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OBRASIL

'
RUMO
,
APINDAIBA
Se não ap1·ovarlogo
uma reforma
da Pr evidência ,
o Brasil terá somente
trocados para
investir nas áreas
em que tanto precisa
N ão se iluda, caro leitor: a maior operação de combate à
corrupção da história do Brasil está agonizando. Ou
melhor: está sendo sufocada. Pode parecer exagero retórico.
nos mesmos moldes de centenas de outras. Há outras dela-
ções que aguardam sigilosamente homologação no Supremo .
Há, ainda, propostas de delação que aguardam aval da nova
Afinal, quantas vezes procuradores, juízes e delegados não procuradora-geral da Repúb lica, Raquel Dodge. Sabe-se que,
alertaram sobre os avanços contra a Lava Jato? Ataques que na maioria dos casos, quanto mais se demora para fechar
vinham do Judiciário, do Legislativo e do Exect1tivo, quase um acordo, menor a chance de sucesso na investigação que
sempre executados com a competência sutil e certeira da se segue a ele. Aliada à suspensão da delação de Joesley
velha política. Às vezes histriônicos e hiperbólicos, coloridos Batista, caso para o qual aind .a não se vislumbra um fim no
com tintas apocalípticas, esses alertas foram largamente Supremo, resta estabelecida a insegurança jurídica sobre o
ign orados pela opinião públ ica - que, de resto, não tinha uso do instituto. Muitos criminalistas não recomendam
muito o que fazer, além de expressar indignação nas redes mais a seus clientes que busquem uma colaboração .
sociais e esperar as eleições de 2018. Ademais, as manifestações Em 2017, abu .ndaram no Supremo decisões que, embo-
públicas dos responsáveis pela Lava Jato raramente contem- ra defensáveis em princípio, na prática limitaram as inves-
plaram o reconhecimento de erros na condução da opera- tigações da Lava Jato, diminuindo as chances de sucesso
ção, especialmente em Brasília, onde errar não é uma opção. nos novos casos e aumentando as chances de impunidade
O marchar aparentemente irrefreável da Lava Jato no Rio de nos antigos. Ministros passaram a revogar com frequência
Janeiro contribuiu para dissipar a força dos apelos dos inves- prisões preventivas, outro instrumento fundamental das
tigadores por apoio da população. Por fim, é controverso se investigações - previsto em nossas leis e, até outro dia, con-
juízes e procuradores podem - ou devem - meter-se no de- servado pelo próprio Supremo. Longos pedidos de vista
bate público das investigações em que estão envolvidos. em casos já em estágio avançado tornaram -se comuns. Eis
Apesar dessas ressalvas, os fatos estão do lado daqueles o resultado: até agora, após anos de operação, o Supremo
que defendem a Lava Jato e por ela temem. Uma sucessão não condenou nem absolveu ninguém na Lava Jato.
de acontecimentos indica o progressivo sufocamento da Nas últimas semanas, os ministros deram ao Congresso
Lava Jato - da Lava Jato entendida em seu sentido mais o poder de revogar medidas cautelares do mesmo Supremo
amplo, como conjunto de esforços de procuradores e dele- contra parlamentares. E, com um pedido de vista do minis-
gados para o combate efetivo dos criminosos de colarinho tro Dias Toffoli, o tribunal deixou de restringir a proteção d.o
branco. As delações premiadas são o oxigênio da Lava Jato. foro privilegiado aos crimes cometidos durante o mandato.
Sem elas, a operação não respira. Desde que as delações d.a Se 2017 já parecia suficientemente difícil, espera-se o pior
Odebrecht e da JBS feriram gravemente os mais importan - para 2018: a mudança (mais uma) de um entendimento que
tes políticos e partidos do país, a retaliação dos que se viram diminuía a impunidade e que fora instituído pela própria
entre o cargo e a cadeia foi viscera l. Com essas delações, a Corte. Há uma articulação forte para que os ministros revo-
Lava Jato atingia, em 2017, o topo do poder político, expon - guem a chamada execução provisória da pena a partir da
do aos brasileiros dezenas de organizações criminosas, in - segunda instância, pela qua l condenados em segundo grau
terligadas umas às outras pelo interesse comum de manter podem começa r a pagar po r seus crimes - o que inclui tem-
o contro le dos principais espaços dos Três Poderes - espaços po de prisão. A prosseguir, portanto, nessa sucessão de deci-
que rendem dinheiro e prestígio. Era para ser o triunfo da sões que retiram os poderosos do alcance das leis penais,
Lava Jato. Tornou-se sua ruína. Sua lenta ruína. como se dava no país até o julgamento do mensalão e a Lava
Desde então, os fatos sucederam-se em benefício dos Jato, o Supremo sufocará não somente uma operação .
investigados. Graças aos erros cometidos na condução da Sufocará, em larga medida, o sentido de justiça do Brasil.
delação da JBS, o Supremo pôs-se a discutir em que circuns-
tâncias as delações podem valer ou 11ão,mesmo que os de-
latores cumpram sua parte. A decisão final, embora aparen-
temente favorável ao instituto, ainda não foi formalizada
pelo tribunal. Quando isso acontecer, poderá haver surpresas.
Recentemente, o ministro Ricardo Lewandowski se recusou Diego Escosteguy
a homologar a delação do marqueteiro Renato Pereira, feita Editor-Chefe

11de de zem bro de 20 17 1ÉPOCA 123


JACOB BARATA FILHO

Foto: Daniel Marenco/Folhapress. 11 de dezembro de 20 17 1 ÉPOCA 125


PERSONAGEM DA SEMANA

Sérgio Garcia

ábado à noite tem a aura de dia de festa para


muita gente. Para o empresário Jacob Barata
Filho, então, nem se fala. Por volta de 22h45
do sábado, dia 2, ele foi solto pela terceira vez
da cadeia pública de Benfica, aquela que se
transformou na segunda casa de ex-poderosos do Rio de
Janeiro. Barata deixou lá dentro homens acusados de serem
parceiros seus de corrupção, como o ex-governador Sérgio
Cabral, seus ex-secretários e os deputados estaduais Jorge
Picciani, Edson Albertassi e Paulo Melo, todos do PMDB.
Barata saiu rapidinho, já habituado aos procedimentos, à
rotina de ser preso pela Lava Jato e solto logo em seguida.
Desde julho a coisa se repete. O juiz da 7ª Vara Criminal
Federal do Rio, Marcelo Bretas, manda prendê-lo; ato con-
tínuo, o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal
Federal (STF), manda soltá-lo. E Barata voa.
Essa batida de entra e sai de calabouços já se repetiu três
vezes nos últimos cinco meses, graças a decisões monocrá-
ticas de Mendes. A saga começou na noite de 2 de julho.
Barata estava no aeroporto internacional do Rio, se prepa-
rando para embarcar para Portugal, quando foi surpreendi-
do por policiais federais. Não era nada de errado com sua
bagagem ou passaporte. Era a Operação Ponto Final, que
abalou o que era até então uma sólida estrutura de parceria
entre Executivo, Legislativo e o mu.ndo empresarial em prol
da corrupção. No dia 17 de agosto, do Supremo Tribunal
Federal, em Brasília, o ministro Gilmar Mendes concedeu
um habeascorpus.Argumentou que os fatos criminosos atri- De acordo com os investigadores da Lava Jato, Barata Filho
buídos a Barata Filho tinham acontecido entre 2010 e 2016 defendia os interesses comerciais de seu conglomerado distri-
e, por isso, não eram suficientes para justificar a prisão na- bui11do propina a pessoas bem colocadas no governo do Rio
quele momento. "Ainda que graves, fatos antigos não auto- e a deputados da Assembleia Legislativa do estado.
rizam a prisão preventivà: disse, e substituiu a cadeia por Em 2013, quando o esquema prosperava sem incômodos,
medidas cautelares, como recolhimento noturno e nos finais Barata Filho alugou o Golden Room e o Salão Nobre, além
de semana e feriados, proibição de participar das atividades de outros três recintos do mítico hotel Copacabana Palace,
de suas empresas de transportes e de deixar o país. para a opulenta festa de casamento da filha Beatriz Perissé
Na noite do mesmo dia, o juiz federal Marcelo Eretas Barata com Francisco Feitosa Filho. Cerca de 1.200 convida-
expediu um novo mandado de prisão contra Barata, na dos se divertiram naquela noite, cujo ápice foi a apresentação
prática impedindo que a decisão de Mendes o colocasse em do cantor Latino. Na ocasião, houve até um confronto com
liberdade. Usou um despacho de prisão preventiva feito manifestantes que lotavam as ruas do país. Eles protestavam
anteriormente por um outro juiz e argumentou que havia na porta do casamento, pelo fato de a família Barata ser
risco de Barata fugir do país. A defesa de Barata recorreu beneficiária das tarifas de ônibus contra as quais protestavam.
novamente a Gilmar Mendes, que no dia seguinte deu novo Detalhe que passou despercebido na ocasião, entre os
despacho e libertou o empresário. Mendes fez pouco de convidados estavam o ministro Gilmar Mendes e sua espo-
Eretas. "Isso é atípico. Em geral o rabo não abana o cachor- sa, Guiomar Feitosa, tia do noivo. Francisco é filho do ex-
ro, é o cachorro que abana o rabo", disse. Começava ali um -deputado federal Chiquinho Feitosa, irmão de Guiomar e
entrevero que persiste. também magnata do ramo de transportes, só que no Ceará.
Jacob Barata Filho não é político da cúpula do poder em Quatro anos depois, quando o episódio já parecia relegado
Brasília. É herdeiro de Jacob Barata, que há mais de 60 anos ao limbo, as imagens daquela festa reapareceram quando
começou dirigindo uma "lotaçãozinha" que ligava dois bairros Mendes mandou soltar Barata Filho e confrontou o juiz
do subúrbio carioca e há quase 50 anos fundou o Grupo Gua- Eretas. Em função de "vínculos pessoais que impedem o
nabara, que hoje opera não só com transporte de passageiros, magistrado de exercer com a mínima isenção suas funções
como também nos setores imobiliário, financeiro e comercial. no processo", o então procurador-geral da República, Rodri-

2 6 1 ÉPOCA 111d e deze mb ro de 20 17 Foto: rep rodução.


Jacob Barata Filho

go Janot, pediu a suspeição do ministro no caso e que o STF


anulasse todas as suas decisões relativas a Barata. O pedido
foi reforçado após o Ministério Público Federal descobrir
que Barata enviou flores para o casal Gilmar e Guiomar em
2015. "Não tem suspeição algumâ: disse Mendes na ocasião .
"Vocês acham que ser padrinho de casamento impede
alguém de julgar um caso? Vocês acham que isso é relação
íntima como a lei diz?" Até hoje o pedido não foi examinado
pelo plenário do Supremo. Em setembro, quando Janotdei-
xou o cargo, sua sucessora, Raquel Dodge, requisitou o pe-
dido de volta à Procuradoria para analisar.
A Operação Cadeia Velha levou Barata à prisão pela ter-
ceira vez há três semanas. Havia dois pedidos de prisão con-
tra ele - um do juiz Eretas e outro do Tribunal Regional
Federal da 2ª Região. As provas contra o empresário encor-
param graças a dados contidos em planilhas de pagamento
de propina entregues pelo doleiro Álvaro Novis e pela dela-
ção do empresário Marcelo Traça. Os investigadores afirmam
que Barata distribuiu R$ 27,7 milhões em suborno a políti-
cos em troca de benefícios para seus negócios, entre 2013 e
2016. De acordo com a investigação, a propina foi para os
bolsos do ex-governador Sérgio Cabral, além dos deputados
estaduais Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi e
para conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Rio.
A defesa de Barata diz que não há "qua lqu er evidência de
distribuição ou recebimento de dinheiro ilícito em prol de
qualquer agente público por parte do empresário':
No dia 1º, o ministro Gilmar Mendes derrubou os dois
decretos de prisão e mandot1 soltar Barata novamente. Fez
um contorcionismo verbal para admitir que os novos fatos
criminosos eram mais recentes, mas ainda assim eram ante-
riores ao primeiro decreto de prisão, portanto a Justiça de-
veria ter levado em conta aquele primeiro habeas corpus
Os investigadores concedido por ele em agosto. Na segunda-feira, dia 4, a pro-
curadora-geral da República, Raquel Dodge, pediu que o

afirmam que Supremo restaure a prisão de Barata Filho. Fez u.m duro ata-
que a Gilmar Mendes. Segundo ela, o argumento do ministro
"não parece encontrar sustentação na ordem jurídica vigen-
Barata Filho te': Afirma ainda que Barata descumpriu as medidas caute-
lares que lhe foram impostas em agosto . "Esse cenário per-
distribuiu R mite concluir que o empresário não se desligou de suas
funções na administração das empresas de transportes cole-
tivos e continua exercendo tais atividades, em absoluto des-
27milhões cumprimento da medida cautelar imposta pelo Supremo
Tribunal Federal", diz Dodge. Outro argumento é que a de-

emprop1naa cisão sobre soltar ou não Barata cabia não ao ministro Gilmar
Mendes, mas ao ministro Dias Toffoli, qt1ejá tinha atuado em

políticos no Rio casos da Operação Cadeia Velha. O Supremo aind .a vai exa-
minar o caso. A despeito das provas, ainda não se achou no
Brasil alguém capaz de manter Jacob Barata Filho preso. +

Com Hudson Corrêa

11 de d ezem br o de 20 17 1ÉPOCA 127


GUILHERME FIUZA

~'.rincan'--"-o

______
'--ea.,_.,
art

S érgio Cabral chegou para depor ao juiz Marcelo Bretas


com uma biografia de Nelson Mandela n as m ãos. Es-
tratégia corretíssima. Está mais que provado que o Brasil
do governo Lula. Sergio Moro já sabe das conta s de propi-
n a abe rtas n a Espanha pela Engevix para Lula e Dirceu. E
por aí vai. Ou foi. São só duas no vid ades de uma epope ia
ama delinquente fanta siado de coitado. Mandela morr eu cauda lo sa ( o m aior assalto govern am ent al já pe rp etrado
durante o jul gam ento do mensalão. Antes mesmo de ser n a hi stó ri a da democracia), mai s do que sufi cient e par a
ente rr ado já tinha virado alter ego de mensaleiro preso. prender o gran de líd er por várias en carn ações . Mas Luiz
Se ele aguentou a cadeia, nó s também aguentaremos - Inácio está sa ltinh o da Silva - graças à len da.
br adava a bandidagem companh eir a. E assim su rgiu uma Ele, Dilma wo rkalc oo lic e grand e elen co band oleiro.
dinastia de mand elas carn avalescos, que terá seu apoge u Jan ot, que protegeu a gan gue se fin gind o de ju sticeiro ,
com a prisão de Lula. conspirou com o laranj a bilionário do PT às sombr as do
Quando a Justiça deixar de fricote e puser o filho do STF e n em invest igado é. Assim como o pad re pedófilo,
Brasil n a cade ia, se sucede rá o espetácu lo mais folclóri co valeu -se da auto rida de de guard ião da virtud e para mon-
já visto na pátria do folclor e. A Marquês de Sapuca í pa- tar a operação m ais obscura envolvend o a Presidência da
recerá um corredor de escritóri o em dia de feriado pe rto Repúb lica desde a ruptur a in stitu cional dos militar es.
do qu e se verá no país . Nada de revolta, insur reição ou Um p ro cur ado r blindado até hoje por essa m esm a lend a
multid ões em polvorosa - po rqu e obra - p rogressista que lhe perm itiu agir ao arr e-
sileiro é distraído, m as nem tanto. Vid.a pio das instituições (leiam suas denú n cias
norm al. O que explod irá é o carn aval da n o original), exatame 11te como faziam as
lenda - um tsunami abst rato, simb ólico, ASSIM COMO O BOM auto rid ades no s an os de ch11mbo.
covarde, que já mobiliza um batalhão de E aí você dá de cara com a notí cia de
defensores da ética de butique.
VELHINHO, A LENDA
um ae ropor to- fanta sma em Moçam-
Nesse conto de fadas altamente lu cra- DO EX-OPERÁRIO bique, con struído pela Odebrecht com
tivo para um pedação do Brasil ( cada vez QUE ENFRENTOU AS dinheiro do BNDES - enfim , o m esmo
m aior ), Lula será o Mandela brasileiro- e DNA, a m esma tecnologia, o m esmo
poderá até ser esquec ido n a prisão, por- ELITESMOVIMENTAUM know-how de rapin agem que o governo
que na realidade nin guém está nem aí para MERCADOGIGANTESCO do PT, apenas o gover no do PT, como
ele. As obras comp letas da ladro agem do nun ca antes do gove rn o do PT algué m
m essias foram esfregadas na cara do país, ousou fazer. Porqu e nin guém jam ais teve
e a relação da popu lação com a alma m ais hon esta virou a ditadura da lenda , a m ágica de ser governo e coitado ao
uma espécie de síndrom e do Papai Noel: h á os que querem mesmo tempo. Um habeas corpus vitalí cio.
acreditar, os que fingem acreditar e os qu e qu erem que os Essa p raga de transformar qualquer disparate na int er-
outros acred item. Len da é lend a. net em escând alo hediondo contra os direitos humano s e
E assim como o bom velhinh o natalino , a lend a do ex- as minorias S.A. - uma histeri a fashion que n ão ajud a em
operário qu e enfr entou as elites mo vim enta um mercado nad a as causas verdad eir as - é a disputa po r esse legado
gigantesco - no caso, de alt ruí smo contrabandeado e bon- hi póc rita . Lula ir á em cana fingind o ler os en sinam ento s
dade de aluguel. Ê com o um conto de Nata l pornô: vai tudo do compa nh eiro Mandela, e os mandelas de carn aval con-
muito bem, até que você é obriga .do a tirar as crian ças da tinuarão à solta cafetin ando a boa-fé.
sala qua nd o o herói da pobreza fica mili on ári o com o di- A não ser qu e a plateia passe a vaiar o teatr inho. E mostre
nh eiro do povo. Aumenta o som do "Jingle bell" (tamb ém ao Cabral que nem um Maracanã repleto de diam ant es é
serve algum hino can astrão da MPB) e segue o b aile, que tão fraudu l ento qu anto brincar de apart heid . +
se fant asiar de progressista revolucion ário está dando um
vid ão para muita gente. Viva o Lula. Dane-se o Lula.
A planilha da propina na Odebrecht revelou u.ma séri e
de desembolsos para as reform as do sít io que n ão é do
Guilherme Fluza é jo rna lista. Publicou os livros Meu nome não é Johnny. que
Lula, totalizando R$ 700 mil em m eno s de du as sema n as deu origem ao filme, 3.000 dias no bunker e Não é a mamãe - Para entender a
- po r uma coin cidên cia atroz , exatamen te as duas últimas Era Dilma. Escreve qu inzena lmente em ÉPOCA gfiuza @edglobo.com.br

28 1 ÉPOCA 111 de dez em bro de 20 17


POR MURILO RAMOS expres so@edglobo.com .br

Para depois
O ex-presidente da Transpetro
Sérgio Machado enviou uma
resposta curta ao Supremo
Tribunal Federal (STF), que o
notificou para se manifestar
sobre a denúncia do Ministério
Público Federal contra senadores
do PMDB por associação
criminosa. Machado diz que
reafumará todas as acusações
que fez contra os ex-aliados.
Mas só quando chegar a hora de
prestar depoimento no tribunal.
,,
Oleobruto
A Petrobras, assistente de
acusação da Procuradoria-Geral
da República , encamin hou ao
STF documento em que afirma
esperar as condenações da
carteira de trahaJ.ho presidente do PT, senadora Gleisi
Hoffmann, e de seu marido, o
Pedra no sapato ex-ministro do Planejamento
Paulo Bernardo, e quer que o

O presidente Michel Temer está empolgado com a redução dos juros e o


controle da inflação. Mas sabe que só poderá continuar sonhando com
a reeleição se a taxa de desemprego ceder significativamente nos próximos
casal devolva no mínimo R$ 1
milhão desviados da estatal.

meses. São 12,7 milhões de pessoas à espera de uma oportunidade.


