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A PRÁTICA DO AMOR

EM JOÃO 13: A NOVA


COMUNIDADE CRISTÃ*

JOEL ANTÔNIO FERREIRA**

Resumo: partindo de uma visão geral de todo o Quarto Evangelho e focando em Jo13, den-
tro do “Livro da Comunidade”, este artigo quer mostrar como a dialética “morte”-“vida”,
dentro de um grupo de fé, precisa ser enfrentada na prática da comunidade. As posturas de
dois membros próximos a Jesus, ou seja, Pedro e Judas questionam, profundamente, dentro
da igreja, as autoridades e lideranças bem como aqueles que colocam o econômico à frente
de qualquer projeto. Nos gestos simbólicos do “ lava-pés” e da “ceia”, a prática de Jesus leva
os cristãos a decidirem pelo serviço, pela partilha e pela solidariedade até o ponto extremo:
entregar a própria vida por causa do projeto de Deus.

Palavras-chave: Solidariedade. Partilha. Lava-pés. Ceia.

INTRODUÇÃO: NO CONFLITO MORTE-VIDA IRROMPE A FÉ EM JESUS CRISTO

E 
m Jo 20,30-31, primeira conclusão deste Evangelho, é apresentado o grande
objetivo do livro: revelar “quem” é Jesus Cristo. “Jesus fez na presença dos seus
discípulos muitos outros sinais que não estão escritos neste livro. Estes, porem, foram
escritos para que creiais que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus e para que crendo, tenhais a
vida em seu nome”. A comunidade joanina, aqui, nos diz porque devemos “crer”: é para
ter “vida”. O evangelho é uma proclamação que faz nascer a fé. Foram escolhidos somente
alguns sinais para suscitar a fé em Jesus. É desta que nasce a vida nova.
A comunidade joanina trabalhou cinco conceitos que denunciavam o mal do mun-
do, pelos anos 95 d. C. Lembremos que Roma imperava, através do modo de produção es-

* Recebido em: 10.08.2015. Aprovado em: 18.08.2015.


** Pós-Doutor em Sagrada Escritura e Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica de Goiás. E-mail:
joelantonioferreira@hotmail.com.

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cravista. A base da economia que movia o império era a escravidão. Em todo o texto, vemos
os substantivos “egoismo”, “trevas”, “mentira”, “escravidão” e “morte”. É preciso ler o Quarto
Evangelho dentro da mentalidade de quem rejeitava qualquer mal que levasse à morte.
Qual foi a proposta joanina? Jesus de Nazaré (Jo 1,46), o Filho de Deus, é a Palavra
que veio ao mundo, encarnou-se para mostrar que os seres humanos devem viver como ele,
isto é, viver a partir do amor gratuito de Deus.
Então, o Quarto Evangelho apresentou outros cinco conceitos que são o dinamis-
mo desse modo novo de viver: “amor”, “luz”, “verdade”, “liberdade” e “vida”. No Prólogo (Jo
1,5) os autores deste livro começaram a explicar aos leitores que o sentido da vinda da Palavra
de Deus é ser Luz que brilha nas trevas. De fato, as “trevas não conseguiram apagar a Luz”,
conforme descreve o Prólogo (1,1-18). O Livro dos Sinais (Jo 1,19-12,50) mostra, fortemen-
te, o embate “verdade-mentira” e “escravidão-liberdade”. O Livro da Comunidade (Jo 13-17)
desenvolve, na prática, a força do “egoismo” para ofuscar o “amor”. O Livro da Realização
(Jo 18,1-20,29) apresenta a luta renhida da “morte-vida”. Parece que a “vida” foi destruida,
porém, ela vence. E o Epílogo (Jo 20,30-31) é a apoteose onde mostra que quem crê que Jesus
é o Cristo, o Filho de Deus tem a “Vida”, definitivamente.
Portanto, conforme a situação vital, em cada capítulo do Evangelho, João desen-
volve um dos temas. A dinâmica do “amor” da “luz-vida”, somadas à “verdade-liberdade”,
perpassará todo o livro para ajudar os leitores a compreenderem a Encarnação da Palavra (Jo
1,14) e, então, decidirem-se por Ela. O objetivo é sempre ajudar os leitores a fazerem a opção
pela vida, ou seja, encontrando Jesus Cristo. Este encontro se chama “fé”. Em João, a fé é
um encontro pessoal com Ele. Nesse encontro, o fiel modifica a sua maneira de viver, por-
que, em Jesus, descobre-se a verdade. Nele tudo é amor. A fé é a passagem da vida fechada
(egoismo) para a vida na comunhão fraterna. Essa nova vida só é possível num contexto de
fraternidade. É preciso haver uma comunidade (Jo 13-17) que já acolheu a Palavra de Jesus
Cristo. É na comunidade que recebemos a ajuda e a força que vem da Palavra. Essa ajuda é a
força do Espírito que sustenta a comunidade. O Espírito está presente entre as pessoas que se
reunem por causa da Palavra.

