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O documento discute os desafios da formação de professores para a alfabetização e como a ênfase na capacitação técnica tem limitações. Historicamente, o fracasso escolar foi atribuído aos alunos e professores, mas pesquisas mostraram que a escola também pode ser responsável. Programas de formação continuada focam no conhecimento teórico, mas ignoram outros aspectos importantes da alfabetização como o uso funcional da escrita.
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Escola Que Não Ensina a Escrever.
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COLELLO, S. M. G. a Escola Que Não Ensina a Escrever. São PauloPaz e Terra, 2007 Resenha
O documento discute os desafios da formação de professores para a alfabetização e como a ênfase na capacitação técnica tem limitações. Historicamente, o fracasso escolar foi atribuído aos alunos e professores, mas pesquisas mostraram que a escola também pode ser responsável. Programas de formação continuada focam no conhecimento teórico, mas ignoram outros aspectos importantes da alfabetização como o uso funcional da escrita.
O documento discute os desafios da formação de professores para a alfabetização e como a ênfase na capacitação técnica tem limitações. Historicamente, o fracasso escolar foi atribuído aos alunos e professores, mas pesquisas mostraram que a escola também pode ser responsável. Programas de formação continuada focam no conhecimento teórico, mas ignoram outros aspectos importantes da alfabetização como o uso funcional da escrita.
FORMAO DOCENTE E REALIDADE ESCOLAR: CAMINHOS PARA A
TRANSPOSIO DIDTICA PARA A PRTICA DA ALFABETIZAO
Silvia M. Gasparian Colello (FEUSP; Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Alfabetizao e Letramento - GEAL) Martha Sirlene da Silva (UNIb; FATI; GEAL)
1. Ensino da lngua escrita, fracasso escolar, e formao de professores
Historicamente, a constatao do fracasso escolar e a preocupao com a formao docente aparecem fortemente associadas. Por sua vez, o desafio de ensinar a ler e a escrever constitui-se como pea fundamental nessa articulao porque, no enfrentamento do fracasso precoce e cumulativo, a alfabetizao configura-se, no raro, como base de toda a dificuldade escolar. A lgica de que a competncia do professor garante o ensino da lngua e, assim, a chance de lidar melhor com os problemas de evaso, repetncia e aprendizagem, fortaleceu-se com a ampliao do sistema brasileiro de ensino na dcada de 60, assumindo, a partir de ento, diferentes conotaes tanto nos discursos pedaggicos, quanto nas iniciativas da poltica educacional. Quando as interpretaes para o fracasso eram atribudas s supostas carncias (cultural, alimentar, afetiva, lingstica ou de estrutura familiar) do aluno, a competncia tcnica do professor deveria incidir sobre a condio dos estudantes a fim de reverter uma realidade adversa externa escola. As perguntas mais bvias pareciam ser: como alfabetizar um aluno que no sabe nem falar? que no conhece suficientemente o mundo para entender o que l? que no se interessa pelos livros? que no tem em casa o apoio familiar capaz de estimular a prontido para a alfabetizao? Uma recente pesquisa divulgada pela UNESCO (Estado de So Paulo, 27/6/07) mostra que quase 40% dos professores consideram que, nos casos de repetncia, a culpa do prprio aluno. Outros 24% atribuem a culpa aos pais. Assim, embora essa concepo esteja ainda hoje bastante arraigada no imaginrio popular e at mesmo nos meios educacionais, a partir dos anos 80, dois eixos de investigao acabaram por transferir a problemtica do fracasso escolar para a dimenso interna da escola: por um lado, a superao dos argumentos de carncia que, como mitos, se prestavam a culpar os alunos pelas suas dificuldades (PATTO,1990; CAGLIARI, 1989; CARRAHER et al, 1988; SOARES, 1991; MOYSS e COLLARES, 1997); por outro, uma srie de pesquisas, no Brasil lideradas por Patto (1990) e Carraher (1988), que chamaram a ateno para as diferenas culturais e a incapacidade da escola de lidar com elas. Ao relacionar o funcionamento escolar, os mecanismos de interveno didtica e as concepes docentes ao fenmeno do fracasso, tais pesquisas