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A GESTÃO INTEGRADA DA ÁGUA E DO SOLO COMO SUPORTE DA

SUSTENTABILIDADE DA PAISAGEM DO BAIXO VOUGA LAGUNAR

Maria Teresa Andresen* José Manuel Gonçalves** Maria José Curado***


*Departamento de Botânica, Faculdade de Ciências, Universidade do Porto
** Escola Superior Agrária de Coimbra
***Departamento de Ambiente e Ordenamento, Universidade de Aveiro

Resumo
A comunicação baseia-se em conclusões de um Estudo de Impacto Ambiental associado ao Projecto de infra-
estruturas primárias e de emparcelamento no Baixo Vouga Lagunar, situado na Ria de Aveiro, na zona centro do
litoral português. Destaca-se a importância de dois factores estratégicos para a conservação e reabilitação da
paisagem - a água e o solo - e defende-se um modelo de gestão do agroecossistema baseado numa estratégia
integrada que assegure a sustentabilidade do Baixo Vouga Lagunar.

O Baixo Vouga Lagunar é uma paisagem cultural com um elevado interesse conservacionista, que está integrado
na Zona de Protecção Especial da Ria de Aveiro. Porém, o agroecossistema encontra-se em regressão e os
proprietários reclamam as terras entretanto salinizadas, mediante a gestão da entrada da água salgada. Apresenta-
se o plano de monitorização e gestão da água e do solo que, por sua vez, sustenta o plano de monitorização e
gestão da diversidade biológica e da paisagem, a serem implementados com o início da execução dos projectos.

1. Introdução

O Baixo Vouga Lagunar é um agroecossistema de grande vulnerabilidade onde a gestão da


água e do solo se revelam estratégicos para assegurar a manutenção de um sistema criado pelo
homem na interface terra/água e onde, logo, a diversidade biológica tem uma expressão
singular. Localiza-se na zona centro do litoral de Portugal, inserido na ria de Aveiro que por
sua vez está classificada como Zona de Protecção Especial (Fig. 1). Faz parte do Plano de
Bacia Hidrográfica do Rio Vouga e portanto uma solução para a qualificação da água nesta
bacia passa naturalmente por um modelo de gestão sustentável no Baixo Vouga Lagunar.
Considera-se assim que os conteúdos dos planos de monitorização aqui apresentados
constituem um contributo significativo para a definição do programa de medidas a elaborar
para esta bacia ao encontro dos objectivos ambientais preconizados na Directiva Quadro da
Água (Directiva 2000/60/CE).

A água é um elemento marcante na génese e na dinâmica do Figura 1 – Localização do


Baixo Vouga Lagunar. Foi protagonista na criação do solo, Baixo Vouga Lagunar
formado a partir de material sedimentar relativamente recente,
de origem predominantemente fluvial depositado em ambiente
estuarino. As inundações são eventos frequentes, havendo
registo de acontecimentos dramáticos com perdas de vidas e de
colheitas e a destruição de infra-estruturas. A água salgada da
ria torna o solo agrícola susceptível à salinização. A água é
sustento permanente da fertilidade e vitalidade da terra. A
escassez hídrica estival é superada pela água doce derivada das
linhas de água, recorrendo a estruturas de hidráulica mantidas e
operadas pelos agricultores. A água também suporta a
circulação de barcos nos esteiros, um meio de transporte de
extrema importância na zona em tempos passados.

O Homem estabeleceu com a água laços peculiares de profunda


intimidade. A busca da sobrevivência levou as populações locais a adaptarem-se aos
condicionalismos hidrológicos, desenvolvendo uma cultura própria. E, na medida das
possibilidades, moldaram o meio físico lagunar, regendo o escoamento e subordinando a
água à manutenção da produtividade da terra. Deste equilíbrio, experimentado com a vida e o
engenho de muitas gerações de agricultores, resultou um agroecossistema muito valioso,
dinâmico mas muito instável.

Água, solo e Homem são o trinómio referencial da vitalidade do Baixo Vouga Lagunar,
responsável por uma paisagem com um carácter singular e de uma excepcional valia sob o
ponto de vista de produção de biomassa e da diversidade biológica.

