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Livro II
Apologia dos desastres hierosolimitanos
I.1. Não esqueci a promessa que te fiz, boníssimo papa Eugenio.102 Já faz tempo que me sinto teu
devedor, e desejo satisfazer-te, ainda que seja tarde. Pois me envergonharia desta dilação se minha
consciência incorresse em incúria ou desconsideração, mas não é assim. Como bem sabes,
aconteceram recentemente tais desastres que cheguei a pensar que podiam cessar todas as minhas
afeições, e até minha vida, como se o Senhor, provocado por nossos pecados e esquecendo-Se de Sua
misericórdia, tivesse determinado julgar com inteira eqüidade todo o orbe terrestre antes do tempo.103
Ele não perdoou Seu povo [411]104, nem Seu nome. Por que os gentios não dizem agora “Onde está
teu Deus”?105 Não é de estranhar se disserem. Pois os filhos da Igreja, os que se gloriavam de serem
cristãos, estão prostrados no deserto106, abatidos pelo gládio107, ou consumidos pela fome.108
Ele lançou o desprezo sobre os príncipes, os fez errar em descaminhos, não no caminho.109 Contrição
e infelicidade encontraram sua via.110 Pavor, aflição e confusão penetraram até no aposento
real.111 Quanta confusão para os que anunciam a paz e para os que anunciam a boa nova!112 Dizemos
“paz”, mas não há paz113; prometemos o bem, mas há turvação.114 Como se em nossos projetos
tenhamos sido temerariamente levianos.115 Contudo, dei-me plenamente, não incertamente116, e
porque me ordenaste, ou melhor, Deus, por meio de ti.
Por que jejuamos e Ele não nos olhou, humilhamos nossas almas e Ele nos ignorou? 117 E, apesar
disso, Ele não aplaca Seu furor, e Sua mão continua estendida.118 Com paciência, Ele escuta as vozes
sacrílegas e blasfemas dos egípcios, que ainda dizem “com má intenção os tirou para fazê-los morrer
no deserto”.119 Contudo, quem pode ignorar que a Justiça do Senhor é verdadeira?120 Essa justiça é
um abismo tão profundo121 que posso ter como um beato a quem não fique escandalizado com o
Senhor.122
2. Além disso, não seria uma grande temeridade humana atrever-se a repreender o que escapa
inteiramente à nossa compreensão? Recordemos Seus antigos juízos,123 que são seculares124, para nos
consolarmos fortemente.125 Na verdade, assim alguém disse: “Relembrando teus juízos seculares,
Senhor, fiquei consolado”.
Vou recordar coisas que ninguém ignora, mas que parece que todos esquecem. Pois assim é o coração
dos mortais: o que sabemos quando não necessitamos sabê-lo, esquecemos quando necessitamos.
Quando Moisés retirou seu povo da terra egípcia, prometeu uma terra melhor.126 Caso contrário, será
que seu povo, tão apegado àquela terra, o teria seguido?
Sim, ele os retirou [412], mas não os introduziu na terra que prometeu.127 Contudo, ninguém poderá
imputar à temeridade daquele guia um desenlace tão triste e inesperado, pois tudo ele fazia por ordem
do Senhor, com a cooperação direta do Senhor, que confirmava com sinais que o acompanhavam.128
Mas tu dirás: “Aquele povo era teimoso e contencioso129, sempre contra o Senhor130 e contra seu
servo Moisés”. De acordo: eram uns incrédulos e rebeldes. E nós? 131 Pergunte a eles.132 Porque eu
devo dizer isso se eles mesmos o estão confessando? Digo a mim mesmo: como podiam seguir adiante
os que sempre se voltavam em seu deambulatório?133 Ao longo de sua peregrinação não houve um
momento em que seu coração não se voltasse para o Egito.134 Se caíram e pereceram por sua
iniqüidade135, podemos estranhar agora que sofram o mesmo desastre quem lhes imitou em seus
passos? Será que as adversidades que eles padeceram põem em juízo as promessas de Deus? 136 Não,
tampouco agora, pois as promessas de Deus nunca criam conflito com Sua justiça. E escuta outra
coisa.
