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Quinta-feira, 9 de março de 2006

Fora, gurus!
O francês Jean Bartoli, professor do Ibmec e da Fundação Getulio Vargas, em São Paulo,
decreta guerra aos modelos corporativos. Saiba por quê
Por Daniela Diniz
Nascido na Ilha de Córsega, o francês Jean Bartoli, de 55 anos, é um teólogo, filósofo,
economista e ex-padre que adora comer misto-quente na padaria da esquina. Apesar de gostar
bastante do sanduíche, o que o atrai de fato na padaria são as conversas de balcão. Para Jean,
professor de ética teológica no Ibmec São Paulo e na Fundação Getulio Vargas, ouvir histórias
de vida significa ampliar a visão de mundo -- atividade, segundo ele, ignorada pela maior parte
dos executivos. Há 30 anos, Jean chegou ao Brasil como estudante do curso de teologia.
Formou-se e celebrou missas durante cinco anos. Largou a batina em 1981, um ano antes de
se casar, e aos poucos foi entrando no universo corporativo. Lá, se deparou com um discurso
muito parecido com o do convento. Autor do livro Ser Executivo, Um Ideal? Uma Religião?
(Editora Idéias & Letras), que ele próprio denomina como um ensaio e jamais um "livro de
receitas", Jean começou a receber convites para falar sobre ética nas empresas. Foi aí que
passou a discursar com pitadas filosóficas e religiosas e cutucar os modelos repetitivos de
gestão, a massificação do perfil dos executivos e a busca por gurus corporativos. "As pessoas
deveriam ir atrás de anjos, e não de gurus", diz Jean. "Os anjos são as pessoas que
encontramos no dia-a-dia, que podem realmente ampliar nossa visão de mundo." A seguir,
uma conversa filosófico-religiosa com Jean.
QUAIS SÃO AS SEMELHANÇAS ENTRE O MUNDO CORPORATIVO E O RELIGIOSO?
Quando cheguei ao mundo corporativo e comecei a participar de alguns treinamentos, passei a
ver analogias entre o trabalho de educação executiva e o trabalho de formação teológica. Vi
que, no ambiente empresarial, existem paradigmas e valores que são apresentados como
inquestionáveis, como se fossem dogmas de uma igreja. Os executivos das empresas são
convidados a abraçar um ideal de perfeição empresarial de forma quase religiosa. Parece que
a realização pessoal e profissional só pode acontecer naquele cenário corporativo.
PODEMOS CITAR ALGUNS EXEMPLOS?
A religião tem tendência a se tornar fanática, assim como acontece com algumas empresas. O
fanático está enclausurado no templo dele e não vê o que está acontecendo lá fora. Não
cresce e fica preso a modelos que o impedem de retomar o controle da sua vida. No mundo
corporativo, vemos pessoas que agem assim. Aceitam tudo o que a organização dita e acabam
perdendo a possibilidade de ser livres. Um outro paralelo é que, no discurso religioso, as
pessoas são induzidas a aceitar o sofrimento presente em função de uma esperança futura.
Isso acontece da mesma forma no mundo corporativo.
NA RELIGIÃO, ESSA ESPERANÇA FUTURA SERIA O PARAISO. E NO CENARIO
CORPORATIVO?
O sucesso. Em algumas empresas, vejo grandes executivos avaliando determinadas técnicas
empresarias apenas pelo fato de terem feito sucesso lá fora. Nem discutem se funciona
realmente. Da mesma forma, muitos palestrantes são avaliados pelo que cobram numa
palestra. Se ele cobra 100 000 reais, é considerado muito bom. E a gente sabe que nem
sempre é assim.
QUAIS AS CONSEQÜENCIAS DO FANATISMO CORPORATIVO PARA O PROFISSIONAL?
O fanatismo sempre é muito dramático e tolhe a capacidade crítica. Os executivos viram alto-
falantes. Perdem a voz própria, a capacidade de duvidar. Estão tão acostumados a receber
modelos prontos que acabam se desinteressando pelo ato de pensar. Acabam agindo
exatamente como alguns religiosos, que aceitam os dogmas da sua religião para chegar ao
paraíso.
A EMPRESA É CULPADA POR ISSO AO DITAR AS REGRAS DO EXECUTIVO PERFEITO?
A culpa é da empresa e também do funcionário. Nada é culpa de um lado só. As organizações
se tornam dramáticas porque os executivos desejam que elas sejam dramáticas. Alguns
reclamam porque é sempre fácil se colocar na posição de vítima. Faço muitos treinamentos
empresariais e percebo que há vários executivos, com grandes poderes, que adoram vestir a
roupa de vítima.
AO ACEITAR OS DOGMAS CORPORATIVOS, OS EXECUTIVOS ACABAM SE TORNANDO
TODOS IGUAIS?
Há um antropólogo que diz que a violência nasce da vontade de ser igual, e não de ser
diferente. O discurso da competitividade é interessante, porque no fundo você compete para
ser igual. Se você pensar bem, o diferencial competitivo serve, na verdade, para você se
igualar a um determinado modelo que acaba sendo o modelo de todos. Veja como Jack Welch,
ex-presidente da General Electric, é uma pessoa reverenciada no mundo corporativo hoje. Tem
muita gente que se espelha nele.
É RUIM SEGUIR GURUS COMO JACK WELCH?
