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INSTITUTO DE ARTES
DEPARTAMENTO DE MÚSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA –
MESTRADO E DOUTORADO
Memorial de composição
por
James Corrêa Soares
Porto Alegre
2003
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO SUL
INSTITUTO DE ARTES
DEPARTAMENTO DE MÚSICA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM MÚSICA –
MESTRADO E DOUTORADO
Memorial de composição
por
James Corrêa Soares
Orientador
Prof.Dr. Antônio Carlos Borges Cunha
Porto Alegre
2003
AGRADECIMENTOS
recital: Luciane Cuervo, Catarina Domenici, Antônio Carlos Borges Cunha, Diego
Instituto de Artes da UFRGS, pela cedência das caixas de som JBL para a realização
do concerto.
é dedicado.
deste trabalho.
Resumo
composições O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam, para violão e sons eletrônicos;
Danças & Intermezzi, para piano e sons eletrônicos; Figurações Percusmáticas, para
sons eletrônicos com difusão em estéreo; e Ets Chayim, para clarinete, percussão,
propostos por Mikhail Malt e Robert Morris. São feitas considerações sobre a
como fonte conceitual e/ou criativa para a composição; a influência estética dos
pieces O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam ( The Garden of the Forked Paths),
for guitar and electronics; Spells for soprano, alto and bass recorders (one player) and
live electronics; Dances & Intermezzi, for piano and electronics; Figurações
Percusmáticas for electronics (in stereo sound diffusion) and Ets Chayim (The Tree-
of-Life), for Bb clarinet, percussion, piano, violin and cello. The description of the
pieces follows the model of the compositional process systematized by the author
based on the models proposed by Mikhail Malt and Robert Morris. This memorial
also presents some considerations on the aesthetic thoughts that influenced the
composition of the pieces, such as: the computer as a tool for composition, sound
design and performance; the use of elements from other music cultures as source
material to new works; and the influence of the composers György Ligeti and Kaija
Saariaho.
assisted composition.
“Nevertheless I used to be very much against
Kaija Saariaho
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................................................................................................. 1
BIBLIOGRAFIA........................................................................................................................................................................................... 103
ANEXO........................................................................................................................................................................................................... 109
INTRODUÇÃO
Jardim dos Caminhos que se Bifurcam, Spells, Danças & Intermezzi, Figurações
Sul.
segundo volume contendo as partituras das composições O Jardim dos Caminhos que se
Bifurcam, Spells, Danças & Intermezzi e Ets Chaiym, e de um disco compacto com o
Nos capítulos dois e três, referentes às peças O Jardim dos Caminhos que se
Intermezzi, a primeira seção trata do Impulso Gerador da peça como um todo; as outras
descrevem as três fases restantes separadamente para cada movimento: 4.2 – Meta-funk;
4.3 – Intermezzi I: Espelho de Areia; 4.4 – Dança de Inverno; 4.5 – Intermezzi II:
Espelho de Granito; 4.6 – Círculos de Fogo. No quinto capítulo, que trata da peça
foram descritas em seções separadas, e as duas últimas fases, aglutinadas em uma única.
O último capítulo, que descreve a composição de Ets Chayim, está organizado em três
2
Para finalizar esta introdução, duas considerações fazem-se necessárias. No
decorrer desse trabalho são citados alguns algoritmos desenvolvidos pelo autor e
utilizados na composição das peças deste projeto. Esses algoritmos foram programados
Modeling a qual desenvolvo desde 1998. OM-Modeling está sendo implementada como
descrição dos processos composicionais, foi utilizado para descrever a organização das
alturas o sistema de notação da Teoria de Conjuntos Classes de Notas (Pitch Class Set
Theory) desenvolvida por Allen Forte. Por não fazer parte do objetivo desse trabalho,
essa teoria não será apresentada. O leitor não familiarizado com a Teoria de Conjuntos
Classes de Notas poderá consultar os autores Forte, The structure of atonal music, e
3
1 - CONSIDERAÇÕES ESTÉTICAS E MODELO DE PROCESSO
COMPOSICIONAL
trabalho, não necessariamente inéditos no cenário musical. Esse interesse por diferentes
culturas musicais no meu cotidiano composicional. Nas composições deste portfólio, essa
automática, meu interesse é pelo uso do computador como ferramenta para gerar e/ou
descritas neste trabalho, em especial nas obras O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam,
4
Spells, os dois Intermezzi de Danças & Intermezzi e no sexto movimento de Ets Chayim,
Geburah. Como ferramenta de síntese sonora, o computador pessoal, hoje, torna possível
sons eletrônicos com qualidade profissional, até poucos anos encontrada apenas em
fundamental para meu direcionamento estético atual. O uso de sons eletrônicos ao lado de
instrumentos acústicos, que é o principal uso dessa tecnologia nas composições desse
musicais. Além disso, a integração desses meios instigou a concepção de idéias novas no
discurso meta-lingüístico em tempo real, sobre o que é interpretado pela flautista, foi
outras disciplinas possibilita a expansão do pensamento musical, tanto no que diz respeito
5
Ao longo de minha trajetória musical experienciei, como intérprete, compositor e
consumidor, diferentes “músicas”, tais como, a música popular brasileira, o jazz e o rock.
Nas composições deste projeto procuro integrar elementos dessas culturas musicais ao
meu trabalho como compositor, não como citações ou imitações estilísticas, mas com a
intenção de criar uma forma de expressão musical pessoal. Essa integração ocorre de
Caminhos que se Bifurcam, uma técnica de execução característica do rock, até o mais
conceitual, como na composição Danças & Intemezzi, em que foram usadas como fontes
compositor na sociedade atual de György Ligeti e Kaija Saariaho são referências para
pensamento musical: “ Eu sou inclinado a não ter uma opinião muito alta sobre artistas
resto de suas vidas. No meu próprio trabalho eu prefiro estar constantemente retestando
com outros procedimentos.” “ Eu não tenho uma idéia fixada para onde tudo isso está
levando. Eu não tenho uma visão definitiva do futuro, nem um plano geral; de um
labirinto. Assim que um passo à frente tenha acontecido, ele já está no passado, e depois,
6
há um sem número de concebíveis ramificações para o próximo passo” (TOOP, apud
LIGETI, 1999, pg. 141 e 179). A posição de estar sempre buscando novas maneiras de se
artista não pode rejeitar a sociedade completamente, até porque ele vive nela…Com a
tecnologia de hoje, qualquer um, mesmo nas mais remotas partes da Lapônia, pode, por
transformando de uma nova maneira. Nos impondo suas imagens e sons, as mídias
que o cerca, a cada dia mais global, buscando transpor as fronteiras entre meios,
sentimentos. Para mim, esse intercâmbio passa pelo interesse em outras áreas de
conhecimento, como a física, a informática, as artes visuais e a literatura, bem como, pela
colaboração com diferentes artistas. Duas composições desse projeto são resultantes da
colaboração com diferentes intérpretes: Spells, com a flautista Luciane Cuervo e Danças
& Intermezzi, com a pianista Catarina Domenici. O processo de composição dessas peças
7
amálgama entre a concepção estética do autor e as características expressivas de cada
intérprete.
