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Analia Santana2
INTRODUÇÃO
“Negro (a) sou,
Negro (a) ficarei!”(Césaire, 1987).
O diálogo permanente com os tempos históricos nunca foi tão necessário quanto
na contemporaneidade. Quando busco inspiração em Aimé Césaire para iniciar esta
reflexão, tento articular a possibilidade da coexistência de pensamentos múltiplos,
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Aiyó palavra da Língua Africana Yorubá que significa alegria. Aiyó, Aiyó ( Alegria, Alegria), termo
usado por Marco Aurélio Luz na conclusão do livro OBA BIYI( O REI NASCE AQUI). Trabalho final
da Disciplina Epistemologia Africano Brasileira do Mestrado em Educação e Contemporaneidade Linha I
Educação, Processos Civilizatórios, Memória e Pluralidade Cultural da Universidade do Estado da Bahia
(UNEB), tendo como professora a Profª. Drª. Narcimária do Patrocínio Luz.
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Pedagoga, Especialista em História e Cultura Afrobrasileira e Africana, Mestranda do Programa de
Educação e Contemporaneidade UNEB linha I, Membro do Núcleo de Estudos em Línguas e Culturas
Africanas (NGEALC) UNEB, Membro da Irmandade de Nossa Senhora do Rosário dos Homens Pretos
do Pelourinho e Professora da Rede Municipal de Ensino de Salvador. Email:
nalsantana33@hotmail.com, nalsantana33@gmail.com
formas simbólicas, narrativas infinitas de seus lugares de origem. Ser negra e afirmar
esta pertença exigem estratégias diversas que são ressignificadas cotidianamente.
A elaboração/reelaboração de outras verdades ou alternativas de visão de mundo
que não estejam necessariamente enquadradas na estrutura eurocêntrica ou
estadunidense faz necessário nas Américas para que ampliemos nossa perceptividade, e,
nos neguemos à subalternidade que o colonialismo nos impôs. A estrutura que se afirma
global nos fragmenta, mas os valores da epistemologia Africano Brasileira buscam
ressignificar nossa alteridade.
Não nego a importância dos grandes clássicos da modernidade. Mas, como bem
nos afirma Fanon (1983), os grandes clássicos da modernidade Hengel, Marx, etc., não
podem fazer-nos esquecer de nossa negrura ou negritude. Porque são os valores
indígenas e africanos, como também outros a eles aproximados que explicam nossa
existência.
Os aspectos históricos, culturais, políticos, éticos, institucionais, relações
interpessoais, simbologias e etc., podem ser interpretados pelos vários paradigmas que
coexistem. Embora isso não seja tarefa fácil, nessa sociedade onde só são valorizadas as
interpretações que tomam como base as epistemologias europeias e americanas. Nesse
contexto, afirmar as narrativas míticas negras são imprescindíveis para a construção de
outras linguagens epistêmicas e territorialidades na perspectiva de propiciar diferentes
compreensões com mais significados, sentidos e valores.
Deixo claro que não queremos negar as contribuições de vários povos para
construção científica, cultural e histórica do mundo plural que vivemos, contudo vale
enfatizar que:
(...) Podemos reconhecer que a verdade não é propriedade de nenhuma cultura;
devemos nos apoderar-nos das verdades de que precisamos onde quer que
encontremos. Mas, para que as verdades se transformem na base da política
nacional e, em termos mais amplos, da vida nacional, há que se acreditar nelas,
e saber se as verdades que retiramos do Ocidente serão ou não dignas de
crédito depende, em grande medida, de como consigamos administrar as
relações entre nossa herança conceitual e as idéias que correm a nosso
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encontro, vindas de outros mundos ( APPIAH , 1997, p.21).
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Kwame Anthony Akroma-Ampim Kusi Appiah, é um dos principais filósofos africanos reconhecidos
na contemporaneidade. De etnia Achante atual República de Gana. O livro Na Casa do Meu Pai A África
na filosofia da cultura se constituí em uma importante obra por sua interdisciplinaridade, clareza e
propriedade no trato das temáticas.
Sabe-se que embora a noção de raça já existisse desde o século VIII, foi a partir
do século XVI que ele foi construído ideologicamente, os pressupostos das ciências
naturais o fizeram como marcador das diferenças entre os seres humanos. Essa
ideologia se propagou no mundo acadêmico e diversos estudos e esquemas foram
utilizados para classificar, hierarquizar e diferenciar os grupos humanos. O fenótipo
negro foi igualado a escravo. Assim, durante quatro séculos o termo “raça” foi
reelaborado pela metafísica religiosa e científica.
Em princípio “raça” concebia espécies humanas distintas, em seguida, tomando
como parâmetro os estudos da medicina a partir da medida do cérebro, tentavam
justificar a dominação dos povos colonizados através da “inferioridade racial”. A “raça
branca” européia era o referencial de “superioridade racial” em detrimento da “raça
Não nos eximimos de uma parcela de culpa nesses episódios, porque de certa
forma quando aceitamos os processos exploratórios em nome da convivência
“pacífica” delegamos aos outros o direito de liberdade, alteridade e mudança. As lutas
foram muitas, mas fragmentadas, assim, a coesão dos resultados nunca foi possível.