O estado de degradação atingido pelo Baixo Vouga Lagunar, principalmente em resultado da


intrusão salina, da destruição e do envelhecimento das infra-estruturas, tais como diques,
valas e caminhos, a dimensão reduzida e inacessibilidade às parcelas agrícolas, determinou a
realização de um Projecto de Desenvolvimento Agrícola que foi sujeito a um processo de
Avaliação de Impacte Ambiental. O respectivo Estudo de Impacte Ambiental, para além das
recomendações inerentes, defende que a sustentabilidade do Baixo Vouga Lagunar deve
contemplar uma estratégia de monitorização integradora da água, do solo, da diversidade
biológica e da paisagem. O presente texto destaca precisamente os aspectos relacionados com
a monitorização da água e do solo.

2. Caracterização breve do Baixo Vouga Lagunar


No Baixo Vouga Lagunar destacam-se três grandes unidades de paisagem, interligadas entre
si por uma densa rede de corredores constituída por esteiros, valas, sebes e caminhos: o
bocage, os sistemas húmidos e o campo aberto (Fig. 2). O carácter destas unidades resulta, em
grande parte, da quantidade e da qualidade da água que, por sua vez, determina a
diversificação das texturas do solo, às quais estão associados diferentes usos de solo e
habitats. Da interacção do homem com as características do clima atlântico - mormente a
intensa relação terra/água, os terrenos suaves de formação recente, a fertilidade dos solos e a
água em abundância - resulta a diversidade e especificidade deste agroecossistema, gerido de
acordo com objectivos de produção e sustentação económica, sob a permanente ameaça das
cheias e da intrusão salina.

O bocage é um habitat raro em Portugal


caracterizado por uma grande densidade de
sebes e parcelas de terreno de pequena
dimensão, logo a sua preservação revela-se
como algo de prioritário e de extrema
importância para a comunidade de aves da
região, bem assim como de mamíferos, anfíbios
e répteis. Nele é possível encontrar grande
densidade de ninhos de aves de rapina.

Os sistemas húmidos possuem também uma


importância elevada que deriva do seu carácter
multi- funcional. A composição e proporção das
diferentes espécies de vegetação variam em
função do gradiente de salinidade que existe ao
longo dos canais, da distância à linha de água e
da topografia do terreno. O juncal e o caniçal
têm uma presença marcante. O juncal que hoje
Figura 2 – Unidades de paisagem
é cortado apenas em pequena escala, está sujeito a um processo regressivo o que põe em causa
a sua existência, devido ao apodrecimento e substituição por outras plantas, num processo
natural. O caniçal surge com o aumento da proporção de água doce, que favorece o
aparecimento de outras plantas. Os sistemas húmidos são importantes nomeadamente para a
migração, nidificação e invernada de um grande número de espécies de aves. A regressão do
arrozal é um factor negativo dada a sua importância enquanto zona de refúgio, alimentação e
nidificação, nomeadamente das aves aquáticas. Os anfíbios são aqui bastante abundantes,
ocorrendo também nas valas, canais e esteiros, onde se regista também a presença de peixes.

No campo aberto obtém-se as mais elevadas produções agrícolas o que confere a esta unidade
de paisagem uma grande importância socio-económica. As culturas predominantes são o
milho, o azevém e as pastagens.

O Baixo Vouga Lagunar é constituído por terrenos muito planos sendo uma zona de
confluência e descarga de várias linhas de água onde o escoamento para a ria é dificultado
pelo efeito das marés. Estas condições naturais explicam, por si só, os problemas de drenagem
que sempre ocorreram nesta área. A necessidade de controlar a adversidade do regime
torrencial nas linhas de água em períodos de cheia e a defesa do solo contra a água salgada
levou à aplicação de técnicas hidráulicas específicas, como o desassoreamento e a limpeza da
vegetação das linhas primárias, a manutenção e conservação de diques para prevenir
inundações e a operação de estruturas tipo comporta para impedir a entrada de água salgada
nas redes secundária de rega e drenagem. O sistema de defesa das marés inclui uma rede de
diques, motas e açudes de verão destinados a impedir a entrada de água salgada e poluída da
ria para montante e a conservação da água doce para rega. Actualmente, os sistemas de
drenagem deparam-se com diversos problemas, nomeadamente as inundações muito
frequentes e descontroladas - criando muitos danos no solo, na rede de drenagem e na rede
viária - dificuldades na efluência para a ria por ineficácia do sistema de drena gem primário e
secundário, e a entrada de água salgada nas redes de valas por deficiência de diques e
comportas.

