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Diagramação e editoração
Núcleo de Produção Gráfica de Mídia Imprensa
Gerência de Criação e Produção de Arte
Preparação e revisão:
Magda Frediani Martins
CIP-BRASIL. CATALOGAÇÃO-NA-FONTE
SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ
T911
CDU: 37(81)
Ministério da Educação
Organização
2013
Volume 4
NOVOS SABERES PARA A EDUCAÇÃO
Sumário
Apresentação............................................................................................................... 5
Rosa Helena Mendonça e Magda Frediani Martins
1 Supervisora pedagógica do programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC). Doutoranda no PROPED- UERJ.
Organizadora da publicação.
2 Professora, escritora e revisora de textos do programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC). Organizadora
e revisora da publicação.
do processo ensino-aprendizagem. Ao con- educadores superem posturas tradicionais,
trário, os autores problematizam a utiliza- “como a clássica fragmentação dos saberes
ção da “tecnologia pela tecnologia” e insis- em compartimentos estanques que rara-
tem na necessidade do comprometimento mente se comunicam”. Esclarecem que a In-
com o currículo e com a construção de uma foeducação “busca romper com paradigmas
sociedade mais justa e igualitária. científicos e educacionais consagrados pela
tradição disciplinar, adotando perspectivas
A discussão em torno do uso das tecnolo- transdisciplinares, que articulam diferen-
gias digitais, de certa maneira, sempre este- tes saberes e fazeres em redes dinâmicas
ve presente ao longo desses mais de 20 anos de conhecimento e de atuação”. Também
do Salto para o Futuro, sendo que o próprio destacam que a biblioteca escolar vem sen-
programa é um exemplo da utilização das do apontada como instância privilegiada
tecnologias na formação de professores. ao desenvolvimento sistemático das apren-
Para debater tema tão relevante, seguem os dizagens informacionais, e que ela precisa
textos do quarto capítulo desta coletânea. transformar-se em estação de conhecimento.
Estes temas foram abordados por esse auto-
Edmir Perrotti3 e Ivete Pieruccini4, tomando
res nas séries de que participaram no Salto
como referência a obra Os sete saberes neces-
para o Futuro. 6
sários à Educação do Futuro, de Edgar Morin,
apresentam diversas considerações sobre Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida5 e
os desafios do trabalho dos educadores na Maria Elisabette Brisola Brito Prado6 apre-
sociedade da informação e da comunicação. sentam um relevante estudo sobre os cur-
Os autores se reportam à criação do termo sos voltados para a formação de professores
Infoeducação, um conceito muito atual, que para a integração de tecnologias ao currícu-
indica a necessidade de que a escola e os lo no desenvolvimento de projetos, em es-
3 Edmir Perrotti foi consultor da série A aventura de conhecer, com veiculação no programa Salto para o
Futuro/TV Escola (MEC) no ano de 2008. Também participou como especialista convidado dos debates de diversas
séries do programa.
4 Ivete Pieruccini participou como autora de textos da série A aventura de conhecer, com veiculação no
programa Salto para o Futuro/TV Escola (MEC) no ano de 2008.
5 Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida foi uma das consultoras da série Pedagogia de projetos e integração
de mídias, com veiculação no programa Salto para o Futuro/TV Escola em 2003, e participou de diversas séries do
Salto como autora de textos e especialista convidada para os debates. Também foi a organizadora, com José Manuel
Moran, da coletânea Integração das Tecnologias na Educação, editada pela Secretaria de Educação a Distância. Brasília:
Ministério da Educação, 2005 (textos selecionados das séries do Salto para o Futuro). Esse livro está disponível no
formato digital em:
http://tvescola.mec.gov.br/images/stories/publicacoes/salto_para_o_futuro/livro_salto_tecnologias.pdf
6 Maria Elisabette Brisola Brito Prado foi uma das consultoras da série Pedagogia de projetos e integração de
mídias, com veiculação no programa Salto para o Futuro/TV Escola em 2003, e participou de diversas séries como
autora de textos e especialista convidada para os debates.
pecial o Programa Proinfo Integrado, do Mi- o Educom e o Formar, e quais são os prog-
nistério da Educação. Segundo as autoras, nósticos para o futuro dessa área. O autor
“o uso das TIC no trabalho com projetos em comenta que o programa Salto para o Fu-
situações de aprendizagem que ocorrem na turo, do qual participou em diversas séries,
escola se desenvolve desde a década de 1980, teve um papel importante na disseminação
mas a integração entre projetos e TIC vem das ideias sobre o uso das TIC na educação e
caminhando mais na forma extracurricu- sobre a questão da formação de professores
lar”. Para que esta situação se modifique, é para o uso das tecnologias. Defende que tais
essencial que os professores cursistas sejam cursos não podem se restringir à passagem
instigados a elaborar seus próprios projetos de informações sobre os aspectos tecnoló-
de trabalhos para desenvolver em sala de gicos ou ao uso pedagógico da informática.
aula usando as TIC, considerando as carac- Para ele, é essencial que essas informações
terísticas do ambiente social e a viabilidade sejam praticadas, com os alunos, em sala
oferecida pelo contexto escolar. Dessa for- de aula, para que o professor possa, gra-
reprodutoras e definir seus projetos pesso- das tecnologias aos processos de ensinar e
ais de trabalho”. As autoras destacam, ain- aprender”. Dessa forma, ele saberá “desafiar
da, que o programa Salto para o Futuro vem os alunos” para que, a partir do projeto que 7
possibilitando que as propostas de cursos de cada um propõe, seja possível atingir os ob-
formação de educadores com o uso das TIC jetivos pedagógicos que foram determina-
7 José Armando Valente participou como autor de textos e como especialista convidado para os debates de
diversas séries do programa Salto para o Futuro, comentadas pelo autor em seu texto para esta coletânea.
8 José Manuel Moran participou como autor de textos e como especialista convidado para os debates
de diversas séries do programa Salto para o Futuro, comentadas pelo autor em seu texto para esta coletânea.
Organizou, com Maria Elizabeth Bianconcini de Almeida, a coletânea Integração das Tecnologias na Educação, editada
pela Secretaria de Educação a Distância. Brasília: Ministério da Educação, 2005 (textos selecionados das séries do
Salto para o Futuro). Esse livro está disponível no formato digital em
http://tvescola.mec.gov.br/images/stories/publicacoes/salto_para_o_futuro/livro_salto_tecnologias.pdf
em muitas avaliações de instituições supe- programa Salto para o Futuro, desde suas
riores na implantação dos seus programas primeiras séries, “que tinham como foco
de educação a distância, assinalando que a formação continuada de professores em
“essa temática também se refletiu em algu- serviço, além de dar apoio à formação de
mas séries do Salto para o Futuro”. Os tex- alunas e alunos de programas de forma-
tos dos boletins dessas séries do Salto foram ção docente para as primeiras séries do
posteriormente organizados em um livro, Ensino Fundamental”. O autor ressalta, em
publicado em 2005, com o título de Integra- especial, que desde 2004, pelo menos uma
ção das tecnologias na Educação9. As quatro série do Salto, por ano, foi dedicada à te-
áreas do livro “englobam as dimensões mais mática das tecnologias e suas linguagens,
importantes da discussão das tecnologias na “quer pela via da discussão diretamente da
educação: Tecnologia, currículo e projetos; cibercultura e das tecnologias, quer focan-
Tecnologias na escola; Tecnologias audiovi- do a convergência das mídias e destas na
suais: TV e vídeo nas escolas; Tecnologias educação”. E acrescenta: “A formação do-
na educação de professores a distância”. cente continuada para uso das tecnologias
Em sua importante análise desse processo, digitais, feita através do Proinfo Integra-
ao longo de mais de 20 anos, Moran conclui do, encontrou importante apoio em séries
que “A inserção na educação das tecnolo- do Salto dedicadas ao tema”. Para o autor, 8
gias conectadas é um caminho importante “esta rede, composta por educadores ativos,
para preparar as pessoas para o mundo atu- especialistas nas mais diversas áreas, técni-
al, para uma sociedade complexa, que exige cos de TV, profissionais de comunicação e
domínio das linguagens e recursos digitais. tecnologia (...) contribuiu para que escolas
(...) Escolas não conectadas são escolas in- se reconhecessem como autoras de um co-
completas, mesmo quando didaticamente nhecimento que não pode ser construído
avançadas. Alunos sem acesso contínuo às em nenhum outro canto”, e que estudantes
redes digitais estão excluídos de uma parte do Ensino Fundamental pudessem “tornar-
Edmir Perrotti 11
Ivete Pieruccini 12
11 Docente e pesquisador da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, responsável pela
orientação científica do Colaboratório de Infoeducação – COLABORI (ECA/USP).