3. Pecou a tribo de Benjamim, e as demais tribos se dispuseram a castigá-la137 com a anuência de
Deus. Inclusive, Ele mesmo designou o líder que devia dirigir a batalha.138 Trava-se o combate,
confiantes que estão em mãos valorosas, que sua causa é mais poderosa e que maior é o favor divino.
Mas que terrível é Deus em seus desígnios com os homens!139 Fugiram dos malvados os que se
vingariam da maldade e, muito mais numerosos, cederam diante de um inimigo muito menor.
Recorrem ao Senhor e o Senhor lhes diz: “Voltai”.140 Vão outra vez, e de novo são desbaratados e
sucumbidos. Primeiro contaram com o favor de Deus, segundo com Sua ordem expressa. Enfrentam-
se em um certame e sucumbem.141 Foram inferiores no certame e superiores na fé.
Nas atuais circunstâncias tu imaginas o que fariam comigo se, por minha pregação, os nossos
voltassem à guerra e sucumbissem? Crês que me escutariam se os exortasse a, pela terceira vez, repetir
a viagem e acometer em uma façanha na qual já fracassaram duas vezes? Pois aí tens os israelitas
que, sem ter em conta suas repetidas frustrações, pela terceira vez obedecem e se superam.142 Mas os
nossos homens diriam: “Como saberemos [413] que este sermão veio do Senhor? Que sinal tu fazes
para que creiamos?143 Não ficaria bem se eu mesmo respondesse: minha vergonha não me permite.
Em meu lugar responde tu e por ti mesmo, segundo o que ouvistes e vistes144, ou melhor, segundo o
que Deus te inspira.
4. Possivelmente te perguntes por que me entretenho a falar de tudo isso quando me propus outra
questão. Contudo, não o faço porque tenha me esquecido, mas porque tudo isso não é alheio ao meu
propósito. Recordo muito bem que me propus desenvolver ante tua dignidade o tema da consideração,
tema magno e digno de profunda reflexão. Pois os grandes personagens devem considerar coisas
grandes. Então, quem como tu poderás estudá-lo com o maior interesse se não há sobre a terra outro
semelhante a ti? Sê tu, portanto, a fazê-lo, segundo a sapiência e o poder dados a ti145 do alto.146
Devido à minha pequenez, sinto-me incapaz de te ditar como deves fazer as coisas. É suficiente ter
insinuado que deves atuar de alguma forma para trazer algum consolo à Igreja, obstruindo os loquazes
iníquos.147 Faço estas brevíssimas considerações em forma de apologia. Espero ter depositado em tua
consciência as razões que me deixam plenamente escusado perante a minha responsabilidade e a
tua148, embora sejam insuficientes para esses que costumam estimar os eventos alheios somente por
seu êxito, pois a justificação perfeita e absoluta de cada um é o testemunho da própria
consciência.149 Importa-me minimamente o que julgam de mim150 aqueles que chamam mal ao bem
e bem ao mal, trevas à luz e luz às trevas.151 Se é preciso escolher, prefiro que os homens murmurem
de mim, não de Deus. Para mim é bom servir-Lhe de escudo. Acolho com boa vontade as detratoras
línguas152 maledicentes e os venenosos dardos blasfemos de meus detratores, contanto que não
cheguem até Ele. Suporto qualquer inglória para que a glória de Deus não sofra menosprezo. Sentir-
me-ia glorificado se pudesse dizer: “Por ti suportei opróbrios, a confusão cobriu meu rosto”.153 Para
mim é uma glória compartilhar a sorte de Cristo, que disse: “Os opróbrios com que te insultam caem
sobre mim”.154 Bem, já é hora de voltar ao nosso tema e avançar ordenadamente em nossa exposição.
