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São Paulo, domingo, 23 de maio de 2010

A cada dia, um professor se licencia por dois anos


Desde janeiro, 194 se afastaram da rede estadual por problemas de saúde

Índice é o maior entre os servidores; problemas nas cordas vocais, na coluna e


psicológicos são os mais recorrentes

FÁBIO TAKAHASHI
DE SÃO PAULO

O professor de história Carlos, 42, fala sozinho às vezes. Seu coração, conta, dispara
sem motivo aparente. "Não conseguia controlar os alunos. Queria passar o conteúdo,
poucos me ouviam. Foi me dando uma angústia. Fiquei nervoso."
Não era assim. "Eu era bem calmo", afirma, referindo-se ao período anterior a 2004,
quando entrou como docente temporário na rede de ensino paulista.
Aprovado um ano depois em concurso, foi considerado apto a dar aulas, na zona sul da
capital. Passados três anos, obteve uma licença médica, que se renova até hoje, sob o
diagnóstico de disforia -ansiedade, depressão e inquietude.
Carlos espera nova perícia. Quer se tornar readaptado -situação de servidores com
graves problemas de saúde, que ficam ao menos dois anos afastados da sala de aula.
Fazem atividades administrativas na secretaria e na biblioteca, por exemplo.
De janeiro até a última sexta-feira, 194 docentes (mais de um por dia) da rede paulista
foram readaptados, aponta levantamento da Folha no "Diário Oficial". Pelos cálculos da
professora Maria de Lourdes de Moraes Pezzuol, que fez uma pesquisa financiada pela
Secretaria da Educação, 8% de todos os professores da rede estão readaptados.
Os casos mais recorrentes são problemas nas cordas vocais, na coluna e psicológicos. A
autora do estudo é ela própria uma professora readaptada.
Entre os servidores da Educação, o índice desse tipo de afastamento é maior que dos
demais: 79% dos readaptados trabalham nas escolas, categoria que soma 53% do
funcionalismo.

POR QUE ADOECEM


Pesquisadores apontam duas razões para tantas licenças. A primeira é a concepção da
escola, que requer para as aulas estudantes quietos e enfileirados. "Isso não existe mais.
Esta geração é muito ativa. O professor se vê frustrado dia a dia por não conseguir a
atenção deles", diz o sociólogo Rudá Ricci, que faz pesquisas com educadores de redes
públicas do país, inclusive no município de São Paulo.
A outra razão são as condições de trabalho. Em geral, os professores dão aulas em
classes com mais de 35 alunos, possuem muitas turmas e poucos recursos (não há, por
exemplo, microfone). Estudo divulgado na semana passada pelo Instituto Braudel e pelo
programa Fulbright mostra que os docentes paulistas têm condições piores que os de
Nova York.
Têm carga maior (33 horas semanais em sala, ante 25) e possuem mais alunos por sala
(35 e 26, respectivamente).

Colaborou ELISANGELA BEZERRA


Frases

"Em 2002, precisei me ausentar por problemas nas cordas vocais. Ficava muito rouca,
no final da semana mal conseguia falar"
MARIA DE LOURDES PEZZUOL
Professora readaptada

"Esta geração [de estudantes] é muito ativa. O professor se vê frustrado dia a dia por
não conseguir atenção deles"
RUDÁ RICCI
sociologo

SP anuncia plano para saúde do docente


Programa terá equipes com médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos,
nutricionistas e enfermeiros

Especialidades são das áreas em que servidores mais têm problemas e são as
maiores causas de absenteísmo

Bruno Fernandes/Folha Imagem

Maria de Lourdes de Moraes Pezzuol, docente que está afastada das aulas desde 2002 por problemas
nas cordas vocais

DE SÃO PAULO

O governo Alberto Goldman (PSDB) reconhece que é preciso melhorar as condições de


saúde dos professores de sua rede.
Tanto que deve anunciar, em um mês, um programa de prevenção e eventual tratamento
para os 65 mil servidores da educação da capital paulista.
Segundo o chefe de gabinete da Secretaria da Educação, Fernando Padula, a ideia surgiu
há três anos, por conta das inúmeras faltas dos docentes. À época, a cada dia, 12,8%
deles não compareciam às aulas.
"Havia muito abuso, por isso mudamos a legislação. Mas verificamos também que era
preciso olhar para a qualidade de vida dos servidores", afirmou.
O governo limitou a seis o número de faltas para exames médicos. Até então, o servidor
podia faltar metade do ano sem desconto do salário desde que apresentasse atestado
médico.
Segundo o governo antecipou à Folha, o novo programa, chamado SP Educação com
Saúde, formará equipes com médicos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos, psicólogos,
nutricionistas e enfermeiros, que circularão pelas escolas estaduais.
Algumas equipes ficarão fixas nas diretorias de ensino. As especialidades escolhidas
coincidem com as áreas em que os docentes mais têm problemas -como lesões nas
cordas vocais, dores na coluna e distúrbios psicológicos- e são as maiores causas de
absenteísmo.
Os profissionais das equipes serão da entidade filantrópica Santa Marcelina. O servidor
que tiver algum problema de saúde diagnosticado será encaminhado ao Hospital do
Servidor Público para tratamento.