necessidade de compor uma obra e o seu registro em partitura, significando aqui todo e
Mikhail Malt, em seu artigo Reflexiones sobre el acto de componer (MALT, 1999); e o
segundo, proposto por Robert Morris, em artigo intitulado Compositional spaces and
fundo e também se elabora uma espécie de teoria que conduzirá a obra. (…) A segunda
fase é descritiva, é o momento em que os conceitos tomam forma para compor a obra.
8
Esta fase será de materialização das idéias, de escrita e realização” (MALT, 1999). Para
estabelecer uma transição entre a fase conceitual e a de realização, Malt propõe uma
proposto por Malt, “o ato de compor é um processo dialético permanente entre o mundo
processo;
1995);
9
- Design Composicional/ improvisação livre: a primeira etapa de organização
parte de seu modelo, não apenas por considerar este o objetivo do compositor,
mas, segundo ele, “porque possui um grande impacto em futuras mudanças nos
outros estágios”.
musical e organização da estrutura formal. Após o estudo dos artigos de Malt e Morris,
10
1.3 - Modelo de processo composicional
Composicional.
Impulso Gerador
nova composição. A escolha do seu título é feita nesta fase. Durante o processo de
composição das obras deste memorial, observei que a ausência de um título resulta de
Estruturação Formal
11
Delimitação do Espaço Composicional
modo e que possui como principal característica não ser organizado temporalmente”
seleção dos materiais musicais a serem utilizados na composição de uma peça. Esses
materiais, ou objetos musicais, como são denominados por Morris, definem a linguagem
espaço composicinal, apesar de não estarem definidos em uma escala temporal, aparecem
pela intuição musical. Por vezes, essas decisões desencadeiam desvios no que já foi
interativo e flexível, figura 1.1. Desse modo, o processo composicional integra de forma
12
orgânica o trabalho detalhado, pré-estruturado das etapas de estruturação formal e de
processo composicional das peças sem, contudo, restringir o trabalho intuitivo e empírico
No âmbito desse trabalho, o modelo apresentado foi utilizado como moldura para
13
2 - O JARDIM DOS CAMINHOS QUE SE BIFURCAM
O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam, para violão e sons eletrônicos, foi
como parte de um ciclo de nove peças para violão, chamado Memorial para J.L.Borges,
iniciado em 1996, nos Estados Unidos, sendo o título retirado de um conto homônimo de
Borges. Das três peças já concluídas, apenas O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam faz
Katherine Neville. O livro é uma ficção sobre o mítico serviço2 de xadrez de Carlos
personagens são tratados no romance como peças e jogadas de uma partida de xadrez. A
1
As outras duas peças, A Biblioteca de Babel e Shifting Mirrors, foram compostas nos anos de 1996 e
1999, respectivamente.
14
personagens serviu de metáfora para a interação entre o violão e a parte eletrônica, figura
2.1. O violão e os sons eletrônicos interagem na primeira parte da peça em uma constante
disputa pela hegemonia do discurso musical. Essa relação vai tornando-se tensa à medida
que se aproxima o ápice da peça. Na segunda parte o violão e os sons eletrônicos fundem-
Fig. 2.1: Estrutura da narrativa do romance The Eight e sua projeção na organização de O Jardim dos
Caminhos que se Bifurcam
2
Serviço é como se chama o conjunto de peças mais o tabuleiro do jogo de Xadrez.
15
2.2 - Estruturação formal
temporal de oito minutos dividido em duas partes, de acordo com as proporções da Seção
Áurea. As duas partes foram subdividas em nove seções: a parte A engloba as seções 1,
em segundos, foram organizadas partindo da série de Fibonacci 15, 15, 30, 45, 75,120.
A Seção Áurea encontra-se no centro da seção seis. Neste ponto localiza-se o ápice
dramático da peça.
Figura 2.2: Gráfico da organização temporal das seções de O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam.
16
por um processo de filtragem, sendo selecionados apenas os parciais3 com maior
amplitude. Esse grupo de oito parciais, após ser adaptado à escala temperada, serviu de
matriz geradora para o espaço composicional da parte do violão, formado pelos conjuntos
PcJ[6,0,10,2], PcK[4,9,3].
áudio gerados a partir de trechos da parte do violão. Esses excertos foram executados e
filtros espectrais que modificam os parciais de cada som, de acordo com parâmetros
3
Parciais são o grupo de freqüências harmônicas e não harmônicas presentes em um som. O número de
freqüências parciais e o comportamento de suas amplitudes durante o tempo são os principais fatores de
17
especificados pelo compositor; alterações temporais e freqüenciais, como aceleração,
Utilizando a parte do violão como material gerador, foi possível criar sonoridades que,
transposição por seqüência numérica. Esta foi realizada somando ao conjunto a ser
transposto uma seqüência numérica, ao invés de um único índice. Um exemplo desse tipo
PcR[10,9,2,6,4].
18
Fig.2.4: Transposição por seqüência numérica
19
Para a composição das seções 5 e 6a, foram selecionadas as coleções
função de transição entre a primeira parte da peça, na qual a escrita é fixa, e a segunda
parte, em que o violão interage com os sons eletrônicos de modo mais flexível. A notação
proporcional foi utilizada para que o intérprete possa reagir com certa espontaneidade aos
eventos da parte eletrônica sem uma definição métrica precisa, preparando assim as
foram compostos dois fragmentos melódicos a serem executados o mais rápido possível e
Organização Rítmica
20
compassos, os quais foram preenchidos por impulsos definidos pela seqüência numérica:
3, 2, 1, 1, 2, 3, 3, 2. Esse processo resultou nas proporções 3:1, 2:2, 1:3, 1:5, 2:8, 3:2, 3:3,
Fig. 2.6: Seqüência rítmica gerada pelas proporções 3:1, 2:2, 1:3, 1:5, 2:8, 3:2, 3:3, 2:2
selecionadas sete para a realização final da composição. A figura 2.7 mostra duas das
21
Fig.2.7: Seqüências rítmicas derivadas da seqüência original
proporção 7:5, ou seja, um compasso em 5/8 dividido em sete impulsos. Esta foi
mostradas na figura 2.9, as quais, inicialmente, foram utilizadas em sua forma original na
composição.