Os solos do Baixo Vouga Lagunar são predominantemente aluviossolos modernos, por vezes
sujeitos a hidromorfismo e a halomorfismo. Em geral são não calcários húmicos de textura
mediana e ligeira ou não calcários de textura mediana. A matéria orgânica é normalmente
elevada ou média na camada superficial. São regra geral solos ácidos com baixo teor em
fósforo assimilável, de grande espessura efectiva, excelente textura e uma estrutura que lhe
confere uma boa drenagem interna. Estas características permitem uma capacidade de uso
elevada. Dentro dos solos halomórficos os mais representados são os de textura mediana com
salinidade moderada ou elevada, sem calcário. O grau de hidromorfismo é muito variável
sendo mais marcado nas zonas onde a toalha freática está mais próxima da superfície do
terreno durante a maior parte do ano.

As principais limitações do solo à manutenção dos ecossistemas e ao aproveitamento agrícola


relacionam-se com a salinização - devida à intrusão da água salgada na toalha freática,
levando a um aumento da presença de sais na solução do solo - com o encharcamento -
devido às insuficiências do sistema de drenagem, limitando a capacidade de desenvolvimento
vegetal e a lavagem dos sais - e, também, com a acidificação, correlacionada com as práticas
de fertilização orgânica e de oscilação da toalha freática. Em suma, o solo do Baixo Vouga
Lagunar é um recurso escasso, com elevado potencial de fertilidade, mas muito sensível e em
elevado risco de degradação.
A rede de valas constituí um património muito particular cuja função principal é o maneio de
água numa gestão permanente de equilíbrios. Ela é o verdadeiro suporte da dinâmica do
Baixo Vouga Lagunar. É constituída por uma rede, relativamente densa, de canais ou valas
construídas em terra sem revestimento, concebida, conservada e operada pelos agricultores,
que desempenha uma multiplicidade de funções, o que por si só simboliza a originalidade do
Baixo Vouga Lagunar. As valas têm uma função de colectores de drenagem superficial e sub-
superficial e de conduta de água excedente para a rede primária. Com o recurso a açudes
temporários, as valas desempenham também a função de reservatório de água, para além de
canais de rega que transportam água das linhas primárias para os terrenos agrícolas. Mas há
outras funcionalidades das valas também muito importantes, nomeadamente como linhas
divisórias da propriedade rústica, permitindo o desenvo lvimento de sebes que servem de
vedação para os animais e produção de lenha. Suportam um biota aquático com elevada
diversidade faunística. E, finalmente, as valas são vias de comunicação, servindo de
caminhos, caso das secundárias, ou de transporte de barcos, no caso dos canais primários,
designados de esteiros.

A manutenção e conservação desta rede colectiva, que se mantém até à actualidade, foi obra
das comunidades de agricultores que estabeleceram regras e práticas cooperativas de
sustentação deste sistema. Mas a evolução económico-social das últimas décadas tornou a sua
conservação incompatível com os recursos humanos agrícolas, nomeadamente devido à
incapacidade de manutenção das estruturas. O aumento da subida do nível da água salgada na
ria em maré cheia acelerou a degradação das obras tradicionais de defesa das marés, o que
vem gravando esse problema. São também condicionantes actuais do sistema de drenagem a
deficiência da ligação hidráulica entre valas e da dimensão da respectiva secção transversal,
limitando a capacidade de escoamento da água para a rede primária, agravada pela dificuldade
de descarga devido ao nível da água muito elevado por influência das marés.

