,
na sala do Conselho Municipal de
Difusão de Informação sobre Saúde), (estágio supervisionado)
da Escola Nacional de Saúde Pública Arte Aristides Dutra (subeditor)
Saúde. Gostaria muito de receber
Sergio Arouca (Ensp). Documentação Jorge Ricardo Pereira, Laïs exemplares anteriores da Radis
Tavares e Sandra Suzano para que a comunidade, usuários e
Periodicidade mensal
Tiragem 60.000 exemplares Secretaria e Administração Onésimo Gouvêa conselheiros possam se inteirar de
Assinatura grátis e Fábio Renato Lucas quão útil é esta revista.
(sujeita à ampliação do cadastro) Informática Osvaldo José Filho • Helena Aparecida de Jesus Leite,
Presidente da Fiocruz Paulo Buss Endereço Jataí, GO
Diretor da Ensp Antônio Ivo de
Carvalho Av. Brasil, 4.036, sala 515 — Manguinhos
Rio de Janeiro / RJ • CEP 21040-361 * Prezada leitora, já foi providen-
Ouvidoria Fiocruz Tel. (21) 3882-9118 • Fax (21) 3882-9119 ciado.
Telefax (21) 3885-1762 E-mail radis@ensp.fiocruz.br
Site www.fiocruz.br/ouvidoria Site www.ensp.fiocruz.br/radis (a seção Radis
na Rede é semanal; Últimas Notícias atualiza NORMAS PARA CORRESPONDÊNCIA
PROGRAMA RADIS
matérias da edição impressa)
Coordenação Rogério Lannes Rocha A Radis solicita que a correspondência
Subcoordenação Justa Helena Franco Impressão dos leitores para publicação (carta,
Edição Marinilda Carvalho Ediouro Gráfica e Editora SA e-mail ou fax) contenha identificação
completa do remetente: nome, en-
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pode ser livremente utilizado e reproduzido em aos veículos que reproduzirem ou citarem conteúdo dereço e telefone. Por questões de
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dos créditos gerais e da assinatura dos jornalistas referências da reprodução ou a URL da Web.
Radis 65 • jan/2008
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Súmula

dos melhores índices de mortalidade e deixou para 2008 o lançamento do


PAC da Saúde infantil do país — 7,64 mortes para cada plano que visa um equilíbrio maior en-
1.000 nascidos vivos (O Estado de S. tre as regras de proteção das patentes

O presidente Lula lançou em 5/12


o Programa Mais Saúde, que pre-
via investimentos de R$ 88,6 bilhões
Paulo, 28/11/07). A maioria dos 3.300
habitantes vive na zona rural, e há pelo
menos uma década todo recém-nascido
e a obrigação dos governos de garantir
saúde aos povos, informou O Estado de
S. Paulo (11/11/07).
(R$ 64,6 bilhões do Plano Plurianual e tem acompanhamento alimentar e nu- A estratégia, debatida desde 2003,
R$ 24 bilhões da CPMF/EC 29) em qua- tricional. O secretário de Saúde, Darci deveria ter sido concluída em dezembro.
tro anos — agora o governo revê as fontes Maia, afirma que o bom índice se deve, Mas o texto final da OMS foi considerado
de financiamento, já que a CPMF foi além do Saúde da Família, ao monito- favorável demais aos grandes laborató-
rejeitada. No eixo Promoção e Atenção, ramento do programa federal Sistema rios. O Brasil então propôs novo texto
a família será foco prioritário, da infância de Vigilância Alimentar e Nutricional (Radis 64), que previa o fim de cláusulas
aos idosos: 26 milhões de crianças serão (Sisvan). Para ele, no cargo há nove de patentes em acordos bilaterais e
acompanhadas por equipes de Saúde da anos, a continuidade tem influência no mecanismos de financiamento de remé-
Família nas escolas com, no mínimo, resultado positivo. “Não houve interrup- dios contra doenças negligenciadas. As
duas consultas por ano, e verbas de ção por questões políticas”, diz. multinacionais atacaram as propostas
R$ 844 milhões; política inédita com brasileiras, que consideram “ideológi-
recursos de R$ 227 milhões será volta- cas e teóricas”.
da à saúde do homem, para ampliação HIV em 20 minutos O Brasil festejou com ativistas
de exames e consultas e capacitação da saúde o adiamento: pelo menos
de 32 mil médicos. Uma das metas é
que o Saúde da Família passe a cobrir
130 milhões de brasileiros, contra os
U m kit descartável para diagnóstico
de aids a partir da saliva, chama-
do OraQuick, fornece resultado em 20
não venceu o ponto de vista dos
EUA, que representa os interesses
da indústria farmacêutica. A OMS
87 milhões atuais. minutos, ao custo de R$ 35. Capaz de considerou a negociação “histórica”,
Serão criadas 132 Unidades de identificar a contaminação pelo HIV os países emergentes apoiaram, mas
Pronto Atendimento 24 horas, para tipos 1 e 2 com 99% de precisão, o a indústria rejeitou. “Estamos todos
diminuir o fluxo de pacientes nas kit está sendo avaliado pela Anvisa. O desapontados”, lamentou Harvey
emergências, integradas ao SAMU, fabricante, a empresa americana Oral- Bale, da Federação Internacional de
que se estenderá a todo o país com a Sure Technologies, ofereceu o produto Indústrias Farmacêuticas. Para Michel
aquisição de mais de 4 mil ambulân- ao Ministério da Saúde e tem espe- Lotrowska, dos Médicos Sem Fronteira,
cias; 302 Complexos Reguladores (um rança de obter sua liberação no Brasil o debate mostrou que alguns governos
em cada estado e em municípios com neste primeiro semestre. Os médicos não mais aceitarão a atual estrutura
mais de 100 mil habitantes) agendarão recomendam um teste tradicional para de patentes. O encontro reuniu 140
consultas, internações e exames. confirmação dos resultados. países e muitas divergências entre
A recomposição da tabela do ricos e pobres.
SUS gerará impacto de R$ 5 bilhões,
sendo R$ 3 bilhões de recursos novos. Vioxx: indenização de US$ 4,9 bilhões
O mecanismo de repasse de recursos Saúde esquenta pré-campanha nos EUA
a estados e municípios será o da con-
tratualização, pela qual o gestor se
compromete a cumprir metas. O pro-
O laboratório Merck anunciou
(9/11/07) acordo de US$ 4,85 bi-
lhões (R$ 8,43 bilhões) de indenização A saúde pública tem sido o tema prin-
cipal dos debates entre os senadores
grama prevê a criação de “fundações para encerrar mais de 95% dos proces- Hillary Clinton (Nova York) e Barack
públicas de direito privado”, que darão sos contra seu antiinflamatório Vioxx, Obama (Illinois), os favoritos entre os
“mais eficiência na administração de retirado do mercado em 2004 depois oito pré-candidatos democratas à indi-
hospitais públicos”, informa a nota. de comprovado o risco de infarto pelo cação do partido na eleição presidencial
O atendimento a mulheres em uso contínuo da droga. A empresa disse deste ano. Hillary defende um sistema
idade fértil subirá de 11 milhões para 21 em comunicado que o acordo não sig- de saúde universal para os EUA. Quando
milhões, com verbas de R$ 790 milhões. nifica reconhecimento de culpa — mas seu marido, Bill Clinton, era presidente
Os programas para idosos receberão R$ afirmava desde o início que contestaria (1993-2001), ela apresentou um plano
138 milhões, com qualificação de 66 cada uma das 26.600 ações na Justiça. integral, esmagado no Congresso pela
mil cuidadores. O PAC da Saúde inclui O pagamento pode começar em agosto indústria médica e farmacêutica, que
uma Força Nacional de Emergência: até deste ano — desde que até 1º de março despejou milhões nos bolsos dos parla-
2011, terá 2 mil médicos, 1.000 enfer- 85% dos pacientes assinem o acordo. mentares. O episódio é contado no filme
meiros e 100 dentistas para crises. SOS Saúde (Sicko, de Michael Moore,
2007), exibido no Festival do Rio em
ONU adia plano sobre acesso outubro, com lançamento comercial no
O exemplo de Camacho, MG a medicamentos Brasil previsto para este mês.
Mais de 47 milhões de america-

U ma equipe multiprofissional do Saú-


de da Família está dando à pequena
Camacho, no centro-oeste mineiro, um
A Organização das Nações Unidas não
conseguiu consenso para a estraté-
gia global de acesso a medicamentos
nos, numa população de 301 milhões
(julho/2007) não têm cobertura
alguma de saúde. No debate entre
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os pré-candidatos fica claro que de agricultura, pecuária, atividade palavras do presidente francês François
mesmo as propostas mais avançadas madeireira, fogo e secas, se as atuais Mitterand, em 1989: “O Brasil precisa
de planos universais não supõem um tendências forem mantidas, segundo aceitar uma soberania relativa sobre a
sistema público gratuito: todos pre- estudo divulgado (Globo Online, Amazônia.” Ou as do Prêmio Nobel Al
vêem papel crucial de empregadores 6/12) pelo grupo ambiental WWF Gore: “Ao contrário do que os brasileiros
e seguradoras de saúde. O Medicare, em Washington e Bali. O trabalho pensam, a Amazônia não é deles. Ela
plano de saúde dos idosos arduamente reuniu pesquisadores do Woods Hole pertence a todos nós.”
conquistado pelos americanos, é um Research Center (EUA), do Instituto
pool de seguradoras. de Pesquisa Ambiental da Amazônia
(Ipam) e da UFMG. Mais cana, menos emprego
“Os modelos anteriores não le-
Câncer de pele vem da infância vavam em conta o fogo, a exploração
madeireira e o regime de chuvas”, D e 1971 a 2004, 670 mil postos de
trabalho foram eliminados nas áreas

A oncologista Senen Dyba Hauff, do


Centro de Pesquisas Oncológicas
da Secretaria de Saúde de Santa Ca-
disse o americano Daniel Nepstad,
coordenador do estudo, que trabalha
na Amazônia há 20 anos. Íntegra (es-
rurais do estado de São Paulo devido,
principalmente, à progressiva mecaniza-
ção da agricultura paulista, informou a
tarina, disse que os pais devem evitar panhol e inglês): www.worldwildlife. Agência Fapesp em 6/12/07. “O número
os banhos de sol do bebê: 70% a 80% org/news/displayPR.cfm?prID=472 de trabalhadores caiu no período, espe-
das radiações que causam câncer de cialmente nos anos 90, de 1,723 milhão
pele na vida adulta foram recebidas para 1,050 milhão”. Os dados estão na
na infância. Tal hábito deve ser aban- Protetorado ao Norte tese de doutorado — “Relações de tra-
donado, disse à Agência Fapesp após balho na agricultura paulista no período
palestra no 2º Congresso Internacional
de Controle do Câncer, realizado no
fim de novembro no Rio de Janeiro.
O colunista Elio Gaspari informou
(28/11/07) que a Guiana, na
fronteira norte do Brasil, quer virar
recente” — de José Marangoni Camargo,
professor de Economia da Unesp em Ma-
rília, defendida no Instituto de Economia
Segundo ela, a recomendação mais protetorado florestal: o presidente da Unicamp. A categoria mais afetada é
comum é que a criança tome banho de Bharrat Jagdeo anunciou que nego- a dos bóias-frias.
sol por 20 minutos diários. No entanto, cia a preservação de sua floresta
dois minutos são suficientes para que o amazônica em troca de recursos
organismo sintetize a vitamina D, que para o desenvolvimento. “Eu não Justiça mantém multa à Syngenta
previne o raquitismo. “No Brasil ainda sou um mercenário e isso não é
não há consenso sobre esse assunto,
como ocorre na Austrália, no Canadá
e nos Estados Unidos”, disse.
chantagem. Eu sei que não existe
almoço grátis e não estou fazendo
isso porque sou um bom sujeito que
A Justiça Federal no Paraná decidiu
que são ilegais as atividades da
transnacional Syngenta Seeds em Santa
A oncologista ressaltou que o quer salvar o mundo. Precisamos de Teresa do Oeste, na área de amorteci-
câncer de pele é o que mais sobe esta- ajuda”. A renda per capita da Guiana mento do Parque Nacional do Iguaçu,
tisticamente. “É necessário desconstruir (770 mil habitantes) é de US$ 4.800 e confirmou multa dada em março de
a idéia de que o bronzeado é bonito, (Brasil: quase US$ 9 mil). A floresta 2006 pelo Ibama, de R$ 1 milhão. A
bronzeado significa agressão celular”. de Jagdeo, diz o colunista, ocupa sentença, de 30/11/07, reconhece que
área maior do que a Inglaterra e a o Parque Nacional do Iguaçu tem plano
mata seria administrada por uma de manejo, com zona de amortecimento
Cenário pessimista para o planeta organização internacional liderada de 10 km, ao contrário do que afirmava
pelos britânicos. “Seria uma recaída a empresa. Diante disso, a Syngenta não

A Conferência da ONU para Mudanças


Climáticas, no balneário de Bali (In-
donésia), em dezembro, começou com
colonial para o país, que se tornou
independente em 1966”, avalia.
Brasil, Guiana, Bolívia, Colôm-
poderá voltar a pesquisar soja transgê-
nica na região. Em 21/10/07, quando a
organização Via Campesina ocupou a área
uma boa notícia: a Austrália trocou de bia, Equador, Venezuela e Peru são em protesto, seguranças da empresa NF,
primeiro-ministro e o atual, mais pro- signatários do Tratado de Cooperação contratada pela Syngenta, executaram o
gressista, decidiu assinar o Protocolo de Amazônica desde 1978. “Por elegân- militante do MST Valmir Mota de Oliveira
Quioto. Assim, os EUA, maior poluidor do cia, o presidente da Guiana poderia e feriram seis trabalhadores.
planeta ao lado da China, ficaram isola- ter apresentado sua idéia nesse foro.
dos na postura de não-adesão ao tratado Por cortesia, em outubro passado, o
que prevê a redução do lançamento de presidente do Suriname, Roland Ve- Morre pioneira do feminismo
gases poluentes na atmosfera. As más netiaan, também poderia ter discutido
notícias, contudo, não faltaram: países
ricos e pobres não chegaram a acordo
em itens-chave e o Canadá, que hoje
com seus vizinhos a idéia de oferecer
um campo de testes para veículos mi-
litares americanos em seu território”,
A escritora Heloneida Studart mor-
reu de complicações cardíacas
aos 75 anos, no Rio. Mãe de seis
tem primeiro-ministro conservador, pro- continua. “Nosso Guia trata a ministra filhos, teve sete mandatos de depu-
tagonizou o que a imprensa chamou de do Meio Ambiente, Marina Silva, como tada, sempre na defesa dos direitos
“escândalo”. Segundo documentos que se fosse uma santa de procissão, se- humanos. Em 1975, co-fundou o
vazaram, a orientação dos diplomatas guida pela bandinha da diplomacia Centro da Mulher Brasileira, primeira
canadenses era exigir metas de emissão emergente, na suposição de que a entidade feminista do país.
de gases de Brasil, China e Índia — ma- questão amazônica pode ser resolvida
nobra para dividir os emergentes. com parolagem doméstica.” SÚMULA é produzida a partir do acompa-
A pior notícia foi a de que até Gaspari observa que com uma base nhamento crítico do que é divulgado na
55% da Amazônia podem estar des- americana no Suriname e um protetorado mídia impressa e eletrônica.
truídos em 2030 por uma combinação ambiental inglês na Guiana ressurgem as
Radis 65 • jan/2008
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REPATRIEM O APÓSTROFO!

Foto: m.c.
— AIH’s, ACS’s, PSF’s, CIB’s...
O que é isso, companhei-
ro?, interpela nosso Fontes
Fidedignas. Pois é, o reda-
BAHIA: CONTRA OU A FAVOR? — tor das propostas do Eixo
Gestores baianos que circulavam 2 cochilou e deixou passar
pela 13ª Conferência mostravam várias vezes essa praga mal
orgulho ao informar que a confe- copiada do inglês que vem
rência estadual da Bahia aprovara assolando os textos da saúde.
as fundações estatais. O delegado Anote aí, gente boa: na lín-
Francisco de Souza e Silva, do seg- gua portuguesa, o apóstrofo
mento de usuários, designado para indica supressão de letra:
a plenária temática da Sala Canela, Vozes d’África, gota d’água,
fez questão de mostrar a versão NOVA ESTRELA — Nem Temporão nem Sant’Ana. Sigla nem precisa de plural,
impressa do Relatório Final da 7ª Lula! Francisco Batista Jr., presiden- mas vá lá: se fizer questão, use AIHs,
Conferência Estadual de Saúde para te do CNS, foi a grande estrela da DVDs, CDs, ACSs, combinado?
provar que não foi bem assim. conferência. Ovacionado aonde quer
A proposta nº 129 diz: “A 7ª que fosse, não podia aparecer que

Foto: adriano de lavor


Conferência Estadual de Saúde con- era logo cercado por delegados que
sidera as Fundações Estatais como queriam tirar fotos a seu lado. “Se eu
uma das alternativas de gestão para soubesse teria vindo de gravata, uma
o SUS-BA. A proposta de projeto de roupinha mais arrumada...”, brincou.
lei das alternativas de gestão, para Em 13/12 houve eleição da diretoria
cada aplicação concreta, deverá ser do Conselho, mas claro que o popstar
antecedida de um amplo debate con- Júnior foi mantido!
duzido por um grupo de trabalho com
participação de usuários, trabalhado- ATRASOS, ATRASOS... — Plenária
res e gestores. Os Conselhos de Saúde final, 19h. Ainda faltava votar todas
devem promover fóruns de debates as propostas dos eixos 2 e 3, além
sobre as Fundações Estatais.” de mais de 150 moções. A platéia PINTURA DE FESTA — Boa parte dos
“Isso é aprovar a fundação esta- chiou quando a mesa interrompeu delegados da conferência manifestou
tal?”, perguntou Francisco. “A questão os trabalhos para homenagear os em seu próprio corpo o apoio às cau-
é que a saúde no interior da Bahia está delegados aniversariantes. Inocêncio sas indígenas: na área reservada ao
toda privatizada, entregue a Oscips, Foca, pela primeira vez num evento artesanato, Anuiá Yawalapiti tatuava,
então os delegados consideraram a deste porte, nem acreditou naquela com tinta de jenipapo, rastros de co-
fundação estatal uma alternativa”. perda de tempo... bra, guelras de peixe e outros motivos
de sua tribo. “É pintura de guerra?”,
UFA! — Que barulho! Os indagou um delegado. “Não”, sorriu o
delegados não gostaram tatuador. “É motivo de festa!”
da escolha do ExpoBrasília
para local da conferência. ACESSIBILIDADE DE MENOS — Ple-
A chuva no telhado me- nária final, e o vendedor ambulante
tálico fazia um estrondo Marcelo Roberto Silveira coçava a ca-
infernal, sem falar das ati- beça, com ar de quem está indignado.
vidades culturais, concen- Alguém tem que falar ao pessoal da
tradas numa arena muito organização para colocar um tradutor
próxima das plenárias para deficientes auditivos no telão,
temáticas. E que cheiro pediu. “Se meu primo, que é surdo,
de comida! Delegados fa- estivesse aqui, não entenderia
mintos quase desmaiavam nada!” Os deficientes visuais
nas votações tardias... também reclamaram muito
Pudera: o gigantesco res- durante a votação do regula-
SERVIÇO DE PRIMEIRA — Grande taurante foi instalado bem ao lado mento: não havia material em
conquista a transmissão ao vivo da do auditório. Para completar, que Braille, com tipos ampliados
13ª pelo Canal Saúde, tanto pela calor! O auditório foi climatizado ou em meios digitais. “A conferência
TV NBR, da Radiobrás, quanto pela com borrifadores só no dia da abertura já está descumprindo lei federal”,
internet. Os vídeos continuam no e da plenária final. Resumindo: Fontes afirmou um deles, que pediu apoio
site do canal (www.canalsaude. Fidedignas acha melhor que o ExpoBra- também para locomoção. “Para que
fiocruz.br/CNS13.php), para baixar sília continue destinado a sua vocação então perguntaram sobre necessida-
ou ver online. original, as feiras de gado... des especiais no formulário?”
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13ª CONFERÊNCIA NACIONAL DE SAÚDE