CONTEXTO VITAL E SOCIOLÓGICO DO LIVRO DE JOÃO

O livro de João tem que ser compreendido a partir do tempo da sua redação final.
A obra toda de João tem uma historia de sessenta anos. Estamos, para o nosso estudo, nos
anos 90-95. O Imperador de Roma já é Domiciano, que foi um perseguidor sistemático dos
cristãos. O cristianismo está passando por duas grandes crises: a) a perseguição romana; b) a
ruptura definitiva com o judaísmo (KONINGS, 2000, p. 46-9).
Procuremos entender o conflito com o judaísmo: em 70 d.C. as grandes institui-
ções judaicas foram destruídas (a cidade de Jerusalém, o Templo com toda a sua estrutura,
os detentores do poder, o sacerdócio). Israel desapareceu (só vai ressurgir, como nação, em
1948). Para onde ir? Acabou o mundo judaico? Como perpetuar, no nível da fé, o judaísmo,
para um povo sem pátria?
Um grande líder, Jonathan (Yoham), após Jerusalém ter sido destruída, articulou,
na diáspora, um grupo significativo e preparado para um congresso que marcou a historia
do Israel sem pátria (FERREIRA, 2011, p. 200). Este longo encontro se deu na cidade de
Jâmnia. Ali, eles reorganizaram o judaísmo que devia estar preparado para a subsistência em
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qualquer parte do mundo. Que decisões a Academia de Jâmnia tomou?
• Definiram o cânon do Antigo Testamento (a atual bíblia hebraica), aceitando somente os
livros escritos em hebraico e aramaico.
• Fixaram o calendário das festas Judaicas (no evangelho de João aparecem seis momentos
de festas).
• Agora, sem o Templo, a sinagoga será a grande expressão do Judaísmo (a partir de agora,
falar em “sinagoga” significará o “judaísmo da diáspora”). É definida a liturgia sinagogal.
• Prepararam um programa de formação dos rabinos.
• Escreveram um corpo de doutrina visando conservar a identidade do povo judeu na
diáspora (FERREIRA, 2011, p. 200-1).
O que tem a ver este congresso de Jâmnia com o Evangelho de João?
Até este congresso de Jâmnia, as comunidades cristãs, que eram chamadas de “Na-
zarenas”, faziam parte do judaísmo. Era, como se fosse, uma tendência dentro do judaísmo1.
Porém, os conflitos iam se ampliando entre as duas partes. Os nazarenos ou cristãos eram
judeus que reconheciam o Antigo Testamento incluindo os livros que foram escritos em grego
(Tobias, Judite, 1º e 2º Macabeus, Sabedoria, Eclesiástico, Baruc), e, alem disso, aceitavam
Jesus como o Messias. As relações entre judeus e judeu-cristãos, nas localidades onde estavam
as comunidades joaninas, eram, mais ou menos, boas.
Com o encontro de Jâmnia acabaram a paz e as proximidades.
Quando os congressistas do novo judaísmo firmaram a “liturgia sinagogal”, elabo-
raram dezoito bênçãos endereçadas aos pertencentes ao judaísmo e uma maldição apontada,
exatamente, aos “nazarenos” (cristãos). Nesse momento, os cristãos tiveram que cortar o cor-
dão umbilical. Jo 9,22 (episodio do ex-cego de nascença) é o retrato de Jâmnia expulsando
os cristãos do judaísmo (sinagoga), bem como Jo 1,46 (fé de Natanael: de “Nazaré” pode vir
alguma coisa que presta?) (FERREIRA, 2011, p. 201-2).