12 Docente e pesquisadora da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, coordena o
Colaboratório de Infoeducação – COLABORI (ECA/USP).
13 Optamos por colocar entre aspas títulos de obras e referências a conceitos citados; em itálico, termos em
língua estrangeira e os conceitos por nós especialmente desenvolvidos, em nossas pesquisas sobre a Infoeducação.
Nos títulos e subtítulos não utilizamos itálico, mas negrito.
práticas. Ganharam, especialmente, novas ções semânticas e conceituais que as termi-
características tecnológicas que transfor- nologias adotadas implicam, é importante
maram sua natureza, extensão, modos de reconhecer que as questões implicadas sob
se expressarem e de serem por nós apropria- tais termos, ao ganharem terreno, vão sen-
dos. Em consequência, sob influência não do não apenas assumidas, mas ampliadas e
exclusiva, mas especial da ALA - American aprofundadas, tornando-se cada vez mais
Library Association (Associação dos Bibliote- objeto de estudos, de ações educativas, de
cários Americanos) e da UNESCO, as discus- políticas públicas de educação e cultura, de
sões e iniciativas de toda ordem, envolvendo encontros nacionais e internacionais14.
14 Na França, o Groupe de Recherche sur la Culture et la Didactique de l’Information (GRCDI), sob a coordenação de
A. Sèrres, realizou, por exemplo, estudos que resultaram em um relatório sob o título Douze propositions pour l’élaboration
d’un curriculum info-documentaire (Doze proposições para a elaboração de um currículo infodocumentário), tendo em vista
orientar a inclusão do tema nos programas nacionais de Educação. Outras iniciativas, no mesmo sentido, são realizadas na
Espanha, na Inglaterra, no Canadá, na Nova Zelândia, na Austrália. Nos Estados Unidos, o governo Obama instituiu, em
2010, um Dia Nacional da Information Literacy, e várias universidades e associações profissionais ocupam-se da questão.
A Unesco vem desenvolvendo também diversas iniciativas nesse sentido.
traditória evidente e que não nos autorizava modelos de formação adequados ao indus-
ignorar o fato de que, de um lado, estáva- trialismo do século XIX já não conseguem
mos, como a maioria dos países, sendo to- dar conta das necessidades de formação
mados de assalto pela superprodução infor- na era pós-industrial, com a emergência de
macional global e, de outro, continuávamos modos de produção assentados sobre o va-
presos a históricas dificuldades de acesso a lor da informação e do conhecimento. E, se
informações relevantes aos processos edu- isso é verdade para as questões econômicas
cacionais e culturais gerais. e sociais que interessam à OCDE, é verdade
também para as culturais que apontam para
A criação do termo Infoeducação indicava,
os processos de construção de sentidos, de
pois, que era preciso superar posturas tra-
participação afirmativa na cultura da infor-
dicionais, como a clássica fragmentação dos
mação em que vivemos.
saberes em compartimentos estanques que
raramente se comunicam, assim como das A Infoeducação associa-se, assim, a esse qua-
ações educativas e culturais que, com suas dro de iniciativas envolvendo relações entre
descontinuidades, transferem aos aprendi- os campos da Informação e Educação, mas
zes a responsabilidade pelo estabelecimento rompe, ao mesmo tempo, com paradigmas
de conexões entre saberes, sem, no entanto, científicos e educacionais consagrados pela 11
lhes fornecer os instrumentos cognitivos e tradição disciplinar, adotando perspectivas
socioculturais necessários para isso. Numa transdisciplinares (CARTA da Transdiscipli-
época de “hibridização cultural” (CANCLI- naridade, 1994), que articulam diferentes
NI, 1995) que, dentre outras característi- saberes e fazeres em redes dinâmicas de
cas, vem se notabilizando pelas rupturas conhecimento e de atuação. Desse modo,
de limites de variadas ordens, por fusões, contribui de forma original para o avanço
aglutinações, articulações e rearticulações da reflexão e das práticas de que se ocupa,
permanentes de linguagens e dispositivos, razão que nos leva a postular o uso do termo
os modos fechados de fazer ciência, de edu- para nos referirmos às preocupações emer-
car, de tratar os processos informacionais e gentes há décadas, mas dimensionadas em
educacionais refletem uma atitude que vai termos diferenciados, críticos e afirmativos
não só na contramão do presente e do fu- em relação à “era da informação”.
turo, como do próprio conhecimento e da
cultura. Como aponta recente relatório da
A Infoeducação e a Escola
Organização para a Cooperação e Desenvol-
vimento Econômico – OCDE (2010), ao tratar Embora seja uma dentre as diversas institui-
dos saberes e fazeres para o século XXI, os ções educativas que devem se ocupar da In-
foeducação, a Escola é um pilar fundamental, Sem deixar de apresentar essa dimensão ins-
indispensável e diferenciado, já que continua trumental, a Informação, em nossa época,
sendo, em nosso mundo, ponto de chegada acabou ganhando também estatuto subs-
e de partida da trama sociocultural comple- tantivo, transformando-se não só em cam-
xa e dinâmica que envolve a apropriação de po sociocultural autônomo, como os acima
saberes de forma sistemática. Por isso, re- indicados, como também em categoria de-
fletir sobre a questão, tendo como pano de finidora de uma era, a chamada “era da in-
fundo o ambiente escolar, pode represen- formação”.
tar um promissor “salto para o futuro”, em
múltiplos sentidos. Em meio à profusão de Tal autonomia e centralidade foram sen-
signos que caracterizam nossa época, tal do gestadas lentamente. Burke (2003), por
reflexão abre caminhos para novas e essen- exemplo, identifica um processo de “explo-
ciais aprendizagens nos contextos escolares, são informacional” em momento posterior
assim como para a renovação desses contex- à invenção da imprensa de tipos móveis,
tos, condição indispensável aos destinos do por Gutemberg, na virada para o século XVI.
conhecimento em nossa época. Esta invenção permitiu a reprodutibilidade
técnica dos objetos culturais em velocidades
e quantidades até então desconhecidas. Se- 12
A explosão informacional guindo os mesmos passos, o industrialismo
Se a informação foi sempre reconhecida do século XIX foi alavanca fundamental des-
como recurso importante às nossas rela- se longo processo, que encontrou nas aspi-
ções com o mundo social e com a natureza, rações do século XX um ambiente cultural
que lhe conferiram a posição de centralida- dos produtos da técnica e que, como nos
de que jamais usufruiu em outros tempos. lembra Walter Benjamin, em vários escri-
Até pouco tempo, salvo exceções, a informa- tos, colocariam em crise modos tradicionais
bilidades, competências e atitudes variadas, ção na escola são, ao mesmo tempo, disposi-
Desse modo, diferentes blocos de saberes in- em vista aprendizagens informacionais. Por
cada etapa da escolaridade – Educação Infan- co/pedagógicos gerais das unidades em que
til, Ensino Fundamental, Ensino Médio, Ensi- se situam, tais dispositivos mesclam função
dos, numa gradação que permita até o final ao mesmo tempo, educam para a informa- 21
do Ensino Fundamental um domínio geral ção, num diálogo fecundo e constante.
contudo, estão desprovidos, pois as marés cas e comunicação permanentes. São pontos
mudaram de tal forma, nossa atual ecolo- distintos que integram o corpo aberto e am-
gia cognitiva é de ordem tão distinta, que os plo das infovias próprias da cultura contem-
instrumentos do passado não são capazes porânea e que necessitam ser apropriadas
de dar conta e evitar afogamentos. por nossas crianças, jovens e adultos, como
condição de participação no universo do co-
nhecimento e da cultura.
