Вы находитесь на странице: 1из 2

De onde vem a

informação
Arquivos brasileiros e norte-americanos alimentam
as investigações sobre os crimes da ditadura

Márcio Ferrari

N
o fim de março, a Comissão Nacional da
Verdade (CNV) denunciou o general re-
formado José Antonio Nogueira Belham
como um dos responsáveis pela morte
do deputado Rubens Paiva, preso e torturado
pela ditadura militar. Paiva foi detido e morto
em janeiro de 1971 em bases da Aeronáutica e
do Exército no Rio de Janeiro. Belham à época
comandava o Destacamento de Operações de
Informações – Centro de Operações de Defesa In-
terna (DOI-Codi) do Rio, mas sempre sustentara
que estava de férias quando Paiva foi preso. Uma
ficha funcional que ele próprio repassou para a
CNV mostrou, no entanto, que ele havia recebido
diárias de serviço justamente naqueles dias. Esquema
O episódio demonstra não só a importância do mam cerca de 10 milhões que estão nos arquivos de método de
espionagem:
exame dos arquivos dos órgãos sob controle da estaduais”, diz Rodrigues. exemplo de
ditadura, como a atenção para detalhes que às ve- Com a Lei de Acesso à Informação, de 2011, o material guardado
zes passam despercebidos até pelas pessoas mais Arquivo Nacional se organizou para, no ano se- no Arquivo
interessadas neles. “A importância principal dos guinte, liberar ao público todos os documentos Nacional

trabalhos da CNV é a possibilidade de articular sobre a ditadura militar, a não ser que estejam
informações testemunhais e materiais vindas de sendo tratados tecnicamente. Estão lá, recolhi-
diversas fontes”, diz Vicente Câmara Rodrigues, dos, todos os arquivos do Conselho de Segurança
assistente da diretoria do Arquivo Nacional para Nacional (CSN), da Comissão Geral de Investi-
o projeto Memórias Reveladas – Centro de Re- gações (CGI) e do Serviço Nacional de Informa-
ferência de Lutas Políticas, 1964-1985, que tem ções (SNI), provenientes da Agência Brasileira
como coordenadora a pesquisadora Inez Stampa. de Inteligência (Abin).
O acervo que agora se encontra reunido em Em cada órgão federal há um representante
rede tornou-se o destino final dos documentos do Sistema de Gestão de Documentos de Arqui-
sobre a ditadura militar quando, em 2005, a Ca- vo (Siga) ou da Casa Civil, que coordena e torna
sa Civil da Presidência da República determinou acessíveis, entre outros, os papéis da ditadura
que as instituições federais transferissem toda a militar, repassando-os ao Arquivo Nacional. Este
informação guardada sobre o período para o Ar- também pode tomar a iniciativa de buscar docu-
Arquivo Nacional

quivo Nacional. Isso decuplicou a quantidade de mentação nesses órgãos. Segundo Rodrigues e
dados sobre o regime abrigados na instituição. Inez, hoje estão recolhidos no Arquivo Nacional
“Só no Arquivo Nacional estima-se que existam os documentos de 30% dos órgãos federais (o que
16,5 milhões de páginas de textos, a que se so- não significa 30% do total de dados).

pESQUISA FAPESP 218 | 43


Uma vez obtidos, os papéis passam por alguns vos”), uma parceria entre
processos antes de chegarem ao público. Primei- a Brown e a Universidade
ramente são classificados sumariamente. Se ne- Estadual de Maringá (PR).
cessário, passam para a área de preservação. Em O site contém quase 10 mil
seguida vão para o controle de informação, onde documentos norte-ame-
são descritos (o que é, quem enviou para quem ricanos produzidos pelo
etc.) e digitalizados. A partir daí são abertos ao Departamento de Estado
público no banco de dados Memórias Reveladas. e pela Agência Central de
Mesmo com todo esse cuidado, nem sempre é Inteligência (CIA). Neles
possível saber se os arquivos foram adulterados. estão registradas obser-
Mas, como cada órgão tinha um sistema de in- vações sobre o perfil dos
formações sigilosas que se reportava ao SNI, as estudantes que se mani-
cópias enviadas para lá são valiosas para compa- festavam contra o regime,
ração com os originais. Nos casos em que os ór- o apoio ativo de parte do
gãos informam destruição (queima) de arquivos, empresariado brasileiro e
é possível comprovar se isso realmente ocorreu detalhes sobre as ativida-
por meio de atas exigidas pelo extinto Regula- des do adido militar dos
mento para Salvaguarda de Assuntos Sigilosos. Estados Unidos, coronel
A troca de informações com a CNV foi reforçada Vernon Walters, nos pri-
pelo deslocamento de funcionários do Arquivo meiros anos do regime.
Nacional para colaborar nos trabalhos de inves- “Estamos encontrando
tigação. E na sede do arquivo há uma área desti- detalhes importantes so-
nada exclusivamente aos pesquisadores da CNV. bre o apoio ao Ato Insti-
tucional nº 5 pela Câmara