O fornecimento de água ao Baixo Vouga Lagunar visa a gestão criteriosa da água doce
durante o estio, para permitir o humedecimento adequado do solo - através da rega das
culturas agrícolas e do abastecimento às zonas húmidas - e o controlo da salinização do solo.
A água é proveniente das linhas de água primárias (rio Antuã, algumas pequenas ribeiras e rio
Vouga), através de açudes, temporários e artesanais, bastante ineficientes. O sistema de
transporte e distribuição de água para rega e conservação da natureza utiliza a rede de valas
comum à drenagem. No começo do período estival fecham-se os sistemas de drenagem
secundária para conservação da água doce e impedimento da entrada e avanço da água
salgada. Resulta, assim, uma extensa rede de valas, com função de transporte e reservatório de
água doce, a qual fará a sua distribuição às parcelas. Na parte Norte existe ainda um modelo
tradicional para distribuição colectiva da água gerido integralmente pelos agricultores. O
arroz é cultivado nos terrenos mais baixos onde a água pode escoar por gravidade, regado por
canteiros em submersão permanente, cultivando-se o milho-azevém nos terrenos mais altos,
recorrendo à bombagem a partir das valas, regando-se por aspersão ou por sulcos. Na parte
restante, em particular no bocage, pratica-se a rega subterrânea, usando o sistema de
drenagem para dis tribuir água aos terrenos através do controlo do nível da toalha freática em
posição elevada para humedecimento do solo por ascensão capilar.

Os principais problemas do sistema de fornecimento de água prendem-se com as grandes


deficiências da rede de transporte e distribuição, que conduz a perdas elevadas por evaporação
e percolação, à velocidade de escoamento muito reduzida que implica acréscimos de tempo de
mão-de-obra e à insuficiência da água, especialmente em Agosto, em alguns dos perímetros
(exs: Beduído e Fermelã). Na parcela há algumas limitações derivadas da precaridade dos
sistemas aplicados que resultam na reduzida uniformidade de distribuição da água. A
aplicação da água doce às zonas húmidas faz-se através das valas e da sua distribuição para os
campos. Devido à topografia destes terrenos, estes ficam praticamente submersos sem haver
necessidade de controlo sistemático dos caudais pelos agricultores. A escassez do
abastecimento em determinados períodos leva a deficiências de aplicação na área de jusante,
resultando em maiores problemas de salinização nesta área.

3 . A intervenção preconizada

O Projecto tem como principal objectivo a defesa dos campos contra o efeito destrutivo das
cheias e contra a salinização dos solos, devido ao progressivo avanço das marés. Nas áreas de
uso agrícola visa-se a implementação dum conjunto de melhorias nas infra-estruturas de rega,
drenagem e viárias e a realização da restruturação fundiária. O Projecto compreende as
componentes de defesa contra as marés, de drenagem primária, de estrutura verde principal,
de infra-estruturas rurais secundárias (drenagem, rega e viária) e de restruturação fundiária
(Fig. 3).

O sistema de defesa contra as marés tem por


objectivo impedir a invasão superficial de
água salgada no s campos e o
estabelecimento de uma zona salobra de
interface entre os campos agrícolas e a Ria.
O sistema será composto por um conjunto
contínuo de diques que irá estabelecer a
linha de fronteira. A ligação entre os esteiros
que atravessam esta linha será efectuada por
estruturas hidráulicas constituídas por
comportas de maré, que permitem dar vazão
ao caudal de drenagem transportado pelas
linhas primárias. Por outro lado, estas
estruturas também irão controlar a entrada
de água salgada nos esteiros. Através dos
solos de fundação dos diques haverá sempre
uma entrada de água salgada. Este sistema
será constituído por um conjunto de três
diques intercalados por cinco estruturas
hidráulicas (Rio-Velho, Barbosa, Canelas,
Salreu e Antuã).
Figura 3 – O Projecto

