Вы находитесь на странице: 1из 13

AIYÓ, AIYÓ1: PELA AFIRMAÇÃO DA EPISTEMOLOGIA

AFRICANO BRASILEIRA NA CONTEMPORANEIDADE

Analia Santana2

Resumo: Este artigo versa sobre a possibilidade da afirmação, da Epistemologia


Africano Brasileira, tomando com base nos valores civilizatórios construídos
milenarmente pelos vários povos negros do continente africano nas Américas. Sem com
isso, excluir outras epistemologias já consagradas. Tomamos como referências para
reflexões os estudos de (CÉSAIRE, 1987) (LUZ, 2007) (APPIAH, 1997), (SOUZA,
1983), (MUNANGA, 2009), (SODRÈ, 1999) etc., para discutir raça e negritude.
Através do conhecimento de outras verdades que foram negligenciadas pela
historiografia oficial pode-se, com a educação minimizar os sofrimentos psicológicos e
resquícios do colonialismo que ainda persistem em recalcar e estereotipar negros e
afrobrasileiros. Nesse contexto, temos a aiyó de reconhecer, que pressupostos da
epistemologia Africano Brasileira resistem, e se reelaboram nas relações sociais e
culturais construindo africanias. Mesmo conservando uma África mítica que se
ressignifica constantemente, mas também dialogando com as Culturas Africanas reais.
Palavras-chave: Epistemologia, Raça, Negritude, Africano, Brasileira.

INTRODUÇÃO
“Negro (a) sou,
Negro (a) ficarei!”(Césaire, 1987).

O diálogo permanente com os tempos históricos nunca foi tão necessário quanto
na contemporaneidade. Quando busco inspiração em Aimé Césaire para iniciar esta
reflexão, tento articular a possibilidade da coexistência de pensamentos múltiplos,

1
Aiyó palavra da Língua Africana Yorubá que significa alegria. Aiyó, Aiyó ( Alegria, Alegria), termo
usado por Marco Aurélio Luz na conclusão do livro OBA BIYI( O REI NASCE AQUI). Trabalho final
da Disciplina Epistemologia Africano Brasileira do Mestrado em Educação e Contemporaneidade Linha I
Educação, Processos Civilizatórios, Memória e Pluralidade Cultural da Universidade do Estado da Bahia
(UNEB), tendo como professora a Profª. Drª. Narcimária do Patrocínio Luz.
2
Pedagoga, Especialista em História e Cultura Afrobrasileira e Africana, Mestranda do Programa de
Educação e Contemporaneidade UNEB linha I, Membro do Núcleo de Estudos em Línguas e Culturas
Africanas (NGEALC) UNEB, Membro da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
do Pelourinho e Professora da Rede Municipal de Ensino de Salvador. Email:
nalsantana33@hotmail.com, nalsantana33@gmail.com
formas simbólicas, narrativas infinitas de seus lugares de origem. Ser negra e afirmar
esta pertença exigem estratégias diversas que são ressignificadas cotidianamente.
A elaboração/reelaboração de outras verdades ou alternativas de visão de mundo
que não estejam necessariamente enquadradas na estrutura eurocêntrica ou
estadunidense faz necessário nas Américas para que ampliemos nossa perceptividade, e,
nos neguemos à subalternidade que o colonialismo nos impôs. A estrutura que se afirma
global nos fragmenta, mas os valores da epistemologia Africano Brasileira buscam
ressignificar nossa alteridade.
Não nego a importância dos grandes clássicos da modernidade. Mas, como bem
nos afirma Fanon (1983), os grandes clássicos da modernidade Hengel, Marx, etc., não
podem fazer-nos esquecer de nossa negrura ou negritude. Porque são os valores
indígenas e africanos, como também outros a eles aproximados que explicam nossa
existência.
Os aspectos históricos, culturais, políticos, éticos, institucionais, relações
interpessoais, simbologias e etc., podem ser interpretados pelos vários paradigmas que
coexistem. Embora isso não seja tarefa fácil, nessa sociedade onde só são valorizadas as
interpretações que tomam como base as epistemologias europeias e americanas. Nesse
contexto, afirmar as narrativas míticas negras são imprescindíveis para a construção de
outras linguagens epistêmicas e territorialidades na perspectiva de propiciar diferentes
compreensões com mais significados, sentidos e valores.
Deixo claro que não queremos negar as contribuições de vários povos para
construção científica, cultural e histórica do mundo plural que vivemos, contudo vale
enfatizar que:
(...) Podemos reconhecer que a verdade não é propriedade de nenhuma cultura;
devemos nos apoderar-nos das verdades de que precisamos onde quer que
encontremos. Mas, para que as verdades se transformem na base da política
nacional e, em termos mais amplos, da vida nacional, há que se acreditar nelas,
e saber se as verdades que retiramos do Ocidente serão ou não dignas de
crédito depende, em grande medida, de como consigamos administrar as
relações entre nossa herança conceitual e as idéias que correm a nosso
3
encontro, vindas de outros mundos ( APPIAH , 1997, p.21).

