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RESENHA DO CURSO DE ESTÉTICA - O COMBATE DE CRONOS E ORFEU

Raphael Vilani Domiciano


Os ensaios de Jean Jacques Nattiez compreendem uma ampla gama de assuntos:
só nesta coletânea, o autor discute o conceito de Tempo em Glenn Gould, a atualidade da
estética de Hanslick, uma análise da peça Répons, para 24 instrumentistas e seis solistas,
de Pierre Boulez, entre outros temas. Apesar de toda sua variedade, todos os trabalhos de
Nattiez têm algo em comum: o mesmo modelo teórico, o modelo tripartite de semiologia
musical.
Entendendo a semiologia como o estudo de formas simbólicas -'forma' no sentido da
realidade material de uma obra de arte, de uma partitura, de um enunciado linguístico…-, a
tripartição substitui o modelo clássico da comunicação (descrita por uma linha direta entre
Emissor, Mensagem e Receptor) para um modelo em que a forma simbólica assume
centralidade de dois processos: 1) Como resultado de um processo poiético, de elaboração
e criação desta forma simbólica; 2) Como ponto de partida de um processo estésico, de
interpretação e de reconstrução de uma mensagem a partir de sua realidade material. Esse
modelo pode ser representado no seguinte esquema:

A partir desta tripartição, Nattiez propõe seis tipos de situações analíticas que
relacionam os três pólos do Poiético, o Neutro (ou Imanente) e o Estésico. Essas seis
situações são pensadas para análises empíricas de uma partitura, por exemplo. A primeira
situação analítica é uma análise exclusiva do pólo Neutro, em que procura-se entender as
configurações de uma obra de uma forma descritiva, sem tentar deduzir seu processo de
criação. As análises poiético indutiva e poiético externa relacionam os pólos do Imanente e
do Poiético de formas complementares: a primeira tenta deduzir qual foi o processo criativo
a partir da análise do vestígio material; a segunda utiliza-se de rascunhos e materiais do
compositor para explicar o material que resultou do processo poiético, muitas vezes
confirmando ou completando aquilo que foi deduzido na situação anterior. As análises
estésico indutiva e estésico externa relacionam os pólos do Imanente e do Estésico: a
primeira cria uma percepção "ideal" que a própria peça, aos olhos do analista, parece
propor; a segunda, no entanto, se aproxima da psicologia cognitiva, e depende de
experimentos empíricos para testar como um determinado grupo de pessoas escuta e
entende determinada obra. A última situação ocorre quando os três pólos são igualados,
chamada de comunicação musical; o autor exemplifica essa situação com as análises de
Schenker em que "o autor pretende se apoiar nos esboços de Beethoven para afirmar que
suas análises indicam como as obras devem ser tocadas e percebidas"(Nattiez, 2014)
Além de serem capazes de produzir situações analíticas bastante prolíficas, os
conceitos da tripartição podem ser tomados fora do contexto de uma análise musical
empírica e serem usados para discussões estéticas/filosóficas. É o caso do Capítulo 5 do
'Combate entre Cronos e Orfeu', em que o autor discute o pensamento de Hanslick e os
limites da imanência.
Analisando as proposições do Belo Musical em Hanslick, Nattiez identifica uma
tentativa de criar uma concepção de Belo Imanente, puramente formal, que independe da
sua criação e de sua percepção, ou seja, independe de seu aspecto poiético e estésico.
Construindo um sistema que caracteriza o pensamento de Hanslick, Nattiez resume seu
discurso em dois níveis, uma Posição Empírica: "Na música, conteúdo é a forma" e uma
Posição Estética Normativa: "O Belo reside na própria forma musical".
Os dois níveis de discurso de Hanslick, paradoxalmente com sua proposta do Belo
Independente, mostram que não é possível pensar a imanência formal sem passar pelo
poiético e pelo estésico, já que, para Nattiez, a Posição Empírica e a Posição Normativa de
Hanslick o obriga a reconhecer o papel que os compositores e os ouvintes exercem no fato
musical. De fato, o crítico se vê obrigado a dedicar muito de seu ensaio para descrever a
posição do compositor e do ouvinte.
O compositor, para Hanslick, apesar de experimentar sentimentos ao criar, tem a
atividade essencial de imaginar uma forma, "sua mente encarna-se diretamente nos sons"
(Hanslick, 1989), portanto, os sentimentos do ato da criação não são reconhecíveis durante
a apreciação da obra. Hanslick reconhece aqui uma autonomia na obra musical, já que não
considera necessário conhecer a poiética da obra para compreendê-la.
Do ponto de vista do ouvinte, Hanslick não nega que os sentimentos possam surgir
da escuta, mas o Belo deve ser procurado além das impressões sensoriais, na própria
forma. A percepção, portanto deve-se elevar à contemplação pura da forma, já que "o Belo
não pode repousar sobre o sentimento, pois deve estar baseado sobre o único e o
intangível" (Nattiez, 2005).
O que interessa Nattiez sobre o pensamento de Hanslick é a atualidade, "não de
suas respostas, mas de seus questionamentos"(Nattiez, 2005); o principal deles sendo
"qual o grau de autonomia da obra em relação ao compositor e ao ouvinte"? Já que
Hanslick teve que esvaziar o poiético e o estético para tentar isolar o Belo, isso prova, para
Nattiez, que o Belo está ligado a ambos. A conclusão que o autor chega é que, mesmo que
a forma imanente seja fundamental, ela não é suficiente; e é onde Hanslick depara-se com
os limites da autonomia: "não há música sem forma, mas também não há música sem
alguém para criá-la, interpretá-la e escutá-la" (Nattiez, 2005)

