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A entrevista resume:
1) A psicopedagoga Alicia Fernández discute as abordagens às dificuldades de aprendizagem, criticando perspectivas organicistas e defendendo que o aprender ocorre no contexto das relações interpessoais.
2) Ela explica seu conceito de "inteligência aprisionada", onde problemas na aprendizagem refletem dificuldades nos ambientes familiar e educacional.
3) Fernández trabalha há 40 anos com psicopedagogia e vê um crescimento de abordagens medicalizantes, em contraste
A entrevista resume:
1) A psicopedagoga Alicia Fernández discute as abordagens às dificuldades de aprendizagem, criticando perspectivas organicistas e defendendo que o aprender ocorre no contexto das relações interpessoais.
2) Ela explica seu conceito de "inteligência aprisionada", onde problemas na aprendizagem refletem dificuldades nos ambientes familiar e educacional.
3) Fernández trabalha há 40 anos com psicopedagogia e vê um crescimento de abordagens medicalizantes, em contraste
A entrevista resume:
1) A psicopedagoga Alicia Fernández discute as abordagens às dificuldades de aprendizagem, criticando perspectivas organicistas e defendendo que o aprender ocorre no contexto das relações interpessoais.
2) Ela explica seu conceito de "inteligência aprisionada", onde problemas na aprendizagem refletem dificuldades nos ambientes familiar e educacional.
3) Fernández trabalha há 40 anos com psicopedagogia e vê um crescimento de abordagens medicalizantes, em contraste
Data da Entrevista: 01 Agosto, 2011 Entrevistado(a): Alicia
Fernandez Entrevistador(es): Luiza Oliva
A especialista argentina completa 40 anos de psicopedagogia e analisa
importantes questes que envolvem as dificuldades de aprendizagem.
A psicopedagoga argentina Alicia Fernndez foi uma das precursoras da
psicopedagogia no Brasil e responsvel pela formao de parte dos profissionais da rea em nosso pas. autora de Os idiomas do Aprendente, O Saber em jogo, A Inteligncia Aprisionada e A Mulher escondida na professora (todos pela Artmed) e de Psicopedagogia em Psicodrama morando no Brincar (Editora Vozes). A especialista estar no Simpsio Internacional de Psicopedagogia - Instrumentos diagnsticos e interveno: novas prticas psicopedaggicas, realizado pela ABPp, dias 5 e 6 de setembro em So Paulo, ministrando o curso Autorias Vocacionais. De Buenos Aires, onde diretora da Escola Psicopedaggica de Buenos Aires, Alicia concedeu esta entrevista Direcional Educador, onde analisa questes que envolvem os problemas de aprendizagem.
DIRECIONAL EDUCADOR - Como a senhora pode definir as
dificuldades/problemas de aprendizagem? ALICIA FERNNDEZ - Antes de falarmos de dificuldades ou problemas, devemos falar de capacidades e possibilidades. Somente assim poderemos realizar duas tarefas: primeiro, tratar dos problemas e segundo, o que mais importante, evitar que apaream. A aprendizagem no um meio para se obter outra coisa. um fim em si mesmo. Ns humanos nascemos carentes. Somos os mais indefesos da espcie animal. O filhote humano se faz humano graas aprendizagem. Esta fraqueza instintiva orgnica seu grande potencial. Porque, como todo beb nasce imaturo biologicamente, sem os mnimos recursos prprios para sobreviver, precisa de outro humano que o ensine, que o reconhea como semelhante, que queira e que acredite que pode aprender. Todo aprender problemtico, porque inclui, no mnimo, trs sujeitos: o aprendente, o ensinante e o sujeito social (a sociedade na qual est inserido). No o organismo que aprende, ainda atividades quase biolgicas como o caminhar, o controle dos esfncteres, o comer sozinho; para serem adquiridas no requerem apenas um organismo sadio, e sim, principalmente, uma aprendizagem. Aprendizagem que ocorrer de acordo com o ambiente, mais ou menos favorvel no qual a criana se desenvolve. Quer dizer, se falamos de dificuldades de aprendizagem, falamos de dificuldades no ou para o meio familiar, e ou educativo/ ensinante.
Como o meio interfere nos problemas de aprendizagem?