3
Kwame Anthony Akroma-Ampim Kusi Appiah, é um dos principais filósofos africanos reconhecidos
na contemporaneidade. De etnia Achante atual República de Gana. O livro Na Casa do Meu Pai A África
na filosofia da cultura se constituí em uma importante obra por sua interdisciplinaridade, clareza e
propriedade no trato das temáticas.

Africanias.com, 03 (2012). Página 2


A afirmação de valores herdados das civilizações e povos negros africanos
transplantados para as diásporas através do processo escravocrata e/ou colonizados no
próprio continente pelos povos europeus sempre foi uma luta constante lá e em terras
brasileiras. Na contemporaneidade eles se tornam instrumentos de liberdade de
pensamento, de reconstrução da identidade africana e afrobrasileira, de combate às
várias formas de discriminação e racismo e de intolerâncias religiosas. “O problema não
se limita aos negros que vivem entre brancos, mas sim dos negros explorados,
escravizados, humilhados por uma sociedade capitalista, colonialista e ocidentalmente
branca...” (FANON, 1983, p.164).
Os estudos de (SOUZA, 1983, p. 10) dão conta que:
A violência racista subtrai a possibilidade de explorar e extrair do pensamento
todo o infinito potencial de criatividade, beleza e prazer que ele é capaz de
produzir. O pensamento do sujeito negro é um pensamento que se auto-
restringe. Que delimita fronteiras mesquinhas à sua área de expansão e
abrangência, em virtude do bloqueio pela dor de refletir sobre sua própria
identidade.
Assim, a reconstrução de valores africanos e afrobrasileiros é uma necessidade
para restabelecer a ancestralidade dos (as) negros (as). Porque, ampliando nosso
pensamento para além do reducionista eurocêntrico que nega outras possibilidades de
emancipação identitária dos povos negros, perceberemos outras formas de ser e está no
mundo para que possamos desfrutar da tão sonhada alteridade civilizatória.

Situando raça e negritude

Sabe-se que embora a noção de raça já existisse desde o século VIII, foi a partir
do século XVI que ele foi construído ideologicamente, os pressupostos das ciências
naturais o fizeram como marcador das diferenças entre os seres humanos. Essa
ideologia se propagou no mundo acadêmico e diversos estudos e esquemas foram
utilizados para classificar, hierarquizar e diferenciar os grupos humanos. O fenótipo
negro foi igualado a escravo. Assim, durante quatro séculos o termo “raça” foi
reelaborado pela metafísica religiosa e científica.
Em princípio “raça” concebia espécies humanas distintas, em seguida, tomando
como parâmetro os estudos da medicina a partir da medida do cérebro, tentavam
justificar a dominação dos povos colonizados através da “inferioridade racial”. A “raça
branca” européia era o referencial de “superioridade racial” em detrimento da “raça