evidenciam uma escola que, pelo despreparo para receber diferentes segmentos da populao e pela dificuldade de estabelecer vnculos entre o que ensinado e a realidade cultural do aluno, , em si, produtora do fracasso. Souza faz uma sntese do argumento que sustenta essa postura: ... os professores no recebem uma formao inicial adequada, logo no sabem como lidar com a clientela escolar, majoritariamente pertencente s classes populares. Os ndices de fracasso escolar so, portanto, o atestado da incompetncia dos professores. Assim, para melhorar a qualidade da escola preciso que seus professores sejam mais bem capacitados por meio de cursos de formao continua, nos quais podero suprir as deficincias de sua formao inicial e entraro em contato com novas teorias, metodologias e tcnicas de ensino-aprendizagem. (2002, p. 251) O aparecimento de um novo referencial e as evidncias prticas das suas implicaes se prestaram a redimensionar a aprendizagem e a vislumbrar uma compreenso do fracasso nunca antes considerada. Conforme demonstra a autora, mudam as concepes, mudam o enfoque do problema, o entendimento acerca do papel do professor, mas no necessariamente a lgica que subsidia os princpios de formao. Quando os professores e a sua atuao em classe configuram-se como determinantes do insucesso escolar, mais uma vez a nfase da capacitao docente acaba recaindo na necessidade de promoo tcnica desse profissional: Olhando para as snteses da maioria dos congressos sobre formao de professores descobrimos uma lgica quase linear. As propostas se concentram em como requalificar os cursos de formao, como dot-los de maior densidade terica e prtica. A nfase recai na formao precedente entrada ao magistrio. Ultimamente se pensa na educao concomitantemente ao trabalho pedaggico, educao continuada, mas freqentemente se mantm a mesma lgica: completar a qualificao precedente, requalificando em servio para renovar os processos pedaggicos e assim requalificar a baixa qualidade de nossas escolas. A lgica linear continua predominante: qualifiquemos e requalifiquemos os mestres e teremos sistemas escolares de qualidade, pois se no temos uma escola de qualidade porque nos falta qualidade profissional. (ARROYO apud SOUZA, 2002, p. 151) No caso especfico da alfabetizao, o discurso da incompetncia tcnica do professor parece ganhar sentido pela dificuldade que os docentes encontram para implementar com qualidade o construtivismo na prtica pedaggica, ou seja, para fazer valer no cotidiano escolar os princpios presentes nos discursos educacionais e nas diretrizes de ensino. Embora os subsdios tericos para uma prtica de ensino renovadora estejam disponveis desde a dcada de 80 (e formalmente assumidos pelas diretrizes dos Referenciais e Parmetros Curriculares Nacionais dede o final dos anos 90), permanecem os quadros de dificuldade no ensino da lngua escrita. Com a poltica de ciclos em alguns municpios, essa realidade tornou-se ainda mais insustentvel pela emergncia de alunos semi-alfabetizados na 4 ou at mesmo na 8 srie do Ensino Fundamental. Do ponto de vista da qualidade do ensino, a no- aprendizagem para aqueles que enfrentam os sucessivos anos de escolaridade ganha uma evidncia que antes era mascarada por outros tipos de fracasso escolar como a repetncia e a evaso. Assim, se verdade que os professores no mais alfabetizam como no perodo que antecedeu aos estudos psicogenticos de Ferreiro e seguidores, igualmente verdadeira a dificuldade deles para implementar prticas eficientes no ensino da lngua (SARRAF, 2003). Aplicada aos cursos de formao para o ensino da lngua, a lgica da competncia docente acaba justificando uma abordagem tcnica bastante especfica do fazer pedaggico nos programas de formao continuada. Esse foi, por exemplo, o caso dos cursos promovidos pela Secretaria Municipal de Educao de So Paulo destinados aos professores e coordenadores pedaggicos em 2006, de onde foram colhidos os dados da pesquisa que aqui se pretende apresentar. Com o objetivo de Intensificar as aes de formao dos professores/ coordenadores pedaggicos envolvidos no Projeto Toda a Fora ao 1 ano e Projeto Intensivo no ciclo I, tomando como referncia o conhecimento didtico de alfabetizao construdo nos ltimos anos. (Dirio Oficial do Municpio de So Paulo, 2006), O projeto prope como contedo a ser desenvolvido: 9 Situaes didticas que a rotina precisa contemplar para a aprendizagem da linguagem que se escreve: leitura em voz alta pelo professor, roda de biblioteca com diversas finalidades. 