Assim, se a biblioteca escolar é dispositivo a
ser reivindicado como condição essencial de
Infoeducador 23
melhoria dos processos de ensino-aprendiza-
gem no país; se, por outro lado, pode facilitar A introdução de projetos e programas de In-
e assumir a coordenação e a realização dos foeducação na escola demanda profissionais
projetos de Infoeducação, outras instâncias devidamente preparados para exercer o pa-
poderão igualmente fazê-lo, pois é da natu- pel de infoeducadores, aspecto que, de resto,
reza da informação, em nossa época, repar- encontra-se em discussão em várias partes
tir-se em diferentes pontos de acesso, todos do mundo. De qualquer forma, mais que o
eles com responsabilidade de informar e de domínio da materialidade e das operações
formar. Escolas que possuam laboratórios de específicas de todos os dispositivos escola-
informática, por exemplo, podem deflagrar res de informação e cultura, é indispensável
e coordenar seus projetos a partir daí, bem que o infoeducador tenha domínio dos sabe-
como de outras instâncias educadoras julga- res informacionais, suas lógicas, suas dimen-
das adequadas pelo coletivo escolar, em fun- sões procedimentais, conceituais e atitudi-
ção de seus contextos específicos. nais. Além disso, é essencial que esteja em
condições de orientar, conjugar e coordenar
Por outro lado, seja qual for a instância co- esforços e atividades gerais, envolvendo pla-
ordenadora e deflagradora do projeto de nejamento, desenvolvimento e avaliação dos
Infoeducação na unidade, esta atuará como projetos e programas dos dispositivos espe-
cíficos, como a biblioteca escolar, o labora- apresentam questões e problemáticas até
tório de informática, sala e cantos de leitura, então desconhecidas. Em consequência,
além de outros porventura existentes. vemos surgir também novas áreas de re-
flexão e atuação, como a dos infoeducado-
O infoeducador, nesse quadro, responde pela res. É preciso compreender que, em face
coerência teórica e prática dos projetos e de tais condições, deverá contar menos o
programas. Dependendo do contexto em que apego desmesurado a territórios forjados
atua, poderá estar diretamente vinculado a pelos valores que constituíram os tempos
um dispositivo específico, ou não. O que o passados e mais a navegação compartilha-
caracteriza são os vínculos de interesse com da, colaborativa, pelos novos territórios
a questão, sua compreensão das questões, simbólicos que caracterizam a ordem do
suas atitudes, bem como sua capacidade de conhecimento e da cultura em nossa épo-
dialogar com os demais interessados direta ca. Experiências nesse sentido15 indicam
ou indiretamente nos aspectos em pauta. que, entre a falta e a profusão de mensa-
Profissional de interface, tal como a Infoe- gens de todo tipo que nos assaltam, ainda
ducação, o infoeducador é um terceiro pon- é possível alimentar esperanças e sonhar
to que emerge com a contemporaneidade e com relações criativas e criadoras com a in-
que, em função dos contextos particulares e formação, a cultura e o conhecimento, em 24
suas dinâmicas, vem se definindo ora como diferentes espaços socioculturais. A escola,
profissão, ora como função, ora como ocu- nesse sentido, ao assumir e adotar as pers-
pação, mas sempre como atividade específi- pectivas da Infoeducação, estará dando um
ca e diferenciada. Muitas vezes, com ótimos importante, necessário e inadiável salto
resultados, vem se objetivando como instân- rumo ao presente, permitindo vislumbrar
cia formada por equipes transdisciplinares, promissores futuros.
constituídas por professores, bibliotecários,
técnicos em educação, entre outros.
Referências
Considerações finais
BURKE, P. Uma história social do conhecimen-
No limiar de uma nova era, estamos assis- to: de Gutenberg a Diderot. Rio de Janeiro:
15 As pesquisas levadas a efeito por Ivete Pieruccini e apresentadas na tese de doutorado, sob o título A ordem
informacional dialógica: estudo sobre a busca de informação em Educação e por Rosemara Gozzi, em dissertação de
mestrado intitulada Oficina de Informação: conhecimento e cultura na educação infantil, atestam as possibilidades
e resultados das proposições aqui defendidas.
CANCLINI, N. Culturas híbridas: estrategias PERAYA, D. Médiation et médiatisation: le
para entrar y salir de la modernidad. Buenos campus virtuel. Hèrmes, Paris, n. 25, p. 153-
Aires: Sudamericana, 1995. 168, 1999.
mento e cultura na educação infantil. Dis- versidade de São Paulo, 2004. 194f.
18 Tais Oficinas foram realizadas para os multiplicadores dos Núcleos de Tecnologia Educacional de várias
regiões do país pela equipe de Coordenação Geral de Capacitação e Formação em EAD Diretoria de Produção de
Conteúdos e Formação em EaD do MEC.
boram seus planejamentos considerando a ladas na situação, levando em conta as dú-
proposta do curso tal como foi concebida, vidas, curiosidades e indagações dos alunos
de forma articulada com as características a respeito de problemáticas reais a partir de
de cada realidade. É nesse momento que a seus conhecimentos prévios, valores, cren-
proposta do curso era ressignificada pelos ças, experiências e interesses individuais,
formadores, podendo agregar o encaminha- propiciando a mobilização de aquisições
mento de novas atividades, dinâmicas e res- cognitivas e a construção de estratégias
pectivos materiais de apoio. É interessante para resolver os distintos problemas envol-
que, durante essas oficinas, os formadores vidos em um projeto.
podem se sentir ‘empoderados’ e desenvol-
ver o sentimento de “pertença” em relação Dessa forma, é possível dizer que não é o
ao curso, o que se torna referência para sua professor quem planeja para os alunos exe-
prática na formação dos professores cursis- cutarem, ambos podem ser parceiros e su-
tas e destes com seus alunos. jeitos de aprendizagem, cada um atuando
segundo o seu papel, projeto individual e
Em consonância com a concepção de proje- nível de desenvolvimento, que se articulam
to especificada (BOUTINET, 2002), é impor- com os interesses e projetos coletivos.
tante destacar que os professores cursistas 29
são instigados a elaborar seus projetos de Na perspectiva de confluência entre os proje-
trabalhos para desenvolver em sala de aula tos de formação, dos formadores e dos pro-
usando as TIC, considerando as caracterís- fessores, consideramos que o conhecimento,
ticas do ambiente social e a viabilidade ofe- do ponto de vista técnico e pedagógico, sobre
recida pelo contexto escolar. Nesse sentido, as especificidades e implicações envolvidas
Almeida e Prado (2009) chamam atenção no uso pedagógico de recursos tecnológicos
para que, no trabalho com projetos, o pro- dá ao professor condições de elaborar seus
fessor respeite os diferentes estilos, deci- projetos de trabalho, incorporando de manei-
sões e ritmos de trabalho dos alunos, desde ra significativa a tecnologia aos conteúdos
a etapa de planejamento, escolha de tema curriculares em seu fazer pedagógico.
e respectiva problemática a ser investigada,
respeitando os projetos individuais e trans- Ao utilizar as TIC em atividades curriculares,
formando sua turma de alunos em uma co- podemos vislumbrar as possibilidades de:
munidade de aprendizagem. abertura de espaços, tempos e conhecimen-
tos tradicionalmente trabalhados na escola;
Segundo Almeida (2001), nessas comunida- estabelecimento de conexões entre a escola,
des as questões de investigação são formu- o cotidiano da vida dos alunos e os acon-
tecimentos do mundo; integração do local nhos epistemológicos de cada participante da
com o global; abertura de fronteiras para o ação (ALMEIDA, 2010, p.1).
diálogo e o trabalho integrado entre as dis-
ciplinas escolares. Evidencia-se, assim, que A integração significativa de conhecimento
o currículo envolve tanto os conceitos rela- cotidiano com as disciplinas e respectivos
cionados às áreas de conhecimento como conhecimentos científicos pode propiciar
os métodos, as ex- o envolvimento de
periências prévias alunos e professo-
de alunos e profes-
A integração de tecnologias res em atividades
sores, as atitudes, os ao desenvolvimento do socialmente rele-
valores, os procedi- currículo na escola e na vantes, auxiliando
mentos, as relações sala de aula desperta na interpretação dos
que se estabelecem fenômenos socio-
a consciência sobre as
na prática social (GI- culturais da comu-
tensões entre a organização
MENO SACRISTAN, nidade, bem como
1998), entre profes-
curricular fechada em no resgate da ética,
sor, alunos e os ele- disciplinas estanques, com das artes, da diver-
mentos simbólicos conteúdos previamente sidade e dos valores 30
31
Essa característica trimodal que contempla as especificidades de cada contexto pode favore-
cer a formação na ação reflexiva do professor.