[414] As quatro coisas que devem ser consideradas e a tríplice consideração de si mesmo
II.V. Primeiramente, considera o que eu entendo por consideração. Não desejo identificá-la
totalmente com a contemplação, pois esta radica na visão ou certeza do conhecido, e a consideração
é uma inquisição do desconhecido. A contemplação pode ser definida como uma intuição verdadeira
e segura da alma ou uma apreensão da verdade sem qualquer dúvida, enquanto que a consideração é
uma cogitação da investigação ou uma aplicação intensa da alma para investigar a verdade. Ambos
os termos costumam ser usados indistintamente.
II.VI. Sobre o que pode versar tua consideração? Penso que tu deves considerar quatro coisas: tu, o
que está debaixo de ti, ao redor de ti e acima de ti. Comece tua consideração por ti, para que não te
frustres te estendendo em outra coisas e te negligencies. Pois de que serve ganhar o mundo inteiro se
te perdes?155 Por mais sábio que sejas156, não possuis toda a sabedoria se não fores sábio para contigo
mesmo. E quanto te faltaria? No meu modo de ver, tudo. Ainda que conheças todos os mistérios 157,
a largura da terra, a altura do céu, as profundezas do mar158, se és um néscio, és semelhante àquele
que edifica sem fundamento159 e levanta uma ruína, não um edifício. Tudo o que construíres fora de
ti será como pó amontoado exposto ao vento.
Não é sábio quem não o é para si. O sábio é sábio por si160, e bebe primeiro de sua fonte.161 Principies
tua consideração por ti e a findes em ti. Vá aonde vás, retornes a ti e serás de grande proveito para a
tua salvação.162 Sê o primeiro e o último para ti. Toma o sumo exemplo do sumo Pai que enviou o
seu Verbo e O reteve.163 Teu verbo é a tua consideração que, se sai de ti, não deve se afastar. Que
progridas sem afastar-se; que vás sem abandonar-te. [415]
Na aquisição de tua salvação164 ninguém será mais teu irmão que o filho único de tua mãe.165 Nunca
cogites nada contra a tua salvação. Mas eu disse mal a palavra “contra”; deveria ter dito “fora”.
Devemos rechaçar tudo o que se oferece à consideração se, de alguma maneira, não nos conduz à
própria salvação.
IV.7. Esta consideração de ti se divide em três perguntas: se consideras o que és, quem és e como és.
O que és por natureza, quem és como pessoa, e como és por teus costumes; que és, por exemplo,
homem; quem és, o papa, ou o Sumo Pontífice; como és, benigno, manso, etc. Embora seja mais
próprio dos filósofos que dos homens apostólicos refletir sobre a primeira pergunta, sabemos que ela
se contesta com a definição do homem como animal racional e mortal.166
Quem goste, pode aprofundá-la com maior precisão. Não encontrarás nada contra a tua profissão e
dignidade se te entregares a esta reflexão, pelo contrário, seria benéfico para a tua salvação. Ao
considerares simultaneamente estas duas realidades, a racionalidade e a mortalidade, perceberás dois
tipos de frutos: tua mortalidade humilhará tua racionabilidade e tua racionabilidade confortará tua
mortalidade, pois o homem circunspecto apreciará estas duas coisas. Se esse fruto requer outra
consideração, logo a exporemos e, se por acaso é devido à relação de uma matéria à outra.
Que tu recordes tua primeira profissão
V.8. Passemos a advertir quem és e de que fostes feito. Embora tenha dito “de que”, penso passá-lo
por alto, para deixá-lo à tua reflexão. Limito-me a recordar que seria indigno de ti ficar abaixo da
perfeição, após teres sido escolhido para tão assunta perfeição. Não te enrubescerias de ver o mais
baixo obtendo um posto magno, quando eras um dos maiores dentre os menores? Não te esqueças de
tua primeira profissão, nem a destruas de tua mente e de teu afeto, apesar de terem-na arrancado das
mãos. Não será inútil que a tenhas sempre em tua vista quando deres uma ordem, corroborares uma
sentença, ou tomares uma decisão. Assim, a consideração te facilitará desprezar as honras no seio da
honra [416], o que é magno.