Confiança
O ex-assessor parlamentar Job
Ribeiro Brandão, que delatou
Problema os irmãos Geddel e Lúcio Vieira
Depois de investigações Lima, era um faz-tudo para a
preliminares, o Ministério família. Além de contar dinheiro,
Público Federal em Brasília assinava como testemunha atos
abriu um inquérito para de constituição ou alteração
apurar irregularidades contratual de empresas
na contratação de ligad.as aos peemedebistas.
funcionários para a
Secretaria Nacional
de Promoção do Vai longe
Desenvolvimento Grandes escritórios de advocacia
Humano. O órgão é acreditam em mais dez anos da
responsável pelo programa Lava Jato nos tribunais. Os casos
Criança Feliz, cuja envolvendo políticos famosos
embaixadora é a primeira- serão raros, mas prosperarão
dama , Marcela Temer. aqueles em que empresários
Ela não é investigada. terão de explicar roubalheiras.

30 1 ÉPOCA 111 de dezembro d e 2017 Fotos: Mateus Bonom i / AG IF/AFP, Agênc ia Câmara,
Filipe Redondo/ Editora Globo, Fát ima Meira/Futura Press
Com Marcelo Rocha e Nonato Viegas
e reportagem de Samantha Lima e Nelson Niero Neto

Reencontros Sem sinal


Rodrigo Janot foi designado O STF encontra dificuldades
pa r a atuar na Sexta Turma para enviar notificações
do Superior Tribunal de relacionadas a decisões dos
Justiça (STJ) após deixar o ministros a outros órgãos.
comando da Procuradoria-Geral Motivo: a insistência da Corte
da República. O lo cal é em recorrer ao velho aparelho
passagem de recursos de fax. Foram duas as tentativas
relacionados a importantes frustradas só na semana passada.
investigações que estiveram
sob sua responsabilidade
quando chefiava o Ministério Replay
Público. Lá estão casos No programa de televisão do
como o dos irmãos Joesley PSD, que será veiculado no final
e Wesley Batista na Lava do mês, o ministro da Fazenda,
Jato e do ex-presidente da Henriq11e Meirelles, pretende dizer
Câmara Eduardo Cunha. sutilmente que salvou a economia
brasileira duas vezes: em 2003,
quando assumiu o Banco Centra l no
Mudança primei ro mandato do ex-p residente
O promotor de Justiça Palavras Lula, e no começo do governo
Sérg io Bruno Fernandes, que Temer. O presidente não gostará.
coordenou o grupo de trabalho Extra
da Lava Jato na gestão de Foram poucas as vezes, mas o
Rodrigo Janot na Procuradoria- ministro do Sup remo Tribunal Confusão
Gera l da República, retornou ao Federal Luís Roberto Barroso Duas pesquisas recentes deixaram o
órgão de origem, o Ministério faturou ao cobrar cachê para deputado federal Celso Russoman110
Público do Distrito Federal, e dá proferir palestras. Na maioria (PRB-SP) confuso. Numa delas, ele
expediente numa Vara de Justiça das vezes em que é convidado, aparece em 1.u lugar nas intenções
de Santa Maria, na periferia da no entanto, ele discursa de de voto para o governo paulista.
capita l do país. Fernandes ficou graça no s eventos ou pede ao Em outra, realizada por seu
famoso por dar uma lição de contratante para repassar o valor partido, figura como favorito na
moral em Emílio Odebrecht. para i11stituições de carid .ade. disputa para o Senado. E ago r a?

Fim do amor
O ex-prefeito do Rio de Janeiro
Imortal Eduardo Paes está decidido a deixar
O deputado federal o PMDB após dez anos e rumar para
Tiririca (PR-SP), que o PDT. Só que antes quer informar
anunciou sua saída pessoalmente o ex-governador
da política a partir de Sérgio Cabra l e o ex-presidente da
2019, diz ter planos Assembleia Jorge Picciani sobre sua
para publicar um decisão. Paes só não quer visitá-
livro em que narrará los na cadeia para dar a notícia.
histórias de sua
passagem de oito anos
pela Câmara. Em Público
201O, Tiririca pediu As dívidas da Oi com o governo
votos aos eleitores federal alcançam R$ 21 bilhões. É
afirmando que queria quase um terço do valor total da
saber o que fazia dívida da empresa, que está em
um deputado. Agora recuperação judicial. Entram nessa
Tiririca diz que sabe. conta empréstimos tomados no Banco
do Brasil, no BNDES e na Caixa.
~
~ Leia a coluna EXPRESSOem epuca.mm.br
11de de zembr o d e 2017 1 ÉPOCA 13 1
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POLÍTICA

Débora Bergamasco, Mateus


Coutinho e Patrik Oamporez

presidente Michel Temer


serpenteava entre as rodas de
convidados espalhadas pelo
amplo salão do Palácio da
Alvorada durante o jantar
oferecido na quarta-feira,
dia 6, aos líderes das banca-
das do Congresso e presi-
dentes de partido para atua-
lizar o placar de votos a favor
da reforma da Previdência.
Ao se aproximar do grupo
em que estava o presidente da Câma ra,
Rodrigo Maia (DEM-RJ), Temer ouviu
o que se passa nos subterrâneos do
Congresso - resistência à reforma e des-
confiança da contab ilidade oficial, ven-
dida com otimismo durante a maior
parte da semana passada. Ouviu críticas
à estrat égia do governo. "Presidente, a
lib eração dos R$ 500 milhões para os
sindicatos e o repasse de R$ 2 bilhões
para os prefeitos deveriam ter sido con-
dicionados à aprovação do texto da
reforma", disse um influente deputado.
"Agora que eles já foram atendidos, o
efeito pode ser inócuo. " Esfregando
uma mão sobre o dorso da outra e al-
ternando a de cima com a de baixo su-
cessivamente, Temer ouvia as queixas.
ESGOTOU
Limitou-se a balbuciar: "Mas conve- O presidente
nhamos ... convenhamos ...". Michel Temer. ta-feira, o adiamento se concretizou.
Durante a maior parte da semana Diante das Temer e Maia combina ram de coloc ar
dificuldades,
passada, o governo vendeu otimismo. o texto em votação na última semana
a reforma
A adesão à reforma da Previdência pode ficar de trabalho do Congresso no ano, en-
avançava, de acordo com inform ações para fevereiro tre os dias 18 e 22. "Essa agenda não
saídas do Palácio do Planalto, fosse por vai desaparecer. Ou a gent e vota isso
meio dos ministros Eliseu Padilha, da ou o Brasil vai caminhar para a que-
Casa Civil, e Moreira Franco, da Secre- bradeira", disse Maia.
taria-Geral da Presidência, fosse por Não por acaso, o período coincide
outros assessores. A partir da quinta- com a deliberação sobre o Orçamento
feira, dia 7, no entanto, o clim a recru- de 2019. Deste modo , há uma garantia
desceu. De manhã, Maia participou de de quórum. Deputados n ão deixam
uma teleconferência com investido res, de votar o Orçamento - se o fizerem, o
gente do mercado financeiro. Deu a eles governo funciona precariamente. Ao
um parecer sincero, de que o governo amarrar as duas votações, o governo
não tinha votos suficientes para colocar reduz o risco de deputados fugirem do
a reforma em votação nesta semana, no plenário na hora decisiva. Aos deputa-
dia 13, como se esperava. O choque de dos, a ideia agrada. É possível amarrar o
realidade fez a turma do mercado fi- voto num tema pol êmico com a garan-
nanceiro realizar seu pess imi smo em tia das benesses prometidas no Orça-
negócios. O dólar subiu 1,7%, a maior m ento ali, na hora. Estratégia esperta,
alta desde maio, e as taxas de juro futu- mas reveladora de desespero do Pla.nal-
ras aumenta ram , dois sina is de quem to. A realidade, no entanto, é um pouco
joga à espera do pior. Na tarde da quin- pior. O governo não diz, mas trabalha .,.

34 1ÉPOCA 111de dezembro de 20 17 Foto: Mateus Bonom i /AGIF/AFP


POLÍTICA

com a hipótese de votar a reforma só em


fevereiro do ano que vem, na volta do
recesso parlamentar. Não vê chance de
obter as adesões necessárias neste ano.
A reforma é uma matéria vital para
o país (leia mais na página 40), portan-
to não é trivial. São necessários 308
votos favoráveis na Câmara, em duas
votações. Na quinta-feira , o próprio
Temer disse a ministros que tinha 280
votos pela reforma; auxiliares palacia-
nos, sempre mais otimistas, falavam em
290; líderes partidários, pessimistas por
conveniência, diziam que eram 270.
Para tentar elevar esse placar até ao me-
nos 320 e, assim, ter margem mínima
de segurança para não perder graças
àqueles que traem ou fogem, o Planal-
to calcula que ainda precisa convencer
cerca de 50 deputados. É muita gente.
Em outro momento, bastaria ao Exe-
cutivo lançar mão da arte que domina
e que o Congresso adora, a do fisiolo-
gismo. Fez isso abertamente (leia algu-
mas ofertas na página 38). Na semana
passada, diante da ineficiência da nego-
ciação com líderes partidários, que não
conseguiam convencer os deputados, o
governo foi para o varejo. Os ministros
Padilha e Moreira Franco e até Temer
receberam deputados; o presidente fez
EFEITO
o jantar de quarta-feira; até governado- O presidente
res e prefeitos foram procurados. da Câmara, terem votado contra Temer na batalha
Contudo, a fonte do fisiologismo e o Rodrigo Maia. contra Janot, agora os pedem de volta
A sinceridade
método das lideranças está esgotado. em troca do voto favorável à reforma.
sobre a reforma
"De modo geral, a base se sente exauri- deixa o mercado Sobrou ao governo lançar mão da
da. Especialmente a da Câmara foi mui- nervoso criatividade financeira. No dia 22 de
to carregada neste ano': diz o líder do novembro, o presidente da Confedera-
PP na casa, deputado Arthur Lira. "A ção Nacional dos Municípios , Paulo
Câmara entregou as aprovações da PEC Ziulkoski, levou 2 mil prefeitos a Bra-
do teto de gastos, a reforma do ensino sília para pleitear R$ 4 bilhões para
médio, a trabalhista, a pauta da tercei- pagar o 13º em vários municípios. Cou-
rização e duas denúncias contra Temer." be a Dyogo Oliveira, ministro do Pla-
Líder do centrão, o grupo que reúne nejamento , dizer "não" a Ziulkoski.
cerca de 140 parlamentares bem apega- Porém, os prefeitos saíram com a pro-
dos ao fisiologismo, Lira dá a senha: messa de receber, ainda neste ano, 11m
depois de salvar o mandato de Temer auxílio de R$ 2 bilhões e, se aprovada
das duas denúncias criminais apresen- a reforma, R$ 3 bilhões extras no
tadas pelo ex-procurador-geral Rodrigo Orçamento de 2019. "Disseram que a
Janot , os deputados não querem mais gente está se vendendo por R$ 2 bi -
desgaste - ou querem mais benefícios lhões. Isso é humilhante ", diz Ziulkoski,
para se desgastar. Muitos deles ainda irritado. "Uma coisa não tem nada a
não receberam os recursos prometidos ver com outra. É como gestores públi-
por sua "fidelidade" ao presidente. O cos que acreditamos na reforma previ-
tempo é propício a tudo. Até deputados denciária. Logicamente, vamos apro-
que perderam cargos no governo por veitar essa situação em que podemos..,.

36 1 ÉPOCA 111 de dezembro de 20 17 Foto: Werther Santana/E stadão Conteúdo


POLÍTICA

foi fixado um preço a pagar por quem


MUITA OFERTA, POUCOS VOTOS desobedecer a ordem, a ordem pouco
Mesmo com prebendas, o governo tem dificuldades para angariar apoio vale. É óbvio que o PMDB não punirá
quem votar contra a reforma.
Na dura matemática do Planalto
AMBULÂNCIAS PARCELAMENTO pesa, sobretudo, a situação de três si-
glas: o PSD, o PR e o PSDB. Juntas, so-
OUEMAPOIAR A DE DÍVIDAS mam 121 votos. Todos operam a Previ-
REFORMAPODERÁ O GOVERNODEU AVAL dência como instrumento para a eleição
de 2018. O PSD tem cobrado do Pla-
INDICAR MUNICÍPIOS PARA NOVOSPROGRAMAS nalto um apoio mais contundente a
~

OUE RECEBERAO OE PARCELAMENTO OE seus candidatos, em especial que, aos


poucos, assuma o ministro da Fazenda,
OS VEÍCULOS. DÍVIDAS PARA MICRO E Henrique Meirelles, como representan -
HÁ RSI BILHÃO PEOUENASEMPRESASE te do governo na disputa. O ministro
das Comunicações, Gilberto Kassab,
RESERVADOS 00 SETOR RURAL. VAI dono do PSD, nega. "A refor1na da Pre-
PARAAS COMPRAS DEIXAR OE ARRECADAR vidência chega num momento de evi-
dente desgaste político da base e do
RS 10 BILHÕES próprio Parlamento': afirma o deputa-
do Rogerio Rosso. "Muitos entendem a
AGRADOS importância, porém defendem que essa
A ESTADOS EMENDAS discussão entre na pauta da eleição de
2018. A reforma está no timing errado
E MUNICÍPIOS DECRETOOE TEMER do ponto de vista político e correto do
ponto de vista fiscal. Resolver essa equa -
PREFEITOSE AUMENTOUEM RS 600
ção é o grande desafio:' Como o PP de
GOVERNADORES MILHÕES O VALOR Artur Lira, Rosso quer dizer que o PSD
RECEBERÃORS DISPONÍVEL PARA já fez muito ao livrar Temer da degola.
O PR, de Valdemar Costa Neto, um
1, 9 BILHÃO COMO GASTARCOM EMENDAS habilidoso jogador , confidenciou a
COMPENSAÇÃO POR OE PARLAMENTARES AO uma liderança da Câmara que faz
"jogo de cena" com o Planalto, pois
"PERDAS" COM ORÇAMENTO . O GOVERNO não acredita que o tema seja votado.
A LEI KANOI R. EMPENHOURS 4 BILHÕES O PSDB é o caso mais complicado.
O Planalto conta com apenas 15 votos
O PLANALTO EM EMENDASEM JUNHO dos tucanos; os mais otimistas falam de
PODEAMPLIAR E JULHO PARA SALVARO 20 a 25 votos favoráveis à reforma,
numa bancada de 46, que até ontem
ESSE VALOR MANDATODO PRESIDENTE tinha quatro ministros no governo. O
PSDB tem uma questão de sobrevivên-
cia política simples: se aprovar a refor-
ma, injeta no mercado otimismo em
relação ao futuro da economia, o que
pode melhorar a vida de Temer. O pre-
pressionar os deputados e tirar uma PMDB contavam que teriam 80º/4 dos sidente pode recuperar força e se tornar
contrapartida para a sociedade." 60 votos a favor da reforma. O partido um ator importante na campanha de
Em um movimento para tentar si- decidiu fechar questão. Mas os detalhes 2018. O PSDB tem candidato à Presi-
nalizar a força do governo, o PMDB fez nas frases mostram que esse compro - dência - provavelmente o governador
na quarta-feira uma reunião de sua misso não é firme. "É um fechamento de São Paulo, Geraldo Alckmin - e não
Executiva Nacional com a bancada na de questão com punição", disse o presi- se interessa nem um pouco em reerguer
Câmara para fechar questão pelo voto dente do partido, senador Romero Jucá. Temer do atual patamar de impopula-
a favor da reforma. Na prática, "fechar "O que nós não fizemos foi dizer que ridade. Aos tucanos interessa adiar a
questão " significa que os deputados que tipo de punição será, para não parecer reforma, ganhar tempo para si e contra
votarem diferente do combinado po- que é uma ameaça feita aos deputados Temer. Muitos jantares e fisiologismo
dem ser punidos. Os deputados do e deputadas do PMDB." Simples: se não ainda serão necessários. +
38 1 ÉPOCA 111d e de zembro de 20 17
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ECONOMIA

Luís Lima ,
governo brasileiro en-
cerra 2017 torrando
~----- DIVIDA ~
dinheiro como se fosse
o fim dos tempos. Gas-
ta como 11mnovo-rico
CRESCENTE
sem noção, destinado A DÍVIDA DO GOVERNO
a cair na pobreza. Essa
trajetória resulta de CRESCE RÁPIDO, POR
muitos fatores e dec i-
sões ruins acumu la.das FATORESDIVERSOS,
ao longo de vários go-
vernos, mas uma dis- COMO JUROS ALTOS -
A

torção evidente a au-


mentar o problema é
E A PREVIDENCIA
quanto o país gasta
com aposentadorias e
benefícios. Hoje, esses
tópicos deixam apenas
43% do gasto público
para outras áreas . Sem
uma reforma da Previdência, até 2026 feito até lá, prevê o Itaú Unibanco. "Já CRESCIMENTO DE BENEFICIÁRIOS
eles continuarão a devorar parcela vemos o governo cortando investimento. A diferença no número de cidadãos
a depender da Previdência
maior da despesa públ ica, até deixarem E vai prec isar reduzir todo o gasto. O
se manifestará rapidamente
apenas 20% para todo o resto, pela pro- exemplo dos passaportes (cuja produção
jeção do Mini stério da Fazenda. O eco- foi interrompida por um mês neste ano) Em %
nomista brasileiro Otaviano Canuto, foi anedótico . Teremos problemas em COMREFORMA
• • SEMREFORMA
diretor executivo no Banco Mundial, outras áreas e a população vai sentir
acompanha de perto as contas de vários isso': diz Nelson Marconi, professo r da
países latino-americanos e chega ao Escola de Economia de São Paulo da
mesmo diagnóstico: o problema não se Fundação Getulio Vargas (FGV-EESP).
resolverá com remendos orçamentários. O mecanismo do teto, que proíbe que o
Quanto mais cedo a reforma for feita, gasto avance em ritmo s11perior à infla-
melhor. Qua11to mais for adiada, mais ção do ano anterior, foi a primeira vitó-
prejudicará o cidadão. ria da equipe econômica chefiada pelo
O teto de gastos, que linlita o cresci- ministro da Fazenda, Henrique Meirel-
mento das despesas do governo, pode les. Mas, se a Previdência continuar a
. /
ser descumprido já em 20 19 se nada for ocupar mais espaço no orçame nto pu-

GASTO -_.
DESCONTROLADO
A PREVIDÊNCIA RESPONDE
POR MAIS DA METADEDA
DESPESADO GOVERNO-
.. 1 1 1 1 1 1 1 1
E O PERFIL DA POPULAÇAO 2018 21 24 2027

AINDA VAI ENVELHECER Fontes: ltaú Unibanco e Paulo Tafn er,


economista especialis ta em Previdê ncia

42 1 ÉPOCA 111d e d ezembr o de 20 17


ECONOMIA PREVISTA
Se for aprovada no formato atual , em
dez anos a reforma poupará R$ 542
BATENDO
bilhões aos cofres públicos
Em R$ bilhões
NO TETO
ECONOMIA
ANUAL• • ACUMULADO GASTOE DÍVIDA CRESCENTES RESSIONARÃO
550 542 O GOVERNO A CORTAREM OUTRASÁREAS,
PARACUMPRIRO LIMITE IMPOSTO
500
PELOTETO DE GASTOS. PERDEREMOS
450
EM SAÚDE, EDUCAÇÃOE SEGURANÇA
400

350

300
blico, sacrificará out ras áreas (a Pre- game nto de terceiri zados em in stitu i-
250 vidên cia b rasileir a é m u ito m ais ções de ensino superior e pa rcelam ento
custosa, em relação ao orçam ento de salári os de fun cion ári os púb licos. E
púb lico e ao PIB, qu e a de países com esse não será o úni co tipo de efeito a se
200
perfil demog ráfico semelhante). abate r sobre nós .
Os p rin cipais cortes deverão atin - Por causa do gasto p(1blico em d is-
150 gir investimentos, como em infr aes- pa rada, a cada m ês bate-se u m novo
112 tru t ur a, e áreas com ma is verba, reco rde de dívida p ú blica bra sile ir a.
100 com o saúde e educação . Quem de- Não há, no mo m ent o, nem expectat iva
pen de m ais de serviços pú blicos so- de colocá-l a sob con trole. To rn a-se
50
frerá m ais. "Voltará ao debate o fan - m ais fácil pe rcebe r o pe rigo n essa gas-
tas m a do shutdow n (paralisação)da ta nça se nos compa r arm os com algu -
m áquin a p úbl ica", diz Ma rconi. O m as out ras n ações que vêm ad mini s-
4
país pode sofrer o que já enfr entam trand o me lhor os n ú m eros .
2018 21 24 2027 estados supe rendividados, com o Rio Nossa dívida púb lica saltou de 63%
de Jan eiro e Rio Grande do Sul: co- do Pr od ut o Int ern o Bru to (PI B) em
Fontes: ltaú Unibanco e Paulo Tafner ,
econom ista espec ialista em Previdênci a lapso da segur an ça púb lica, não pa- m aio do an o passado, quan do o .,,.