A palavra interferir diferente de intervir. O meio sempre intervm, e s vezes pode interferir. Que quero dizer com isto? Inter-vir (vir entre). Inter- ferir (ferir entre). Maravilha dos nossos idiomas. Nossa tarefa consiste em intervir e conseguir que o meio no interfira, negativamente. Como estvamos dizendo, no se pode esquecer do diagnstico do meio, do ambiente, quando realizamos um diagnstico psicopedaggico. A partir desta idia central, eu escrevi meus dois primeiros livros: A inteligncia aprisionada, nele trago fundamentos de como a famlia pode ser possibilitadora ou produtora de problemas de aprendizagem dos filhos, e deste modo, estruturo um modelo de diagnstico interdisciplinar familiar, que venho utilizando em diversos pases. E no meu segundo livro traduzido em portugus, A mulher escondida na professora, explico e fundamento o lugar e a importncia dos professores, tanto como agentes de sade na aprendizagem, como s vezes (ainda que sem propor a s-lo) como desencadeadores de problemas de aprendizagem. A escola, e todos os seus atores, tm um papel subjetivante em relao aos alunos. Ns, humanos, aprendemos a partir de identificaes com nossos ensinantes, e somente em um ambiente familiar, e depois, no escolar e social, que nos aceite como seres pensantes. Quero dizer, que permita e favorea nossas perguntas, d lugar diferena, em sntese, que favorea a autoria de pensamento. A inteligncia se constri, a atividade de pensamento se constri, como tambm a ateno e a capacidade de se prestar ateno.
Como a senhora entende a abordagem organicista a respeito das
dificuldades de aprendizagem? As tendncias patologizao dos avatares da aprendizagem se acrescentam, promovidas pela indstria farmacutica e pela difuso das notcias pela mdia. Sem dvida, tal discusso no teria o xito alarmante que est tendo, se no se sustentasse nas formas de subjetivao impostas pela sociedade do mercado globalizado. Preocupa-nos a inquietante proliferao de posturas que no s psicopatologizam e medicalizam os mal estares psquico-sociais, como tambm consideram suspeita e at perigosa a prpria atividade da alegria e o brincar, desvitalizando a autoria de pensamento. Quanto se trata de crianas e da aprendizagem, tal tendncia encontra fceis adeptos e propulsores em professores e pais aprisionados pelas lgicas da competitividade, pela eficincia (que mata a eficcia) e pelo cumprimento imediato para se chegar a um fim exitoso, sem considerar os meios para se alcan-lo. A aprendizagem perde assim seu carter subjetivante fim em si mesmo - para transformar-se em um triste meio para obter um resultado exigido pelo outro. A atividade de pensar fascinante. Como se produz a maravilhosa e transformadora atividade de pensamento? A fbrica de pensamentos no se situa nem dentro, nem fora da pessoa, est localizada entre. Entre, em psicopedagogia, no uma palavra a mais, um conceito. A atividade do pensar nasce na intersubjetividade promovida pelo desejo de se fazer prprio que nos desconhecido, mas tambm nutrida pela necessidade de entendermos e que nos entendam. O pensar, ademais, se alimenta do desejo de que este outro nos aceite como seu semelhante. Desejos, aparentemente contraditrios, mas que juntos vo armando a trama do nosso existir em sociedade. Entendendo assim a atividade do pensar, poderemos encontrar outros caminhos para a construo de regras. A funo do pensamento em seu sentido mais radical tem a ver com superar a racionalidade pragmtica. A sustentao do pensar se d naquilo que se quer alcanar e no no que est dado. Definimos a inteligncia como a capacidade de desadaptar-se criativamente. Quando o modo de pensar perde a provisioriedade necessria a todo o pensar, as observaes descritivas e particulares so utilizadas como se fossem explicaes gerais. O devastador de tal modo de pensar abrange no somente os sujeitos observados, e assim transformados em objetos, como tambm a quem pretendemos diagnosticar. As perturbaes na aprendizagem expressam uma mensagem que sempre singular. O rtulo esconde a mensagem que est entrelaada no drama singular de cada criana ou jovem. A abordagem clnica consiste na explorao desta dramtica.
Pode explicar o conceito de aprisionamento da inteligncia?