Africanias.com, 03 (2012). Página 3


negra”. Nesse contexto, Os aparatos tecnológicos, o Cristianismo, as Ciências Sociais e
Bíblia também serviram como base no século XIX para alimentar e difundir mundo
afora as concepções social de “raça”. Estudos como os de (GOBENEAU, 1854),
(RODRIGUES, 1932).
Já no século XX, o termo “raça” foi associado á cultura e também ampliado para
eugenia onde foram exterminados milhares de judeus em nome da “pureza da raça
ariana”. Raça e racismo se articularam para a exclusão dos povos negros escravizados e
colonizados nas mais variadas maneiras. No Brasil as teorias raciais se propagaram nos
estudos médicos de Nina Rodrigues e na democracia racial de Gilberto Freire as quais o
estado brasileiro materializou e institucionalizou suas ações. O racismo que, “através da
estigmatização da cor, amputa a dimensão de prazer do corpo negro, também perverte o
pensamento do sujeito privando-o da possibilidade de pensar o prazer e do prazer de
funcionar em liberdade” (SOUZA, 1983, p. 8).
É lícito afirmar que o racismo foi elaborado ideologicamente e se apresenta de
várias formas na contemporaneidade, escamoteado nas objetividades e subjetividades
das relações cotidianas da sociedade brasileira. (SODRÉ 1999), apoiado nos estudos de
Taguieff (1988) elenca quatro categorias de racismo. São elas:
1-Racismo universalista de tipo espiritualista- enunciado básico: as raças
evoluem e tornam-se superiores na razão direta do processo civilizatório.
2-Racismo universalista do tipo biomaterialista- enunciado básico: há raças
atrasadas e raças adiantadas, cabendo ás ultimas posição superior numa
escala hierárquica entre homens.
3- Racismo diferencialista de tipo espiritualista enunciado básico: as
identidades espirituais das raças ou mesmo dos grupos humanos são
radicalmente diferentes e impermeáveis umas ás outra, não havendo
aproximação cultural possível.
4-Racismo diferencialista de tipo biomaterialista - enunciado básico: a
miscigenação ou cruzamento interracial viola as leis naturais, já que não há
hibridação aceitável entre raças humanas (SODRÉ, 1999, p.195).

O estudioso (MOORE, 2010, p.8) no livro Discurso sobre a Negritude de Aimé


Césaire, fala que “raça e racismo (grifos do autor) foram erigidos pelos não negros em
uma metaconsciência totalizadora, definidora do humano em termos tautológicos,
maniqueístas e essencialistas, como fruto de uma metavisão hegemônica”.
Para o padre afroamericano Crummell (1860’s) a “raça” era o único conceito
que podia explicar o Continente Africano, pois, esse continente era a “pátria da raça
negra”. Suas idéias se legitimavam porque ele falava também como negro e foi
inaugurador do discurso do Panafricanismo. O que explicava a unidade da África era
ela ser a pátria dos negros (Appiah, 1997, p. 22).

Africanias.com, 03 (2012). Página 4


Deixo claro que nós negros reconhecemos todas as mazelas que os povos
considerados “brancos” fizeram contra as populações negras, negroides e ameríndios.
Uma vez que nossos antepassados e nós fomos/somos colaboradores. (SOUZA, 1983,
p. 4) confirma bem as nossas percepções quando salienta que:
O negro sabe que o branco criou a inquisição, o colonialismo, o
imperialismo, o antissemitismo, o nazismo, o stalinismo, e tantas outras
formas de despotismo e opressão ao longo da história. O negro sabe também
que o branco criou a escravidão e a pilhagem, as guerras e as destruições,
dizimando milhares de vidas. O negro sabe igualmente que, hoje como
ontem, pela fome de lucro e poder, o branco condenou e condena milhões e
milhões de seres humanos a mais abjeta e degradada miséria física e moral.