Eu acho que sim. É claro que, na vida, você encontra pessoas que quer imitar e que o levam a
uma parte do caminho. Mas, a partir de um certo momento, você é você e ela é ela. Você quer
imitar os seus pais, por exemplo. Mas, depois que desenvolve o julgamento crítico, começa a
questionar e deixa de aceitar muitas posições. E os próprios pais se sentem orgulhosos
quando vêem que o filho toma essa atitude. A gente ganha muito ao pensar pela própria
cabeça, em vez de ficar seguindo um modelo. É claro que a obra de Peter Drucker é uma
excelente leitura, mas também é bom ler Jorge Amado, Machado de Assis, Shakespeare,
historiadores... Para conseguir relativizar um pouco o que diz Peter Drucker. Na Grécia Antiga,
Sócrates vivia cercado de discípulos de todos os lados e começou a dizer a eles: "Nós
precisamos questionar, duvidar, aprender a pensar sozinhos". Ele nunca se propôs como
modelo, mas como parteiro, que é alguém que sabe motivar o pensamento.
O PROBLEMA É QUE MUITOS EXECUTIVOS SO LEEM LIVROS DE NEGOCIOS...
Exatamente. Todo o meu processo reflexivo começou pela leitura. Aos 14 anos, li Os Irmãos
Karamazov, de Dostoievski. A experiência de se confrontar com grandes autores é muito mais
rica do que ir atrás de um guru. Acho que a gente tem de ir atrás de anjos, e não de gurus.
QUEM SÃO ESSES ANJOS?
Às vezes, um anjo é uma pessoa que cruza teu caminho no avião. É alguém que você nunca
mais vai ver... Mas, se você está ligado na conversa, pode fazer reflexões que vão lhe servir
muito. Enriquece a vida sair do mundo corporativo, ouvir a conversa dos balconistas na padaria
da esquina, conhecer gente nova... E, ao enriquecer a vida, você enriquece a carreira. Se você
não tem visão de mundo, sua visão de negócios fica pobre, superficial. E, se você não tem um
projeto de vida, você não tem um projeto de carreira.
OUVIR HISTORIAS DA VIDA REAL É MAIS PRODUTIVO DO QUE OUVIR GURUS
CORPORATIVOS?
Exato. Não é natureza e vocação da empresa ser educativa. Então, você tem de se emancipar
intelectualmente. E isso é você com você mesmo. Portanto, é preciso tomar muito cuidado com
o feedback que a empresa dá. Eu não posso basear minha carreira na avaliação que recebo
dos outros.
COMO AGIR, ENTÃO, DIANTE DAS AVALIAÇÕES DE DESEMPENHO REALIZADAS
PELAS EMPRESAS?
Esse feedback pode ser extremamente positivo, desde que esteja claro que essa é a avaliação
que você vai receber naquela empresa, em função das necessidades dela. Agora, se você
mesmo se avaliar profissionalmente, precisa olhar outros aspectos. Tem de tomar cuidado para
não ficar escravo do feedback corporativo, senão só vai ver no espelho o que o outro te oferece.
QUEM É O EXECUTIVO IDEAL, QUE AS EMPRESAS TANTO CULTUAM?
É um chato de galocha! Costumo fazer um exercício com os executivos e peço para eles
colocarem no papel esse perfil ideal. Eles escrevem tudo que já ouviram e leram: assertivo,
ambicioso, agressivo, trabalha muito etc. Aí eu pergunto: você conseguiria conviver cinco
minutos com um cara desse? Silêncio...
É PRECISO, ENTÃO, FUGIR DO IDEAL DE PERFEIÇÃO CORPORATIVO?
Sim. O mundo corporativo é muito "nietzschiano". Nietzsche odiava o cristianismo, pois ele
ensina a aceitar as fraquezas. E, para Nietzsche, o ser humano era um super-homem. Eu acho
que o mundo corporativo precisa é exatamente fugir dessa imagem. Tem de ter consciência da
própria fragilidade. Se você considera que a comunidade a que pertence tem fragilidades
fundamentais, você trabalha com elas e consegue per enidade. A gente aprende a partir de
uma doença, de uma demissão. Agora, se você faz de conta que essas fragilidades não
existem, elas voltam com força total -- e aí temos as grandes frustrações que dominam tantos
profissionais.
SEGUIR MANUAIS DE CARREIRA, PORTANTO, NEM PENSAR...
Quem busca o como não vai muito longe. Você tem de usar muito mais a pergunta para quê?
Por quê? Para que ser líder, por que quer ser líder? Quer ser líder de quê? De quem? Para
fazer o quê? Depois de responder isso, vá atrás do como. Eu aprendi uma coisa: o importante
não é a forma como se reza, mas para que se reza, o que você busca quando reza. Acho que
é a mesma coisa quando se trata de carreira.
HA ESPAÇO PARA TANTA REFLEXÃO NO AMBIENTE CORPORATIVO?
Vivemos um momento difícil nas empresas. As pessoas estão decepcionadas com o discurso
empresarial e, por isso, há muita gente pronta para pensar diferente. Tenho a impressão de
que virão ótimas surpresas. Há uma nova geração aguçada, e o momento político do país
ajuda também. A gente perdeu, finalmente, a possibilidade de terceirizar a indignação. Na
medida em que a consciência política fica mais crítica e menos ligada a líderes carismáticos,
isso acaba se refletindo na empresa... O mesmo cara que está furioso com o PT começa a ficar
irritado com o discurso do guru. Estou esperançoso.
Agradecimento Bella Paulista

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