22
Fig.2.9: Seqüências rítmicas das seções 5 e 6a
rítmicas sofreram pequenas modificações nos impulsos, sendo que, na revisão final,
23
Fig.2.10a-b: (a) Seqüência original; (b) seqüência rítmica após alterações
início da parte B, o violão responde, de forma proporcional, aos gestos musicais da parte
24
Nas seções 7 e 8 foi utilizado um fragmento musical que o intérprete deve utilizar como
figura 2.12. Na última seção da peça foram utilizadas figuras repetidas continuamente,
execução desenvolvida por guitarristas de rock, denominada Finger tapping5. Essa técnica
consiste em percurtir as notas com as duas mãos no braço do violão. Dessa maneira, é
possível atingir uma grande velocidade de execução, mesmo alternando notas percussivas
com pequenos glissandos e legatos. A figura 2.13 mostra as duas seqüências compostas
para a seção 9, sendo que as notas executadas pela mão direita possuem as hastes
5
Esta técnica de execução foi muito difundida nos anos oitenta, graças ao virtuosismo alcançado pelo
guitarrista de jazz americano Stanley Jordan. Apesar de ser creditado a ele o desenvolvimento desta técnica,
ela vem sendo usada por guitarristas de rock desde os anos sessenta. Atualmente é também utilizada por
violonistas e compositores na música de concerto.
25
Fig.2.13: As duas seqüências de finger tapping que compõem a seção 9
Parte eletrônica
A parte eletrônica foi composta de duas maneiras, seguindo a divisão formal da
peça (parte A e parte B). Na parte A foram sintetizados diversos fragmentos musicais, por
composta do violão. A parte B foi composta como uma textura granular contínua, criada
pela granulação6 de um trecho da parte do violão, tornando difícil, pela escuta, ao final da
que haveria participação dos sons eletrônicos, as durações de cada intervenção e suas
26
representados na partitura apenas os eventos importantes para o sincronismo entre as
partes. Assim, a notação dos sons eletrônicos teve como função criar um guia de auxílio
musical, com o uso nas outras peças do conceito de Morris, passei a chama-la de
composicional por ser a primeira vez que trabalho com a interação entre um instrumento
estabelece uma nova fase no meu desenvolvimento como compositor, marcada pela
6
Granulação refere-se aqui ao uso da técnica de síntese granular, tendo por material um arquivo sonoro e,
não, um ciclo de onda senóide.
27
O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam foi estreada em maio de 2001, em
violão.
28
3 - SPELLS
Spells foi comissionada pela flautista Luciane Cuervo para fazer parte do seu CD,
29
3.2 - Estruturação formal
crescente de durações. As seções dos grupos B e C foram concebidas como variações das
segundos:
Grupo A 1A 2A 3A 4A 5A 6A 7A
Grupo B 1B 2B 3B 4B 5B 6B 7B
Grupo C 1C 2C 3C 4C 5C 6C 7C
30
Fig.3.1: Ordem final das seções, divididas por instrumento utilizado
execução das flautas soprano, contralto e baixo. Para evitar a quebra no fluxo musical, a
pré-gravados:
31
3.3 – Delimitação do Espaço Composicional
amplo.
√
œ
?
œ &
peça.
32
resultando em um conjunto de parciais não-harmônicos7. A terceira coleção resulta da
intersecção entre os dois primeiros conjuntos, ou seja, é formada pelas notas comuns aos
conjunto II; e a terceira de conjunto III. As figuras 3.3a, 3.3b e 3.3c mostram em notação
Fig.3.3b: Coleção formada pela nota ré sustenido e parciais 2,3,6,9,12,15,16,19,29, após frequence shift
7
Parciais que não estão relacionados com a fundamental por uma razão de números inteiros.
33
Após a definição dessas coleções, foram realizados dois processos de
interpolação foi feita entre o conjunto I e o conjunto III, resultando em uma filtragem
conjuntos III e II, reverte o processo anterior de filtragem, causando uma adição gradual
coleções pivôs circuladas; o conjunto III apresenta a repetição da nota lá sustenido apenas
8
Essas operações foram realizadas utilizando a biblioteca de funções Profile, do programa de auxílio à
composição OpenMusic.
34
Além desses conjuntos de notas, foi utilizado um pequeno grupo de multifônicos,
tendo como fundamentais as notas fá, lá e si bemol. Esses multifônicos foram articulados
A composição de cada uma das sete seções do grupo denominado A foi realizada
de modo independente; cada seção foi composta como uma pequena peça isolada. Para
cada uma das seções foram selecionados diferentes materiais musicais e características
seções 7 são compostas de frases longas e melancólicas, interrompidas por figuras curtas
35
As seções 1A, 2A e 3A foram compostas utilizando o conjunto de multifônicos e
glissando foram notadas na partitura fazendo uso das notas da escala de dó maior, por ser
como um glissando. Em função de suas durações serem curtas, essas seções foram
seguintes: 1C, 1D, 2C, 3C e as seções 3B, 2B, 1B, que foram agrupadas para a criação da
parte final da peça. Nessas sete seções foram utilizados os mesmos multifônicos das
Seção 1A
Seção 1C
36
Seção 1D
A seção 4A foi composta utilizando as notas dó sustenido, sol, mi, sol sustenido,
si e ré, sendo esse grupo de alturas parte do décimo nono conjunto resultante do processo
por meio de delays com diferentes tempos de espera, criou uma textura polifônica densa
Fig.3.7: Parte executada pelo intérprete e duas possibilidades de padrões rítmicos (início do segundo
sistema, pág.4)
permutações foi o décimo quarto conjunto de notas – fá, lá, si, ré e fá sustenido – , sendo
37
as notas lá e fá sustenido substituídas pelas notas lá sustenido e sol, respectivamente. A
substituição dessas notas deu-se por sugestão da flautista Luciane Cuervo, tornando a
computador, como na seção A4. A 4C foi composta em três módulos: o primeiro é uma
transposição de uma segunda maior acima do conjunto de notas da seção 4B; o terceiro
foi composto fazendo uso de um conjunto de alturas derivado dos usados nos módulos
anteriores. Esse conjunto foi formado por duas notas - si e ré -, do usado no primeiro
módulo; e três do segundo módulo – dó sustenido (ré bemol), mi e sol. A textura da seção
estruturais três tipos de gestos musicais: trinados, trêmolos e apogiaturas. Esses gestos
(frulato), foram usados como transição entre nota e ruído. Esse gesto de transição foi
construído pela repetição de uma mesma nota em uma pequena seqüência de semi-fusas
38
Fig.3.8: Gesto de transição entre nota e ruído. Terceiro compasso da seção 5A, página 6
ao usado pela técnica de síntese granular, para derivar seqüências musicais a partir de um
Granulus2.