Não nos eximimos de uma parcela de culpa nesses episódios, porque de certa
forma quando aceitamos os processos exploratórios em nome da convivência
“pacífica” delegamos aos outros o direito de liberdade, alteridade e mudança. As lutas
foram muitas, mas fragmentadas, assim, a coesão dos resultados nunca foi possível.
Mesmo porque a diversidade de povos negros tanto na África quanto na diáspora é
imensa.
A UNESCO após a segunda Guerra Mundial propôs uma alternativa para
designar grupos humanos que compartilham uma cultura, língua, memória e valores e
patrimônio histórico é etnia ou grupos étnicos ou sociedades como muitos estudiosos
preferem designar. Mas raça sobrevive sendo problematizada nas relações sociais tanto
nas lutas por equidade de direitos, empreitadas pelos movimentos negros como nos
embates teóricos, sociais e pessoais nas mais diferentes formas de racismo ou
manutenção de privilégios para os ditos brancos.
No entender de (SODRÉ, 1999, p. 194), “falar-se de ‘raça’ só é admissível como
noção culturalmente (e jamais biologicamente) marcada, donde a possibilidade da
‘relação racial’, isto é aquela caracterizada por dissimetria nas relações hierárquicas e
simbólicas entre seres humanos em virtude das diferenças fenotípicas”.
O termo negritude problematizado desloca o foco do termo “raça”, inaugurando
outras possibilidades de entender a trajetória dos povos negros no continente e na
diáspora. Negritude, inaugurado por Aimé Césaire em 1950, mas experienciado pela
Revolução do Haiti em São Domingos (1791/1804), pela Rainha Nzinga de Matamba e
pela Profetiza Kimpa Vita no antigo Reino do Congo tem grande significação para a
epistemologia Africano Brasileira.
Os anos de 1970 foram importantes para definição do termo Negritude como
conceito ideológico no entender de Munanga (2009). Para ele as interpretações

Africanias.com, 03 (2012). Página 5


ambíguas: ora mítica, ora ideológica de diferentes formas foram elaboradas no
continente africano e na diáspora. Muitas foram as reelaborações, mas a maioria dos
grandes pensadores concordam que a luta dos povos negros contra o racismo sempre
foi justa e legítima.
Nesta perspectiva, Césaire (1987) como criador e defensor da Negritude é quem
melhor elabora sua noção.
A Negritude, aos meus olhos, não é uma filosofia.
A Negritude não é uma metafísica
A negritude não é uma pretensiosa concepção do universo.
É uma maneira de viver a história dentro da história; a história de uma
comunidade cuja experiência parece em verdade singular, com suas
deportações de populações, seus deslocamentos de homens de um continente
a outro, suas lembranças distantes, seus restos de culturas assassinadas
(CESAIRE, MIAMI, 1987, p.3).

Partindo do pressuposto acima, vale ressaltar que os conhecimentos construídos


a cerca do continente Africano, a exemplos das antigas migrações humanas, os grandes
impérios, os reinos, a invenção do ferro, as primeiras organizações políticas, um celeiro
de religiosidades, de rotas comerciais e de produções diversas, são basilares para
entendermos a humanidade. Não podemos apenas aceitar as verdades européias, mas
também, buscar outras fontes que ampliem nossa visão de mundo para a reconstrução de
um conhecimento mais plural que contemple os processos civilizatórios dos cinco
continentes.
Para (MUNANGA, 2009, p. 54 apud DIOP, 1979; OBENGA, 1973) os estudos
negros são imprescindíveis por que:
Os historiadores negros africanos esmiúçam os grandes impérios e reinos de
ontem, mostrando a África negra não como uma tabula rasa, e sim como um
teatro de brilhantes culturas e civilizações, cujos atuais vestígios desmentem
as teses colonialistas. Afirmam ainda que, a partir das descobertas
arqueológicas e paleontológicas mais recentes, a África e o berço da
humanidade. Estabelecem uma relação marcante entre as civilizações negras
africanas e a do Egito faraônico, enfatizando sua origem negra,
contrariamente ao que certa egiptologia tendenciosa considerava uma
falsificação moderna da história.

Para compreendermos um pouco mais as complexidades que o Continente


Africano apresenta, é elementar reconhecer suas especificidades, diversidades,
pluralidades de povos, generalidades, geografias, culturas línguas, religiosidades e seus
sistemas de valores é preciso buscar os referenciais africanos, e ou, outros reconstruídos
a partir de referenciais positivos do continente.
Nesse contexto, para afirmarmos valores que fazem parte do processo
civilizatório africano brasileiro é basilar alicerçar nossa base histórica, cultural,

Africanias.com, 03 (2012). Página 6


psicológica e lingüística dentre outras. E, a educação a principal ferramenta porque dá
subsídios para pensar uma reflexão mais ampla e menos hierarquizada. Assim, dá
significado a nossa existência enquanto negros e de nossa negritude como um conjunto
de valores que não nos apequena, pelo contrário, nos faz partícipes da história e com
conhecimentos construídos há milhares de anos.

