1. O Sistema de Fontes No Direito Interno, se quisermos saber quais são as fontes de direito vamos ao Código Civil, os primeiros artigos enunciam as fontes. Em Direito Internacional Público também há um elenco de Fontes: • Artigo 38º do Estatuto do Tribunal Internacional de Justiça
Artigo 38º 1. O Tribunal , cuja função é decidir em conformidade com o direito internacional as controvérsias que lhe forem submetidas, aplicará: a) As convenções internacionais, quer gerais, quer especiais, que estabeleçam regras expressamente reconhecidas pelos Estados litigantes; b) O costume internacional como prova de uma prática geral aceite como direito; c) Os princípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas; d) Com ressalva das disposições do artigo 59 as decisões judiciais e a doutrina dos publicistas mais qualificados das diferentes nações como meio auxiliar para a determinação das regras de direito. 2. A presente disposição não prejudicará a faculdade do Tribunal de decidir uma questão ex aequo et bono, se as partes assim convierem.
O estatuto está a dizer-nos quais as fontes que o Tribunal aplica para a resolução de litígios, e portanto está a dizer quais são as fontes de Direito Internacional Público. O artigo faz a distinção entre fontes primárias e fontes secundárias. As primeiras seriam as convenções, o costume e os princípios gerais do Direito. As segundas seriam a jurisprudência e a doutrina.
Duas coisas são incontestáveis e seguras: a) Este artigo não contém uma enumeração exaustiva ou taxativa de fontes, mas sim exemplificativa e que, feita em certa época, tem de ser submetida a uma interpretação atualista. Este artigo não esgota os modos de produção ou de revelação existentes b) Não se pode inferir deste artigo uma hierarquia das fontes ou das normas de Direito Internacional.
O nº2 do artigo 38º menciona a faculdade do Tribunal de decidir uma questão ex aequo et bono. Ou seja, está-se a fazer menção da equidade. Contudo, a equidade não é em si uma fonte de Direito. É antes um modo de aplicar o sentimento ideal de justiça aos casos concretos.
O costume, o tratado e a decisão de organização internacional são fontes formais que se recortam hoje com toda a nitidez. A elas acresce a jurisprudência, com um papel mais reduzido, quer pela sua intervenção insubstituível na interpretação e na integração das normas preexistentes, quer pelo seu eventual contributo para a formação de um tipo de costume – o costume jurisprudencial.
Estas fontes são interdependentes e as normas através delas criadas entrelaçam- se sistematicamente, sem prejuízo da consideração de zonas diferenciadas. Esta interdependência das fontes aponta para a precedência do costume: • Com efeito, a jurisprudência, por natureza, pressupõe norma jurídica anterior, pressupõe a declaração do direito do caso concreto • A decisão de qualquer organização internacional ou entidades afins repousa na competência de um ou vários dos seus órgãos e reveste a eficácia que se encontre prevista (explícita ou implicitamente) no respeito tratado constitutivo • O processo de conclusão de tratados, assentavam até á Convenção de Viena de 1969, em normas consuetudinárias
Não indicamos com isto que a razão da obrigatoriedade de todas as normas internacionais deva ser procurada no costume: ela tem de se firmar, como atrás se disse, em princípios objetivos. São problemas diferentes, o da formação encadeada e o da fundamentação das normas.
Os atos das organizações internacionais e de entidades afins: Há vários tipos de atos ou decisões de organizações internacionais: àAtos de eficácia externa e atos de eficácia interna àAtos políticos, atos jurisdicionais e atos administrativos àAtos normativos e atos não normativos àAtos imediatamente aplicáveis e atos não imediatamente aplicáveis (ou: decisões preceptivas e decisões programáticas ou diretivas)
Das decisões enquanto atos vinculativos ou imperativos distinguem-se as recomendações (exemplo: as recomendações da Assembleia Geral da ONU), e os pareceres (exemplo: os pareceres do Tribunal Internacional de Justiça).
Só os atos normativos, sejam de eficácia interna ou externa, são considerados fontes de direito internacional.
Jurisprudência e Doutrina Ao aludir à jurisprudência, importa considerar tanto as decisões de tribunais internacionais, arbitrais e judiciais, como as decisões de tribunais existentes na esfera interna dos Estados, na medida em que estes tribunais aplicam diretamente o Direito Internacional.
Os artigos 38º e 59º do estatuto do Tribunal Internacional de Justiça não atribuem às decisões deste órgão efeitos erga omnes nem é adotada, na prática, a regra do precedente. Mas, na ordem internacional, ainda mais do que na ordem interna, adquire crescente relevo aquilo a que se tem chamado a elaboração jurisprudencial do Direito, estimulada pelo confronto de diversas escolas e correntes judiciais.
O papel dos tribunais varia de acordo com os sistemas jurídicos respetivas e com as formas de Estado. Tem-se revelado significativo em problemas como os concernentes ao reconhecimento de Estado ou de governo, á sucessão de Estados, ás imunidades diplomáticas, á extradição e á cidadania.
A jurisprudência e a Doutrina são fontes mediatas de direito, são fontes meramente “auxiliares”. Quando alguém litiga no Tribunal Internacional de Justiça, ou outro Tribunal Internacional, pode a pessoa invocar decisões desses tribunais e ainda a doutrina Não existe a regra do precedente, porque estamos sempre a falar de uma fonte mediata, um meio auxiliar e portanto vai se usar as decisões dos tribunais como meios de persuasão do juiz daquele caso. Não há regra do precedente mas o juiz não deixará de a utilizar, por motivos de coerência às suas decisões passadas.
Em relação à doutrina, enquanto litigante, a evocação da doutrina será mais bem sucedida quanto mais bem conceituado o nome da pessoa que está a ser invocado.
2. O Costume Internacional O costume em Direito Internacional tem um papel bem maior do que aquele que tem no domínio do Direito Interno. Por via do artigo 8º nº1 da Constituição pode-se afirmar que as normas consuetudinárias internacionais fazem parte do Direito Português.
O costume pode ser definido como uma prática social reiterada com uma convicção de juridicidade. O Costume internacional decompõe-se num elemento material (o uso) e num elemento psicológico (a convicção de obrigatoriedade).
Relevância do Costume no plano internacional vs. plano interno: • A produção normativa resulta dos tratados, que são recentes e cobrem ainda poucas áreas das relações de direito internacional e há portanto várias áreas que necessitam de ser cobertas por este costume. • Antes de haver tratados sobre matérias, como a diplomacia, o costume cobria estas diversas áreas (por exemplo: a imunidade dos embaixadores, antes também não havia Direito Internacional Aeronáutico, tendo sido institucionalizada mais tarde. • Ainda hoje há matérias importantíssimas que continuam reguladas principalmente ou quase só por costume, como a responsabilidade internacional e as imunidades dos Estados. • Se o Costume funciona tão bem então porquê que hoje em dia temos tratados sobre essas matérias? o Dificuldade em provar que o costume existe o As pessoas têm fácil acesso aos tratados e convenções mas não ao costume (segurança jurídica) o No direito interno muito costume também foi sendo transformado em lei
Costume geral ou universalà Costume que obriga todos os sujeitos de Direito Internacional, mesmo aqueles que o não reconhecem. Costume particularà Costume nascido e aplicável apenas em certo continente ou em certo conjunto de Estados com afinidades políticas, culturais ou outras (por exemplo: o asilo diplomático na América Latina). Costume Localà Relativo a uma área geográfica circunscrita, como foi o costume consagrador do direito de passagem de autoridades civis portugueses
entre Damão e os enclaves de Dadrá e Nagar-Aveli no antigo Estado da Índia ou como são determinados costumes locais na Europa.
O Fundamento do Costume: • Posição mais antigaà reconduzia o costume ainda à vontade; o costume seria na célebre expressão de Grócio, um pacto tácito. Não manifestada a sua vontade em contrário, os Estados estariam adstritos a cumprir os deveres decorrentes de normas consuetudinárias. Mas, esta doutrina voluntarista está ultrapassada e nem sequer fornece uma base segura para a compreensão de costumes locais ou bilaterais.
Não existe costume contra-legem porque se os Estados se vincularam perante um Tratado, já adotaram uma posição sobre determinada matéria que acaba por prevalecer um costume anterior. Implica que os Estados adoptaram uma posição ou contrária ou que prevalece a um costume previamente existente. Professor Jorge Miranda: As normas jurídicas de origem consuetudinária e as normas jurídicas convencionais possuem o mesmo valor jurídico e, por conseguinte, deve admitir-se a possibilidade de recíproca modificação e revogação. Em concreto, será muito difícil ou até impossível verificar-se a revogação de um costume universal por um tratado.
As normas consuetudinárias encontram-se subordinadas ao ius cogens. O ius cogens não pode nem ser modificado nem afetado por normas consuetudinárias. O costume postula sempre a prática, o ius cogens impõe-se ainda quando não haja nenhuma prática.