,
DIVIDA
, EM BIFURCAÇÃO À FRENTE
O cenário econômico sem reformajá
se mostra bem pior a partir de 2018

NIVEL PERIGOSO Em %

COMREFORMA
ALÉM DE CRESCERRÁPIDO, A DÍVIDA 2018 2020
É ALTA E CHEGARÁA UM NÍVEL
, , DÍVIDA <0 -
BRUTA EI
DIFICIL DE ENCONTRARENTRE PAISES JUROBÁSICO 1111 1111
SUBDESENVOLVIDOSCOMOO BRASIL. O PAÍS
INFLAÇÃO Ili l!I
DESEMPREGO Ili Ili
SE COLOCARÁNUMA SITUAÇÃO VULNERÁVEL (1) Em% d o PIB

11de d ezem b ro de 20 17 1 ÉPOCA 143


ECONOMIA

presidente Michel Temer assumiu o car-


go interinamente, para 74% em outubro
ECONOMIA PERDIDA
Ao longo de 2017, a proposta do relator
Arthur Maia (PPS-BA) perdeu 34% de
PERIGO
deste ano, dado mais recente divulgado
pelo Banco Cent ral. Só economias de-
senvolvidas costumam administrar bem
seu potencial de contenção de gasto.
Eis o impacto de cada recuo em 2025 EXTERNO
Valores em % do PIB
dívidas acima desse nível. Afastamo-no s NUM CENÁRIO
muito da média da.s economias em de- • PROPOSTA
ORIGINAL
senvolvimento, de 48%, no cálculo do • PARECER
DORELATOR
GLOBALCALMO, O
Fundo Monetário Internacional (FMI), • PROPOSTA
ATUAL
e de vizinhos como México (53%), Co- BRASIL PODE OBTER
lômbia (49%) e Chi le (25%). Se o país
não conseguir reformar seu sistema de MEDIDA EMPRÉSTIMOS
aposentadorias e benefícios, esse indi-
cador deverá ultrapassar os 100 % do
Idade mínima + FACILMENTE. E
regra de transição 1,4 1,0 0,85
PIB em 2022. « (A dívida bruta em) OUANDOVIER A
100% do PIB, em um cenário de país 62 anos (mulher) e 66
emergente, nao- e a mesma coisa
/ .
que em
(homem) + pedágio de
PRÓXIMA CRISE?
30% para o tempo que
países que têm renda per capita muito falta para aposentar
elevada. A dívida não pode ir para 100%
porque não temos como sustentar': aler-
Va.lorda
tou o ministro do Planejamento, Dyogo aposentadoria o 0,1 0,1
Oliveira, na quinta-feira, dia 7. O que o
. . . -
mmistro tenta resu .mir, neste nao te-
((
60% da média dos um país. Em 2010, os economistas
.
mos como sustentar '', e o seguinte:/
o
salários com aumento
Carmen Reinhart e Kenneth Rogoff
escalonado até 40
governo brasileiro precisa tomar em- anos de contribuição avaliaram os efeitos de dívidas púb licas
préstimos o tempo todo. Se a dívida superiores a 60% e a 909tódo PIB. Atual-
explode, alguns emprestadores se afas- mente , o consenso entre os economistas
Previdência
tam e os que ficam passam a cobra r ju- rural 0,3 0,1 0,1 é que o nível da dívida importa menos
ros cad.a vez maiores. O governo deixa que sua trajetória. E a trajetória da dí-
de conseguir planejar seus gastos e in- Previa o fim da vida brasileira preocupa muito.
aposentadoria rural
vestimentos. Isso provoca um efeito em especial e reoneração
O aumento dessa dívida pressiona os
cadeia destruidor. Não que o tamanho de exportadores juros para cima - como no mercado em
da dívida , sozinho, defina o destino de geral, qu em está mais desesp erado por
dinheiro tem de se submeter a pagar ju-
Pensões
0,2 0,15 0,15 ros mais altos. Se a situação se agravar,
por morte . . / / / .
atmg1ra o pais num momento pessimo .
Proibição de acúmulo Na quarta-feira, dia 6, a taxa básica de
para novos entrantes
, acima de dois salários
juro s caiu pela décima vez seguida, para

-DUVIDA-- mínimos se manteve 7%, a menor desde 1986. Juros menores


incentivam o consumo, a produção e as
contratações. Trata -se de um catalisador
NO Benefício
de Prestação
Continuada (BPC)
0,1 0,05 o
/ .
,
.
necessario para uma econom ia que ape-
.
nas começa a crescer, apos a mais pro-

MERCADO Proposta original era


aumentar a idade de
acesso de 66
funda e longa recessão da história, entre
20 15 e 20 16. A desconfiança crescente se
para 68anos mo stra em número s. Em evento em São
O GOVERNO TERÁ Paulo, em novembro, o secretário de
Acompanhamento Econômico do Mi-
OE OFERECER Servidores
públicos 0,1 0,2 0,2 nist ério da Fazenda, Mansueto Almeida ,
disse que apesar de os juros futuros sina-
JUROS MAIS ALTOS, Equaliza regras com lizarem queda para abaixo de 7% no
o INSS, como a idade
SE FOR VISTO mínima e tempo de começo de 2018, a taxa em 2020 pode
contribuição mínimo ficar acima de 10%. O economista Paulo
COMO POTENCIAL Tafner, especialista em Previdência , pro-

CALOTEIRO
TOTAL 2,1 m
Fonte: ltaú Unibanco
jeta que, sem a reforma , em trê s anos os
juro s vão a 9,25% e a inflação a 4,5%-.,.

44 1 ÉPOCA 111de dezembro de 2017


ECONOMIA

o gasto público alimenta a alta de pre-


ços. "Não aprovar a reforma é tudo que
COMO AJUSTAR?
No curto prazo, reformar a
Previdência já representa mais de um
MENOS
não queremos, nem precisamos. Se sub-
metermos a economia a esse estresse, o
país dará sinal de que não tem compro-
quinto do ajuste das contas públicas.
No longo prazo, o efeito aumenta CONSUMO
misso de conter a trajetória crescente da
dívida sobre o PIB. Em reação, a ativi-
Contribu ição (em%) para
respe itar o teto de gasto em 2025 E EMPREGO
dade econôm ica arr efece': diz.
Para quem depende de salário, torna-
COMJUROSALTOSE
se mais difícil consumir e planejar o fu- MERCADO INSEGURO ,
turo com juros e inflação em alta. Para ..
quem produz, esse cenário dificulta in- OS CIDADAOSDEIXAM
vestir e cont ratar. Para o emprestador de
dinheiro a governos, o adiamento da DE COMPRARE
reforma para 2019 (quando assumi rá o
próximo presidente da República) le- CONTRATAR . FICA
vanta suspeitas sobre o futuro do Brasil.
O país se expõe a um possível novo re- DIFÍCIL CRIAR
baixamento da nota de crédito, como
admitiu na semana passada Moritz
EMPREGOS
Kraemer, chefe da área de avaliação de
governos na agência de classificação de
risco Standard & Poor's. Lembremos que
o debate atual ocorre num momento de
bonança global , com capital abundante forma ora proposta pelo governo Te-
e as maiores economias em situa ção mer. Ela foi alvo de críti cas de entidades
tranquila. Não convém nunca confiar na da sociedade civil, como a Ordem dos
permanência dessa situação. Advogados do Brasil ( OAB) e o De-
Podem-se questionar pontos da re- partamento Intersindical de Estatística
e Estudos Socioeconóm icos (D ieese).
Ninguém que faça as contas, porém, tem
19 como refutar a necessidade de mudar o
REAJUSTE ZERO PARA FUNCIONÁRIOS PÚBUOOS !O sistema de aposentadorias e benefícios.
Entre os apoiadores da reforma, pre-
U R O S E_____.
.___J valece a constatação de que aprová- la é
condição necessária, mas não suficien-
te a fim de preservar espaço para as
INFLA AO outras despesas e investimentos, assim
como estab ilizar a dívida pública. Sozi-
DEIXAM DESPESA
14
DISCRICIONÁRIA REAL CONSTANTE
nha, a reforma da Previdência represen-
ta menos de um quarto do esforço ne-

DE CAIR
..
cessário para o ajuste fiscal necessário,
levando-se em conta o teto de gastos.
Mostram-se muito relevantes outras
A PERCEPÇAODE 8 medidas, como manter o salário míni-
FIMDOABONOSAURW.
mo real constante (ou seja, sem ganho
RISCO ALTO DE acima da inflação, ao menos por en-
quanto) e não dar reajustes aos funcio-
CALOTEELEVA nários públicos. A situação é grave .
8 "Todos podemos ser afetados, com o
JUROS
,
. GASTO tdoRENOVAçjoDOSSUasbosDOPSIEFB risco de não pagamento de retornos
PUBLICO ELEVADO 5
financeiros e benefícios no futuro", diz
Tafner. É essencia l que o tema não esfrie
REFORMA DOSEGURO-DESEMPREGO
ALIMENTA A -e que, em 2018, candidatos que quei-
.. ram ser levados a sério expliqu em como
INFLAÇAO (1) Funcionár ios ativos. Prevê repos ição salarial
de 50% a partir de 2020 ajustarão as contas públicas. +
46 1 ÉPOCA 111d e d ezembr o d e 2 0 17
POLÍTICA

assados dez minutos do meio-

escu dia de 2 de dezembro, o minis-


tro Marco Aurélio, do Supremo
Trib11nal Federal (STF), decidiu: era
hora de livrar Andrea Neves, irmã do
uase senador tucano Aécio Neves, das pesa-
das amarras da prisão domiciliar e do
uso da tornozeleira eletrônica. Ela não
O Supremo Tribunal Federal era sequer o alvo inicial do pedido de
usa o desgaste da delação liberdade. Seus benefícios foram esten-
didos a ela pe lo ministro. Os advogados
da JBS para ignorar as de outros dois réus, Frederico Pacheco,
pro vas produzidas por ela o Fred, e Me11dherson Souza Lima, é
que entraram com recurso para suspen-
der as medidas restritivas impostas a

48 1 ÉPOCA 111de d ezem br o de 20 17


devidamente acompanhado pela Polícia jurídica era uma questão de tempo.
Federal, que vigiava a ação. Em maio) Que o diga o senador Aécio Neves.Ele
Andrea, Fred e Mendherson foram pre- foi um dos maiores implicados na dela-
sos em Belo Horizonte. Em junho, a ção. As provas são fortes. Além da trata-
Primeira Turma do Supremo aliviou. tiva dos R$ 2 milhões, toda gravada,
Substituiu as prisões preventivas por Joesley diz que pagou propina de R$ 60
domiciliares e acrescentou a proibição milhões em 2014 para Aécio, por meio
de deixar o país e o monitoramento por da emissão de notas fiscais frias a diver-
tornozeleira. Marco Aurélio, agora) sas empresas. O empresário acrescenta
afasta essas restrições. que comprou o apoio de partidos po-
A decisão do ministro é a mais recen- líticos para a candidatura de Aécio à
te e significativano lento desconstruir da Presidência. Em troca, Aécio usou o
delação da JBSe, consequentemente, das mandato para "beneficiar diretamente
investigaçõesmais fortes da LavaJato em interesses do grupo': ajudando na libe-
Brasília. Com ela, o caso de Aécio entra ração de créditos de mais de R$ 23 mi-
na chamada normalidade processualque, lhões de ICMS para empresas do grupo.
não raro, resulta em absolvições.Foi por Nada disso foi suficientepara o Supre-
esse mesmo carril que o presidente Mi- mo. A Primeira Turma afastarao senador
chel Temer escapuliu. Flagrado em con- do cargo e determinara seu recolhimento
versade conteúdo gravíssimocom Joesley noturno. O plenário da Corte, com voto
e, segundo a Procuradoria-Geral da Re- decisivo da presidente Cármen Lúcia,
pública (PGR), bene- decidiu que só os pró-
ficiário do dinheiro prios parlamentares
carregado na mala de poderiam julgar seus
rodinhas do ex-depu- ANTES DA pares. O Senado de-
tado Rodrigo Rocha TRAPALHADADOS volveuAécioao cargo.
Loures, Temer foi Era mais um implica-
acusado de obstrução IRMÃOS BATISTAE DE do na delação da JBS
da Justiça,
. . organiza- JANOT, O SUPREMO ERA que se livrava, apesar
ção crunmosa e cor- da gravidade das pro-
rupção passiva. Por
BEM MAIS RIGOROSO vas que a colabora-
duas vezes foi salvo NA LAVAJATO ção produziu.
pelos deputados fede- Sejapelos erros co-
rais, imersos em libe- metidos no processo
ração de emendas e promessas de cargos. de fechar o acordo, seja por qualquer ou-
Medidas como a de Marco Aurélio e tra razão,parte dos ministros do Supremo
outras tomadas no Supremo tornaram- está alterando seu entendimento sobre as
se possíveisgraças ao desgasteda delação investigaçõesda LavaJato.Políticose em-
da JBS e do então procurado r-geral da presários vinham sendo mantidos em
República, Rodrigo Janot. O episódio prisões cautelares. O ex-senador Gim
capital para desmoralizar a delação re- Argello, por exemplo, está preso desde
seus clientes. Fred é primo de Andrea sultou na entrega de uma nova gravação abril de 2016 - com aval do Supremo.
e Aécio - é aquele que o senador diz de Joesley)regada a uísque. Nela, o dela- Até a delação da JBS,o Supremo ia pro-
que "mata antes de fazer delação" na tor imbricava sexo e corrupção, cons- gredindo para um tipo de direito mais
gravação com Joesley Batista, da JBS. trangendo Janote jogando dúvida sobre voltado ao mérito e interessado nas evi-
Mendherson é o ex-assessor do senador a lisura do acordo de colaboração. Num dências de corrupção levantadas nos in-
Zezé Perrella, do PMDB mineiro. An- ato que se provou decisivo,Janot convo- quéritos. Lenta e discretamente, decisões
drea, Fred e Mendherson cumpriam cou uma coletiva e anunciou ao país judiciaisseguidasvão !asseandoesserigor.
prisão domiciliar, com tornozeleira, que os áudios apresentados pelos dela- E as investigaçõescom malas de dinheiro
porque foram denunciados na ação que tores punham a idoneidade de ministros e ações controladas, produzidas a partir
investiga Aécio e os R$ 2 milhões que do Supremo em dúvida e indicavam da delação da JBS,não têm resultado em
ele recebeu de Joesley. Em fevereiro, novos crimes cometidos pelos próprios nada. Isso não é pela fragilidadedas pro-
Andrea pediu a quantia para Joesley, delatores. De uma só vez, Janot destruía vas apresentadas pelos delatores. É, sim,
que repassou o dinheiro para Fred, por a credibilidade dos delatores e, portanto, uma falha no sistema,na condução sobre
indicação de Aécio. Fred, então, entre- das provas apresentadas por eles. Poli- como usar essasprovas.É o que preocupa
gou o dinheiro para Mendherson. Tudo ticamente, a delação morria. A morte agora e daqui para a frente. +
Foto: Ueslei Marce lino/ Reuters 11de de zembr o de 20 17 1 ÉPOCA 14 9
INTERNACIONAL

Guilherme Evelin

a sexta-feira,dia 1º de dezembro,
Michael T. Flynn, o general re-
formado do Exércitoamericano
que foi conselheiro de Segurança Nacio-
nal do governo Donald Trump por bre-
ves 25 dias entre janeiro e fevereirodeste
ano, compareceu a um tribunal federal
em Washington, a capital americana.
Ao entrar no tribunal, Flynn enverga-
va um elegante terno cinza e estava de
mãos dadas com a mulher. Ao final da
audiênciade 45 minutos, Flynn confessou
ter mentido ao FBI sobre contatos com
SergeyKislyak,o embaixadorda Rússiaem
Washington - um crime que, pela legis-
lação americana, pode custar uma pena
de até cinco anos de prisão. Na história
recente dos Estados Unidos, nenhum
outro presidente americano, com menos
de um ano de mandato, teve um assessor
tão próximo na Casa Branca e tão gra-
duado a se envolver num escândalo. O
maior embaraço que Flynn representa
para Tr11mp,porém, não está relacionado
ao que ele já confessou,mas ao que pode
revelar.Em troca da redução de sua pena,
Flynn firmou um acordo de colaboração
com a investigaçãoconduzida por Robert
Swan Mueller III, o procurador especial
que está esquadrinhando as suspeitas de
um conluio entre a campanha de Trump
e o governo da Rússia para interferir no
resultado da eleição americana de 2016.
Uma das mentiras confessadas por
Flynn ao FBI diz respeito a uma conversa Em Jerusalém, o presidente dos EUA arrisca o
com Kislyakem que ele,como integrante
da equipe de transição de Trump, pediu o
apoio da Rússia,no Conselhode Seguran- dos Estados Unidos, numa mudança de Netanyahu. Reconheceu oficialmente
ça das Nações Unidas, para barrar uma posição histórica do governo americano Jerusalém como a capital de Israel e en-
resolução de condenação à construção em relação aos aliados israelenses.A ges- cerrou uma política de 70 anos seguida
de assentamentos por Israel em territó- tão de Flynn junto aos russos,que atendia pelos Estados Unidos. Desde a aprovação
rio palestino.A medida era apoiada pelo a uma demanda do primeiro- ministro da criação do Estado de Israel pela ONU,
governo de BarackObama, que estavano israelenseBenjaminNetanyahu a Trump, em 1947, os americanos vinham se recu-
seu final. Em 23 de dezembro de 2016, o fracassou.Na quarta-feira, dia 6, Trump sando a reconhecer Jerusalém como sua
Conselho de Segurançaaprovou a resolu- tomou uma decisão simbólica,mas mais capital - uma política seguida por prati-
ção - com o apoio da Rússiae a abstenção eficaz para atender aos interesses de camente todos os países do mundo.