Outro uso da tripartição para uma discussão estética acontece no capítulo seis do
mesmo livro, em que Nattiez aborda a questão do juízo crítico, interpretação e
autenticidade.
Para Nattiez, os três pólos da tripartição dividem diferentes posições do que é a
perspectiva autêntica de uma interpretação.
O primeiro caso corresponde à tradição dos historiadores da música que defendem
que exista uma significação: aquela concebida pelo compositor. Essa posição
hermenêutica é exemplificada por excelência pela frase de Harnoncourt "Uma interpretação
só será fiel se traduzir a concepção do compositor no momento da composição". Na
perspectiva da tripartição, essa concepção de autenticidade está claramente ligada à
pertinência do pólo Poiético.
O segundo caso corresponde a uma hermenêutica estruturalista, que pensa que o
sentido da obra deve estar na organização da obra, independente do contexto em que
foram criadas ou em que são ouvidas. O enfoque dessa posição está no pólo Neutro da
tripartição.
O terceiro caso corresponde a uma mudança de perspectiva para o ponto de vista
do ouvinte, ou seja, para uma autenticidade estésica. Essa terceira posição pode, ainda, ser
subdividida em dois grupos. O primeiro grupo caracteriza-se por uma negação do poiético e
não acredita em qualquer tipo de fidelidade; é o caso de Boulez, quando questiona "O que é
realmente a fidelidade? Seria o respeito ao transitório? Ou seria considerar a obra como
eterna portadora de novas verdades?". O segundo grupo acredita em autenticidade, mas
esta está ligada à atitude do intérprete, independente do universo composicional "Desde
que saibamos o que queremos e o que não queremos, agimos segundo valores e não
estamos envoltos em um nevoeiro. Temos autenticidade"
O quarto e último caso corresponde ao que o autor caracteriza como 'diálogo'. Essa
posição tem sua ênfase no pólo estésico mas reintroduz o domínio poiético para resgatar as
intenções do compositor (através da pesquisa histórica) e transportá-las para os tempos de
hoje "em busca do que Mozart ainda têm a nos oferecer".
O autor examina essas posições e destaca suas limitações: A concepção poiética e
historicista peca pois sabemos que toda reconstrução do passado é limitada à uma seleção
de fatos; além disso, a 'verdade' do compositor nunca é única, as estratégias de
composição são sempre múltiplas e complexas de mais para ser definidas como uma só. A
segunda posição é mais problemática pois tenta excluir tanto o ouvinte quanto o compositor
da música, e como já foi dito a respeito de Hanslick, não há música sem alguém para criá-la
e para escutá-la. As concepções de autenticidade através do estésico são limitadas por
negarem que exista alguma intenção do compositor, mesmo que ela esteja toda contida no
texto musical. A posição do diálogo traz os mesmos problemas de reconstrução histórica da
primeira posição e ainda sugere que a cultura contemporânea seja incapaz de discutir os
próprios problemas seja obrigada a recorrer ao passado, como em um estado de crise
cultural.
Nattiez, então, diante das limitações das posições até então investigadas, esboça
uma quinta perspectiva de autenticidade: pluralista, construtiva e semiológica. Pluralista
pois admite que as significações na música são múltiplas. Construtivista pois entende que a
interpretação e enunciações de juízo crítico são formas simbólicas elas mesmas e que
modificam nosso paradigma cultural e intelectual. Semiológica pois circula entre os três
pólos da tripartição sem cair em um reducionismo limitante das posições anteriores.

As discussões da estética de Hanslick e do juízo crítico foram aqui bastante


resumidas para que se pudesse demonstrar a capacidade das aplicações da semiologia
musical tripartite e como, através da articulação dos conceitos de poiético, estésico e
neutro, Nattiez consegue se aprofundar nos mais diversos problemas musicais. A pequena
variedade de assuntos que foram mencionados neste trabalho ainda não fazem jus à
quantidade de problemas diferentes que o autor trata em toda sua obra, mas servem como
demonstração de como a semiologia funciona e como consegue dar conta da complexidade
do funcionamento da música.

Referência Bibliográfica:
HANSLICK, Eduard. Do Belo Musical. Um Contributo para a Revisão da Estética da Arte dos Sons.
Trad: Artur Mourão, Lusofiapress, 2011.
NATTIEZ, Jean Jacques. O Modelo Tripartite de Semiologia Musical: O Exemplo de L'Cathédrale
Engloutie de Debussy. Revista Debates n. 6, 2014
____________________. O Combate entre Cronos e Orfeu. Ensaio de Semiologia musical aplicada.
Via Lettera, 2005

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