Que tampouco se ausente de teu peito; que sejas como um escudo no qual ricocheteie aquela seta: “O
homem, por estar rodeado de honras, não compreendeu”.167 Por isso, repita em teu interior: “Sou o
mais abjeto na casa de meu Deus”.168 Será possível que um pobre e abjeto se estabeleça sobre as
gentes e os reis?169 Quem sou eu e quem é o dono de minha pátria170 para me sentar no mais excelso
e sublime? Sem dúvida, quem disse “Amigo, ascenda ao superior”171, seria sempre seu amigo. Se não
o sou, me virá uma grande desgraça172, pois quem me elevou pode abater-me. Seria como o lamento:
“Depois que me elevaste, me arruinaste”.173 Pois é absurdo se auto-bajular nas alturas, onde a
solicitude é maior: aquela busca a grandeza, esta é a prova do amigo. Devo ater-me a isso se, ao final
de tudo, não quero ocupar o último lugar.
Por que te fizeram superior
VI.9. Não podemos dissimular que te fizeram superior, mas temos que meditar para que és superior.
Opino que não é para comportar-te como um senhor. De fato, como a ti, o Profeta foi elevado, e
escutou: “Para arrancar e destruir, dispersar e demolir, edificar e plantar”.174 Estes verbos soam
faustosos? São figuras que se referem ao suor do rústico, e, de certa maneira, expressam o trabalho
do espírito.
Portanto, por mais elevado que seja o conceito que temos de nós mesmos, temos que nos convencer
que não nos foi entregue um domínio, mas uma função servil. “Eu não sou o maior Profeta.175 E
embora possa igualar-me em poder, pelo mérito não há comparação”. Diga isso interiormente e ensina
a ti mesmo, tu, que doutrinará os demais.176 Considera-te um profeta qualquer.177 Ou te parece muito
pouco para ti? É demasiado. Mas pela graça de Deus és o que és.178 O que? Um Profeta. Ou pensas
que és mais que um Profeta?179 Se fores sábio, contentar-te-ás com a medida [417] que Deus te
deu.180 Tudo o que for além disso, é mau.181
Aprende com os Profetas a presidir, mas fazendo o que requerem os tempos, não simplesmente
ordenando. Deves saber que tu necessitas mais de uma enxada do que um cetro para cumprir o
trabalho de um Profeta. A ascensão profética não é para reinar, mas para extirpar. Não crês que tu
também poderás encontrar algum trabalho no campo de teu Senhor? Sim, e muito. Porque os
verdadeiros Profetas não o limparam totalmente. Deixaram algo para seus filhos, os apóstolos, como
teus predecessores deixaram a ti algo por fazer. Tampouco tu poderás fazer tudo. Certamente deixarás
algo para teu sucessor, e este para o seu, os outros ao seguinte, e assim sucessivamente até o fim.
Por volta da décima-primeira hora, o Senhor repreende o ócio dos operários e eles são enviados à
vinha.182 Esse mesmo Senhor disse aos apóstolos que o cereal é abundante e poucos os
operários.183 Reinvidica tua herança paterna, porque se és filho, és herdeiro.184 Para provar que o és,
põe mãos à obra. Não te entorpeças no ócio, nem seja como aquele que dizem: “O que fazes aqui,
todo o dia ocioso?”.185
10. Muito pior seria te estragares nas delícias, ou te enfatuares na pompa. Quem fez teu testamento
não te legou nada disso. E por quê? Se te ativeres à letra do testamento, herdarás mais preocupação e
trabalho do que glórias e riquezas.186 Te encantarás com a cátedra? Ela é um espelho, como uma torre
de sentinelas. Dela tu deverás vigiar tudo; esse é o dever que te impõe tua condição de epíscopo, pois
ela não é um domínio, mas um ofício. Por acaso não estás em um lugar eminente para observar tudo,
e não te constituíram como observador de tudo?187 Pois esta vigilância te obrigarás a viver sempre
tenso, não no ócio. Podes tu apetecer à glória onde não há ócio? É impossível permanecer ocioso
quando urge a solicitude por todas as igrejas.188 Ou recebestes outra herança do santo Apóstolo? O
que tenho, isto te dou.189 O que ele te deu? Eu só sei que não te deu ouro nem prata, porque disse
expressamente: “não tenho ouro nem prata”.190
Se o tens tu, usa-o, mas não caprichosamente, e sim de acordo com os tempos atuais. Assim o
possuirás como se não o possuísse.191 As riquezas não são boas nem más para a alma. Usá-las é bom,
abusá-las é mau, cobiçá-las é pior, procurá-las é torpe [418]. Poderás justificar-te com as razões que
queiras, mas não com o direito apostólico. Ele não pode dar-te o que não tem, pois te deu tudo o que
tinha, isto é, a solicitude por todas as igrejas.192 Para dominá-las? Escuta: não dominando aos que
confiaram, mas tornando-os modelos do rebanho.193 Eu digo isso convencido de que deve ser assim
como a voz do Senhor no Evangelho: “Os reis das gentes as dominam, e os que exercem o poder se
fazem chamar benfeitores”.194 E acrescenta: “Mas vós, nada disso”.195 Está claro: aos apóstolos está
interdita a dominação.