9
Esse algoritimo faz parte da biblioteca de funções de auxílio à composição OM-Modeling, que vem sendo
desenvolvida e programada em linguagem LISP pelo compositor. OM-Modeling está sendo implementada
como uma biblioteca de extensão nos ambientes de Composição Assistida por Computador OpenMusic e
Common Music.
39
Fig.3.9: Processo de trabalho do algoritmo Granulus2
O material gerador utilizado foi extraído das seções 5A e 5C, sendo o algoritmo
empregado cinco vezes para cada seção. O resultado foi impresso e revisado
musicais expressivas. A figura 3.10 mostra o primeiro compasso da seção 6B, gerado por
40
Fig.3.10a: Compasso gerado por Granulus2
As seções 7A e B, para flauta baixo, foram compostas como uma única seção e,
após estar concluída, foi dividida em duas. Nessas seções o discurso musical da flauta foi
no registro grave-médio da flauta baixo. Para a construção rítmica do primeiro nível foi
estabelecido um grupo de sete compassos organizados na seguinte ordem: 6/8 6/8 7/8 7/8 6/8
7 4
/8 /8. Estes foram preenchidos por grupos de impulsos assimétricos obedecendo à
mesma ordenação númerica dos pulsos de cada compasso, resultando nas figurações
seção 7B, foi composta com uma permutação dos compassos da primeira parte, figura
41
Fig.3.11a: Figurações rítmicas referentes à seção 7A
Essas intervenções são fragmentos melódicos, executados o mais rápido possível, que
discurso musical lento e estável das seções 7A e 7B. Fazendo uso dos conjuntos oito e
42
temporalmente, de modo a criar um acúmulo gradual de interrupções na melodia
grupos.
Fig.3.12: Seqüência melódica dividida em grupos, de acordo com a série numérica 3,5,7,5,5,7,5,3
Utilização do computador
possuem parâmetros com valores a serem definidos pelo intérprete, permitindo inclusive
a variação dinâmica dos valores durante a performance da peça. Assim, com o controle
desses parâmetros deixado a cargo do intérprete, a partitura indica apenas quando deve
43
EFX-01: Conjunto de cinco unidades de Delay, com tempos variados entre 200 e
2000 milissegundos;
EFX-02: Conjunto de dez unidades de Delay, com tempos variados entre 500 e
7000 milissegundos;
EFX-03: Conjunto de duas unidades de flanger, com freqüência e profundidade
variadas (freqüência entre 3 e 10 Hz e profundidade entre 0.3 e 1.0) e uma unidade de
reverberação;
EFX-04: Conjunto de uma unidade de modulação em anel (ring modulation) e
uma unidade de pitch shift;
EFX-05: Conjunto de três unidades de delay, com tempos variados entre 250 e
1000 ms.; mais uma unidade de flanger, uma de phaser e um filtro (low pass).
sonoros gerados, sound-01, sound-02 e sound-03 foram utilizados nas transições entre as
seções 7A -> 1D, 4B -> 2C, 6A -> 7B, 7B -> 5C. O arquivo sound-final foi utilizado na
áudio pré-gravados são controlados por uma interface gráfica, desenhada para ser operada
10
Foram registradas, tendo Luciane Cuervo como intérprete, as seções 1A, 2A, 3A, 6B, 3B, 2B, 1B.
44
peça Spells, mas, como qualquer instrumento musical, pode ser utilizado em futuras
eletrônicos, na qual, a performance não está constrita pela rigidez cronométrica. Por outro
vezes, a manutenção da peça no repertório dos intérpretes, considerando que ainda é mais
a fase em que são definidos modelos que permitem adaptar os conceitos abstratos à
composicional por ser esta a fase, na qual, manipulando o material delimitado como
45
Spells foi publicada em CD, tendo por intérpretes Luciane Cuervo nas flautas-
46
4 - DANÇAS & INTERMEZZI
Catarina Domenici de uma peça para piano e sons eletrônicos, baseada em uma dança
peça, optei pela expansão do projeto, concebendo assim um ciclo de três danças
compostas para piano e sons eletrônicos, intercaladas por dois intermezzi para piano-solo.
As peças para piano e sons eletrônicos Meta-funk, Dança de Inverno e Círculos de Fogo
foram compostas a partir de duas danças e de uma canção oriundas de diferentes culturas
musicais.
A influência das fontes originais no resultado de cada uma das três peças dá-se em
derivado de um excerto da gravação do funk Get it Together, realizada pelo grupo norte-
Círculos de fogo, o padrão rítmico cíclico do Ponto de Iansã, dança ritual de religiões
47
afro-brasileiras, além de seu uso literal em alguns momentos, também guiou a intenção
expressiva da peça.
discurso musical. Essa disputa dá-se pela alternância entre momentos que o piano conduz
rítmico derivado da baguala, utilizado na parte eletrônica. Essas três linhas rítmicas,
se, desse modo, dois discursos simultâneos. A justaposição da estrutura cíclica da parte
do piano às densas seções da parte eletrônica criam um acúmulo de tensão que determina
as danças que os antecedem, bem como preparação para a que vem depois. A concepção
48
estrutural dos Intermezzi foi motivada pelas múltiplas possibilidades de reflexão de
Danças & Intermezzi foi concebida para ser executada integralmente. No entanto,
4.2 – Meta-funk
Estruturação formal
interação entre piano e sons eletrônicos: sons eletrônicos com intervenções do piano;
Para cada uma das seções foi estabelecido um único modo de interação entre a parte
modo:
49
Seções Compassos Modo de interação
1 1-6 Eletrônicos/interv.piano
2 7-16 Piano-solo
3 17 Sons eletrônicos-solo
4 18-24 Piano = sons eletrônicos
5 25 Sons eletrônicos-solo
6 26-29 Piano-solo
7 30-34 Eletrônicos/interv.piano
8 35-49 Piano = sons eletrônicos
de um excerto da gravação do funk Get it Together, realizada pelo grupo Jackson Five.