9 Psicognese da lngua escrita: hiptese de escrita, sondagem. 9 Situaes didticas que a rotina precisa contemplar para a aprendizagem do sistema de escrita: leitura e escrita de textos conhecidos de memria, leitura e escrita de ttulos e listas diversas. 9 Princpios norteadores para o planejamento de boas situaes de aprendizagem: situaes problema, agrupamentos e variaes, tratamento do objeto de conhecimento (ibidem, p. 32) O que chama a ateno nessa proposta a meta de intensificar a formao docente (assumindo implicitamente a sua deficincia original) mediante o acesso ao conhecimento construdo nos ltimos anos, o que circunscreve a iniciativa ao aporte complementar de teorias e correspondente capacitao para o fazer pedaggico (situaes didticas que a rotina precisa contemplar). No caso, elas se concentram principalmente na psicognese da lngua escrita, tomada pelo vis especfico das hipteses de escrita descritas por Ferreiro e Teberosky (1984): pr silbico, silbico, silbico alfabtico e alfabtico. a identificao desses momentos conceituais de escrita que possibilita ao professor no s fazer um bom diagnstico do seu grupo (sondagens e avaliaes), como tambm propor atividades estrategicamente formuladas para investir na progresso do conhecimento. Embora no se possa desqualificar a relevncia do aporte terico e metodolgico para a atuao docente no ensino da escrita, dois pontos merecem ser destacados. Na perspectiva tcnica, h a tendncia de supervalorizar as hipteses da escrita, tomando-as como a prpria alfabetizao, o que representa um reducionismo no modo como se compreende a aquisio da lngua escrita. Quando a alfabetizao entendida como a sucesso dos momentos conceituais, perde-se a chance de investir em outras frentes de processamento cognitivo e funcional relacionados escrita como, por exemplo, a compreenso das funes da escrita, o uso desse sistema em diferentes situaes e com propsitos variados, a familiarizao com diferentes gneros, o entendimento das relaes entre oralidade e escrita, imagens e escrita, leitura e escrita e a constituio da situao interlocutiva na produo textual (COLELLO, 2004, 2007). Nesse sentido, Soares (2003) alerta para o fato de que a alfabetizao no necessariamente garante a maior insero no universo letrado, e Ferreiro (2001) insiste que o efetivo processo de alfabetizao a prpria imerso na cultura escrita. Na perspectiva pedaggica (e aqui est o foco de interesse do presente artigo), a abordagem puramente tcnica que pretende superar a suposta incompetncia dos professores tem se mostrado insuficiente para a transformao das prticas de ensino e resoluo dos problemas de aprendizagem. Inmeros autores tm promovido a reviso crtica do argumento da incompetncia docente, chamando a ateno para a necessidade de se considerar, nos projetos de formao continuada, a complexidade do universo escolar, tanto no que diz respeito s estruturas funcionais, quanto no que tange a relaes interpessoais e prticas cotidianas propriamente ditas. Para Kramer, Com muita freqncia, tanto nos cursos de formao, como nos encontros, reciclagens, treinamentos, os profissionais das universidades falam mais do que querem ouvir. Talvez o faam porque ouvindo se dariam conta de como no dispem da maioria das respostas que deles se espera. Talvez porque - no sabendo assar uma torta de amora no tm coragem de confess-lo, e, ficam usando a figura do carrasco antes como aliado do que como ameaa a si prprios e ao conjunto dos professores. Ao contrrio, o espao da formao de professores um espao de linguagem: espao dinmico, ativo, criativo.