Há muitas áreas que podiam ser reguladas por costume internacional mas que estão cada vez mais a serem abrangidas por tratados. A vantagem é a segurança jurídica. O tratado nunca deixa dúvidas.
3. Tratados Internacionais
3.1 Noção de Tratado Por tratado ou convenção internacional entende-se um acordo de vontades entre sujeitos de Direito Internacional constitutivo de direitos e deveres ou de outros efeitos nas relações entre eles; um acordo de vontades regido pelo Direito Internacional, entre sujeitos de Direito Internacional; acordo de vontades entre sujeitos de Direito Internacional, agindo enquanto tais, de que derivam efeitos jurídico-internacionais ou jurídico-internacionalmente relevantes.
Os Tratados são a principal forma de regular as relações internacionais. Só podemos dizer que os tratados são fonte de direito quando falamos de tratados normativos – aqueles que têm comandos gerais e abstratos. Antigamente, os tratados não tinham esta natureza, apenas continham direitos e obrigações recíprocas entre duas partes. Hoje em dia, contêm direitos e obrigações gerais para todas as partes. Todos os tipos de tratados estão sujeitos às mesmas regras, principalmente quanto ao modo de celebração.
O conceito envolve: • Um acordo de vontades • A necessidade de as partes serem todas sujeitos de Direito Internacional e de agirem nessa qualidade • Regulamentação pelo direito internacional • A produção de efeitos com relevância nas relações internacionais – sejam estritos efeitos nessas relações, sejam efeitos nas ordens internas das partes
O conceito não implica, pelo contrário: • Que as partes sejam Estados – porque há tratados entre Estados e outros sujeitos de direito internacional – como os previstos no artigo 43º da CNU – ou mesmo apenas entre sujeitos de direito internacional que não Estados, como os do artigo 63º • Que o acordo seja reduzido a escrito – pois a priori nada o impõe e ao longo da história houve tratados não escritos • Que, sendo escrito o acordo, se reduza a um único instrumento – pois pode o consenso formar-se através da troca de notas
A Convenção de Viena apresenta uma noção mais restrita de Tratado ao estatuir no seu artigo 2º alínea a) que apenas são tratados aqueles que são escritos, mas isto nem sempre é assim, pode haver tratados não-escritos, como já vimos. A noção de contrato neste artigo apenas fala nos tratados que contenham as características presente nesta convenção
Artigo 2º Definições 1. Para os fins da presente convenção: a) “Tratado” designa um acordo internacional concluído por escrito entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer esteja consignado num instrumento único, quer em dois ou mais instrumentos conexos, e qualquer que seja a sua denominação particular.
Deve contudo esclarecer-se que muito embora esta definição de tratado não se aplique, nem aos acordos internacionais concluídos entre Estados e outros sujeitos de Direito Internacional Público, nem aos acordos internacionais de forma não escrita, a Convenção de Viena de 1969 vem esclarecer no seu artigo 3º que não é por isso que tais acordos perdem o seu valor jurídico.
Artigo 3º Acordos Internacionais não compreendidos no âmbito da presente Convenção O facto de a presente Convenção não se aplicar aos acordos internacionais concluídos entre Estados e outros sujeitos de direito internacional ou entre estes outros sujeitos de direito internacional, nem aos acordos internacionais em forma não escrita, não prejudica: a) O valor jurídico de tais acordos; b) A aplicação aos mesmos de quaisquer normas enunciadas na presente Convenção às quais estejam submetidos por força do direito internacional, independentemente desta Convenção;
c) A aplicação da Convenção às relações entre Estados regidas por acordos internacionais nos quais sejam igualmente partes outros sujeitos de direito internacional.
Distinção de realidades afins Dos tratados internacionais distinguem-se: • Os feixes de atos unilaterais – ou atos unilaterais simultaneamente emitidos por diferentes Estados com conteúdo idêntico, de ordinário sob a forma de declaração • Os acordos estritamente políticos – em si sem produzir efeitos jurídicos, mas a que se sucedem verdadeiros tratados e outros atos • Os acordos informais ou gentlemen’s agreements • Os comunicados de reuniões e conferências diplomáticas, anunciando a conclusão de negociações ou a celebração de acordos (pois uma coisa é o tratado que foi ou virá a ser assinado, outra coisa a notícia a seu respeito). • Os contratos entre organizações internacionais e particulares • Acordos de cooperação entre municípios e regiões de dois Estados em áreas fronteiriças • Contratos entre Estados e empresas privadas transnacionais ou multinacionais – as empresas e entidades privadas não possuem personalidade jurídico-internacional e por isso os atos que produzem não podem estar na categoria de Tratados.
Diferença entre Tratado e Convenção: Tratado é o termo correntemente utilizado para definir os acordos celebrados entre os sujeitos de direito internacional. Para a Constituição Portuguesa, tratado é apenas uma modalidade de convenção que assume uma forma mais solene (ratificação pelo Chefe de Estado). A Convenção, por sua vez é mais genérica. Os dois termos reportam-se a amplitudes diversas.
Terminologia: Numerosos tratados em especial ou sobre objeto específico recebem designações particulares. Assim: • Carta e estatuto – termos utilizados para a constituição de organizações internacionais (natureza institucional) • Concordata: Tratado entre a Santa Sé e um Estado acerca da situação da Igreja Católica perante este • Pacto: Tratado de aliança militar (por exemplo: Pacto do Atlântico ou Pacto de Varsóvia), mas igualmente tratado político de grande importância (por exemplo: Pacto da Sociedade das Nações ou Pactos de Direitos Económicos, Sociais e Culturais e de Direitos Civis e Políticos). • Ato geral ou final: tratado conclusivo de uma conferência ou congresso internacional de Estados . Às vezes, porém, a ata geral de uma conferência não chega a ter natureza de verdadeiro e próprio tratado. • Convenção técnica: tratado sobre matérias especializadas de caráter técnico, em regra complementar de outro • Protocolo adicional: tratado complementar ou modificativo de outro sobre matérias políticas
• Modus Vivendi: Acordo temporário ou provisório • Compromisso: Acordo tendente à solução arbitral de conflitos
Classificações de tratados: • Tratados Normativos (tratados-leis) e tratados não normativos (tratados- contratos) à No primeiro caso, estabelecem-se comandos de caráter geral e abstrato ou geral e concreto ou as partes submetem-se a comandos preexistentes, concretizando-os nas suas relações. No segundo caso, estipulam-se prestações recíprocas e os tratados esgotam-se com a sua realização. • Tratados relacionais e tratados institucionaisà sendo estes os constitutivos de organizações internacionais e de entidades afins • Tratados principais e tratados acessóriosà Sendo estes tratados subsequentes aos primeiros, deles dependentes e destinados a regular certas matérias adicionais ou a situação de certas partes • Tratados bilaterais e multilateraisà Os tratados bilaterais são aqueles que só têm duas partes e nos quais se entremostra a reciprocidade dos interesses. Os tratados multilaterais, ou com uma pluralidade de partes, avultam interesses comuns. E os contratos multilaterais podem ainda ser restritos ou gerais. Nos tratados multilaterais gerais, há uma tendencial coincidência com a totalidade dos Estados com acesso à comunidade internacional – porque são tratados entre Estados, embora às vezes abertos a outros sujeitos—e é neles que se manifesta mais o caráter normativo. Por definição os tratados multilaterais gerais são tratados abertos • Tratados abertos e fechadosà Os tratados abertos são aqueles que admitem a adesão de estados que não participaram no momento original da sua fundação (exemplo: Tratado da União Europeia). Os tratados fechados são aqueles dos quais apenas podem fazer parte sujeitos que tenham participado na sua negociação. Os tratados de delimitação de fronteiras, as concordatas e os acordos entre as Nações Unidas e as organizações especializadas são tratados fechados. • Tratados solenes e tratados não solenes à Os tratados solenes têm a exigência do ato de ratificação. Envolvem a participação de um maior número de órgãos internos. Nos tratados não solenes ou convenções simplificadas podem distinguir-se acordos em forma simplificada e acordos em forma ultrasimplificadas (estes últimos caracterizam-se por a vinculação ocorrer não aquando da ratificação ou da aprovação mas aquando da assinatura, e assim neles dispensam-se quer a ratificação, quer a própria aprovação). Os acordos em forma simplificada dispensam apenas a ratificação. São tratados cuja vinculação ocorre por decisão de órgãos menos importantes. À maior ou menor formalidade ou solenidade dos tratados deveria corresponder uma maior ou menor importância das matérias. Os tratados que carecem de ratificação ligar-se-iam à função política própria dos Estados, ao passo que nos outros estar-se-ia fundamentalmente na presença da função executiva ou função administrativa. • Tratados exequíveis por si mesmos e tratados não exequíveis por si mesmosà Consoante obtenham plena efetividade só por si ou, sem
prejuízo da sua vigência na ordem interna, careçam, à semelhança das normas constitucionais não exequíveis, de outro tratado ou de lei de complementação. • Tratados perpétuos e temporáriosà Consoante sejam de duração indefinida ou de duração sujeita a termo final • Tratados públicos e tratados privadosà Conforme o conhecimento do seu conteúdo seja revelado ou tornado possível ou fique reservado a quem interveio na sua conclusão. Mas os tratados secretos são hoje repelidos pelo Direito Internacional por porem em causa a boa-fé, e como a história mostra, poderem afetar a igualdade entre os Estados e a paz internacional.