A inteligncia se constri. No nascemos inteligentes, nascemos com a possibilidade de sermos inteligentes, quer dizer, de podermos eleger nosso destino. A maioria das crianas diagnosticadas como deficientes mentais, no o so. Sua inteligncia encontra-se aprisionada. Quando, 20 anos atrs, publiquei o livro A inteligncia aprisionada, a indstria farmacutica no havia penetrado nas escolas do modo que ocorre hoje, e os efeitos devastadores do neoliberalismo no colonizavam as mentes de tantos profissionais como na atualidade, portanto no considerava urgente denunciar a medicalizao das crianas. Ademais, o pretendido carter orgnico e hereditrio da inteligncia j estava suficientemente questionado pela epistemologia gentica, pela psicanlise, pela sociologia da educao e pela psicopedagogia. Apoiando-me nestes saberes, que contextualizam a inteligncia humana em um sujeito inserido em um meio familiar e social, pude explicar os possveis e diferentes aprisionamentos de que padece a mesma. A partir destes aportes tericos e clnicos consegui propor outros modos de diagnosticar a capacidade intelectual frente a aqueles que pretendiam faz-lo atravs de cocientes intelectuais (CI) e percentuais. Em sntese, sobre a atividade intelectual estavam ento (e esto agora) suficientemente estudadas uma srie de questes: que a inteligncia se constri; que tal construo nasce e cresce na intersubjetividade - pelo que no pode explicar-se do ponto de vista neurolgico - e que os meios ensinantes (familiares, educativos e sociais) participam favorecendo ou perturbando a capacidade de pensar. Quer dizer, para questionarmos os modos institudos de pensar a inteligncia, contvamos ento com teorias que desde o sculo XX vinham rebatendo as idias de pocas anteriores que a consideravam uma funo orgnica. A situao varia quando se trata de pensar a atividade atencional. Os diagnsticos de dficit de ateno se realizam sobre supostos (no explcitos) que desconhecem os avanos produzidos no sculo XX em relao aos estudos da subjetividade humana e da inteligncia. Assim, atualmente se definem tipos de ateno de modo semelhante ao determinado pela psicologia experimental do sculo XIX. Necessitamos analisar a ateno aprisionada, para diferenci-la da desateno reativa (e a ambas dos poucos casos de dano neurolgico que comprometem a ateno). Hoje urgente trabalhar e estudar a capacidade atencional como aquilo que : uma capacidade. Partindo desta postura, a psicopedagogia pode fazer importantes aportes.
H quantos anos trabalha com a psicopedagogia? Pode fazer um breve
histrico de como iniciou na rea? E como v a evoluo da psicopedagogia nesse perodo? Neste ano completam-se 40 anos que desenvolvo a maravilhosa atividade da psicopedagogia. Fazer psicopedagogia uma atividade que no somente nos permite, como tambm exige fazermos por ns mesmos, o que podemos fazer pelos outros. A exigncia de fazer por ns mesmos se refere a ir re- significando nossas prprias modalidades de aprendizagem/ensinagem, e ir nutrindo as fontes propiciadoras de nossa prpria autoria de pensamento. Uma destas fontes a alegria que vem de mos dadas com a capacidade de surpreender-se. Voc me pergunta como iniciei minha carreira. Na Argentina, a psicopedagogia uma formao que ocorre na graduao. Eu comecei trabalhando como orientadora educacional em escolas de regies carentes, as quais me serviram como uma grande aprendizagem, j que ao mesmo tempo em que estudava na faculdade, podia receber as perguntas que aquela realidade educativa colocava a professores e alunos.
Como v o futuro da psicopedagogia? H exageros na questo do
encaminhamento psicopedaggico? Um dos aspectos da subjetividade mais atacado pela sociedade neoliberal a possibilidade de pensar. Este ataque lento, persistente e perigoso. Vai se dando imperceptivelmente. Jovens e adultos o sofremos. Na escola se evidenciam os efeitos de tal bombardeio. Nos alunos se manifesta como um aborrecimento-tdio e pode expressar-se como desateno. Nos docentes pode aparecer como desnimo e queixa-lamento. Portanto o futuro da psicopedagogia depende da postura que cada psicopedagogo pode ir construindo, quer dizer, priorizando a sade da aprendizagem tanto nas escolas, nas famlias e nos meios de comunicao. Esta a tarefa principal. Encaminhar uma criana ou jovem a um tratamento s uma ltima instncia. A psicopedagogia tem muito que contribuir se conseguir ser fiel proposta psicopedaggica da sade. Em sntese, frente nossa inteligncia aprisionada, a tarefa a de cada um de ns, como ensinantes e aprendentes, passa por: o autorizar-se a pensar; o permitir-se perguntar, o perguntar, o deixar espao imaginao e ao prazer de aprender; e, em conseqncia, ao prazer de ensinar.
Matria publicada na Revista Direcional Educador - edio 43 de
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