(1993, p. 189) Pensando nos aspectos que interferem no desempenho profissional do professor, Azanha (1994) afirma que a qualidade do trabalho docente est vinculada especificidade da instituio de ensino. Souza (2002) defende a idia de que no se trata de lidar individualmente com os professores, mas de colocar a vida cotidiana da escola como objeto de conhecimento e reflexo. Para Lerner (2002), para alm da capacitao tcnica, preciso criar mecanismos para que o professor possa lidar com a tenso entre a reproduo acrtica da escola tradicional e a considerao responsvel dos princpios de mudana. Colello (2007) prope uma dinmica que, superando a dimenso terico-instrumental, possa integrar o compreender, o aplicar, o problematizar e o refletir. Ampliando a compreenso dos desafios na formao de professores, Macedo (2005) postula uma prtica reflexiva capaz de conciliar o fazer e o aprender, concretizada em uma dupla direo: no processo de interiorizao, pois importa que os professores possam tomar conscincia de si, do seu papel e dos aspectos relacionados ao seu trabalho e no processo de exteriorizao, pois eles devem ser capazes de mobilizar recursos para a construo de novas possibilidades no seu campo de ao. Em sntese, o conjunto dos trabalhos mais recentemente produzidos indica que to importante quanto a atualizao terica e tcnica dos professores a viabilizao do trabalho escolar a partir das expectativas e motivaes, condies de trabalho, relaes interpessoais, disponibilidades coletivas para o enfrentamento das dificuldades, revises crticas da prtica de trabalhos e fortalecimento conjunto e responsvel do projeto pedaggico. Como conciliar essa perspectiva crtica em um projeto de formao continuada para professores? O que os professores esperam e como eles podem ser atendidos? Para alm do aporte tcnico, como as iniciativas de capacitao podem favorecer a transposio didtica e a reviso das prticas no ensino da lngua escrita? 2. A pesquisa Partimos do pressuposto de que o fracasso escolar, e particularmente as dificuldades no ensino da lngua escrita so construdos na e pela escola, configurando-se como produtos de uma interveno que, para alm da dimenso tcnica e conceitual, tm sua base nas condies trabalho dos educadores. Nessa configurao, as relaes estabelecidas entre professores e coordenadores pedaggicos passam a ser fundamentais para a construo do projeto de ensino e implementao de uma proposta eficiente e ajustada aos alunos. De modo inverso, possvel colocar a hiptese de que o descompasso entre eles, seja no plano interno (concepes de ensino, compreenso do papel do outro, expectativas mtuas para a concretizao da prtica educativa), seja na dimenso mais concreta da articulao desses profissionais para, de fato, viabilizarem uma proposta no dia- a-dia escolar (ajustamento operacional para lidar com as condies materiais e estruturais da escola, superar eventuais problemas e ainda recriar as condies de trabalho em prol do ensino inovador), um fator decisivo na produo do fracasso escolar. Compreender as tenses e ansiedades que acompanham os professores e coordenadores pedaggicos pode ser um fator importante para repensar os eixos de abordagem dos cursos de formao continuada. Por isso, tomamos com principais focos de anlise os aspectos relacionados realidade do trabalho escolar e aqueles vinculados aos cursos de formao. Assim, o objetivo do presente artigo fazer um estudo das relaes dialgicas entre professores alfabetizadores e coordenadores pedaggicos, comparando suas concepes, perspectivas de trabalho e necessidades de formao. Para tanto, acompanhamos 23 professores e 25 coordenadores pedaggicos da regio de Pirituba em So Paulo em seus respectivos cursos de formao continuada (4 horas por semana com o total de 40 horas), no para avaliar o impacto da iniciativa em si, mas como oportunidade privilegiada de discutir concepes, ansiedades, focos de tenso relacionadas s condies de trabalho. Como parte do programa Ler e Escrever, os cursos foram promovidos pela Secretaria da Educao de So Paulo, de agosto a dezembro de 2006. Durante esse perodo, foram feitas sondagens com questionrios semi- abertos, anotaes em dirio de campo a partir de situaes de debates, trocas de experincias e oficinas pedaggicas. Ao tomar a linguagem como foco de anlise, assumimos, assim como Bakhtin (1988), que no jogo da palavra e contrapalavra, o dilogo mediador da compreenso. Alm disso, entendemos que a dialogia construda no curso fez emergir aspectos da conscincia