CONFLITOS EXTERNOS

A escola joanina nos apresenta muitos conflitos externos: os “batistas”,ligados ao


grupo de João Batista. O Quarto Evangelho demonstrou um grande interesse pela figura de
João Batista e seus discípulos. Desde o Prólogo (Jo 1,1-18) o texto vai informando que João
não era a “luz”, mas deu testemunho dela. O momento forte é quando é colocado na boca de
João Batista que Jesus “deve crescer e eu diminuir” (Jo 3,30). Muitos dos seus seguidores, aos
poucos, na história, foram compreendendo que o messias não era João Batista (KONINGS,
2000, p. 49-50).
Os “Docetas” chegaram a diminuir a materialidade de Jesus. Por isso, João evange-
lista deu muita ênfase à Encarnação (Jo 1,1-18).
Os “Gnósticos” diziam que para ter fé, bastava estar em comunhão com Deus
(BLANK, 1990, p. 22-3). Era suficiente uma atividade intelectual. Então, o Evangelho mos-
trou, especialmente, no “livro da comunidade” (Jo 13-17) e na Primeira Carta de João (1 Jo
2,2-4) que a “prática” é vital.
O “mundo”: sistema social e modo de produção escravagista romano. Quer dizer: o
império romano, muitas vezes, é o mundo. Não se podia falar claro. No Evangelho de João,
a palavra ”rei” vem nomeada dezesseis vezes. Só na Paixão, ela aparece doze vezes com relação
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a Pilatos (representante do mundo: Roma). Por isso, que, para João, proclamar que Jesus era
rei, era uma decisão radical.
O forte conflito com o judaísmo de então (RUBEAUX, 1989, p. 9) foi explicitado
no congresso de Jâmnia. Depois que os romanos destruíram Jerusalém, em 70 d.C., os judeus
fariseus tentaram reorganizar o povo judeu numa estrutura, embora sem pátria, exigente e
rigorosa, como vimos atrás.

CONFLITOS INTERNOS

Onde as pessoas convivem juntas, é normal que apareçam dificuldades, tensões e


conflitos. Fiquemos atentos a duas comunidades: a “petrina” e a “joanina”. A primeira era
ligada à pastoral e à experiência comunitária que veio de Pedro. Este, pelos anos 95, quando o
Evangelho foi finalizado, já havia falecido. Porém, o grupo petrino, após sua morte, continu-
ava forte. Por exemplo, próximo à cidade de Roma e arredores, havia grupos ligados à linha
de Pedro. No entanto, também nos arredores de Roma tinham pessoas ligadas à comunidade
de João, o evangelista. Isso fazia gerar tensões nas lideranças. O Evangelho de João já estava
pronto. O último capítulo era o vigésimo. Porém, por questões pastorais sérias, o grupo de
João resolveu, após alguns anos, acrescentar um vigésimo primeiro capítulo. Na questão da
liderança e o amor, a comunidade joanima resolveu questionar a petrina abordando temas
de liderança e da prática do amor. Percebemos isso, em Jo 21,15-17, quando, por três vezes,
Jesus perguntou a Pedro se ele o amava. Os ligados à linha de Pedro, muitas vezes, olhavam a
condução da igreja a partir da liderança. Os que provinham de João, colocavam a prática do
amor como centro da pastoral.
Em Jo 20, 3-9, no relato da ressurreição de Jesus, o “outro discípulo” foi mais veloz
e chegou primeiro que Pedro. Para João, quem é mais rápido, ama mais. Nessa cena, ao chegar
antes, ele “viu e creu”. Parece que havia um conflito entre a organização institucionalizada (os
discípulos de Pedro) e uma comunidade que vivia, fortemente, o espírito do amor.
Nas narrativas do Evangelho, os narradores se recordavam do tempo de Jesus e, ao
elaborarem o texto final, muitas vezes, colocavam Pedro e João juntos. Por exemplo, após a
cena da Ceia no anúncio da traição (Jo 13, 21-30) Pedro (liderança) pede a João (prática do
amor) para perguntar a Jesus quem o trairia. Quem ama é mais íntimo a Jesus.
Em Jo 1, 35-40 o “outro discípulo”, junto a André, seguem a Jesus e, através, deles,
Pedro é chamado.