Encontro
de paradoxos
final, como ocorreu em 2003 na 12ª Conferência Nacional de

A
13ª Conferência Nacional de Saúde tinha tudo Saúde, resultaram num certo vazio de novas idéias. Tirando
para entrar na história como um novo marco do os grupos pró e contra o aborto e pró e contra as fundações
controle social brasileiro. Em sua última etapa estatais, nada mais parecia interessar aos delegados. Se o re-
reuniu 2.275 delegados estaduais, 352 nacionais, gulamento permitia defesa de destaques e propostas inéditas,
336 convidados e 219 observadores, que circularam de 14 o que possibilitaria alguma discussão sobre um ou outro tema
a 18 de novembro pelo Pavilhão de Feiras e Exposições do específico, a plenária final não quis saber: sempre votava
Parque da Cidade, em Brasília, precedidos por outro re- maciçamente contra o debate.
corde: 4.413 municípios, os 26 estados e o Distrito Federal Com o lema “Saúde e qualidade de vida: Políticas de
mobilizaram nas etapas prévias 1,3 milhão de participan- Estado e desenvolvimento”, a 13ª foi dividida em três eixos
tes. Mas, por questões de método e organização, a maior temáticos — Desafios para a efetivação do direito humano à
conferência nacional de saúde de todos os tempos acabou saúde no século 21: Estado, sociedade e padrões de desenvol-
revelando paradoxos inéditos: pouco debate e votações vimento; Políticas públicas para a saúde e qualidade de vida: o
dirigidas. Parte dos conselheiros levou essa queixa à reu- SUS na Seguridade Social e o Pacto pela Saúde; e A participação
nião de janeiro do Conselho Nacional de Saúde. na efetivação do direito humano à saúde. Todos os delegados
Desde o início ficou visível a baixa mobilização de gru- votaram todas as propostas do relatório consolidado das etapas
pos de defesa de propostas — a não ser o das igrejas contra estaduais nas plenárias temáticas em 10 salas com nomes de
o aborto e o dos gestores a favor das fundações estatais. ervas — e pouco debateram. Na plenária final, dia 18, foram
As boas intenções dos organizadores, que “engessaram” o votadas, sem discussão, as propostas que não tiveram mais de
regulamento para evitar excesso de propostas na plenária 70% dos votos em pelo menos seis dos 10 grupos.
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Da mesa ainda fizeram parte os

Fotos: Aristides Dutra


presidentes do Conselho Nacional de
Secretários de Saúde, Osmar Terra, e
do Conselho Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde, Helvécio Miran-
da Magalhães Júnior, o representante
em exercício da Opas/OMS no Brasil,
Rubén Figueroa, o ministro da Saúde
da República Democrática de São
Tomé e Príncipe, Arlindo Vicente de
Assunção Carvalho e, para surpresa de
muitos delegados, o secretário-geral
da Conferência Nacional dos Bispos do
Brasil, Dimas Lara Barbosa.
Temporão, o primeiro a falar, logo
chamou a atenção para a ausência de
mulheres na mesa e destacou que a
Secretaria Executiva do Ministério da
Saúde é ocupada por Márcia Bassit
A Oitava foi histórica, mas a 13ª acontece — que estava na primeira fila do audi-
na maioridade do SUS” tório. Instado pela platéia, convidou
Márcia à mesa, que subiu ao palco sob
Ministro Temporão aplausos. O ministro lembrou que este-
ve presente na 8ª [1986] e na 9ª [1992]
Mesmo assim, muito se trabalhou à plenária final, rejeitada por nove dos conferências como delegado e, na 10ª,
noite adentro. No dia 15, dedicado 10 grupos temáticos. como relator. “A Oitava foi histórica,
à plenária temática do Eixo 1, com O ministro considerou esse re- mas a 13ª acontece na maioridade do
210 propostas vindas dos estados, a sultado um “equívoco”, ainda mais SUS”, disse. Sob aplausos, destacou a
maioria dos grupos encerrou os tra- que os delegados não apresentaram aprovação, na Câmara dos Deputados,
balhos à meia-noite. No dia 16, o da alternativas viáveis. “O Ministério do PLP 1-B/03, que regulamenta a EC
plenária temática do Eixo 2, com 284 da Saúde continuará irredutível na 29, e reafirmou a necessidade de apro-
propostas, os delegados deixaram o busca de soluções para a gestão do vação da depois rejeitada CPMF.
ExpoBrasília à uma da manhã. Apenas SUS”, disse à imprensa em 19/11 Francisco Batista Júnior, falando
a plenária temática do Eixo 3, no dia (http://portal.saude.gov.br/portal/ em seguida, dirigiu-se ao presidente
17, encerrou os trabalhos em torno aplicacoes/noticias/noticias_detalhe. Lula destacando a grande participa-
das oito da noite, votando 94 propos- cfm?co_seq_noticia=39038). “A confe- ção popular na 13ª. “Nós do Conselho
tas. A plenária final terminou às duas rência é consultiva, não deliberativa”. Nacional de Saúde nos sentimos orgu-
da manhã de segunda-feira 19/11. Segundo ele, o governo respeita lhosos com essa conferência, que en-
De todo modo, um grande avanço a opinião expressa na conferên- volveu 4.330 conferências municipais
em relação à 12ª CNS, que encerrou os cia, mas continuará buscando, no de saúde, conferências em todos os
trabalhos madrugada alta deixando um Congresso Nacional, “uma lei que estados da Federação, a participação
mundo de assuntos sem votação: quatro permita ao SUS operar seus hospitais de pelo menos 1 milhão e 300 mil
mil destaques e centenas de moções fo- com alguma eficiência”. pessoas e 4 mil aguerridos delegados
ram enviados pelo correio aos delegados aqui presentes, defensores da vida e
para votação posterior, num processo que O ATRASO DE SEMPRE do SUS”, informou, sob aplausos.
retardou o relatório final em um ano. Na noite do dia 14, o clima ainda Júnior citou o SUS como um sistema
Desta vez, ao fim da jornada de era de excitação e esperança, apesar exemplar em transplantes de órgãos, em
cinco dias foram analisadas todas as das longas filas à entrada do grande medicamentos e no controle de HIV/aids,
588 propostas do relatório consolida- auditório, de 3.700 lugares, que mas ineficiente em outros setores. “Não
do, mais 373 sugestões inéditas — 108 atrasaram a cerimônia de abertura, podemos ter um programa maravilhoso
do Eixo 1, 163 do Eixo 2 e 102 do Eixo marcada para as 19h e iniciada às de combate ao HIV ou de vacinação e
3, além de 154 moções — 99 de apoio 20h40: como sempre, eram as me- sermos o campeão de tuberculose no
e 55 de repúdio. O relatório final, didas de segurança impostas pela mundo”, exemplificou. Ao dirigir-se mais
apresentado em 12/12 na reunião do presença do presidente Luiz Inácio uma vez a Lula, disse que o objetivo da
CNS e depois submetido a revisão, Lula da Silva — um a um, os delegados conferência era resgatar os ideais da
deve estar disponivel no site se submeteram aos detectores de Reforma Sanitária, priorizar a Atenção
do conselho (www.conselho. metais e à revista das bolsas. Lula Básica, as equipes multiprofissionais e as
saude.gov.br) ainda este mês. entrou acompanhado dos presidentes ações intersetoriais. “Não teremos con-
As idéias mais caras ao go- do Senado, Tião Viana — substituído dições de resolver os graves problemas
verno, como aborto e fundações em dezembro pelo senador Garibaldi da saúde sem compreender que saúde
estatais, foram maciçamente Alves (PMDB-RN) —, da Câmara dos precisa ser entendida como ação inter-
rejeitadas. No primeiro caso, a des- Deputados, Arlindo Chinaglia, e da setorial”, salientou. “Educação, pla-
criminalização ainda chegou à plenária Frente Parlamentar da Saúde, de- nejamento familiar, imposto de renda,
final, mas não passou pelo fortíssimo putado Darcisio Perondi (PMDB-RS), meio ambiente, tudo isso é saúde”.
lobby da igreja católica e seus aliados. além do ministro da Saúde, José Aplaudido calorosamente, o pre-
A proposta das fundações estatais Gomes Temporão, e do presidente do sidente do CNS elogiou o papel “funda-
como alternativa de gestão sequer foi CNS, Francisco Batista Júnior. mental” de Lula na aprovação do PLP
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1-B/03 pela Câmara. “Mas para avan-


çarmos ainda mais deveremos continuar
trabalhando na perspectiva de obediên-
cia ao piso constitucional proposto pelo
ex-deputado Roberto Gouveia”, lembrou
ele o percentual de 10% da receita cor-
rente bruta da União retirado do texto
original de Gouveia, enviado ao Senado
e sem previsão de votação.
A platéia reagiu com entusiasmo
quando Júnior destacou a gestão do
trabalho que, em sua análise, foi sem-
pre loteada por grupos corporativistas e
elitizados. “Devemos fazer esse debate
com muita tranqüilidade e responsabili-
dade”, pediu. “Não podemos esquecer
que há sérios problemas na gestão, mas
não podemos permitir que propostas que
apresentam grandes distorções sejam
regulamentadas”. À mesa, o ministro Se não fossem vocês, o Temporão estaria
Temporão levantou uma sobrancelha, pedindo dinheiro para o SUS à rede privada”
entendendo o recado sobre seu projeto
das fundações. O desafio, segundo Júnior, Presidente Lula
é simples. “Devemos trabalhar na pers-
pectiva de profissionalização da gestão secretária Márcia Bassit, o que já lhe fez piadinha o presidente sobre a
a partir do nosso quadro”, propôs. “Não rendeu fortes aplausos. Em seguida, descoberta recente do Campo de Tupi
podemos permitir que o trabalhador da contou que tinha discurso escrito, mas (SP). Ele exaltou ainda os Centros de
saúde seja demitido a qualquer momen- resolvera falar de improviso. “Por que Especialidades Odontológicas e o SAMU,
to”, encerrou, sob ovação da platéia. discursar sobre saúde numa conferência criados pelo Ministério da Saúde em seu
O deputado e médico Arlindo com tantos especialistas, onde o único governo. Sensibilizado pela energia que
Chinaglia (PT-SP), em seguida, defen- leigo sou eu?” Mais aplausos calorosos. vinha da platéia, contou que em quatro
deu o projeto de regulamentação da Reconheceu que há muito a fazer no anos e meio de governo esteve em 47
EC 29 e procurou desfazer os rumores país, mas destacou os avanços na saúde conferências nacionais (ele ainda abriria
de que teria acelerado a votação do nos últimos quatro anos — já recorrendo mais duas: a das Cidades, em 26/11, e a
PLP 1/03 depois que Tião Viana incluiu ao discurso previamente preparado: da Assistência Social, em 14/12), todas
na pauta do Senado projeto de sua em 2003, o Brasil contava com 175 mil promovidas a partir da experiência das
autoria. “O senador entendeu que era agentes comunitários de saúde, bene- conferências nacionais de saúde. “Eu
necessário que aprovássemos primeiro ficiando 90 milhões de pessoas, ou 52% fico feliz porque, se não fossem vocês,
na Câmara, pela urgência do tema e da população; em 2007, o país contava o Temporão estaria pedindo dinheiro
pelas condições da política”, disse. com 221 mil agentes, que atendem 109 para o SUS à rede privada”, disse. “Hoje,
Chinaglia elogiou o senador por ter milhões de pessoas, 58% da população. temos a convicção de que vocês podem
sido o primeiro a apresentar projeto “Um crescimento de 26%”, festejou. orientar o governo federal e as políticas
de regulamentação da EC 29 — o PLS públicas da saúde”.
35/2002, depois arquivado. PUXÃO DE ORELHA O presidente reiterou então a
Em discurso empolgado, o também A Estratégia Saúde da Família importância da regulamentação da EC
médico Tião Viana (PT-AC) recorreu às avançou: em 2003, 16 mil equipes 29 na Câmara — revelou até que foi ele
lembranças: “Participei da 7ª [1980], atendiam 55,4 milhões de habitantes, quem pediu a inclusão do projeto na
da 8ª e, agora, da 13ª Conferência Na- ou seja, 31,9% da população distribuída pauta, apesar das divergências internas
cional de Saúde”, disse. “Se voltarmos em 4.176 municípios; em 2007, eram em seu governo — e da prorrogação da
no tempo, se olharmos a dívida que a 27.474 equipes para 87 milhões, ou CPMF no Senado, afinal rejeitada na
ditadura deixou, veremos que conse- 47% da população brasileira em 5.131 madrugada de 13/12. “A regulamen-
guimos avançar bastante”, referindo-se municípios. “Um crescimento de 64%”, tação vai permitir que cada estado
à Constituição, que elevou a saúde a ressaltou. Na saúde bucal, as 4.261 brasileiro cumpra com a obrigação de
direito de todos. “Se olharmos para os equipes para 26,1 milhões em 2003 investir 12% de sua arrecadação na saú-
gringos de Detroit [maior cidade do es- chegaram em 2007 a 15.934, para 77,7 de”, disse, lembrando que apenas sete
tado americano de Michigan], veremos milhões em 4.432 municípios. “Devido deles atingiram o percentual
que quem não tem dinheiro não tem ao Programa Brasil Sorridente, temos constitucional. “Agora também
acesso à saúde”, citou. “Por isso, basta 274% a mais de equipes e mais de 50 vai ser possível definir o que são
olhar para o SUS e para os programas milhões de pessoas recebendo atendi- ações de saúde; senão, daqui a
sociais do Brasil”. O senador festejou a mento bucal”, informou. Vendo que pouco, o cidadão ia querer abrir
regulamentação da EC 29, mas lembrou Chinaglia conversava à mesa, disse: uma academia de ginástica com
que não é o suficiente para dar conta “Isso é importante para você usar na o dinheiro da saúde”, brincou, nova-
dos problemas da saúde e conclamou a Câmara, Chinaglia”. O deputado nem mente muito aplaudido.
platéia a recorrer sempre ao Congresso percebeu o puxão de orelha. Ainda confiante na prorrogação,
Nacional. “Cobrem mais!” “Precisamos de dentistas nas Lula dedicou boa parte do discurso à
O presidente Lula iniciou sua escolas para que a cárie das crian- CPMF. “Com ela, a saúde até 2011 rece-
fala com cumprimentos efusivos à ças não vire um poço da Petrobras”, berá mais R$ 24 bilhões, além da variação
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do PIB, num total de R$ 32 bilhões”, saúde para o período entre 2008 e cedimentos de radio e quimioterapia,
esperava o presidente. Ele adiantou 2011”. Quatro pontos norteiam essas além de programas de excelência inter-
que não brigaria com o Senado, apesar ações, disse. O primeiro refere-se ao nacional como o Programa Nacional de
dos esforços da imprensa em intrigar conceito de qualidade de vida que já Imunizações (PNI), o de combate à aids
senadores e governo. “Parem com foi contextualizado ao longo dos anos. e o de controle do tabagismo. “Tudo isso
essa bobagem, porque o Lula paz e “Um exemplo é a Carta de Ottawa, com gestão participativa pactuada com
amor não vai brigar com o Senado”, que tem como prioridade a paz, a estados e municípios”, salientou.
riu. Para ele, o voto contra ou a favor renda, a habitação, a educação, a ali- Os custos da saúde são influencia-
é parte da democracia brasileira. “Se mentação adequada, o ambiente sau- dos por vários fatores, disse. O primeiro,
votarem contra é um resultado tão dável, a eqüidade e a justiça social”, a mudança no padrão demográfico do
legítimo como o a favor e eu jamais citou, referindo-se ao documento final país: em 1981, havia seis idosos para
vou cobrar resultado de um senador da da 1ª Conferência Internacional sobre cada 12 crianças até 5 anos; em 2004,
República”, continuou. “Até porque o Promoção da Saúde, no Canadá, em seis idosos para cada cinco crianças até
mandato de presidente é de quatro novembro de 1986. “A esse conjunto 5 anos. “Isso significa aumento da popu-
anos, e o de senador é de oito”. de princípios eu acrescentaria que qua- lação de idosos e, conseqüentemente,
O presidente disse que seria pre- lidade de vida é viver numa sociedade aumento de custo para a saúde”, resu-
ciso mapear o quanto da CPMF vai para que permita a plena realização das miu. O segundo, a mudança no perfil da
cada estado e perguntar a cada gover- potencialidades”, acrescentou, lem- morbimortalidade da população: por um
nador se pode prescindir desse dinheiro. brando o saudoso Sergio Arouca. lado, caíram drasticamente as doenças
“Vamos ver quanto o Rio Grande do Sul infecciosas; por outro, aumentaram os
recebeu no ano passado e recebe este POLÍTICA DE ESTADO cânceres, as doenças cardiovasculares
ano da CPMF para a saúde, ou perguntar O segundo ponto, fundamental e a violência. “Hoje, vivemos uma
ao estado de São Paulo se o governador para se criar um movimento em defesa epidemia de violência no trânsito,
Serra pode prescindir desse dinheiro”, da vida: comunicação, informação e contra a mulher, a criança e o idoso”,
provocou o presidente, matreira raposa educação. O terceiro, lembrar que o apontou. O terceiro fator, obesidade
política — dias depois, os mais importan- SUS não é uma receita pronta para ser e doenças decorrentes. “Entre 1975 e
tes governadores tucanos, Aécio Neves aplicada em qualquer lugar e circuns- 2003, houve um aumento de duas vezes
(MG), José Serra (SP) e Yeda Crusius (RS), tância. O quarto e último ponto, re- na obesidade do homem brasileiro e de
faziam lobby com seus senadores pela conhecer que o SUS é uma política de 60% entre as mulheres”, disse.
aprovação — viu-se depois, inutilmente. Estado, de caráter pluripartidário. As conquistas na área das doenças
Lula opinou que se cada governador e O ministro citou as realizações do imunopreveníveis mereceram destaque:
cada prefeito pudessem pôr de lado o SUS: 27 mil equipes do Saúde da Família “Reduzimos essas doenças em mais de
dinheiro da CPMF significa que são capa- para 87 milhões de brasileiros em 92% 90%, várias foram erradicadas e novas
zes de cobrir essa arrecadação, “e não dos municípios; 110 milhões de pessoas vacinas foram incorporadas ao PNI”. O
vamos ter tantos problemas”. atendidas em 95% dos municípios por mesmo, no entanto, não aconteceu com
O auditório ensaiou um protesto, agentes comunitários de saúde; por ano, a mortalidade por doenças crônicas, pro-
quase vaia, quando o presidente disse 2,3 bilhões de procedimentos ambulato- vocada pela insuficiência de tecnologia
que “pobre não paga CPMF”, mas ele riais, 300 milhões de consultas médicas, e pela fragilidade na prevenção e pro-
logo se recuperou ao dizer que os 11,3 milhões de internações, 2 milhões moção da saúde, continuou o ministro.
opositores da prorrogação não estão de partos, 15 mil transplantes, 215 mil A única conquista aqui foi a redução da
brigando com o governo, mas com os cirurgias cardíacas e 9 milhões de pro- mortalidade por câncer de pulmão entre
5.600 municípios brasileiros. “Quem é
que vai dar dinheiro para a prefeitura