desvelada pelas diferentes atividades da formao. Trata-se de uma fala significativa porque, no contexto de vida e de trabalho, ela se vincula a um certo modo ou sentido do pensar: S a corrente da comunicao verbal fornece palavra a luz da sua significao (1988, p.138). Essa concepo tambm compatvel com os ensinamentos de Vygotsky (1987) que defendem o significado como o amlgama entre a palavra e o pensamento, institudo em um dado contexto sociocultural. Por isso, longe de quantificar e medir posturas, o que se pretendeu foi uma abordagem qualitativa que pudesse captar significados assumidos pelos professores e coordenadores, mapeando aspectos significativos para a compreenso da realidade escolar e dos condicionantes da formao continuada. Os educadores analisados eram na sua grande maioria pedagogos, do sexo feminino, com idade entre 40 e 49 anos. No grupo das professoras, predominava um tempo de servio acima de 10 anos e, no momento da pesquisa, o magistrio na 1 srie. No grupo dos coordenadores, prevalecia o tempo de 1 a 5 anos no cargo, todos eles com experincia docente prvia. 3. Realidade escolar Configurando-se a princpio como uma profuso catica de idias, sentimentos, posies, convices, descries crticas e queixas, o material colhido pde, aps minuciosa anlise, ser organizado em quatro grandes categorias, a saber: o eu e o eu profissional; relaes na escola; condies de trabalho; a construo da prtica pedaggica no ensino da lngua escrita. 3.1 O eu e o eu profissional Os professores e coordenadores estudados so praticamente unnimes em associar a vida profissional (opo pela educao e trajetria vivida) ao gosto, justificando esse prazer ora como uma descoberta ao longo do caminho possvel (Cheguei na educao por acaso, mas logo que entrei gostei), ora como uma paixo vinculada ao modo de ser, ideologia ou predestinao (nasci para estar dentro de uma escola; por ideologia, acreditar que poderia ajudar as crianas num futuro melhor). O trabalho tende a ser valorizado pelo grau de responsabilidade, o que, no caso dos coordenadores, aparece de modo mais tcnico (a mediao para o trabalho pedaggico) e, no caso das professoras, aparece vinculado a metas genricas (possibilidade de mudana, conscientizao e melhoria de vida para uma comunidade esquecida) ou relacionado com os alunos (Sinto que sempre falho quando no consigo alfabetizar todos). Em funo da responsabilidade e do valor atribudo sua funo, os educadores tendem a se recolocar como pessoas: as professoras com uma conotao mais afetiva (sinto-me me de meus alunos) e os coordenadores pela perspectiva da carreira profissional (Sinto orgulho de mim... cheguei aonde cheguei... Sonhos de garota do interior... com muita esperana, vontade e determinao). A despeito dos ganhos e recompensas, eles se queixam da presso sofrida e da dificuldade do seu trabalho: os professores referindo-se aos desafios e obstculos da sua funo e os coordenadores apontando para um trabalho confuso e pouco compreendido, sem retorno para a auto-estima. 3.2 Condies de trabalho Quando o foco de discusso sai do plano mais genrico do ser educador e passa para a dimenso mais concreta da rotina de trabalho, o sentimento comum de frustrao aparece de modo mais intenso e evidente: Temos inmeras possibilidades e todas as dificuldades (CP), Sinto-me remando contra a mar. No entanto, a explicitao dessa condio em ambos os grupos estudados assume diferentes nfases. Os professores trazem uma queixa ampla que oscila entre pontos difusos e outros bastante especficos, abordando dimenses fsicas (falta de espao, de material), estruturais ou funcionais (excesso de alunos, pouca assistncia aos alunos de incluso, falta de tempo para tantas cobranas, ausncia de estagirios, mau aproveitamento do trabalho coletivo, desorganizao), humanas (falta de participao dos pais e alunos, coordenao omissa, direo ausente, indisciplina e apatia dos alunos) e poltico-econmicas (jornada estafante, baixa remunerao, falta de investimento do governo). Contrariando as expectativas que poderamos ter em face dos argumentos da incompetncia docente, curioso perceber a falta de referncia dos professores s suas dificuldades pedaggicas, o que sugere uma