Formação na ação reflexiva cesso de aprendizagem dos alunos e da prá-
19 O curso “Elaboração de Projetos” que foi criado em 2009, com autoria de Maria Elizabeth Bianconcini de
Almeida e Maria Elisabette Brisola Brito Prado, faz parte do Programa Proinfo Integrado do MEC, em realização no
ambiente eproinfo para multiplicadores do NTE- NTM e professores de escolas públicas do país.
do fazer pedagógico não é simples. A refle- que enquanto isto ocorre – prática contex-
xão sobre a prática é fundamental, mas o tualizada e estudo teórico – cada professor
professor precisa também conhecer os pres- interage no ambiente virtual do curso, com-
supostos que embasam as novas referências partilhando suas reflexões, dificuldades,
de práticas do trabalho com projetos com conquistas com os formadores e seus pares.
a integração das TIC ao currículo e a con- Nesse processo de aprender com o outro,
cepção de projeto que integra as dimensões: relatando e conhecendo diferentes expe-
organizacional, da formação e individual riências, discutindo questões emergentes
(BOUTINET, 2002). apoiadas teoricamente, o universo de refle-
xão e de referências do professor cursista se
Isto significa que a formação na ação que amplia.
contempla o cotidiano do professor deve
também propiciar o estudo teórico, de modo De acordo com a concepção já especificada,
a ampliar a compreensão do professor, para a estrutura curricular do curso “Elaboração
que tenha autonomia e olhar crítico e refle- de Projetos” foi organizada contemplando
xivo na recriação da prática. Com este pro- três eixos conceituais – Projeto, Currículo e
pósito, o curso “Elaboração de Projetos” foi Tecnologias – que se articulam entre si for-
concebido articulando a teoria e a prática mando a espiral ascendente da formação, a 33
de projeto com as TIC de forma integrada qual se desenvolve integrada com a prática
ao currículo, bem como privilegiando situ- concreta dos professores no uso de tecnolo-
ações reflexivas, tanto individuais como no gias com seus alunos.
coletivo da turma, que englobam também
os aspectos estruturais e políticos do siste-
Articulação dos três eixos
ma de ensino.
do Curso: Projeto, Currículo
e Tecnologias
Durante a realização do curso, cada profes-
sor cursista tem a oportunidade de vivenciar Os princípios que permeiam o trabalho com
o trabalho de projeto com seus alunos no projeto surgiram no século XVIII, quando
contexto escolar (prática) e, concomitante-
Pestalozzi e Froebel defenderam a importân-
mente, fazer os estudos teóricos sobre prin-
cia de desenvolver uma educação voltada
cípios norteadores da concepção e metodo-
para os interesses e necessidades das crian-
logia de projetos com o uso das TIC voltados
ças, valorizando a experimentação prática.
para a integração com o currículo.
20 A transversalidade pode potencializar situações que valorizam as relações humanas e sociais mais
urgentes. Trabalhar transversalmente é permitir que o aluno aprenda conteúdos que perpassam por diferentes
áreas curriculares, com vistas à resolução de problemas de forma contextualizada e entendendo a problemática
social e as possibilidades de solução.
volvimento das investigações, aprofun- contribuições ao aprendizado e à constru-
dando-se verticalmente em sua própria ção curricular.
identidade, ao mesmo tempo que esta-
belecem articulações horizontais numa Na situação escolar, as estruturas curricu-
relação de reciprocidade entre elas, a lares instituídas a priori nas “grades curri-
qual tem como pano de fundo a unici- culares” se atualizam e alteram por meio
dade do conhecimento em construção do trabalho com projetos, transformando o
(ALMEIDA, 2001, p.58). currículo prescrito, que é reconstruído em
função das significações atribuídas no con-
Um projeto pode partir de uma questão re- texto da prática socioeducativa. O currículo
lacionada com uma única área de conhe- construído na ação, isto é, o vivido na práti-
cimento e, em seu desenvolvimento, ir se ca concreta, pode ser identificado por meio
abrindo e articulando conceitos de outras da exploração das características interativas
áreas. Quando isto ocorre, fica evidenciado e de registro inerentes às TIC, as quais pro-
que o conteúdo disciplinar deve ser trabalha- piciam:
do numa perspectiva que não se feche em si
mesma, mas que no processo de busca para • Acompanhar e recuperar as trajetórias de-
compreender um determinado fato ou fe- lineadas no desenvolvimento de projetos; 35
nômeno seja ampliado o escopo de relações
• Reconhecer as narrativas curriculares in-
entre as diferentes áreas de conhecimento e
dividuais que expressam as inter-relações
o significado dos conceitos incorporados no
entre informações e conhecimentos com
desenvolvimento do projeto. Por outro lado,
o uso de diferentes mídias e linguagens,
pode ocorrer o inverso, ou seja, iniciar o
os significados atribuídos em ato;
projeto com uma questão mais abrangente
e pouco a pouco ir afunilando em determi- • Identificar os conhecimentos mobilizados
nado conceito de uma área específica para na ação, que se referem tanto aos conhe-
compreender determinadas particularida- cimentos historicamente produzidos e or-
des do fato ou fenômeno em estudo. ganizados em materiais didáticos, como
aos novos conhecimentos construídos pe-
No desenvolvimento do projeto, o professor
los alunos;
precisa estar atento, acompanhar o proces-
so de aprendizagem, ter clareza de suas in- • Possibilitar a abertura de espaços, tempos
tencionalidades pedagógicas e criar condi- e conhecimentos tradicionalmente traba-
ções para que os alunos possam incorporar lhados na escola;
as tecnologias de modo que essas tragam
• Estabelecer conexões entre a escola, o co- integração das TIC ao currículo por meio de
tidiano da vida dos alunos e os aconteci- projetos pode ser um caminho para repensar
mentos do mundo. a escola num sentido mais amplo. No entan-
to, para isto é fundamental focar nas especi-
Nesse sentido, o currículo como constru-
ficidades dos elementos constituintes desse
ção social, política e histórica se constitui
cenário educacional abordados neste estudo,
na própria ação com o uso de tecnologias,
que são as possibilidades e implicações das
aproximando-se da concepção de design
TIC no processo de ensino e aprendizagem,
emergente (CAVALLO, 2003), que incorpora
bem como os conceitos de currículo e de pro-
as mudanças provocadas pelo trabalho que
jeto em suas diversas dimensões.
se desenvolve a partir das problemáticas
contextuais. Essa perspectiva requer uma
Nesse sentido, fica evidenciada a importân-
postura investigativa do contexto imbuída
cia da formação e, consequentemente, de
de ousadia e flexibilidade para lidar com os
desenvolver projetos de cursos que abor-
imprevistos, mas com clareza de propósito.
dam tais elementos e priorizam a formação
Essa postura é metaforicamente compara-
na ação reflexiva de professores, também
da por Cavallo (2003) a um conjunto de jazz
sujeitos e autores de seus projetos de traba-
capaz de improvisar uma música, mas man- 36
lho, envolvendo os demais atores do contex-
tendo a estrutura da harmonia entre seus ele-
to da escola.
mentos e os princípios teóricos de seus estilos
(p. 392). Entretanto, cabe ressaltar que um curso só
ganha vida e identidade própria durante a
A realização do trabalho com projeto e as sua concretização, por isso o papel do for-
TIC na perspectiva de repensar o currículo mador é imprescindível, para que sua ação
e a escola, considerando as características seja sintonizada com os princípios abraça-
da sociedade atual, requer muitas vezes dos na concepção de um curso. No curso
sensibilizar os demais atores da comunida- “Elaboração de Projetos”, o preparo inicial
de escolar para participarem, no sentido de do formador foi feito nas Oficinas e esta
se sentirem coautores deste momento de ação mostrou sua relevância. Mas a ideia
reconstrução, no que se refere às possibili- que propomos é de dar continuidade, ou
dades do uso da tecnologia na educação. seja, propiciar aos formadores que tenham
um acompanhamento de suas ações de for-
mação, para que possam aprimorar com
Algumas considerações
autonomia suas práticas, contemplando o
A formação de professores voltada para a trabalho com projetos integrado com o cur-
rículo. Para a continuidade do aprendiza- putadores portáteis; indicadores de mu-
do, é necessário também oferecer aos pro- dança na prática e no currículo. In: Actas da
fessores a oportunidade de socializar suas VI Conferência Internacional de Tecnologias
experiências com projetos com seus pares de Informação. Braga, Portugal, 2009.
de diferentes realidades, tendo ainda a con-
tribuição de especialistas da área trazendo ALMEIDA, M. E. B.; PRADO, M. E. B. B. De-
cias que considerem as potencialidades dos mação Continuada de Educadores com su-
SCHÖN, D. A. Formar Professores como Pro- ZEICHNER, K. & LISTON, D. P. Reflective tea-
fissionais Reflexivos. In: Nóvoa, A. (coord.). ching: an introduction. Nova Jersey: Lawren-
Os Professores e a sua Formação. Lisboa, Por- ce Erlbaum Associates Publishers, 1996.
tugal: Publicações Dom Quixote Instituto
de Inovação Educacional, 1992.