50 1 ÉPOCA 111de de zembro d e 20 17


DEIXOU O MURO
Bandeiras de
Israel e dos EUA
nas muralhas da
Cidade Velha de
Jerusalém. Trump
atendeu seus
amigos israelenses

página 52). Por ser um assunto tão espi-


nhoso, o Acordo de Oslo, de 1993, ainda
a principal bússola para um acordo de
paz entre israelenses e palestinos com a
criação de dois Estados para cada povo,
deixou o status de Jerusalém de lado e
estipulou que ele deveria ser resolvido
num tratado à parte.
Aplaudida por Netanyahu e rechaçada
publicamente por quase todos os outros
líderesmundiais, do papa Franciscoao rei
da Arábia Saudita, Salman bin Abdula-
ziz al Saud, a decisão de Trump pode ter
A • • • / •
consequenc1as1mpreV1s1ve1s- como uma
nova onda de violência na região mais
conflagrada do planeta. Mas as conside-
rações de Trump, ao tomar a iniciativa,
foram sobretudo domésticas- e estão re-
lacionadas às investigaçõescom as quais
seu ex-conselheirode SegurançaNacional
passou a colaborar. Na aflitiva situação
em que se encontra, sob o cerco cada vez
mais próximo de Mueller,Trump precisa
reforçar sua base política - e foi isso que
ele fezao reconhecer Jerusalém como ca-
pital de Israel e anunciar a transferência
para a cidade da embaixada dos Estados
Unidos, hoje localizada em Tel Aviv.
A medida foi uma das promessas de
campanha de Trump - e é defendida
especialmente pelos cristãos evangéli-
cos que o apoiaram em massa na eleição
presidencial no ano passado.
Além dos evangélicos,Trump procu-
rou agradar a um eleitor em especial:
futuro do Oriente Médio, de olho na própria pele o bilionáriojudeu SheldonAdelson,dono
de cassinosem LasVegas,figura próxima
a Netanyahu e um dos mais fervorosos
O status de Jerusalémé um dos aspec- Israel- e de partes da Cisjordânia, tam- lobistas das causas de Israel nos Estados
tos mais divisivosdo centenário conflito bém tomada pelos israelenses em 1967 Unidos. Doador tradicional do Partido
entre israelenses e palestinos. Enquanto -é considerada ilegalpelas regras do di- Republicano, Adelson deu US$ 20 mi-
Israel proclama que Jerusalém é sua "ca- reito internacional. Além disso, a cidade lhões para a campanha presidencial de
pital eterna e indivisível",os palestinos é um potente símbolo religioso para bi- Tr1unp- e mais US$ 5 milhões para a or-
consideram que a parte oriental da ci- lhões de pessoas em todo o mundo. As ganização de sua cerimônia de posse na
dade, ocupada por Israel desde a Guerra muralhas da Cidade Velhade Jerusalém CasaBrancaem janeiro. Segundo o jornal
dos Seis Dias, em 1967, é a capital de seu guardam locais sagrados para cristãos, The New York Times, na véspera de seu
futuro estado. A anexação da cidade por muçulmanos e judeus (leia o gráficona anúncio, Trump fez duas conferências..,.

Foto: Ronen Zvulun/Reuter s 11de dezemb ro de 20 17 1 ÉPOCA t 5 1


INTERNACIONAL

UM LITÍGIO HISTÓRICO
Sagrada para judeus, cristãos e muçulmanos, Jerusalém está no centro do conflito entre israelenses e palestinos

1 9 4 7 19 4 8 19 6 7 2000
A ONU propõe partilha Israel entra em guerra com Após nova vitória militar sobre os Após uma visita do líder israelense
do território da Palestina os países árabes e integra a árabes, os israelenses conquistam Ariel Sharon à Esplanada das
entre árabes e judeus, com parte oriental de Jerusalém Jerusalém Oriental da Jordânia e Mesquitas , na Cidade Velha,
a criação de dois Estados . a seu território. A parte ganham acesso à Cidade Velha vista como provocação pelos
Jerusalém permaneceria sob ocidental, inclusive a Cidade Jerusalém vira símbolo de um palestinos , estoura a segunda
controle internacional. Na foto, Velha , é ocupada pela nacionalismo religioso para os intifada , que dura cinco anos .
patrulha da polícia no bairro Jordânia. Na foto, destroços judeus. Na foto , um muro entre os Na foto, palestinos jogam
comercial de Jerusalém de prédios em bairro judeu lados leste e oeste de Jerusalém calçados na polícia israelense

TERRA EM DISPUTA A CIDADE VELHA concent ra lugares sagrados pa ra três


Pelo Acordo de Oslo de 1993, Israel religiões. Para os cr istãos, a Basílica do Santo Sepulc ro é o
• local da crucificação e ressurreição de Jesus. O Muro das
cedeu à Autoridade Palestina o
La1nentações é o último vestíg io do
controle da Cisjordânia. Neste Segundo Templ o Juda ico.
território, há, porém, mais de 150 ••, •
~

• i Os muçu lmanos ac reditam


I
assentamentos, onde moram 520
mil colonos israelenses
.• - ,

que Maomé subiu aos
céus a part ir da
Cúpula da ~h a

- Linha verde (após o armlstlci de 1949)


- Perímetro do município de JtH"Usalém •
- Muro de separação Já con ruido
' '

••• Muro em construção ou e bargado ..•• CÚPULA


DA ROCHA
o Área sob controle de 1s7 e1 •

o
Assentamento Judaic o/
Área sob controle d Autoridade Palestina
O Área urbana palesti a
• Bases militares ISRAEL
O Posto de cont lede fronteira Bairro cristão e
e Postodeco .-·· Bairro muçulmano O
. ~/
-. Bairro judeu •
e Bairro armênio e
•• .F..

telefônicas com líderes religiosos evan- Abbas, qualificou a decisão de "deplorá- israelensesnos mesmos moldes das que
gélicos e judeus para explicar a medida. vel" e fez questão de frisar que "Jerusa- ocorreram entre 1987 e 1993 e entre 2000
Uma das conferências foi encerrada com lém é a etern a capital da Palestina': ls- e 2005, inclusive com atentados suicidas.
oraçõesde um pastor e de um rabino com mail Radouane, líder do grupo Hamas, A conclamação de Radouane foi respon-
agradecimentos a Deus e a Trump. que co11trola a Faixa de Gaza e se opõe dida na quinta-feira, dia 7, com protestos
Se agradou a sua base de eleitores pró- radicalmente a Israel, disse que Trump na Cisjordânia e na Faixa de Gaza, que
Israel, o anúncio de Trump frustrou e "abriu as portas do inferno para os inte- deixaram, pelo menos, 100 feridos.
enraiveceu os palestinos. Voz moderada resses americanos na região': O Hamas O espectro de uma espiral de violên-
em relação aos israelenses, o presiden- convocou os palestinos para uma nova cia é alimentado pelo aspecto sagrado
te da Autoridade Palestina, Mahmoud intifada, uma revolta com ataques aos devotado a Jerusalém por 1,6 milhão..,.

52 1 ÉPOCA 111d e dez em bro de 2017


INTERNACIONAL

LONGO
ALCANCE
de muçulmanos em todo o mundo Trumpno presidente americano reiterou também
- inferior em termos de importância anúncio de seu empenho em relançar um processo
Jerusalém
religiosa para os seguidores do islamis- de paz entre os dois lados, que está sendo
como capital
mo apenas a Meca e Medina, na Arábia de Israel. O fim desenhado por seu genro,Jared Kushner.
Saudita. "É previsível que o reconhe- de uma política É difícilacreditar,porém, que os Estados
cimento unilateral de Jerusalém como de70anos Unidos consigam conservar a posição de
capital de Israel provoque ataques con- mediador do conflito depois que tomou
tra os Estados Unidos da parte de mu- partido tão claramente em favor de um
çulmanos enraivecidos': diz Juan Cole, dos lados. "Uma das consequências do
professor da Universidade de Michigan, Estados Unidos sob o comando de um anúncio de Trump é o fim do papel dos
nos Estados Unidos, especializado em presidente firmemente anti-Irã, como Estados Unidos como único país com
história e religião do Oriente Médio. Trump."O conflito entre israelensese pa- credenciaispara mediar o conflito entre
"Uma das motivações para os ataques lestinos deixou o palco central do Oriente isra.elenses e palestinos': diz Gelvin."Re-
de Osama bin Laden e da al-Qaeda aos Médio.A rivalidade entre Arábia Saudita presenta também um ataque mortal ao
Estados Unidos foi a ocupação por Israel e Irã é agora o conflito central - e poucos Acordo de Oslo, único caminho para a
de partes muçulmanas de Jerusalém. Estados árabes que se alinham aos sau- solução dos dois Estados, à Autoridade
Pelo menos para boa parte dos gover- ditas vão se arriscar a enfraquecer suas Palestina,cuja única razão de ser é a nego-
nos árabes,a questão da Palestinadeixou, posições, alienando os Estados Unidos e ciaçãodessasolução,e aos israelensesmo-
porém, de ser tão incendiária, como era Israel': diz James L. Gelvin, professor de derados. Também representa uma vitória
no passado. Os líderes de países sunitas história moderna do Oriente Médio na clara da direita israelense:'Ao reconhecer
importantes, como Arábia Saudita, Egito Universidadeda Califórnia e autor do li- Jerusalém como capital de Israel,Trump
e Emirados Árabes Unidos, estão mais vro IsraelX Palestina- 100anosde guerra. mirou em seu público interno, mas pode
preocupadoscom a própria sobrevivência Em seu anúncio, Trump disse que os ter acertado um tiro fatalno sonho de um
e em bloquear o aumento da influência Estados Unidos continuam a defender a Estado nacional próprio dos palestinos,
do Irã xiita na região do que com o des- solução de dois Estados e não afastou a cada vez mais distante. +
tino dos palestinos. Em seu próprio in- possibilidade de uma Jerusalém dividi-
teresse,preferem se alinhar a Israel e aos da como capital por Israel e Palestina.O Com Flávia Yuri Oshima

54 1 ÉPOCA 111de d ezem bro de 20 17 Foto: Saul Loeb/AFP


CULTURA

A a t ribulada
viagem de o s
Carlos Eduardo
Pereira rumo
a seu po t en t e
romance de
es t reia, que
fala de suas
CAMINHOS
• A •

exper1enc1as

pessoais

e discu t e
problemas

D E U M urgen t es sem
sacrificar a
. .
1mag1naçao
-

ESCRITOR
CULTURA

co artificial. Não havia nada de meu ali':


diz. Esse segundo romance é Enquanto
osdentes(Todavia, 96 páginas, R$ 39,90),
que aportou nas livrarias em novembro.
Enquanto os dentesacompanha o tra-
jeto de Antônio, um homem perto dos
40 anos, cadeirante, que, por motivos
nunca esclarecidos pelo narrador, pre-
cisa voltar para a casa dos pais debaixo
de uma chuva intermitente. Antônio
desocupa seu apartamento num bairro
de classe média do Rio de Janeiro e, de
metrô, vai até a estação da Praça XV de
Novembro, no centro da cidade, de onde
zarpam barcas para as ilhas de Paquetá e
do Governador e para alguns municípios
Ruan de Sousa Gabriel
do litoral fluminense. Depois do passeio
arlos Eduardo Pereira beirava de barca, ele ainda toma um ônibus e
os 40 anos quando descobriu roda por algumas ruas antes de che-
que gostava de escrever. Em gar à casa dos pais. Desde que saiu de
2011, ele começou a publicar RUA casa, há uns 20 anos, Antônio não tem
cenas cotidianas num blog. muito contato com eles. A mãe é uma
No ano seguinte, matriculou-se no cur- "Na rua, as pessoas dona de casa calada e submissa que reza
so de letras da Pontifícia Universidade nos intervalos do trabalho doméstico.
Católica do Rio de Janeiro (PUC-RJ) , que vivem olhando O pai é da Marinha, um militar gros-
oferece oficinas de formação de escrito- seiro e autoritário que obriga mulher e
res coordenadas pelo poeta e tradutor para Antônio. E filho a chamá-lo de "Comandante". Pai
Paulo Henriques Britto. Pereira passou , e filho romperam quando Antônio de-
a rodar a cidade à procura de oficinas de ele sorri. E de se sistiu da carreira militar. Como costu-
escrita criativa. A primeira delas foi com ma acontecer na literatura, a viagem de
o jornalista . e escritor Arnaldo Bloch. imaginar o que elas Antônio de volta à casa dos pais não é
Depois de escrever alguns contos e crôni- apenas um deslocamento geográfico - é
pensam ao cruzar
cas, resolveu que era hora de se aventurar também uma viagem interior. Antônio
numa narrativa mais longa e começou com um cadeirante percorre a cida.de e, ao mesmo tempo,
a frequentar uma oficina oferecida pela vaga pelos becos e ladeiras da memória ,
escritora Carola Saavedra que indica os desacompanhado. a recordar a difícil relação com o pai , os
caminhos para a tessitura de um roman- anos de aprendizado no Colégio Naval e
ce. "Toda semana eu escrevia no máximo Tem gente que a tentativa de desfrutar alguma liberdade
dez páginas e entregava para ela, que me depois de homem feito.
devolvia na semana seguinte com co- basta topar com A narração pujante de Enquanto os
mentários muito meticulosos. Era óti- dentesimpressionou alguns leitores bem
mo, porque me estimulava a escrever': um infeliz numa antes da publicação. Pereira trabalhou
disse Pereira em entrevista a ÉPOCA. o romance em outros cursos de escri-
cadeira de rodas
"Debaixo do guarda-chuva da Carola': ta criativa, coordenados por escritores
como ele diz, Pereira começou a escrever que logo se oferece tarimbados, como Paulo Scott, Rubens
um romance. Quando colocou o ponto Figueiredo e Adriana Lisboa. «o Carlos
final no livro, descartou-o, determinado para prestar algum se destacou porque ele tem voz própria
a escrever outro, diferente. <'Aquele ro- e é capaz de compor grandes persona-
mance ficou legal, bacana, mas um pou- tipo de ajuda." gens': diz Scott. «Ele enfrenta riscos reais

58 1ÉPOCA 111de dezembro de 20 17 Ilustrações: Espaço Ilusório


ESTAÇÃO
DAS
BARCAS
"Os dois marujos
no romance e consegue transpô-los de ra e ofereceu o romance para a Todavia.
maneira franca. Não é aquela literatura articulam um "Para mim, foi um prazer enorme o con-
que enche a narrativa de veneno e ofere- tato com o Carlos, foi uma relação que já
ce um ai1tídoto 110final. Ele não dá um movimento começou boa, muito simpática:' Pereira é
desfecho que apazigua o leitor - e, para realmente simpático. ÉPOCA conversou
coordenado, um
mim, essa é a grande literatura no Bra- com ele numa sexta-feira de novembro.
sil hoje." Pereira também participou de deles empurrando Naquela manhã, ele participara, com
oficinascomandadas por Adriana Lisboa, outros escritores latino-americanos, de
que vivenos Estados Unidos, mas dá au- por trás, empinando um debate sobre a solidão da literatura
las virtuais, em tempo real, a escritores negra no continente na Sª Festa do Co-
aprendizes espalhadospelo mundo. "Não a cadeira de nhecimento, Literatura e Cultura Negra,
posso dizer que a oficina fez muita dife- a FlinkSampa."Cara, é curioso isso: você
rença para o Carlos, porque ele chegou Antônio, e o outro fica muito tempo escrevendo, na frente
com o romance praticamente pronto. Ele do computador vendo letrinhas. Aí, de
já apareceu como um escritor arremata- indo de costas meio repente, aquilo vira um livro concreto. É
do", afirma Adriana. "Nesse romance e muita novidade para mim!", diz Pereira,
abaixado, puxando
nos contos dele, existe um amargor que com seu caloroso sotaque fluminense.
nunca cai na autocomplacência, mas é a cadeira pela Ele nasceu em Nova Friburgo, na região
tratado com ironia. O leitor fica nesse lu- serrana do Rio de Janeiro, em 1973. Filho
gar ambíguo, entre a ironia e o amargor. frente. Terminada a de um trabalhador da construção civil e
Ele consegue manter o texto tenso até o de uma dona de casa, ele cursou história
fim. Poucos autores conseguem ter tanto faina, eles encaixam na UniversidadeFederaldo Rio de Janeiro
controle sobre o próprio texto:' (UFRJ),deu aula em cursinhos pré-vesti-
Adriana fez duas leituras de Enquanto Antônio no local bular e foi técnico de atividade judiciária.
os dentes,algumas sugestões aqui e ali e , . . A carpintaria narrativa de Enquanto
recomendou entusiasmada o romance propr10 para isso, os dentesjustifica os elogios que Pereira
para a agente literária Lucia Riff. Pereira recebeu quando o livro ai11daera inédi-
ajeitam seus
e Lucia trocaram alguns e-mails e ele en- to. O narrador é vigoroso, mas discreto.
viou o manuscrito. "Eu fiquei louca com gorrinhos, prestam Conhece cada detalhe da trajetória de
o livro! Li numa sentada. É um dessesli- Antônio. Descreve em minúcias a cadei-
vros que ficam com a gente,que marcam'~ orgulhosos uma ra de rodas importada da Alemanha, o
diz Lucia, que passou a representar Perei- freio de burro da adolescência e o cin-
quase continência turão de couro, apelidado de Madalena,
usado pelo Comandante para surrar o
e passam o filho. Mas é um narrador respeitoso: não

expõe os sentimentos de Antônio nem
serviço para outro conta nada ao leitor que o circunspecto
protagonista não diria. As descrições es-
funcionário ... " crupulosas conferem ritmo à narrativa,
que segue tensa, como se algo estivesse
prestes a ser revelado - mas nunca é. O
narrador vai confessando o que sabe aos
poucos. Só na página 39 diz que Antônio
é negro: "Antônio, tecnicame11te,é mu-
lato, já que o Comandante é branco e a
.-- - -t'"Imãe é preta". Há insinuações da homos-
sexualidade de Antônio aqui e ali, mas a
revelaçãosó vem na página 49, com uma
descrição discreta de um encontro ..,.