11. Agora, veja, e se te atreves, usurpe o ministério apostólico como senhor ou, como apóstolo, o
senhorio. Ambas te foram inteiramente proibidas. Caso pretendas ter as duas, ficarás sem nenhuma.
Então, não penses estar livre daqueles de quem o Senhor se lamenta: “Eles nomearam reis sem contar
comigo, nomearam príncipes sem o meu conhecimento”.196 Será muito agradável reinar sem o
Senhor, tereis glória, mas não a de Deus.197
Já sabemos o que está interditado, ouçamos agora o Edito: “O maior dentre vós iguale-se ao menor,
e o superior, ao que serve”.198 Esta é a norma apostólica: se interdita o domínio, se intima o serviço,
carece imitar o exemplo do Legislador, acrescentando: “Eu estou entre vós como quem serve”.199 Será
que podemos considerar inglório um título com o qual o Senhor quis distinguir-se na glória?200 Com
mérito, Paulo se gloriou disso, e disse: “São ministros de Cristo, eu também”.201 E acrescentou: “Direi
uma mediocridade: mais eu. Muito mais nos sofrimentos, abundantemente nos cárceres, na
quantidade dos espancamentos, na freqüência dos perigos de morte”.202
Oh, preclaro ministério! Não é glorioso esse principado? Se for preciso me gloriar203, olha os santos
e considera a glória proposta pelos apóstolos.204 Parece-lhe pequena essa recompensa? Que meu
tributo seja similar à glória dos santos.205 [419] Clama o profeta: “Os amigos de teu Deus são
honrados excessivamente, teu principado é confortado excessivamente”.206 Clama o apóstolo:
“Quanto a mim, Deus me livre de gloriar-me mais que na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo.”207
12. Eu desejo para ti que esta seja sempre a tua maior glória, a que os apóstolos e os profetas elegeram
e te transmitiram. Descubra tua herança no sofrimento maior da cruz de Cristo.208 Feliz quem pode
dizer: trabalhei mais que todos.209 Glória é, mas não vazia, nem fraca, nem orgulhosa. O trabalho que
repugna necessita de estímulo. “Cada um receberá seu próprio salário segundo seu
trabalho”.210 Embora tenha trabalhado mais que todos211, não acabou a tarefa: ainda há lugar.212
Notas
1.Tradução a partir da edição Obras completas de San Bernardo II. Madrid: Biblioteca
de Autores Cristianos (BAC), MCMXCIV, p. 52-185. Em latim, consideratio é a ação de observar,
refletir; considerare, o agir com reflexão; consideratus, ser prudente, atento, circunspecto, ter bom
senso.