Os projetos sobre o uso das TIC na educação nas atividades de sala de aula ainda impe-
bre esse tema em 1982, a preocupação tem são usados esporadicamente como adendo,
sido a melhoria do processo ensino e apren- como reforço ou mesmo para o ensino de
dizagem que acontece na sala de aula da es- informática. Em grande parte ainda impera
cola pública. O objetivo que tem norteado a desintegração das TIC ao currículo.
po para repensar sua a integração das TIC ao elas devem ser reali-
zadas, considerando 44
prática e tempo para currículo, é preciso que o
a idade e o desenvol-
explorar os recursos currículo seja repensado
vimento intelectual
do computador. O
para a era digital. dos alunos; e saber
processo de apro-
desafiar os alunos
priação da tecnolo-
para que, a partir do
gia e sua integração
projeto que cada um propõe, seja possível
nas atividades curriculares demandaram
atingir os objetivos pedagógicos que ele de-
tempo e aconteceram de modo gradativo.
terminou em seu planejamento.
Isto significa que a formação desse profes-
sor não pode se restringir à passagem de No entanto, mesmo que consigamos a me-
informações sobre os aspectos tecnológicos lhor formação e o maior esforço dos profes-
ou ao uso pedagógico da informática. Mas sores para o uso das TIC integradas às ativi-
essas informações devem ser praticadas, dades de sala de aula, essa integração será
com os alunos, em sala de aula, de modo difícil. Por exemplo, se o aluno dispuser de
que o professor, gradativamente ,possa pas- um laptop em sua carteira, com livre acesso,
sar pelas fases e, eventualmente, atingir a o que ele poderá realizar? Copiar no laptop
fase da inovação. Nesse contexto, o domínio o que o professor colocar no quadro de giz?
Resolver um problema, como ele faz no ca- lhas práticas (WESTON; BAIN, 2010). Ou as
derno? Isso seria empobrecer e subutilizar “inovações” desenvolvidas por meio das TIC
o enorme potencial que as TIC apresentam. “brigam” com o currículo da era do lápis e
Ou seja, um dos fatores que tem dificultado papel, e as tecnologias acabam sendo expul-
a integração é justamente o tipo de ativida- sas da escola, como já aconteceu em algu-
de curricular a ser desenvolvida. O currículo mas escolas dos Estados Unidos (HU, 2007).
atual foi elaborado na era do lápis e papel.
Para que haja a integração das TIC ao currí- No entanto, à medida que as TIC passam a
culo, é preciso que o currículo seja repensa- fazer parte do cotidiano da vida dos alunos,
do para a era digital. vai ficar cada vez mais difícil controlar essa
“briga”! A conciliação parece ser o caminho
mais viável e, nesse sentido, as TIC devem
Currículo da era do lápis
ser integradas aos assuntos curriculares de-
e papel X currículo da era
senvolvidos em sala de aula e deixarem de
digital
ser tratadas como apêndice do que acontece
Como já dissemos, o currículo atual, de to- no processo de ensino e aprendizagem.
das as disciplinas, desde o ensino básico até
o ensino superior, foi desenvolvido para a Por outro lado, as TIC jamais serão integra- 45
era do lápis e papel. Os conteúdos trabalha- das às atividades curriculares se essas ativi-
dos e as atividades desenvolvidas são cen- dades continuarem explorando somente o
trados no uso do lápis e papel para represen- lápis e papel para representar e explicitar os
tar e explicitar os conhecimentos do aluno. conhecimentos do aluno. As TIC oferecem
Os estudos mais recentes usando laptops novas possibilidades que são bastante inte-
na situação 1-a-1, ou seja, o acesso pleno às ressantes e que favorecem a integração às
TIC, têm mostrado que, em geral, os laptops atividades curriculares.
têm sido utilizados para o acesso imediato
à informação, basicamente substituindo as Primeiro, as atividades, os projetos que o
fontes impressas, como o livro; para a pro- aluno desenvolve usando as TIC podem ex-
dução de texto, em grande parte, substituin- plorar novos letramentos e, portanto, as fa-
do o lápis e papel; ou para armazenar in- cilidades que as tecnologias oferecem como
formação, como repositório de informação o uso da imagem, do som, da animação.
digital, substituindo os fichários. Nenhuma Além disso, explorar aspectos hipermidiá-
dessas “inovações” está relacionada com al- ticos, permitindo navegar na informação,
terações do processo de ensinar e aprender. quebrando a estrutura linear e sequencial
O uso das TIC simplesmente automatiza ve- da informação impressa.
Segundo, como fonte inesgotável de infor- e projetos que os alunos desenvolvem são si-
mação sobre praticamente todas as áreas do tuações ideais para promover conversações
conhecimento. Essa pluralidade de olhares e sobre as ações que são realizadas, e sobre
opiniões cria a oportunidade de lidar com as teorias, explanações e ideias que permitem
incertezas, com os questionamentos, com discutir as implicações das ações.
os modelos incompletos ou imprecisos, que
podem ser depurados com a ajuda das tec- Finalmente, as atividades usando os recur-
nologias, dos colegas, do professor ou de es- sos da Web permitem explorar, além de con-
pecialistas. teúdos, os contextos onde esses conteúdos
foram desenvolvidos e como eles podem au-
Terceiro, a presença das TIC, principalmente xiliar na aprendizagem. O contexto é o local
das tecnologias móveis, cria condições para onde as conversações ocorrem. Porém, em
repensar as teorias de vez de ser fixo, ele é
aprendizagem para O contexto é o local onde moldado pelo diálo-
englobar as carac- as conversações ocorrem. go continuamente
terísticas da era da Porém, em vez de ser fixo, negociado entre as
mobilidade, entendi- pessoas e a tecnolo-
ele é moldado pelo diálogo
da não só pelo fato gia. A aprendizagem 46
continuamente negociado
de usar os laptops não só ocorre em um
e os celulares, mas
entre as pessoas e a determinado contex-
também pela mobi- tecnologia. to, como também ela
lidade das pessoas e gera novos contextos
da informação. Shar- por meio da intera-
ples, Taylor e Vavoula (2007) propõem uma ção contínua que acontece com o uso das
teórica que explica a aprendizagem para a TIC. As salas de aulas tradicionais são fun-
era da mobilidade, como processos de vir a dadas na ilusão de contextos estáveis, uma
conhecer por meio de conversações entre vez que são localizadas em um espaço fixo,
múltiplos contextos de pessoas e tecnolo- com recursos comuns, com alguns profes-
gias interativas pessoais. As conversações sores, e um currículo que permite montar
são necessárias para que as pessoas possam bases comuns a serem mantidos no dia a
se informar sobre as informações de que dia. Se algumas dessas características são
outras pessoas dispõem, para externalizar removidas, como deve acontecer no caso da
o que as pessoas compreendem, e com isso aprendizagem na era da mobilidade e no uso
pensar sobre as interações e reciprocamente de currículos flexíveis, então deve ser previs-
construir novas conversações. Os problemas ta a criação de ilhas temporárias de contex-
tos relativamente estáveis. Esses contextos tado presente desde os primeiros projetos
devem ser previstos, devem ser bem defi- desenvolvidos e tem se mantido nos pro-
nidos e flexíveis (LUCKIN et al., 2005). Por jetos atuais, como o Programa UCA de im-
exemplo, os problemas ou projetos a serem plantação de laptops educacionais em cerca
trabalhados pelos alunos constituem parte de 300 escolas. Esse é um aspecto positivo,
do contexto. No entanto, eles não devem se considerarmos que outros países não têm
emergir espontaneamente, mas devem ser perseguido esse objetivo com tanta clareza.
definidos em função do interesse do aluno e
da intenção pedagógica do professor, e ajus- Os resultados conseguidos até o momento
tados para que o nível de dificuldade esteja também podem ser vistos como positivos
de acordo com a zona proximal de cada alu- pelo fato de que, ao longo desses anos, os
no (ou coletivamente, da classe). projetos de formação de educadores para
o uso das TIC possibilitaram a formação de
A passagem do currículo da era do lápis e muitos educadores, praticamente de todas
papel para o currículo da era digital não é as regiões do país. Em qualquer localidade,
simples de ser realizada e implica uma sé- mesmo as mais remotas, é possível encon-
rie de mudanças no espaço e no tempo da trar um professor que passou pelo processo
escola e, ainda, em novos papéis que os pro- de formação do Proinfo ou Proinfo-Integra- 47
fessores, os gestores, os alunos e os pais de- do. Programas como o Salto para o Futuro
vem assumir. Certamente essas mudanças têm tido um papel fundamental na conti-
não acontecem pelo simples fato de as TIC nuidade da formação desses educadores, no
serem inseridas na sala de aula. Elas criam sentido de que eles podem estar em contato
condições para uma educação coerente com com especialistas da área, conhecer o que
as necessidades da era digital e da mobilida- está sendo gestado e as boas práticas que
de. A mudança em si está nas mãos da so- são desenvolvidas.