588 propostas prévias


cuidar da saúde?”, perguntou à platéia.
Lula encerrou seu discurso às 22h sob
ovação e deixou o salão ao som do Lula-
lá, cantado pela platéia, toda de pé.
NÚMEROS DA 13ª 210 do eixo 1
O auditório em peso, animado
mas cansado, começou a se levantar 284 do eixo 2
quando o ministro Temporão voltou ao
púlpito para sua atrasada conferência
2.275 delegados estaduais 94 do eixo 3
magna, programada para as 20h.
Incomodado pela dispersão e o baru-
352 nacionais 373 propostas inéditas
lho, Temporão perguntou à platéia se
queria ouvi-lo. “Se vocês não quiserem
336 convidados 108 do eixo 1
que eu fale, vou embora, pois
tenho muito trabalho”, recla-
219 observadores 163 do eixo 2
mou. Uma delegada subiu ao
palco com um cartaz. A platéia
800 pessoas de apoio 102 do eixo 3
pediu que Temporão lhe cedesse
3.982 no total
o microfone, mas o ministro
negou: “Ela vai ter quatro dias para
154 moções
apresentar suas idéias.” 99 de apoio
Às 22h10, ele deu início à sua
apresentação, “Saúde e desenvolvi-
800 atendimentos médicos 55 de repúdio
mento, crescimento, transformação
e eqüidade — as ações prioritárias da
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os jovens, devido à política antitabagis- assistência e a base produtiva e de R$ 24 bilhões [da CPMF rejeitada] nos
ta. “Mas aumenta entre as mulheres”. inovação em saúde; fragmentação do estados e municípios, estabelecendo
Temporão afirmou que as taxas da território e vazios assistenciais tanto contratos de gestão com objetivos, me-
mortalidade infantil continuarão caindo nas metrópoles quanto nas regiões tas, indicadores, resultados esperados e
nos próximos anos, mas reconheceu menos desenvolvidas; predomínio de recursos que vão ser repassados e criar
as grandes desigualdades regionais de um modelo burocratizado de gestão; um fundo para premiar quem alcançar
acesso ao SUS. Segundo ele, interna- subfinanciamento para atender às ne- desempenho acima do determinado”,
ções hospitalares em alta complexidade cessidades da população; precarização expôs ele. A platéia, cansada, e a esta
em cardiologia, em cirurgia oncológica do trabalho e baixo investimento na altura pela metade, nem percebeu que
e transplantes no SUS estão concen- qualificação de recursos humanos. o ministro defendia sua proposta de
tradas nas regiões Sudeste e Sul. Para Ao todo, sete eixos sustentam a fundações estatais.
o ministro, é necessário ainda cuidar nova proposta para a saúde: Promoção A idéia do Complexo Industrial,
da qualificação das equipes do Saúde à saúde e Ações Intersetoriais; Atenção esclareceu Temporão, é usar-se o poder
da Família e da desprecarização do à saúde: Assistência e Vigilância; Com- de compra do Estado, setor privado
trabalho. “É preciso fazer com que plexo Industrial e de Inovação; Força e público, associado a uma linha de
essas equipes tenham disponibilidade de Trabalho em Saúde; Qualificação da financiamento do BNDES para dar início
tecnológica para atuar mais e ter re- Gestão; Participação e Controle Social; a um programa de redução de importa-
sultados melhores”. e Cooperação Internacional. ções e ampliação da produção nacional.
A Política Nacional de Humaniza- “Devemos lembrar que hoje 25% do
ção, informou, desde 2003 tem como SEM MEDO DE DISCUTIR mercado farmacêutico, 80% do mercado
base a responsabilização pela resolução: O ministro detalhou cada um. O de vacina e 50% de material hospitalar
não se passa a outro profissional e outras eixo Promoção da Saúde e Ações Inter- são públicos”, informou. Dois critérios
unidades o que pode ser feito em diag- setoriais inclui a articulação de ações orientam essa iniciativa: relevância
nóstico e terapêutica; a construção de no campo das políticas públicas. “Aqui epidemiológica das doenças e o custo de
vínculos, saudável para usuários e profis- vamos trabalhar fortemente a questão cada medicamento para o SUS.
sionais da saúde; a responsabilização na do álcool, da redução de danos por uso O quinto eixo, a Força de Trabalho
articulação de recursos disponíveis para abusivo, propaganda de bebidas, bebida em Saúde, prevê o treinamento dos pro-
o acesso à tecnologia que defende a vida e direção”, enumerou, informando que, fissionais. Afinal, ressaltou o ministro,
e a articulação da rede de continuidade somente no ano passado, metade das 35 “ainda não inventaram uma medicina
de cuidados; e construção e ativação da mil mortes no trânsito envolveu bebida que não necessite de terapeutas”. No
rede de assistência e proteção social alcoólica. Inclui também controle de eixo Controle Social, a idéia é fortalecer
intersetorial e solidária. tabagismo, padrão alimentar, exercício cada vez mais os conselhos de saúde e
A nova proposta da política de físico, planejamento familiar e direito as conferências, qualificar as ouvidorias
saúde do atual governo, disse, “está em sexual. “Sem medo de discutir a interrup- do SUS e promover auditorias em saúde
sintonia com a 13ª CNS”: preconiza saú- ção da gravidez também”, disse, aplau- sob o comando da Secretaria de Gestão
de e desenvolvimento, ou seja, a saúde dido. Temporão aproveitou para pedir à Participativa do Ministério da Saúde. A
como frente de expansão estratégica platéia que aprovasse a proposta de ex- Cooperação Internacional propõe apoio
para a economia e a política social. “A tensão da licença-maternidade de quatro aos países do Mercosul e africanos de
saúde é a única política social que tem para seis meses. “Se lá atrás falei que na língua portuguesa na qualificação de
uma dualidade fundamental: é uma po- saúde é fundamental o estabelecimento seus sistemas de saúde. “Posso já ante-
lítica para a melhoria da qualidade de de vínculos, a família, a mãe, o pai e o cipar que a Fiocruz abrirá um escritório
vida e o desenvolvimento da sociedade bebê, espero que a conferência aprove na África, com sede em Moçambique,
e, ao mesmo tempo, tem dinâmica essa extensão”, defendeu, também sob e passará a apoiar fortemente a estru-
econômica e potencial de inovação e aplausos — e foi aprovada. turação do sistema de saúde naquele
criação de riqueza e emprego qualifi- O eixo Atenção à Saúde refere-se continente”, adiantou.
cado”, afiançou. a tudo o que, comumente, as pessoas Depois de 40 minutos de fala,
Os números que a saúde gera são identificam como problemas de saúde. Temporão explicou por que apresen-
a prova: responde por 8% do PIB, incor- “É o mau atendimento, a fila, o tempo tou somente os eixos que norteiam
porando todos os setores estratégicos de espera etc.”, exemplificou. Tem- a ação do Ministério da Saúde, não
do futuro (microeletrônica, biotecno- porão afirmou que essa é uma questão falando das metas do PAC da Saúde,
logia, química fina, nanotecnologia, a ser resolvida no contexto do Pacto o Programa de Aceleração do Cres-
equipamentos); responde por 10% dos pela Vida e do Pacto de Gestão. Dessa cimento na área: “O presidente Lula
postos formais de trabalho qualificado; forma, prevê ampliação do Serviço de pediu que anunciasse essas metas
é o setor mais importante do gasto Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), apenas em 3 de dezembro, data
nacional com Ciência e Tecnologia expansão e melhoria de qualidade do oficial de lançamento do pacote” —
(25% do total); e emprega 9 milhões Saúde da Família, do Brasil Sorridente, na verdade, lançado no dia 5.
de brasileiros em atividades de maior da Farmácia Popular e da Atenção de Em seguida, antecipou: “Vocês
qualificação. “Ou seja, a saúde deve Média e Alta Complexidade. podem ter certeza de que são
ser vista não apenas como gasto, mas No eixo Qualificação da Gestão, a propostas muito importantes
principalmente como fator de desen- proposta é inovar pela profissionaliza- e bem-estruturadas, que res-
volvimento”, afirmou. ção da gestão e da contratualização. gatam o sentido e o conteúdo
Temporão listou oito problemas “Sem abrir mão dos princípios do SUS”, da Reforma Sanitária e qualificam o
críticos do SUS: reduzida articulação prometeu. Ele defendeu a gestão com SUS”, encerrou, sob aplausos.
da saúde com as demais políticas controle social, planejada e qualifica-
nacionais; elevada iniqüidade de aces- da, e a contratualização por concurso Cobertura: Adriano De Lavor, Bruno
so; desigualdade pessoal e regional; público. “Podemos aproveitar agora que Camarinha Dominguez, Katia Machado
descolamento entre a evolução da vamos avançar a contratualização dos e Marinilda Carvalho
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ENTREVISTA

Francisco Batista Júnior

“A 13ª percebeu que


o SUS está privatizado”
Quando analisamos a legitimida-

O presidente do CNS e coordenador-


geral da conferência, Francisco
Batista Júnior, faz balanço positivo da
de do debate, também percebemos
que conseguimos avançar, uma vez que
credenciados e habilitados se envolve-
13ª, especialmente quanto à sintonia ram em todas as discussões do relató-
das propostas com a carência do siste- rio consolidado, indistintamente. Nas
ma: para ele, ficou clara a necessidade plenárias temáticas, o debate foi bas-
de inversão do modelo de atenção, tante aprofundado — é óbvio que em
de fortalecimento da prevenção e algumas salas mais do que em outras.
promoção da saúde, do destaque à Apesar de na grande mídia dois temas
intersetorialidade, de valorização da terem monopolizado as atenções (as
gestão do trabalho, de regulação da fundações e o aborto, provavelmente
relação público-privado. “Todas as pelo fato de serem polêmicos e terem
propostas que apontavam parcerias do sido pautados pelo ministro), não hou-
Estado com empresas privadas foram ve prejuízo do debate sobre as demais
rejeitadas”, lembrou. “Algumas pesso- questões do sistema. Ficou clara a
as me disseram que acharam exagero, necessidade de inversão do modelo de
mas acredito que os delegados perce- atenção, de fortalecimento das ações
beram que o sistema está privatizado de prevenção e promoção da saúde,
e precisa ser reestruturado.” do destaque à intersetorialidade, de
uma política de valorização da gestão
Que balanço o Sr. faz da 13ª Confe- do trabalho, de regulação da relação
rência Nacional de Saúde? entre o público e o privado. vamente, imaginei que teríamos mais
Começamos a organizar a 13ª Todas as propostas que aponta- problemas. Os que tivemos, como o
muito preocupados com o esgotamento vam para parcerias do Estado com dos banheiros, estavam relacionados
do modelo de conferência. Percebemos empresas privadas foram rejeitadas. à infra-estrutura inadequada do local,
a frustração das pessoas pelo fato de Algumas pessoas me disseram que que foge do nosso controle.
haver componentes excludentes — na acharam exagero, mas acredito que
12ª, por exemplo, os infindáveis eixos os delegados perceberam que o sis- Na plenária final, parte dos delega-
alijaram os delegados da possibilidade tema está privatizado e precisa ser dos protestou por acreditar que não
de conhecer e debater cada um deles. reestruturado. Ou seja, os debates es- houve debate. De que forma o Sr.
Também avaliamos que o debate es- tavam totalmente sintonizados com as recebe esta crítica?
tava estratificado, pouco focado nas carências do sistema. Comemoramos Temos que entender que o mé-
questões essenciais do SUS, gerando também o fato de a conferência ter todo das conferências passadas era
relatórios dessintonizados do que de- tido começo, meio e fim. contraproducente: tanto as plenárias
veria ser posto em prática de imediato. temáticas como a final transformavam-
Portanto, nossa tarefa era trabalhar Antes da conferência, o Sr. disse à se em autênticos palanques para ma-
para que esses problemas não voltas- Radis que os problemas na 13ª eram nifestações pessoais e corporativas.
sem a se repetir e ainda para ampliar a inevitáveis. Quais foram os pontos A experiência nos mostra que isso
participação. Em relação a este negativos e positivos? acontecia às custas da modificação
tema, conseguimos ir além do De mais positivo, indico o senti- de propostas, o que gerava discussões
que imaginávamos. Pela primei- mento de exercício da participação intermináveis, porque cada um queria
ra vez, permitimos que qualquer democrática — poucas conferências alterar uma palavra. Alguns delegados
pessoa que fosse ao ExpoBrasília tiveram este ingrediente. De nega- não conseguiam aprovar seus textos
visando participar da confe- tivo, apenas questões pontuais. Não nos estados e tentavam retomar a dis-
rência entrasse como observadora, tivemos problemas com hotéis, com cussão na nacional, o que tornava o de-
mesmo aquelas sem credenciamento violência, com alimentação, nem bate distorcido, ilegítimo e, de certa
prévio — não tiveram direito a voz com atendimento em saúde (com forma, desonesto. Assim, a conferên-
e voto, mas puderam articular com exceção das pessoas com deficiência, cia era ingovernável. No momento em
os delegados. Daí o número de 4.500 que reclamaram da falta de material que mudamos o método, impedimos
participantes, que é histórico. específico). Fui surpreendido positi- esse dispositivo incongruente.
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Outra coisa que as pessoas têm que esse convencimento é legítimo e tem avaliação seria outra. A opinião dele está
entender é que o debate deve aconte- mesmo que acontecer, principalmente prejudicada. Em relação à apresentação
cer nas plenárias temáticas. Algumas em temas polêmicos. As propostas caras de propostas, reafirmo que os delegados
ficaram surpresas por não ter havido aos agentes comunitários, por exemplo, pediram mudanças no modelo. Sobre
discussão na plenária final, mas foram raramente são rejeitadas — primeiro as fundações, o CNS tem debatido a
os próprios delegados que, de forma so- porque se articulam para saírem de- gestão do SUS, coisa que o ministério
berana, votaram pela não-necessidade legados e, depois, porque defendem deveria ter feito e não fez. Realizamos
de defesa na maioria das vezes. Em os textos. Isso é natural, se acontecer o primeiro seminário de Modalidades
determinadas propostas, optaram por nos limites da ética. Penso que a con- de Gestão do SUS em agosto, e marca-
três falas favoráveis à aprovação e três ferência mandou um recado para que o mos o segundo para janeiro. Em nome
contrárias, o que mostra que o debate Ministério da Saúde realize um grande da minha confederação [Nacional dos
não foi cerceado. A nossa limitação fo- debate no país a respeito do aborto, Trabalhadores em Seguridade Social],
ram as propostas inéditas. Precisamos pois há pouco esclarecimento. Já falei apresentamos um monte de propos-
repensá-las, pois para uma proposta com Temporão que o ministério tem que tas. Alguns setores dizem que quem
normal chegar à plenária final, tinha que chamar a si essa responsabilidade. é contrário ao projeto não apresenta
ser discutida nos 10 grupos e aprovada proposta, mas a verdade é que quem é
por mais de 70% dos delegados em pelo O ministro criticou a conferência, contrário ao projeto nunca foi convidado
menos seis deles. No caso da inédita, afirmando que “não cumpre seu ob- a debater com quem defende.
bastava ser apresentada numa sala e jetivo legal, de avaliação do sistema
obter 50% de aprovação. público de saúde”, e “não propõe Na mesa do Eixo 3, o procurador Hum-
alternativas claras e possíveis de se- berto Jacques questionou a herança
A proposta de apoio à descriminaliza- rem executadas”. Também disse que da 13ª. Qual será, em sua opinião?
ção do aborto acabou rejeitada, devi- a rejeição ao projeto das fundações O resgate do conceito amplo de
do à mobilização de grupos contrários. é um “equívoco”, fruto de “postura saúde, na perspectiva de superar a
Como o Sr. vê essa mobilização? radical e pouco comprometida com lógica conservadora de tratar a do-
O projeto das fundações foi dis- o social, que mantém a inércia do ença, trabalhar para impedir que ela
cutido em boa parte das conferências sistema”. O que o Sr. pensa disso? apareça. O que requer a atuação de
municipais e estaduais, então as pessoas Toda crítica deve ser respeitada, equipes multiprofissionais, preven-
já chegaram à nacional com posição mas discordamos do conteúdo. A ava- ção, promoção, ações intersetoriais
delineada. O aborto foi menos discutido liação do ministro é equivocada, talvez (envolvendo áreas vitais para a saúde,
e o desfecho teve como elemento nor- porque ele não teve oportunidade de como educação, trabalho, emprego,
teador a capacidade de convencimento participar de nenhuma conferência es- renda, violência, meio ambiente,
por parte de atores contrários ao aborto, tadual, nem da nacional. Se ele tivesse desenvolvimento). Essa é a grande
como igrejas e indígenas. Entendo que tempo de se envolver, com certeza a herança da 13ª. (B.C.D.)

Sob tensão, plenária aprova regimento


auditório pedidos de destaque, o e mudar parte das propostas, quando

A votação da proposta de regula-


mento, na manhã da quinta-feira
15/11, foi marcada por uma onda de
que só fazia aumentar a apreensão.
No total, a plenária apresentou
destaques em 12 dos 28 artigos,
o regulamento só permitia aprovação
ou supressão total. Um grupo de 15
delegados que apoiavam a alteração
tensão nos bastidores: a comissão quase a metade. Na defesa das fazia barulho na lateral do palco. A
organizadora temia que as novidades alterações, porém, a tensão deu conselheira nacional Maria Izabel da
preparadas para a 13ª — como as 10 lugar pouco a pouco ao alívio: os Silva, a Bel (representante da CUT),
plenárias temáticas — fossem rejeita- delegados rejeitaram a maioria dos que coordenava a votação, pôs fim
das. Na prática, avaliava a organiza- destaques. Houve, por exemplo, ao alvoroço: “Companheiros, aqui
ção, mudanças inviabilizariam o novo quem exigisse a retirada das mesas- ninguém vai ganhar no grito”. O ar-
formato. Francisco Batista Júnior, foi redondas da programação, alegando tigo acabou mantido, sob protestos
convocado a defendê-lo. que diminuiriam o tempo de análise do grupo, enquanto a platéia
“Planejamos um modelo que das propostas, considerando-se gritava “Senta, senta!”
nos possibilite chegar ao fim sem que nas conferências anteriores as Pequenas mudanças foram
que aconteça o que aconteceu com palestras embasavam os debates. aprovadas. A votação — prevista
a 12ª, que não terminou a votação do Em vão. Teve até quem tratasse de para acabar às 10h45, quando do
relatório”, disse. De acordo com ele, assunto alheio ao regimento: um início da mesa do Eixo 1 — só se
o regimento agilizaria a conferência. conselheiro de 91 anos pediu que o encerrou às 12h30, comprometendo
“Não podemos nos perder em discus- Conasems atue mais ativamente no a programação do dia. A mesa come-
sões para colocar uma vírgula”. interior, e saiu sob vaias. çaria depois do almoço e a plenária
De início, parecia que o discur- A plenária se dividiu apenas temática teve início três horas de-
so não surtira efeito: pipocavam no quanto à possibilidade de se suprimir pois do programado, às 17h.
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Três dias de
(boa) reflexão

para as votações das propostas. Ape-

E m mesas-redondas abertas a to-


dos, 12 expositores convidados
— quatro por dia — analisaram cada
sar dos atrasos e do calor intenso, os
delegados lotaram o salão do auditório
e reagiram com entusiasmo à maioria
eixo temático, estimulando o debate das apresentações.