O sistema primário de drenagem tem por objectivo diminuir a frequência das cheias e
minimizar os efeitos nefastos que estas provocam, enquanto no Verão, há que garantir a
recarga de água doce subterrânea. Preconiza-se a manutenção do leito actual das linhas de
água sem rebaixamento e o alargamento apenas nos troços de linhas de água com capacidade
de vazão muito reduzida. Assim, o aumento da capacidade é, em regra, obtido com o
alteamento das margens através do reforço dos diques actuais. No sistema do Vouga procede-
se ao reforço e alteamento do dique da margem direita deste rio, à reabertura de um
descarregador e à instalação de uma estrutura de derivação do Vouga para o rio Velho.
Enquanto no sistema do Barbosa se prevê a derivação de caudais excedentes do rio Fontão,
em período de cheia, para o sistema de drenagem de Canelas, através do esteiro da Linha,
paralelo ao caminho de ferro, e a limpeza do esteiro do Barbosa. Por outro lado, no sistema de
Canelas proceder-se-á ao reforço da capacidade de vazão do esteiro da Linha, limpeza e
regularização das várias linhas de água primárias e também ao reforço do esteiro de Canelas,
para além da remodelação das estruturas de descarga das redes secundárias de drenagem do
esteiro. No sistema de drenagem do Antuã o projecto visa o melhoramento da rede viária e a
implantação de estruturas hidráulicas de dissipação de energia das águas de cheia que irão
inundar os campos com muita frequência, permitindo o seu controlo por forma a minimizar os
danos resultantes.

O projecto prevê ainda a instalação de uma estrutura verde de compartimentação da paisagem,


constituída por sebes implantadas em áreas de domínio público, ou seja, ao longo dos diques
de protecção contra marés, das linhas de água primárias e secundárias e dos caminhos. A
localização das sebes procurará minimizar o ensombramento das zonas de cultivo e as linhas
de água. Além do sistema de sebes, contempla-se a manutenção e implementação de áreas de
bosquetes.

O projecto de infra-estruturas rurais secundárias de rega, drenagem e viária visa a melhoria


das condições de trabalho e de produção agrícola. As infra-estruturas de rega previstas
destinam-se a garantir o acesso à água a toda a área tradicionalmente regada. Este objectivo é
conseguido através da recuperação dos açudes móveis nas tomadas de água existentes nos rios
interiores, complementada com a abertura de novas valas que permitirão uma melhor
distribuição da água, para além de promover a recarga dos aquíferos, por forma a assegurar a
conservação das condições para a existênc ia dos sistemas húmidos. As novas infra-estruturas
de drenagem têm por objectivo racionalizar e repor em funcionamento os sistemas existentes
no interior de cada perímetro. Estas intervenções irão estabelecer os grandes eixos
secundários de drenagem - reduzindo-se o número de comportas para a rede primária - para
além da limpeza e a abertura de novas valas. As intervenções na rede viária visam melhorar as
condições de trânsito e acesso a todos os prédios, através da reabilitação dos caminhos
existentes e da abertura de novos caminhos.

O projecto de restruturação fundiária – que consiste basicamente no redimensionamento da


propriedade rústica, através da junção dos prédios pulverizados por progressivas partilhas
sucessórias e transacções imobiliárias e sem qualquer potencial económico, através da sua
avaliação e re-distribuição com base em dados cadastrais, por forma a viabilizar a
implementação das infraestruturas de apoio e a sua exploração em termos de rentabilidade -
tem por finalidade a redução do número de proprietários em cada perímetro, o aumento das
áreas contíguas de exploração e a eliminação de prédios encravados, sendo que existe uma
diferenciação significativa da intensidade das intervenções. Será mantida e consolidada a
existência de um modelo de sebes heterogéneo e os lotes obtidos terão formas pouco
regulares. Nesta situação, as intervenções na rede viária e de drenagem poderão vir a servir de
propulsor para alertar e motivar agricultores para serem eles próprios a interessar-se e pugnar
pelo emparcelamento das suas propriedades, acelerando assim o respectivo processo.

4. A gestão da água e do solo

A grande susceptibilidade ambiental do Baixo Vouga Lagunar implica que a implementação


das infra-estruturas prevista no Projecto não garante, só por si, o cumprimento dos objectivos
programados. Ao nível da exploração do projecto há, de facto, a necessidade de cumprimento
de um programa de monitorização que contemple um Plano de gestão da água e do solo
(PGAS) e um Plano de gestão da diversidade biológica e da paisagem, naturalmente
complementares entre si.