JO 13 DENTRO DO LIVRO DA COMUNIDADE

Podemos colocar os cinco capítulos em três blocos:


Jo 13-14: a fundação da comunidade e a prática de Jesus.
Jo 15-16: a comunidade do mundo sob o impulso do Espírito Santo.
Jo 17: a oração de Jesus resume a fundação da comunidade e a luta do mundo.

Pelos anos 95 dC, a comunidade joanina, tendo uma experiência diferente dos
padrões romanos e vivendo próxima aos judeus do judaísmo, diante de várias tensões e con-
tradições, procura se recordar de Jesus e narrar vários fatos dele para iluminar a vida no final
do I Século. Jo 13 foi escrito para dizer aos cristãos: “assim como Jesus teve uma prática fun-
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damentada no amor, assim, nós hoje, também, temos que ter este tipo de vida em torno do
amor”. O capítulo 13 tem a seguinte divisão:
Jo 13, 1: Em ambiente de Páscoa, é anunciada a “hora” no espírito do amor.
Jo 13, 2-20: O lava-pés e a Ceia do Senhor: nova prática do amor e crítica ao ritu-
alismo vazio do judaísmo.
Jo 13, 21-30: Anúncio da traição de Judas
Jo 13, 31-32: Glorificação
Jo 13, 33-35: Mandamento Novo
Jo 13, 36-38: Anúncio da traição de Pedro
Olhemos, agora, o capítulo 13, a partir da ótica conflitual:

O grande ciclo da vida de Cristo (descida da parte do Pai e volta ao Pai) o pon-
to mais baixo da descida e o momento em que começa a subida é o de agora, quando o
Filho toma sobre si a forma de “escravo” (v. 16). Sua “hora” (v.1) começou (BROWN,
1971, p. 114).
Jo 13,1: O grande conflito entre o “projeto de Jesus” e o “projeto do mundo” (o
mundo tinha dois significados: o sentido cósmico e mundo representava, naquele tempo, o
império romano). O amor é apresentado em ambiente de Páscoa. Porém, vê-se que há uma
crítica às celebrações ritualísticas e vazias da Páscoa do Antigo Testamento. Parece que o sen-
tido da “liberdade” se esvaziou. Já não é mais a Páscoa dos Judeus, porque agora é a Páscoa
de Jesus, o Cordeiro de Deus que libertará a humanidade do seu pecado. Ela será a Páscoa da
libertação do homem (MATEOS; BARRETO, 1989, p. 559).
Jo 13, 2: Foi anunciada a traição de Judas dentro do projeto do mundo. A consta-
tação é antagônica à experiência da ceia partilhada que irá acontecer.
Jo 13, 3: O Senhor da História é Jesus Cristo e não o imperador romano.
Jo 13, 4: O lavar os pés era a expressão simbólica máxima do serviço. Além da parti-
lha do amor, retratatava a solidariedade aos mais necessitados. Era a contraposição da postura
opressora das autoridades.
Jo 13,6-11: Pedro, aqui, simbolizava a resistência das lideranças da Igreja que
olhavam a comunidade a partir do poder. Nesta mentalidade era impossível compreender o
gesto revolucionário do serviço em pleno modo de produção escravagista romano. O texto
é, também, uma crítica aos ritos de purificação do judaísmo que via o ser humano a partir
do puro-impuro.
Jo 13, 12-13: Jesus é o Mestre e Senhor. A ideologia do império não podia entender
essa definição, porque o senhor do império era o imperador e os mestres romanos e gregos
estavam no nível elitista do saber e da cultura. Também a ideologia dos rabinos absolutizava
os seus mestres.
Jo 13, 14-15: Lavar os pés uns dos outros era um contraste com qualquer liderança
dominadora da comunidade.
Jo 13,16-20: Igualdade entre o Pai e o Filho. Conhecer é praticar o amor, concreta-
mente. É uma crítica aos gnósticos que ignoravam a práxis cristã.
Jo 13, 21-30: João, como amava mais, estava mais próximo de Jesus. A autoridade,
Pedro, tem que pedir ajuda a quem ama mais. Será que a autoridade não ama? Pedro não
conseguia decifrar quem era o traidor, Judas. Este não conseguia partilhar. Tomou o pão e
saiu. O lado econômico é forte. Era ele quem guardava o dinheiro.
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A PRÁTICA DE JESUS EM JO 13