Mesa-redonda • Eixo 1

A ideologia bem viva

“A inda não temos conferência”, co-


mentava no auditório o sanitarista
Mário Scheffer, pouco depois das 12h
Clair: “Civilização
de bárbaros”

do dia 15: a votação do regimento


atrasou tudo. Às 12h51, a decisão
oficial de adiamento foi informada às
poucas pessoas que ainda esperavam,
pacientemente. Após as 14h a mesa do
Eixo 1 finalmente foi composta, sob a
coordenação da conselheira nacional
de saúde Rosane Maria Nascimento da
Silva, do Conselho Federal de Nutricio-
nistas (CFN), que apresentou o tema
proposto — “Desafios para efetivação
do direito humano à saúde no século
21: Estado, sociedade e padrões de
desenvolvimento” — e passou a palavra
à primeira oradora, Clair Castilhos Co-
elho, da Rede Feminista de Saúde.
Clair iniciou sua fala destacando do imperialismo hegemônico e global informem-se contra a alienação e se
como as políticas públicas sociais — dos Estados Unidos”. organizem contra a discriminação,
e, entre elas, o próprio SUS — são Para Clair, assistimos à “fragmen- o preconceito e o fundamentalismo.
influenciadas pelo contexto político, tação comercial do ser humano”, que Para Clair, somente assim se efetivará
econômico e ideológico. Segundo ela, vai além da compra e venda da força o controle social e se combaterão as
é difícil falar de saúde e cons- de trabalho. “Hoje se vende sangue, políticas referenciais dos organismos
trução de um sistema único num medula, gameta, órgão de reprodução, multinacionais — Banco Mundial, Fun-
país que vive sob o neoliberalis- placenta, embrião, feto, DNA e célula”, do Monetário Internacional e até a
mo, “esta etapa destrutiva do denunciou, alertando para o perigo de Organização Mundial da Saúde.
capitalismo”, responsável pelo uma “civilização de bárbaros”. A força Ela destacou como “políticas
desperdício criminoso de re- do capital mundializado concentra a referenciais” a Estratégia de Saúde da
cursos materiais e humanos, afirmou, riqueza e faz cinco bilhões de excluídos Família, “que reduz a integralidade a
citando o filósofo marxista húngaro em todo o mundo, disse. ações básicas de saúde”, o Consenso de
István Mészáros, seja pelo tratamento Este contexto exige dos que Washington e seu “mito da inexorabili-
dado às populações do mundo sub- lutam pela saúde que superem as dade das mudanças e reformas”, cujos
desenvolvido, seja pela violação da políticas neoliberais, entendam o resultados apontam para um aumento
natureza ou pelas “aventuras militares significado ideológico das palavras, nas desigualdades. A palestrante citou
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o subcomandante Marcos — porta-voz negras, contra 5,2% entre as pardas A sociedade brasileira é um
do movimento zapatista, no México — e 3,2% entre as brancas. “Resumindo: “amálgama de várias ancestralida-
para resumir o cenário atual: “Estamos nós morremos de hipertensão, hemor- des, trajetórias individuais e familia-
na 4ª guerra mundial, que é a guerra ragia e aborto”, disse ela, salientando res marcadas por migração, valores,
do capital financeiro”. Este conflito é que entre as lésbicas o atendimento é culturas, expressões, símbolos e
responsável pela “polarização interna- de “quinta qualidade”. Neste grupo, identidades”, descreveu, que ao
cional”, fenômeno que concentra “nas 30% saem dos serviços de saúde com mesmo tempo carrega a transforma-
mãos de 358 supermilionários a renda receitas de contraceptivos, revelou ção das diferenças em desigualdades,
necessária para o sustento de 2 bilhões Clair o paradoxo. “pautadas na perda do valor de
e 600 milhões de pessoas”. “As maiores causas de adoeci- humanidade”. A palestrante afirmou
Esta realidade dificulta a destina- mento e morte são as condições de que essas desigualdades poderiam
ção de recursos para a saúde, já que trabalho, a pobreza, o preconceito, ser evitadas se os pactos firmados
os organismos multinacionais estão a discriminação, a medicalização do pela sociedade fossem respeitados
interessados na manutenção do Esta- corpo, a precariedade da assistência, — mas a afirmação destas desigual-
do mínimo, afirmou, o que significa a criminalização do aborto, a clan- dades traz “restrições de acesso aos
a abertura da economia aos capitais destinidade da prática e os dados bens materiais e simbólicos e aos
internacionais, a privatização e a precários para o planejamento da benefícios das ações do Estado” e o
diminuição de gastos públicos. Clair prevenção à gravidez indesejada”. A aumento das vulnerabilidades indi-
questionou o governo e o superávit situação se agrava graças às políticas viduais e coletivas. Deve-se encarar
primário de 106 bilhões “para pagar subservientes ao capital financeiro, a vulnerabilidade, aconselhou, como
juros e outros custos da dívida”, o afirmou, o que coloca a saúde das uma realidade dinâmica e multifato-
que corresponde a 4,37% do PIB. mulheres na posição de “moeda de rial, responsável por situações que
“Não sabem o custo social e humano troca” em negociações internacio- geram agravos à saúde.
que isso representa para a popula- nais. “É Estado mínimo para o social Por isso, assinalou, é importan-
ção brasileira?”, lançou. e máximo para o capital”, declarou, te defender um conceito de saúde
O controle social em sua opinião sob calorosos aplausos da audiência. mais amplo do que “o contrário de
tem como papel a luta por financia- Para a feminista, entender esta reali- doença”, já que ambas as definições
mento, no sentido de que o dinheiro dade deve estar entre as prioridades — de saúde e doença — são resul-
público seja aplicado em políticas do controle social. tantes de processo histórico, que se
públicas, e não no fortalecimento do apresenta de acordo com a maneira
próprio capital. “A ditadura do capital quem pode ser a favor? como as pessoas se relacionam entre
privatiza”, destacou: 10% da população Ela se deteve na questão do abor- si e com o meio, “pela forma como a
brasileira detêm 2% de toda a riqueza. to. “A favor ou contra — quem pode ser sociedade se organiza e se constrói,
Numa população de 180 milhões, 55 a favor? Digam! Todas as mulheres que se reproduz e se apresenta aos seus
milhões estão na pobreza. querem a legalização são chamadas membros”. Para Fernanda, saúde é
Para as mulheres é mais difícil de aborteiras, assassinas, pró-morte, um conjunto de situações integrais
ainda, disse Clair. Elas representam criminosas”, desabafou. A questão e individuais, que ao mesmo tem-
43% do mercado de trabalho; entre as não é essa, prosseguiu, classificando po decorrem de fatores culturais,
que estão trabalhando — dos 25 aos 49 toda essa discussão como “bate-boca ideológicos, políticos, ambientais e
anos —, 94% também são responsáveis inútil”, já que as mulheres continuam econômicos. Quando há equilíbrio,
pelas tarefas domésticas; em 2006, morrendo e ninguém deixaria de ser disse ela, é possível ver a saúde
31,4% das famílias tinham como chefe virtuosa, caridosa ou humana “porque como direito, como algo que deve
uma mulher. Em relação à saúde, são defende isso ou aquilo”. Para Clair, ser reivindicado, universal e indivi-
tratadas no período gestacional ou de temos que defender o direito à vida sível, “assim como o corpo não pode
amamentação, afirmou. “Reduzem-nos das mulheres e das crianças, mas ser fragmentado”.
a matrizes reprodutoras e usinas de dentro de políticas públicas humanas O direito à saúde, afirmou, só
leite”, resumiu, sob aplausos. e eqüitativas, exortou, sinalizando pode ser conquistado quando os de-
Para Clair, 92% das mortes mater- que a questão principal é definir onde mais são respeitados: só há vida sau-
nas seriam evitáveis, embora nunca terminam os gastos e começam os dável quando não se é discriminado,
apareçam na lista das 10 maiores investimentos. “Dinheiro para pobre quando se pode viver sem violência,
causas de óbito. O problema estaria é gasto, para rico é investimento”, quando há liberdade e autonomia
no fato de, culturalmente, a gravidez protestou, conclamando os delega- sobre o corpo em qualquer fase
ser encarada como “estado fisioló- dos da 13ª a declararem “morte ao da vida, quando a livre orientação
gico especial”, que incluiria a alta capital” sob uma chuva de aplausos sexual, a identidade e a expressão
mortalidade por aborto. Além disso, da platéia de pé. de gênero são respeitadas e, por
salientou a “péssima qualidade” dos Às 14h50, a ex-conselheira nacio- fim, quando se tem acesso às
serviços de pré-natal. “São 2 milhões nal de saúde Fernanda Lopes iniciou sua informações. Também listou
de partos, 500 milhões de consulta, apresentação, sob forte calor, defenden- educação de boa qualidade,
mas a mulherada morre depois de do a “saúde como bem público global segurança alimentar, habita-
fazer o pré-natal”. E sentenciou: e direito fundamental”. Integrante do ção digna, trabalho decente,
“Alguém já ouviu falar em alta para Comitê Técnico da Saúde da População segurança e desenvolvimento
pré-natal? Pois no Brasil tem”. Negra, Fernanda apresentou como — “não como sinônimo de geração
Quando são levadas em conside- desafio “a construção de um ambiente de riquezas ou crescimento econô-
ração as questões étnico-raciais, os favorável para ampliar o pensar e o agir mico” —, aumento das liberdades
problemas aumentam. O risco de uma em torno das questões de saúde e de fundamentais e potencialidades
gravidez terminar em aborto, segundo desenvolvimento” — o que incluiria a individuais, além da ampliação da
Clair, é de 9,4% entre as mulheres ampliação dos direitos humanos. participação social.
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No auditório lotado, Fernanda se as tomadas de decisão começam sustentou, é a ampliação das de-
defendeu a remoção das fontes de pelos municípios, se o processo é par- sigualdades — entre países, entre
privação da liberdade, como a pobreza ticipativo. “É a participação que ga- segmentos sociais —, o consumo de
e a tirania, a carência de oportuni- rante a sustentação social”, afirmou. recursos naturais, degradação e con-
dades econômicas, a negligência e a “Há polêmicas, há diversidade, mas as taminação do meio ambiente, criando
omissão dos serviços governamentais, contradições do movimento social são um quadro de “injustiça ambiental”
a destituição social e a intolerância, sintomas de vitalidade”. em que “o acesso é desigual na distri-
a interferência excessiva dos Esta- buição dos benefícios”, e cujos danos
dos opressivos. A responsabilidade, PIB DA DOENÇA atingem trabalhadores de baixa renda,
segundo ela, é da sociedade civil Última a falar, Raquel Riggoto, populações marginalizadas, grupos
como um todo, incluindo-se família, representante do Fórum Brasileiro sociais discriminados e povos étnicos
comunidade e instituições religiosas, de ONGs e Movimentos Sociais, minoritários. E lançou a questão: “De-
tarefa de agentes mobilizadores e trouxe longa reflexão sobre saúde, senvolvimento para quem?”
articuladores da efetivação dos di- doença e desenvolvimento. Para Raquel citou como exemplo a
reitos humanos. “O controle social ela, há um equívoco de conceito, soja, exportada aos países ricos para
faz a vigilância para que os poderes já que a saúde está muito mais ração. A área de plantação do grão
públicos cumpram os compromissos ligada à doença e à assistência, e no Brasil cresce 300% ao ano, o que
estabelecidos”, destacou Fernanda, o desenvolvimento “é uma crença aumenta a produção, mas não gera
garantindo “tudo para todos, de da sociedade moderna que preci- aumento de empregos. As rodovias
acordo com as diferentes necessi- sa ser revista”. Raquel deu como previstas no PAC, para ela, estariam
dades, partindo de uma construção exemplo a idéia, defendida, entre pautadas pelo escoamento desta pro-
democrática e descentralizada”. outros, pelo ministro Temporão na dução. Com as usinas hidrelétricas, o
conferência, de que o setor saúde mesmo. A Comissão Mundial de Barra-
A PARTICIPAÇÃO AVANÇA seria responsável por 8% do PIB. “O gens sabe que os empreendimentos são
Falou em seguida o secretário- que gerou estes 8% na verdade foi ineficientes para gerar energia, os cus-
geral da Presidência da República, Luiz a doença”, destacou. “Se desen- tos são sempre maiores que o previsto
Dulci, que abordou o papel pioneiro volvimento é isso seria melhor não e os impactos ambientais deslocam 40
dos movimentos sociais nas questões tê-lo”. E questionou se não haveria milhões de pessoas em todo o mundo.
de mobilização e participação popular. outro caminho para a qualidade de Mesmo assim, há mais de 100 usinas
Desculpando-se por ter que se ausen- vida que não fosse o progresso, já previstas pelo PAC. “Vamos alimentar
tar logo após falar, já que viajaria a que sua ideologia associa a presença carros e desnutrir pessoas”, denunciou
Montevidéu, ele centrou suas palavras humana à condição de “produzir e — usando o neologismo “necrocom-
na “questão vital” para a efetivação consumir indiscriminadamente”. bustíveis”, criado por Frei Betto para
de qualquer direito: a participação A palestrante denunciou nosso os biocombustíveis — e lembrando a
popular, que alerta para os objetivos modelo de desenvolvimento, no qual situação dos trabalhadores rurais que
políticos. A construção do SUS só foi agentes econômicos pressionam o vivem do corte da cana. “Sugam a vida
possível graças à articulação conjunta Estado a investir na infra-estrutura das pessoas e depois empurram para a
de diversos setores da sociedade, afir- para que atuem melhor, a financiar Previdência pagar a conta”.
mou. “Quem conhece o antes e o depois empreendimentos e a remover obs- Raquel também comentou o
do SUS pode avaliar as diferenças”. táculos ao lucro, em detrimento da projeto de transposição das águas do
Para Luiz Dulci, as conferências saúde e do meio ambiente. Estas São Francisco — “R$ 6,6 bilhões para
foram fundamentais no processo. empresas, segundo ela, procuram alimentar o agronegócio do camarão
“Adotar a participação social como vantagens como solo barato, recur- e da siderurgia” —, mostrando fotos
forma de governo” em outras polí- sos naturais abundantes, mão-de- de manguezais, antes e depois da
ticas públicas tem sido prioridade obra farta e de baixo custo, políticas devastação causada pela carcinicul-
do governo Lula, assegurou. As de incentivos fiscais, além de “con- tura. “Como se vai viver daqui para
conferências são fundamentais para textos de frágeis políticas ambien- a frente com o constrangimento das
“elaboração, execução, avaliação e tais, trabalhistas e de saúde”. famílias prejudicadas, que têm que
correção de políticas públicas”, dis- Raquel fez histórico do Estado apelar ao Bolsa-Família?”, questio-
se. “Por isso precisam ser realizadas brasileiro nos últimos 30 anos, “su- nou, sob aplausos. “O Brasil está
em todas as áreas”. bordinado ao capital transnacional, funcionando como barriga de aluguel
O secretário aproveitou para que minimiza pessoal e estrutura das para as políticas do capital”, adver-
condenar a tentativa de criminalização políticas sociais e desenvolve políti- tiu, enquanto nos grandes centros
das organizações não-governamentais, cas compensatórias — necessárias, urbanos sobram áreas de risco e lixo
“por razões políticas e ideológicas”, porém insuficientes para superar e falta saneamento básico.
mas se mostrou confiante em as desigualdades”. A conseqüência, Para ela, falta também uma pon-
que tudo se esclarecerá na CPI te entre saúde e desenvolvimento: “A
das ONGs. “Mesmo no caso das desigualdade social e a injustiça am-
rádios comunitárias, as verda- biental decorrem dos padrões urgentes
deiras nada têm a esconder”, de desenvolvimento, e não da falta de
afirmou. Para ele, todo este crescimento”, afirmou, levantando
movimento contrário parte dos que nova onda de aplausos. “De quanto
desejam que “a sociedade civil parti- dinheiro nosso SUS vai precisar para
cipe menos da execução das políticas atender a tanta produção de doença?”.
públicas”. A política não pode ser de- Às 16h, sob o tórrido calor de novem-
finida entre quatro paredes, salientou bro em Brasília, a platéia aplaudiu de
ele, para quem faz “muita diferença” pé a palestrante.
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Mesa-redonda • Eixo 2

Beabá da seguridade

A mesa-redonda do Eixo 2 — “Po-


líticas públicas para a saúde e a
qualidade de vida: o SUS na Seguridade
Ivanete: seguridade
desmantelada

Social e o Pacto pela Saúde”, no dia


16, foi a síntese do que se entende
por intersetorialidade. Fez raio-x da
Seguridade Social, tratou da neces-
sidade de articulação entre saúde
e seguridade e de pontos polêmicos
como fundações estatais de direito
privado. Programada para 9h, a mesa,
coordenada pelo secretário de Saúde
do Maranhão, Edmundo Costa Gomes,
vice-presidente do Conass, começou às
9h45 após atividades de aquecimento
e alongamento promovidas pelo grupo
de educação física Geração Saúde, do
Ministério da Saúde.
O primeiro expositor, José Marcos
de Oliveira, do Movimento Nacional “Deve pautar-se pelos princípios da à saúde, efetivando os preceitos
de Luta contra a Aids, ressaltou a universalidade da cobertura e do legais, ampliando o acesso a ações
importância de os usuários do SUS atendimento e da seletividade e distri- e serviços de saúde, fortalecendo
qualificarem-se para o debate sobre butividade na prestação dos benefícios a atenção básica, garantindo ações
Seguridade Social. “O que é segurida- e serviços”, explicou. de média e alta complexidade, re-
de social?”, perguntou. Em alusão ao Segundo pilar, a previdência duzindo as iniqüidades regionais e
Artigo 194 da Constituição, respondeu: social, completa a assistência. Pelo priorizando a promoção da saúde. E
“Seguridade Social é um conjunto artigo 3º da Lei nº 8.212/1991, tem também implementar medidas para
integrado de ações de iniciativa dos por fim assegurar a seus benefici- a qualificação da gestão do traba-
poderes públicos e da sociedade, ários meios indispensáveis de ma- lho e educação na saúde; investir
destinadas a assegurar os direitos nutenção, por motivo de incapaci- na desprecarização do trabalho em
relativos à saúde, à previdência e à dade, idade avançada, desemprego saúde e na formação e educação
assistência social”. involuntário, encargos de família permanente no SUS; fortalecer o
Para ele, dos três eixos que e reclusão ou morte daqueles de controle social e democratizar a
norteiam a 13ª, o segundo é o mais quem dependiam economicamente. gestão, por meio da gestão partici-
complexo. “Nós dominamos muito bem Já a saúde, como consagra o Art. pativa; e investir na constituição do
os eixos 1 e 3, mas precisamos de fato 196 da Constituição, é direito de complexo produtivo em saúde.
nos apropriarmos do que é Seguridade todos e dever do Estado, garantido
Social e interferir nas políticas sociais mediante políticas sociais e econô- CAMINHOS DA DESORDEM
que influenciam as políticas de saúde”, micas que visem à redução do risco A segunda palestrante, a pes-
opinou. Representando o segmento de de doença e de outros agravos e ao quisadora Ivanete Boschetti, pro-
usuários na conferência, ele buscou acesso universal igualitário às ações fessora do Departamento de Serviço
apresentar, didaticamente, o que e serviços para sua promoção, pro- Social da Universidade de Brasília,
significa cada um dos três pilares da teção e recuperação. traçou o perfil da Seguridade Social
seguridade, que são assistência, pre- O palestrante apresentou pon- do país. “Depois de 20 anos,
vidência social e saúde. tos que considera essenciais para 40,6 milhões estão excluídos,
Assistência social, segundo a a qualificação e o fortalecimento 58 trabalhadores em cada
Constituição de 1988 e a Lei Orgânica do SUS como política de Estado. 100 sem direito à previdên-
da Assistência Social (LOAS), de 1993, “Como devemos caminhar?”, inda- cia; entre eles, 20,4 milhões
é definida como política voltada para gou. A resposta foi dada na forma não têm rendimento ou ele é
a proteção à família, à maternidade, de sugestões de propostas. São elas: inferior a um salário mínimo; desse
à infância, à adolescência e à velhice; retomar o conceito de Seguridade total, 5 milhões são trabalhadores
o amparo a crianças e adolescentes Social, aproximando os três pilares; rurais e 15,4 milhões são urbanos”,
carentes; a integração no mercado de regulamentar a EC 29; implemen- informou. Para ela, os princípios
trabalho; a reabilitação e a integração tar o Pacto pela Saúde; investir na constitucionais da Seguridade Social
de pessoas portadoras de deficiências. qualificação do modelo de atenção — universalidade, uniformidade e
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[ 20 ]