O PGAS tem por objectivo principal regular a distribuição da água doce, tendo em conta, por
um lado, a natureza estocástica das afluências nas linhas de água e, por outro, a procura
concorrencial nos períodos de escassez de abastecimento entre áreas de produção vegetal de
produção pecuária e de conservação da natureza e ainda monitorizar a intrusão salina, por
forma a garantir o controlo da qualidade da água e da conservação do solo, minimizando os
riscos de salinização e acidificação. O PGAS compreende três componentes:
1) Rede de Monitorização - consiste na recolha de informação de campo através de uma rede
de postos de observação da quantidade e qualidade das águas e de alguns parâmetros do
solo; no processamento de dados, gestão e integração de informação; e, também, o
desenvolvimento de experimentação sobre aspectos específicos dos ecossistemas.
2) Plano de Operação - consiste num plano de operação da distribuição de água, traduzindo-
se na prática num calendário de abertura e regulação das comportas de controlo de
caudais, em resposta ao valor das variáveis de estado do sistema (afluências, procura de
água agrícola e de conservação da natureza); este plano integra a informação sobre a
qualidade da água, pelo que as soluções são concebidas segundo critérios de
sustentabilidade do sistema; inclui também o controlo da entrada de água salgada no
Bloco de acordo com as necessidades das zonas húmidas.
3) Avaliação - consiste em acções de fiscalização, controlo e avaliação de desempenho do
sistema e do próprio plano; a dinâmica do sistema e o aprofundamento do seu
conhecimento requerem a re-alimentação do modelo de gestão, de modo a ajustar as
regras aplicadas no plano operatório; nesta componente deverão participar continuamente
os diferentes intervenientes do sistema (agricultores, ambientalistas, Estado), para ajustar
o PGAS à evolução do agroecossistema, ao longo do tempo de exploração do Projecto.

Centramo-nos, seguidamente, na descrição de algumas características da rede de


monitorização e do plano de operação.

A monitorização da quantidade de água de superfície disponível compreende medições das


disponibilidades hídricas oferecidas pelas linhas de água que abastecem o Bloco no período
estival, da derivação de água para as redes secundárias de valas e da procura de água nas
diferentes áreas dos vários perímetros. Esta monitorização e o respectivo processamento a
tempo real permitirão gerar a informação conveniente e oportuna para a operação das infra-
estruturas hidráulicas, a fim de que a distribuição da água doce contemple e satisfaça com a
maior eficácia os múltiplos objectivos estabelecidos no Projecto.

A monitorização da procura e do abastecimento de água destina-se a determinar as


necessidades de água nas diferentes áreas, ao longo do ano, avaliando as condições do
fornecimento efectuado e prevendo a procura de água no curto prazo. Estes dados, associados
aos da monitorização dos recursos hídricos disponíveis nas linhas principais, permitem
racionalizar a operação do sistema hidráulico de distribuição de água doce. É feita a
inventariação sistemática da ocupação cultural do solo - em cada período de primavera-verão,
por forma a se determinar com rigor a procura de água das áreas cultivadas; observando-se a
profundidade da toalha freática em cada um dos perímetros, através da instalação de furos de
observação com cerca de 2 m de profundidade; esta informação é importante para avaliar a
quantidade de água disponível às plantas por ascensão capilar e para indicar se o fornecimento
de água às valas é suficiente para um pleno abastecimento hídrico das culturas; e sendo feitas
observações meteorológicas, nomeadamente de precipitação e de evapotranspiração.
Os dados das disponibilidades e da procura de água deverão ser processados em tempo real
(passo de tempo do processamento de 1 a 4 dias, dependendo da época do ano), de modo a
permitir estabelecer previsões a curto prazo (1 a 2 semanas) das necessidades de
fornecimento, por aplicação do método do balanço híd rico do solo. Em função da previsão da
procura de água deverá planificar-se a entrada de água nas redes de valas secundárias e a sua
distribuição no interior do Bloco. As situações de carência hídrica deverão ser identificadas,
no tempo e no espaço, devendo ser cuidadosamente aplicadas as regras operativas previstas
no plano de gestão da água para estas situações.

O plano de monitorização da qualidade da água tem dois objectivos fundamentais: confirmar


ou não potenciais impactes em termos de contaminação das águas superficiais e controlar a
salinidade em todo o Bloco. O plano prevê o tipo de impactes que se pretendem monitorizar,
os locais de observação, a periodicidade dos controlos e os métodos de análise. Prevê-se o
controlo do oxigénio dissolvido, da salinidade, de organismos patogénicos, de nutrientes
vegetais e de pesticidas.