resistncia para considerar a frustrao nascida nos seus prprios limites. como se, ao localizar o problema no outro ou na situao, ele pudesse se defender das eventuais crticas ao seu trabalho ou culpas a ele relacionadas. Integrado polifonia das queixas (os discursos circulantes no mbito escolar), os coordenadores tambm parecem defender a sua posio ao concentrar a anlise das condies de trabalho na organizao do trabalho escolar. Suas queixas recaem na sobrecarga de trabalho, no ritmo sempre imprevisvel (Como CP no tenho condies de trabalho. A rotina uma parania e nunca um dia como o outro) e na dificuldade para atender tantas pessoas ou para resolver tantos problemas (Sinto-me frustrada nos momentos de trabalho coletivo, pois eles precisam ser ocupados por atendimentos aos alunos, por falta de professores e profissionais). 3.3 Relaes na escola A anlise do tema das relaes na escola evidencia como os problemas podem ser mascarados por realidades paralelas (talvez at contraditrias) que coexistem no plano social: por um lado, o espao institucional dos educadores aparece como um lugar de amigos j que, em geral, as relaes so marcadas pela cordialidade; por outro, as efetivas dificuldades de interao e intercambio comprometem o trabalho (pareo secretria sem respaldo da direo; sinto meu trabalho limitado em relao a trocas). As queixas com relao direo ausente, falta de dilogo/compreenso do trabalho por parte da equipe, remetem a um sentimento de solido evocado tanto pelos professores (sinto um vazio, no tenho com quem falar sobre as minhas dificuldades) como pelos coordenadores (O CP sozinho e lida com grupos grandes e com diferentes concepes de educao. Alguns so muito resistentes, inflexveis, preciso ter jogo de cintura). Quando se referem aos mecanismos que podem aliviar a sua condio de isolamento, os professores costumam lembrar do apoio dos estagirios (quando podem contar com eles) e, eventualmente, de alguns colegas (ao mesmo tempo de se queixam das panelinhas), assumindo talvez a falta de expectativa com relao equipe tcnica e ao trabalho coletivo. Os coordenadores, por sua vez, sentindo-se responsveis pela mediao na escola, referem-se a iniciativas pessoais: procuro uma relao de construo de idias, sou grande colaborador dos professores, preciso ter respeito pelo modo de trabalhar das pessoas, ouvir os professores e ter jogo de cintura. Pela fragilidade da dinmica de trabalho em equipe (os debates, o planejamento conjunto, a avaliao construtiva etc.) e de mecanismos operacionais de apoio ao professor (reunies conjuntas e no mesmo horrio, encontros por rea ou segmento etc.), cada um se sente como se estivesse carregando um pesado fardo e lidando aleatoriamente com as dificuldades: estamos sempre apagando incndio. 3.4 A construo da prtica pedaggica no ensino da lngua escrita Ao mencionar os desafios especficos no ensino da escrita, professores e coordenadores mais uma vez recorrem ao argumento da culpa. Retomando os discursos das dcadas de 60 e 70, eles atribuem suas maiores dificuldades aos alunos (indisciplinados, faltosos, desinteressados, sem prontido nem ajuda dos pais). Ao mesmo tempo, pensando nos problemas intra-escolares, culpam-se mutuamente pelas dificuldades no desenvolvimento do trabalho: os coordenadores falam de um professor sem interesse por novas idias, sem compromisso, que no acredita no projeto que est sendo apresentado a ele; o professor, por sua vez, volta a se referir ao sentimento de abandono na escola (sem algum para conversar sobre o trabalho, fica muito difcil). No cenrio de acusaes e autodefesas, fragilizam-se quaisquer iniciativas para articular esforos, dividir responsabilidades e operar cooperativamente na construo da prtica pedaggica. O plano institucional fica reduzido s subjetividades em um contexto cujas dinmicas de trabalho, fragmentadas, reducionistas e por vezes caticas, dependem mais das possibilidades de cada momento do que de um projeto educacional pensado luz da realidade dos alunos. Na considerao do que efetivamente fazem, os professores costumam relacionar indiscriminadamente atividades (leitura espontnea, reescrita, narrao de histrias, trabalho com diferentes portadores de