análise da Associação Nacional dos Social. Em 2000, era de 14,10%; em


Auditores Fiscais da Receita Federal, 2006, caiu para 11,96%. “Ou seja,
em 2005 o orçamento da Seguridade houve queda nominal”, ressaltou.
Social foi de R$ 24,7 bilhões com a Para Ivanete, a mudança desse
DRU; sem a desvinculação, seria de quadro depende de uma agenda para
R$ 56,8 bilhões. “Ou seja, foram a saúde na Seguridade Social. Essa
retirados da Seguridade R$ 32,1 bi- agenda deverá contemplar as seguintes
lhões”, alertou. Em 2006, a retirada propostas: a substituição das fontes de
foi de R$ 33.819.950, como informa financiamento regressivas por progres-
o demonstrativo das receitas desvin- sivas; o estabelecimento de um Fundo
culadas do orçamento da Seguridade Nacional da Seguridade Social; a não-
Social: R$ 17.673.653 desvinculados da renovação da DRU sobre as receitas da
receita da Cofins (Contribuição para seguridade social [na mesma data da
Esse fórum tem Financiamento de Seguridade Social); rejeição da CPMF o Senado aprovou a
legitimidade, R$ 5.060.876 da CPMF (Contribuição prorrogação da DRU]; a regulamenta-
precisa aprovar sobre a Movimentação Financeira); R$ ção da EC 29; a reinstalação do Con-
a 1ª Conferência de 4.613.362 da receita da contribuição selho Nacional da Seguridade Social; a
PIS/Pasep; R$ 5.288.194 da receita da integração mais estreita e articulada
Seguridade Social” Contribuição sobre o Lucro Líquido PJ entre as políticas da Seguridade; o
Ex-deputado Roberto Gouveia (CSLL); R$ 824.649 de outras receitas fortalecimento do SUS; a estruturação
de contribuições; e R$ 359.216 de e o fortalecimento da rede pública de
outras receitas correntes. serviços em contraposição à proposta
equivalência, seletividade e distribu- “Quem paga a conta”?, pergun- de criação das fundações estatais
tividade, diversidade do financiamen- tou. A resposta estava na ponta da de direito privado; e a estruturação
to, gestão democrática e descentrali- língua: os trabalhadores. Em 2006, de uma Seguridade Social pública,
zada — foram desmantelados. 3,8% vieram de recursos provenientes universal e com responsabilidade es-
O setor foi totalmente desestru- de impostos; 46,2% da contribuição de tatal. Algumas dessas idéias estavam
turado, analisou, “tanto em relação empregadores e trabalhadores; 25,6% presentes no relatório consolidado.
aos direitos quanto à gestão e ao finan- do Cofins; 7,7% da CPMF; 8,4% da CSLL; Outras serviram de base para a for-
ciamento”. Na opinião da professora, 4,7% da contribuição para custeio de mulação de propostas inéditas.
os direitos à seguridade não foram plano de servidor e militar; 1,3% de Sob aplausos inflamados, ela avi-
uniformizados nem universalizados. outras fontes; e 2,4% do Fundo de sou que a Seguridade Social que defen-
Na previdência, as contra-reformas Combate e Erradicação da Pobreza. de deve articular amplo conjunto de
restringiram os direitos, reforçaram “A Seguridade Social tem caráter direitos sociais e constituir sistema de
a lógica do seguro, reduziram valor regressivo”, acentuou. A palestrante proteção social universal e equânime.
de benefícios e abriram caminho para apresentou números que explicam essa E mais: “Precisa também fortalecer os
a privatização. Na saúde, houve fra- regressão: a previdência ficou com espaços de socialização da política e
gilização da atenção básica e o SUS 80%, a saúde, com 16% e a assistência, sustentar-se na luta e no movimento
não foi instituído completamente. Na 4%. Em 2006, exemplificou, foram dos trabalhadores e bater-se contra a
assistência social, tivemos foco em destinados à previdência R$ 212,9 política econômica e garantir recursos
segmentos e situações específicos e bilhões; à saúde, R$ 40,5 bilhões; e progressivos e redistributivos”.
uma abrangência restrita. à assistência, R$ R$ 21,5 bilhões. De
O desmonte na gestão se deu, se- 2000 a 2006, o orçamento cresceu GRITOS BEM-VINDOS
gundo Ivanete, pela não-consolidação 132,9%, o da previdência subiu 128,0% O palestrante seguinte era o
das instâncias deliberativas e partici- e o da assistência, 385,2%, enquanto a ex-deputado petista Roberto Gouveia
pativas e pela extinção dos Conselhos saúde cresceu apenas 100,2%. Segundo Nascimento. O coordenador da mesa
de Seguridade Social e Previdência. Ivanete, a regressão aparece também esqueceu de informar e grande parte
No financiamento, na medida em que na participação do Fundo Nacional de da platéia não ficou sabendo que se
não diversificou fontes, reforçou a Saúde no orçamento da Seguridade tratava do autor do PLP 1/03, tão caro
arrecadação sobre folha de à saúde pública. Do púlpito,
salários do setor privado e muito entusiasmado e feliz,
passou a usar recursos da Se- emocionado com o convite
guridade para pagamento da para falar à conferência, o
dívida pública. “Desde 1994 médico paulista gritou nos
vem ocorrendo apropriação 10 minutos de sua fala — às
indevida dos recursos vezes, sua voz até falhava.
do Orçamento da Se- Lembrou dos tempos de Con-
guridade Social, por gresso Nacional, das votações
meio da DRU [Desvin- na Câmara e exaltou o avanço
culação dos Recursos que representou a aprovação
da União], que são do 1/03 em 31 de outubro,
retidos pelo Orçamento Fis- “porque a regulamentação
cal da União e canalizados da EC 29 deu força de lei à
para a esfera financeira da Resolução nº 322, do Conselho
economia”, afirmou. Nacional de Saúde”.
Ivanete deu exemplos Como não podia deixar de
dessas distorções: segundo ser, Gouveia mostrou-se insa-
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tisfeito com o substitutivo aprovado, críticas. Para Sônia, ele se volta mais
que destinaria R$ 24 bilhões da CPMF uma vez para o crescimento, e não
em quatro anos à saúde, e defendeu para o desenvolvimento sustentável.
sua proposta original, que prevê para “Precisamos saber quantas pessoas
a área 10% das receitas correntes da sairão da miséria, quanto de empre-
União, o que representaria R$ 20 bi- go, de educação o PAC vai gerar, e
lhões a mais já em 2008. “Temos que não apenas quantas estradas serão
convencer o Senado a retomar esse construídas”, cobrou. A economista
percentual”, defendeu, lembrando defendeu mudanças na política mone-
que a proposta foi deliberada pela 12ª tária e participação da sociedade civil
Conferência Nacional de Saúde. organizada nos fóruns de discussão da
Inflamado, Gouveia defendeu área econômica. “Precisamos pensar a
um desenvolvimento econômico que política monetária, pois é ela que nos
inclua distribuição de renda — por- estrangula, que faz com que o governo
O governo
que desenvolvimento com susten- contingencie o orçamento”, alertou, encaminhou
tabilidade não se faz sem políticas muito aplaudida. mal a proposta,
públicas, disse. Nesse sentido, pediu Em relação à Seguridade Social, mas não podemos votar
ações intersetoriais e ressaltou a ela destacou, como havia feito Gou-
importância do controle social, em veia, a necessidade de uma conferên-
sem discutir”
especial das conferências nacionais cia nacional para que os setores mais Economista Sônia Fleury
de saúde. Gouveia conclamou os atrasados possam avançar, principal-
delegados a aprovarem proposta de mente a previdência. “Em parte, a
realização da 1ª Conferência Nacio- culpa é nossa”, observou: a saúde, Saúde como saída para os desafios
nal de Seguridade Social. Seus gritos por mais que tenha avançado, não da gestão e da atual conjuntura.
surtiram efeito, pois a sugestão criou um projeto claro para a Seguri- Corajosa, diante de uma platéia
foi imediatamente incluída como dade Social. “Tivemos medo que ela sabidamente contrária às fundações
proposta inédita e aprovada pela tomasse dinheiro da saúde, mas não há estatais, pediu mais debate sobre o
maioria na tarde daquele mesmo saúde sem seguridade”, avisou. Muito assunto. “A conjuntura da saúde nunca
dia. “Esse fórum tem legitimidade, aplaudida, desafiou: “Ou saímos daqui foi tão favorável como hoje em dia
precisa aprovar a 1ª Conferência de com uma proposta de conferência de para um debate”, disse, referindo-se
Seguridade Social para que possamos Seguridade Social ou nada acontecerá, a José Gomes Temporão como um mi-
recompor o Conselho Nacional e o os setores mais avançados precisam nistro comprometido com a Reforma
Fundo Nacional de Seguridade Social”, permitir que os setores mais atrasados, Sanitária. “Temos que reconhecer que
exortou, sob fortes aplausos. como a previdência, caminhem”. Sônia o SUS não é essa maravilha, a lógica é
criticou o fato de a previdência estar corporativista, está centrado no gestor,
PARA EVITAR O TRATOR atrelada à contribuição, uma vez que é injusto, há dificuldade de acesso, há
Diferentemente de Gouveia, a a Constituição brasileira garante o humilhação, não há igualdade de direi-
professora da Fundação Getúlio Var- direito a ela. “Já contribuímos com to”, enumerou ela os muitos problemas
gas Sônia Maria Fleury, presidente do os impostos”, disse. do sistema e da gestão hospitalar. “O
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde, A palestrante criticou também governo encaminhou mal a proposta,
defendeu com voz serena o desenvolvi- a fragmentação do setor social e mas não podemos votar sem discutir”,
mento sustentável do país. “No Brasil, a falta de comunicação entre os argumentou. “Se não debatermos, vão
não houve desenvolvimento, mas sim conselhos de Saúde e de Seguridade passar que nem trator sobre nós”, en-
crescimento econômico”, afirmou. De Social e já estava com a voz infla- cerrou Sônia sua fala, aplaudida de pé
1930, quando se produzia somente mada quando citou o Pacto pela por grande parte do auditório.
café, a 1980, o Brasil tornou-se a 8ª
economia do mundo. “Mas não houve
desenvolvimento de tecnologia, que
apropriamos de outros países desen-
volvidos, nem criamos um sistema
democrático inclusivo”. Radis Adverte
Na avaliação de Sônia, o governo
brasileiro, por um lado, promoveu o
crescimento do PIB em 120% no século
passado, mas não avançou socialmen- Apatia faz mal
te. “Podemos dizer que o governo
à saúde: participe!
saiu de um papel de terceirização e
redução do Estado para um Estado
que planeja o crescimento, apenas”,
ressalvou. E esse descompasso con- 26 DE JANEIRO
tinua neste século. “Agora, estão
destruindo a Amazônia para plantar Dia de Ação Global
soja de exportação, e não se faz de-
senvolvimento acabando com o povo do Fórum Social Mundial
e o meio ambiente”.
O Plano de Aceleração do Cres-
www.forumsocialmundial.org.br/
cimento (PAC) foi também alvo de
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Mesa-redonda • Eixo 3

Que herança deixaremos?

O procurador Humberto Jacques,


o primeiro a falar na mesa do
Eixo 3 — “A participação da socieda-
Humberto: gestão
e fiscalização

de na efetivação do direito humano


à saúde”, na manhã de sábado,
mostrou-se otimista em relação
à participação da sociedade no
SUS. Vice-presidente da Associação
Nacional do Ministério Público de
Defesa da Saúde, ele apontou como
avanço a reorganização do Conselho
Nacional de Saúde, que em 2006
elegeu pela primeira vez seu pre-
sidente. Também destacou o fato
de o espaço da saúde ser receptivo
a todo tipo de diferença humana,
abarcando grupos vulneráveis sem
preconceito. “O conceito de univer-
sal não está apenas no acesso a ser-
viços, mas na certeza de que entre além da forma, temos conseguido Por isso, pediu o resgate do ativismo
todos os envolvidos não há qualquer transformar os conteúdos da ação es- sanitário, apelo que já fizera na 12ª
discriminação”, afirmou. tatal na garantia do direito à saúde?”, (Radis 18), a fim de que o SUS não
Além dele, refletiram sobre o questionou. O procurador declarou seja reduzido à pura prestação de
tema o médico Mário Scheffer, o ser inegável a atuação do movimento serviços. Na palestra mais aplaudida
secretário de Saúde de Belo Hori- sanitário para impedir retrocessos no do dia, o sanitarista tocou corajo-
zonte, Helvécio Miranda Magalhães setor. Mas não se pode festejar a au- samente nas feridas do controle
Júnior, presidente do Conasems, sência de retrocesso, ressalvou, dado social. Os conselhos de saúde — que
e o sindicalista Manoel José dos o tamanho da dívida que a sociedade hoje são cerca de 5.600, envolvendo
Santos, presidente da Confederação brasileira tem a cobrar. mais de 100 mil pessoas pelo país —
Nacional dos Trabalhadores na Agri- Para ele, dois grandes passos a foram o primeiro alvo. Para Mário,
cultura. Valdenir Andrade França, serem dados pelo controle social são muitos ainda não exercem seu papel
da Coordenação das Organizações a responsabilização por problemas deliberativo e fiscalizador por conta
Indígenas da Amazônia Brasileira, de gestão e a fiscalização das ver- das condições precárias. “A gestão
coordenou a mesa. Em comum, as bas destinadas à saúde, pois não há pública subestima os conselheiros,
críticas à gestão e, em menor núme- direito fundamental sem recursos, insiste em não agir com transpa-
ro, aos conselheiros de saúde. nem recursos sem orçamento, nem rência e em não dar informações
Humberto disse se preocupar orçamento sem fontes. Baseado na básicas”, criticou, depois de “pedir
com o futuro e propôs uma auto- história da EC 29, Humberto avaliou licença” ao presidente do Conasems,
crítica aos delegados: “Recebemos que as denúncias feitas por con- sentado ao lado.
uma bela herança da 8ª Conferên- selhos, por exemplo, não têm sido O sanitarista, que é da diretoria
cia, que herança deixaremos aos suficientes para explicitar falhas. do Cebes, apontou a existência de
participantes da 18ª?” Lembrou que “Reelegemos pessoas que a descum- conselhos cartoriais, que só são con-
é comum avaliar-se a democracia prem, trocamos por outras e as novas vocados por gestores quando precisam
representativa — que ele considera também a descumprem”, entendeu. se credenciar para um repasse de re-
bem-sucedida, por conta de suces- cursos. As críticas não foram direcio-
sivas eleições, alternância PARA NÃO DIZER SÓ AMÉM nadas apenas à gestão: na outra ponta
no poder, crises, impeach- O controle social na saúde tem de distorções, indicou, há conselhos
ment — pela sua capacidade passado por transformações sem que que querem competir com prefeitos
de modificar os indicadores haja tempo de se refletir coletivamen- e assumir funções tipicamente exe-
sociais do país. A democracia te sobre elas, sentenciou o médico cutivas. Em ambas as situações, a
participativa, salientou, tam- Mário Scheffer, do Grupo Pela Vidda, agenda governamental dita o rumo
bém precisa ser questionada sobre que falou em seguida. do controle social: ou o conselho faz
os progressos que ofereceu para Para ele, os defensores do SUS oposição sistemática ao gestor ou se
eliminar as injustiças. estão cada vez mais assoberbados, torna um aliado incondicional dele,
“A briga que temos conduzido é “cada um cuidando de um pedaci- um coadjuvante. Mário classificou
só para melhorar as formas de exer- nho do sistema”, o que prejudica esta realidade de “seqüestro consen-
cício da democracia participativa ou, a atualização das causas da saúde. tido de uma agenda própria”.
Radis 65 • jan/2008
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Diante de uma platéia em gran- ciam, mas não têm responsabilidade


de parte formada por integrantes de e compromisso”. Segundo Mário, esse
conselhos de saúde, o sanitarista re- comportamento deve-se ao fato de
clamou da baixa representatividade que, em determinados momentos,
de muitos conselheiros em relação ao parte dos gestores do SUS não aceita
segmento, assim como sua profissio- abrir mão da prerrogativa de decisão
nalização, o que impede a renovação em favor das instâncias de controle
do controle social. “O que mais as- social. “As conferências e os conse-
susta é que até hoje ainda existem lhos só servem ao gestor quando di-
conselhos com composição ilegal, zem amém”, alfinetou. “Quando têm
que não obedecem à proporção dos deliberação contrária aos interesses
segmentos, em que conselheiros são dele, são ignorados”.
escolhidos pelo gestor por ser de O cidadão deve ser o centro das
determinado partido ou corporação”, atenções do controle social, pregou,
Sejamos francos,
denunciou. Da platéia, muitos aplau- visto que é a principal vítima dos pro- o SUS não vai
sos e gritos de “apoiado”. blemas do sistema — sofre com filas, nada bem”
Ele defendeu a eleição de con- descaso, humilhação, ineficácia, falta
selheiros entre seus pares, em subs- de médicos e remédios. O sanitarista Sanitarista Mário Scheffer
tituição às indicações por segmento, disse acreditar que as dificuldades de
e incentivou novas experiências na acesso têm sido banalizadas, assim O sanitarista disse desconfiar
direção, como a eleição de usuários como o sofrimento dos usuários. “A que a omissão do controle social em
para a presidência. Mas não des- tendência é só falarmos dos pontos relação à saúde suplementar deve-se
cartou a possibilidade de gestores positivos do SUS, na tentativa de não ao fato de que mesmo os servidores
assumirem a função, declarando darmos argumentos aos inimigos”, do SUS querem ser atendidos por
discordar de que exista algum impe- observou, “mas, sejamos francos, o planos privados de saúde, pois não
dimento ético. “Precisamos vencer SUS não vai nada bem”. confiam totalmente no sistema públi-
o preconceito”, agregou. Mário, Mário lamentou que a concepção co. Para ele, há um divórcio entre a
inclusive, sugeriu que sejam testa- de democracia prevalente não seja sociedade e o sistema de saúde, daí a
dos modelos de comando que não o a participativa, e sim a burocrática, necessidade de que a sociedade seja
presidencialismo. “Por que não atuar que impede transformações nas re- convencida de que não existem dois
de forma colegiada, por exemplo?” lações de poder. Ele comparou reu- sistemas no Brasil, e sim um só — in-
Outro alvo foram as conferên- niões de conselhos de saúde a jogos justo e desigual. “A impressão é que
cias: sugeriu o estabelecimento de xadrez: na disputa por espaço, estamos defendendo o SUS do outro,
de um novo modelo, que inclua e sacrificam-se os peões — “e o peão do pobre, ou será que sepultamos de
valorize discussões em bairros, regi- muitas vezes é a população que de- vez a tentativa de conquistar um SUS
ões e distritos antes de chegar aos pende do SUS”. Ou seja, em instân- justo e equitativo?”, provocou. Ele
municípios, aos estados e à etapa na- cias de controle social dominadas por pediu que o controle social ataque
cional. Ele contou ter ouvido muitos grupos e corporações, o usuário que outros vícios do sistema, como as
relatos entusiasmados de pessoas que não integra nenhum movimento orga- emendas parlamentares da saúde
participaram de conferências, mas nizado não tem capital político, não e o loteamento político dos cargos
também alguns preocupantes. Várias consegue vocalizar suas demandas. de gestão, e resista às tentativas de
foram convocadas “a toque de caixa” Esta situação torna-se ainda mais restrição do acesso.
só para constar como realizadas, grave por ocorrer num sistema com Na contramão da maioria dos
reduziram-se à eleição de delegados recursos escassos, em que muitas sanitaristas, apoiou a judicialização
para a etapa seguinte, não tiveram vezes leva quem grita mais alto. da saúde: “Não podemos admitir
representação adequada, listou. De acordo com ele, a instrumen- que se impeçam ações judiciais que
E acrescentou: “Muitos gestores talização partidária e de categorias obrigam os gestores a fornecerem
estiveram ausentes, como se quises- profissionais dos conselhos favorece o medicamentos de alta complexidade
sem dizer que até toleram, até finan- clientelismo: todas as vezes em que as e alto custo”. Da lista de reivindica-
instâncias participativas ções que apresentou constava ainda
são manipuladas, os in- o enfrentamento das grandes corpo-
teresses da coletividade rações que valorizam mais o lucro
ficam subordinados a do que a vida, quebra de patentes,
interesses menores. investimento na produção nacional
“O que mais vemos são de medicamentos, luta contra o
aqueles que querem lobby da indústria da bebida
receber por produção e alcoólica e exigência de que
por serviços prestados, as operadoras de planos pri-
estão juntos engrossan- vados de saúde paguem o que
do a fileira pela regu- devem ao SUS.
lamentação da EC 29, Falando muito rápido, para
mas só para apresentar não ser advertido sobre o tempo, o
a fatura do que mais sanitarista alertou a platéia a não
eles têm a receber”, embarcar na onda do desinteresse
observou. Essa inversão pela política, apesar da conjuntura.
de valores, destacou, Segundo Mário, a saída para se res-
deve ser combatida. gatar a dimensão pública da política
Radis 65 • jan/2008
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futuro é a crítica que fazemos do Críticas à parte, Helvécio desta-