Limites à Liberdade Convencional Princípio da Liberdade Contratual: Existe alguma obrigação de celebrar tratados? Podem os sujeitos incutir qualquer conteúdo a uma convenção internacional? Os tratados pressupõem liberdade não só de negociação mas também de estipulação. Os Estados podem estipular qualquer conteúdo, pois qualquer matéria pode ter relevância internacional. Não há nenhuma obrigação de vinculação ao tratado, um país pode até fazer parte das negociações mas depois não se vincular ao tratado.
No entanto, há limitações a este princípio, umas de direito interno, outras de Direito Internacional. àLimites de direito interno: • Estados não devem celebrar tratados que vão contra os princípios fundamentais das suas Constituições • Exemplo. Portugal não pode, celebrar tratados que infrinjam os direitos fundamentais consignados na Constituição àLimites de direito internacional • Os estados estão sujeitos aos princípios de Ius Cogens (por exemplo: um Estado que se tenha obrigado por tratado com outro Estado não pode celebrar um tratado com um terceiro Estado que ponha em causa o primeiro, pois isso colidiria com o princípio da boa-fé) • Os Estados podem estar vinculados a um tratado anterior que os obrigue a celebrar um tratado posterior. • Limites derivados tratados constitutivos de organizações internacionais ou de outras entidades a que os Estados pertençam, quando tal se encontre previsto nos seus tratados constitutivos • Limites decorrentes de normas emanadas de organizações internacionais ou de outras entidades a que os Estados pertençam, quando tal se encontre previsto nos seus tratados constitutivos
3.2. Fases da conclusão de tratados A regulamentação das formas de vinculação internacional dos Estados A regulamentação das formas de vinculação internacional dos Estados consta tanto de normas de Direito Internacional como de normas de Direito Interno, tem, portanto, um caráter misto.
É principalmente ao Direito Interno que cabe tal tarefa por três razões principais: • A deficiente estruturação ou institucionalização da comunidade internacional e do seu Direito • Se os tratados em si têm por objeto relações jurídico-internacionais, o seu processo de conclusão depende igualmente do Direito interno, por ser uma das manifestações do exercício da função política do Estado • A liberdade de organização dos Estados para esse efeito, consequência da sua soberania e traduzida numa grande variedade de soluções adequadas aos respetivos regimes e sistemas de governo
O processo e as formas de vinculação As fases clássicas do processo de vinculação internacional eram: 1. Negociação 2. Assinatura 3. Ratificação
No Direito Internacional contemporâneo fala-se em: 1. Negociação (com a assinatura) 2. Aprovação 3. Ratificação
A fase da negociação é marcadamente uma fase internacional, é regulada quase totalmente pela Convenção de Viena. A fase de vinculação (modo pelo qual o Estado se declara obrigado à convenção) pode assumir formas diferentes. Nada impede que uma mesma convenção internacional assume formas distintas para os diferentes Estados e em consequência que o momento da vinculação seja diferente para cada um deles.
A Convenção de Viena no seu artigo 11º diz que “O consentimento de um Estado em ficar vinculado por um tratado pode manifestar-se pela assinatura, a troca de instrumentos constitutivos de um tratado, a ratificação, a aceitação, a aprovação ou a adesão, ou por qualquer outra forma acordada.”
A Convenção não impõe, por conseguinte, nenhuma forma predeterminada em face da natureza, do objeto ou do conteúdo de qualquer tipo de tratado. O princípio consiste na estipulação da forma pelo tratado em concreto. Mas, para além disso, pode o Direito Constitucional de cada Estado pode prever esta ou aquela forma de vinculação. Segundo o artigo 6º da Convenção de Viena “Todo o Estado tem capacidade para concluir tratados”.
3.2.1. A negociação e a assinatura A fase da negociação é a fase em que os sujeitos de direito definem o conteúdo das obrigações e direitos a que estarão sujeitos. Sendo os Estados pessoas coletivas, os representantes dos Estados para efeitos de negociação são, segundo o artigo 7º da Convenção de Viena:
Artigo 7º Plenos Poderes 1 - Uma pessoa é considerada representante de um Estado para a adopção ou a autenticação do texto de um tratado ou para exprimir o consentimento do Estado em ficar vinculado por um tratado: a) Quando apresenta plenos poderes adequados; ou b) Quando resulta da prática dos Estados interessados, ou de outras circunstâncias, que estes tinham a intenção de considerar essa pessoa como representante do Estado para esses efeitos e de prescindir da apresentação de plenos poderes.
2 - Em virtude das suas funções e sem terem de apresentar plenos poderes, são considerados representantes do seu Estado: a) Os chefes de Estado, os chefes de governo e os ministros dos negócios estrangeiros, para a prática de todos os actos relativos à conclusão de um tratado; b) Os chefes de missão diplomática, para a adopção do texto de um tratado entre o Estado acreditante e o Estado receptor; c) Os representantes acreditados dos Estados numa conferência internacional ou junto de uma organização internacional ou de um dos seus órgãos, para a adopção do texto de um tratado nessa conferência, organização ou órgão.
Um ato relativo á conclusão de um tratado praticado por pessoa que não possa ser considerada autorizada a representar o Estado para esse fim não produz efeitos jurídicos, a não ser que seja ulteriormente confirmado pelo Estado (artigo 8º da Convenção de Viena).
Artigo 8º Confirmação posterior de um acto praticado sem autorização Um acto relativo à conclusão de um tratado praticado por uma pessoa que, nos termos do artigo 7º, não pode ser considerada como autorizada a representar um Estado para esse fim não produz efeitos jurídicos, a menos que seja confirmado posteriormente por esse Estado.
A adoção do texto do tratado efetua-se através do consentimento de todos os Estados que participaram na sua elaboração.
À adoção do texto segue-se a respectiva autenticação, a qual se faz segundo o processo nele estabelecido ou que seja acordado pelos Estados participantes na sua elaboração e, na sua falta, por assinatura ou rubrica do texto do tratado ou da ata final da conferencia em que o texto tenha sido incluído. A assinatura não é uma formalidade requerida pela Convenção para todos os casos.
A assinatura pode ter efeitos mais ou menos relevantes. A assinatura ou o processo equivalente não obrigam o Estado-parte, salvo nas convenções ultrasimplificadas. Em todos os casos serve como forma de fixar e autenticar o texto que foi negociado. Tem também o efeito de atribuir aos Estados que negociaram o poder de direito de se virem a vincular a ele definitivamente. Um outro efeito da assinatura é que faz nascer para esses estados que assinaram a convenção, a obrigação de não pôr em causa o objeto e o fim do tratado. Significa que a partir da assinatura, os Estados que assinaram uma Convenção têm a
obrigação que decorre do princípio da boa fé de não porem em causa o objeto e fim do tratado (artigo 18º da Convenção de Viena).
Artigo 18º Obrigação de não privar um tratado do seu objecto e do seu fim antes da sua entrada em vigor Um Estado deve abster-se de actos que privem um tratado do seu objecto ou do seu fim: a) Quando assinou o tratado ou trocou os instrumentos constitutivos do tratado sob reserva de ratificação, aceitação ou aprovação, enquanto não manifestar a sua intenção de não se tornar Parte no tratado; ou b) Quando manifestou o seu consentimento em ficar vinculado pelo tratado, no período que precede a entrada em vigor do tratado e com a condição de esta não ser indevidamente adiada.
O último efeito que a assinatura produz, é que em alguns casos pode ter um efeito de vinculação do estado à Convenção. São os casos que correspondem às modalidades menos solenes dos Tratados. Esta assinatura que é feita pelo pleno e potenciário pode originar a vinculação do Estado à Convenção. Isto acontece nos Estados que preveem que a assinatura tem este efeito.
3.2.2. A Aprovação Outra fase que a Convenção de Viena menciona é a fase da aprovação (artigo 11º). A fase da aprovação é a fase já de direito interno pela qual o órgão de direito interno aceita, delibera, no sentido da adoção ou vinculação do Estado àquela convenção. Nalguns casos essa aprovação pode ter efeito de vinculação. É o que acontece em alguns casos quanto ao Estado Português. Segundo a Constituição, a aprovação pode ser momento de vinculação quanto a acordos de forma simplificada. Todos os tratados requerem aprovação pelo órgão interno competente.
