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si, a perturbação só pode ser concebida quando a relacionamos à idéia de uma finalidade
a ser alcançada, finalidade que a doença perturbou. Patologia implica então “valor”.
Para Canguilhem, de fato é impossível fazer um diagnóstico em medicina sem
fazer apelo a uma informação clínica prévia, a saber, o testemunho do sujeito sobre o
seu sofrimento. Em física, por exemplo, jamais poderíamos falar em patologia, somente
nas ciências da vida, pois a patologia envolve uma referência a um estado do organismo
considerado preferível ou desejável pelo sujeito, problema que evidentemente não se
coloca para uma máquina.
O problema é que para Canguilhem a necessidade de usar um critério qualitativo
não serve simplesmente para tornar mais objetiva a noção da patologia. Pelo contrário,
tal fato denuncia a impossibilidade de uma definição puramente objetiva do fato
patológico. Este juízo de valor não pode ser universalizado, transformado em uma
norma a ser seguida, sob o risco de cairmos num regime normatizante, ou seja, a norma
acaba ganhando um sentido disciplinar de padrão a ser seguido, sendo anormais os que
desviam desse padrão.
com outros indivíduos, mas pela comparação do individuo com ele mesmo, ou entre o
que ele consegue fazer numa situação e é incapaz de fazer em outra. Canguilhem ilustra
este ponto com o caso de uma mulher que só descobriu que tinha hipotensão quando a
levaram para passar férias na montanha. Como ninguém é obrigado a viver em altas
altitudes, ela só veria nisso um problema se um dia viver naquele meio se tornasse
inevitável.
Fica evidente nesse caso que o sujeito se deparou com uma limitação de seu
organismo: uma flutuação do meio revelou-lhe uma incapacidade que ele até então
desconhecia. Tal forma de vida é patológica por não possuir recursos para lidar com tais
transformações.
Se a doença tem sua normatividade própria, faz algum sentido ainda postularmos
uma distinção entre a saúde e a doença? Sim, pois ainda que a doença seja uma norma
de vida, ela é “uma norma inferior, no sentido que não tolera nenhum desvio das
condições em que é válida, por ser incapaz de se transformar em outra norma”.
(CANGUILHEM, 1978, p. 146) Ou seja, a patologia não é uma ausência de regra ou
diminuição da regra, mas um funcionamento inferior.
O ponto capital de que não devemos nos desviar é: estipular um estado como
inferior a outro é inseparável de uma avaliação que o indivíduo faz de qual seria o
funcionamento desejável de seu corpo, o que torna impossível isolar no plano
inteiramente objetivo o fato patológico.