O resultado da análise espectral foi transcrito para a notação musical tradicional com o
auxílio do programa OpenMusic. Como a quantidade de parciais era excessiva, foi feita a
opção pelo uso dos parciais graves, chegando por fim à seqüência de notas mi bemol, dó,
50
O espaço composicional da parte eletrônica se resume ao próprio sample,
utilizado como fonte geradora para o conjunto de notas da parte do piano. Para os sons
organização temporal dos trechos eletrônicos. Tendo a parte eletrônica como estrutura
improvisada.
contrabaixo elétrico nos grupos de funk, figura 4.2. Dessa figura melódica foram
e 6. A seção 4 foi composta como um grande arpejo do acorde [ré bemol, lá bemol, si, e
sol] por vários registros do piano. Esse acorde foi construído sobre o ré bemol, utilizando
notas que não pertenciam ao espaço composicional, criando, dessa forma, um contraste
harmônico maior com as outras seções. A peça termina com o piano executando
51
Fig.4.2: Figura melódica alusiva ao acompanhamento do contrabaixo elétrico dos grupos de funk
Estruturação formal
modo semelhante à forma Tema e Variação. A primeira seção foi a matriz geradora, ou
52
composição da primeira seção. As seções 2-5 foram derivadas da primeira pelo uso de
œ œ
&œ œ bœ œ bœ bœ
Fig.4.3:Coleção de notas que formam o espaço composicional de Espelho de Areia
Após sua conclusão, a primeira seção foi “refletida” três vezes, gerando assim as
onde “A” é a linha melódica superior; “B”, a linha inferior; e “R”, o retrógrado.
11
Em alusão à metáfora dos espelhos, descrita na seção 4.1 deste capítulo.
53
retrógrados são refletidos retornando à sua forma original, mantendo a inversão das
Fig.4.5: Representação gráfica dos reflexos aplicados à primeira seção de Intermezzo I: Espelho de Areia
aplicadas ao material da primeira seção sem ordem preestabelecida, sendo alternadas com
passagens que fazem uso de reflexos literais (retrógrados e inversões). A seguir, são
apresentados exemplos das técnicas usadas para a composição das seções 2-4.
Fig.4.6: Reflexo Literal (retrógrado), fim da primeira seção – início da segunda seção, comp.12-13
12
O algoritmo faz parte da biblioteca de funções criada pelo compositor no programa de auxílio à
composição OpenMusic.
54
Original, comp.5-6
Estruturação formal
1-13, enquanto a segunda consiste nos compassos 14-26. A primeira seção foi composta
para sons eletrônicos-solo com uma pequena interferência do piano no final da seção. A
55
entrada definitiva do piano marca o início da segunda seção, em que a parte eletrônica
gongo. Esse timbre foi sintetizado utilizando a técnica de síntese sonora, denominada
Baguala.
÷ 43 Œ Œ ‰ œ äœ . œ. œ œ . äœ œ œ äœ . œ. äœ ä̇ œ äœ äœ . ä̇ œ . >œ
J J
÷ äœ . äœ . äœ œ . œ œ œ äœ . œ. äœ ä̇ œ äœ äœ . ä̇. ˙.
8
J
Fig.4.9: Frase rítmica da parte eletrônica de Dança de Inverno
uma polarização oscilante entre as notas dó e dó sustenido. O piano inicia apenas com a
56
nota dó; na segunda metade do compasso 16, divide-se em duas vozes. No registro grave,
No registro agudo, linha melódica superior, foi utilizada uma seqüência cromática,
derivada do subconjunto[0,1,2,].
Estruturação formal
espelhos, utilizada como impulso gerador dos Intermezzi. No primeiro intermezzo foi
concebida uma seqüência de espelhos circular; para o segundo, a imagem utilizada foi a
superfície dos espelhos como não sendo plana, o reflexo do objeto vai sendo aos poucos
distorcido, chegando ao último espelho da série como um novo objeto. A figura 4.10
57
Fig.4.10: Seqüência de espelhos e processo gradual de transformação
÷˙ œ œ3 œ ˙ Œ œ ˙. œ œ œ. ˙
J
÷‰ œ œ œ œ3 œ Œ ˙ œ œ ˙.
5
J
Fig.4.11a: Seqüência rítmica Seq1
58
÷ œ œ œ œ œ œ œ œ œ œœœ ≈ œ œ œ œ œ œ‰ œ œ
3 5 3
Após a definição das coleções de notas e das seqüências rítmicas, foi realizado um
processo de interpolação dinâmica entre PcA e PcB, e Seq1 e Seq2, resultando em uma
segunda linha rítmica, escrita na clave de fá, foi utilizado um algoritmo denominado
double-reflect13. Esse algoritmo compara as durações rítmicas com valores definidos que
representam os limites superior e inferior; se o valor da duração rítmica for maior que o
limite superior ou menor que o limite inferior é, então, transposto de forma proporcional
13
Esse algoritmo faz parte da biblioteca de funções Profile, desenvolvida por Mikhail Malt e Jacopo
Baboni Schilingi para o programa OpenMusic.