ciedade e, mais especificamente, nas mãos
dos educadores. Embora tenhamos o lado positivo da ques-
tão, o fato é que ainda não atingimos os
objetivos relacionados à melhoria das prá-
Reflexões e novas tendências ticas pedagógicas nem a integração das TIC
O uso das TIC na educação nas escolas pú- às atividades curriculares de sala de aula.
blicas no Brasil tem avançado e tem manti- Como foi mencionado nos tópicos acima,
do um objetivo único que é a melhoria do esse é um processo difícil, que requer tem-
processo ensino e aprendizagem que acon- po. Vale mencionar que essa dificuldade não
tece na sala de aula. Esse objetivo tem es- é restrita ao nosso país nem ao nosso sis-
tema público de educação, uma vez que a confrontadas com atividades como leitura
integração das TIC às atividades curriculares on-line, navegação por hipertextos ou in-
não aconteceu de maneira sistemática nas teração via telecomunicação móvel. As TIC
escolas particulares, nem mesmo ocorreu introduzem novos modos de comunicação,
em outros países. As escolas particulares permitem a expressão do pensamento por
que dispõem dos recursos tecnológicos, na modalidades como as da escrita, imagem,
proporção adequada para seus alunos, não sonora, tátil e a combinação dessas modali-
necessariamente utilizam esses recursos in- dades, no que tem sido conhecido como os
tegrados às atividades curriculares. O mes- diferentes tipos de letramentos: digital (uso
mo acontece em países com alto índice de das tecnologias digitais ou das TIC), visual
desenvolvimento econômico, social e tec- (uso das imagens), informacional (busca crí-
nológico, como mostram os estudos reali- tica da informação) – ou os múltiplos letra-
zados pela Organização para a Cooperação mentos, como tem sido tratado na literatu-
e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Por ra (KRESS, 2000).
exemplo, em países como a Finlândia, que
atribuem grande importância às TIC e ao Especificamente com relação à mudança do
seu papel no desenvolvimento do sistema currículo e às questões relacionadas com os
educativo, os alunos não apresentam índices letramentos, entendo que o Salto para o Fu- 48
de utilização das TIC melhores do que em paí- turo, que trabalha com inovações tecnológi-
ses mais pobres, estando também os professo- cas e com diferentes mídias, tem um papel
res ainda longe de incluírem os computadores importante no fomento e na disseminação
nas suas rotinas de trabalho diárias, em clas- dessas ideias. É fundamental poder incen-
se... (GEPE, 2008, p. 29). tivar ações de mudanças curriculares, bem
como a divulgação de atividades curricula-
Assim, temos diversos desafios a serem ven-
res que não são restritas ao uso do lápis e
cidos. Um, bastante complicado, está re-
papel. A televisão e as novas mídias, que se-
lacionado com a mudança do currículo da
rão facilmente agregadas à TV Digital sendo
era do lápis e papel para a era digital. Outro
implantada, poderão facilitar esse trabalho
desafio diz respeito ao acelerado desenvolvi-
e, com isso, contribuir para que essas mu-
mento das tecnologias. A presença das TIC
danças sejam mais rapidamente implanta-
em nossa cultura contemporânea cria novas
das. Essa pode ser uma agenda importante e
possibilidades de expressão e comunicação.
desafiadora para os próximos anos do Salto
A leitura e escrita tradicionais estão passan-
para o Futuro!
do por constantes questionamentos quando
Referências Moraes, M. C. Informática Educativa no
Brasil: uma história vivida, algumas lições
Andrade, P. F. (org.) Projeto EDUCOM: Rea-
aprendidas. Revista Brasileira de Informática
lizações e Produtos. Brasília: Ministério da
na Educação, nº 1, p.19-44, set. 1997.
Educação e Organização dos Estados Ameri-
canos, 1993. SANDHOLTZ, J. H.; RINGSTAFF, C.; DWYER,
D. C. Ensinando com Tecnologia: criando salas
Andrade, P. F.; Lima, M.C.M.A. Projeto EDU-
de aula centradas nos alunos. Porto Alegre:
COM. Brasília: Ministério da Educação e Or-
Artes Médicas, 1997.
ganização dos Estados Americanos, 1993.
teracy learning and the design of social fu- Campinas, SP, 1993. p. 114-134.
50
4.4 Vinte anos de mudanças tecnológicas
profundas e superficiais na educação
Quando foi lançado o programa Salto para o o computador pessoal, ainda muito caro e
Futuro, eu estava participando da criação do pouco conectado. A Internet estava escon-
Projeto Escola do Futuro da Universidade de dida em poucas universidades, com acesso
São Paulo. Imaginava, no começo dos anos lento, no modo texto, cheio de comandos
1990, que em vinte anos teríamos uma edu- complicados. Ainda não existiam os navega-
cação muito mais flexível, aberta, diversifi- dores gráficos como o Explorer ou o Firefox.
cada, semipresencial, focada de verdade no Mas já prevíamos o grande potencial que a
aluno. Provavelmente os criadores do Salto rede conectada poderia trazer para todas as
para o Futuro também tinham as mesmas atividades humanas.
51
expectativas.
Pessoalmente, passei da máquina de escre-
Do ponto de vista teórico, as ideias se man- ver a um computador primitivo, para jogos
tiveram coerentes. Mas olhando as mudan- com cartuchos comprados para meu filho e
ças reais, constatamos que avançamos muito onde experimentei os primeiros programas
menos. Praticamente se mantém a mesma de texto. No começo dos anos 1990, con-
escola que existia, sua organização curricular segui o meu primeiro computador pessoal
pouco mudou e o professor continua falan- financiado, um 386, com uma conexão ins-
do muito, ainda no centro. O mundo mudou tável à Internet. Em 1994, fiz a grande des-
muito, os processos em todos os campos são coberta da Internet gráfica, no Mosaic, que
muito mais complexos, com interação pro- acessava imagens e sons.
funda entre o presencial e o digital.
O passo seguinte foi poder utilizar um labo-
Há vinte anos não existia o Google, o You- ratório conectado à Internet para fazer pes-
Tube, redes sociais, ipods, tablets. Estáva- quisa e dar aulas. O laboratório em rede me
mos passando da televisão e do vídeo para permitiu experimentar a integração da sala
organizações.
4. Tecnologias na educação de professores
A segunda parte do livro foca mais as tecno- apontadas pelos telespectadores ao vivo es-
logias na escola, desde as simples para au- pelham mais os medos, as dificuldades e a
Web. Há muita ênfase, principalmente nos ção de uma adoção rápida e generalizada.
gias para melhorar o ensino e a aprendiza- como apoio ao professor, do PowerPoint até
gem. Há críticas das tecnologias, do des- as lousas digitais, com todos os recursos
críticas são ao custo elevado da sua implan- para as diversas áreas e níveis de conheci-
mento: programas educacionais, comer- 54
tação na escola, num país com tantas carên-
cias. Há também uma discussão constante ciais e jogos. A Internet estava começando
práticas diferenciadas, por muitos fatores. blicação. Há debates sobre os blogs como
equipamentos com a expectativa de obter vés da escrita colaborativa, o wiki ou, mais
resultados no curto prazo, com resultados recentemente, o Google Docs, que permi-
nologias contribuem para a aprendizagem, al. Bem mais recentemente a discussão foca
também as redes sociais, como o Orkut e o com o computador e a Internet e deixamos
Facebook, suas vantagens e desvantagens de lado a televisão e o vídeo, como se já esti-
na educação. Também merecem destaque vessem ultrapassados, não fossem mais tão
as discussões sobre as ferramentas de co- importantes ou como se já tivéssemos esgo-
municação em tempo real como o MSN e tado seu potencial educativo.
o Twitter, que de um lado agilizam a escri-
ta, mas de outro fomentam uma linguagem As linguagens da TV e do vídeo respondem à
mais coloquial e com menos atenção à nor- sensibilidade dos jovens e da grande maio-
ma culta, o que perturba muitos professo- ria da população adulta. São dinâmicas, di-
res. Há sempre uma tensão entre o uso des- rigem-se antes à afetividade do que à razão.
sas ferramentas para entretenimento e os As crianças e os jovens leem o que podem
ruídos que elas provocam quando são trazi- visualizar, precisam ver para compreender.