11de de zembro de 20 17 1 ÉPOCA 159


CULTURA

ÔNIBUS

"As pessoas no ônibus

( ... ) esticam o pescoço

para enxergar melhor o


sexual - o narrador vai do sexo para a de Pereira ainda não está fechado, mas
descrição dos quadros que enfeitam a procedimento. Alguns suspeita-se que seja neuromielite ópti-
parede do apartamento. Sempre que a ca, uma doença degenerativa em que o
sugerem suspender
narrativa alcança um ponto de tensão, sistema imunológico do paciente ataca
há um corte e começa uma descrição. O Antônio no braço para os nervos ópticos e a medula espinhal.
narrador também desconstrói o tempo: Antônio, de Enquanto os dentes, foi tes-
o presente parece comportar o passado e ser mais rápido, outros tado positivo para neuromielite óptica
não há muita perspectiva de futuro. Es- depois de um acidente de carro que
ses recursos mantêm o leitor num lugar acham que assim vai acelerou o avanço da doença.
de per1nanente angústia, tentando unir escorregar. Depois de A literatura e a cadeira de rodas entra-
as pontas que a narrativa deixa soltas. ram quase juntas na vida de Pereira. Por
O leitor também é colocado numa ca- uma pancada e dois sugestão da mulher, Gloria, ele fundou
deira de rodas e sente o mundo como o blog Acessível para manter a família
um cadeirante: a dificuldade de encon- chutes, o equipamento e os amigos informados de seu estado.
trar banheiros adaptados, os apuros do Quando voltou a passear pela cidade, co-
transporte público e das calçadas plane- começa a se mover, meçou a escrever sobre as dificuldades
jadas para bípedes, o olhar supostamente , . de locomoção de um cadeirante no Rio.
soque para c,ma, o
solícito dos pedestres. Daí para a ficção foram alguns meses
Pereira é cadeirante. No Domingo que parece estranho. e algumas oficinas. Pereira não queria
de Páscoa de 2010, ele acordou com ficcionalizar sua experiência pessoal.
formigamento nos pés. No dia seguin- O motorista aperta "Quando escrevi aquele primeiro ro-
te, a dormência atingiu os tornozelos e mance na oficina da Carola, eu imagi-
continuou subindo pelo corpo. Uma se- outro botão, e aí sim nava que a ficção tinha de ser o mais
mana depois, ele caminhava com muita afastado possível da minha experiência
a plataforma vai para
dificuldade, amparado pela mulher ou pessoal, que ficção tinha de ser ficção
escorando nos corredores. Perdeu os baixo e os degraus mesmo': diz. "Depois, percebi que isso
movimentos e a sensibilidade dos mem- era bobagem. Larguei aquela versão e
bros inferiores até o abdômen. Passou são recolhidos. escrevi Enquanto os dentes."
47 dias num centro de terapia intensiva Nos últimos tempos, a relação entre
( CTI) recebendo tratamento à base de Antônio se ajeita na literatura e experiência tem provocado
corticoide, medicamento que deprime debates calorosos no mundo literário:
almofada, se posiciona
o sistema imunológico. O diagnóstico quem pode escrever sobre a experiência
no local indicado nas de quem? Há os que afirmam que cada
u.m só pode escrever de seu lugar de fala,
instruções, que dizem ou seja: autores brancos ou privilegiados
devem se abster de escrever sobre ex-
que é para entrar de periências de minorias raciais e sexuais,
não devem se apropriar de suashistórias
ré, freia a cadeira,
e culturas. Por um lado, a defesa do lugar
sorri, dando a entender de fala pretende democratizar o mercado
editorial para que as minorias possam
que agradece e pede publicar suas histórias - o que, hoje, não
é fácil. Por outro, a radicalização desse
desculpas por tomar discurso pode levar ao rebaixamento
da estética em nome de uma literatu-
o tempo alheio, se
ra cujo valor reside no cumprimento
segura como pode e o de um programa político-literário. Um
exemplo foi o terrível realismo socialis-
ônibus arranca dali." ta, que equivalia qualidade literária à ..,.

60 1 ÉPOCA 111de dez embr o de 20 17 Ilustração : Espaço Ilusório


CULTURA

representação simbólica da emanc ipa- debates urgentes sem sacrificá-los em avô Otávio, ma s cresceu ouvindo suas
ção da classe trabalhadora. A exigência nome da correção política. O roman - histórias. Otávio era ferroviário e agi-
que um autor se limite a escrever sobre ce discute deficiência física, racismo e tador cultural . Numa zona boêmia de
experiências que ele conhece ignora que homofobia e não subjuga a literatura Nova Friburgo, ele fundou o Grito da
a matéria-prima da literatura é a imagi- a esses debates. A potência narrativa Mocidade, uma mistura de bar e club e
nação, que nos permite habitar mundos transforma as experiências de um per- social onde aconteciam bailes e apresen-
e corpos diferentes dos nossos. sona gem singu lar em dilemas univer- tações teatrais que ele próprio idealizava.
Pereira subverte essa discussão ao es- sais - o peso do passado, as escaramuças Branco era proibido de botar o pé ali.
crever sobre experiências que são suas - com o pai, o preço da lib erdade. "Não conheci meu avô. Para mim, ele
os desafios de um homem negro, de um Pereira já pensa no segundo livro. Ele é uma foto na sala da minha avó, que
cadeirante- e experiências que não são pretende resgatar a história de seu avô e tem 95 anos. Eu vou buscar as versões
suas - a homossexualidade. Um livro discutir o racismo no interior de uma da minha família para a história dele,
com um protagonista cade irant e, negro família negra. Pereira não conheceu seu o que eu ouvi da minha avó, dos meus
e gay pode suscitar leituras primos. Eu tenho a minha
demasiado políticas, capa- versão, de garoto. Mas talvez
zes de cobrir a literatura A capa de Enquanto os - pesquise
eu nao . tanto assim. ",
com as tintas de um ma- dentes (Editora Todavia). diz Pereira, num discurso que
nifesto. Enquanto os dentes Uma narrativa pujante que mostra como ele é capaz de
dribla leituras enviesadas combinar a experiência com
deixa o leitor num lugar
ao se equilibrar numa po- uma defesa da ficção e da
sição virtuosa: incorpora de permanente angústia liberdade de inventar. +
62 1 ÉPOCA 1 11de dezembro de 20 17 Foto : Andre Arruda/ ÉPOCA
PUB LIE DIT O RIA L

Auditório do Memorial da América Latina reinaugura com show


histórico de divas brasileiras em homenagem a Elza Soares
U1n dos palcos mais lege11dários do País, o aprendeu carregando latas d'água na cabeça
Auditório Silnón Bolívar, do l\'1emorial da Alné- e1n sua infâ11cia 1niserável - e que Baby,
rica Latina, está de volta. Totahnente recupe- n1eniI1a rica, aprenderia ouvindo Elza no
rado após o incêndio que o tirou do ar em 2013, rádio . Sandra de Sá foi escalada pelo cario-
o espaço projetado há 30 anos por Oscar Nie- quês carregado co1n orgu lho, pela e1nissão
1neyer, e onde já se aprese11taran1 estrelas da avassaladora de sua voz e pela militância
grai1deza de Tom Jobim a Mercedes Sosa, teve (Elza é uma das maiores bandeiras da cha-
até a fabulosa tapeçaria de Tomie Ohtake refeita 1nada Música Preta Brasileira) . Paula Lima
- e pleitea11doseu lugar 110Gui11nessBook como veio tanto pela ginga na MPB quanto pela
a 1naior já produzida 11al1istória. "São Paulo exuberância da image1n. Rosana faz 1natch
ganha tun 11ovoespaço multiuso mais 1noderno com Elza pelo apelo pop e ta1nbém pelo seu
e equipado com todos os recursos de co11forto, lado B: um estilo jazzístico de improvisar
segurança e acessibilidade", afir1na o presidente com forte influência norte-a 1nericana, à
da Fundação, Irineu Ferraz. E completa : "O obje- 1noda de Aretl1a Fra 11klin . Vâ11ia Bastos,
tivo é conte1nplar orqt1estras, óperas, teatros, pelo apego ao samba de raiz e interpretação
balés, grai1des espetáculos e semiI1ários". dos grandes mestres do passado . Da nova
Para sua primeira apresentação aberta ao geração, alén1 da va11guarda artística que
público, a mo 11umental casa de espetáculos, trazem em seu DNA, Liniker e As Bahias eA
um dos cartões-postais da cidade, ganhou um Cozinha Mineira falam sobre a diversidade,
concerto sob medida . Com apresentação de te 1na co11stante 110 cru1to-protesto de Elza,
Vera Fiscl1er, o espetáculo "Jazz & Divas - U1na que promete ttm momento t111icocom todo
l1omenage 1n a Elza Soares" reúne a fantástica o elenco", adia11ta Allex Colontonio, diretor
Orquestra Jazz SiI1fônica com um escopo plu- de atividades cultttrais da Fundação Memo-
ral de cantoras brasileiras absolutame 11te con- rial e idealizador do show . Com única apre-
sagradas, de diferentes tribos e estilos, como sentação, o concerto acontece no sábado, dia
bandeira do ecletismo da l101nenageada 16/12/2017, às 21h. Os ingressos estão dis-
"Baby do Brasil representa os scat sh1gi11gs, po11íveis no site www .totalplayer .com .br e
i1nprovisações onomatopeicas que Elza 11a bilheteria do Me1norial.
HELIO GUROVITZ

., .,
s1n __ro erusa e
e a cura ......,ara
o anatis
erusalém é a única cidade que originou um transtor- O principal obstáculo à paz, diz Oz, é o fanatismo, uma
no psiquiátrico, a síndrome de Jerusalém. Visitantes versão expandida e mortal da síndrome de Jerusalém. Não
são tomados por um instinto pregador, abandonam casa é, constata no primeiro ensaio, um problema restrito à re-
e família, perambulam por lá à cata de fiéis. Um toca lira gião. São fanáticos terroristas da al-Q aeda e do Estado Islâ-
entoando os salmos do rei Davi, outro anuncia as trombe- mico, do Ham as e do Hezbollah, neonazistas e antissemitas,
tas do Apoca lip se, um terceiro se julga o messias redentor. racistas e islamófobos, a Ku Klux Klan e os grupo s judaicos
Os casos em geral são inof ensivos, até cômicos. Por vezes, que aterrorizam palestinos - "todos os que derramam san-
o fascínio religioso que emana das pedras esbranquiçadas gue alheio em nome de suas crenças". Também, em menor
traz consequências mais graves. "As pessoas respiram o ar grau, antitabagistas, vegetarianos, ambientalistas, feminis-
da montanha 'límpi do como o vinho', se levantam e vão tas, antiglobalistas e mesmo seus colegas pacifistas. "Não
atear fogo numa mesquita, explodir uma igreja ou profanar é o volum e de sua voz que o definirá como um fanático,
uma sinagoga, 'varrer o mal do mundo"', escreve o israe- mas principalmente sua tolerância ou a falta dela com vozes
lense Amós Oz em "Caro fanático", o primeiro discordantes", diz. "Todos os fanáticos vivem num
dos três ensaios da coletânea Mais de uma luz. mundo em preto e branco. Num faroeste simplista
Além de um dos maiores romancistas vivos, de mocinhos contra bandidos. O fanático é um
Oz é conhecido ( e atacado em sua terra) pe la homem que só sabe contar até 1. Prefere 'sentir'
militância em prol do Estado palestino. "A briga -·- lll1 a pensar." Fanáticos religiosos e id eológicos são
entre nós e os palestinos não cabe num filme de violentos não só por abominar "o Ocidente, mu-
faroeste de Hollywood com mocinhos e ban- çulm anos, esquerdistas, sionistas, LGBTs" ou seja
didos. É a tragédia da justiça contra a justiça", lá quem for. "São sanguinários sobretudo porque
diz. "Com frequência, infelizmente, injustiça querem salvar o mundo, levar todos nós para o
contra injustiça." Ele compara o conflito a uma cam inho do bem." Nunca entr am em debate. Se
LIVRO DA SEMANA
ferida cheia de pus: "Não faz sentido brandir algo é ruim , o dever é elimin ar.
novamente um pedaço de pau e bater numa fe- Mais de uma luz Oz conta que, quando crian ça, também era um
AmósOz
rida que sangra para que se assuste, deixe de ser "peque110 fanático sionista-nacionalista, dono da
uma ferida e enfim pare de sangrar". Nada disso Companhia das Letras verdade, entusiasta e doutrinado", surdo a qualquer
2017
foi escrito tendo em mente a transferência da 136 pág inas
argumento que desafiasse a narrativa do nascente
embaixada dos Estados Unidos para Jerusalém, R$35 Estado de Israel. Conc lui q11eo fanático é, antes de
anunciad .a na semana passada pelo presidente tudo, alguém que não saiu desse estado infantil.
Donald Trump. Mas poderia ter sido. "Querem com todas as forças que voltemos todos
Por mais que fronteiras, soberania e símbo los co1no em- a ser crianças pequenas e mimadas, suscetíveis à sedução",
baixadas sejam relevantes, não é a diplomacia que preocupa diz. "Nas eleições, círcu los cada vez mais amp los votam em
Oz. "Religiosos e seculares, esquerda e direita, chafurdam quem os emociona ou diverte, em quem dá uma banana
na questão de por onde passarão as fronteiras e qual ban - para as regras convencion ais." O apelo à emoção gera um
deira tremulará sobre os lugares sagrados", diz ele. Mas os ódio cego entre inimigos estridentes, cujas atitudes são
lugares continuarão sagrados "com ou sem bandeira". "O id ênticas. A receita de Oz contra o fanatismo envo lve três
que haverá dentro das fronteiras é mais importante que seu in gredientes: criatividade, ima ginação e humor. "O humor
traçado." Oz defende a democracia contra o fundamenta- permite enxergar, por um instante, coisas já conhecidas sob
lismo religioso - e a divisão do território em dois estados, uma luz nova. Ou ver a si mesmo como os outros o veem."
como nas malogradas tentativas de paz. "Não há outra saída É preciso perceber que certos confrontos n ão podem ser
senão dividir esta casa pequenina em duas ainda menores." definidos em preto e branco e que "a discórdia não é uma
Tal meta tem desafiado sucessivos negociadores. Governos tragédia". "Com uma condição determinante: que o deba-
israelenses parecem preferir gerenciar um "conflito inso- te ocorra sem violência. Controvérsia sem perseguições."
lúvel". Em vão. "Vencer as guerras, não podemos, simp les- Conse lho que se ap lica não só ao Oriente Médio. +
mente porque não temos objetivos nacionais consensuais
atingíveis pe la força militar. Para mim , gerenciar o conflito Hello Gurovitz é j orna lista hgurovitz@edglobo.com.br (e-ma il)
só levará a agruras e mais agruras, derrotas e mais derrotas." @gurovitz (Twitte r) http://g1.globo.com/mundo/blog/helio-gurovitz/ (web)

11de dezembro de 2017 1 ÉPOCA 169


SAÚDE
Governos locais tentam restringir as visitas

de representantes da indústria farmacêutica

a médicos da rede pública

N
- e a indústria reage.

Um

essa relaçã0
SAÚDE

avia pouco m ais de um


ano que o recifense Ro -
drigo Lima terminar a o
curso de medicina. Aten-
dia na pequena Gravatá, a
80 quilôm et ro s do Reci-
fe, e adotara a prática de
distribuir receitas de um
m ed icam ento. Era uma
droga contra tosse - um
incômodo, ma s que pode
denunciar um problema
a ser tratado ou ajudar a expe lir secre-
ções de que o corpo precisa se livrar. Em
mui tos casos, o ideal é deixá-la seguir seu
cu rso. Mas vário s pacientes de Lim a não
contavam com essa opção. Ele ganh ar a
amost r as do medicamento de um repre-
sentant e de vendas de uma empresa que
acaba ra de lan çar a droga. Co mo eram
gratuitas , achou por bem distribuí-las.
Depois que as amo stras acaba r am, pas-
sou a receitar. "Os pacientes gosta ram
e, m eio no modo automático, passei a
receitar para gent e que, talvez, nem pre-
cisasse", diz. Lima era m édi co de um a
11nidade pública de saúde. Os pac ient es,
muito s deles pob res, tinh am de comprar
a droga , mais ca ra que outras seme lhan-
tes. Ela n ão fazia parte das med icações
disponíveis na r ede pública.
Em 2003, Lima era recém-f ormad o.
Tinha pouco tempo n a carreira, m as su-
ficiente para que propagandistas da in-
dústria farma cêuti ca, como aquele que o
apresentou ao m edicame nto contr a a tos-
se, fossem seus velho s conh ecidos. Desde
os temp os da faculdade, no Recife, ele
os encontr ava dentro dos ho spita is onde
fazia estág io. Em uma das in stitui ções,
filantrópica, cada amb ulatório tinha um
armário carregado de amostras grátis. Os
médicos se sentiam bem de poder dar aos

72 1 ÉPOCA 111 de d ezemb ro de 20 17 Foto: A driano Machad o/ÉP OCA


pacientes com menos recursos alguns medicamentos. As amostras
não ficavam só nos hospitais. Os profissionais , em treinamento ou já
formados, também ganhavam. O então estudante Lima levava para
casa sacolas carregadas. "Os parentes me ligavam para pedir remédio, e
eu, ainda na faculdade, me sentia importante." Estudantes de medicina
não podem prescrever medicações, mas as informações dadas pelos
representantes ajudavam Lima a saber como indicar. "Ê com essas
informações que os médicos jovens formam seu
arsena l terapêutico e se habituam com as mar-
cas que passarão a usar", diz. Havia também os Uma lei
eventos, promovidos por empresas farmacêuticas em Brasília
em churrascarias badaladas do Recife. "Como
estudante, ia feliz da vida com a boca- livre." Ha - restringe
via prime iro uma apresentação das n ovidades: a entrada de
lançamentos, estudos pa ra reforçar ou amp liar a
propagandistas
indicação de drogas . Depois, o jantar. Farto.
Hoje, Lima, de 39 anos, atende como médico em unidades
de família em uma unidade pública de saúde
públicas de
nos arredores de Brasília. Ainda observa a re-
lação estreita entre médicos e representantes da saúde. Outras
indústria farm acêutica. Mas sabe que, ao menos,
três cidades
no Distrito Federal esse relacionamento anda
complicado. Uma lei que entrou em vigor em têm iniciativas
junho proíbe a presença de propaga nd istas em
parecidas
unidades púb licas de saúde no horário de aten-
dimento ao público. "A lei nos marginalizou",
afirma o propagandista Caio Santos, de 48 anos.
Há 22 anos, Santos visita hospitais da rede pública da região para
convencer os profissionais de saúde de que os medicamentos da empre-
sa que representa são melhores que os da concorrência. Um trabalho
que exige conhecimento técnico e boa dose de habilidade social. Há seis
meses, os crachás que autorizavam sua entrada em 16 hospitais púb licos
do Distrito Federal perderam a validade. Agora, Santos só consegue
entrar em cinco deles, autorizado pela administração da instituição,
mas precisa ser anunciado. Reclama de ter perdido o acesso direto aos
médicos - assim como outros 450 propagandistas da indústria farma-
cêutica na região. "A mudança torna inviável levarmos as discussões
científicas para os médicos", diz. "O jeitinho brasileiro é chamar o mé-
dico para sair do hospital, marcar reunião no consultório pa rticular."
O autor d.a lei, o deputado distrita l Juarezão (PSB), afirma que
quis garantir o atendimento aos pacientes : "A própria comunidade
pediu. O representante entra na sala e os pacientes ficam do lado
de fora espera ndo. Atrapa lh a muito". Juarezão pode ter mirado em
agradar a sua base eleitora l. Ele já traba lh ou na área de saúde em
Brazlândia, uma região administrativa do Distrito Federal, cum-
prindo atividades de gestão em uma unidade púb lica de saúde. Mas,
com a medida de apelo popular, entrou num debate nebuloso: como
os médicos escolh em receitar um medicamento em vez de outro.
Parece uma questão técnica, mas sofre influências variadas - até do
grau de simpatia do médico pelo representante.
Os propagandistas ocupam papel central na estratégia de marke-
ting da indústria farmacêutica. Conectam o setor aos médicos. Levam
informações sobre os produtos da empresa a profissionais de saúde até
as cidades mais afastadas de grandes centros, em uma conversa olh o
no olho, permeada pelas melhores táticas de venda e pe la dist ribui ção
de amost r as grátis, como as que Lima encontrava nos hospitais e .,..