texto) e materiais (cruzadinha, histria em quadrinhos, livros, jornais), buscando uma aproximao com as tarefas tipicamente construtivistas sem necessariamente fazer aluso aos seus princpios e critrios. Para os coordenadores, a nfase recai nas prticas de sondagem e avaliao em detrimento de tarefas como planejamento, discusso de diretrizes e acompanhamento do fazer dirio em sala de aula. Como reflexos das especificidades das funes de docncia e coordenao, os respectivos discursos fazem emergir o significado de uma oposio que, na prtica, desarticula o processo do produto, o fazer do aprender e o ensinar do avaliar. A despeito da objetividade e do foco dos depoimentos sobre a prtica, no h, contudo, uma clareza dos fundamentos do construtivismo. Na profuso de idias, ora de adeso ora de rejeio, o que fica evidente so as marcas da insegurana, m compreenso e at desconhecimento. Provenientes de outras reas que no a Pedagogia, alguns coordenadores se declaram leigos em alfabetizao. Entre os pedagogos, muitos duvidam da proposta (tenho muitos conflitos em relao ao construtivismo: ser to bom como dizem?) ou resistem a ela (Vejo que em classes de professores tradicionais as crianas escrevem mais). H os entusiastas que pouco compreendem a proposta ( a alfabetizao no global atravs de pequenos textos que no fica totalmente preso nas famlias), os que justificam a sua posio com base em argumentos vagos (Tanto professor como aluno tem mais liberdade para construir seus conhecimentos) ou empricos (Acredito nessa abordagem porque meus filhos foram alfabetizados atravs dela) e, finalmente, aqueles que, indecisos, apostam simultaneamente em diferentes propostas de trabalho (Como me, prefiro o tradicional e como professora o construtivismo, A teoria perfeita, mas h crianas que precisam do apoio do tradicional para aprender). Na prtica, esse conjunto de posicionamentos aparece em configuraes pedaggicas ditas eclticas (sou s 40% construtivista) que caminham ao sabor das possibilidades e sentimentos pessoais do professor e do coordenador: um verdadeiro convite reviso da lgica que rege os cursos de formao continuada! 4. Dimenses da formao continuada Reconhecer a relevncia da formao continuada e defend-la como uma necessidade para o aprimoramento da prtica pedaggica no garante necessariamente o envolvimento e a motivao dos educadores para participar desses cursos. A constatao desse aparente paradoxo nos leva a perguntar: afinal, o que querem os professores e coordenadores pedaggicos? Quais as dimenses de uma proposta bem sucedida de formao continuada? bem verdade que, na explicitao das expectativas, muitos educadores acabam por incorporar, consciente ou inconscientemente, o discurso da incompetncia profissional, da necessidade de suprir lacunas da m formao (Espero completar mais a minha formao), especialmente as relacionadas ao que mais valorizado nos estudos psicogenticos (Compreender as etapas de construo da escrita). No raro, o apelo formao tcnica se traduz nas exigncias estritamente prticas (Receber pautas prontas para as reunies com os professores, saber o que fazer com alunos que chegam na 5a srie e no esto alfabetizados). Mas para muitos as expectativas vo alm disso: eles querem tambm refletir, conhecer alternativas de trabalho, buscar bibliografias, discutir casos e, acima de tudo, sentirem-se valorizados e respeitados. Na lgica dessa demanda, o reducionismo das propostas estritamente tcnicas suplantado pela necessidade de abordagens mais profundas, capazes de integrar a complexidade da situao de ensino- aprendizagem. O sucesso das iniciativas de capacitao parece depender da relao, dialtica e dialgica, entre a conformao da proposta e as expectativas docentes. dialtica porque o professor reage sempre em conformao com a proposta de trabalho, esperando desde o incio que ela tenha sido forjada em funo de suas necessidades prticas. dialgica porque ele espera que esses encontros possam se constituir como projetos de negociao de idias e troca de experincias, uma alternativa para o isolamento profissional cristalizado na escola. Nesse sentido, possvel compreender as crticas feitas pelos educadores aos cursos muito tericos e sem