presente”, filosofou. Por isso, con- cou em sua fala a intersetorialidade.
vocou os delegados a militarem com Salientou que a desigualdade no Brasil
mais força em defesa do SUS e ter- — de renda e de acesso a serviços — faz
minou sua energética fala gritando mal à saúde de todos, não só à dos mais
palavras de ordem, aplaudido de pé: pobres. “Ao contrário do que a elite
“Viva o SUS, viva o controle social e pensa, ter uma parcela da população
viva a vida”. com dificuldade de acesso à saúde
é ruim para a própria elite, porque
SUJEITOS DA acaba recorrendo a hospitais privados
CONSTRUÇÃO DO SUS e custosos”, explicou. E citou um dado
Representante dos gestores, para comprovar sua teoria: grupos de
Helvécio Miranda Magalhães Júnior, renda média em países com alto grau
Fala-se muito presidente do Conasems, chegou he- de iniqüidade têm saúde pior do que a
de economia, sitante ao púlpito: “Falar depois do de grupos de renda inferior que vivem
crescimento, PIB, Mário... eu fico apertado”. Mas não em sociedades mais equitativas.
receita, renda per capita, se abalou com as sucessivas críticas “Fala-se muito de economia,
a seu segmento. Ele próprio confir- crescimento, PIB, receita, renda per
sem se considerar o mou, por exemplo, que há ingerência capita, sem se considerar o bem-estar
bem-estar das pessoas” política “nefasta” na escolha de con- das pessoas, o verdadeiro desenvol-
selheiros de saúde, principalmente vimento do país”, observou, daí a
Secretário Helvécio Magalhães Jr. por parte de prefeitos. Segundo o relevância do tema da conferência.
secretário de Belo Horizonte, existe O debate sobre qualidade de vida é
é aprofundar a democracia partici- uma “zona cinzenta” na relação en- uma reação aos enfoques puramente
pativa, ampliando as alianças — com tre gestão e conselhos, que favorece economicistas, disse. E depende de
ONGs, movimentos populares de ne- um clima desnecessário de conflito. um conjunto de políticas públicas e da
gros, índios, homossexuais, mulheres, Helvécio concordou quanto a outros articulação de movimentos por direitos
portadores de patologia e deficiência, problemas enumerados na mesa: humanos: “Lutar por saúde é lutar por
de defesa do consumidor, dos direitos profissionalização de conselheiros, uma nova política nesse país”.
humanos, das pastorais, dos estudan- apropriação privada desses espaços
tes, dos sem-terra, dos sem-teto. “Se e exclusão de usuários das arenas do SAÚDE PARA O CAMPO
não o fizermos, não tenham dúvida de controle social. Manoel José dos Santos também
que vai vencer o projeto de isenção do Indicou como desafios a melhoria apoiou a fiscalização da destinação
Estado na garantia de direitos, o que da estrutura de conselhos (com apoio dos recursos do SUS, de modo a dimi-
já está acontecendo”, ressaltou. técnico, informática, transporte nuir a corrupção. “Não basta lutar por
O movimento da saúde, disse, e comunicação), a ampliação do mais dinheiro”, disse. O sindicalista
deve libertar-se do aprisionamento espectro de participação, a radica- surpreendeu ao pedir a diminuição
em conselhos e conferências, reto- lização da transparência por parte do número de conselhos de saúde no
mar o contato com as comunidades, da gestão e a educação permanente país, de modo a aumentar seu poder
ocupar a mídia, convencer a opinião de conselheiros. Se há dinheiro para de deliberação. De acordo com ele, a
pública, comprometer os gestores. pagar médicos e enfermeiros, disse, pulverização desses espaços de con-
Segundo ele, a lentidão do controle não pode faltar para capacitação, já trole social é fruto de um movimento
social pôde ser medida na tentativa que interessa ao sistema que os con- do governo para impedir o fortaleci-
de regulamentação da EC 29 — “le- selheiros o entendam por completo. mento da participação. “São tantos
vamos sete anos para regulamentar “Estou convencido de que quanto que uma mesma discussão sai de um
um direito e ainda estamos diante mais preparamos os conselheiros, e entra no outro”, julgou.
de um impasse no Senado que vai ser mais possibilidades eles têm de irra- Assim como os três palestrantes
prejudicial ao SUS”. Outro exemplo diar conhecimento, de fiscalizar e de anteriores, Manoel culpou a ges-
foi a diminuição do percentual a ser dar tranqüilidade aos gestores, pois tão pelas dificuldades do controle
destinado pela União à saúde: eram viram sujeitos da construção do SUS”, social. Ele afirmou que prefeitos
30% da seguridade (que equivaleria afirmou. Ele também defendeu o or- e vereadores se valem da falta de
hoje a R$ 105 bilhões), viraram 10% çamento participativo e a criação de informação de alguns conselheiros
da receita corrente bruta (R$ 74 bi- conselhos locais em todas as unidades para manipulá-los, defendendo os
lhões) e a Câmara acabou aprovando básicas estatais ou de hospitais priva- interesses de grupos específicos.
o projeto que prevê R$ 51 bilhões. dos, especialmente os filantrópicos, Segundo ele, esse comportamento se
Mário ainda afirmou que os que recebem dinheiro público. deve à história do país, em que “co-
defensores do SUS caíram ronéis” decidiam os rumos sem que
numa armadilha: tiveram que a sociedade interferisse. Presidente
“chantagear” a sociedade a da Contag, Manoel aproveitou o mo-
apoiar a renovação da CPMF. mento para pedir a criação de uma
Se o controle social não política de saúde específica para a
foi a marcha triunfal que todos es- população do campo. O argumen-
peravam, contemporizou, tampouco to: “Se nas periferias das grandes
é uma causa perdida. “Não podemos cidades pessoas morrem na fila de
culpar os resíduos do passado: nos- hospitais à espera de atendimento,
so compromisso tem que ser com imagine quem mora a 500 quilômetros
o futuro, mas o que modifica esse de distância de uma cidade”.
Radis 65 • jan/2008
[ 25 ]

Plenárias temáticas

Da bagunça ao método

300 delegados, ar-condicionado e telão

A equipe do RADIS acompanhou


seis das 10 plenárias temáticas
simultâneas, em salas separadas por
para exibição dos itens em votação. As
propostas em debate eram as mesmas,
mas o comportamento dos grupos variou
divisórias, com lugares sentados para da confusão geral à organização total.

Ali pelas 19h do primeiro dia, na votação da proposta 113 do Eixo 1:


Canela a Sala Capim Seco, por exemplo, “O Ministério da Saúde deve garantir
já votara as 210 propostas prévias que o SUS reconheça como promoto-
do Eixo 1, enquanto na Alecrim res de saúde alternativa pajés, xa-
faltavam apenas cinco. A Canela mãs, parteiras e pastorais da criança,
encerrou os trabalhos perto da além de regulamentar a atuação das
meia-noite sem votar as propostas ONGs que desenvolvam atividades
inéditas. No segundo dia, a plená- na área da saúde.” Delegados da
ria iniciou os trabalhos com quase ala esquerda pediram supressão de
uma hora de atraso. Após sessão de imediato. Não podia, mas a proposta
alongamento “para relaxar depois voltou como “inédita” sob nova reda-
do almoço”, como justificou José ção — sem “pastorais da criança” — e
Cláudio Barrigueli, o novo coorde- acabou aprovada, embora suprimida

T umulto, brigas, gritaria, desin-


formação, entra e sai incessante,
curto-circuito em lâmpada e até aci-
nador, ainda houve muito bate-boca
sobre o regulamento. Um delegado
ao microfone agitou os ânimos:
na plenária final.
Às 15h20 do segundo dia entrou
na sala o ministro Temporão, sob
dentes com cadeiras fizeram da ple- “Nossa conferência morreu quando aplausos. “Tudo hipocrisia”, obser-
nária da Canela uma das mais desor- aprovamos esse regimento”. vou o delegado Francisco de Souza
denadas. Tentando ser democrático, Na votação das sugestões iné- e Silva, sindicalista de Salvador que
o coordenador Edmundo Costa Couto, ditas, mais confusão quando foi lida marcava cerrado as propostas ex-
secretário de Saúde do Maranhão, a nova redação para a proposta 37 temporâneas à saúde. “Ele deveria
acabou dominado pelo grupo de dele- do Eixo 1: “Assegurar os direitos ter chegado meia hora antes, para
gados que gritava mais alto. Logo na sexuais e reprodutivos, respeitar a ver esse povo rejeitando o aborto”.
abertura, bastou ele avisar que segui- autonomia das mulheres sobre seu Na votação, passavam coisas como
ria rigorosamente o regulamento para corpo, reconhecendo-o [reconhe- “Auditoria da dívida interna do Bra-
começarem os protestos: a maioria não cendo o aborto] como problema de sil” — “ué, a Saúde vai pagar essa
tinha o texto final — e só se lembrou saúde pública, e discutir sua descri- auditoria?”, perguntou um delegado
de reclamar na plenária. minalização por meio de projeto de que se distraiu e não pediu supres-
As questões semânticas prevale- lei”, dizia o texto original, confuso são —, a primeira proposta inédita
ciam. A discussão sobre que palavra porque não incluíra as palavras aqui ainda do Eixo 1, ou a criação, pelo
usar — “destaque”, “supressão” ou entre colchetes. A delegação de Ministério da Saúde, de IMLs em
“proposta” — na rejeição de um tex- São Paulo exigiu e conseguiu nova cidades com mais de 50 mil habitan-
to tomou mais de meia hora. Quando votação. Afinal, o erro da relatoria tes — “Vamos prestar atenção, isso
finalmente começou a votação, o alterara o sentido da proposta. Nem é problema de segurança pública,
perfil da sala ficou logo definido: assim: muitos braços se levantaram minha gente”, argumentava
igrejas e gestores se reuniram pre- pedindo supressão. Francisco. As duas propostas,
dominantemente à direita, enquanto A delegada Jussara Cony, farma- vá se entender, chegaram vi-
“laicos” e servidores da saúde fica- cêutica do Grupo Conceição, de Porto toriosas à plenária final...
ram à esquerda da entrada. Numa Alegre, que tentava explicar cada Também passou nas 10
das plenárias mais conservadoras, proposta sobre o tema — “Pessoal, salas pedido de inclusão na
a ala direita rejeitou toda e cada não se trata de legalização do abor- Política Nacional de Práticas Integra-
proposta sobre direitos de mulheres, to...” —, mal conseguia falar, e no tivas e Complementares da “medici-
gays, negros ou trabalhadores. Aten- último dia teve até crise de hiperten- na antroposófica” e outras terapias
ta também, a ala esquerda vetou são: “Perdi tudo”, dizia, desolada. Os com “comprovado embasamento
todas as sugestões que supunham “laicos” da Canela brincaram muito científico”. Mas sugestões que fa-
verba para ações extra-saúde. com o que chamaram de “vingança” voreciam instituições filantrópicas
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[ 26 ]

e seguradoras de saúde ou livravam o ouvir opinião contrária, a plenária


gestor de responsabilidade fiscal eram entretanto rejeitou. Manjericão
imediatamente vetadas. Ainda com o Ivonildo, inconformado, voltava à
escândalo dos sanguessugas na cabeça, carga: “Esta conferência não está dis-
um delegado gritou “Superdestaque! cutindo nada, falta respeito com quem
Derruba!” à proposta que pedia prio- pensa diferente”. Os delegados então
ridade do Orçamento da União para a autorizaram sua fala. Desta vez sob
compra de ambulâncias. silêncio, ele pediu que mantivessem o
Em meio ao tumulto geral, dois texto para permitir que o debate fosse
integrantes da mesa que faziam a aprofundado. Mas acabou acusando os
leitura das propostas foram sumaria- críticos de quererem manter regalias
mente “demitidos”, pela dicção pouco e privilégios, e saiu novamente vaia-
clara. Até o último dia, só era aceito do. O texto, como tudo indicava, foi
quem tivesse voz de locutor. Tudo
contribuía para a confusão. Em meio à
leitura ouvia-se de vez em quando um
suprimido. Outro delegado baiano, o
trabalhador Edmundo Cezar Ribeiro,
disse que a proposta foi empurrada
O barulho externo foi um dos prin-
cipais obstáculos na Sala Manjeri-
cão, quase ao lado do espaço cultural:
“catabum”: era alguém caindo das ca- na etapa estadual, apresentada como o alto volume das atrações artísticas
deiras, que tinham o assento solto. Um salvação do sistema público de saúde fez concorrência com as discussões.
curto-circuito no teto da ala esquerda e aprovada sem discussão. O regulamento também irritou os
também causou grande susto. Do lado de fora da sala, Ivonildo delegados, impedidos de debater as
Além do aborto no Eixo 1, outra queixava-se da metodologia da con- propostas. “Na minha avaliação, a
unanimidade contra foi a fundação ferência. Segundo ele, o fato de só gente não está aprofundando”, opinou
estatal, no Eixo 2. Propostas que existir a possibilidade de supressão Ana Célia da Cunha, representante dos
lembrassem mesmo de leve essa das propostas impediu que os pro- gestores, da Secretaria Municipal de
alternativa de gestão eram extermi- blemas da saúde e suas soluções fos- Saúde de Guarulhos (SP).
nadas sem piedade. Um gestor ousou sem debatidos. Também questionou Ela reclamou da falta de de-
criticar o “corporativismo” da plená- o “sumiço” da proposta 54B, vinda bate sobre questões concretas. Por
ria — “o usuário chega e não encontra de seu estado, do relatório conso- exemplo, a Vigilância Sanitária em
os profissionais, mas o salário no fim lidado entregue aos delegados — o municípios com penitenciárias. “Em
do mês sai em dia...” — e se retirou texto veio em errata separada. “Se Guarulhos, temos quatro unidades pri-
debaixo de vaia. Em contrapartida, não pressionássemos, nem entraria sionais, com seis mil detentos, embora
a sala aprovou por aclamação a na pauta de votação”. a capacidade seja bem menor, o que
proposta de ponto eletrônico para O secretário de Saúde da torna esse ambiente muito insalubre,
médicos e dentistas nas unidades de Bahia, Jorge Solla, contou que o propício à proliferação de doenças”,
saúde. A Canela foi uma das últimas texto constava do relatório até a disse. Altair Lira, da Federação Na-
a encerrar os trabalhos. saída da representante do estado cional das Associações de Doenças
da última reunião de redação. Na Falciformes, representante dos usuá-
versão impressa, porém, desapare- rios de Salvador, estava mais otimista:
Eucalipto ceu. Um dos três coordenadores da “As coisas vão se ajustando, as pessoas
relatoria da conferência, Armando vão entendendo as propostas”, afir-

P or volta das 20h da sexta-feira,


quem passava pelos corredores
do ExpoBrasília ouvia gritos vindos
Bardou Raggio explicou que o item
foi retirado por se referir ao estado
da Bahia. “Todas as propostas locais
mou. “Estão representadas na sala
as populações indígena, negra, GLBT,
mulheres, quilombolas, e o grupo está
da Eucalipto. Lá dentro, a discussão saíram do relatório”, garantiu. O construindo e percebendo que este é o
não podia ser outra: as fundações. secretário recorreu e a errata só foi grande desafio para a saúde no século
A esmagadora maioria rejeitou o distribuída por conta de um acordo 21: garantir a integração dessas pesso-
projeto do governo. A voz dissonan- da Bahia com o Rio de Janeiro, mo- as ao sistema de saúde”. Já o desafio
te era a do gestor Ivonildo Dourado dificando o texto original. Armando da 13ª, para ele, era resolver como o
Bastos, diretor regional de saúde da fez questão de dizer que há provas SUS atenderá as especificidades sem se
Bahia, que ainda tentava conven- insofismáveis da isenção dos relato- tornar “excludente ou exclusivista”.
cer a plenária. “Temos um sistema res: “Não admito sequer a cogitação A enfermeira Ana Paula de
precarizado e as fundações são uma de que houve uma triagem para Andrade Lima Viana, representante
forma de organizar essa sacana- suprimir a discussão”. dos usuários de Recife, considerou
gem, acabar com OSSs e Oscips”, Assim como Ivonildo, Solla tam- “inclusiva” a discussão do Eixo 1,
bradou. De nada adiantou: parou bém criticou a forma “maniqueísta” apesar de uma certa “ameaça de re-
de falar sob vaias e os dele- com que se debateu a questão: sim trocesso” em relação aos serviços de
gados mantiveram o texto da ou não, contra ou a favor. Para o saúde para populações específicas.
54, exigindo que o ministério secretário, os opositores do projeto “Houve uma expansão muito positiva
retire do Congresso o projeto das fundações usaram argumentos do debate sobre direitos sexuais e
das fundações. falaciosos nas salas — por exemplo, reprodutivos das mulheres”, disse
Um delegado reclamou que o modelo pressupõe a privatiza- ela, integrante da Rede Feminista
da falta de educação dos colegas. ção do sistema. Ele rebateu dizendo de Saúde. E isso apesar da presença
“Não estão respeitando o direito de acreditar que as fundações serão ca- marcante dos católicos que, “com
cada um se manifestar”, criticou. Na pazes de fortalecer a gestão pública, discussões muito apaixonadas, aca-
54B, por exemplo, um grupo de 10 inverter o processo de privatização baram inviabilizando o debate”. Na
pessoas gritava “Não à fundação!” iniciado há 15 anos e dar fim à pre- Manjericão estava sendo amplamen-
Consultada sobre a necessidade de carização dos trabalhadores. te distribuída a cartilha “Por que
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somos contra o aborto”, produzida O delegado Pedro de Jesus Silva, as propostas lidas, a maioria aprova-
pela Frente Parlamentar contra a representante dos trabalhadores pelo da, pausa para o jantar. No retorno, a
Legalização do Aborto. Rio de Janeiro, a favor da supressão, votação dos 64 destaques solicitados.
O conservadorismo também foi esbravejou: “O governo não discutiu Cansaço chegando, 38 destaques e as
percebido por Altair Lira, que respon- antes e quer discutir agora? Pau que propostas inéditas do Eixo 1 ficaram
sabilizou a falta de informação pela nasce torto morre torto”. para o dia seguinte, provocando pe-
rejeição de propostas mais “avan- Apesar de problemas como can- queno atraso na votação da plenária
çadas”. Ele citou como exemplo a saço, barulho externo, falta de luz em temática do Eixo 2.
má vontade com a proposição que vários momentos, a sala conseguiu con-
defendia o tratamento da necrose da cluir, noite avançada, a votação das 284
cabeça do fêmur, um dos sintomas da propostas do relatório consolidado e Alecrim
anemia falciforme, apenas porque preparar as propostas inéditas, votadas
o texto mencionava “célula-tronco” sem problemas no dia seguinte.
— os católicos condenam o uso de No último dia, reservado à vota-
células-tronco embrionárias. Depois ção do Eixo 3, o ambiente era de muita
de esclarecer que o tratamento usa organização e nenhuma polêmica,
as células-tronco adultas, conseguiu condizente com o nome da sala: a
a aprovação. “Cada vez mais há leitura das 94 propostas do Eixo 3
necessidade de debate, para que as começou às 14h40, terminou às 16h e
pessoas não votem simplesmente pelas às 20h já tinham sido votados todos os
convicções religiosas”, opinou. destaques. O único momento de algum
atrito foi na proposta nº 25 — “Deter-

Erva-Doce
minar que o quantitativo de delegados
para a Conferência Nacional de Saúde
seja fixo por unidade federada, e não
N a Alecrim, os delegados pareciam
ter combinado votar rapidamen-
te as propostas. Pedidos seguidos de
Foto: Rogério Lannes

pelo critério populacional”. A plenária destaque eram motivo de vaia — que


protestou indignada e votou em peso o diga um delegado chamado Wilson
pela supressão. que, ao perceber que se tornara o
principal alvo — “Pára com uilso”,
ironizava a platéia, fazendo troca-
Cidreira dilho com seu nome —, anunciou ao
microfone que retirava as objeções.
Também sofreu quem pediu supressão
de textos importantes para usuários e
trabalhadores. “Só pode ser gestor!”,