3.2.3. A ratificação Uma outra fase eventual, é a fase da ratificação. É a fase em que decorre a vinculação na modalidade mais solene. É uma fase que é eventual porque a vinculação pode ter ocorrido em momento anterior. A partir da assinatura que sucede a negociação, todas estas fases são eventuais.
Quando prevista, a ratificação nunca é um acto obrigatório para quem tenha de a emitir. É sempre um ato livre, salvo na hipótese, aliás rara, de o dever de ratificar derivar de um tratado anteriormente concluído.
Uma característica da ratificação é que é um ato destacável no procedimento. É um ato de natureza política, pois nada obriga um Chefe de Estado a ratificar. A recusa de ratificação é um ato político, corresponde ao exercício do poder próprio do Chefe de Estado. Mesmo que a Convenção Internacional tenha sido aprovada pela Assembleia da República, o Chefe de Estado permanece livre de não a ratificar de acordo com o seu poder próprio.
3.3. Conclusão de Tratados em Portugal É o Direito Interno de cada Estado que estabelece qual a forma – solene, simplificada, ultrassimplificada – que os tratados podem ou não assumir; e é também ele que determina quais os órgãos competentes para a vinculação internacional do Estado e os respetivos tipos de atos. Estes órgãos e atos situam- se no domínio da função política e, por isso, as normas de Direito interno que os regem são, naturalmente, normas de Direito constitucional.
A Constituição Portuguesa, acerca destes momentos, diz em primeiro lugar que os plenipotenciários representantes é o Governo. A negociação pertence ao Governo, e a competência para a negociação é também para a assinatura. O artigo 8º nº2 da Constituição diz que vigoram em Portugal as Convenções regularmente ratificadas. Daqui se extrai a impossibilidade do Estado Português estar vinculado por efeito de mera assinatura.
A aprovação das Convenções Internacionais em Portugal compete à Assembleia da República, nos termos do artigo 161º i). A Assembleia da República tem competência para aprovar todos os tratados, bem como os acordos em forma simplifica que versem sobre sua matéria reservada. O Governo tem competência nos acordos em forma simplificada que não versem sobre matéria reservada da Assembleia da República. Nestes casos, não há hipótese de dar ao governo uma autorização.
Perante o direito constitucional português, encontram-se duas formas de tratados: tratados solenes e tratados em forma simplificada. A relevância constitucional da distinção entre tratados solenes e tratados sob forma simplificada é a seguinte: • A vinculação do Estado dá-se com a ratificação nos tratados e com a aprovação nos acordos • Os tratados são todos sujeitos a aprovação do Parlamento (artigo 161º alínea i); os acordos tanto podem ser aprovados pela Assembleia da República como, salvo os que versem sobre matérias reservadas á Assembleia da República, pelo Governo • Só questões objeto de tratado, não de acordo, pode ser submetidas a referendo • O Presidente da República intervém nos tratados através da ratificação e nos acordos através da assinatura dos decretos ou das resoluções de aprovação • Há fiscalização preventiva da constitucionalidade de uns e de outros, embora com efeitos diversos: em caso de pronúncia pela inconstitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, ainda poderá vir a verificar-se a ratificação do tratado, se a Assembleia da República o aprovar por maioria de dois terços dos deputados presentes, desde que superior á maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções; porém, o Presidente da República não poderá assinar o decreto ou a resolução de aprovação de acordo objeto de tal pronúncia e, portanto, Portugal não poderá tornar-se parte.
O direito constitucional português exclui acordos em forma ultrasimplificada. Em primeiro lugar, porque as únicas formas de vinculação constitucionalmente previstas são as que se dão com a ratificação e com a aprovação. E em segundo lugar, porque não faria sentido que, representado o Presidente da República o Estado, ele ficasse afastado da vinculação de Portugal a um tratado internacional.
Distinção material entre tratados solenes e acordos em forma simplificada: àMatéria O ponto de partida encontra-se no artigo 161º alínea i) da Constituição. Com este preceito – a conjugar com o artigo 197º nº1 alínea c), relativo ao Governo – visa- se assegurar a intervenção da Assembleia da República nas convenções que assumam maior relevância na vida do país.
Assim, as matérias correspondentes aos artigos 161º, 164º e 165º integram uma reserva – necessariamente absoluta – de aprovação parlamentar de convenções internacionais, e desde logo, as primeiras têm de ser objeto de tratado.
Matérias objeto de tratado: • Matérias referidas normativamente no artigo 161º • Matérias especificamente contempladas em preceitos avulsos de reserva de convenção: o Cidadania (artigo 4º) o Exercício em comum de poderes necessários á integração europeia (artigo 7º nº6) o Tribunal Penal Internacional (artigo 7º nº7) o Previsão de novos direitos fundamentais (artigo 16º nº1) o Extradição (artigo 33º nº3, 4 e 5) o Funções do Banco de Portugal) • Matérias que envolvam decisão política relevante ou primária (exemplo: entrega de Macau á China)
E quanto ás matérias da reserva de competência legislativa? O artigo 164º alínea i), da Constituição, na versão de 1982, falava em tratados que versassem sobre matéria da competência legislativa reservada da Assembleia da República; e devia entender-se que aí nunca poderiam ser celebrados acordos em forma simplificada. Em 1989 – por se temer que o Governo não respeitasse esta regra – acolheu-se a denominação mais genérica de convenções, e em 1997 introduziu-se a forma atual. Garante-se sempre a intervenção do Parlamento. Mesmo aqui não deixa de fazer sentido distinguir entre tratado e acordo, quando estejam em causa opções políticas primárias, quando a nível interno tenha de haver uma decisão legislativa, deve optar-se pela forma de tratado.
Esta regra aplica-se, inclusive, a matérias que nem sequer se acham reservadas ao Parlamento, valendo também para matérias de competência concorrencial conexas ou de significado afim.
Para que a Assembleia mantenha uma prerrogativa de decisão fundamental em quaisquer domínios, é essencial que, mesmo não lhe sendo esses domínios
reservados a nível de competência legislativa, eles lhe sejam reservados a nível de tratado. E nem por isto ela adquire uma posição de supremacia absoluta frente ao Governo, visto que a iniciativa de celebração de tratados é exclusiva do Governo.
Pode mesmo reconhecer-se um valor reforçado aos tratados em face dos acordos em forma simplificada, no âmbito do direito português. Um tratado não poderá ser afetado, com efeitos na ordem interna, por um acordo em forma simplificada. Isto implica que se, na ordem internacional, se pretender modificar ou abrogar um tratado, então o Governo deverá dar ao novo ato a forma de tratado e não a de acordo.
Negociação e assinatura: A negociação e a assinatura competem ao governo (artigo 197º nº1 alínea b). É nítida a atribuição exclusiva ao governo dos poderes de negociação internacional do Estado. O Primeiro-Ministro informa o Presidente da República acerca dos assuntos da política externa do país (artigo 201º nº1 alínea c), e aqui se incluem, se não todas as negociações, pelo menos as atinentes ás convenções de maiores repercussões para a vida coletiva – informação prévia, e não apenas a posteriori, ou perante factos consumados.
Tão pouco a Assembleia da República participa na negociação, mas nada obsta a que recomende ao Governo a negociação de qualquer tratado. O governo tem o dever de informação, em relação aos partidos políticos representados na Assembleia da República, e que não façam parte do Governo, e em relação aos grupos parlamentares.
Ao Ministério dos Negócios Estrangeiros incumbe a condução das negociações internacionais e a responsabilidade pelos procedimentos que visem a vinculação internacional do Estado, sem prejuízo das competências atribuídas a outros órgãos do Estado. A assinatura de acordos internacionais estão sujeitas a prévia aprovação pelo Conselho de Ministros e dependem de mandato expresso, entendendo-se esta competência delegada no Primeiro-Ministro.
A participação das Regiões Autónomas: Participam nas negociações dos tratados e acordos internacionais que diretamente lhes digam respeito, bem como nos benefícios deles decorrentes. Compreendido neste poder está o poder de acompanhar a execução dos mesmos tratados e acordos. O órgão que intervém nas negociações é o Governo Regional. à“Tratados ou acordos internacionais que diretamente lhes digam respeito”: • Política fiscal, monetária, financeira e cambial • Águas territoriais • Zona económica exclusiva e aos fundos marinhos contíguos • Organizações que tenham por objeto fomentar o diálogo e a cooperação inter-regional • Processo de construção europeia
A aprovação: Regime atual de aprovação apresenta-se assim: • Aprovação dos tratados à só pela Assembleia da República • Aprovação dos acordos em forma simplificada sobre matérias de competência reservada á Assembleia da República – também só pela Assembleia • Aprovação dos restantes acordos em forma simplificada – pelo Governo mas podendo este submeter qualquer destes acordos a aprovação parlamentar
O procedimento e as formas de aprovação: • Iniciativa à reservada ao Governo • Apreciação pela comissão competente em razão da matéria e, se for o caso disso, por outra ou outras comissões, pelos órgãos das regiões autónomas, ou tratando-se de convenção de caráter militar, pelo Conselho Superior de Defesa Nacional • Discussão e votação – discussão no plenário, na generalidade e na especialidade, e só votação global A maioria de aprovação é, nos termos gerais de Constituição, a maioria relativa.