O
estado de São Paulo mantém 340 mil re- de Comércio Brasil-Esta-
gistros de fichas do Departamento Esta- dos Unidos em São Paulo
dual de Ordem Política e Social (Deops) e sobre o debate interno
abertos para consulta pública desde o início de no Departamento do Esta-

léo ramos
Arquivo do Deops
1994, por determinação da Secretaria de Cultura. do a respeito dos efeitos do decreto”, diz Green. em São Paulo:
quase 10 milhões
Segundo Lauro Ávila Pereira, ex-diretor do De- “Mas temos que entender que a pesquisa mais
de páginas sobre
partamento de Preservação e Difusão do Acervo, interessante neste momento é um trabalho longo a ditadura
há quase 10 milhões de páginas de documentos e detalhado, juntando fontes, elementos e indí-
sobre a ditadura militar no arquivo, 10% delas cios para construir uma leitura mais densa das
digitalizadas. Os processos de tratamento e di- relações entre os dois países.”
gitalização contaram com apoio da FAPESP e da A participação indireta dos EUA no golpe e
Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, por na ditadura militar foi confirmada em 1977 pe-
meio do edital Marcas da Memória. la pesquisadora Phyllis Parker, que encontrou
Os documentos do Deops são os mais procu- documentação sobre a operação Brother Sam
rados do Arquivo Público do Estado e o fato de já (“irmão Sam”) e publicou um livro sobre o as-
estarem disponíveis há 20 anos formou, segundo sunto, O papel dos Estados Unidos da América no
Pereira, “uma geração de pesquisadores especia- golpe de estado de 31 de março. As violações aos
lizados”. Eles se encarregam do difícil trabalho de direitos humanos haviam entrado na pauta dos
leitura das informações contidas na documentação. assuntos governamentais por iniciativa do pre-
Para evitar perdas, o Arquivo do Estado optou por sidente Jimmy Carter (1977-1981). “Até então as
manter a lógica do arquivamento feito pelos órgãos informações sigilosas não davam ênfase à tortura
de segurança do regime em São Paulo. e a outros abusos da primeira década da ditadu-
Contribuições suplementares e preciosas so- ra”, diz Kornbluh. “Mas os documentos norte-
bre as violações aos direitos humanos durante -americanos que estão sendo revelados agora
a ditadura vêm de pesquisadores dos arquivos lançam luz sobre horríveis agressões cometidas
do governo norte-americano. Dois dos mais im- pelos militares – e também expõem o papel do
portantes estiveram no Brasil para participar Brasil na Operação Condor e outras ações secre-
de eventos que marcaram o 50º aniversário do tas das forças policiais brasileiras no exterior.” n
golpe: James Green, historiador da Universidade
Brown, e Peter Kornbluh, diretor de documen-
tação sobre o Brasil no National Security Archi- Projeto
ve, organização sem fins lucrativos vinculada à Preservação e difusão da memória pública: modernização e amplia-
ção dos laboratórios do Arquivo Público do Estado de São Paulo (nº
Universidade George Washington. 2009/54965-1); Modalidade Programa Infraestrutura 6 - Arquivos;
Green participou da inauguração do site do Pesquisador responsável Carlos Bacellar – FFLCH-USP; Investimento
projeto Opening the Archives (“abrindo os arqui- R$ 1.692.982,33 (FAPESP).

44 | abril DE 2014

Вам также может понравиться