C om 260 pessoas, a Sala Erva-Doce


lembrou mais uma pimenta do que
um chá calmante. No segundo dia de
gritavam. Uma gestora pediu questão
de ordem: “Não podemos ser vistos
como algozes, colocados contra a
plenária temática, reservada à vota- parede”, reclamou.
ção do Eixo 2, delegados reclamaram Na sexta-feira, uma algazarra foi
várias vezes quando a mesa, coorde- criada quando se anunciou o recurso da
nada por Wilson Valério (segmento delegação de São Paulo pela correção
de usuários), com ajuda de Mauro
Schimidt (trabalhadores) e Jurandir
Frutuoso (gestores), acatou destaques
O lema “Ordem e progresso”,
da bandeira brasileira, sinte-
tizou o clima na Sala Cidreira, no
da proposta 37 do Eixo 1, que omitia
a palavra “aborto”. A grande maioria
se negou radicalmente a votar, mas
depois da aprovação de propostas. “A primeiro dia de plenária temática. a mesa insistiu. Pela supressão da
mesa está manipulando, não pode”, No início da votação do Eixo 1, proposta, um delegado disse conhecer
reclamou o delegado Tiago Pinheiro, às 17h, uma pequena confusão se uma mulher que abortou e precisou de
representando os usuários da Bahia. formou: alguns delegados queriam cinco anos de tratamento psicológico
Revoltado, foi procurar a relatoria destaque de uma proposta depois para se recuperar, pois era “direita”,
geral para resolver a questão. de aprovada. Mas o regulamento era afirmou. “Isso é puro machismo”,
Outro momento apimentado claro: propostas lidas sem pedido protestou uma delegada.
foi a votação das propostas 54 e de destaque eram automaticamente Na defesa do texto, outra dele-
“54B”. A primeira, contra o projeto aprovadas. Dez minutos foram su- gada quase não pôde falar. “A mulher
de fundação estatal de direito pri- ficientes para que a coordenadora tem direito sobre seu corpo e sua
vado, foi aprovada de imediato. A da mesa, Maria Isabel dos Santos, a vida”, chegou a ensaiar, sob
segunda considerava o projeto uma Bel, representante do segmento de forte barulho. Os contrários
“alternativa de modelo de gestão usuários, pusesse “ordem na casa”. gritaram: “E o direito à vida da
para o SUS” e recomendava “maior A maioria dos delegados a apoiou, criança?” Na soma dos votos, 55
debate”. Acabou suprimida, sob for- ansiosos por recuperar o atraso na optaram pela manutenção e 93
tes aplausos. Um dos poucos que se programação do dia. pela supressão. A rapidez nas
propuseram a defender a manuten- Polêmicas não tiveram chance na votações deu resultado: Alecrim foi a
ção do texto foi o delegado Nelson dos Cidreira. Nem na votação da proposta primeira plenária temática a encerrar
Santos: “As pessoas não querem fazer nº 37, que mencionava o aborto como os trabalhos. Às 17h30 do sábado já
o debate onde ele tem que ser feito”, problema de saúde pública e recebeu terminara o Eixo 3 e os delegados
resumiu. “Essa proposta faz isso, re- apenas um destaque, passando à ple- saíram pelos corredores em carnaval,
comenda o debate com a sociedade”. nária final. Às 19h12, depois de todas gritando “Adoro alecrim!”
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ENTREVISTA

Clóvis Boufleur

“A 37 não era
um texto inocente”
Problema de saúde pública é

A imprensa atribuiu a bem-suce-


dida articulação política que
levou à rejeição da proposta sobre
a saúde da mulher em geral, não o
aborto especificamente. Para ser
considerado problema de saúde
descriminalização do aborto ao pública, teria que ter dados confi-
secretário-geral da 13ª, o católico áveis, e nós questionamos os dados
Clóvis Boufleur. Gestor de relações divulgados pelo governo.
institucionais da Pastoral da Criança,
ele substitui no Conselho Nacional de Nas plenárias temáticas, a tendência
Saúde a sanitarista Zilda Arns — fun- era aprovar a proposta. A que atribuir a
dadora da Pastoral, organização da mudança de opinião dos delegados?
Confederação Nacional dos Bispos do Nas temáticas, a questão não estava
Brasil que praticamente eliminou a evidenciada. Mesmo com a inclusão da
mortalidade infantil por desidratação palavra aborto no texto, parecia que a
no Brasil com a disseminação de seu opinião da maioria não ia mudar. Mas as

A.D.
famoso soro caseiro. pessoas começaram a conversar nos cor-
Nesta entrevista à Radis, conce- redores. Grupos de defesa da vida tam-
dida por telefone em 6 de dezembro, bém passaram a mostrar que a proposta
ele conta como foi a articulação para não era genérica, que indiretamente
derrubar a Proposta nº 37 do Eixo estava aprovando o aborto. A partir daí,
1. “A intenção da proposta era dar as pessoas entenderam que o objetivo
margem para que o movimento pró- não era só encaminhar o debate: antes
legalização do aborto tomasse mais achavam que era um texto inocente
corpo e influenciasse a decisão do e depois perceberam que não era. A O Ministério da Saúde afirma que,
Congresso”, contou, referindo-se ao intenção da proposta era dar margem apesar da decisão da conferência, o
exame do projeto de legalização na para que o movimento pró-legalização debate sobre o aborto como proble-
Câmara. O relator, deputado Jorge do aborto tomasse mais corpo e influen- ma de saúde pública continua. Como
Tadeu Mudalen (DEM-SP), que é evan- ciasse a decisão do Congresso. o Sr. vê essa posição?
gélico, deu parecer em 21/11 pela Também achamos que o debate
rejeição. “As pessoas antes achavam Como se deu a mobilização para im- deve continuar. A idéia não é ignorar o
que era um texto inocente e depois pedir a aprovação da proposta? problema, mas dialogar para conseguir
perceberam que não era.” Tínhamos um grupo da Pastoral aumentar as ações de prevenção. Por
distribuindo material específico sobre outro lado, a decisão da conferência
Como o Sr. analisa a supressão da o aborto, pelo menos 500 cópias de um aponta uma posição muito clara, que
proposta relativa ao aborto? artigo científico organizado pela Dra. a defesa da vida é indiscutível. Para
Foi uma surpresa para algumas Zilda Arns. Além disso, havia padres nós, a vida é inegociável.
pessoas que estavam lá, mas para nós conversando com os delegados sobre
reflete o amadurecimento dos que o assunto. No primeiro dia da confe- Adson França, do ministério, diz
participaram da conferência. rência, nos reunimos e contamos 60 que são 200 mortes por ano no
Vejo esta decisão como a ca- pessoas da Pastoral. Calculo que, no país e acusa os contrários à descri-
pacidade de se entender que total, nosso grupo era formado por minalização de acharem que esse
um problema de saúde pública cerca de 200 pessoas ligadas à igreja, número é pequeno.
não se resolve com uma ação a movimentos de defesa da vida e a Para nós, esse número é me-
pontual, mas com uma lógica de outras congregações religiosas. nor. Mas independentemente disso,
prevenção, de educação, de qualidade nós defendemos a vida de todos. As
do atendimento à mulher. Este assunto Vocês se articularam com outros mortes poderiam ser evitadas com
não pode ser visto de modo isolado. grupos, então... um bom pré-natal, no qual a mulher
Sim, procuramos o pessoal do receba informações sobre a gestação,
O Sr. considera o aborto uma questão movimento indígena, com quase 100 sobre as possibilidades de uma criança
de saúde pública? pessoas, que pensam como nós. trazer alegria... (B.C.D.)
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Plenária final

Os sem-debate

A plenária final começou com a pro-


messa de votação rápida, de modo
a evitar que as discussões entrassem
pela madrugada, mas só foi possível
encerrar a conferência depois das 2h.
Francisco Batista Júnior abriu a plenária
com um balanço parcial da 13ª: a “mais
ordeira, disciplinada e democrática que
tivemos”. Segundo ele, foi consensual
a opinião na comissão organizadora de
que houve poucos problemas em com-
paração às anteriores. “Vocês estão de
parabéns — não nós, organizadores —,
pois estão fazendo coletivamente uma
conferência maravilhosa, com debate
qualificado”, festejou.
Na entrada do auditório, os dele-
gados recebiam listas com as propostas
aprovadas ou suprimidas nas plenárias Júnior era chamado a todo momento para acalmar os ânimos na plenária final
temáticas dos três eixos e podiam fazer
seu próprio balanço. Chamava a atenção, silêncio repetidas vezes. A aglomera- Ainda sob forte burburinho, ficou
por exemplo, o fato de que todos os itens ção em torno do palco também gerou decidido que os destaques só seriam
contrários ao projeto das fundações es- reclamações. Portadores de necessi- defendidos após a leitura de todas as
tatais haviam sido mantidos na maioria dades especiais, na primeira fileira propostas de cada eixo. E também
das salas, enquanto o único favorável da plenária, reclamavam espaço para que, primeiramente, os delegados
fora suprimido. Ou seja, o tema sequer circular, conforme recomendação do analisariam os itens que não obtiveram
conseguiu chegar à plenária final. Corpo de Bombeiros. Deficientes visu- mais de 70% dos votos (tanto para
Apesar da maratona de quatro ais tinham dificuldade de acompanhar manutenção como para supressão) em
dias, os delegados não pareciam os trabalhos. De novo, Júnior teve pelo menos seis das 10 plenárias.
cansados: a agitação tomou conta do que intervir — como fez toda vez que No Eixo 1, eram nove nessa
auditório e obrigou a mesa a pedir surgiram problemas. situação, incluindo a da descrimi-
nalização do aborto. A proposta foi
destacada e, apesar de se tratar de
assunto polêmico, a plenária votou
contra a necessidade de defesa. Sem
debate, restou ao movimento femi-
nista ver muitos homens decidirem
pela supressão do texto, aos gritos de
“Sim à vida!”, “A vida venceu!”
Concentradas no meio da plená-
ria, as feministas viram-se esmagadas
por reliogiosos e conservadores,
organizados a sua volta. Foram
totalmente abafadas as placas que
sustentavam, com as frases “Pela
manutenção da proposta 37” e
“Pelo direito ao aborto” e as blusas
que vestiam com a frase “Uma vida sem
violência é direito das mulheres”.
Uns festejavam, outros protes-
tavam. “No grito, não”, bradou uma
delegada. “Eles ganharam no grito!” Na
A alegria dos religiosos na hora da rejeição do aborto: “Sim pela vida”, gritavam lateral do palco, o secretário-executivo
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da conferência, Clóvis Boufleur, levan- baixa escolaridade e negra. “Religiosos

E m 2005, foram registradas 150 tava os braços pela vitória da igreja, negam que seja um problema de saúde
mortes em decorrência de que distribuía farto material contra a pública porque, para eles, 200 é um
aborto no país, informa Fátima Ma- legalização do aborto. A poucos metros número pequeno”, comentou.
rinho, da Secretaria de Vigilância de distância, o diretor do Departamento No almoço, começaram os primei-
em Saúde. O DataSUS calcula 96. de Ações Programáticas e Estratégicas do ros protestos exigindo debate na ple-
A diferença no número deve-se ao Ministério da Saúde, Adson França, que nária final. No restaurante improvisado
fato de que o DataSUS leva em con- coordena o Pacto Nacional pela Redução no centro do pavilhão, 15 jovens circu-
ta apenas a causa básica das mor- da Mortalidade Materna e Neonatal, criti- laram com adesivos em forma de cruz
tes, enquanto a secretaria analisa cava o resultado e a ausência de debate. sobre a boca, segurando cartazes nos
todo o atestado de óbito. Em 2006, “A essa altura, depois de três dias de dis- quais se liam frases como “Novo debate
houve 232.716 internações por cussão, não haveria mudança significativa só daqui a quatro anos; vai esperar?”,
gravidez terminada em aborto, o de opinião”, alegou Clóvis. “A conferência não é viagem nem folia;
que corresponde a 10% das interna- De acordo com Adson, a decisão sem debate não há democracia” e “O
ções de mulheres (excetuando-se foi muito disputada, por isso, merecia SUS não se faz sem debate”.
partos). Desse número, estima-se contagem dos votos. “Havia um grupo
que 3 mil tenham sido por abor- de pessoas contrárias à medida sentado JORNADA NOITE ADENTRO
tos provocados. Esses dados não estrategicamente nas cadeiras mais O relógio marcava quase 3 da
costumam ser divulgados pelo próximas ao palco”, desconfiou. Mesmo tarde e a movimentação pós-almoço no
risco de punição às pacientes (um com a supressão da proposta, disse, o auditório crescia. Enquanto os borrifa-
deputado do DEM, ex-PFL, já pediu governo segue reafirmando que o aborto dores de água amenizavam o calor e a
a lista de nomes dessas mulheres é um problema de saúde pública, já que pouca umidade de Brasília, a plenária
para levá-las à prisão). mata 200 mulheres por ano no país, a aguardava o início dos trabalhos ao som
maioria com baixo rendimento familiar, de música popular brasileira. “Bobeira

ENTREVISTA

Armando Raggio

“Fomos fiéis aos textos”


não considerou sua proposta contem- Os próprios delegados concorda-

O relator-geral da 13ª Conferên-


cia, Armando Raggio, conta
nesta entrevista como foi o
plada no relatório pôde ser informado
em qual item foi incluída, já que o
sistema permite rastreamento.
ram em não discutir vírgulas, tempos
verbais, e sim a essência das propos-
tas. O modelo aumentou a possibili-
complexo trabalho da rela- O grupo que formulou o texto dade de se debater profundamente os
toria, que reduziu as 5 mil sobre aborto em São Paulo, por temas da saúde. Mas fomos questio-
propostas vindas dos estados exemplo, questionou a omissão nados sobre isso. Respondi que o bom
às 588 do relatório consoli- da palavra aborto na proposta garantido é melhor que o ótimo que
dado, e responde às queixas 37 do Eixo 1 e, então, corri- compromete o andamento da confe-
sobre a falta de debate. Em gimos. É um risco, não houve rência. A lapidação dos textos pode
sua avaliação, os relatores intenção deliberada. vir depois, com uma edição correta,
foram fiéis aos textos. sem alterar o que aprovaram.
Algumas propostas eram lon-
Como foi o trabalho de consolidação gas, com assuntos diferentes, como O sistema informatizado vai mesmo
do relatório da etapa nacional? a 18 do Eixo 1: agricultura familiar, antecipar o lançamento do relatório
Foi o desafio mais desproporcio- fitoterápicos, terapias alternativas e final, levando-se em conta que o da
nal que eu, o Ronald Ferreira, a programa do leite. 12ª demorou um ano?
Gysélle Saddi Tannous, [os três Neste e em outros casos, o pres- Nosso plano é ter o relatório
coordenadores da relatoria] e suposto era o mesmo. Evidenciamos o no dia seguinte à plenária final [o
os demais relatores já enfren- que era comum, e nenhuma delegação que não foi possível], o que será
tamos: reduzir as mais de 5 mil reclamou do comprometimento do um ganho muito grande, já que
propostas aprovadas nas etapas mérito. As junções não foram mutila- aumenta a chance de as propostas
estaduais a 588. Só conseguimos graças doras, nem abalaram as propostas. terem efeito imediato. A demora na
à formação da relatoria, com repre- divulgação compromete a conjuntu-
sentantes de todos os segmentos do A 13ª vetou a mudança e a supressão ra — daqui a um ano provavelmente
CNS e também dos estados. Discutimos parcial de propostas, o que agilizou a não estaremos mais discutindo
categorias, sistemática, tudo para ser- votação, mas gerou reclamações por a regulamentação da EC 29, por
mos fiéis aos textos. Um delegado que “esfriar” o debate. O Sr. concorda? exemplo. (B.C.D.)
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é não viver a realidade / E eu ainda


tenho uma tarde inteira”, cantava
Cássia Eller no telão, acompanhada em
uníssono pela plenária ruidosa, ansiosa
pela votação do Eixo 3, que viria a se-
guir — a ordem foi modificada, já que
a relatoria ainda preparara o texto com
as propostas inéditas do Eixo 2.
Muita gente aproveitava a últi-
ma chance para registrar presença
no evento. Seguranças e bombeiros
viraram fotógrafos: delegados ex-
perimentaram sentar-se à mesa dos
trabalhos e levaram ao palco suas
bandeiras estaduais e municipais.
Os flashes guardavam a memória do
congraçamento e da pluralidade de
sotaques, garantindo uma lembrança
digital do maior e mais democrático
evento da saúde pública do país. Na aprovação da proposta que condenou a hemofobia, muita alegria no auditório
Somente às 15h40 recomeçaram
os trabalhos e, tão logo a mesa se CNS, lembrando o esforço que a rela- 30, que pedia um projeto de lei proibindo
posicionou, surgiram os manifestantes toria fazia, naquele momento, para a terceirização. A disputa foi acirrada, e a
do almoço exigindo “destaque com sistematizar as 199 propostas do Eixo mesa decidiu contar os votos. Enquanto
debate”. A manifestação se organizou 2 e as 150 moções, que ainda seriam isso, até o Hino Nacional foi cantado.
em apoio a recurso apresentado à votadas na seqüência. Mais um atraso de 45 minutos.
mesa, para que as proposições inédi- Ele reconheceu as falhas de mé- O relógio já marcava 23h40 quan-
tas fossem debatidas antes de vota- todo, mas defendeu a necessidade de do nova confusão se estabeleceu. Um
das. A plenária, no entanto, rejeitou. que os trabalhos continuassem, “para pequeno grupo, no fundo do auditório,
A mesa começou, então, a votar as que não paire em nenhum de nós a des- seguidamente pedia destaque para
propostas em clima acelerado. confiança de que não há democracia”. qualquer proposta apresentada. Os
A esta altura, Júnior já revia a Os gritos ressurgiram: “Pede ajuda à ânimos se exaltaram quando, a vota-
previsão de término dos trabalhos, igreja! Pede ajuda à CNBB”, vocifera- ção do Eixo 3 próxima do fim, o grupo
às 22h para uma longa jornada até a va uma manifestante do movimento pediu destaque para a proposta nº 160
madrugada. Somente às 5 da tarde co- feminista. A votação do Eixo 3 acabou — que garantia atendimento oftalmo-
meçou a votação dos destaques do Eixo às 7 da noite, quando a plenária optou lógico a crianças entre 6 e 14 anos na
3, em meio a nervosos protestos que por uma pausa para o jantar. rede pública de ensino fundamental: a
exigiam, mais uma vez, a discussão das O reinício das atividades só aconte- plenária enfurecida exigiu que o autor
propostas. O barulho e a movimenta- ceu duas horas depois, com o auditório defendesse seu destaque.
ção dos insatisfeitos inviabilizaram o parcialmente esvaziado. Por sugestão da O rapaz atravessou trêmulo o
trabalho. O grupo exigia aos gritos a mesa, os participantes decidiram mudar salão — que neste momento estava
substituição da mesa. Júnior reapare- o sistema de avaliação das 199 propostas, quase lotado, novamente — e se dirigiu
ceu após 15 minutos de paralisação: já votando os destaques no momento em à frente da plenária, onde foi cercado
“Quero conversar um pouco com vocês que eram apresentados. Tudo correu em por seguranças. Uma minoria exaltada
aqui”, contemporizou o presidente do relativa tranqüilidade até a proposta nº ameaçava agredir o delegado, que nem
usou o microfone. Com um gesto, reti-
rou o destaque e foi “escoltado” para
fora, sob vaias. A votação do Eixo 2 foi
encerrada à meia-noite, quando a ple-
nária optou por continuar os trabalhos,
a despeito do café servido do lado de
fora: os grupos saíam para pegar seu
lanche e voltaram ao auditório. Entre
uma mordida e outra, ainda se ouviam
comentários com insinuações: “Eles
mudaram a ordem para tentar
emplacar a fundação estatal...”
Pouca gente conseguiu
acompanhar a votação das mo-
ções. Em ritmo veloz, as 105
propostas de apoio e repúdio
foram apresentadas fora da ordem
numérica, e assim muitos delegados
não achavam o texto na lista. Às
duas da manhã, a maior conferência
nacional de saúde da história, final-
O protesto dos “sem-debate”, do restaurante à plenária final: maioria rejeitou discussões mente, terminava.
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ENTREVISTA