A fiscalização preventiva da constitucionalidade: Os tratados e acordos internacionais são passiveis de fiscalização preventiva da constitucionalidade pelo Tribunal Constitucional, a requerimento do Presidente da República: antes da ratificação, no caso de tratados; e antes da assinatura dos correspondentes atos de aprovação, no caso de acordos em forma simplificada.
Ao contrário do que acontece com os atos de direito interno, a Constituição não prevê, nem poderia prever, o expurgo da norma considerada inconstitucional constante de tratado ou acordo internacional. Resta á Assembleia da República ou ao Governo uma possibilidade: aprovar a convenção de novo, e introduzir-lhe reservas se o tratado as admitir. Nada obsta, porém, a que o Presidente da República requeira de novo a apreciação preventiva.
O Parlamento poderá, em segunda deliberação, aprovar, por maioria de dois terços dos Deputados presentes, desde que superior á maioria absoluta dos Deputados em efetividade de funções, um tratado de que constem normas objeto de pronúncia pela inconstitucionalidade.
A ratificação dos tratados: Ao Presidente da República compete ratificar os tratados depois de devidamente aprovados. A ratificação consiste na declaração solene de vinculação do Estado. Pondo fim ao processo de conclusão do tratado, ela não interfere no seu conteúdo: o Presidente da República não pode formular reservas. A ratificação é entendida como ato livre. Estará sujeita a prazos? • Um prazo plausível seria o de 20 dias, por analogia com os 20 dias para promulgação das leis. Contudo, talvez se justifique um prazo mais alargado, por a conclusão de um tratado exigir maior ponderação do que a aprovação de uma lei, que o Estado pode sempre livremente revogar
A assinatura dos atos de aprovação de acordos: Questão controversa à Saber se o Presidente da República pode recusar a assinatura do ato de aprovação de um acordo em forma simplificada. Têm-se vindo a dizer que sim: • Por o conteúdo dos acordos em forma simplificada tender a ser idêntico ao dos decretos regulamentares e estes poderes ser vetados pelo Presidente da República • Por, a não haver possibilidade de recusa da assinatura de decretos de aprovação de acordos, o Governo poder frustrar o veto exercido sobre decretos regulamentares, uma vez que as convenções internacionais prevalecem sobre os atos de direito interno • Por o Presidente da República poder suscitar a fiscalização preventiva e acordos, e por, sendo insuperável a pronúncia do Tribunal Constitucional no sentido de inconstitucionalidade, mal se compreender que o Presidente não tenha, frente aos mesmos atos, um poder de recusa por razões políticas • Por, representado o Presidente da República o Estado nas relações internacionais, também mal se compreender que não possa opor-se a acordos em forma simplificada, quando pode opor-se a tratados solenes
Competência e forma em caso de desvinculação: àEm geral, não pode o governo denunciar nenhuma convenção sem o consentimento do Presidente da República
àEstando em causa um tratado ou um acordo que verse sobre matérias reservadas á Assembleia da República, a decisão de desvinculação tem de ser por ela aprovada, sob a forma de resolução
A publicação: Todas as convenções internacionais regularmente ratificadas ou aprovadas, para vigorarem na ordem interna têm de ser publicadas, em Diário da República. Carecem igualmente de publicação os avisos de retificação e os restantes avisos respeitantes a convenções internacionais.
Mas a publicação situa-se já para além do procedimento de conclusão das convenções, e se é condição necessária, não é condição suficiente para a vigência na ordem interna – os tratados e acordos só vigoram na ordem interna desde que vigorem na ordem internacional (artigo 8º nº2 da Constituição).
3.4. Reservas A história das reservas surge associada ao número de partes em cada tratado. Até aos finais do século XIX a maioria dos tratados eram bilaterais (tratados entre dois estados). Só com a evolução da interdependência do estado, da atividade económica internacional mais intensa, e a necessidade de um número de matérias cada vez mais abrangente, o direito internacional passa a regular aspetos inovadores na vida internacional. Este número de países é mais elevado e é mais difícil encontrar um consenso. É difícil conseguir conciliar num só tratado todas as características de todos os países do mundo e por isso são raros os tratados multilaterais universais.
Nas reservas há dois interesses contraditórios em presença: • O primeiro é a extensão da convenção: deseja-se que ela valha para o maior número possível de Estados, e assim, tende-se a aceitar os arranjos que permitam obter a sua participação. • O segundo é a integridade da Convenção: as mesmas regras devem, tanto quanto possível, valer para todas as partes, sem lacunas nem exceções. Durante muito tempo impôs-se o segundo interesse. Ultimamente, adota-se uma orientação mais flexível, destinada a facilitar as relações convencionais.
De certo modo, a reserva é um instituto de garantia das posições ou dos interesses das partes minoritárias perante a maioria formada aquando da negociação do tratado.
A definição de reserva encontra-se no artigo 2º alínea d) da Convenção de
Viena. “Reserva designa uma declaração unilateral, qualquer que seja o seu conteúdo ou a sua denominação, feita por um Estado quando assina, ratifica, aceita ou aprova um tratado ou a ele adere, pela qual visa excluir ou modificar o efeito jurídico de certas disposições do tratado na sua aplicação a esse Estado”.
Há um problema de traduçãoà a palavra “conteúdo” está aqui mal utilizada. O conteúdo tem sempre de ser de reserva. O conteúdo é relevante, e não era esta a tradução que se pretendia das versões em inglês e em francês.
O motivo da existência da reserva é a modificação do efeito jurídico normal de determinada norma. O importante de uma reserva é o seu conteúdo (visa excluir ou modificar um efeito jurídico de certas disposições do Tratado na aplicação ao Estado). A reserva só é reserva se for feita quando o Estado assina, aceita, ratifica ou aprova o tratado. Uma reserva não é uma reserva aquando do momento negocial. Um Estado, em princípio, não pode resolver fazer uma reserva a um Tratado que já tenha sido assinado, ou aprovado há algum tempo. Contudo, já tem acontecido serem postas reservas posteriormente e a entidade responsável pelo depósito dessa reserva ter aceitado isto.
Da figura da reserva distinguem-se: • As retificações do texto • As meras declarações interpretativas, as quais não atingem os efeitos jurídicos das disposições convencionais • As disposições transitórias e as cláusulas de exclusão relativas a certo ou certos Estados, umas e outras aceites por todas as partes e inseridas no próprio Tratado. • As declarações anexas a um tratado de mero alcance político • As modificações ou emendas que, supervenientemente, o tratado venha a sofrer.
A emissão de reservas está sujeita a limites materiais, temporais e formais:
Os limites temporais traduzem-se na exigência de a reserva ser formulada durante o processo de vinculação do tratado, não depois: a reserva tem de ser formulada no momento da assinatura, da ratificação, da aceitação ou da aprovação do tratado ou no momento da adesão.
Artigo 19º Formulação de Reservas Um Estado pode, no momento da assinatura, da ratificação, da aceitação, da aprovação ou da adesão a um tratado, formular uma reserva, a menos que: (...)
Os limites formais consistem na necessidade de a reserva ser formulada por escrito e comunicada aos Estados contratantes e aos outros Estados que tenham o direito de se tornar partes no tratado.
Artigo 23º Procedimento relativo às reservas 1 - A reserva, a aceitação expressa de uma reserva e a objeção a uma reserva devem ser formuladas por escrito e comunicadas aos Estados Contratantes e aos outros Estados que possam vir a ser Partes no tratado. 2 - A reserva formulada quando da assinatura de um tratado, sob reserva de ratificação, aceitação ou aprovação, deve ser formalmente confirmada pelo Estado que a formulou no momento em que manifesta o seu consentimento em ficar vinculado pelo tratado. Neste caso, a reserva considerar-se-á formulada na data em que tiver sido confirmada. 3 - A aceitação expressa de uma reserva ou a objeção a uma reserva, se anteriores à confirmação da reserva, não necessitam de ser elas próprias confirmadas. 4 - A retirada de uma reserva ou de uma objeção a uma reserva deve ser formulada por escrito.
Os limites materiais podem ser: • Expressosà proibição de reservas pelo tratado ou autorização somente de determinadas reservas • Implícitosà incompatibilidade da reserva com o objeto e o fim do tratado (artigo 19º, alíneas a), b) e c) da Convenção de Viena).