das para o contexto Toda a sua fala é
escolar. Em alguns mais sensorial-visu-
As linguagens da TV e
momentos a discus- al do que racional e
são se centra entre
do vídeo respondem à abstrata. Leem nas
proibir ou permitir sensibilidade dos jovens múltiplas telas que
na sala de aula as e da grande maioria da utilizam: da TV ao 55
qualquer lugar, a qualquer hora e de formas crescente entre atividades presenciais e di-
mais convenientes para cada momento. A Há um uso intensivo de recursos para dis-
com o próximo e distante, com o igual e o ca mais com o mundo e traz o mundo para
diferente, estando juntos e estando conecta- a sala de aula. Nos projetos mais avança-
Houve, infelizmente, mudanças muito mais com diferentes usos do espaço, com o aluno
Alberto Tornaghi 24
O Salto para o Futuro completou vinte anos, se comunica. Mas tudo e todos têm funcio-
em 2011. Vinte anos de experiências, vivên- nado, e muito bem, ao longo de vinte belos
cias, aprendizagens... Merece parabéns. anos. Anos que ligam os sonhos do passado
Quem mesmo? Seria o “Salto” em si, esse às realizações do presente e a novos sonhos
que nasceu programa de TV e que soube ser de futuro. Tudo isso junto formou essa rede
mais do que isso, tornou-se também uma que soube crescer, conectando escolas e
imensa rede de educadores, rede viva e mu- gente dos mais diversos cantos e encantos
tante? Sim, ele mesmo, este programa-rede desse país.
que é composto por quem o fez em cada 60
momento e em cada um de seus aspectos. Para celebrar o muito que aprendemos e en-
O que precisamos celebrar é essa rede he- sinamos ao longo desse tempo, lembrando
terogênea, que reúne seres humanos e tec- de alguns e, com certeza, esquecendo de
trazem competências e especialidades varia- caros leitores a dar, junto comigo, um salto
das: educadores, técnicos de TV, jornalistas, para o passado. Nada como o olhar volta-
outros. As tecnologias também são muitas presente e construir nossos saltos para e no
e não devem ser negligenciadas: quando um futuro. Vamos, então, ao passado em bus-
Começo este mergulho na história pelo con- Fomos convidados, eu e o Prof. Carlos Hi-
vite que me foi feito para participar do Salto, roo Saito27, a participar do projeto escreven-
ainda no início dos anos 1990. do o texto para a área de Ciências Naturais.
O convite vinha com a perspectiva de dar à
Pouco antes da criação do Salto, a Funda- área de ciências a perspectiva de aprendiza-
ção Roquete Pinto havia desenvolvido, em gem ativa com que trabalhávamos no Espa-
parceria com a Organização dos Estados ço Ciência Viva.
Americanos (OEA), o projeto “Onda Viva, as
Alfabetizações na Escola”. O projeto previa a Este projeto contribuiu para inocular na
criação de um sistema multimeios de apoio Fundação Roquette Pinto (FRP) a perspecti-
à formação docente, voltado para professo- va de trabalho integrado em diversas mídias.
res das séries iniciais, e reuniu uma miría- Boa parte dos profissionais da FRP que fo-
de de profissionais de diversas áreas26. Foi ram responsáveis por esta produção vieram
criado um livro (BRASIL, 1990), com textos a trabalhar no Salto em anos subsequentes.
apresentando perspectivas para o ensino em Para mim, nasciam ali parcerias diversas 61
cada área do conhecimento que compunha que deram muitos frutos, entre eles, a parti-
o currículo básico de uma escola voltada cipação no Salto para o Futuro.
para as primeiras séries do Ensino Funda-
mental. Esses textos serviriam de base para
a criação de uma série de programas para TV Nem tão simples assim
e outra de programas de rádio.
Mudanças de governo, naqueles anos politi-
camente atribulados no Brasil, interrompe-
Era um projeto ousado para seu tempo,
ram a produção do “Onda Viva”. O livro foi
já buscando trabalhar sobre o que veio a
publicado, mas levou muitos anos até que
se chamar convergência de mídias. Antes
seus exemplares chegassem às mãos de pro-
mesmo do vislumbre do que viria a ser a In-
fessores de escolas públicas. Algumas séries
ternet, o projeto buscava usar o que podia
de TV e de rádio chegaram a ser produzidas,
trazer maior amplitude para a distribuição
26 Adoraria nomear aqui cada um dos parceiros deste trabalho, mas isso faria o texto longo e pouco
interessante para o leitor. Nomear alguns seria para lá de injusto. Fica o agradecimento explícito a cada um deles
por ter contribuído para esta produção que é uma das sementes do Salto para o Futuro.
27 O professor Saito, hoje pesquisador da UNB na área de ecologia, e eu fazíamos parte da coordenação
coletiva do Espaço Ciência Viva, o primeiro museu interativo de Ciências, Matemática e percepção do Rio de Janeiro.
mas só muitos anos depois. Antes que as perimentar e vivenciar novos olhares. Era a
séries de rádio e TV do “Onda Viva” fossem observação da prática dos educadores em
produzidas, a Fundação Roquette Pinto deu formação que orientava e definia as inter-
início à produção do Jornal do Professor, a venções dos formadores.
primeira experiência de série regular de pro-
gramas de TV que se transformou no Salto Depois de muitos contatos, mais uma vez
para o Futuro (MENDONÇA, 2009). O progra- era convidado a participar do programa.
ma visava apoiar a formação continuada de Agora já se chamaria “Um Salto para o Futu-
docentes que atuavam nas séries iniciais da ro” e previa a participação de cada especia-
educação fundamental, assim como a com- lista em um programa semanal dedicado à
plementação da formação inicial de alunos sua área. Em conversa (amistosa e provoca-
de programas de formação de professores tiva) com a Prof.ª Heloisa Melhado28, típica
para as séries iniciais. Buscava formação em de quem participou de uma experiência que
grandes números, usando a TV como ele- resultou em muitas aprendizagens, ela me
mento de disseminação de conhecimento e desafiou: “Você não é cientista? Não ensina
práticas educativas de sucesso. Ciências pela prática de fazer ciências? Não
é esse o cerne da atuação de vocês no Espa-
Fui convidado a participar deste programa ço Ciência Viva? Como pode afirmar que não 62
indicado por profissionais que participaram funciona algo que nunca experimentou?” O
da produção do “Onda Viva”. Declinei do diálogo permanece vivo em minha memória
primeiro convite (e do segundo e do tercei- como se ocorrido ontem. Foi um chute ami-
ro...) porque não acreditava que seria pos- go e certeiro em minhas certezas precon-
sível uma prática de formação docente a cebidas. Sem argumentos e curioso com a
distância. Acreditava que uma tal formação segurança de minha amiga, aceitei o convite
de qualidade exigia presença, olho no olho, com meus argumentos desfeitos. Fui experi-
toque, a possibilidade de percepção das difi- mentar minha primeira vivência em educa-
culdades dos formandos expressos nos ges- ção a distância.
tos e no olhar. Minha prática de então com
formação de educadores estava fortemente
assentada em experiências presenciais, em Primeiros passos do Salto
que os formandos expressavam suas dificul-
O programa, em suas primeiras séries, fo-
dades no próprio ato de lidar com objetos
cava a formação continuada de professores
e experimentos, com sua forma ativa de ex-
28 A profª Heloisa Melhado integrou a Coordenação Técnico-Pedagógica do projeto Onda Viva junto com Zilda
Benazio Lenz e Virginia Primo.
em serviço, além de dar apoio à formação ção do programa. Em média, a cada progra-
de alunas e alunos de programas de forma- ma, respondíamos a cerca de uma dezena de
ção docente para as primeiras séries do En- perguntas ao vivo e a outras tantas por tele-
sino Fundamental, o então chamado Curso fone ou fax. Por telefone, os cursistas parti-
Normal. Para cada área do conhecimento cipavam do programa ao vivo, apresentando
realizava-se um programa semanal: Língua suas questões e inquietações (TRINDADE,
Portuguesa, Estudos Sociais, Matemática, 1996). Eu começava a experimentar a inte-
Ciências Naturais e Artes. ração a distância, via TV, em formação do-
cente com surpreendente qualidade, o que
Cada programa abordava um tema sobre o me parecia impossível até aquele momento.