Telia Negrão

“A conferência adiou o
debate, mas ele voltará”
Sem dúvida é um avanço o reco-

A 13ª Conferência Nacional de Saúde


rejeitou a proposta de descrimi-
nalização do aborto. Na Câmara dos
nhecimento das parteiras, na medida
em que a Rede Feminista implementa
uma longa luta pelo resgate do saber
Deputados, onde proposições sobre das mulheres sobre a saúde e a excessiva
o tema tramitam há 16 anos, o enge- medicalização que caracteriza os últi-
nheiro hidráulico Jorge Tadeu Mudalen mos dois séculos no mundo. As parteiras
(DEM-SP), evangélico que preside a Co- possuem um saber próprio e cumprem
missão de Seguridade Social e Família, um papel fundamental, especialmente
apresentou em novembro parecer pela em regiões onde o acesso das mulheres
rejeição do Projeto de Lei 1.135/91, ao sistema de saúde é difícil. Dar-lhes A.D.
dos ex-deputados petistas Eduardo as condições de trabalho, de elevação
Jorge e Sandra Starling, que revoga o de sua qualidade técnica e de segu-
artigo 124 do Código Penal — detenção rança para atuar é fundamental. Mas,
de um a três anos para a gestante que de fato, não basta. A CNS infelizmente
provocar aborto ou consentir que outro teve uma composição desfigurada,
o faça. O relator da matéria também construída sob a influência dos setores
pediu a rejeição do Projeto de Lei da igreja católica, evangélicos etc.
176/95, de José Genoino (PT-SP), que
permite o aborto até o 90º dia de gravi- Para decidir sobre questões que A causa das mulheres é histórica,
dez e obriga a rede hospitalar pública competem ao Estado... é uma marca do século passado e ainda
a realizar o procedimento. Para decidir sobre os rumos do hoje se constitui num ponto de conver-
Nesta entrevista, a secretária- sistema público universal de saúde, gência e divergência de muitos setores
executiva da Rede Feminista de Saúde, que por si só já diz que é laico. Mui- da sociedade. Tem não mais de 30 ou 40
Telia Negrão, jornalista e mestre em tos setores se esqueceram de que a anos a idéia de que as mulheres são su-
Ciência Política, avalia esse mau mo- democracia se fundamenta, entre os jeitas de direitos humanos, e apenas em
mento para o movimento das mulheres, muitos pilares, na liberdade religiosa 1993 as Nações Unidas reconheceram
mostra o quanto é extensa e profunda e no Estado laico. Estas pessoas se isso numa Declaração, a de Viena. Vive-
a invisibilidade das mortes por aborto esqueceram de separar as duas coisas mos ainda numa sociedade de profundas
e conta que viu na 13ª um fato “gravís- e estão tentando impor a todos e raízes patriarcais, que a todo momento
simo”: setores católicos e evangélicos todas nós uma concepção religiosa de busca deslegitimar e desqualificar as
impondo uma concepção religiosa de Estado, que se baseia na negação de mulheres, seus movimentos e, em es-
Estado, baseada na negação de direitos direitos, em lugar da sua afirmação. pecial, o movimento feminista. Não há
em lugar de sua afirmação, com apoio Me preocupa muito que estes setores dúvida de que o movimento de mulhe-
de ativistas de sindicatos — “esses de- tenham se unido a ativistas de sin- res é muito menos numeroso do que a
legados têm bases e serão cobrados”, dicatos, por exemplo, para derrotar Igreja Católica, porque enquanto esta
afirma —, tudo para derrotar um propostas construídas pelo movimento realiza sua ação ao sedimentar dogmas
ponto capital da agenda históri- de mulheres ao longo de décadas. Para construídos há séculos, o movimento
ca do feminismo. Telia, contudo, mim, isso é gravíssimo. de mulheres faz o caminho inverso, na
é otimista: “A conferência adiou desconstrução desses velhos paradigmas
o debate por mais um tempo, Após a 12ª, a Radis publicou matéria e na busca de novos valores.
mas ele voltará.” sobre a postura da Pastoral da Crian-
ça, organizada como um “partido”, Como avaliar os gritos de “venceu a
Uma delegada avaliou que houve derrotando as feministas em vários vida” na plenária final, como se os
“avanços” na 13ª para a mulher, pontos. Isso ficou ainda mais eviden- demais fossem adeptos da morte?
como a recomendação de que par- te na 13ª. As feministas deveriam ter É muito fácil jogar com as pala-
teiras sejam consideradas agentes se organizado melhor este ano, feito vras numa sociedade cuja tradição,
de saúde. Isso basta? alianças, como a Pastoral? desde a chegada dos portugueses, foi
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calcada na fé cristã, igualando a luta fala em milhares, o Datasus informa submeter ao senso comum aquilo que
das mulheres pela sua autonomia no 96 mortes em 2005, os conserva- cabe apenas à mulher opinar e decidir.
exercício da sexualidade e da reprodu- dores afirmam que não é questão Trata-se de um direito. Obviamente
ção a assassinatos. O difícil para esses de saúde pública por se tratar de isso implica vivermos numa sociedade
setores é responder, sem desqualificar “poucas mortes”. Não é importante democrática, que reconhece direitos
as mulheres e os profissionais de saúde aclarar esses números? humanos, reconhece o direito das mu-
que têm postura mais democrática, so- Os números sobre morte materna lheres à autonomia, reconhece os direi-
bre as mortes maternas provocadas por e aborto serão sempre contestados tos sexuais e os direitos reprodutivos.
abortos clandestinos e inseguros, sobre porque é um fenômeno invisibilizado e Sabemos que este é um tema bastante
as gestações impostas pela violência se- naturalizado. Morrer de morte materna difícil de ser debatido, e também que
xual dentro de casa por maridos e com- faz parte da missão sagrada das mulhe- uma consulta à população pode trazer
panheiros agressores. Para eles — que res de dar a vida para proporcionar vida resultados surpreendentes, pois o voto
se dizem defensores da vida, e para nós a outro. E depois não se trabalha com é secreto.
são os pró-morte —, a vida das mulheres estatísticas, senão com estimativas, pois
não tem nenhum valor. Quanto aos ou- há subnotificação. Há, por exemplo, di- Os conservadores afirmam que a
tros setores, sabemos que sua intenção vergência quanto à magnitude do aborto maioria é contrária...
era buscar apoio onde houvesse para no Brasil, cujas estimativas oscilam de 1 Segundo pesquisas realizadas mui-
derrotar uma proposta do governo, e milhão e meio de abortos a 800 mil. Já to recentemente, entre aquilo que os
para tanto passaram por cima de uma as mortes maternas, numa média, ficam católicos fazem e o que eles dizem que
agenda histórica do feminismo. Mas em 55 a cada 100 mil nascidos vivos, ou fazem há uma distância muito grande.
isso deverá passar por uma reflexão, seja, mera estimativa, não a partir do Daí porque a própria Igreja Católica foi
com certeza, pois esses delegados têm número de mulheres em idade fértil, mas contra a idéia do plebiscito. Mais inacei-
bases e serão cobrados. pelo número de bebês que nasceram. tável para nós é fazer uma consulta sobre
As mortes por aborto constituem da este tema ao lado do casamento entre
As perspectivas de legalização do aborto primeira (Salvador) à quarta causa (na- homossexuais, minoridade penal, des-
estão mais distantes depois da 13ª, ainda cional) de morte materna. No entanto, criminalização das drogas... a sociedade
por cima com o parecer do Mudalen? as mortes maternas no Brasil são ainda não teria condições sequer de formar
Serão tempos difíceis pela frente? desconhecidas quanto ao seu verdadeiro uma opinião. Esta situação é diferente da
Os tempos nunca foram fáceis para número porque não se computam dados de Portugal, onde, apesar de o resultado
as mulheres e no ano de 2007 também de mulheres que morrem em zona rural, do plebiscito ter sido contrário ao aborto,
não foram, pois a presença do papa floresta, sertão, fronteiras etc., mesmo por abstenção, o país era um dos últimos
reforçou o conservadorismo de muitos fazendo-se a correção, e os registros de da Europa a não adequar sua legislação
setores da sociedade, que se sentiram causa mortis são camuflados. As mulhe- sobre direitos sexuais e reprodutivos, ou
com legitimidade para ameaçar os di- res morrem por aborto (hemorragias, seja, estava mais atrasada em termos
reitos humanos das mulheres. No Estado infecções, falência geral dos órgãos) e de costumes. Foi por isso que o gover-
brasileiro temos áreas extremamente in- registra-se como causa não o aborto, mas no, mesmo sem o apoio do plebiscito,
fluenciadas pelas idéias religiosas, entre a causa final. Sendo assim, os números legalizou o aborto, para elevar Portugal
os quais o Judiciário e o Legislativo em só podem ser maiores, nunca menores à condição de país moderno, civilizado,
todos os níveis. A votação na conferência quando se trata de morte por aborto. que respeita os direitos humanos.
adiou o debate por mais um tempo, mas
ele voltará. De mais a mais, o Brasil Até quando aborto vai ser questão

Esses
é signatário de convenções e tratados de opinião neste país?
internacionais nos quais se compromete Não se trata de opinião, pois
com a descriminalização do aborto. A posso ser favorável ao aborto e nunca

delegados
39ª Sessão da Convenção Cedaw sobre a fazê-lo e ser contra e precisar dele
eliminação das discriminações contra as e realizar a interrupção. O aborto é
mulheres recomendou mais uma vez que o uma questão de saúde pública, de

têm bases
governo tome medidas concretas, isso foi justiça social e de direitos humanos.
reafirmado pela 2ª Conferência Nacional Enquanto os setores conservadores
de Políticas para as Mulheres. continuarem mandando neste país, será

E o parecer do Mudalen, que promo-


veu tantas audiências públicas com
e serão a opinião predominante. Os meios de
comunicação podem jogar um papel
transformador, ao lado dos segmentos
especialistas e depois se decidiu pela
rejeição com argumentos religiosos?
Ninguém esperava outra posição,
cobrados da sociedade que se baseiam no para-
digma dos direitos humanos. O direito à
autonomia em relação ao corpo
ele é um fundamentalista e seu parecer é um conceito fundamental, no
é uma confissão de que não respeita a entanto fundamentalistas de
Constituição brasileira. O último pará- E quanto a um eventual plebiscito? todo o mundo, do Islã ao Brasil,
grafo é uma peça religiosa. Ele se esque- Leigos podem opinar nesse caso? insistem em que não. Preferem
ceu de que foi eleito para legislar em A escolha de um plebiscito como estuprar as mulheres para que
nome de todas as mulheres, e não para caminho para o debate de grandes elas não cheguem virgens ao céu, que
as pessoas de seu credo religioso. Sua temas na sociedade é um excelente ins- elas morram antes de salvar suas vidas
postura não dignifica o Parlamento. trumento. Ocorre que, em se tratando e sejam condenadas a ter filhos que
do aborto, este é a priori um assunto não desejam. Essa é a justiça que os
Outra questão é o número de mortes que envolve a decisão das mulheres fundamentalistas conhecem. Esta não
de mulheres por aborto. O ministro sobre seus corpos, ou seja, não se pode nos serve, definitivamente. (M.C.)
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serviço

EVENTOS ensino e na pesquisa, indicadores de esses anos, teve sua organização e


morbimortalidade, de cobertura, de funcionamento pautados por normas
Conferência Mundial sobre gestão e de implementação de ações operacionais editadas pelo Ministé-
o Desenvolvimento de Cidades programáticas, como também de rio da Saúde, que privilegiaram o
educação, formação e capacitação financiamento e não a primazia do
de recursos humanos, diretrizes interesse e da satisfação do usuário”,
curriculares, mudanças no ensino salientam os autores na chamada do
médico, entre outros. livro. Outro ponto destacado nessa
obra, publicada pelo Instituto de
Data 1º a 4 de maio Direito Sanitário Aplicado (Idisa) e
Local Centro de Convenções do Ceará, o Conselho Nacional de Secretários
Fortaleza Municipais de Saúde (Conasems), é

S ob o tema Inovação democrática e


transformação social para cidades
inclusivas no século 21, o evento tem
Mais Informações
E-mail congresso2008@sbmfc.org.br
a falta de regulamentação de temas
fundamentais para a organização do
SUS, como padrão de integralidade
como objetivo captar iniciativas de Site da assistência, acesso regulado e
inovação democrática e transfor- www.sbmfc.org.br/congresso2008/ inovação tecnológica.
mação social que vêm surgindo nos
últimos anos. Propõe quatro eixos de INTERNET
debate: Direito à cidade; Governança Saúde mental
e democracia em cidades; Desenvol- PAC da Saúde
vimento local; e Sustentabilidade Um manual para
e cidade-rede. A conferência, pro- o Caps: Centro de
movida pelas prefeituras de Porto Atenção Psicos-
Alegre e Roma (Itália), o Ministério social, organizado
das Cidades e o governo do Rio Gran-
de do Sul, entre outras entidades,
tem como foco gestores públicos
O Ministério da Saúde dedicou
amplo espaço na internet ao
Programa Mais Saúde — Direito de
por Antonio Reinal-
do Rabelo, Anne
Alice Quaresma
(prefeitos, vereadores e operadores todos, lançado oficialmente no dia 5 Mattos, Domingos
de políticas públicas), acadêmicos de dezembro de 2007 pelo presiden- Macedo Coutinho
e especialistas, lideranças comuni- te da República. Localizadas no por- e Nelson Nunes Pereira, expõe os con-
tárias, promotores governamentais, tal da Biblioteca Virtual em Saúde ceitos teóricos e técnicos relacionados
empresariais e sociais. (http://bvsms.saude.gov.br/html/ à prática desses centros voltados para
pt/home.html), as páginas contêm o cuidado de pessoas com transtornos
Data 13 a 16 de fevereiro pilares e diretrizes do plano e docu- mentais. O livro, publicado pela Edi-
Local Centro de Eventos da PUC-RS, mentos básicos e de referência, que tora da Universidade Federal da Bahia
Porto Alegre incluem legislação correlata, pactos (Edufba), é um manual que procura
pela saúde e conferências, além de conciliar fundamentações teóricas,
Mais informações notícias e links. diretrizes e rotinas de procedimentos
Tel. (51) 3228-6388 técnicos e de gestão, além de fazer
E-mail: eventos@felliniturismo.com.br Site http://bvsms.saude.gov.br/bvs/ avaliação e crítica de algumas ativi-
Site www.cmdc2008.com.br pacsaude/ dades relacionadas ao Caps.

PUBLICAÇÕES
9º Congresso Endereços
Brasileiro de Gestão em saúde
Medicina de Edufba
Família e SUS: o espaço da Livraria 1: Rua Augusto Viana,
Comunidade gestão inovada Canela, estacionamento da
e dos consensos Reitoria da UFBA, Salvador

A nona edição do evento propõe o


tema Importância da Medicina
de Família e Comunidade e da Saúde
interfederativos.
Aspectos jurídi-
cos, administrati-
CEP 40110-060
Tel./fax (71) 3263-7075 / 6160
E-mail: edufba@ufba.br
da Família para a saúde do Brasil. vos e financeiros, Site www.edufba.ufba.br/
O objetivo é ressaltar o potencial de Lenir Santos e lancamentos.html
que tem a Estratégia de Saúde da Luiz Odorico Mon-
Família na atenção básica e dis- teiro de Andrade, faz uma análise Idisa
cutir como qualificar ainda mais a crítica da organização do SUS pautado Tel. (19) 3289-5751
assistência e o cuidado em saúde. O pelo financiamento e propõe novos E-mail idisa@idisa.org.br
congresso enfatizará o impacto da paradigmas político-administrativos Site www.idisa.org.br
Saúde da Família na assistência, no para operá-lo. “O SUS, durante
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Pós-tudo

Um confronto anunciado
farmacêutico e líder lemas não resolvidos, por exemplo,
sindical potiguar Fran- na promoção de falsas expectativas
cisco Batista Junior. nos participantes dos conselhos de
Os vários conse- saúde quanto a um suposto poder
lhos de políticas sociais autônomo de decisão sobre a política
existentes no Brasil de saúde, bem como na constituição
(além da Saúde, Edu- dos conselhos como meros fóruns de
cação, Meio Ambiente, debates focados na ideologia, no cor-
Criança e Adolescente, porativismo e no partidarismo. O que
Previdência Social, Di- eles deveriam ser de fato: organismos
reitos Humanos, Desen- de formulação, apoio e sustentação
volvimento Social e outros) têm como estratégica de políticas de interesse
Flavio Goulart* aspectos comuns a vinculação ao Poder coletivo, necessariamente vinculados
Executivo, com a presidência exercida ao Estado. Assim, resta uma grande

H
á alguns meses, publiquei pelo ministro ou dirigente de confiança distância entre o idealizado e o real,
no Correio Braziliense um deste, o estatuto de política de governo, ou entre o ideológico e o jurídico-
artigo no qual alertava os atributos de instância de consulta, administrativo e essas disjunções
para problemas relativos acompanhamento e formulação de polí- acarretam enormes prejuízos para as
aos conselhos de saúde implantados ticas, com o poder deliberativo atrelado práticas de participação em saúde.
no país pela Lei 8.142/90, ou seja, de a diretrizes previamente estabelecidas Corajoso, mais uma vez, foi o
que estariam abrigando uma espécie em leis e normas. A saúde se configura ministro Temporão, que em outro
de quarto poder, ao arrepio das leis vi- como exceção, não só por ter a presidên- momento enfrentou dogmas religiosos
gentes, bem como sobre o surgimento cia exercida por um ator externo, mas e agora se dispõe a resistir a dogmas
de certas tendências preocupantes, também por sua paridade auto-regulada, corporativos, ao sugerir ao farmacêu-
por exemplo, sua transformação em pela escolha direta de conselheiros a tico Batista Junior que sua vontade de
meros fóruns de debates, sua “parla- partir das bases, e por um forte discurso criar leis seja canalizada através de
mentarização”, a profissionalização de autonomista, que se estende até mesmo um cargo no Legislativo. Afinal, o ver-
seus conselheiros, além de uma inédita à reivindicação de autonomia orçamen- dadeiro e final poder de deliberação é
e radical auto-regulação. tária e administrativa. atributo do Executivo, como afirmam e
A matéria do dia 17 de novembro, Batista Junior declara sua oposi- reafirmam as leis. Isso não impede que
neste mesmo jornal, intitulada “Troca ção ao projeto do Ministério da Saúde outras tarefas, também nobres, possam
de farpas entre Temporão e CNS” veio que cria as Fundações Estatais de e devam ser assumidas pelos conselhos,
demonstrar que as preocupações mani- Direito Privado. Até aí, nada demais, de acordo com o que está referido na
festadas no texto anterior não só eram seria um direito seu, como cidadão. Resolução 333 do próprio CNS: formular,
procedentes, como já se prenuncia O problema é que, no caso, ele está mobilizar, fiscalizar, discutir, opinar,
uma era de confrontos entre o Execu- inserido na máquina governamental, propor, exercer visão estratégica.
tivo e o Conselho Nacional de Saúde. como dirigente de um órgão que se Há novos tempos na saúde e
Falo das duas entidades como perten- situa, de fato e de direito, na esfera a sociedade brasileira deseja mu-
centes a esferas distintas — o que não do Executivo. Também não haveria danças. É preciso ultrapassar os
é verdade — apenas para reforçar o nada demais em sua opinião, se ela movimentos puramente ideológicos,
que a realidade vem demonstrando, não refletisse um viés sindicalista e típicos (e necessários) nos anos de ar-
por exemplo, com a emergência do corporativista, o que, aliás, tem preva- bítrio, em direção à ação política não
atual conflito, que talvez seja apenas lecido nas discussões sobre o referido mais num ambiente de competição
o primeiro de uma longa série. projeto, longe, portanto, do interesse partidária e ideológica e de temor
O CNS tem uma prerrogativa pra- maior da sociedade brasileira, à qual, de conspiração, mas de construção
ticamente exclusiva quando comparado por princípio, um presidente de con- solidária do bem comum.
aos demais conselhos de políticas sociais selho nacional deveria
no Brasil: sua presidência não é exercida estar atento.
por um ator governamental, do estatuto Seriam essas
de um ministro de Estado ou de um prerrogativas e este
funcionário graduado, mas sim por uma ineditismo de práticas
liderança da sociedade civil, no caso o vigentes no CNS van-
tajosos para a área da
saúde? Não necessaria-
* Médico, doutor em Saúde Pública, profes-
sor-titular (aposentado) da Universidade de mente. Se há avanços
Brasília (UnB); texto publicado no site do na participação em
Cebes em 26/11/07 (www.cebes.org.br/) saúde, há também di-

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