59
Fig.4.13: Conjunto de seqüências rítmicas resultante dos processo de interpolação e de double-reflect.
conjuntos de notas, pela eliminação dos conjuntos repetidos e com um número grande de
esse processo foram realizadas pequenas alterações na parte rítmica para permitir uma
60
4.6 – Círculos de Fogo
Estruturação formal
Para a peça Círculos de Fogo, foram definidos dois planos de organização formal,
um para a parte do piano, e outro para a parte eletrônica. A do piano foi dividida em
cinco seções, aqui denominadas A, B, A’, C, A’’, e a parte eletrônica, em três seções,
delimitado pela escolha de conjuntos de notas diferentes para cada seção. Esses conjuntos
foram utilizados apenas nas seções para as quais foram designados. As seções A, A’ e
61
A’’ possuem em comum a polarização da nota Fá sustenido; para essas seções o espaço
composicional foi delimitado por esta nota e mais uma coleção de outras. A delimitação
62
Modelagem do Espaço Composicional
rítmico do Ponto de Iansã, figura 4.16. A sucessão dos padrões rítmicos acontece em um
crescendo de tensão, causado pelo aumento da densidade textural e pelo uso dos timbres
com timbre metálico. A segunda seção é a mais longa e foi composta alternando rufos de
derivados do Ponto de Iansã. A terceira seção foi composta utilizando o mesmo padrão
63
A parte do piano foi composta em ciclos, em que cada um se caracteriza por
O primeiro ciclo engloba a seção A, que foi dividida em três fases. Inicia com um
fim das seções A, B e o início da seção A’. Neste segundo ciclo, o afastamento inicia no
final da seção A, com um aumento de tensão causado pelo uso crescente de acentos
desenhos melódicos inspirados nos improvisos de pianistas de jazz. Uma nova realização
64
Fig.4.17: Compassos 89-95, início da substituição das oitavas acentuadas pelas notas dos conjuntos PcA’1
e PcA’2
relação ao fá sustenido inicial. Nesta seção os fragmentos melódicos criados pelas notas
ápice encontra-se nos compassos 134-141, em que a figura melódica mostrada na figura
65
A parte do piano e a parte eletrônica direcionam seus discursos musicais
composta com os padrões rítmicos executados em vários andamentos – MM= 120, 135 e
semínima pontuada igual a 80, e a seção B com a semínima pontuada igual a 68. Apesar
Essa foi a primeira peça a ser composta utilizando por completo o modelo de
tipos de materiais.
dezembro de 2002, sendo publicada no CD Plural – James Correa & Eduardo Miranda,
66
5 - FIGURAÇÕES PERCUSMÁTICAS
sons percussivos selecionados para formar a parte eletrônica de Círculos de Fogo. Cada
um dos estudos utiliza um tipo diferente de figuração rítmica orquestrada por diferentes
conjuntos de sons percussivos, mas que possuem algum grau de similaridade. Decidi
mesmo tempo por diferentes grupos de percussão. O título da peça é uma referência ao
caráter percussivo do material sonoro utilizado e ao mesmo tempo uma alusão à imagem
67
5.2 - Estruturação formal
de alguns dos pequenos estudos não aproveitados em Danças & Intermezzi, aqui
68
Duas das Figurações, 1 e 4, foram compostas utilizando softwares específicos de
sonora Chaosynth14. Esse aplicativo utiliza uma técnica específica de síntese granular que
síntese conhecida por FOF15, utilizando a linguagem de programação para síntese digital
Csound.
14
Concebido e desenvolvido na Universidade de Edimburgo, Escócia , pelo compositor Dr. Eduardo
Miranda, ver CORREA, MIRANDA, WRIGHT, 2001.
15
Técnica desenvolvida no Ircam, em Paris, França, por X.Rodet para a síntese de vozes e sons
percussivos.
69
Figurações Percusmáticas é a única peça, deste projeto, composta somente para
meios eletrônicos. O processo composicinal foi realizado, de modo não intencional, sobre
todo o portifolio, onde a estrutura formal foi sendo estabelecida durante a fase de
Maria, RS.
70
6- ETS CHAYIM
Ets Chayim, para clarinete, violino, violoncelo, piano e percussão, teve como
contêm cada uma três Sephiroth, e a coluna central, quatro, e são denominadas de Pilar
centro). As Sephiroth são ainda interligadas por vinte e duas linhas denominadas pela
tradição cabalística de Caminhos, figura 6.1. Nesse símbolo estão embebidos conceitos
esotéricos e místicos acerca do universo e da alma humana16. Cada uma das Sephiroth
Malkuth: O Reino;
Yesod: O Fundamento;
Hod: A Glória;
Netzach: A Vitória;
Tiphereth: A Beleza;
Geburah: A Força;
Chesed: A Misericórdia;
Binah: O Entendimento;
Chokmah: A Sabedoria;
Kether: A Coroa.
16
Para um estudo aprofundado da simbologia da Árvore da Vida , ver REGARDIE, 1999.
17
Sephirah: forma singular de Sephiroth.
71
Os conceitos atribuídos a cada Sephirah impulsionaram a concepção de cada
Chaiym.
72
6.2 - Organização global da obra
fazendo referência aos Pilares da Árvore da Vida: o Pilar Direito foi formado pelos
Pilar Central, englobando os movimentos I/II/V/X. Para cada grupo de movimentos foi
identidade comum entre as peças de cada um dos Pilares. Essas características foram
Pilar Características
73
6.3 – Estruturação Formal, Delimitação e Modelagem do Espaço
Composicional de cada movimento
Estruturação Formal
O primeiro movimento, Malkuth, foi organizado em três seções: A, compassos 1-
29; B, comp. 30-39 e C, comp.40-48. Nas seções A e C, o clarinete ocupa uma posição
piano e violoncelo.
Imaginário IX, composto pelo autor em 1999. A seção A de Malkuth foi composta como
uma reconstrução concisa das três primeiras seções do último movimento do concerto.
1-4.
74
Fig.6.2a: Primeira página de Cárcere do Imaginário IX, comp. 1-3
75
Fig.6.2b: Abertura de Malkuth, comp.1-4
sobreposição de três linhas rítmicas com figuras assimétricas e com acentos não
seção B. Para compor as partes do piano e do violoncelo, foram definidos dois conjuntos
de alturas, figura 6.4. O segundo nível consiste em notas longas (dó e si) na parte do
clarinete e do violino.
76
Fig.6.3: Linhas rítmicas formadas por figuras assimétricas e com acentos não coincidentes
77
seção C, comp. 40-41; e o segundo trecho, no piano, no compasso 43-44. A figura 6.6a
foi realizada uma expansão da parte do clarinete com uma seqüência de arpejos,
acompanhado por acordes de caráter percussivo executados pelo piano e pelas cordas.