11d e dezem br o de 20 17 1 ÉPOCA 173


SAÚDE

distribuía para a fam ília. Mas a relação se encontr a sob forte escru -
tínio, p rin cipa lm ent e de grupos acadê mi cos. ''A inte ração dos m é- PARA
dicos com a indú stria ger a conflit o de int eresse", diz Mário Scheffer, Iniciativas, no Brasil e no mundo,
professor da Facu ldad e de Medicina da Universidade de São Paulo.
"O objetivo principal, que é o m elhor tratamento para o paciente, é
COM OU SEM EFEITO
alterado por um secu nd ário , d.a indú str ia: ganh ar dinheiro." Vários países tentam
A lei do Distrito Federal não é uma inici at iva isolad a (leia no qua- restringir o contato entre
dro ao lado). No Brasil, pelo m eno s outras três médicos e propagandist.as. Os
cidades tentaram impl ant ar medidas seme lh an- resultados são incertos
Códigos de
tes - não sem polêmica e resistência. Em Goiânia,
O contato entre médidos e
conduta médica em 2014, a ent ão vereado ra Cida Ga rcêz (SDD)
representantes farmacêuticos foi
colocou em pauta um Proj eto de Lei que deter- restringido numa clínica em Brisbane,
e da indústria
minava que os represent ant es de empr esas far- na Austrália . Houve mudança (em %)
ditam regras ma cêuti cas deveriam marcar um hor ário para
A prescrição de medicamentos
falar com o médico antes ou depois das con sultas.
para garantir a por paciente caiu de
O projeto não foi aprovado. "Na época, o sindi -
independência cato dos propagandistas de Goiás procurou os 0,5 l

dos médicos.
vereado res e o projeto foi barrado", afirma Cida.
Em Campin as, São Paulo, uma portaria da Se-
. •--------
~

Mas ainda creta ria Municipal de Saúde pro íbe desde 2016,
A prescrição de genéricos, mais
salvo "com a expressa autori zação" do secretário,
há brechas baratos que os de marca, subiu de
a visita de representantes em todas as unidades da
r ede municipal. H á tentativas de revert ê-la. Um ~
Proj eto de Lei de 2015, pa ra garantir o acesso dos propagandistas,
foi aprovado em uma primeira votação - agora, aguard a a segun da.
----•---- •-- 4 8
Não h á previsão de quando isso deve ocorrer. Em Ribeirão Preto,
São Pau lo, até dezembro do ano passado, vigorou um decreto que
proibiu a presença de representant es de laborat ório s farmacêuticos e Na Polônia, uma lei proibiu os
simil ares nas unidades de saúde do município. Um projeto de decreto representantes de procurar os
legislativo do vereador Luciano Mega (PDT) revogou o trecho sobre os médicos no horário de atendimento.
propagandistas. Mega, m édico pediatra, diz que a moti vação sur giu Muitos a desrespeitam
a partir de conversas com os repr esenta nt es que visitavam seu con -
sult ório. ''Achei a proibição muito injusta. Trabalhei para revogá-la."
Em setem bro , um a limin ar obtida pelo prefeito derrubou o decreto a dos médicos
continuaram
favor da presença de representantes. Em not a, a Associação da Indú s- se encontrando
tria Farmacêutica de Pesquisa (Interfarma ) afirma que a proibi ção o/o cornos
das visitas pode prejudicar o atendimento a pacientes: "Esse contato propagandistas
é r ealizado única e exclusiva ment e com o objet ivo de promover a
atualização científica do profissional de saúde".
A relação entr e médicos e indú stria já foi mais íntima no passado
- com direito a excessos que, hoj e, códigos de ética de entid ades m é-
dicas e de conduta da indú stria tentam regular, com vari ados grau s
de sucesso (leia o quadro na página 76). O Cód igo de Ética Médica ,
do Conselho Federal de Medicina (CFM), assim como resoluções dos
conselho s regionai s, traz recome nd ações gerais de ind ependê ncia. A
própria indú str ia também tem seus cód igos de conduta. ''Antes era
m ais 'fác il'. Agora, é preciso segu ir o que é determinado e ficou mai s
seguro até para os propagandistas", afirma Rober to Medina, diretor de continuaram
negociações coletivas da Federação Interestadua l dos Propa gand istas. a fazer isso
No passado, um represent ante podia oferecer a um m éd ico uma via- mesmo durante
gem para participar de um congresso, acompanhado de sua famíli a. o horário de
atendimento
Hoj e, há norma s que vetam esse tipo de oferta. Ainda vale convidar
o m édico, m as os acompanhantes não. Está liberado pagar refeições,
desde que ju stificadas com a apresent ação de informa ções sobre pro-
dutos. A distribui ção de brindes como ca netas e bloquinhos, com
m arcas dos produto s, foi proibida pela Agência Nacional de Vigilânc ia

74 1ÉPOCA 111de dezembro de 20 17


zes no Brasil a alertar sobre o conflito de
TOMAR CONTA DOS MÉDICOS interesse na relação médico-indústria. A
para blindar os profissionais de saúde da influência da propaganda desconfiança não brotou de uma hora
para outra: foi semeada no cotidiano por
ações de marketing que, a seus olhos, co-
CERCO À PROPAGANDA
O que aconteceu com as
locam os médicos em situações vexató-
tentativas de restringir o rias. Uma vez, deparou com um cartaz e
acesso dos representantes uma urna, colocados por uma empresa
farmacêuticos aos médicos farmacêuticana sala de descanso dos mé-
dicos em um hospital em que trabalha-
va, em Jaboatão dos Guararapes, região
GOIÂNIA DISTRITO metropolitana do Recife.No cartaz, via-
INICIATIVA: em FEDERAL -se a Torre Eiffel e lia-se um convite: os
2014, um Projeto de INICIATIVA: médicos deveriam depositar a segunda
Lei propunha que uma lei proíbe via da prescrição que haviam feito para os
os representantes a presença de
deveriam marcar propagandistas
pacientes - de genéricos produzidos por
horário para falar .---- ----1 em unidades uma empresa específica- para concorrer
como méd ico públicas de a uma viagem a Paris.
antes ou depois saúde no horário
das consu ltas
O momento decisivo aconteceu em
de atendimento
DESFECHO: não ao público
2004. Em uma troca de mensagens com
foi aprovado . "O DESFEOHOi outros médicos, Lima conheceu um mo-
sindicato dos a lei está em vimento iniciado por um profissional
propagandistas vigor desde
de Goiás procurou
americano com inquietaçõessemelhantes
junho. Ações
os vereadores e o a questionam às dele. Cinco anos antes, Robert Good-
projeto foi barrado", na Justiça man pensava em abrir uma clínica para
diz a autora, a então
pessoas de baixa renda, em Nova York.
vereadora Cida
Garcêz (SDD)
Não queria que médicos e pacientes so-
fresseminfluência da indústria, o que sig-
CAMPINAS (SP)
nificava recusar as amostras grátis. Para
INICIATIVA; uma
financiar os medica1nentos,teve a ideia de
RIBEIRÃO PRETO (SP) portaria municipal vender canecas e canetas sem logomarcas
INICIATIVA: até dezembro de 2016, proíbe, desde 2016, das empresas e de remédios - uma pro-
salvo "com a expressa
vigorou um decreto que proibiu vocaçãosobre os tradicionais brindes dis-
a presença de representantes autorização " do
secretário de Saúde, a tribuídos pelospropagandistas. O que era
em unidades públicas
DESFECHO: um projeto de decreto visita de representantes para ser um site de vendas, que ganhou o
legislativo do vereador Luciano DESFECHO: um Projeto nome irreverentede «Nãohá almoço grá-
de Lei pede garantia
Mega (PDT), ped iatra, revogou tis" (No free lunch, em inglês),tornou-se
a proibição. Em setembro, uma do acesso. Aprovado
em primeira votação, uma campanha internacional, ao reunir
liminar obtida pelo prefe ito
derrubou a autorização de Mega aguarda a segunda materiais e referênciassobre a influência
da indústria na prática médica. Ironica-
mente, Goodman tinha uma boa estraté-
Sanitária (Anvisa) em 2008, mas há margem para os brindes institu- gia de marketing, o que fez sua iniciativa
cionais e para empresas que ganharam uma liminar desobrigando-as famosa internacionalmente. Ele trocava
de cumprir a regra. A mesma resolução estabelece que as visitas dos canetas com logos,enviadas por médicos,
representantes podem acontecer, desde que não interfiram na atenção por unidades sem nenhuma propaganda.
aos pacientes. «É lógico que precisamos de uma lei para regular as «Fiquei meio chocad.o quando li o site",
relações dos médicos com os propagand istas", afirma o cardiologista diz Lima. «Existiam evidências de que
Bráulio Luna Filho, do Conselho Regional de Medicina do Estado nós, os médicos, éramos influenciados
de São Paulo. «São poucos os médicos que conhecem a resolução da demais." Hoje, como um dos diretores
Anvisa e os códigos autorregulatórios deixam brechas." da Sociedade Brasileira de Medicina de
Uma parcela significativada boa vontade da indústria vem da ne- Família e Comunidade, Lima não rece-
cessidade de estabelecer limites entre os concorrentes. Mas também be visitas de representantes e só organiza
atende à pressão social por relações mais éticas - em parte fomenta- eventos sem patrocínio da indústria.
da por grupos de médicos que passaram a se sentir desconfortáveis. As evidências a que Lima se refere são
O próprio Rodrigo Lima, que começou a carreira em Pernambuco, extensas, principalmente na literatura
entusiasmado com as amostras grátis, é hoje uma das principais vo- científica internacional. Um número..,.

11d e de zembr o de 20 17 1ÉPOCA 175


SAÚDE

crescente de estudos sugere que a inte-


REGRAS RESTRITAS, MAS NEM TANTO ração dos médicos com a indú stria pode
Há normas no Brasil para barrar a alterar os hábitos de prescrição - e nem
influência da indústria de medicamentos sempre favorecer o paciente. Um sistema
e dispositivos sobre os médicos . Mas elas inovador, adotado nos Estados Unidos
ainda permitem brechas importantes desde 2014, tem conseguido provar na
prática o que há muito se discutia na teo-
ria. Agora, as empresas farmac êuticas são
obrigadas a informa.r pública e nominal-
mente quais médicos receberam verbas
de marketing - e quanto. A conta inclui
desde honorários para falar sobre um
produto até almoços de relacionamento
com propagandistas. Pesquisadores da
As informações Promover os As informações
sobre os produtos produtos de acordo devem ser Universidade da Califórnia cruza.raro
devem ser com o uso aprovado consistentes com os esses dados com as prescrições feitas por
científicas . A visita pelas autoridades estudos técnicos . E' esses médicos. Descobriram que, quanto
não pode interferir regulatórias locais, desaconselhada a
na atenção aos com base em presença durante a
mais frequentes eram os encontros em
pacientes e as estudos científicos, prática clínica, como que houve o pagamento da refeição ou
. .
instituições de informando sobre uma cirurgia para quanto mais cara ela era, maior era o au-
saúde podem criar benefícios e riscos colocar prótese. mento na prescrição de medicamentos
regras de visitação Mas é permitida
se for necessária
de marca, mais caros que os gené ri cos.
paraapo,o As refeições pagas aumentaram em 1,8
vezes o receituário das drogas de marca
contra colestero l e em 3,4 vezes a pres-
crição de antidepressivos. O aumento
mais expressivo foi nos medicamentos
i
para pressão arteria l: chegou a 5,4 vezes.
Distribuir brindes, Oferecer brindes i: O pagamento Isso porque 95% das refeições pagas não
benefícios e de medicamentos i: direto de viagens
vantagens aos e produtos usados i: a congressos para
passavam dos US$ 20 (R$ 60).
prescritores e no consultório i: profissionais de Dados como esse não significam que
dispensadores (canetas, blocos), i•saúde, a partir de os médicos que recebem representantes,
assinaturas !• janeiro de 2018. aceitam um brinde para o consu ltório,
de periódicos !: Também proíbe
científicos ou !• brindes, presentes concordam com um alm oço pa ra saber
pagar/doar valores !• e qualquer outro mais sobre uma nova droga ou a pos-
ou bens para ter i benefício sibilidade de assistir a um congresso
direito à visitação
ajam deliberadamente para favorecer
os interesses da indústria. Apenas que
eles - como qualquer pessoa - podem ser
influenciados pelo fator reciprocidade,
uma tendência inconsciente de retribuir
ao sentir que receberam um favor. Tal-
vez essa seja a questão mais delicada: os
Oferecer brindes Pagar refeições Pagar refeições
institucionais, para troca de e bebidas em próp rios profis sionais têm dificuldade de
que não veiculem informações reuniões com reconhecer a influência. Uma pesquisa
propaganda de científicas ou profissionais de ain da não publicada, feita por Scheffer,
medicamentos. educacionais. As saúde. Permite
Artigos científicos, empresas dizem ter
da USP, com mais de 4 mil médicos re-
também pagar
livros técnicos, responsabilidade viagens para cém-formados de todo o Brasil, mostra
revistas científicas de oferecer treinamentos que 44% dos entrevistados ach am que a
e publicações treinamento e da empresa e visita não influencia na prescrição. Quase
para atualização educação(pode distribuição de
profissional podem incluir pagamento livros e itens de
50% consideram n ão haver problemas
ser distribuídos de viagens) utilidade médica, em receber brindes de pequeno valor e
mas fixa limites financiamento para viagens científicas.
Os primeiros resultados de iniciativas
que tentam blindar os médicos - e os
Fontes: Anvisa, lnterfarma e Abimed pacientes - da influ ência da indústria ..,.

76 1ÉPOCA 111de dezembro de 2017


SAÚDE

começam a aparecer. O epidemio logista libanês Elie Akl, da Universidade


A OPINIÃO DO PACIENTE
de Beirute , ana lisou o impacto de três inici ativas para coibir a interação
O que pensam sobre as visitas
dos propagandistas e as
entre médicos e propagandistas. "Os resultados foram positivos nas
prescrições do médico (em%) políticas que restringiram o contato com representantes, a distribuição
de amostras grátis e de material promociona l", afirma Akl. Um projeto,
O fato de os médicos receberem visitas de em uma clínica universitária em uma área periférica de Brisbane, na
representantes da indústria farmacêutica:
Austrália, apresentou resultados ao adotar novas regras: as secretá rias
É irritan te porque Não faz
atrasa o atendimento diferença foram pro ibid as de receber materiais promoc ionais
·---------~ -.......
.........
..................... .
e de agenda r visitas dos repre sentantes, e os médicos
16 ~ ~ 10 que desejassem encontrá- los deveriam fazê-lo fora do Quase 50°/o
horário de atendimento. Nove meses após a imple - dos médicos
mentação, a prescrição de medicamentos que era de,
entrevistados
13 61 no mínimo, uma por paciente, caiu a 0,54. Isso signi-
Dáa Deixa fica que nem todos os pacientes saíam do consultório em uma
imp ressão desconfiado
de o médico de que ele
com uma receita - evidência de que, antes, muitos
pesquisa
estar bem pode favorecer eram medicados desnecessariamente. A prescrição de
informado alguma marca genéricos também aumentou: passou de 4% para 8%. dizem não ver
Ainda que o impacto prático pareça significativo, a
Você recebeu alguma prescrição de problemas em
remédio de marca (não genérico)?
experiência da Polônia , que adotou em 2008 uma lei
federal proibindo as visitas de propagandistas durante receber brindes
Não
o horário de atendimento, sugere que a restrição pode
25 da indústria
se tornar um tipo de lei conhecido dos brasileiros:
a que não pega. A socióloga Marta Makowska, que farmacêutica
estuda a influ ênc ia do mark etin g farmacêutico na
75 Universidade de Varsóvia, fez uma pesquisa on -lin e
Sim com 379 médicos. A vasta maioria (97% ) confirmou ter encont rado
..............................
OOUHOoo••·······-----~~~~~~~~~
.........................
. representantes. Desses, mais de um terço admitiu continuar a recebê -
Se você recebeu a prescrição de um
los durante o horário comercial. Ainda há out ro fator a considerar.
medicamento de marca, você: "A proibição traz riscos éticos", afirma Marta. "Os encont ros fora do
Não Perguntou para o médico horário de trabalho têm natureza menos formal e dão brechas para
pensou a razão da prescr ição condutas que estimul am gratificação. Os médicos entendem que o
a respe ito daquela marca
tempo deles vale dinheiro e ficam mais abertos a aceitar recompensas."
35 15 É provável que o caminho pa ra relaçõe s mais éticas inclua também
a cobrança pelos pacientes. Uma pesquisa nos Estados Unidos mos -
trou que eles avaliam como menos honestos e comprometidos com
os pacientes os médicos que receberam pagamentos da indústria. No
Brasil, um levantamento on -lin e com mais de 1.700 pessoas, feito pelo
ReclameAQUI a pedido de ÉPOCA , sugere que os brasileiros também
25·-- 25 estão atentos: 61o/oafirmam que o médico receber visitas de propa -
Ficou em dúvida Ficou em dúvida gandistas os deixa desconfiados de que possa favorecer alguma marca.
se pod ia substituir se podia substituir
. - No Distrito Federal, na unidade púb lica de saúde em que Lima
apresc nçao a prescrição . . por
por um genérico um genen co, mas trabalha desde o ano passado, ele diz tentar convencer os colegas sobre
e pergun tou não perguntou
a influência inconsciente a que estão sujeitos. Tornou -se um vig ilante
do cumpr im ento da lei que proíbe a presença de propagandistas no
Se o médico prescreve um medica.mento
de marca muito caro, você: horário de atendimento. Já ameaçou jogar fora uma sacola de amostras

Não compra

5
_ Compra, po rque acha
-,· que
~ é a me lhor opção _
______________
__,,...................
grátis que haviam deixado na recepção para um dos médicos. Sua
postura virou motivo de provocação entre os colegas. Uma médica o
chamou para tomar café e ofereceu biscoitos. Perguntou se estavam
9
gostosos. "Uma delícia ", respondeu Lima , para ouvir a resposta da
colega, galhofeira: "Foi um representante quem me deu". Ambos ca-
íram na risada. Para Lima , sua postu ra não é radical. "Todo mundo,
15__ , ou quase, é um pouco intransigente sob re seus va lor es mais profun-
Pesquisa
em 71 dos ", diz. "Não me submeter a dinheiro, para mim, é um valor bem
·--~ -
outras Pergunta se existe profundo." Passados 14 anos, ele ainda tem a im agem da caixa do
farmácias alguma opção genérica medicamento cont ra a tosse que costumava prescrever - e do nom e
Fonte: ReclameAQUI - pesquisa com mais de 1.700 participantes comercial - gravada na memória. •

78 1 ÉPOCA 111de dez e mbro d e 2017


TECNOLOGIA

.A.