Há tratados que, desde logo, não consentem reservas: como por exemplo, a Carta das Nações Unidas, o estatuto do Tribunal Internacional de Justiça e o Estatuto do Tribunal Penal Internacional; as convenções de codificação na parte correspondente a normas consuetudinárias preexistentes. E há outros muito restritivos: os respeitantes aos direitos dos homens. Também não são possíveis reservas opostas ao ius cogens.
Artigo 19º Formulação de reservas Um Estado pode, no momento da assinatura, da ratificação, da aceitação, da aprovação ou da adesão a um tratado, formular uma reserva, a menos que: a) A reserva seja proibida pelo tratado; b) O tratado apenas autorize determinadas reservas, entre as quais não figure a reserva em causa; ou
c) Nos casos não previstos nas alíneas a) e b), a reserva seja incompatível com o objecto e o fim do tratado.
Só as reservas compatíveis com o objeto e o fim do tratado é que passam pelo mecanismo de aceitação consagrada no artigo 20º da Convenção.
Artigo 20º Aceitação das reservas e objeções às reservas 1 - Uma reserva autorizada expressamente por um tratado não exige a aceitação posterior dos outros Estados Contratantes, a menos que o tratado assim o preveja. 2 - Quando resulte do numero restrito dos Estados que tenham participado na negociação, assim como do objecto e do fim de um tratado, que a sua aplicação na íntegra entre todas as Partes é uma condição essencial para o consentimento de cada uma em vincular-se pelo tratado, uma reserva exige a aceitação de todas as Partes. 3 - Quando um tratado for um ato constitutivo de uma organização internacional e salvo disposição do mesmo em contrário, uma reserva exige a aceitação do órgão competente dessa organização. 4 - Nos casos não previstos nos números anteriores e salvo disposição do tratado em contrário: a) A aceitação de uma reserva por outro Estado Contratante constitui o Estado autor da reserva em Parte no tratado relativamente àquele Estado, se o tratado estiver em vigor ou quando entrar em vigor para esses Estados; b) A objeção feita a uma reserva por outro Estado Contratante não impede a entrada em vigor do tratado entre o Estado que formulou a objeção e o Estado autor da reserva, a menos que intenção contrária tenha sido expressamente manifestada pelo Estado que formulou a objeção; c) Um acto pelo qual um Estado manifeste o seu consentimento em ficar vinculado pelo tratado e que contenha uma reserva produz efeito desde que, pelo menos, um outro Estado Contratante tenha aceite a reserva. 5 - Para os efeitos dos números 2 e 4, e salvo disposição do tratado em contrário, uma reserva é considerada como aceite por um Estado quando este não formulou qualquer objeção à reserva nos 12 meses seguintes à data em que recebeu a notificação ou na data em que manifestou o seu consentimento em ficar vinculado pelo tratado, se esta for posterior.
Para que a reserva produza efeitos, é necessário que, pelo menos, outro Estado contratante a tenha aceite. Contudo nem sempre é assim, como se pode verificar no artigo 20º nº2 e nº3.
A aceitação da reserva pode ser tácita. A reserva será tida por aceite por um Estado se este não tiver objetado à reserva nos doze meses subsequentes à sua notificação, nem no momento em que tiver expresso o seu consentimento a vincular-se pelo tratado, se o fez posteriormente (artigo 20º nº5).
Em face das reservas, a vinculação ao tratado pelos diversos Estados ocorre nos seguintes termos: • Para os Estados que não formularam nem objetaram reservas o princípio é o cumprimento integral do contrato
• Para os Estados que formularam reservas e para os que as aceitaram, as reservas modificam, quanto às disposições que dela são objeto, as relações entre esses Estados à podendo falar-se numa espécie de tratados bilaterais acessórios enxertados no tratado multilateral principal. • Havendo Estados que objetaram às reservas, o relacionamento com os Estados que as formularam depende da atitude que aqueles assumirem, visto que: o Podem simplesmente ter formulada objeções o Podem formular as objeções e opor-se à entrada em vigor do tratado entre eles e os Estados que emitiram as reservas.
As reservas podem ser revogadas a todo o tempo e a objeção de uma reserva pode em qualquer momento ser revogada. A revogação de uma reserva e a revogação de uma objeção a essa reserva devem ser formuladas por escrito.
Artigo 22º Retirada das reservas e das objeções às reservas 1 - Salvo disposição do tratado em contrário, uma reserva pode ser retirada a todo o tempo, sem que o consentimento do Estado que a aceitou seja necessário à retirada. 2 - Salvo disposição do tratado em contrário, uma objeção a uma reserva pode ser retirada a todo o tempo. 3 - Salvo disposição do tratado em contrário ou se de outro modo acordado: a) A retirada de uma reserva só produz efeitos em relação a outro Estado Contratante quando este Estado dela tenha sido notificado; b) A retirada de uma objeção a uma reserva só produz efeitos quando o Estado autor da reserva tenha sido notificado dessa retirada.
Problemas que resultam da Convenção de Viena quanto às reservas: • Indefinição quanto ao que é o objeto e o fim do tratado, a falta da definição inquina o processo que a Convenção de Viena prevê • Falta de meios para que o um Estado oponha • Confusão entre o momento da verificação da compatibilidade das reservas com os tratados e o momento da aceitação das reservas por parte de outros Estados. • Há uma total falta de consequências para uma reserva incompatível com o objeto e fim dos tratados.
A nível interno dos Estados, a competência para emitir, modificar ou revogar reservas depende das normas constitucionais relativas à aprovação de tratados.
3.5. O depósito de Tratados Nos tratados multilaterais existe o instituto do depósito. à Convenção de Viena, artigos 76º e 77º
O depositário pode ser um ou várias dos Estados que participaram na negociação, uma organização internacional ou o principal funcionário administrativo de uma organização internacional. A sua função tem caráter internacional e ele está sujeito a um dever de imparcialidade.
São funções do depositário: • Assegurar a guarda do texto original do tratado; • Estabelecer cópias autenticadas do tratado ou cópias noutras línguas; • Receber todas as assinaturas do tratado e receber e guardar todos os instrumentos e notificações relativos ao tratado; • Informar as partes e os Estados com capacidade para se tornarem partes acerca de todos os atos, comunicações e notificações relativos ao tratado; • Informar os Estados com capacidade para serem partes no tratado da data na qual foi recebido ou depositado o número de assinaturas ou de instrumentos de ratificação, adesão, de aceitação ou de aprovação necessários para a entrada em vigor do tratado; • Promover o registo do tratado
3.6. O registo, publicação e entrada em vigor dos tratados A convenção de Viena estabelece normas supletivas, em muitos casos limita-se a remeter para o próprio tratado a regulação de determinada matéria, regulando-a se o tratado nada disser. A Convenção de Viena regula um ato de soberania dos Estados. São normas que só entram em funcionamento se o tratado nada disser.
Registo e Publicação Os tratados secretos revelaram-se sempre perigosos para a paz e segurança coletiva, e são inadmissíveis em forma de governo democrático. Por isso, consagra-se a regra do registo dos tratados.
A Convenção de Viena vem impor o registo relativamente a todos e quaisquer tratados, sejam ou não as partes membros das Nações Unidas (artigo 80º). A convenção não determina a consequência da falta de registo.
O artigo 102º nº2 da Carta das Nações Unidas aponta para a simples oponibilidade: nenhuma parte em qualquer tratado ou acordo internacional que não tenha sido registado poderá invoca-lo perante qualquer órgão das Nações Unidas (portanto, tão-pouco, perante o Tribunal Internacional de Justiça).
Entrada em vigor
Artigo 24º Entrada em vigor 1 - Um tratado entra em vigor nos termos e na data nele previstos ou acordados pelos Estados que tenham participado na negociação. 2 - Na falta de tais disposições ou acordo, um tratado entra em vigor logo que o consentimento em ficar vinculado pelo tratado seja manifestado por todos os Estados que tenham participado na negociação. 3 - Quando o consentimento de um Estado em ficar vinculado por um tratado for manifestado em data posterior à da sua entrada em vigor, o tratado, salvo disposição do mesmo em contrário, entra em vigor relativamente a esse Estado nessa data. 4 - As disposições de um tratado que regulam a autenticação do texto, a manifestação do consentimento dos Estados em ficarem vinculados pelo tratado, os termos ou a data da sua entrada em vigor, as reservas, as funções do depositário,
bem como outras questões que se suscitam necessariamente antes da entrada em vigor do tratado, são aplicáveis desde a adoção do texto.
Um tratado só entra em vigor na data estipulada, se as partes o tiverem ratificado. A posição de uma data só faz sentido em casos de Tratados em que seja óbvio ou manifesto de que o mesmo será ratificado. àNo Estatuto de Roma do Tribunal Penal não há a imposição de uma data, mas estabelece-se uma série de condições para a entrada em vigor do Estatuto.