2.Trata-se de Eugênio III, papa (1145-1153), ex-discípulo de Bernardo de Claraval
(1090-1153). Pier Bernardo Pignatelli nasceu em Montemagno, próximo a Pisa, de rica e nobre
família cristã. Em 1135 ingressou na Ordem de Cister e, mais tarde, foi designado para abrir um
mosteiro em Farfa (diocese de Viterbo). Como papa, enfrentou a difícil situação política italiana, em
parte provocada por Arnaldo de Bréscia (c. 1105-1155), conhecido opositor papal. Após tomar
conhecimento da queda de Edessa (1145), Eugênio III escreveu uma carta a Luís VII da França (1120-
1180), convidando-o a tomar a cruz. Na Dieta de Speyer (1146), o imperador Conrado III (1093-
1152), além de muitos nobres, também foi convencido à peregrinação armada. Eugênio III governou
a Igreja somente oito anos e cinco meses, e foi beatificado em 1872.
3.Bernardo faz uma alusão aqui ao senhorio, centro territorial do poder feudal.
4.Gn 29, 6ss.
5.4Reis (Vulgata), 19, 3.
6.Os 10, 11.
7.Jó 6, 7.
8.Ex 7, 13.
9.Ex 18, 18. Trata-se do sogro de Moisés.
10.Isto é, seis da tarde.
11.Mt 6, 34.
12.Sl 19 (18), 3.
13.Jr 5, 3.
14.Jo 6, 11-12.
15.2Cor 11, 19.
16.2Cor 11, 20.
17.Is 28, 19.
18.Sl 118, 130.
19.Pr 18, 3.
20.Gl 5, 1.
21.Gl 5, 1.
22.1Cor 9, 19.
23.Tt 1, 7.
24.Fl 1, 21.
25.1Cor 7, 23 (“Alguém pagou alto preço pelo vosso resgate; não vos torneis escravos
dos homens”).
26.Lc 20, 1.
27.1Cor 14, 4.
28.Sl 1, 2.
29.Sl 18, 8.
30.Jo 34, 5.
31.Sl 118, 85.
32.At 9, 6.
33.“Eugênio é exortado a não suportar que o escravizem. O papa deve resistir à maldade
destas estultas ocupações através do clamor sincero a Deus. Bernardo o impele a reagir, pois a força
do costume leva à despreocupação, e conseqüentemente à dureza de coração, ao pecado. Deve-se
querer rechaçar o mal, fazê-lo retroceder, opondo-lhe tenazmente força contrária. Em ambiente tão
nefasto, destaca-se a exortação de Bernardo à resistência. Nesse cenário, compreendemos o
significado para o abade de Claraval do livre-arbítrio: ser coagido pela iniqüidade é menos miserável
do que deixar-se dominar por ela. O permitir pressupõe escolha. E, mais do que isso, escolha
consciente. Isso porque a decisão da vontade deve ser precedida de uma reflexão sobre se algo deve
ser feito ou não, na ponderação dos motivos; a decisão final procede de um ato livre da vontade.
Assim, o livre-arbítrio não é meramente autodeterminação, mas também auto-julgamento.”,
SEPULCRI, Nayhara, e COSTA, Ricardo da. “Querer o bem para nós é próprio de Deus. Querer o
mal só depende de nosso querer. Não querer o bem é totalmente diabólico: São Bernardo de Claraval
(1090-1153) e o mal na Idade Média”. In: Anais do II Simpósio Internacional de Teologia e Ciências
da Religião (ISSN 1981-285x - cd-rom), Belo Horizonte, ISTA/PUC Minas, 2007.
34.1Cor 11, 22.
35.Ecl 38, 25.
36.1Cor 9, 22.
37.Jo 10, 33.
38.Mt 16, 26.
39.Sl 77, 39.
40.Rm 1, 14.
41.Ecl 6, 8.
42.Ef 6, 8.
43.Pr 22, 2.
44.Gn 1, 27.
45.Ier 31, 13.
46.Gn 18, 25.
47.Pr 5, 16.
48.Ion 3, 7.
49.Gn 24, 14.
50.Pr 5, 15.
51.Pr 5, 17.
52.Ecl 14, 5.
53.1Cor 7, 6.
54.Rm 12, 3.
55.Pr 9, 9.
56.1Cor 6, 5.
57.1Cor 6, 5.
58.1Cor 6, 4.
59.2Tm 2, 4.
60.1Cor 7, 28.
61.Lc 12, 14.
62.At 5, 27.
63.Mt 19, 28.