Mesmo porque a diversidade de povos negros tanto na África quanto na diáspora é
imensa.
A UNESCO após a segunda Guerra Mundial propôs uma alternativa para
designar grupos humanos que compartilham uma cultura, língua, memória e valores e
patrimônio histórico é etnia ou grupos étnicos ou sociedades como muitos estudiosos
preferem designar. Mas raça sobrevive sendo problematizada nas relações sociais tanto
nas lutas por equidade de direitos, empreitadas pelos movimentos negros como nos
embates teóricos, sociais e pessoais nas mais diferentes formas de racismo ou
manutenção de privilégios para os ditos brancos.
No entender de (SODRÉ, 1999, p. 194), “falar-se de ‘raça’ só é admissível como
noção culturalmente (e jamais biologicamente) marcada, donde a possibilidade da
‘relação racial’, isto é aquela caracterizada por dissimetria nas relações hierárquicas e
simbólicas entre seres humanos em virtude das diferenças fenotípicas”.
O termo negritude problematizado desloca o foco do termo “raça”, inaugurando
outras possibilidades de entender a trajetória dos povos negros no continente e na
diáspora. Negritude, inaugurado por Aimé Césaire em 1950, mas experienciado pela
Revolução do Haiti em São Domingos (1791/1804), pela Rainha Nzinga de Matamba e
pela Profetiza Kimpa Vita no antigo Reino do Congo tem grande significação para a
epistemologia Africano Brasileira.
Os anos de 1970 foram importantes para definição do termo Negritude como
conceito ideológico no entender de Munanga (2009). Para ele as interpretações
Quando Luz (2007) conclui o livro O Rei Nasce Aqui OBA BIYI o título AIYÓ,
AIYÓ ou Alegria, Alegria não tive dúvidas em tomá-lo emprestado após ter participado
de uma das suas magníficas aulas como professor visitante da disciplina Epistemologia
Africano Brasileira no ano de 2011. Um misto de alegria, emoção e conhecimento
contagiou a turma. Sentino-nos tocados em desenvolver uma reflexão que trouxesse
algumas possibilidades de desarticular a estrutura estática que a academia ainda
preserva. Podemos produzir conhecimentos usando outras linguagens, outros
pressupostos teóricos que complementem o que já é convencional.
Estudiosos, pesquisadores e líderes fundados na tradição africana antiga aos que
se construíram com os pressupostos do colonialismo europeu, assim como os dois lados
do Panafricanismo e os contemporâneos colaboram para desmontar as distorções da
história eurocêntrica. Exemplos como Cheikh Anta Diop4, Aimé Césaire, Joseph Zi-
Zerbo, Van Sertina, Basil Davidson, Franz Fanon, Leon Gontran Damas, Leopold
Sedar Senghor, Kabengele Munanga, Hampatê BA, Clifford Geertz, Victor Turner,
Evans Pritchard, Theóplile Obenga dentre outros.
Tomando apenas um desses estudiosos, (DIOP, 1974), cujos estudos estão em
francês e inglês continuam sem tradução para o português, grande cientista negro
senegalês, usou diversas fontes de pesquisa dentre elas: arqueológicas, lingüísticas,
históricas, físicas e datação de carbono para demonstrar cientificamente que o preto ou
negro egípcio é a matriz da origem do ser humano. Os egípcios sempre se definiram
como “Klem” pretos por excelência. No seu entendimento, o cristianismo e as invasões
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DIOP, Cheikh Anta, Naissance du Mythe du negre e Arguments contre L’idee D’une Egypte Negre
in Nations Negres et Culture.Paris: Presence Africaine, 1974, ( p. 49-58 e 337-360). Diop um dos
expoentes do renascimento da historiografia africana, Este importante livro está em francês, pela falta de
fluência nesta língua e por fazer uma tradução aproximada nos limitamos a usar apenas algumas
compreensões que tivemos deste conceituado autor. Outras obras: Anterioridade das civilizações Negras:
Mito ou verdade histórica ( 1967), Origens Africana da Civilização: mito ou realidade ( 1974), História
Geral da África Estudos e Documentos V. 1 UNESCO ( 1978),Civilização ou barbárie : A Autêntica
Antropologia ( 1991)
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Pássaro mítico da cultura africana Akan ( Gana e Costa do Marfim); o Sankofa é um dos símbolos do
Adinkra ( conjunto de símbolos Akan) que significa que nosso presente está alicerçado pelo passado . A
ancestralidade africana construída por nossos antepassados é imprescindível para ressignificar presente e
ao futuro da humanidade. Imagem do Pássaro Sankofa ( www.museudarocinha.blogspot.com).
REFERENCIAS