O nº2 deste artigo é uma norma de unanimidade. Ou seja, na falta de disposição no tratado, o tratado entra em vigor logo que o consentimento a ficar por ele vinculado seja manifestado por todos os Estados que tenham participado na negociação.
A vigência das normas de um tratado na ordem interna depende da sua vigência na ordem internacional, e isso mesmo diz, por exemplo, o artigo 8º nº2 da Constituição Portuguesa.
Observância dos Tratados
Artigo 26.o Pacta sunt servanda Todo o tratado em vigor vincula as Partes e deve ser por elas cumprido de boa fé.
Este artigo é um princípio de ius cogens. Isto quer dizer que se a regra dos tratados é a regra segundo a qual só está vinculado a um tratado quem o ratifica, esta regra de ius cogens vincula os Estados mesmo quando estes manifestam intenção de não se vincularem.
Princípio da boa féà Não violação do princípio da proteção da confiança.
Em direito internacional, causa um grande problema. Se houver contradição entre tratado e direito interno, pode haver um conflito de deveres.
Artigo 27º Direito interno e observância dos tratados Uma Parte não pode invocar as disposições do seu direito interno para justificar o incumprimento de um tratado. Esta norma não prejudica o disposto no artigo 46.o
O direito interno não pode servir de justificação para não cumprir as disposições do Tratado. Em caso de contradição, numa perspectiva de monismo com primado do direito internacional, o que prevalece é o tratado.
Pode haver aqui uma dificuldade que é a da contradição do tratado e a Constituição. Na pirâmide normativa, a Constituição está acima dos tratados.
Artigo 46º Disposições de direito interno relativas à competência para concluir tratados
1 - A circunstância de o consentimento de um Estado em ficar vinculado por um tratado ter sido manifestado com violação de uma disposição do seu direito interno relativa à competência para concluir tratados não pode ser invocada por esse Estado como tendo viciado o seu consentimento, salvo se essa violação tiver sido manifesta e disser respeito a uma norma de importância fundamental do seu direito interno. 2 - Uma violação é manifesta se for objectivamente evidente para qualquer Estado que proceda, nesse domínio, de acordo com a prática habitual e de boa fé.
Este artigo refere-se à inconstitucionalidade orgânica, violação de regras de competência. Esta norma transmite que o Direito Interno está abaixo dos tratados. A Constituição não pode servir de fundamento para não cumprir um tratado que já tenha sido ratificado por um estado. A não ser que haja violação de regras de competência. Se o tratado violar uma norma substancial da Constituição, o tratado prevalece. Contudo, se o tratado violar a competência dos órgãos, já pode ser invocada a inconstitucionalidade. àExplicação: O princípio pacta sunt servanda é um principio assente na boa fé, isto quer dizer que se um Estado ao seu mais alto nível manifestou intenção de cumprir um tratado foi porque esse estado e o seu órgão consideraram que estavam aptos a fazê-lo e que a sua constituição não era um obstáculo à funcionalidade desse tratado. Se o consentimento foi dado por quem tinha de ser dado então o estado está vinculado porque eram esses órgãos que tinham o dever de assegurar que não haveriam inconstitucionalidades. Contudo, se não foram as entidades adequadas a participar no processo, então não é legítimo exigir que um estado viole a sua constituição com fundamento numa vinculação que foi dada por quem não a podia dar. Isto implicaria imputar ao povo uma norma que não foi aceite por quem a representa.
São dois os requisitos de invocabilidade e eventualmente, de não vinculação do Estado: 1º) Que se tenha infringido uma regra interna de importância fundamental – o que aponta para uma regra de caráter constitucional, embora a importância das regras tenha de ser medida no contexto de cada sistema político; 2º) Que a violação seja manifesta. Subjacentes às regras estão o principio da boa fé e as exigências de segurança jurídica. Todavia, as fórmulas adotadas abrangem conceitos indeterminados, cuja interpretação pode revelar- se difícil em muitos casos.
Artigo 277º nº2 da Constituição: “A inconstitucionalidade orgânica ou formal de tratados internacionais regularmente ratificados não impede a aplicação das suas normas na ordem jurídica portuguesa, desde que tais normas sejam aplicadas na ordem jurídica da outra parte, salvo se tal inconstitucionalidade resultar de violação de uma disposição fundamental.” à A parte mais controversa é a exigência de reciprocidade (de aplicação da norma pela outra parte). Não é que a outra parte aplique, exige-se que seja evidente para a outra parte.
A Constituição dos Estados não servem de pretexto para incumprimento desse Tratado.
Artigo 53º Tratados incompatíveis com uma norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens) É nulo todo o tratado que, no momento da sua conclusão, seja incompatível com uma norma imperativa de direito internacional geral. Para os efeitos da presente Convenção, uma norma imperativa de direito internacional geral é uma norma aceite e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados no seu todo como norma cuja derrogação não é permitida e que só pode ser modificada por uma nova norma de direito internacional geral com a mesma natureza.
Um tratado estabelece uma regra que viola o princípio da igualdade. Isto não é uma violação de uma norma de competência. Mas isto é uma violação de norma de ius cogens. Um tratado que viole uma norma de ius cogens é nulo. Disto tudo o que resta são os princípios materiais constitucionais.
Aplicação dos Tratados
Artigo 28º Não retroatividade dos tratados Salvo se o contrário resultar do tratado ou tenha sido de outro modo estabelecido, as disposições de um tratado não vinculam uma Parte no que se refere a um acto ou facto anterior ou a qualquer situação que tenha deixado de existir à data da entrada em vigor do tratado relativamente a essa Parte.
Isto é uma norma supletiva. Os Tratados só vão regular para o futuro, salvo se o contrário resultar do tratado. O próprio tratado pode estabelecer a sua eficácia retroativa e determinar que ele se aplica a situações anteriores. Os julgamentos de Nuremberga foram um caso excepcional de retroatividade.
Um tratado não pode dispor retroativamente se isso colocar em causa as expectativas de um Estado e de terceiros, por colocar em causa o princípio da boa fé que é um principio pacta sunt servanda.
Quando o tratado põe em causa direitos adquiridos, também não pode ter eficácia retroativa.
Artigo 29º Aplicação territorial dos tratados Salvo se o contrário resultar do tratado ou tenha sido de outro modo estabelecido, a aplicação de um tratado estende-se à totalidade do território de cada uma das Partes.
Esta é uma norma supletiva, e as exclusões têm de ser expressas, senão aplica-se a todo o território. Quanto aos estados unitários sabe-se pacificamente, que o tratado se aplica à totalidade do território. O problema se coloca quanto aos Estados Federados.
Artigo 30º Aplicação de tratados sucessivos sobre a mesma matéria
1 - Sem prejuízo do disposto no artigo 103.o da Carta das Nações Unidas, os direitos e obrigações dos Estados Partes em tratados sucessivos sobre a mesma matéria são determinados de acordo com os números seguintes. 2 - Quando um tratado estabelece que está subordinado a um tratado anterior ou posterior ou que não deve ser considerado incompatível com esse outro tratado, prevalecem as disposições deste último. 3 - Quando todas as Partes no tratado anterior são também Partes no tratado posterior, sem que o tratado anterior tenha cessado de vigorar ou sem que a sua aplicação tenha sido suspensa nos termos do artigo 59.o, o tratado anterior só se aplica na medida em que as suas disposições sejam compatíveis com as do tratado posterior. 4 - Quando as Partes no tratado anterior não são todas Partes no tratado posterior: a) Nas relações entre os Estados Partes nos dois tratados é aplicável a norma enunciada no nº 3; b) Nas relações entre um Estado Parte em ambos os tratados e um Estado Parte apenas num deles, o tratado no qual os dois Estados são Partes rege os seus direitos e obrigações recíprocos. à Isto só faz sentido no caso de não haver incompatibilidade. 5 - O nº 4 aplica-se sem prejuízo do disposto no artigo 41º, ou de qualquer questão de cessação da vigência ou de suspensão da aplicação de um tratado nos termos do artigo 60º, ou de qualquer questão de responsabilidade que possa nascer para um Estado da conclusão ou da aplicação de um tratado cujas disposições sejam incompatíveis com as obrigações que lhe incumbam relativamente a outro Estado, por força de outro tratado.
Um tratado posterior só revoga o anterior se: • As partes forem as mesmas; coincidência de partes • E houver um consenso quanto a essa revogação
Interpretação dos Tratados
Artigo 31º Regra geral de interpretação 1 - Um tratado deve ser interpretado de boa fé, de acordo com o sentido comum a atribuir aos termos do tratado no seu contexto e à luz dos respectivos objecto e fim. 2 - Para efeitos de interpretação de um tratado, o contexto compreende, além do texto, preâmbulo e anexos incluídos,: a) Qualquer acordo relativo ao tratado e que tenha sido celebrado entre todas as Partes quando da conclusão do tratado; b) Qualquer instrumento estabelecido por uma ou mais Partes quando da conclusão do tratado e aceite pelas outras Partes como instrumento relativo ao tratado. 3 – Ter-se-á em consideração, simultaneamente com o contexto: a) Todo o acordo posterior entre as Partes sobre a interpretação do tratado ou a aplicação das suas disposições; b) Toda a prática seguida posteriormente na aplicação do tratado pela qual se estabeleça o acordo das Partes sobre a interpretação do tratado; c) Toda a norma pertinente de direito internacional aplicável às relações entre as Partes.