64.Jo 13, 16.
65.Prov 22, 28.
66.Lc 12, 14.
67.Jo 13, 14.
68.1Cor 6, 3.
69.Mt 16, 19.
70.Mt 9, 6.
71.Mt 9, 6.
72.1Cor 6, 2.
73.Ef 5, 16.
74.1Tm 4, 8.
75.Jo 28, 28.
76.Sl 45, 11 (“Traqüilizai-vos e reconhecei: Eu sou Deus, mais alto que os povos, mais
alto que a terra!”).
77.1Tm 4, 8 (“A pouco serve o exercício corporal, ao passo que a piedade é proveitosa
a tudo, pois contém a promessa da vida presente e futura”).
78.Rm 13, 14.
79.ARISTÓTELES, Retórica, II, 12, 1389b. Nessa passagem, Aristóteles trata
do caráter do jovem, e diz: “Em tudo pecam por excesso, e violência, contrariamente à máxima de
Quílon: tudo fazem em excesso; amam em excesso, odeiam em excesso e em todo o resto são
excessivos; acham que sabem tudo e são obstinados (isto é a causa do seu excesso em tudo)”.
O Estagirita cita Quílon (ou Quilão), o Lacedemônio, lendário personagem da história grega, um
dos Sete Sábios, talvez vivido no século VI a.C. A máxima “nada em demasia”, atribuída a Quílon,
segundo a tradição, figurava no Santuário de Delfos. Naturalmente, Bernardo a cita como um bom
exemplo de Aristóteles (chamado por ele e por todos os medievais de “O Filósofo”) a respeito da
virtude da temperança. Outro aspecto interessante dessa citação de Bernardo é o fato de a Retórica de
Aristóteles só ter sido traduzida no ocidente medieval no século XIII; primeiro por Bartolomeu de
Messina (da corte de Manfredo da Sicília), depois por Guilherme de Moerbeke (1215-1286),
arcebispo de Corinto e membro da ordem dos pregadores, e, por fim, por Herman, o Alemão (1266-
1272), tradutor da Escola de Toledo, o que significa que muito provavelmente Bernardo fez sua
citação a partir da leitura de outro autor que, por sua vez, citou a passagem de Aristóteles (talvez
Cícero).
80.Mt 7, 12 (“A regra de ouro – Tudo aquilo, portanto, que quereis que os homens vos
façam, fazei-o vós a eles, pois esta é a Lei e os Profetas”). Na verdade, a passagem bíblica é positiva,
pois Jesus inverte essa máxima de comportamento conhecida desde a Antigüidade, especialmente no
Judaísmo (Tb, 4, 14-15 “Sê vigilante, meu filho, em todas as tuas ações e mostra-te educado em todo
o teu comportamento. Não faças a ninguém o que não queres que te façam”), e a torna uma regra
positiva, bem mais exigente que a máxima judaica. Por isso, Bernardo faz aqui, para sermos mais
exatos, a citação da tradição vetero-testamentária, e só a seguir, e diz que a perfeição culmina com a
sentença do Senhor. Portanto, a tradição judaico-cristã está de acordo com a tradição platônica –
Platão coloca a justiça como uma condição sine qua non para a boa convivência entre os homens
(Protágoras, 322 b-c) – ao contrário de Aristóteles, que a circunscreve na adequação à Lei, e como
aquela que propicia e mantêm a felicidade (Ética a Nicômano V, 1, 1129).
81.Mt 7, 12.
82.Ecl 7, 17.
83.Rm 12, 3 (“Eu peço a cada um de vós que não tenha de si mesmo um conceito mais
elevado do que convém, mas uma justa estima, ditada pela sabedoria, de acordo com a medida da fé
que Deus dispensou a cada um.”).
84.Mt 6, 16.
85.Gl 1, 10.
86.“No momento que eu tiver decidido, eu próprio vou julgar com retidão.”, Sl 74, 3.
87.2Pet 3, 15.
88.Ecl 38, 25.
89.Sl 102, 6; 145, 7.
90.1Tm 6, 4.
91.Sl 11, 4.