qual era produzido um texto para ser dis-
tribuído previamente No início do Salto para
a educadores que as- No início do Salto para o Futuro, os professo-
sistiam ao programa o Futuro, os professores res cursistas apresen-
em telessalas29, onde cursistas apresentavam tavam perguntas e
se fazia o que cha- dúvidas sobre os te-
perguntas e dúvidas sobre
mávamos de recep- mas dos programas,
os temas dos programas, 63
ção organizada. Uma que eram escolhidos
equipe, reunindo dois
que eram escolhidos de de forma centraliza-
especialistas de cada forma centralizada, pela da, pela equipe de
área, produzia os tex- equipe de especialistas da especialistas da TVE.
tos e participava dos TVE. Com o passar do
programas ao vivo. tempo começaram a
Nesses se fazia uma chegar sugestões de
breve apresentação do tema, apresentavam- atividades e propostas de como trabalhar
se alguns vídeos ilustrativos e respondiam- os conteúdos; alguns trabalhos eram envia-
se às questões vindas do campo. Os cursis- dos por correio para que os comentássemos
tas liam e discutiam os textos em conjunto, nos programas ao vivo. Sim, havia interação
sob a orientação de um dinamizador, e pre- e intensa; os professores cursistas começa-
paravam questões para serem apresentadas vam, na prática, a interferir na seleção de te-
e respondidas ao vivo, ou enviadas por fax mas e nas orientações dos programas. Falta
para serem respondidas após a apresenta- de “olho no olho” sentíamos nós, no estúdio
29 Telessala é “um ambiente de recepção organizada, que possibilita a criação de relações recíprocas para
debates: as condições para leitura crítica dos programas de TV, nos quais som e imagem, acoplados a outros
equipamentos tecnológicos, possibilitam informações, conhecimentos e trocas de experiências entre os cursistas”
(SANTA CATARINA, 2009).
e, mesmo assim, só no começo. Os profes- dos vídeos, mas o estímulo ao registro e à
sores viam-nos “olho no olho” e interagiam troca de experiências. Depois de muita dis-
conosco fazendo de nós seus pares. cussão, a direção da TV concordou que ex-
perimentássemos, ainda sem acreditar que
Ainda mais importante era a forma de parti- algum vídeo realizado nas escolas pudesse
cipação ao vivo dos professores que acompa- apresentar qualidade técnica suficiente para
nhavam os programas de forma organizada ser veiculado. De fato, não foi possível uti-
nas telessalas. Ao longo de cada programa, lizar os primeiros trabalhos que nos chega-
entre 8 e 12 perguntas entravam no ar, ao ram, mas, pouco a pouco, a necessidade de
vivo, pela voz dos cursistas: “Olá, aqui fala a cuidados com a gravação foi sendo compre-
professora fulana, do teleposto da cidade tal endida pelos professores e, depois de pouco
e a questão que trago é do grupo”. Ainda sem tempo, começamos a veicular as imagens
“olho no olho”, havia a voz, ao vivo, em ca- que eram produzidas nas escolas.
deia nacional de televisão, que fazia de cada
cursista um professor presente nesta cadeia A rede se ampliava e se consolidava. Não
nacional de educadores; revelava, em cada éramos mais só nós, os especialistas, que
participante, um especialista, tão especialis- escolhíamos e mostrávamos experiências
ta quanto os profissionais da equipe central, importantes na TV: escolas que dispunham 64
explicitando e trocando o que aprendera e do equipamento necessário e que dedica-
construíra com seus estudos e em suas prá- vam tempo para fazer registro cuidadoso
ticas. A rede nacional de televisão viabilizava do que produziam passavam a compartilhar
uma rede nacional de educadores. seus cotidianos em rede nacional. Tecno-
logia acessível aos professores contribuía
Em meados dos anos 1990, as câmeras ama- para que sua produção saltasse os muros
doras de VHS começavam a se popularizar das escolas em que atuavam. Essa rede era
fazendo-se presentes em algumas escolas e composta por gente e por coisas, aparatos
Alguns de nós, professores que participamos jacente a várias dessas séries: a formação
da equipe de especialistas do Salto até en- docente para a cibercultura focando nas no-
tão, voltamos a ele diversas vezes, quer par- vas formas de produzir e comunicar conhe-
ticipando de programas em torno de temas cimentos que chegam à escola e nas trans-
específicos, quer criando séries temáticas. formações que isso pode viabilizar.
30 Pode ser verificado na página em que se apresentam as sinopses das séries do Salto (BRASIL, 2011).
As perspectivas e possibilidades que o cibe- tanto como leitores, como no papel de au-
respaço traz para a interação (entre insti- tores, trouxe para os educadores que atu-
tuições, entre educadores, entre discentes, am em Educação Básica o desafio de novas
entre estes e outros produtores de conhe- aprendizagens, novos estudos com um pro-
cimento etc.) viabilizam a criação de uma dutivo desconforto intelectual. O desequilí-
nova identidade para escola de educação brio, a sacudidela na zona de conforto em
básica: para além da função de reprodução que vivíamos, deslocando-nos de portadores
de conhecimentos historicamente produzi- de conhecimentos e verdades estabelecidas
dos pela humanidade, pode, agora, fazer de para um papel de mediadores (que avaliam o
si um espaço de autoria. Na cibercultura, a que está publicado e discutem com seus alu-
escola tem a possi- nos) e produtores de
bilidade de registrar conhecimento, pro-
e publicar o que faz,
A parceria entre a vocou, em grande
de produzir e publi- tecnologia digital, que número de educado-
car conhecimento viabiliza interação de res, a volta aos estu-
sobre o que é o seu mão dupla, e processos dos. Como exemplo,
saber específico: consistentes de formação, podemos citar o sig-
como refletir, dis- nificativo número 66
vem trazendo mudanças
seminar e ampliar de profissionais das
a produção cultural
dignas de nota em escolas redes públicas, em
da humanidade. A de diversos cantos desse diversos estados do
escola pode, graças país. país, que após parti-
às tecnologias de ciparem dos progra-
informação e comu- mas de formação do
nicação (TIC) e ao Proinfo Integrado,
ciberespaço, sem grande custo, produzir em passaram a produzir blogs e integram às
diversos meios e linguagens e publicar o que suas atividades docentes a produção de blo-
faz em espaço acessível a muitos. Pode tro- gs e assemelhados por seus alunos.
car com seus pares. Pode tornar-se um espa-
ço de autoria. E, porque é autora, a escola Cabe ressaltar que tal produção não decorre
conquista e amplia a autoridade sobre o que unicamente da chegada das TIC e das redes
pensa e faz. às escolas, mas dos processos de formação
que, junto com os aparatos e conexões, che-
A possibilidade de exploração de novas lin- garam aos professores dessas escolas. A par-
guagens (audiovisuais, hipertextuais etc.) ceria entre a tecnologia digital, que viabiliza
interação de mão dupla, e processos consis- Houve séries dedicadas às mídias digitais
tentes de formação, vem trazendo mudan- e seu uso em escolas, educação do olhar e
ças dignas de nota em escolas de diversos tantas outras.
cantos desse país.
A penetração deste trabalho junto a profes-
No Salto, não foram só os temas que se am- sores de todo o país é surpreendente. Ao lon-
pliaram; as práticas e meios de interação go dos últimos anos viajei de norte a sul do
com o campo também mudaram com o ad- país apresentando programas de formação
A participação dos professores nos progra- res vinham comentar os programas, sugerir
mas, que no início se dava sempre por te- temas e abordagens, apresentar o que viram
lefone ou fax, passou a contar com a possi- ser realizado em escolas a partir do que fora
bilidade de trocas mais ágeis pela Internet: discutido nos programas ao vivo.
das os textos e os próprios programas são al- especialistas nas mais diversas áreas, técni-
guns dos exemplos mais óbvios. Séries sobre cos de TV, profissionais de comunicação e 67
o uso de tecnologia nas escolas passaram a tecnologia, muita tecnologia, está de para-
ter espaço cada vez maior. Computadores béns. A rede cunhada que viabiliza trocas
debate de para que serviriam e de que for- escala, sobre os mais diversos assuntos, fez
ma poderiam contribuir para que a escola muitas escolas mais fortes. Essa rede con-
realizasse de forma mais competente o que tribuiu para que escolas se reconhecessem
que se escondia por trás de muitos temas, não pode ser construído em nenhum outro
começava a aparecer na frente das câmeras. canto: como forjar um espaço em que es-
tudantes do Ensino Fundamental possam
docente continuada para uso das tecnolo- nomos, brasileiros que sabem de seu papel
gias digitais, feitas através do Proinfo Inte- e sua responsabilidade na construção deste
grado, encontraram importante apoio em nosso país que faz hoje o seu futuro.