4 - Um termo será entendido num sentido particular se estiver estabelecido que tal foi a intenção das Partes.
Boa-fé: impede o venire contra Factum Proprium; aparece a propósito dos contratos; isto acaba por aproximar um tratado de um contrato; a interpretação deve ser conforme o comportamento que tiveram as negociações.
• Caso 1: Protocolo de Kyoto, tratado de natureza ambiental que visa diminuir as emissões poluentes do mundo. Os EUA nunca ratificou, com o argumento de que a China nunca ratificou dizendo que isto afetaria a competição empresarial com a China (pois a China continuaria a produzir, e as empresas americanas ficariam numa posição de desvantagem). Um Estado não pode pretender influenciar as decisões de um tratado e mais tarde contrariá-las, que é o que os EUA fizeram, pois participaram nas negociações mas nunca ratificaram o tratado.
• Caso 2: Estatuto de Roma do Tribunal Penal Internacional. Ocorreu a mesma coisa, os EUA participaram nas negociações mas nunca chegaram a ratificar o Estatuto. Os EUA não podem participar nas negociações e depois frustrar as expectativas. Os EUA não se vincularam.
Questão diferente, é um Estado ter um determinado comportamento na negociação, o Estado ratificar o tratado, e vem mais tarde defender uma solução interpretativa completamente oposta àquela de defendeu na negociaçãoà violação da boa fé. Análise do número 1 do artigo 31º: • De acordo com o sentido comum a atribuir aos seus termosà dependem do sentido atribuído à expressão em cada uma das línguas. Há uma regra relativa à fé das línguas do tratado. Isto quer dizer que o tratado é originariamente celebrado numa ou mais línguas mas ficam definidas no tratado, e essas são línguas oficiais. Há casos de tradução nos quais os sentidos acabam por ser diferentes. • No seu contextoà circunstâncias históricas geopolíticas, económicas e sociais em que ele está a ser aplicado. Apelo a uma interpretação atualista, a interpretação do tratado não pode ser desligada do seu contexto. • À luz dos respetivos objeto e fimà O objeto e fim do tratado respeitam ao seu conteúdo essencial e aos seus objetivos, aquilo que ele visa atingir. Sempre que olhamos para um tratado temos de fazer este juízo, o que é essencial e o que é acessório neste tratado. Cada cláusula deve ser interpretada à luz do seu objeto e fim.
Análise do número 2 do artigo 31º: • Importância dos preâmbulos e anexos, matérias que não estão incluídas no tratado • Acordo relativo ao tratadoà Visam complementar o tratado • Instrumento estabelecido pelas partesà neste contexto falam-se das declarações interpretativas; estas não são reservas mas são declarações interpretativas porque é um estado a dizer à partida no momento em que
se vincula, qual é a sua interpretação do tratado. Isto acaba por ser um reforço da boa fé.
A interpretação atualista de um tratado, tem de ser suportada em normas e em factos. Se há um tratado posterior que ajuda a enquadrar uma determinada questão, esse tratado tem de ser enquadrado na interpretação do tratado anterior.
O costume pode ser utilizado como instrumento auxiliar de interpretação de um tratado. Isto apenas na medida em que a prática se conforme com o tratado. Estamos numa prática que nos ajuda a interpretar o tratado. Exemplo: aquela cláusula do tratado tem sido interpretado de determinada forma há 100 anos.
Interpretação conforme do direito dos tratados com o direito internacional imperativo. Nulidade dos tratados desconformes ao ius cogens. Se houver duvida quanto ao sentido a dar a uma cláusula do tratado, deve-se ter em conta o direito internacional vigente, ou seja, o direito internacional imperativo (ius cogens).
Artigo 32º Meios complementares de interpretação Pode-se recorrer a meios complementares de interpretação, designadamente aos trabalhos preparatórios e às circunstâncias em que foi concluído o tratado, com vista a confirmar o sentido resultante da aplicação do artigo 31.o, ou a determinar o sentido quando a interpretação dada em conformidade com o artigo 31.o: a) Deixe o sentido ambíguo ou obscuro; ou b) Conduza a um resultado manifestamente absurdo ou incoerente.
Artigo 33º Interpretação de tratados autenticados em duas ou mais línguas 1 - Quando um tratado for autenticado em duas ou mais línguas, o seu texto faz fé em cada uma dessas línguas, salvo se o tratado dispuser ou as Partes acordarem que, em caso de divergência, prevalecerá um determinado texto. 2 - Uma versão do tratado numa língua diferente daquelas em que o texto foi autenticado só será considerada como texto autêntico se o tratado o previr ou as Partes o tiverem acordado. 3 - Presume-se que os termos de um tratado têm o mesmo sentido nos diversos textos autênticos. 4 - Salvo o caso em que um determinado texto prevalece, nos termos do nº 1, quando a comparação dos textos autênticos evidencie uma diferença de sentido que a aplicação dos artigos 31.o e 32.o não permita superar, adotar-se-á o sentido que melhor concilie esses textos, tendo em conta o objecto e o fim do tratado
Efeitos dos tratados perante terceiros à Artigo 34º da Convenção de Viena: Um tratado não cria obrigações nem direitos para um terceiro estado sem consentimento deste. Este é o postulado da relatividade: Pacta tertiis nec nocent nec prosunt
Um tratado só vincula as partes, os Estados que o ratificaram. Será que por parte deve-se entender o estado que negociou ou o estado que ratificou? O estado que ratificou o tratado, porque quem negociou e não ratificou não é parte porque não
se vinculou às obrigações do tratado. Por outro lado, pode haver um estado que ratifique mas que não tenha negociado: caso dos tratados abertos. A negociação aqui não é relevante em termos de vinculação do estado, o que é importante é a ratificação: intenção de estar vinculado pelo tratado.
Existem direitos e obrigações de um estado que tendo participado na negociação não tenha ratificado. Isto resulta do artigo 18º. Obrigação que impende sobre o estado neste momento: não privar o tratado do seu objeto e do seu fim, numa lógica de boa fé. • Caso do Tribunal Penal Internacional – Estados Unidos não ratificaram. Bush coloca a questão: Não poderiam os EUA “desassinar” o Estatuto do TPI? A Convenção de Viena não prevê isto. Mas o artigo 18º menciona a “intenção de não se tornar parte”.
Temos quanto à posição perante os Tratados, três situações de vinculação: 1. Estados partes que estão sujeitos às vinculações do tratado 2. Estados terceiros que não estão vinculados ao tratado 3. E estados em posições intermediárias, que são aqueles que: • Participaram das negociações mas não ratificaram o tratado e que portanto não podem pôr em causa o objeto e fim do tratado nos termos do artigo 18º da Convenção de Viena; • Artigo 35ºà Estados Terceiros aos quais foram atribuídas obrigações: liberdade contratual e negocial; algum Estado que não é parte do tratado não está sujeito ao tratado mas pode se encontrar vinculado a determinados deveres, se esse mesmo terceiro estado aceitar expressamente por escrito essa obrigação. • Artigo 36ºà Estados Terceiros aos quais foram atribuídos direitos pelos Estados que fazem parte do Tratado: Se um grupo de estados entender atribuir a um terceiro estado um direito, esse terceiro estado tem de consentir mas o consentimento também pode ser presumido enquanto não houver indicação em contrário. *Os Tratados abertos são, por definição, tratados que conferem direitos a terceiros (o direito de aderir ou de se tornar parte supervenientemente).
Artigo 37ºà No caso de haver uma obrigação para um terceiro estado, essa obrigação só pode ser revogada ou modificada mediante o consentimento das Partes no tratado e do terceiro estado, salvo se de outro modo tiverem acordado.
Oponibilidade dos tratados erga omnes: todos os Estados devem respeitar os tratados concluídos por outros Estados e não interferir na sua execução. Tal resulta do princípio de segurança nas relações internacionais ou de coexistência pacífica. Independentemente das regras sobre eficácia dos tratados perante terceiros, pode uma norma constante de um tratado tornar-se obrigatória em relação a terceiros Estados como norma consuetudinária. Isto resulta do artigo 38º da Convenção de Viena.
Como se sabe, a Carta das Nações Unidas impõe-se aos Estados não membros, quer nas relações com Estados-membros da organização, quer mesmo independentemente dessas relações.