osa 1

ocrac1a
"Bots" políticos têm estigma negati vo: influenciam
eleições com notícias falsas e discurso de ódio nas
redes sociais. Não é o caso de Rosie, Alice e Beta
Paula Soprana, com Daniela Simões

osie é uma robô. Mais espec i- nologia, para fiscalizar a adm inistração
ficamente, um a bot, uma ap li- pública. A vocação da Serenata n ão é
cação de computado r. Recebeu ser uma Lava Jato automatizada, como
esse nom e in spir ado na faxineira dos explica Pedro Vilanova, um dos ideali-
Jetsons. Nasceu com intuito parecido: zado res. "É fazer milhões de denúncias
limp ar. Em vez de tapetes, var re bancos de poucos reais, n ão uma denúncia de
de dados públicos para detectar sujeira s milh ões de reais", disse e1n pa lestra no
parlamentares. Logo nos primeiros me- Wired Festival Brasil, realizado pelas Edi-
ses, reportou 8.500 situações de uso sus- ções Globo Condé Nast e por O Globo
peito da cota parlamentar, uma quantia no Rio de Janeiro em 1.ue 2 de dezembro.
de R$ 33 mil a R$ 44 mil de dinheiro A Câma ra dos Deputados recebe 20 mil
público que cada deputado federal e pedidos de reembolso por mês dos 5 13
senador recebe para exercer sua ativi- parlamentares. Quem os confere são os
dade política - além dos salário s e da próprio s po líticos. Em 2016, 3 milhões
verb a para o gabinete. São notas fiscais de not as fiscais geraram R$ 150 milhões
de alimentação, transporte, acomoda- em reembolsos. Diante da abundância de
ção e outros gastos que eles ent regam dados e da falta de transparência, a Ope-
à Câma ra dos Deputados e ao Sena.do ração Serenata decidiu transformar leis
para poster ior reembo lso. Ao vasculh ar em código. Após levantadas as suspe itas
os dados, o p ro grama encont rou docu- cert as, deputados devolveram dinheiro,
m ento s que registram cervejas em Las mesmo que quant ias ínfimas, como R$
Vegas, 13 almoços em um único dia, 9 18 em cerveja consumida em Las Vegas.
quilos consumidos em um restau rant e Um dia, Vilanova recebeu uma liga-
self-service, R$ 1.500 gastos em bode ção. Era uma chamada da Câma ra. Ao
assado e almoços simultâneos em di- chegar a uma sala com uma equ ip e de
ferentes regiões: Caxias do Sul, no Rio quatro servidores, diz ter ouvido: "Pe-
Grande do Sul , Rio Branco, no Acre, dro, a gente recebe 600 denúncias em
e Caxias do Sul de novo, tudo em um um ano. Você mandou isso em um a
intervalo de 15 minuto s. semana': Explicou: "Nada contra sua
A rob ô tem posição de destaque na equ ipe, mas temos um robô e ele é m ais
Operação Serenata de Amor, um pro- rápido': Rosie com eçou a ficar popular
jeto de inteligência art ificial concebido (talvez não tanto dentro do Cong resso).
por cidad ãos, dez especialistas em tec- Passo11a ter presença nas redes soc iais

80 1ÉPOCA 111de de zembro d e 20 17 Foto: Adri ano Machado/É POCA


e ganhou uma conta oficial no Twitter,
onde publica cada irregularidade que
encont ra e menciona o perfil oficial do
congressista envolvido. Também foi
pa rar no horário nobre da TV Depois
disso, a equipe da Serenata recebeu 300
pedidos de aná lise de prefeituras. A ex-
posição pública de Rosie aumentou a
eficiência do trabalho. "O deputado vê
o tuíte, paga o que deve, tira u.ma foto
e responde: Rose, pe lo amor de Deus,
eu já devolvi!': brinca Vilanova.
O Brasil está em 7º- lugar num
ranking internacional sobre dispon i-
bilida .de de dados públicos - uma bela
colocação. Também tem, segundo um
estudo recente do Fóru m Econômico
Mundial, um dos piores índices de con-
fiança em políticos do mundo. Criar
um modelo matemático que identifique
inconsistências no modo como parla-
mentares usam verba púb lica, portanto,
é certeza de resultados positivos. A robô
acerta em 89% das vezes.
A família de agentes digitais a que
Rosie pertence vem crescendo. Há vá-
rios tipos: chatbots (mensageiros que
aprendem a dialogar com humanos a
partir de inteligência artificial), socia l
bots (que interagem a partir de perfis
em redes sociais) e bots políticos, hoje
estigmatizados de forma negativa. Fo-
ram associados à geração automática
de conteúdo falso, impulsionada por
ideologia ou tática eleitoral. Em 2014,
10% da discussão na internet sobre
a disputa entre os candidatos Dilma
Rousseff e Aécio Neves era gerada por
robôs, segundo a Fundação Getulio
Vargas. Dona ld Trump, cuja eleição deu
destaque a termos como «r1ake news " e
a e, conversou a1gumas vezes
"'pos -verdd"
com uma fã de nome Nicole. Há suspei-
ta de que o interlocutor do presidente
seja um robô, não uma eleitora. Mas
nem todo bot po lítico é um tro ll oura-
dical. Além de Rosie, há Alice, criada .,.

11 de dezem br o de 20 17 1 ÉPOCA t 8 1
AGRICULTURA

produtores artesanais. Piora o quadro


a fragmentação, já que as licenças po-
dem ser tiradas em nível municipal,
estadua l e federal. Quanto maior a es-
fera, mais restritas as regras, e poucos
fora das grandes indústrias conseguem
se encaixar nelas. Só que, sem esses se-
los, o produto não pode circular pelo
país ou mesmo ser exportado .
"Nossa legislação foi feita no século
XX pensando 11aprodução de larga es-
cala, de commodities", explica João Fran-
cisco Adrien, diretor da Sociedade Rural
Brasileira, associação que reúne peque-
nos e grandes produtores e uma das en-
tidades que articulam os debates para a
revisão da lei. "Ela padronizou os pro-
cessos e acabou deixando de fora o pro-
dutor artesanal. Afinal, como desenvol-
ver um produto com identidade própria
seguindo um modelo predefinido?" No
caso dos queijos, por exemplo, exige-se
que a maturação seja feita em ambiente
refrigerado e revestido de azulejos -
nada do que tem nos armazéns da Ata-
laia, em dezenas de outras pequenas

Na França po e. queijarias do país ou de diversos queijos


feitos no mundo. Temperaturas de aque-
cimento, altura do pé-direito e divisão

qui é complica • • dos sanitários por gênero são outros


elementos que podem estar predefinidos
nas regulações. E que não cabem na vida
Produtores artesanais querem simplificar burocracia real de muitos queijos de alta qualidade.
para poder vender em todo o Brasil e até exportar O debate avança lentamente. "Fize-
mos uma consulta pública e em janeiro

,
Juliana Elias devemos apresentar uma nova regula-
mentação para a agroindústria artesa-
da Fazenda Ata laia, em Ampa- subterrâneos de queijos famosos como nal em São Paulo", diz o secretário da
ro, n o int erior de São Paulo, o comté ou o roquefort. Só há um pro- Agricu ltu ra do estado, Arnaldo Jardim.
q11esai um dos melhores q11ei- blema: no Brasil, ele é ilegal. "Eu não O anúncio foi feito no fim de semana
jos do mundo: o queijo tu lh a, marca posso vender meu queijo em nenhum passado durante o Festival Origem,
da propriedade, foi vencedor da me- lu gar fora de minha cidade", diz o pro- evento de gastronomia sustentáve l rea-
dalha de ouro da edição de 2016 do dutor da Atalaia, Paulo Rezende. "Para lizado pelas revistas ÉPOCA, Globo
Wor ld Cheese Awards, prem iação in- isso, eu preciso do selo estadual ou Rural e Casa e Jardim. "A ideia é desbu-
ternacional de queijos finos. O segredo federal, mas eles não reconhecem o rocratizar e, com isso, facilitar a regu-
está na maturação, que dura até 18 meu processo de fabricação." larização dos pequenos produtores
meses e é feita na tulha, o antigo arma- Confusa e cheia de exigências que dentro do estado", continua o secretá-
zém de café da propriedade centenária. padron izam os estabelecimentos, a le- rio. A expectativa é que, com o avanço
As paredes de taipa dão um clim a pró- gislação atual pa ra a produção de ali- em São Paulo, se estimu le o debate em
prio e reproduzem o processo feito em mentos no país exclui grande parte dos nível nacional também. +

84 1ÉPOCA 111 de de zembro de 20 17 Foto: Divulgação


MEIO AMBIENTE

CDE>
rêmi É OCA mpr sa
Ve d dest~ca as e mp anhi..__
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que 1nvest m no meio
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eomo esi:r-ã1
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Desirêe Galvão
para tempos difíceis

maior crise econômica da história recen- mas escassezde recursos naturais, como a falta de chuva e de
te do Brasil foi uma prova de fogo para água nos rios, causa um impacto muito maior': disse Vando
o engajamento das empresas em ações Telles,diretor executivo da Pecsa.Essas empresas estão entre
de sustentabilidade, especialmente em as vencedorasdo Prêmio ÉPOCAEmpresaVerde,realizadoem
iniciativas ambientais. Diante de difi- parceria com a consultoria PricewaterhouseCoppers (PwC).
culdades financeiras, muitas optam por Na décima edição do prêmio, foram analisadas 145 em-
cortar investimentos em ações ambientais. Já outras fazem presas concorrentes para chegarmos a 13 destaques, seis
o contrário. Enxergam os projetos de meio ambiente como delas em categorias especiais. "De dez anos para cá, vimos
uma estratégiade sobrevivência."Asustentabilidade é a lógica que as empresas deixaram de perceber a relação com o meio
que move nosso modelo de negócio. Momentos de crise, no ambiente apenas como uma boa prática para vê-la como
entanto, nos obrigam a ser ainda mais eficientese criativosna um modo de adaptação à escassez de recursos naturais e re-
conciliaçãode investimentosem inovaçãocom as nossasmetas siliência",diz Dominic Schmal, gerente de sustentabilidade
de respeito ao meio ambiente': diz LucianaVillaNova, geren- da PwC. Os participantes foram avaliados por meio de um
te de sustentabilidade da Natura. "Mesmo em meio à crise, questionário quantitativo e qualitativo e depois seleciona-
continuamos a desenvolverações ambientais e incentivando dos por um conselho formado por José Roberto Marinho,
a condução de negócios que geram valor ao longo do tempo vice-presidente do Grupo Globo (que edita ÉPOCA) e pre-
para todos que se relacionam co11osco':diz Denise Hills,supe- sidente da Fundação Roberto Marinho; Sergio Besserman,
rintendente de sustentabilidade e negócios inclusivas do Itaú diretor do Jardim Botânico do Rio de Janeiro; Luiz Gylvan
Unibanco. "Investir em sustentabilidade é fundamental para Meira, professor da Universidade de São Paulo (USP); e
a longevidade dos negócios.Crises econômicassão superadas, Rachel Biderman, diretora da WRI Brasil.

8 6 1 ÉPOCA 111de d ezem br o de 20 17 Fot o: divulgação


BJíllYOS
D

SUSl(NllY(

possível aumentar os lu cros da pecuária sem desmatar mais


E nenhuma árvore da Amazônia. E o que prova a Pecuária Sus-
PECSA ,..__,l,entável da Amazônia (Pecsa), com um novo modelo de parce ri ..,a -~ -·
, para uma intensificação sustentável do negócio. Funciona assim,
o produtor oferece a ter ra, as instalações e o gado e a empresa
entra com tecnologia de ponta, gestão financeira e investimentos
em melhorias. Os lucros são divididos de acordo com a part ici-
pação de cada um. Assim, em poucos anos, o pecua ri sta tem uma
fazenda inteiramente reformada, altamente produtiva, com mão
de obra qualificada, gerando alto desempenho econômico, e em
conformidade com a legislação ambienta l.
No ano passado, a empresa administrou fazendas somando
10.000 hectare s em Alta Floresta, em Mato Gro sso. Os resultados
chega ram, o valor das fazendas está aumentando, junto com a fila
de pecuaristas interessados em fazer parceria. Segundo Vando
Telles, diretor executivo da Pecsa, a missão da empresa é transfor-
mar a pecuár ia na Amazônia em um negócio sustentável. "Nosso
trabalho é aumentar a produção de alim entos e, ao mesmo tempo,
recuperar e conse rvar os recursos naturais e também desenvo lver
a economia local", disse.

11de dezem br o de 20 17 1 ÉPOCA 187


e as iniciativas ambientais das empresas geram benefícios para •
a natureza e para a sociedade e ainda rendem lu cros, por que
ão investir nelas? Esse é o princípio dos títulos verdes. A ferramen-
ta financeira permite às empresas captarem recursos para investi-
·- ··entos em projetos ambientais com melhores condições, como
~ 1juros mais baixos. Os títulos verdes são comuns no mercado ameri- •;-";t
JA.
I
: 'cano e europeu . Mas, 110 Brasil, a primeira emissão de títulos verdes ,.
:só aconteceu no ano passado e foi coordenada pelo Itaú Unibanco .
IAempresa Suzano Papel e Celulose fechou um contrato de R$ l liil!idl;!."""-1
bilhão em títulos verdes, que estão sendo negociados pelo Itaú.
Os recursos captados com os títulos serão usados em projetos
de manejo florestal , restauração de áreas degradadas, conservação
da biodiversidade , gestão de recursos hídricos, eficiência energéti-
ca e energia renovável. De acordo com Denise Hills, superinten-
dente de sustentabi lidade do Itaú Unibanco, fazer parte de ações
como essa significa crescer com responsabilidade. "Buscamos apoiar
iniciativas alinh adas a uma econom ia mais verde e inclusiva, en-
contrando diferenciais competitivos", disse Denise. "Acreditamos
que esse cami nho será seguido por outras empresas. Poderemos
nos orgulhar em dizer que o mercado financeiro nacional avança
em direção às melhores práticas internacionais ", diz Marcelo
Bacci, diretor financeiro da Suza na.

os UNILEVER TOYOTA ARCELORMITT


DESTAQUES A Unilever criou estações de
pontos de coleta voluntária
A Toyota fez parcerias com
prefeituras para capacitar
Cerca de 30% do aço da
ArcelorMittal é produzido a
Algumas ações de resíduos e recicláveis. O as pessoas a utilizar práticas partir de sucata, sem perder
exemplares das projeto já recolheu mais de industriais de economia de suas propriedades físicas.
100.000 toneladas de resíduos recursos naturais desenvolvidas Isso ocorre por meio de um
empresas com e as envia gratuitamente pela empresa . Em 2016, cerca de estruturado processo de logística
as melhores para cooperativas . Além R$ 650 mil foram poupados nas reversa . A ação é essencial
pontuações disso, a empresa trabalha na contas públicas de Sorocaba, dentro da perspectiva da
do prêmio implantação de uma rede de São Paulo, resultado de dez economia circular, até porque
coleta seletiva no Brasil. projetos implementados. o aço é 100% reciclável.

88 1 ÉPOCA 111 de dezembro d e 2017 Fotos: Sérgio Zacchi, divulgação


s comunidades na Amazônia sabem que>para serem fornecedo-
NATURA A ras da Natura> o pré-requisito é que a floresta no entorno delas
esteja preservada. A empresa tem um sistema próprio de avaliação
das cadeias sociais e ambientais com padrões previstos em selos or-
gânicos> de comércio justo e do Conselho de Manejo Florestal (FSC
na sigla em inglês). Em 2016, a Natura alcançou a marca de 100% de
fornecedores audita dos. Ao propor um modelo comercial sustentável,
a Natu ra estabeleceu técnicas produtivas> que contribuíram para a
conservação de 256.000 hectares de floresta em pé na região, e criou
,.,, produtos a partir de plantas nativas, como a murumuru .
No ano passado> a empresa lançou o estudo de contabilidade am-
biental, conhecido como EP&L, que significa ganhos e perdas am-
bientais na sigla em ingl ês. A Natura foi a primeira instituição da
América Latina a implementar a ação. A partir da análise, que inclui
todas as etapas do processo de produção até o descarte dos produtos,
oi possível m ed ir, em reais , os impactos causados pelas atividades
da empresa. "O levantamento confirmou o impacto positivo de ini-
ciativas adotadas pela Natura ao longo de sua trajetória, como a
opção de uso de álcool orgânico na perfumaria e de ativos da biodi-
ersidade amazônica em seus produtos", explicou Luciana Villa Nova,
igcri

(MPR(~A
Y(R(
INDUSTRIA

NEOENERGIA
DURATEX BASF NOVELIS
A empresa desenvolve o Projeto A empresa tem projetos de Para reduzir a quantidade de Em 2016, a empresa de
Biogás, que gera energia elétrica adaptação a mudanças do água utilizada na produção de laminados de alumínio
a partir de resíduos sólidos e clima, como o estudo dos concreto, a Basf desenvolveu reduziu em 22% o consumo
esgoto sanitário. Em uma das balanços hídricos e de carbono, um hiperplastificante que de água nas unidades. A
estações, em Feira de Santana, e de sustentabilidade das bacias aumenta a eficiência da Novelis estabeleceu, no
na Bahia, o gás alimenta um hídricas onde atua. Seu programa hidratação do cimento e reduz segmento em que atua, um
gerador de energia elétrica de melhoramento de eucalipto o uso de água em mais de 40% novo padrão de práticas para
que supre cerca de 80% desenvolve variedades mais em relação aos processos a gestão da água com ações
da demanda da estação de resistentes a pragas e variações convencionais nas obras de inovadoras, educativas e de
tratamento de esgoto da cidade. climáticas, como seca e geada pequeno e grande porte. consumo mais consciente.

11de d ezemb ro de 20 17 1 ÉPOCA 189


,

MEIO AMBIENTE

CPFL
,.,,
,

or se destacar pelo bom trabalho em ações ambientais, a Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL)
P venceu o prêmio na categoria Serviços pelo segundo ano consecutivo. Ela tem o maior empreen-
dimento da América Latina em produção e distribuição de renováveis. Ao todo, 96% da energia pro-
duzida pela empresa vem de usinas eólicas, solar, aproveitamento de biomassa e pequenas centrais
hidrelétricas. Só no ano passado, 14.900 gigawatts de energia limpa foram obtidos através de 93 usinas ·"- ...1
renováveis. Além disso, a empresa compõe o Índice Dow Jones de Sustentabilidade para Mercados
Emergentes, que elege 95 instituições de países em desenvolvimento que sobressaem no assunto.
Em 2016, a CPFL selecionou clientes de baixa renda e promoveu ações para reduzir o consumo d
energia elétrica. Substituiu equipamentos domésticos antigos, como geladeiras, chuveiros e lâmpadas
por modelos mais eficientes. Reformou as instalações elétricas internas dessas famílias e regularizou as
ligações clandestinas. "Aqui, todas as ações ambientais estão relacionadas a negócio. Todas as ações são
avaliadas pela eficiência ambiental, pelo impacto social e retorno financeiro. É isso que garante o
sucesso e a continuidade dos projetos", diz Rodolfo Sirol , gerente de ustentabilidade da CEFL,.__ _

EDP
ENERGIAA snibilidade
mudanças climáticas tornam instável a dispo-
de chuvas e água e, consequentemen-
te, o mercado de geração de energia. Pensando nisso,
durante a maior crise hídrica da história, em 2015,
EDP Brasil criou a EDP Soluções em Energia, empre-
sa que fornece serviços de eficiência energética.
Segundo Miguel Setas , presidente da EDP, o objetivo ·~
até 2020 é alcançar a meta de economia em 100 gi-
gawatts. "Investir em eficiência energética signific
construir uma usina virtual. Nela, a energia não é
produzida, mas sim, poupada", explicou.
Ao longo de 2016, a empresa realizou 15 projetos
de eficiência energética, que renderam uma economia
de 45 gigawatts. Isso é aproximadamente o que Itaipu
produz em cinco meses. Além disso, um dos projetos
1 1 : 11
envolveu o reaproveitamento de biomassa para a ge-
ração de energia por meio do vapor. Foi feita a quei-
ma do cavaco de reflorestamento. Essa operação evi-
tou que 12.367 toneladas de gás carbônico fossem
emitidas por meio de outras formas de geração de
energia. Esse tipo de queima ainda gera pouco re-
síduo. De 200 caminhões de cavaco queimado, sobro
apenas 1,5 caçamba de cinzas. Elas foram reinseri-
das na indústria de reflorestamento como adubo,
incentivando a economia circula

9 0 1 ÉPOCA 111de d ezem br o de 20 17 Fot os: Car olinaVia nna/ ÉPOCA, Rogeri o A lbuquerque/
Ed. Glo bo, Ann a Carolina NegrVÉPOCA
s florestas plantadas são parte da solu ção dos
FIBRIA A problemas relacionados às mudanças clim á-
ticas. Isso porque, para se desenvolver, as árvores
precisam retirar gás carbônico da atmosfera para
transformar em folhas, galho s e raízes. Esse me-
canismo é um valor para a Fibria, empresa brasi-
leira de base florestal, que lid era a produção de
celulo se de euca lipto no mundo. Cada árvore da
Fibria tem um ciclo de seis anos, entre cresc im en-
to e colh eita. Durante esse tempo, muito carbono
é tirado da atmosfera não só pelo plantio, m as
também pelas áreas de florestas nativas conser-
vadas da empresa. "Temos estudos mostrando que
para cada tonelada de celulo se produz ida, entre
sequestro e emissões de carbono até o no sso clien-
te, ainda ficamos com um saldo positivo", disse o
presidente da emp resa, Marcelo Castelli .
Em 2016, a Fibria estabe leceu um preço interno
de carbono com o objetivo de reconhecer e valorizar
suas áreas de plant io e conservação florestal. Dessa
orma, a empresa propõe entend er melhor o irnpac-
o das emissões de gases de efeito estufa e criar novas
soluções para uma economia de baixo carbono .
essa conta, a Fibria definiu que a tonela .da de gás
carbônico vale US$ 5 para o sequestro em florestas
Mun,N~A~ ,us$10 pa ra emissões industriais e de logística e US$
' 30 para novas tecno logias. Dessa forma, foi calcu-
llM~llCAS ada em R$ 309 mil a redução de emissões de gás
carbônico geradas no transporte de madeira feito
INDUSTRII
brunoastuto@ed glo bo.com.br

Cliques
do paraíso
Desde que pisou em
Fernando de Noronha, há
15 anos, Paulo Vilhena caiu
de amores pelo arquipé lago.
"É um lugar mágico, que
me ajudou a enxergar o
mundo de outra maneira",
desmancha-se o ato r, que
decidiu fazer algo mais
pe lo local. "Estou à frente
de uma série de ações pa ra
ajudar os jovens de lá. No
ano passado, a.rrecadei 1
tone lada de material para
as escolas da região." O
próximo passo é a exposição
Neuronhe-se, que acaba de
ser inaugurada na Cidade
das Artes, n o Rio de Janeiro,
com imagens feitas pe lo
fotógrafo Rildo Iaponã. No
ar na novela Pegapega, ele
, . . , .
estreara em Janeiro a serie
Trezedias longedo sol."A
série já foi toda gravada
e, assim que terminar a
novela, vou tirar férias." O
destino? No ronha, é claro.