Essa seqüência de arpejos possui uma função transitória entre o primeiro trecho utilizado
no clarinete e o segundo excerto executado pelo piano, figura 6.6b. A peça foi finalizada
com gesto pontual composto por um acorde de caráter percussivo executado pelo
clarinete, piano e cordas. O acorde é executado duas vezes em uma seqüência de fusas,
78
Fig.6.6b: Segundo excerto executado pelo piano
Estruturação Formal
Yesod consiste em três seções, A, B e C. A primeira seção, compassos 1-25, foi
segunda seção, comp. 27-55, o piano realiza um contraponto a duas vozes com o baixo
escrito como um moto perpétuo, baseado no walking bass dos contrabaixistas de jazz. A
voz aguda consiste em uma melodia com ritmos sincopados, dobrada pelo clarinete. As
cordas têm intervenções pontuais e não há uso de percussão. A última seção, comp. 56-
para cada seção (A e B). Para a seção A, foram gerados doze conjuntos de alturas
baseado no modelo utilizado por Iannis Xenakis, na obra Achorripsis. A figura 6.7 mostra
79
durações. A parte do piano foi sobreposta ao padrão rítmico repetido em forma de
ostinato pela percussão. O padrão rítmico construído por um ciclo de onze semicolcheias,
em que os acentos foram organizados pela seqüência numérico 2,1,2,2,2,2, foi baseado no
modelo dos ritmos circulares africanos (ver ANKU, 2000), figura 6.8. As cordas e o
80
Fig.6.8: Padrão rítmico utilizado como ostinato na seção A
geração randômica de notas; os outros onze conjuntos foram gerados pelo processo de
seção foi iniciada pela parte do piano. A melodia do clarinete foi composta como uma
redução da voz superior do piano, com a função de ressaltar algumas notas ou desenhos
melódicos. A seção C foi composta como uma pequena cadenza para percussão, tendo
81
6.3.3 – Hod (Glória)
Estruturação Formal
O terceiro movimento, Hod, para clarinete e piano, foi organizado em quatro
seções: A [1-13], B [13-18], C [19-26] e A’ [27-32]. A textura da peça foi definida como
na seção C, piano-solo.
mostrado na figura 6.10. Essa peça foi composta de modo bastante intutivo, sem o auxílio
duas frases melódicas, executadas pelo clarinete na seção A. Essas frases serviram de
matriz para a composição das demais. A seção B, clarinete-solo, foi composta como uma
uma síntese entre os elementos das outras frases da peça. Sendo ritmicamente relacionada
82
com a primeira frase, apresenta também variações de registro, fazendo uso de um grupo
maior de intervalos.
83
5,4,5,2,3,2,3,5,2,3,5. Para o preenchimento dos compassos, foram estabelecidos grupos
figura 6.12 apresenta a seqüência rítmica resultante, que serviu de estrutura para a
foi expandida pelo acréscimo de dois compassos de três por oito, comp.8-9 na metade da
tendo sido concebido dessa forma para contrastar com o lirismo do movimento anterior,
Hod .
Fig.6.12: Seqüência rítmica resultante do preenchimento dos compassos pela seqüência de impulsos
5,4,3,2,3,1,3,5,1,3,3
84
6.3.5 – Tiphereth (Beleza)
Estruturação Formal
O movimento Tiphereth consiste em três seções denominadas A, B e C. A seção
ostinato do piano, reforçado pelas cordas, o clarinete cita a melodia inicial do último
movimento, trazendo características expressivas próprias, bem como dos dois outros
movimentos. A seção A inicia com uma sonoridade construída pelo uso de diferentes
trêmolo com a ponta do arco próximo à ponte, e o clarinete, com o ataque ordinário,
85
realiza um movimento de aceleração e desaceleração (figura 6.14). O resultado é uma
textura rica em harmônicos agudos, com uma expressão delicada e distante. Essa textura
(figura 6.15). Após a interrupção a textura inicial é retomada, acrescida agora das notas ré
86
Fig.6.15:Acordes retirados de Malkuth
87
Fig.6.16:Interferência de acordes no compasso 12
partir do compasso 24, com a entrada das cordas com a nota si, o ostinato do piano passa
a ser uma seqüência de notas por grau conjunto (figura 6.18). Sobre este novo ostinato o
clarinete executa a melodia inicial de Kether, transposta e com o ritmo aumentado (figura
6.19a-b). A seção final é uma transição entre os dois últimos conjuntos de notas do
88
sintética, a transição entre o gestual violento e pontual, característico de Malkuth, para a
estabilidade de Kether.
89
Fig.6.19a: Melodia original realizada pelo clarinete e violoncelo em Kether
criar um discurso musical contínuo. Não havendo subdivisões em seções, nem indicações
individualmente. O Espaço Composicional foi definido por uma frase melódica derivada
90
Fig.6.20: Espaço Composicional de Geburah, melodia derivada de Hod
denominado TransObj-1, desenvolvido pelo autor. Esse algoritmo realiza uma série de
organização rítmica:
escolha do tipo de transformação e dos valores de cada parâmetro é feita pelo compositor.
Partindo de uma melodia como matriz, da escolha dos tipos de transformações e dos
valores definidos para cada parâmetro, o algoritmo organiza uma nova seqüência
selecionados vinte e três para a versão final da peça. Para a ordenação temporal dos
91
fragmentos, foram feitos pequenos ajustes para tornar a transição de um fragmento para
outro o mais imperceptível possível, criando, assim, um discurso musical fluente com
caráter de improvisação.
Fig.6.21: Fragmento melódico número cinco, derivado utilizando diferentes índices de transposição e
permutação de impulsos
de gestos com curta duração, tensos e violentos. Para isso, Chesed foi organizada
92
Fig.6.22: Espaço Composicional de Chesed
finalização dessa etapa, os contornos melódicos foram definidos fazendo uso dos
conjuntos de notas do espaço composicional. A criação das figuras rítmicas, bem como
93
Fig.6.23a: Esboço da estrutura rítmica e do contorno melódico do primeiro módulo
pressão, pressão normal e muita pressão; a região da corda em que o arco estabelece
94
contato – sulla tastiera, sul poticello e posição natural; a pressão da mão esquerda ao
sonoras do instrumento; a figura 6.24 exemplifica dois usos diferentes. Na figura 6.24a o
violoncelista executa o trêmolo na posição sul ponticello com grande pressão no arco.