Epistemologia Africano Brasileira: ressignificando saberes

Quando Luz (2007) conclui o livro O Rei Nasce Aqui OBA BIYI o título AIYÓ,
AIYÓ ou Alegria, Alegria não tive dúvidas em tomá-lo emprestado após ter participado
de uma das suas magníficas aulas como professor visitante da disciplina Epistemologia
Africano Brasileira no ano de 2011. Um misto de alegria, emoção e conhecimento
contagiou a turma. Sentino-nos tocados em desenvolver uma reflexão que trouxesse
algumas possibilidades de desarticular a estrutura estática que a academia ainda
preserva. Podemos produzir conhecimentos usando outras linguagens, outros
pressupostos teóricos que complementem o que já é convencional.
Estudiosos, pesquisadores e líderes fundados na tradição africana antiga aos que
se construíram com os pressupostos do colonialismo europeu, assim como os dois lados
do Panafricanismo e os contemporâneos colaboram para desmontar as distorções da
história eurocêntrica. Exemplos como Cheikh Anta Diop4, Aimé Césaire, Joseph Zi-
Zerbo, Van Sertina, Basil Davidson, Franz Fanon, Leon Gontran Damas, Leopold
Sedar Senghor, Kabengele Munanga, Hampatê BA, Clifford Geertz, Victor Turner,
Evans Pritchard, Theóplile Obenga dentre outros.
Tomando apenas um desses estudiosos, (DIOP, 1974), cujos estudos estão em
francês e inglês continuam sem tradução para o português, grande cientista negro
senegalês, usou diversas fontes de pesquisa dentre elas: arqueológicas, lingüísticas,
históricas, físicas e datação de carbono para demonstrar cientificamente que o preto ou
negro egípcio é a matriz da origem do ser humano. Os egípcios sempre se definiram
como “Klem” pretos por excelência. No seu entendimento, o cristianismo e as invasões
4
DIOP, Cheikh Anta, Naissance du Mythe du negre e Arguments contre L’idee D’une Egypte Negre
in Nations Negres et Culture.Paris: Presence Africaine, 1974, ( p. 49-58 e 337-360). Diop um dos
expoentes do renascimento da historiografia africana, Este importante livro está em francês, pela falta de
fluência nesta língua e por fazer uma tradução aproximada nos limitamos a usar apenas algumas
compreensões que tivemos deste conceituado autor. Outras obras: Anterioridade das civilizações Negras:
Mito ou verdade histórica ( 1967), Origens Africana da Civilização: mito ou realidade ( 1974), História
Geral da África Estudos e Documentos V. 1 UNESCO ( 1978),Civilização ou barbárie : A Autêntica
Antropologia ( 1991)

Africanias.com, 03 (2012). Página 7


bárbaras foram fatores importantes para o favorecimento da Europa Ocidental. Como
também, o nascimento dessa civilização que se tornou a mais difundida pelas várias
ciências e ideologias no mundo.
Na percepção de (DIOP, 1974) a identidade cultural de qualquer povo está
alicerçada em três princípios elementares: o histórico, o lingüístico e o psicológico.
Nesse sentido, os estudos históricos permitem ao negro reconstruir sua identidade e
nacionalidade, tirando deles, estratégias morais para conquistar seu espaço no mundo
moderno. Os lingüísticos e psicológicos são o suporte para a construção da memória e
da identidade afastando-nos do assimilacionismo colonialista que aliena, paralisa e
recalca.
Nessa perspectiva, outras verdades eram construídas e outras possibilidades de
leitura das relações humanas entre diferentes povos, mas de uma gênese comum, o
Continente Africano. Mesmo que a historiografia oficial reservasse um restrito espaço
para a valoração desses estudos, eles foram e são muito importantes. Um excelente
referencial lançado no Brasil neste ano e que deve ser a base dos estudos são os oito
volumes de História Geral da África do Projeto UNESCO dos anos de 1950.
Enquanto pedagoga tenho o importante papel de aproximar-me das várias
epistemologias, para tentar compreender a sociedade que estou inserida. Porque a
interdisciplinaridade é uma constante nesta área de atuação e de pesquisa. Entender as
realidades históricas sem usar o discurso homogeneizador das elites, sem a linearidade
temporal é nosso grande desafio.
Fazemos um esforço para desenvolver uma reflexão menos eurocêntrica, nem
afrocêntrica demais e menos narcísica se forem possível. Já que, o processo de
formação que passamos foi todo cunhado no eurocentrismo, marxismo e cristianismo.
Nesse sentido, fazer uma opção ideológica diferente da que se cristalizou na
sociedade brasileira é compreender que tanto a escola quanto os espaços acadêmicos
podem contribuir para a ressignificação dos valores culturais historicamente construídos
da epistemologia africano-brasileira como também podem reproduzir estereótipos
arraigados pelo racismo disfarçado de democracia racial. A negação da plasticidade do
corpo e do fenótipo negro tem sido uma constante.
Estamos passando por um intenso processo de ressignificação identitária, e
também de conquista de direitos desde as primeiras décadas do século passado. O
surgimento da Frente Negra Brasileira, do Teatro Experimental do Negro, os primeiros