O capítulo se inicia, colocando o leitor no ambiente de Páscoa. Esta era a festa, por
excelência, do judaismo. Celebrava-se o ponto alto da história dos hebreus: a libertação do
jugo egípcio. A Páscoa deveria ser a celebração da liberdade. Na verdade, o texto insinua que
os judeus do judaísmo não estavam dando vida ou vivendo a vida da liberdade. No nosso
texto, vemos Jesus e seu grupo vivendo a Páscoa, de um modo novo. Segundo o texto, ele a
viveu em plenitude. Assim como os hebreus fizeram a passagem para uma terra livre, Jesus fez
a passagem deste mundo para o Pai. Era a “hora” de Jesus (COMBLIN, 1974, p. 89-92). Esta
passagem se deu através da total entrega: ele “os amou até o fim”, ou seja, até o último mo-
mento, ao extremo. Nesta total entrega da vida, há uma relembrança do “servo sofredor” do
profeta Isaías. O evangelista João, quando fêz a elaboração final do texto, uniu-se à maneira
como as primeiras comunidades viram esse momento da vida de Jesus. Vemos aqui alguns as-
pectos singulares da sua personalidade: o seu amor extremo pelos discípulos, o seu seviço su-
premo com o dom da vida, a prospectiva pascal da sua morte (PANIMOLLE, 1986, p. 175).
O gesto do lava-pés tem um significado simbólico importantíssimo. Vemos, no
sociodrama do lava-pés dos discípulos, uma referência da entrega do Servo Sofredor. Quem
cuida, desinteressadamente, dos desvalidos está se esvaziando de qualquer atitude de prepo-
tência e se envolvendo no mundo dos ultrajados. A cerimônia final da vida de Jesus, mostrou
que a liturgia da vida de Jesus, celebrada no partir do pão, envolvia, totalmente, a comuni-
dade servidora com a celebração litúrgica. Foi assim que a comunidade dos discípulos com-
preendeu a maneira como foi manifestada a glória do Pai, ou seja, a presença libertadora de
Yahweh. Revelando tudo isso, Jesus também se manifestou: foi reconhecido como Senhor.
Aí está, no último momento de convivência de Jesus com os seus discípulos, a expressão da
“prática” d’Ele em relação à Páscoa celebrada pelas comunidades. E assim, as comunidades se
sentiam animadas e a vivência comunitária reanimava a todo/as, em um momento muito ten-
so da história humana. A fraternidade ia se construindo. “Dou-vos um mandamento novo:
que ameis uns aos outros. Como eu vos amei, amai-vos também uns aos outros” (Jo 13, 34).
(RUBEAUX, 1989, p. 27).