maior de parciais agudos, misturados com o ruído da fricção exagerada do arco nas
cordas. A figura 6.24b mostra uma seqüência de notas executadas tocando levemente a
corda com a mão esquerda, enquanto com o arco realiza um trêmolo com pouca pressão
na posição sul ponticello. A combinação dessas técnicas resulta em uma textura de sons
glissando, com trêmolo executado com muita pressão no arco e em posição natural, o que
resulta na mistura do som “puro” do violoncelo com o ruído causado pelo excesso de
95
Fig.6.24b: Textura de sons harmônicos criada pela combinação de trêmolo com pouca pressão no arco
em posição sul ponticello e com pouca pressão na mão esquerda
notas em oitavas e o pedal sempre aberto, criando uma sonoridade próxima ao som do
carrilhão. Na segunda seção, o clarinete passa para um segundo plano, o piano realiza um
solo polifônico, e o violoncelo entra ao fim da seção com uma pequena melodia derivada
Na primeira, foi escrita a parte do clarinete. Foram compostas duas melodias, comp.1-7 e
7-19, com notas de longa duração, intervalos melódicos pequenos explorando o registro
com uma sonoridade próxima à do carrilhão, criada através do uso de oitavas executadas
com ataques curtos e o pedal aberto ampliando a ressonância. Na segunda seção, a parte
96
do piano foi composta como um comentário da primeira melodia do clarinete. Utilizando
figuras rítmicas mais curtas e variadas em uma textura polifônica, a parte do piano foi
entra na segunda seção para finalizar a peça, com um fragmento melódico derivado da
Chokmah foi composto em uma seção, exercendo uma função de transição entre
97
6.3.10 – Kether (A Coroa)
final do quinteto Uma visão da Noite, escrito pelo autor em 1995. A forma de Kether foi
estruturada em uma única seção. O espaço composicional foi delimitado pelo conjunto de
notas lá bemol, dó, ré, mi bemol, fá (figura 6.27). Sobre um ostinato harmônico na parte
Ets Chayim foi a última peça composta e a única escrita apenas para instrumentos
98
importância pois possibilitaram o planejamento global da composição auxiliando também
mestrado.
99
CONSIDERAÇÕES FINAIS
dos Caminhos que se Bifurcam, Spells, Danças & Intermezzi, Figurações Percusmáticas
ao trabalho artístico.
compositor. Avanço esse, que, acredito, não seria possível sem o estímulo intelectual e
Instituição.
As três peças centrais deste projeto, O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam,
instrumentos acústicos com sons eletrônicos. Nessas peças, trabalhei a relação entre os
dois meios de modos distintos. Em O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam, todos os
sons eletrônicos foram derivados de uma fonte, o próprio violão; na peça Spells, assim
100
como a anterior, a parte eletrônica deriva do instrumento acústico, mas aqui o discurso
eletrônico é realizado interativamente. Nas Danças & Intermezzi, a parte eletrônica foi
concebida sem nenhuma relação com o piano. A experiência com essas composições foi
eletrônica em tempo real também com grupos instrumentais, bem como com a utilização
de outras mídias.
movimento de Ets Chayim, onde utilizei trechos das obras Cárcere do Imaginário IX e
espaço composicional trechos compostos como estudos para a peça Círculos de Fogo,
último movimento de Danças & Intermezzi, que não foram utilizados diretamente nessa
trajetória composicional, porém, nessas duas obras esse procedimento foi utilizado com
101
Nas considerações estéticas, procurei não definir afiliação a uma corrente estética
deste portfólio.
102
BIBLIOGRAFIA
103
Publishers, 1995.
Forte, Alan. The structure of atonal music. New Haven e Londres: Yale
University Press,1973.
Lévy, Pierre. Cibercultura. Tradução: Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora
34, 1999.
Maor, Eli. To infinity and beyond: A cultural history of the infinite. Princeton:
Princeton University Press, 1991.
Miranda, Eduardo Reck. Composing music with computers. Great Britain: Focal
Press, 2001.
104
winter/summer, 1995.
Schaeffer, Pierre. Trait des objets musicaux. Paris: Editions du Seuil, 1966.
105
Toop, Richard. György Ligeti. Londres: Phaidon Press, 1999.
Winkler, Todd. Composing interative music: Techniques and ideas using Max.
Cambridge: The MIT Press, 1998.
106
DISCOGRAFIA
Coltrane, J. Blue Train. John Coltrane, sax tenor; Lee Morgan, trompete; Curtis
Fuller, trombone; Kenny Drew, piano; Paul Chambers, contrabaixo; Philly Jones,
bateria. Hollywood: Blue Note, 1997. 1 CD (60 min): digital, estéreo. D118230.
Evans, B. Trio 64. Bill Evans, piano; Gary Peacock, contrabaixo; Paul Motian,
bateria. Nova Iorque: Verve,1997. 1 CD (60 min): analógico, estéreo.
3145390582 DG01.
Jackson 5. The ultimate Collection. Los Angeles: Motown, 1996. 1 CD (74 min):
analógica, estéreo. D118073.
Jethro Tull in concert. Londres: BBC, 1995. 1 CD (50 min): digital, estéreo.
WINCD 070.
King Crimson. Discipline. Reino Unido: Virgin, 1989. 1 CD (40 min): digital,
estéreo. EGCD 49.
Ligeti, G. Works for piano. Pierre-Laurent Aimard, piano. Nova Iorque: Sony,
1997. 1 CD (74 min): digital, estéreo. SK 62308.
Murail, T. C’est un jardin secret, ma sœur, une source scellée, une fontaine
close… Alain Nöel, trompa; Ensemble l’Itinéraire; Jeanne Loriod, ondas
martenot; Orquestra Nacional da França; Charles Bruck e Yves Prin, regência.
Paris: MFA, 1992. 1CD (63 min): digital, estéreo. 202122
107
Saariaho, K. Maa – Ballet music in seven scenes. Mikko-Ville, violino; Tuula
Riisalo, viola; Lea Pekkala, violoncelo; Eva Tigerstedt, flauta; Pauliina Ahola,
harpa; Jaana Kärkkäinen, cravo e sintetizador; Tapio Aaltonen e Juhani Hapuli,
percussão; Juhani Liimatainen, sons eletrônicos; Tapio Tuomela, regente.
Helsinki: Ondine, 1992. 1 CD (74 min): digital, estéreo. ODE791-2.
108
ANEXO
Algoritmos Granulus2, ReflexDist-1 e TransObj-1
109
Granulus2 (utilizado em Spells):
Fragmento
melódico dado
pelo compositor
Seleção randômica
de compassos para
gerar grão
Separa
*ritmo altura*
Formatação da nova
seqüência melódica
110
ReflexDist-1 (utilizado em Intermezzo I: Espelho de Areia):
Reconstrução da seqüência
melódica
111
TransObj-1 (utilizado em Geburah):
Aplicação da transformação
112