O plano de monitorização da intrusão salina prevê a instalação de marégrafos fixos ou


amovíveis, que permitam a avaliação da evolução dos níveis de marés, para avaliação das
alterações e apoio à gestão do sistema de comportas. Esta monitorização deverá ser iniciada
antes da implementação do próprio projecto. Deverão ser realizadas análises de salinidade
junto dos pontos de medição expedita dos vários níveis de maré e a montante e jusante das
comportas de maré. Deverão também ser escolhidos pontos de acordo com outras campanhas
de medição. Todos os resultados da monitorização (níveis e salinidade) devem integrar um
modelo matemático do sistema lagunar.

O plano de monitorização do solo destina-se a observar parâmetros indicadores de


acidificação, salinização e alcalinidade do solo, nomeadamente o pH, a condutividade do
extracto de saturação e a proporção de sódio no complexo de troca. O controlo da evolução da
acidificação será levado a cabo nas zonas mais sensíveis. A evolução da acidificação tem sido
observada nas manchas de potenciais tiossolos no perímetro de Salreu e manchas de solo nos
perímetros de Canelas e Rio das Mós, cujo pH é inferior a 5. Serão também monitorizadas as
manchas localizadas nas zonas mais altas em que seja aplicada a rega por aspersão e onde seja
prática comum a incorporação de matéria orgânica no solo, pois essas condições favorecem
uma rápida mineralização da matéria orgânica e, portanto, uma mais célere acidificação.
Relativamente à salinização, a monitorização será no sentido de verificar se a lixiviação dos
sais, realizada pelas águas das chuvas de inverno, vem sendo efectiva. Em anos mais secos
poderá ser necessário alagar os terrenos com água de origem fluvial para se dar a lavagem dos
sais. Nas zonas mais sensíveis, haverá que dispensar um cuidado acrescido à gestão da toalha
freática, mantendo-a afastada da zona radicular, e evitando a possibilidade de fluxos
ascendentes de água com sais afectarem as raízes. Será o caso das manchas que se estendem
pelo limite poente, desde o perímetro da Longa ao esteiro de Estarreja e que apresentam
salinidade elevada.

O plano de operação da gestão da água pressupõe que as afluências disponíveis para


abastecimento de água não garantem um pleno fornecimento no período crítico estival nos
anos mais secos, em particular do rio Antuã, resultando numa inevitável escassez hídrica em
determinadas zonas do bloco. Por isso, deverá ser salvaguardado o abastecimento Baixo
Vouga Lagunar por água do rio Vouga - em particular, nos anos mais secos, quando as linhas
afluentes escoam no verão caudais mais reduzidos - para se garantir uma regularidade na
produção agrícola, na conservação das zonas húmidas e na prevenção do problema da
salinização do solo.

A limitação no abastecimento obriga a que a exploração do Projecto seja feita com muito
rigor, cabendo ao PGAS o estabelecimento do modo operativo que optimize o uso da água
nos períodos de escassez. As medidas a aplicar consistem na optimização da eficácia da rede
de distribuição de água, de modo a que, em período crítico, todos os utilizadores da rede
sejam obrigados ao cumprimento escrupuloso e integral das regras de utilização,
nomeadamente tempos e caudais de abastecimento previamente estabelecidos para cada um, e
na redução ao fornecimento de água às culturas, sendo ainda necessário estabelecer quais as
culturas que ficarão sujeitas a esta redução e a respectiva prioridade. Prevê-se que a regra a
adoptar inclua a seguinte prioridade: - corte ao abastecimento das áreas florestadas; redução
do fornecimento às áreas com prados naturais; - redução do fornecimento às áreas de incultos
até um limite que não ponha em risco a vitalidade do caniçal e sapal e o correspondente
desempenho na conservação ambiental; - e, finalmente, nos casos mais críticos, redução do
fornecimento às áreas de produção agrícola mais intensiva, nomeadamente das culturas de
milho e arroz. Esta decisão também terá em conta critérios de gestão da empresa agrícola,
pelo que é crucial a participação dos agricultores na definição do Plano.