Escolhida por testes para o filme amar", diz Gianne, que não ch egou a
Chacrinha: o Velho Guerreiro, em que conhecê- la pessoa lm ente . Fisicamente
interpreta ninguém menos do que parecidas e com histórias de vida
Elke Maravilha, Gianne Albertoni se seme lh antes - ambas foram modelos
apaixonou tanto pe la figura da icónica de passarela, com 1,80 metro de altura
artista que está sendo comp li cado se -, a atriz conta que se esforçou muito
despedir dela. "É a parte mais difícil para fazer jus a Elke. "Interpretá-la
de tod .a a filmagem, que está ago ra é uma gra n de realização na minha
terminando. Me identifico muito carreira. O Stepan Nercessia11, que
com a Elke, me apegue i mesmo. faz o Chac rinh a, me ajudou m11ito a
Ela lut ava cont ra todos os tipos de entende r a relação que eles tinham. Fiz
preconceito, com uma energ ia tão muitas pesquisas. Espe ro qu e o irm ão
vibrante, cheia de humanidade. É uma dela goste da minha homenagem ." O
mulher difícil de defini r, mas fácil de filme será lançado em meados de 20 18.

92 1 ÉPOCA 1 11de dezembro de 20 17


Com Acyr Méra Júnior e Guilherme Scarpa

Guerreira
Recuperada de um câncer -
ela descobriu, por acaso, um nódulo
no seio - , Laura Wie celebra o fato
de seu cabelo voltar a crescer, três
meses após o fim da quimioterapia.
"Já na primeira sessão, raspei a
cabeça porque quis. Preferi fazer isso
logo, antes que o cabelo começasse
a cair. Cheguei a recorrer a uma
. , .
peruca, mas a usei pouquissimas
vezes, não me senti verdadeira com
ela. Não me deixei contaminar
em nenhum momento, nunca me
senti doente", afirma a ex-modelo
e apresentadora, de 4 7 anos, que
se achou linda careca. Ao dividir
sua doença nas redes sociais, Laura
viu seu número de seguidores
triplicar em poucos meses.
"Recebo muitas histórias e divido
exper iencias com que me procura.
• I\ • ''

O pupilo
deAnitta
Revelado no filme Cidade
de Deus, de 2003, Micael
Borges deixou de lado a
carreira de ator h á três anos
para se dedicar à música, sua
grande paixão. Mas foi um
-.. encontro com Anitta que o
levou ao pulo do gato. Agora
empresariado pela cantora,
ele está lançando seu primeiro
single, "A noite toda". "Nossa
Sem brigas

parceria começou em u.m
estúdio, conversando sobre
Alice Caymmi passou, segundo ela, por "uma música. Daí vieram muitas
limpeza energética e visual" para dar forma identificações. Assim como
a seu terceiro álbum, que será lançado em ela, sou um ca.ra ambicioso.
janeiro. O novo single, "Inocente': que acaba Também quero ter uma
de chegar às plataformas digitais, é assinado carreira internacional. Mas
em parceria com Ana Carolina e mostra um não tenho pressa, é um
pouco da nova fase da camaleônica cantora. passo de cada vez': explica
"Assumi uma postura artística e politicamente ele. Casado e pai de Zion,
romântica. Fiquei pensando em como eu era de 3 anos, Micae l se diz
antes da minha primeira decepção amorosa preparado pa ra ser "u ma
sinistra. E aí entrou mais luz, o branco e Anitta de calças': "O escritório
rendas", filosofa ela, que também mudou dela tem tudo de que um
suas armas na luta feminista. "Cansei de artista precisa. Ela nã.o para,
brigar de forma agressiva para ser ouvida. trabalha 24 horas por dia. E
Querem sempre te fazer passar por maluca." quer que eu vá bem longe ."

Fotos: Divulgação , Leo Castro/ÉPOCA, Gil lnoue,


Daryan Domelles , Cam ila Marchon/ÉPOCA
---.
BRUNO ASTUTO ~ Leia a colu na d iária d e Bruno As tuto em epoca.com.br

ClC)
ENTREVISTA Aarte
como causa
DIOGO NOGUEIRA
CANTOR
No ar como a prostituta
Gilberte, da no vela Tempo
de amar, a atriz Maria
''Vai ser o Carnaval Eduarda de Carvalho
comemora sua estreia no

da raça'' cinema com a comédia


Altas expectativas, em que
int erpreta uma jaqu eta. O
tema do filme é o nani smo ,

D iogo Nogueira celebra dez anos


de carreira com o lançamento de
um novo álbum, MundoÊ, seu primeiro
evocado pelo companheiro
de cena Leonardo Reis. "O
Léo usa o humor como
trabalho 100% autoral. "Nesse tempo ferramenta de inclu são.
todo já fiz mais de 100 canções. Foi difí- Suas piadas sob re o assunto
cil selecionar 14 músicas", diz o cantor, levam você a enxergar além
que honra o DNA do pai, João Noguei- dessa questão. E isso faz
ra, uma das figuras mais emblemáticas você renovar a fé no ser
do samba. "Cresci com roda de samba humano", elogia Maria. A
na minha casa praticamente todos os atriz também acaba de fazer
dias. Até tentei fugir da música e jogar seu début como autora
futebol profissional. Mas não teve jeito." teatral, com a peça infantil
Atrás do mundo, em cartaz
ÉPOCA - Aceita o título de "muso" do no Rio de Janeiro. "Ded iquei
samba? o texto à minha irm ã, que
Diogo Nogueira - Longe disso. Sei que morreu há sete anos de
não tenho o tipo físico de sambista, um câncer raro. Escrever,
tenho minhas tatuagens, sou surfista, contar e recontar essa
gosto de pegar ondas e também malho. perda, com humor e leveza,
Mas não me vejo como muso. E posso
"MUSO" DO SAMBA?
acabou por ressignificá-
garantir: nunca usei meus olhos azuis Diogo Nogueira: "Sofri preconceito la dentro de mim."
e meu tipo físico a meu favor. Inclusive, por ser branco de olho claro"
no meio onde sempre circulei, sofri pre-
conceito por ser branco de olho claro.
,
Crível/a) está com a cabeça'? Esses cor-
EPOCA - Resistiu em seguir a carreira tes absurdos paralisaram os traba.lhos
de seu pai? nos barracões. Infelizmente, não será
Diogo - Muito. Eu queria mesmo era uma festa luxuosa como estamos acos-
ser jogador de futebol e cheguei a jogar tumados. Vai ser o Carnaval da raça, da
profissionalmente. Mas tive um proble- garra que as comunidades têm.
ma no joelho e fui obrigado a parar. Com
isso, fiquei um tempo perdido, lá pelos ÉPOCA - Política se mistura com
meus 23 anos. Não sabia o que fazer, e a Carnaval?
música entrou. Nunca me obriguei a dar Diogo - Claro, no mundo de hoje tudo
continuidade ao que meu pai começou. está interligado. Precisamos sempre
Aconteceu de forma orgânica estar atentos à democracia. Os atos
políticos, mais do que nunca, no próxi-
ÉPOCA - Com os cortes de verbas, o mo ano, vão interferir na nossa maior
que esperar do Carnaval carioca? festa. Nesse meu CD tem uma canção
Diogo - É triste ver agir assim um políti- chamada "Tempos difíceis", em que
co que comanda uma cidade que, princi- falo disso tudo que estamos vendo aí.
pa.lmente durante o Carnaval, vive muito Ouve lá: dou uma porrada, mas com
do turismo. Onde essa pessoa (Marcelo luva de pelica.

94 1 ÉPOCA 111de dezembro de 2017 Fotos: Leo Castro/ ÉPOCA, Carla Barraqui
WALCYR CARRASCO


s .........
ersona 1_ a_ es

ndo surpreso como as redes sociais transformam as Faz parte da minha vida. Em geral, são pessoas sem experi-
A pessoas. Ou revelam outros lados da personalidade.
Os nudes, por exemp lo. Sou de uma época em que havia
ê11ciana área artística, para quem o sucesso na mídia é algo
instantâneo e milagroso. Nã.o uma profissão. Esse amigo
prós e contrários à nudez. Uma atriz famosa, ao posar nua, de quem falei abriu o Instagram de alguém que tentava
provocava escândalo - e maravilhamento. Algumas se ne - uma nova amizade. Ela só seguia famosos.
gavam: nua, jamais. Homens, nem pensar . Hoje ficar nu é - É óbvio o fascínio pela fama.
habitual. As pessoas postam fotos sensuais. Enviam junto Conhecem-se as profundezas e até os desvios do caráte r
com o primeiro "oi, tudo bem". Eu não caí na tentação do ana lisando as redes sociais de alguém. Essas mesmas pes-
nude devido a minha barriga. Explico. Quando olho para soas, muitas vezes, na vida cotidiana são tímidas. Têm pro-
baixo, vejo somente meu umbigo. Não me sinto habilitado fissões comuns. Por que postam cada pedaço de pizza no
a posar para um cliqu e pe lado. Já se tornou comum certo fim de semana? óbvio. A possibi lidad e de aparece r estimu-
tipo de escânda lo: um ator famoso é flagrado num vídeo la o exibicionismo. São poucos os que postam livros. Frases,
íntimo. Viraliza nas redes. Eu me pergunto: foi mesmo há muitos. Mas a maioria gosta de mostrar a si mesmo. Ou
11ma câmera oculta? Ou um vídeo transmitido pelo pró- até de estabe lecer uma relação de poder. Recentemente, um
prio para alguém? Pior: quem sabe o próprio alvo do es- amigo de muito tempo separou-se. Pediu a todos os seus
cândalo seja autor do vazamento? amigos que excluíssem seu ex das próprias redes. Argumen-
Likes viciam tanto quanto o crack. tou que era uma atitude para deixar claro
Tenho um amigo que posta fotos de si ao rapaz que já não pertencia a seu mundo.
mesmo sem camisa, na academia, na Pessoalmente, sou adepto do velho ditado:
praia etc. É um execut ivo de mais de 40 AS PESSOAS POSTAM "Em briga de marido e mulher, ninguém
anos. Em sua loucura, posta também as mete a colher': Adaptado para os novos
viagens de fim de semana, que começam
FOTOS SENSUAIS. tempos, que r dizer simp lesmente: quando
na sexta-feira e terminam na tarde de ENVIAMJUNTO COM um casal se separa, melhor não tomar par-
segunda-feira. Perdeu um emprego, por O PRIMEIRO "OI". tido. E se depois os dois voltam? Terei fei-
motivos nebulosos. Fez entrevista para to péssimo papel. Também considerei a
outro. O futuro chefe pediu: LIKESVICIAM TANTO questão do ponto de vista ético. Um que-
- Não se exponha mais na int ernet. QUANTO O CRACK ria dar uma demonstração de poder sob re
Adiantou? Não. Meu amigo segurou o outro. Por que devia participar disso? E
duas semanas . Admitido, voltou a publi- não excluí o outro.
car fotos sem camisa, com a expressão de quem se acha a Resultado: recebi de meu ex-amigo, pela internet, uma
suprema beleza neste Universo. Por que acredita que seus mensagem que até me chamava de "alm a trevosa". Franca-
seguidores têm interesse em vê- lo na academia pratica- mente, alguém falaria isso ao vivo? O distanciamento da
mente todos os dias? Ou de sunga na praia? Conversei. int ern et é que permite tal nível de hostilidade. Se estivés-
- Cuidado ao postar todas as fugidas de fim de semana, semos conversando, discutiríamos e a amizade continuaria.
inclusive a outros países. Vai causar descontentamento e Mas, diante de tal mensagem, reagi. Excluí meu antigo
inveja entre quem trabalha com você. amigo de todas as minhas redes, bloqueei etc. Mas me
Ficou duas semanas sem postar. Agora não resiste mais. assustei com a maneira como as redes sociais evidenciam
Exibe os cliques. Não causa só inveja. Evidencia que está aspectos de alguém, que nã.o conheceríamos de outra ma-
matando tempo do trabalho. Não há mais o que dizer. A neira. Mais. Estimulam esses aspectos a emerg ir.
internet transformou um homem até tímido num exibicio- Co ntinuo a ser um admirador da int ernet e de tudo
nista. Outro amigo já sabe analisar a personalidade de alguém que ela proporciona. Mas não me engano mais. É perigo-
por meio de quem segue. Examina os amigos nas redes so- sa até para minha própria pe rsonalidade. Ainda bem , já
ciais. Descobre qual é seu campo de interesse. Recentemen- me dei conta. É um vício. +
te, estávamos falando sobre uma pessoa que se aproximou
de mim. Como costuma acontecer, há muita gente que for-
ja uma amizade, garantindo que não tem a menor vontade Walcyr Carrasco é jo rnalista, aut or de livros,
de ser ator ou atriz ... para depois dar o bote e pedir um papel. peças teat rais e nove las de te levisão

96 1 ÉPOCA 111de dezembro d e 2017


JOSÉ GOMES TEMPORÃO

• • •
ais raciona 1
. ,,,,
1scussaoso
o dia 27 de novembro, a Academia Nacional de Me-
N dicina (ANM) enviou uma carta aberta para a mi-
nistra Cármen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF),
em 2016 comprovou que em países onde o aborto foi
legalizado houve uma queda tanto no número de proce-
dimentos quanto no de mortes maternas. Esse fenômeno
em que defende a descriminalização do aborto até a 12ª também foi bem documentado em países como Portugal
semana de gestação. AANM, cuja fundação em 1829 an- e Uruguai , que não apenas legalizaram a interrupção
tecede à do STF em mais de 60 anos, sempr e contribuiu voluntária da gravidez, mas ampliaram a oferta de ser-
para balizar o debate sobre saúde baseado em evidências. viços de saúde reprodutiva.
A prática do aborto é bem mai s antiga que a Academia e O Brasil já possui uma das legislações de aborto mais
o STF e, pelo menos, desde a Antiguidade está entre as restritiva s do mundo. É necessário ampliar os casos em
opçõe s que as mulheres têm para controlar a sua repro - que uma mulher pode ter acesso a métodos seguros de
dução. A interrupção voluntária da gravidez sempre foi interrupção da gravidez, não restringi -los. Iniciativas
utilizada e não diminui porque uma par- como a Proposta de Emenda Constitu-
te da popu lação a desaprova. cional (PEC) 181, além de contrárias ao
Fazer de conta que o aborto, por ser que demonstram as evidências científi-
ilegal, deixa de ocorrer é condenar 500 PORQUE AS cas, estimulam um debate baseado em
mil mulheres brasileiras todos os anos opiniões e não em fatos.
aos riscos de um procedimento clandes- BRASILEIRAS A posição da ANM nesse tema é am-
. ~ .
tino. E preciso encarar o tema com ra- TÊM DE SER plamente partilhada entre as organiza-
cionalidade e a perspectiva da saúde nos ções profissionais do campo da saúde. A
dá instrumentos para isso. Temos as evi- PRIVADASDE Associação Brasileira de Saúde Coletiva
dências científicas necessárias para de- INTERVENÇÕES (Abrasco ), a Federação Brasileira de Gi-
senvolver políticas públicas que podem MÉDICAS SEGURAS? necologia e Obstetrícia (Febrasgo) e o
salvar vidas e reduzir sequelas evitáveis. Conselho Federal de Psicologia, além de
Hoje, há diversos métodos seguros, outras 18 organizações, já protocolaram
recomendados pela Organização Mundial da Saúde, para documentos no STF apoiando uma ação em curso em
a interrupção voluntária da gravidez. Quando usados pro l da descriminalização do aborto no Brasil.
com o apoio especializado, reduzem as consequências Rebeca Mendes, a mulher que recentemente pediu ao
adversas para as mulheres e os índices de mortalidade STF o direito de interromper sua gravidez de maneira
materna. No Brasil, ele atinge taxas incompatívei s com o segura, é apenas a mais visível entre as centenas de mi-
nosso grau de desenvolvimento. Todos os anos, temos lhares de brasileiras que enfrentaram sozinhas os riscos
mais de 200 mil internações no SUS por complicações de um aborto ilegal neste ano. É chegada a hora de dei-
relacionadas a aborto. Por que as brasileiras têm de ser xarmos as impressões subjetivas de lado para avançarmos
privadas de intervenções médicas seguras que estão dis - em um debate com base em dados e na experiência
poníveis para as francesas, canadenses, sul-africanas, documentada ao redor do mundo. +
indianas e para mulheres em dezenas de outros países?
Há quem diga que proibir o aborto salva vidas, mas
essa afirmação não encontra nenhum amparo na litera - José Gomes Temporão, médico sanitarista, ex-min ist ro da Saúde, com os
médicos Jor ge Fonte de Rezende Filho e Carlos Antôn io Barbosa Montene gro.
tura científica. Ao contrário, quando o aborto é ilegal, ele Os três são membros titu lares da Academ ia Naciona l de Medic ina
acaba ocorrendo de forma arriscada e é mais frequente.
Um estudo publicado no periódico britânico The Lancet A cada edição, um rep resentante da soc iedade abordará um tema de interesse do leitor

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