Africanias.com, 03 (2012). Página 8


Templos Religiosos de Matrizes Africanas, os Blocos carnavalescos negros, Movimento
Negro Unificado, Mine Comunidade Oba Biyi.
Na contemporaneidade vislumbramos outras conquistas através das Ações
Afirmativas dentre elas: Cotas nas Universidades Públicas como medida reparatória das
mazelas causadas pelo processo escravocrata e exclusão social que sofreram aos negros
e seus descendentes, Leis 10.639/2003, 11.645/2008 que legitimam o Ensino da história
e Cultura Africana, Afrobrasileira e Indígena nos Sistemas de ensino do País, a
aprovação do Estatuto da Igualdade Racial dentre outros.
Não podemos deixar de registrar que as várias linguagens podem ser utilizadas
para que o conhecimento se efetive, uma vez que, uma das formas mais utilizadas desde
os primórdios das civilizações africanas é a linguagem oral. Mesmo com tantas
invenções tecnológicas, ela sobrevive. A palavra é ação, é movimento, é escuta, é fala, é
conhecimento e registro na memória. Nas comunidades de tradição oral os griôts são os
guardiões do conhecimento.
Não basta repetir o que Stuart Hall, concebe como identidades confluentes.
Contudo, convém buscar outras fontes de memórias, histórias e culturas africanas que
nos alimente desta aiyó (alegria) de ser e existir que só a ancestralidade do Continente
Mãe, é capaz de proporcionar aos negros e/ou afrodescendentes brasileiros.
Acredito no potencial das identidades como bem delineou (CESAIRE, Miami
1987), “... creio numa identidade não arcaizante, devoradora de si mesma, mas sim
devoradora do mundo, isto é: apoderando-se do presente, para melhor reavaliar o
passado e, mais ainda, para preparar o futuro”.
Em se falando de identidade ela se contextualiza em uma amplitude maior e
mais complexa do que pensamos. “Envolvendo fatores diversos como: históricos,
psicológicos, lingüísticos, culturais, político-ideológicos e raciais” (Munanga, 1988, p.
143-146).
Compreendemos que quando os povos de origem africana reivindicam seu
espaço na sociedade brasileira, eles querem o espaço que é de direito, não apenas as
migalhas que restam ou o paternalismo e assistencialismo do estado neoliberal. Não
querem ser vistos pelos visitantes de outros países como exóticos, nem ter seus corpos
estereopitados e vistos como instrumentos sexuais.
Todavia, os povos negros ou afrodescendentes são sujeitos, portadores de
identidade que se reinventa, de plasticidade, de ancestralidade, de memória e de
culturas, de religiosidade e de conhecimento. Esses povos são coopartícipes na