A conservação do solo e dos ecossistemas está também dependente da qualidade da água


distribuída na rede de valas. Um dos problemas que requer um cuidadoso controlo é o da
contaminação da água por fertilizantes, produtos fitofarmacêuticos e microorganismos
patogénicos. Embora a natureza extensiva da agricultura e o reduzido encabeçamento
pecuário reduzam o risco desta contaminação, os agricultores serão aconselhados sobre as
práticas agrícolas desejáveis neste agroecossistema. Um outro problema diz respeito à
eutrofização - em particular nas áreas interiores dos sistemas de drenagem do Barbosa e de
Canelas, devido à circulação diminuta, ao alto teor de matéria orgânica e ao reduzido nível de
oxigénio dissolvido - resultando numa má qualidade da água, desadequada à sobrevivência da
maioria das espécies aquáticas. É essencial garantir uma boa circulação da água na rede de
valas, o que pressupõe a aplicação de um plano da sua limpeza sistemática de conservação da
rede. Em condições de estiagem, quando os caudais sejam insuficientes e as plantas se
desenvolvem nas valas de forma excessiva (por causa dos resíduos de fertilizantes), o PGAS
terá forçosamente que atender ao problema da eutrofização, prevendo uma circulação de água
mínima para contornar os respectivos impactes.

O Plano de operação da gestão do solo decorre da monitorização; tomando como referência


os intervalos referidos para os parâmetros de controlo, identificam-se as manchas de solo em
situação crítica relativamente aos problemas de salinização, alcalinidade e acidificação.
Nestes casos são previstas diversas medidas de prática agrícola. Considerar, por exemplo, que
uma vez realizadas as respectivas correcções, tais como aplicação de gesso, lavagem e
drenagem na correcção dos solos salino-sódicos e aplicação de calcário na correcção da
acidez; as amostragens deverão continuar com uma periodicidade anual até se conseguir uma
leitura que permita prever a evolução de tais valores. Nessa altura, os intervalos de
amostragem poderão ser alargados a algumas ou, eventualmente, à totalidade das manchas de
solo inicialmente classificadas como susceptíveis. Os agricultores terão de ser sensibilizados
para a realização de fertilizações ajustadas às necessidades das culturas, mediante os
resultados das análises de terras, devendo ser feita a recolha e concentração anual destes
resultados junto dos agricultores, simplificando-se a tarefa de monitorização nas zonas
susceptíveis.
5. Conclusão

O Baixo Vouga Lagunar é efectivamente um agroecossistema de grande complexidade,


fragilidade, mas com uma valia natural e cultural excepcionais. Para a sua sustentabilidade, a
gestão da água e do solo é determinante quer sob o ponto de vista agronómico, quer
conservacionista. A intervenção preconizada, sendo delicada é também complexa e exigente
sob o ponto de vista de rigor, quer no tocante à execução das obras, quer à monitorização e
operação na fase de exploração. Daí a importância atribuída aos Planos de gestão da água e do
solo e ao de gestão da diversidade biológica e da paisagem.

A implementação do PGAS, pelo facto de envolver um alargado leque de dados


pluritemáticos de índole dinâmica, deverá recorrer a um Sistema de Informação Geográfica.
Assim, pode garantir-se a adequada integração dos diferentes tipos de dados, variáveis no
espaço e no tempo, de modo a dispor-se uma ferramenta proficiente e eficaz na resolução dos
problemas de gestão deste ecossistema.

O sucesso destes planos depende igualmente e de forma inequívoca, do empenhamento e


apoio dos agentes intervenientes no processo, quer das entidades públicas com
responsabilidade no Baixo Vouga Lagunar – e na Ria de Aveiro – quer dos proprietários, quer
dos utilizadores. Este é por isso um projecto exigente em diálogo e compromissos mútuos, em
que o Baixo Vouga Lagunar deve ser encarado como uma parte integrante da bacia
hidrográfica em que se insere.

Agradecimentos

Os autores expressam um sincero agradecimento ao Instituto de Hidráulica, Enge nharia Rural


e Ambiente e à Equipa do Projecto do Baixo Vouga pela confiança depositada e pelo
permanente apoio e colaboração prestados. Também, um agradecimento à equipa do EIA pelo
entusiasmo demonstrado e pelo espírito de abertura e inter-ajuda no decurso dos trabalhos.

Bibliografia

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