A PRÁTICA DA COMUNIDADE

A comunidade joanina está elaborando o final do evangelho, pelos anos 95 dC. As


tensões mundiais e intracomunitárias eram fortíssimas. Havia muito conflito. O texto de Jo
13, além de ser uma memória, era interpelativo. Provavelmente, nesse anos 95 em diante,
dentro da Igreja, após os assassinatos de Pedro e Paulo e a morte de quase todos os amigos
que conviveram com Jesus, era hora de “chacoalhar” as lideranças, fazendo uma memória
de um possível fato acontecido sessenta anos antes. Pedro se recusou, diferentemente dos ou-
tros, em deixar que seus pés fossem lavados. A comunidade joanina, que amava muito, e que
respeitava e gostava da comunidade petrina, colocou a figura do Pedro no começo e no fim
do capítulo treze, quando Jesus lhe abriu os olhos. A maneira de Pedro reagir e, certamente,
a maneira como as lideranças que sucederam Pedro, pelos anos 95, não era o jeito de Jesus
agir. A comunidade era questionada sobre como “ter parte com Jesus”. Ele precisava celebrar a
Páscoa como Jesus a celebrou e viveu. Como Jesus passou deste mundo para o Pai, a comuni-
dade seguidora, também, precisava fazer a passagem. Como? Fazendo o que Jesus fêz, lavando
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os pés uns dos outros, dando a vida uns pelos outros. A comunidade precisava fazer o ritual
pascal ligado à vida do serviço e do amor.
Outro aspecto foi a partilha. Celebrar a Páscoa é partilhar o pão. Para haver uma
liturgia da vida compartilhada, não pode haver um traidor, sequer, no meio da comunidade.
O texto da narrativa sobre Judas foi uma alerta para os cristãos do final do primeiro século.
Não podia haver ritos eucarísticos mentirosos, desligados da vida. A celebração de Jesus foi
uma vivência do agápe (o amor), da solidariedade. Toda comunidade litúrgica que celebra a
memória da Páscoa (todas as eucaristias) de Jesus, devem sentir-se interpeladas em relação ao
modo como estão vivendo.
Celebrando a ceia de Jesus, qualquer comunidade, desde os tempos joaninos até
hoje, vai relendo o próprio Jesus à luz da Palavra de Deus. Está se apropriando da Palavra de
Deus, para perceber o sentido da prática de Jesus. Todos, em qualquer tempo, seguidores de
Jesus, ao descobrirem-se que são de Jesus entendem que não se pode ser, ao mesmo tempo,
do projeto do mundo. Como foram incompatíveis o projeto de Jesus com o do Imperador
romano, também hoje essa incompatibilidade existe. No tempo de Jesus, estava havendo a
perseguição do imperador Domiciano aos cristãos. Em qualquer tempo da história, existem
adversidades agressivas contra os cristãos. Em nenhum tempo, pode haver a acomodação. Por
isso, sempre, o lava-pés, a ceia e a fidelidade precisam vitalizar o ritual da Páscoa (qualquer
eucaristia).
Então, Jo 13 é um retrato bem crítico dos tempos de Jesus, quanto ao lava-pés, à
ceia e à traição do evangelho, como foi uma radiografia dos problemas dos anos 95 dC, como
o é hoje, para nós.