Africanias.com, 03 (2012). Página 9


construção histórica do país. A igualdade de direitos não exclui nem elimina o respeito
às diferenças culturais, ambas se complementam.
As culturas africanas Bantu especialmente do Antigo Reino do Congo e
Matamba que correspondem hoje aos países (Angola, Congo Brazaville, Congo
Kinchaça e Sudão). Os Yorubá que aqui eram denominados Nagôs, Jêje e ejexá
originários do Reino de Ketu no Benin e Sudoeste da Nigéria foram as que mais
deixaram suas marcas nas culturas brasileiras, especificamente na Bahia. A diversidade
cultural que nosso país de estrutura continental apresenta, mostra que é difícil defini-lo
como de cultura única.
Enquanto Foucault (1987) delegava ao negro após liberto o papel de
disciplinado, dócil e submisso, se observamos melhor os momentos históricos veremos
outras interpretações, pois as revoltas, insurreições, e busca por emancipação sempre se
fizeram presentes em África, nas Américas e especialmente no Brasil.
Muitas são as narrativas míticas que tentam explicar nossa existência, mas elas
não são amplamente conhecidas. Cada civilização Africana, ou indígena da América,
tem seu conjunto de saberes e valores construídos milenarmente. Se tivermos outras
possibilidades de conhecimento os enriquecimentos culturais serão bem mais amplos as
colaborações também. Aqui no Brasil tem-se o hábito de tomar como único parâmetro a
cultura européia, porém muitos pesquisadores vêm numa contra corrente mostrando
outras possibilidades de leituras e verdades escamoteadas pela história oficial. Nesse
sentido, (BRANDÃO 2008, p.10), ressalta que:
As verdades das narrativas devem ser analisadas considerando-se as
complexidades dos sujeitos, suas ambigüidades subjetivas e
permanentemente (re) construídas. Estas se tornam palavras, signos de
comunicação de transmissão e preservação de um passado vivido e
reconstruído no presente, por meio da linguagem, elemento socializador do
homem e suas histórias.

Partindo da premissa acima, a revisão, reapropriação de elementos culturalmente


e historicamente construídos sobre as culturas negras requer de nós olhares menos
hierarquizantes considerando a aiyó (alegria), a arkhé (do grego a origem), o Egun
(princípio ancestral o àiyê (mundo visível), o orum (mundo invisível) e etc. Nas
palavras de Sodré (1988) “os valores da ancestralidade são poderosos, pois nele a
pessoa pode crescer, envelhecer e morrer. Durante todo o tempo ele é atravessado pelo
discurso fundante de seu pai e sua mãe”. Pensemos nesse conceito de pai e mãe amplos
não apenas de parentesco consanguíneo mas de pais universais e mães ancestrais que

Africanias.com, 03 (2012). Página 10


reconfiguram e ampliam a experiência da coletividade da circularidade do passado e do
presente ressignificado pelo Sankofa5.

(Sankofa Pássaro Mítico que remete ao passado africano para


ressignificar o presente de seus descendentes)

Palavras quase conclusivas

Nossa arma mais poderosa contra a ideologia do recalque, a negação do fenótipo


negro e pela afirmação dos valores africanos e afrobrasileiros é a educação seja a
informal ou a formal. Muitos dos valores civilizatórios do patrimônio Africano
Brasileiro como: ancestralidade, espiritualidade, memória, coletividade, corporeidade e
etc., sobreviveram graças às culturas de tradição oral e ao importante papel dos griôts
nas culturas africanas e dos templos religiosos de matrizes africanas e das Irmandades
Negras aqui no Brasil.
Assim os substratos de algumas línguas africanas faladas pelos povos negros
(Kikongo, Kimbundo, Yorubá, Jêje) reelaboradas com a Língua Portuguesa
sobreviveram e sobrevivem na memória religiosa afrobrasileira e africana. A dinâmica
da linguagem ajudou de forma significativa na preservação da memória da África
ancestral que nos alimenta até hoje.
Nossa esperança no “reencantamento do mundo” nas reflexões de Narcimária
Luz (2008, p. 20) que entende que “na dinâmica do espírito do tempo, reencantar o
mudo, aqui, é assegurar a coexistência sócio-existencial entre os distintos povos cuja
ética está pautada no acolhimento das alteridades civilizatórias que caracterizam as
sociedades contemporâneas”.
A persistência na crença de que se quisermos podemos transformar o mundo,
continuo sonhando que é possível através da aiyó (alegria) do conhecimento de outras

5
Pássaro mítico da cultura africana Akan ( Gana e Costa do Marfim); o Sankofa é um dos símbolos do
Adinkra ( conjunto de símbolos Akan) que significa que nosso presente está alicerçado pelo passado . A
ancestralidade africana construída por nossos antepassados é imprescindível para ressignificar presente e
ao futuro da humanidade. Imagem do Pássaro Sankofa ( www.museudarocinha.blogspot.com).