PREVENÇÃO
Segundo a Secretaria da Educação, o programa é inédito no país. "Vamos atuar na
prevenção de agravos, para que os professores faltem menos e estejam mais dispostos, o
que impactará na qualidade de ensino", afirma Fernando Padula.
Sobre o número de docentes readaptados, o governo estadual afirma que o índice vem
caindo, tomando como base os dados fechados por ano. Em 2007, foram 902; no ano
passado, 341.
(FÁBIO TAKAHASHI)

ANÁLISE

É necessário intervir de forma mais intensiva em


prevenção
LUIZ CARLOS MORRONE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Estudos com professores da rede estadual da Baixada Santista e Botucatu, de 2000 a


2006, trouxeram importantes informações sobre a saúde de professores, relatadas por
equipe do Programa de Saúde do Trabalhador, do Hospital do Servidor Público.
Na região de Botucatu, verificou-se que a frequência de licenças médicas na rede
estadual é maior. Para cada cem horas de aulas, os professores da rede privada tiravam
em média 1,3 hora em licenças; da municipal 3,1; e da estadual 7,3 horas.
É presumível que o nível excessivamente centralizado das decisões sobre as licenças,
tomadas na capital do Estado, seja uma das importantes causas da diferença. Na
Baixada Santista, de um total de 735 servidores examinados (mais de 80% professores),
18,8% tinham hipertensão, 4,3%, rinite alérgica, 5,8%, disfonia, e 3%, depressão.
Também foram analisadas 105 licenças médicas, na mesma região, de servidores
afastados por mais de 90 dias. Transtornos mentais e comportamentais figuravam entre
51 casos (51,4%), seguidos de doenças osteomusculares, com 13 casos (12,4%).
A análise de 1.272 professores mostrou que os fatores para a ocorrência de doenças
vocais são: A) hábitos como falar muito e gritar; B) fatores como ruído e excesso de
poeira; C) cargas horárias mais longas e trabalho com alunos no nível médio.
É necessário intervir de forma mais efetiva na prevenção. Para tanto, necessário se faz a
criação de uma estrutura que, a exemplo dos serviços especializados em segurança e
saúde no trabalho, obrigatórios nas empresas privadas, também sejam estendidos para
os servidores públicos estatutários.

LUIZ CARLOS MORRONE é professor da Santa Casa de São Paulo

DEPOIMENTO

"O processo de readaptação foi um período


deprimente"
MARIA DE LOURDES DE MORAES PEZZUOL
ESPECIAL PARA A FOLHA

O magistério para mim sempre esteve relacionado a se doar à formação de outras


pessoas. Em 2002, infelizmente, precisei me ausentar por problemas nas cordas vocais.
Ficava muito rouca, no final da semana mal conseguia falar. À época, tinha jornada de
36 horas semanais.
Fiquei um ano em licença médica. Em 2003, voltei para a escola estadual Vereador
Narciso Yague Guimarães como professora readaptada. A sensação foi de perda total da
identidade profissional.
Muitas vezes, quando chegava ao estacionamento da escola, me via chorando. Meus ex-
alunos me perguntavam: "Professora, quando a senhora volta a dar aulas?". O processo
de readaptação sugerido inicialmente foi de dois anos. Foi um período deprimente.
Realizava preenchimento de fichas, atendia telefone, guichê etc.
Resolvi agir. Observei que a sala de informática da escola não funcionava. Em 2004,
criei com alunos um projeto para ela. No final daquele ano, fui coordenar a biblioteca, e
o projeto parou. Mas voltamos em 2005, com a chegada da nova gestora.
Em 2006, na procura de saber quem é o professor readaptado, pleiteei a bolsa de
mestrado da Secretaria da Educação, com a proposta de pesquisa "Identidade docente: A
situação do professor readaptado em escolas públicas do Estado de SP". Verifiquei que
o não reaproveitamento do profissional como educador gera acomodação ou
insatisfação, com prejuízos pessoais e profissionais para professores. Atualmente, tento
voltar.
Estou readaptada há sete anos. Fiz novos exames. O laudo médico foi favorável ao
retorno. Minha escola protocolou o pedido para cessação da readaptação em setembro
de 2009, mas até agora não pude voltar.

MARIA DE LOURDES DE MORAES PEZZUOL é professora da rede estadual há 19 anos

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