CONCLUSÃO

A comunidade joanina, ao escrever, pelos anos 95, este Evangelho, queria questio-
nar os cristãos que viviam no Império Romano bem próximos aos judeus da mentalidade de
Jâmnia o seguinte: assim como, mais ou menos sessenta anos atrás, Jesus mostrou que a reli-
gião estava se distanciando da vida, hoje (anos 95), também, ela está se tornando instrumento
de ritualismo e opressão. A nova religião judaica, reorganizada pelos novos rabinos fariseus, se
mantiver na linha dos ritos vazios, sem a prática do amor, não tem mais sentido.
Então, qual é a proclamação joanina? Jesus veio, na sua própria pessoa, praticar um
novo modo de viver a liturgia da vida. O ritual da Páscoa precisa ser conservado, celebrando,
ao mesmo tempo, a vida dos que estão impuros (lava-pés), envolvendo-se com os que estão
excluídos da sociedade. Só assim, é possível celebrar a nova Ceia do Senhor. Jesus é a manifes-
tação de Deus na vida dos seres humanos. A fonte da vida é Jesus morto e ressuscitado. Com
sua morte, Jesus eliminou, de uma vez por todas, a idéia de que o regime do ritualismo vazio
salva. Roma não salvava, o judaísmo rabínico também não.
O texto do lava-pés e da ceia, possivelmente, foi colocado no inicio do “Livro da
comunidade” (anos 95), ministério da praxis de Jesus, para fazer “memória” a dois grupos: a)
aos judeus dos anos 95, após o congresso de Jâmnia. João devia estar dizendo: olhem, não re-
pitam, nos dias de hoje, o que os antepassados de vocês fizeram com o rito judaico da Páscoa.
Aquilo que era para ser o lugar de encontro com Deus e os irmãos tornou-se vazio. Agora,
vocês, novos rabinos fariseus, não repitam o que os pais de vocês fizeram. Não coloquem a
falsa segurança nas leis que vocês elaboraram e fixaram para todos os judeus. Não façam dessas
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leis uma nova segurança ritualística. Tenham abertura... b) aos cristãos, particularmente, os
vindos da fé israelita, João deveria estar falando: escutem, após Jesus morto e ressuscitado, é
preciso relativizar todas as normas e leis fixadas pelos rabinos fariseus do congresso de Jâmnia.
Elas são boas enquanto orientadoras. Porém, tornam-se falsas seguranças quando são absolu-
tizadas. Vejam, cristãos: os rabinos declararam até uma maldição para nós. Não se assustem!
Após Jesus, não podemos mais ter medo de ameaças. Nós somos abençoados no morto e
ressuscitado. Ele está vivo e presente no nosso meio. Ele é o sinal de Deus para nós.
Então, os cristãos dos anos 95 precisavam, sempre, olhar sessenta anos para trás,
fazer memória de Jesus lavando os pés e celebrando a nova Ceia e, então, praticar, vivamente,
o serviço aos irmãos. Assim, a nova liturgia voltava a ter sentido.

THE PRACTICE OF LOVE IN JOHN 13: THE NEW CHRISTIAN COMMUNITY

Abstract: Starting from an overview of the whole Fourth Gospel Room and focusing on Jo 13
within the “Book of the Community”, this article wants to show how the dialectic “death” - “life”,
within a group of faith, must be addressed in the practice of community. The positions of two mem-
bers near Jesus, that is, Peter and Jude question deeply, inside the church, authorities and leaders
as well as those who put economic ahead of any project. In symbolic gestures of “foot washing” and
“Supper”, the practice of Jesus brings Christians to decide for the service, by sharing and solidarity
to the extreme point: lay down his life because of God’s plan.

Keywords: Solidarity. Sharing. Washing of the feet. Supper.

Nota

1 Os grupos joaninos, ao que parece, estavam próximos a grupos judaicos após a destruição de Jerusalém. Não
podemos nos esquecer que outros cristianismos originários não tinham esta proximidade. Por exemplo, os
grupos de Paulo, Silas, Barnabé, Timóteo, Priscila e Áquila, Lídia, Trifosa e Trifena, Apolo etc tinham outras
problemáticas. A questão de Jâmnia será, fortemente, absorvida pelos grupos joaninos e mateanos.

Referências

BLANK, J. O Evangelho Segundo João (Parte A). Petrópolis: Vozes, 1990.


BROWN, R. E. Evangelho de João e Epístolas. S. Paulo: Paulinas, 1971.
COMBLIN, J. O Enviado do Pai. Petrópolis: Vozes, 1974.
FERREIRA, J. A. Paulo, Jesus e os Marginalizados. Leitura Conflitual do Novo Testamento
(2a ed). Goiânia: Ed. da PUC Goiás, 2011.
KONINGS, J. Evangelho Segundo João: amor e fidelidade. Petrópolis: Vozes, 2000.
MATEOS, J.; BARRETO, J. O Evangelho de São João. S. Paulo: Paulinas, 1989.
PANIMOLLE, S. A. Lettura Pastorale del Vangelo di Giovanni (III vol). Bologna: Dehoniane,
1986.
RUBEAUX, F. “Mostra-nos o Pai”: uma leitura do quarto evangelho. S. Leopoldo: CEBI,
1989.
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