Africanias.com, 03 (2012). Página 11


verdades sobre os povos negros africanos e afrobrasileiros que foram negligenciados
pela historiografia oficial. Pode-se, através da educação minimizar os sofrimentos
psicológicos e resquícios do colonialismo que ainda persistem e aflorando assim, os
valores como ancestralidade, memória, religiosidades, plasticidade e identidade e etc.
Parte da sociedade contemporânea prima pela individualidade e esvaziamento dos seres
humanos.
Porém, temos a aiyó de reconhecer, que pressupostos da epistemologia Africano
Brasileira resistem, e se reelaboram nas relações sociais e culturais construindo
africanias. Mesmo conservando uma África mítica que se ressignifica constantemente,
mas também dialogando com as Culturas Africanas reais. Acreditamos em princípios da
coletividade da comunidade, do eu e do outro, pensando no homem/mulher enquanto
seres circulados por mundos visíveis e invisíveis. Portanto, a epistemologia Africano
Brasileira pode ser afirmada como processo transformador de relações, saberes, fazeres
e ideologias numa relação dialógica com as diversas construções epistemológicas.

REFERENCIAS

APPIAH, Kwame Anthony. N casa de meu pai: a África na filosofia da cultura;


Tradução Vera Ribeiro; Revisão de tradução Fernando Rosa Ribeiro. Rio de Janeiro:
contraponto, 1997.
BRANDÃO, Tordino Mª Vera. Memória (auto) biográfica como prática de
formação. Revista Ambiente Educação, v.1, n.1, jan-jul 2008. Disponível em
WWW.cidadesp.edu.br/old/revista_educacao/index.html. Acesso: 05/08/2011.
CÉSAIRE, Aime. Discurso sobre a Negritude. Org. Carlos Moore. Belo Horizonte:
Nandyala, 2010.
DIOP, Cheikh Anta. Nations Negres et Culture. Paris: Presence Africaine, 1974.
FANON, Frantz. Pele Negra Máscaras Brancas; Tradução Adriano Caldas. Rio de
Janeiro: Fator, 1983.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir (nascimento da prisão); Tradução Raquel
Ramalhete. Petrópolis: Vozes, 1987.
GOBINAEU, Joseph, Arthur. Essai sur l'inégalité des Races humaines, 1854. Paris,
1933.
LUZ, Narcimária Correia do P. Reencantamento do Mundo: Perspectivas de Análise
para a compreensão do nosso tempo. Salvador: Departamento de Educação do

Africanias.com, 03 (2012). Página 12


Campus I da Universidade do Estado da Bahia. Texto da promoção e progressão na
carreira de Magistério Superior Concurso Professor Pleno. 17/06/2008.
MUNANGA, Kabengele. Negritude, usos e sentidos. Belo Horizonte: Autêntica, 2009.
___________, Construção da identidade negra: diversidade de contextos e problemas
ideológicos. In : CONSORTE, josildeth Gomes; COSTA, Márcia Regina da( Orgs.) .
Religião Política e Identidade. São Paulo: Educ-séries Cadernos PUC, 1988.p.143-146.
OBENGA, Théophile. L’ Afrique dans I’ antiquité; Egypte pharaonique/afrique noire.
Paris: Présence Africaine, 1973.
RODRIGUES, Raimundo Nina. Os Africanos no Brasil. Salvador: Progresso, 1932.
SANTOS, M. Deoscoredes, LUZ, Marco Aurélio. O rei nasce aqui – Oba Biyi, a
educação Pluricultural africano- brasileira. Salvador: Fala Nagô, 2007.
SODRÉ, Muniz. Claros e escuros: identidade, povo e mídia no Brasil. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1999.
SOUZA, Neusa Santos. Tornar-se Negro: as vicissitudes da identidade do negro
brasileiro em ascensão social. Rio de Janeiro: Graal, 1983.

Africanias.com, 03 (2012). Página 13

Вам также может понравиться