92.Jr 9, 5; Is 59, 3.
93.Is 1, 23; Jr 5, 28.
94.Hebr 7, 23.
95.“Então Jesus entrou no Templo e expulsou todos os vendedores e compradores que
lá estavam. Virou as mesas dos cambistas e as cadeiras dos que vendiam pombas. E disse-lhes: ‘Está
escrito: Minha casa será chamada casa de oração. Vós, porém, fazeis dela um covil de ladrões!’”,
Mt 21, 12-13.
96.Jo 12, 26.
97.Is 16, 5.
98.Mt 21, 13.
99.Lc 10, 37.
100.1Cor 9, 19.
101.Ef 5, 16; Col 4, 5.
102.O leitor observará que, neste capítulo dedicado ao fracasso na cruzada, Bernardo
aprofunda suas citações bíblicas, como se justificasse a tragédia como uma espécie de predestinação
divina, castigo por causa dos pecados dos cristãos.
103.Sl 9, 9; 95, 13.
104.Jl 2, 18.
105.Sl 113, 10.
106.1Cor 10, 5.
107.Ez 32, 21; 35, 8.
108.Thren 4, 9.
109.Sl 106, 40.
110.“Estão todos desviados e obstinados também: não há um que faça o bem, não há
um, sequer”, Sl 13, 3.
111.“Sua terra pululou de rãs, até nos aposentos reais”, Sl 104, 30.
112.Rom 10, 15.
113.Ez 13, 10.
114.Is 17, 14.
115.2Cor 1, 17.
116.“Quanto a mim, é assim que corro, não ao incerto”, 1Cor 9, 26.
117.Is 58, 3.
118.Is 5, 25.
119.Ex 32, 12.
120.Sl 18, 10.
121.Sl 35, 7.
122.Mt 11, 6.
123.Sl 118, 52.
124.Sl 24, 6.
125.Sl 118, 52.
126.Ex 3, 8.
127.Nm 20, 12.
128.Mc 16, 20.
129.Dt 31, 27.
130.Nm 20, 10.
131.Jo 21, 21.
132.Jo 9, 21.
133.Ez 1, 17; 10, 11.
134.Ex 16, 3.
135.Sl 72, 19.
136.Gl 3, 21.
137.Jz 20, 2.
138.Jz 20, 18.
139.Sl 65, 5.
140.Jz 20, 23.
141.Jz 20, 25.
142.Jz 20, 30.
143.Jo 6, 30.
144.Mt 11, 4.
145.“Considerai a longanimidade de nosso Senhor como a nossa salvação, conforme
também o nosso amado irmão Paulo vos escreveu, segundo a sabedoria que lhe foi dada.”, 2Pd 3, 15.
146.“Não terias poder algum sobre mim, se não te fosse dado do alto; por isso, quem a
ti me entregou tem maior pecado”, Jo 19, 11.
147.“...a boca dos mentirosos será fechada”, Sl 62, 12.
148.Lc 14, 18-19.
149.“O nosso motivo de ufania é este testemunho da nossa consciência...”, 2Cor 1, 12.
150.“Quanto a mim, pouco me importa ser julgado por vós ou por um tribunal humano.
Eu também não julgo a mim mesmo. Verdade é que a minha consciência de nada me acusa, mas nem
por isto estou justificado; meu juiz é o Senhor”, 1Cor 4, 3.
151.“Ai dos que ao mal chamam bem e ao bem mal, / dos que transformam as trevas
em luz e a luz em trevas, / dos que mudam o amargo em doce e o doce em amargo...”, Is 5, 20.
152.“O vento do norte gera a chuva, / e a língua dissimuladora, uma face irritada”, Pr
25, 23.
153.“É por tua causa que eu suporto insultos, / que a confusão me cobre o rosto, / que
me tornei um estrangeiro aos meus irmãos, / um estranho para os filhos de minha mãe”, Sl 68, 8.
154.“...pois o zelo por tua casa me devora, / e os insultos dos que te insultam recaem
sobre mim.”, Sl 68, 10.
155.Mt 16, 26.
156.Pr 9, 12.