contribuio para a prtica em sala de aula, que vem os professores como tbulas rasas. O aprofundamento na anlise das crticas, expectativas e avaliaes dos cursos permitiu delinear trs dimenses fundamentais e indissociveis para a formao continuada de educadores: a cientfica, a pedaggica e a humanizadora. A primeira diz respeito possibilidade de alicerar os educadores na construo de critrios para a promoo da segurana e da autocrtica a partir da compreenso profunda dos diversos aportes tericos relativos ao desenvolvimento, aos processos cognitivos e aprendizagem no contexto cultural. A segunda visa discutir diretrizes prticas para o planejamento, interveno e avaliao em sala de aula, em funo do perfil e das variveis da escola. Finalmente, a dimenso humanizadora merece ser projetada luz do grupo em questo. Nesse sentido, o curso de formao pode ser uma oportunidade para reflexo docente a partir da sua prpria trajetria e dos saberes construdos, pode tambm constituir-se como uma vertente formativa por favorecer o gosto pela leitura e o incitamento pesquisa (SIRLENE, 2005). Alm do estritamente pessoal, a dimenso humanizadora pode investir na compreenso das relaes na escola, seus mecanismos de funcionamento e poder em face do posicionamento profissional assumidos pelos educadores. preciso criar espaos para ouvir, compreender e negociar; lidar com as angstias e com as resistncias e, acima disso, com a disponibilidade para assumir as mudanas na escola. 5. guisa de concluso A compreenso ampla acerca da formao continuada de educadores permite-nos defender uma interveno que articule a atualizao terica, o delineamento das diretrizes pedaggicas e o reposicionamento pessoal e profissional do professor e do coordenador pedaggico no contexto da escola. Para superar a lgica empirista, que toma os professores na perspectiva do que lhes falta, pretendendo incutir neles a suposta competncia profissional, preciso investir no processo de formao institudo como espao dialgico de compreenso, escuta, conscientizao e recriao de significados. Nele, a palavra do professor, trazendo a realidade paradoxal da escola, os significados, as angstias e os mecanismos de resistncia plasmados na dinmica institucional, a mais significativa ferramenta para a o enfrentamento dos desafios da prtica pedaggica. No discurso dos professores e coordenadores pedaggicos, o confronto de posies relativas ao trabalho escolar e de expectativas de formao permite vislumbrar que a qualidade dos cursos no est na quantidade ou consistncia do que se pretende ensinar, mas na urdidura de relaes que favorecem novos olhares e posicionamentos crticos, criando inclusive espao para a apropriao de fundamentos tericos. Em outras palavras, no se trata de falar para os educadores sobre a educao, mas de falar com os professores construindo o processo educativo. A novidade no est no contedo em si, mas na reflexo que se pode fazer a partir das interaes, estudo coletivo e troca de experincias. Conduzidas na perspectiva humanizadora, o jogo de poder da escola, as frustraes difusas, os discursos defensivos e as queixas que necessariamente culpabilizam o outro podem dar lugar negociao de princpios coletivos para a transformao das prticas pedaggicas, reviso do ensino da lngua escrita e enfrentamento responsvel da no-aprendizagem. Enfim, nas relaes dialgicas significativamente tecidas ao longo dos encontros que se torna possvel negociar o difcil equilbrio entre o refletir, o aprender e o fazer para a (re) construo da escola. Referncias bibliogrficas: AZANHA, J. M. P. Comentrios sobre a formao de professores em So Paulo. Formao de professores. So Paulo: UNESP, 1994. BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem.So Paulo, Hucitec, 1988 CAGLIARI, L. C. Alfabetizao e lingstica, So Paulo, Scipione, 1989 CARRAHER e Ali. Na vida dez, na escola zero. So Paulo: Cortez,1988 COLELLO, S. M. G. A escola que (no) ensina a escrever. So Paulo: Paz e Terra, 2007 COLELLO, S. M. G. 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TAVARES DRIGHETTI O (Des) Encontro Com A Experiência Docente No Projeto Eliti (Ensino de Línguainglesa para A Terceira Idade) Efeitos Na Formação de Professores de Inglês